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Sumário Prefácio 7 1. Noções de Criminologia 11 1.1 Conceito de Criminologia 12 1.2 Método da Criminologia 14 1.3 Objeto da Criminologia 16 1.3.1 Delito 18 1.3.2 Delinquente 19 1.3.3 Vítima 20 1.3.4 Controle social 22 1.4 Finalidade da Criminologia 22 1.5 Características da Criminologia 23 1.5.2 Ciência causal-explicativa 26 1.5.3 Ciência auxiliar do Direito Penal 26 1.5.4 Ciência Natural /Humana / Social 26 1.5.5 Conteúdo Múltiplo -Tríplice Conteúdo 26 2. Análise histórica dos meios punitivos e do controle social 33 2.1 Sociedades Primitivas 36 2.2 Criminologia na Antiguidade 38 2.3 Período da Inquisição: 1232 – 1834 39 2.4 Ostentação dos suplícios 40 2.5 Iluminismo 42 2.6 Evolução da Criminologia no Brasil 44 3. As escolas criminológicas 51 3.1 Escola Clássica - século XVIII 54 3.2 Escola positiva - século XIX 56 3.2.1 Cesare Lombroso 58 3.2.2 Enrico Ferri 60 3.2.3 Raffaele Garófalo 64 3.2.4 Positivismo no Brasil – século XX 65 3.3 Escola de Chicago – século XIX 69 4. Teorias Sociológicas 75 4.1 Sociologia Criminal – século XIX 78 4.1.1 Augusto Comte 78 4.1.2 Adolphe Quetelet 81 4.2 Modelos sociológicos de consenso e de conflito 82 4.3 A teoria ecológica e suas propostas - 1920/1940 83 4.3.1 Teoria das zonas concêntricas 85 4.4 Associação diferencial 85 4.5 Anomia - Subcultura delinquente 87 4.6 Labelling Approach 90 4.7 Teoria crítica, radical ou “nova criminologia” – século XX 92 4.8 Neorretribucionismo - lei e ordem - tolerância zero - broken windows 94 4.9 Estatística criminal 97 4.9.1 Cifras criminais da criminologia 97 5. Vitimologia 105 5.1 Conceito 107 5.2 Evolução histórica 108 5.3 Classificação das vítimas 108 5.4 O criminoso e a vítima 114 5.5 Vitimização primária, secundária e terciária 115 5.6 Política criminal de tratamento da vítima 116 6. Política criminal das drogas 123 6.1 Enfoque descritivo das drogas e aspectos farmacológicos 125 6.2 Classificação das drogas 126 6.3 Aspectos criminológico das drogas - toxicomanias e alcoolismo 128 6.4 Fatores endógenos e exógenos das drogas 134 6.5 Fatores de risco e fatores de proteção das drogas 134 6.6 Prevenção ao uso indevido de drogas 135 6.7 Repressão ao uso indevido e ao tráfico de drogas 137 7. Teorias da pena 145 7.1 Teorias da pena 147 7.2 Sistema carcerário 148 7.3 Conceitos de estabelecimentos prisionais 149 7.4 A falência da política prisional 152 7.5 Sistema social da prisão 154 7.5.1 Direção 155 7.5.2 Guardas 156 7.5.3 Terapeutas 157 7.5.4 Presos 157 8. Mídia e política criminal 167 8.1 Repercussão social da mídia 171 8.2 Representações de violência e crime 172 8.3 Criação de medos, ilusões e discursos justificadores 179 Noções de Criminologia 1 12 • capítulo 1 1. Noções de Criminologia 1.1 Conceito de Criminologia O significado etimológico do vocábulo criminologia deriva do latim crimen (crime, delito) e do grego logo (tratado ou estudo). O antropólogo francês, Paul Topinard, foi o primeiro a utilizar este termo no ano de 1879. Não obstante, internacionalmente, o referido o termo só passou a ser aceito no ano de 1885, com a publicação da obra Criminologia, de Raffaele Garofalo. AUTOR Raffaele Garofalo – Nasceu na cidade de Nápoles em 18 de novembro de 1851 morreu em 18 abril de 1934, foi um jurista e criminologista italiano, representante do Posi- tivismo Criminológico, chamado na época da nova escola (Nuova Scuola). Lecionou na Universidade de Nápoles e foi senador. Cunhou, em 1885, o termo Criminologia, em seu livro "Criminologia. Um estudo do crime, suas causas e da teoria da repressão". Ele ocupou vários cargos no Mi- nistério Público e do Judiciário e do Ministério de Graça e Justiça. © W IK IM E D IA .O R G capítulo 1 • 13 A Criminologia, em sentido lato, vem a ser a pesquisa científica do fenôme- no criminal, das suas causas e características, da sua prevenção e do controle de sua incidência. Segundo Antonio Garcia-Pablos de Molina, a Criminologia é a ciência em- pírica e interdisciplinar que tem por objeto o crime, o delinquente, a vítima e o controle social do comportamento delitivo; e que conduz uma informação váli- da, contrastada e confiável, sobre a gênese, dinâmica e variáveis do crime – ob- servado este como fenômeno individual e como problema social, comunitário –; bem como sua eficaz prevenção, as formas e estratégias de reação ao mesmo e as técnicas de intervenção positiva no infrator. (MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de. Tratado de Criminologia. 2ª ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 1999, p. 43). A definição de Criminologia apresentada por de Edwin H. Sutherland, é mais clara, resumida e completa, eis que, segundo ele: “Criminologia é um conjunto de conhecimentos que estudam o fenômeno e as causas da crimina- lidade, a personalidade do delinquente, sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo”. Os criminólogos, normalmente, trazem sua experiência do estudo de outros setores científicos aos quais adicionam considerações de ordem pessoal, as- sim, como não poderia deixar de ser, a Criminologia não é definida de maneira uniforme, sendo diversas as suas conceituações. Para grande jurista Nelson Hungria, a Criminologia é entendida como o estudo experimental do fenômeno do crime, para pesquisar-lhe a etiologia e tentar a sua debelação por meios preventivos ou curativos. CONCEITO A criminologia é a ciência que estuda: 1. As causas e as concausas da criminalidade e da periculosidade preparatória da crimina- lidade; 2. As manifestações e os efeitos da criminalidade e da periculosidade preparatória da criminalidade e, 3. A política a opor, assistencialmente, à etiologia da criminalidade e da periculosidade preparatória da criminalidade, suas manifestações e seus efeitos. 14 • capítulo 1 1.2 Método da Criminologia A Criminologia passou a ter autonomia e status de ciência quando o positivis- mo difundiu o emprego do método empírico, ou seja, quando a análise, a ob- servação e a indução substituíram a especulação e o silogismo, superando o método abstrato, formal e dedutivo do mundo clássico. Segundo Augusto Com- te, em sua obra Discurso sobre el espiritu positivo, submeter a imaginação à observação e os fenômenos sociais às leis implacáveis da natureza foi uma das virtudes, do método empírico. O método da criminologia é uma ciência do “ser”, que visa entender e ex- plicar a realidade, utilizando-se para tanto de um método empírico e indutivo. Empírico, vista que, analisa a realidade através do uso dos sentidos, onde os dados coletados são concretos, materialmente verificáveis (uso da estatística) e é indutivo, pois em decorrência da observação de premissas específicas é possí- vel se construir uma teoria genérica capaz de explicar determinado fenômeno. Difere do direito, caracterizado como uma ciência do “dever ser” e que se utiliza de um método lógico e dedutivo que parte de uma premissa geral (a lei) para chegar a uma conclusão particular. O direito atribui valor ao fato, definindo-o ou não como algo lesivo para a coletividade, enquanto a criminologia o analisa e explica, como um fenômeno real. A Criminologia pretende conhecer a realidade para explicá-la e o Direito valora, ordena e orienta aquela com apoio em uma série de critérios axiológi- cos (valorativos). A Criminologia se aproxima do fenômeno delitivo sem prejuí- zos, sem mediações, procurando obter dele uma informação direta, enquanto o Direito limita interessadamente a realidade criminal (da qual, por certo, só tem uma imagem fragmentada e seletiva), observando-a sempre sob o prisma do modelo típico estabelecido na norma jurídica, isto é, de forma mediata. Se à Criminologia interessa como é a realidade - a realidade em si mesma, tal e como se apresenta -, para explicá-la cientificamente e compreender o problema do crime, ao Direito só lhe preocupa o crime enquanto (hipotético) fato descrito na norma legal,para descobrir sua adequação típica. A Ciência do Direito versa sobre normas que são interpretadas em suas conexões internas, sistematica- mente. Nos modelos do Direito codificado, os três momentos fundamentais da tarefa jurídica são: interpretar a norma, aplicá-la ao caso concreto e elaborar um sistema. Por isso, o método básico das ciências jurídicas (normativas) é o dogmático e seu proceder o dedutivo sistemático. capítulo 1 • 15 A Criminologia é uma ciência empírica, mas não necessariamente experi- mental: o método "experimental" é um método empírico, porém, não o único; de outro lado, nem todo método empírico tem obrigatoriamente natureza ex- perimental. A observação parece necessária, pois o objeto da investigação - ou os fins desta - pode tornar inviável ou ilícita a experimentação e, não obstante, o criminólogo seguirá em condições de constatar empiricamente a hipótese de trabalho com as garantias que exige o conhecimento científico mediante ou- tras técnicas não experimentais, assegurando também, assim, a confiabilidade do resultado. Afirmar, portanto, que só é científico o demonstrável de forma experimental dentro de um laboratório não tem fundamento. Trata-se de um pressuposto sim- plificador no qual incorrem, por exemplo, determinados setores criminológicos de natureza "biologicista" (v.g., psicologia radical da conduta), que terminam por negar todo cientificismo à psicanálise, apesar de sua tradição empírica. Não obstante, o método empírico não é o único método criminológico. Sendo o crime, em última análise, um fenômeno humano e cultural, com- preendê-lo exigirá do investigador uma atitude aberta, flexível e intuitiva, capaz de captar as sutis arestas e as múltiplas dimensões de um profundo problema humano e comunitário. Indubitavelmente, o método empírico contribuiu para a consolidação da Criminologia como ciência e ao progresso da mesma. Não obstante, foi objeto de numerosas críticas, tanto do ponto de vista epistemológico como ideológi- co, e não foram poucos os autores a questionar sua possível aplicação ao âm- bito das ciências humanas e sociais, argumentando que não lhes caberia esta- belecer generalizações, uma vez que o comportamento humano é imprevisível ou de tal complexidade e riqueza de matizes que o método empírico não pode captar sua essência e seu significado. Por fim cabe salientar o entendimento de Enrico Ferri no seu livro Polemica in difesa della Scuola Criminale Positiva, 1886, p.54, considerado fundador da criminologia, explica a relevância do método empírico: 16 • capítulo 1 Para nós, o método experimental (indutivo) é a chave de todo conhecimento; para eles (os clássicos), tudo deriva de deduções lógicas e da opinião tradicional. Para eles, os fatos devem ceder seu lugar ao silogismo; para nós, os fatos mandam...; para eles, a ciência só necessita de papel, caneta e lápis, e o resto sai de um cérebro cheio de leituras de livros, mais ou menos abundantes e feitos da mesma matéria. Para nós, a ciência requer um gasto de muito tempo, examinando os fatos um a um, avaliando -os, reduzindo-os a um denominador comum e extraindo deles a ideia nuclear. Para eles, um silogismo ou uma anedota é suficiente para demolir milhares de fatos conse- guidos durante anos de observação e análise; para nós, o contrário é verdade. Portanto, a importância do método empírico criminológico reside na sua credibilidade enquanto instrumento de uma ciência, haja vista que não se limi- ta a análises, críticas e repaginações de ideias jurídicas apresentadas por estu- diosos antecessores, mas dedica-se ao estudo do crime fato a fato, para então encará-lo como patologia social constantemente mutável, para a qual devem ser desenvolvidas adequadas formas de controle. 1.3 Objeto da Criminologia Toda ciência deve ter um objeto, um método e uma finalidade. Para aqueles que não consideram a Criminologia uma ciência, esta não possui objeto, por- quanto estuda o delito, que pertence ao Direito Penal. É o objeto que distingue as ciências. Método é o fim que conduz ao conheci- mento ou à verdade científica. Não obstante, embora o Direito Penal e a Criminologia estudem o crime, o foco dado por um e por outra, quanto ao delito, é diverso, haja vista que o Direito Penal, sendo uma ciência normativa, tem por objeto o crime como re- gra anormal de conduta, contra o qual estabelece o castigo, a punição. Assim, pode-se dizer que, o Direito Penal é a ciência de repressão social ao crime, me- diante regras punitivas que ele mesmo executa. A Criminologia é uma ciência causal-explicativa que, em face de sua nature- za, tem por objeto a missão de não apenas se preocupar com o crime, mas tam- bém de conhecer o criminoso, armando esquemas de combate à criminalidade, capítulo 1 • 17 ampliando meios preventivos e formulando interesses terapêuticos para cui- dar dos delinquentes visando a sua não reincidência. Assim, pode-se afirmar que o Direito Penal e a Criminologia trabalham com a mesma matéria-prima, mas a forma de operação é bem distinta, podendo-se concluir que o objeto de uma ciência não é o mesmo objeto da outra. Na atualidade, o objeto da Criminalidade está dividido em quatro pilares: delito, delinquente, vítima e controle social. Observa-se que, do surgimento da Criminologia até a fase atual houve uma transformação substancial no seu objeto de estudo. Na época de Beccaria, a investigação era com relação somente ao crime e com o surgimento da Escola Positiva, e de Lombroso e seus seguidores, o objeto de estudo da Criminologia passou a ser o delinquente. Assim, o delito e o delinquente, foram durante muito tempo, os objetos de estudo da Criminologia. Á partir da metade do século XX até o presente, passa- mos a ter não mais uma substituição, mas também uma ampliação do objeto de estudo, porquanto são mantidos os interesses com o crime e o delinquente, e são somados mais dois pontos: a vítima e controle social. Os estudos criminológicos específicos sobre a vítima criminal iniciaram-se por volta da década de 1950. Aproximadamente, nessa época, também começa- ram a surgir os estudos sobre o controle social. ATENÇÃO Dependendo do interesse do pesquisador, o objeto da criminologia pode variar, dentro dos seguintes temas: • Quanto ao criminoso; com referência a esse tema, tenta-se explicar o seu comportamento, seu psiquismo, suas motivações; • Quanto crime; neste estudo pode ser dirigido à análise da prática de delitos específicos, como nos casos de tráfico de drogas, crime organizado e lavagem de dinheiro; • Quanto à vítima, por meio da vitimologia, ciência que estuda seu comportamento, sua po- sição diante do agente vitimizante ou, até mesmo, sua colaboração para a prática do crime; • Os processos de criminalização, parte dos estudos mais modernos da chamada criminolo- gia crítica, que têm como interesse explicar quais critérios que levam um delinquente a ser inserido no sistema penal. 18 • capítulo 1 Sendo assim cabe concluir que, o objeto da Criminologia é o crime, o de- linquente e o controle social. A criminologia busca conhecer a realidade para explicá-la. Para explicar esta realidade é necessário mais do que conhecimento dos fatos, deve-se ter certo subjetivismo, pois se tratando de seres humanos, qualquer generalização passa a ser falha. Daí o caráter interdisciplinar da ciên- cia criminológica, que faz uso da filosofia, do direito, da biologia, da sociolo- gia, psicologia, entre outros. Tudo para decifrar o comportamento criminoso e suas consequências. O Objetivo da Criminologia Objeto Criminologia Delito Delinquente Vítima Controle Social 1.3.1 Delito O delito é um dos objetos mais antigos de preocupação da humanidade. Nos primórdios da narrativa bíblica, já estava presente, com o homicídio praticado por Caim em face de Abel ou nos escritos da Grécia Antiga, passando por diver- sos autores da Idade Média. O crime éum fenômeno humano e cultural, pois só existe em nosso meio, haja vista que, na natureza não há a figura do crime. Os animais são regidos por leis próprias e são irracionais. Muito embora alguns sejam mais inteligen- tes que outros, eles não possuem o poder de reflexão que o homem tem. Não é possível um animal ter a compreensão suficiente para um julgamento racional, qual seja, se determinado ato é um crime ou não. Assim sendo, os animais es- tão excluídos da autoria de crime. No Direito Penal há três conceitos de delito: o material, o formal e o analítico. • O conceito material está vinculado ao ato que acarreta prejuízo social, ou que provoque lesão a um bem jurídico; • O conceito formal está ligado ao fato de existir uma lei penal que descreva determinado ato como infração criminal; • O conceito analítico de delito explica os elementos estruturais e aspectos essenciais do conceito de crime. capítulo 1 • 19 Segundo determinados autores, os conceitos formal e material não tradu- zem com precisão o que seja crime. Se há uma lei penal editada pelo Estado, proibindo determinada conduta, e o agente a viola, estando ausente qualquer causa de exclusão da ilicitude ou dirimente da culpabilidade, haverá crime. Não obstante, o conceito material sobreleva a importância do princípio da in- tervenção mínima quando aduz que somente haverá cri9me quando a conduta do agente atenta contra os bens mais importantes. Acontece que, mesmo sen- do importante e necessário o bem para manutenção e subsistência da socieda- de, se não houver uma lei penal protegendo-o, por mais relevante que seja não haverá crime se o agente vier a atacá-lo em face do princípio da legalidade. Esses conceitos não traduzem a profundidade do fenômeno criminal e fica visível a diferença existente na aplicação da lei penal pela Justiça Criminal to- gada e pelo Tribunal do Júri. O Tribunal do Júri é a mais pura Criminologia porque estão ali estão bem visíveis: o delito, delinquente, vítima e o controle social. A Criminologia moderna não mais se baseia no dogma de que convivemos em uma sociedade consensual. Pelo contrário, vivemos em uma sociedade con- flitiva. A Criminologia moderna busca se antecipar aos fatos que precedem o conceito jurídico-penal de delito. A sociologia criminal atualmente já utiliza o parâmetro de conduta desviada ou desvio. Esse critério utiliza as expectativas da sociedade como paradigma. As condutas desviadas são aquelas que infringem o padrão de comportamen- to esperado pela população num determinado momento. Esse conceito não se confunde com o de crime, mas o abrange. 1.3.2 Delinquente O principal objeto de estudo da Escola Clássica criminal, foi o delito. Posterior- mente, com o surgimento da Escola Positiva passou o núcleo das pesquisas para a pessoa do delinquente, abandonando-se a centralização na figura do crime. A Escola Positiva surgiu no contexto de um desenvolvimento acelerado das ciências sociais (Antropologia, Psiquiatria, Psicologia, Estatística etc.), determi- nando uma nova orientação nos estudos criminológicos, de forma significativa. Atualmente, os modelos biológicos de explicação da criminalidade perde- ram quase por completo a sua força. Não obstante, não foram eliminados por completo. Eles também podem contribuir, dentro de suas limitações, para a compreensão do fenômeno criminal. 20 • capítulo 1 Na moderna Criminologia, o estudo do homem delinquente passou a um segundo plano. O centro de interesse das investigações (mesmo não tendo abandonado a pessoa do infrator) deslocou-se para a conduta delitiva, para a vítima e para o controle social. Não há dúvida de que a Psicologia Criminal possa contribuir de forma sig- nificativa para a Criminologia com seus estudos, individuais ou coletivos, do delinquente. Uma das maiores contribuições criminológicas que a Psicologia pode dar nesse sentido é ajudar na criação de programas que ajudem a redução da rein- cidência criminal, terreno que ainda não foi completamente explorado. 1.3.3 Vítima Na história da civilização ocidental, a vítima passou por três fases principais. Primeiro, a fase conhecida como idade de ouro, se valorizava muito a vítima, valorava-se muito a pacificação dos conflitos e a vítima era bastante respeitada. Posteriormente, com a responsabilização do Estado pelo conflito social, ad- veio a chamada neutralização da vítima. O Estado, assumindo o monopólio da aplicação da pretensão punitiva, diminuiu a importância da vítima no conflito. Ela passou a ser tratada como uma testemunha de segundo plano, haja vista que, aparentemente, ela tinha interesse direto na condenação dos acusados. Por último, da década de 1950 em diante, adentramos na fase do redesco- brimento da vítima, cuja importância é retomada sob um aspecto mais huma- no por parte do Estado. Na segunda parte do século XX, os estudos criminológicos da vítima foram se multiplicando, sendo fundada uma nova disciplina: a Vitimologia. Nos úl- timos 20 anos, começamos a observar o surgimento e a expansão dos centros profissionais de apoio às vítimas criminais, dentre outras iniciativas. Esses centros ou núcleos de atendimento às vítimas criminais, localizados em diversas capitais e cidades de porte médio do Brasil, foram se diversificando, já existindo programas de atendimento específicos para as vítimas de crimes se- xuais, violência doméstica, defesa das crianças e adolescentes etc. Esses núcleos, algumas vezes, recebem verbas públicas para se manterem, ou, em alguns casos, trabalham mantidos por organizações não governamentais, às vezes com o auxí- lio de voluntários, dentre eles, pessoas que já foram vítimas de crimes. capítulo 1 • 21 Esses centros que estão funcionando também em outros países como EUA, Portugal, Nova Zelândia e Espanha, entre outros, trabalham em vários casos com advogados, psicólogos e assistentes sociais, auxiliando a vítima, mormen- te na atenuação do processo conhecido como vitimização secundária. A vítima criminal na maioria das vezes sofre danos psíquicos, físicos, sociais e econômicos adicionais, em consequência da reação formal e informal do fato, ao contrário do aspecto racional, que seria o fim do sofrimento em face da ação do sistema repressivo estatal. Essa reação traz mais danos, efetivos à vítima do que o prejuízo derivado do crime praticado anteriormente ( vitimização primária). A vitimização secundária é o sofrimento adicional que a dinâmica da Justiça Criminal (Poder Judiciário, Ministério Público, polícias e sistema penitenciário), provoca normalmente nas vítimas. A própria sociedade também não se preocupa em ampará-la e muitas vezes chegam a incentivá-la a manter-se no anonimato, contribuindo para a formação da malsinada cifra negra, ou seja, o conjunto de cri- mes s que não chegam ao conhecimento do Estado pelos mais variados motivos. Indubitavelmente, a Criminologia influenciou fortemente o ressurgimento da vítima no seio da discussão do fenômeno criminal. A Lei Federal n.º 9.099/1995, reflete no Brasil, a restauração da importância nuclear da vítima na pacificação dos conflitos. A Lei Federal quer romper essa falta de diálogo e resgatar a importância da vítima, entre vários objetivos. O advento da Lei Maria da Penha – Lei Federal n.º 11.340/2006 – reflete a preocupação da sociedade com as vítimas da violência doméstica. Na forma da mencionada lei, configura a violência doméstica e familiar contra a mulher, qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofri- mento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I. No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II. No âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidadeou por vontade expressa; III. Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Esta lei foi sancionada com profundo sentimento vitimológico. Essa for- ma de vitimização possui altos índices de impunidade (cifras negras) e merece uma atenção melhor do Poder Público. 22 • capítulo 1 1.3.4 Controle social O controle que um grupo social exerce sobre seus membros, no sentido de que não se desviem das normas aceitas, diversas vezes não é perceptível, e até nós mesmos exercemos certo controle sobre nossos atos, mediante um sentimento de culpa quando nos desviamos do que é considerado correto. Esse controle é absolutamente fundamental para o funcionamento das sociedades: sem ele não haveria nenhum tipo de ordem social e não saberíamos como proceder nas mais diferentes situações, criando assim uma desordem nas relações entre in- divíduos e grupos sociais. O controle social constitui um tema central da Sociologia e o termo apa- rece em estudos sociológicos do final do século XIX. Esses estudos analisa- ram os meios que aplica a sociedade para pressionar o indivíduo a adotar um comportamento conforme os valores sociais e, assim, garantir uma convivên- cia pacífica. O controle social é uma expressão que pode levar a um número elevado de conceituações. Ele é exercido das mais diferentes formas e o objetivo principal é transformar o padrão de comportamento de um indivíduo adaptando-o aos padrões de comportamento sociais dominantes. 1.4 Finalidade da Criminologia A finalidade da Criminologia é estudar todos os fatores que estão agregados no fator crime, para que haja uma prevenção contra a criminalidade e como uma cura social, vez que quando um crime a sociedade se fere. Quando o crime ocorre, um dos membros da sociedade pratica fato típico, an- ti-jurídico e culpável na visão do Direito Penal, mas para a criminologia é um fator que altera a estrutura da sociedade, que a modifica, que cria um ferimento social. A função básica da Criminologia consiste em informar a sociedade e os po- deres públicos sobre o delito, o delinquente, a vítima e o controle social, reu- nindo um núcleo de conhecimentos que permita compreender cientificamen- te o problema criminal, preveni-lo e intervir com eficácia e de modo positivo no homem delinquente. A investigação criminológica reduz ao máximo a intuição e o subjetivismo, enquanto atividade científica, submetendo o problema criminal a uma análise rigorosa, com técnicas empíricas. Ademais, a sua metodologia interdiscipli- nar permite coordenar os conhecimentos obtidos setorialmente nos distintos capítulo 1 • 23 campos do saber pelos respectivos especialistas, eliminando contradições e suprindo inevitáveis lacunas. Assim, oferece um diagnóstico qualificado e de conjunto sobre o fato delitivo. É preciso desmistificar algumas crenças sobre o saber científico crimino- lógico, haja vista que oferecem uma imagem distorcida da Criminologia como ciência, da contribuição que esta pode oferecer e de sua própria função. Para certos autores, a prioritária função da Criminologia, como ciência inter- disciplinar e empírica, é conduzir um núcleo de conhecimentos mais seguros e contrastados com o crime, a pessoa do delinquente, a vítima e o controle social. Diante de todo o exposto, as funções principais da moderna Criminologia são: • Explicar e prevenir o crime; • Intervir na pessoa do infrator; • Avaliar os diferentes modelos de resposta ao crime. 1.5 Características da Criminologia 1.5.1 Ciência interdisciplinar Assim, a criminologia, além de ser reconhecida como ciência, também é consi- derada interdisciplinar, uma vez que para qualquer dos objetos que se destina estudar, poderá fazê-lo sob enfoques distintos, podendo se apoderar de diver- sas esferas do conhecimento a fim de melhor entender determinada situação. Tendo objeto de estudo extremamente complexo, qual seja, o crime como um fato biopsicosocial, a Criminologia não se limita a um só domínio, ou seja, uma área ou terreno científico. O delito é estudado pela ciência criminológica, em sua realidade fenomenológica, ou seja, como um fenômeno real, em sua realidade fática. Como fato humano que o é, a conduta tida como antissocial, é determinada por uma plêiade imensa de fatores, sejam eles internos (endó- genos) ou externos ao ser humano (exógenos), sejam eles, emoções, fatores atávicos geneticamente determinados, desvios de conduta, neuroses, desvios endocrinológicos, psicológicos, psiquiátricos, sócio-econômicos, climáticos etc., que interagem, culminando com a eclosão do ato objeto de estudo. Cada um desses fatores motivadores do ato estudado, observado em sua pureza e in- dependência fenomenológica é afeito ao domínio de determinada ciência, daí porque se asseverar ser uma das características da Criminologia, seu aspecto interdisciplinar, haja vista necessitar recorrer aos conceitos e conclusões de estudo, tal como recorrera ao instrumental metodológico de outras ciências, 24 • capítulo 1 como a biologia, medicina, direito, sociologia, psicologia, antropologia etc. Aliás, essa interdisciplinaridade é uma das características marcantes do pano- rama científico da atualidade. No caso da Criminologia, nota-se essa integração investigatória com outras áreas científicas acerca do mesmo objeto, o crime, recorrendo-se a conceitos, instrumental metodológico, princípios de outras ciências, do mesmo modo que elas necessitam e recorrem a princípios e conceitos criminológicos. É por esse inter-relacionamento científico que se diz ser, a Criminologia, uma ciên- cia interdisciplinar. A interdisciplinaridade é uma perspectiva de abordagem científica envol- vendo diversos continentes do saber. Ela é uma visão importante para qualquer ciência social. A criminologia, em seus estudos, se engaja em diálogo tanto com disciplinas das Ciências Sociais ou humanas quanto das Ciências Físicas ou naturais. Entre as áreas de estudo mais próximas da Criminologia temos: DIREITO PENAL O principal ponto de contato da criminologia com o Direito Penal está no fato de que este delimita o campo de estudo da criminologia, na medida em que tipifica e define juridicamente a conduta delituosa; O direito penal é sancional por excelência; ele caracteriza os delitos e, através de normas rígidas, prescreve penas que objetivam levar os indivíduos a evitar essas condutas. DIREITO PROCESSUAL PENAL A Criminologia fornece os elementos necessários para que se estipule o adequado tratamento do réu no âmbito jurisdicional. Indica também qual a personalidade e o contexto social do acusado e do crime, auxi- liando os juristas para que a sentença seja mais justa. A criminologia oferece os critérios valorativos da conduta criminosa. Ela pesquisa a eficácia das normas do Direito Penal, bem como estuda e desenvolve métodos de prevenção e ressocialização do criminoso. DIREITO PENITENCIÁRIO Os dados criminológicos são importantes no Direito Penitenciário para permitir o correto e eficaz tratamento e ressocialização do ape- nado. A criminologia ajuda a tornar a pena mais humana, buscando o objetivo de punir sem castigar. PSICOLOGIA CRIMINAL É ciência que demonstra a dimensão individual do ato criminoso; estuda a personalidade do criminoso, orientando a Criminologia. capítulo 1 • 25 PSIQUIATRIA CRIMINAL É ramo do saber que identifica as diversas patologias que afetam o criminoso e envolve o estudo da sanidade mental. ANTROPOLOGIA CRIMINAL Abrange o fenômeno criminológico em sua dimensão holística, ou seja, biopsicosocial. É o Estudo do homem na sua história, em sua totalidade (homem como fator presente no todo); SOCIOLOGIA CRIMINAL Demonstra que a personalidade criminosa é resultante de influên- cias psicológicas e do meio social; CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Fornecem os elementos naturais e orgânicos que influenciamou determinam a conduta do criminoso; VITIMOLOGIA Estuda a vítima e sua relação com o crime e o criminoso (estuda a proteção e tratamento da vítima, bem como sua possível influência para a ocorrência do crime); CRIMINALÍSTICA É o ramo do conhecimento que cuida da dinâmica de um crime. Estuda os fatores técnicos de como o crime aconteceu. Há um setor especializado da polícia destinado a essa área. CIÊNCIAS ECONÔMICAS Estuda o crime a partir do instrumental analítico racionalista. O crime é visto como um mercado e sua oferta é determinada por fa- tores como o ganho esperado da atividade criminosa, probabilidade de sucesso e intensidade da punição em caso de falha. Estudo Criminologia Direito Processual Penal Direito Penal Direito Penitenciário Psicologia Criminal Psiquiatria Criminal Antropologia Criminal Sociologia Criminal Ciências Biológicas Ciências Econômicas Vitimologia Criminalística ESTUDO CRIMINOLOGIA 26 • capítulo 1 1.5.2 Ciência causal-explicativa Ao contrário do Direito, que é uma ciência do ideal, a Criminologia, em se tra- tando de uma ciência do “ser”, analisa o delito como fato humano e social nor- mal, buscando-lhe as causas e estudando-as, bem como procurando obter o conhecimento e respectiva explicação acerca da personalidade do criminoso. A criminologia tem feições etiológicas, visto que ao estudar a conduta seu objeto, busca seu porquê. 1.5.3 Ciência auxiliar do Direito Penal Ao estudar as motivações do crime e da criminalidade, bem como a persona- lidade do delinquente, e ainda buscando o domínio sobre as condições de cumprimento de pena e ressocialização do egresso, propicia ao Direito Penal o conhecimento naturalístico sobre seu objeto de estudo, viabilizando a sólida normatização do ideal buscado pelas normas criminais. 1.5.4 Ciência Natural /Humana / Social Ao contrário do Direito que pode ser considerado como uma ciência ideal (obje- tiva ideais) estuda o delito em sua realidade fenomênica, empiricamente, con- forme efetivamente o é. 1.5.5 Conteúdo Múltiplo -Tríplice Conteúdo 1.5.5.1 Fenomenologia criminal - Descrição do Crime Considerar que a criminalística é constituída pela fenomenologia criminal e pela ciência prática da investigação, designando por fenomenologia criminal uma “teoria” (ou seja, com maior parcimônia uma descrição) sobre a técnica de execução dos crimes, com exclusão propositada de qualquer explicação causal, deixada ao que chamava etiologia criminal. No corpo teórico da fenomenolo- gia, há quem faça distinção entre a descrição de fenômenos gerais do crime – que se podem entender atualmente como os conceitos e teorias criminológicas a respeito da criminalidade e do criminoso, de que pode partir a investigação criminal – e a descrição dos fenômenos especiais – que corresponde ao objeto capítulo 1 • 27 fundamental da investigação criminal, ou seja, especificar o crime como foi co- metido, seu autor e consequências observadas. Segundo a noção de fenomenologia criminal, se adquire conhecimento so- bre a execução dos crimes “por uma longa prática de investigação” e “pela leitu- ra” do que alguns autores chamam de “memórias” obtidas dos próprios autores dos crimes (em seus depoimentos) e dos funcionários de polícia e investigação (o que constitui o espólio de saber empírico dos órgãos de investigação não de- vidamente tratado cientificamente), entre outras fontes. Nessas observações, encontram-se implícitas o caminho (o método) fundamental para que as práti- cas de investigação criminal em particular, analisadas e sistematizadas em seu conjunto, possam constituir o corpo de conhecimento de um saber científico, a partir de uma compreensão criminológica do fenômeno como ponto de par- tida para teorias dirigidas especificamente às formas de investigar, segundo as formas de cometimento do crime. Podemos entender que, não apenas a investigação criminal se beneficia do conhecimento criminológico, como a criminologia tende a se beneficiar do co- nhecimento criminalístico. Tendo em conta a ideia de que uma teoria crimino- lógica pode ser considerada tanto como ponto de chegada e integração de vários conhecimentos prévios, quanto como ponto de partida e hipótese anterior de tra- balho, podem-se entender essas relações entre criminologia e criminalística, tan- to a partir da criminalística (fenomenologia criminal – tipologias classificatórias – hipóteses teóricas – teorias gerais) como a partir da criminologia (teorias gerais – hipóteses teóricas – tipologias classificatórias – fenomenologia criminal). 1.5.5.2 Etiologia criminal – Estudo das Causas Estudo sobre a origem das causas e dos fatores do delito, ou seja, estuda os de- terminantes do crime, onde em vez de pressupor a livre vontade do infrator, procura o determinismo de seu ato antissocial, na sua constituição orgânica e as condições ambientais em que vivem, podemos citar uma jurisprudência que aborda o tema. Apelação criminal - tráfico ilícito de entorpecentes - apreensão de crack na posse de terceiro - inexistência de provas que demonstrem o nexo etiológico entre as drogas e o apelado - materialidade não comprovada - absolvição preser- vada. Associação para o tráfico - crime autônomo e que prescinde da prática efe- tiva dos delitos que motivaram a reunião - elementos do tipo penal preenchidos - condenação devida - recurso ministerial parcialmente provido. A associação 28 • capítulo 1 para o tráfico (art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06) constitui delito autônomo, ou seja, a sua caracterização não depende da prática de qualquer dos crimes pre- vistos no tipo penal, que, se ocorridos, atraem a regra estabelecida no art. 69, caput, do Código Penal. (TJ-SC - ACR: 217396 SC 2009.021739-6, Relator: Moacyr de Moraes Lima Filho, Data de Julgamento: 15/07/2009, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: Apelação Criminal n. , de Criciúma) 1.5.5.2.1 Dinâmica criminal - “Processus”- Manifestação ou Exteriorização do Delito A dinâmica criminal é o estudo do Processus delituoso em suas formas entre elas a motivação, exteriorização etc., servindo para a prevenção da criminalida- de e o tratamento dos criminosos, sendo indispensável para o Direito Penal e a Política Criminal. ATIVIDADES Ao responder os questionamentos que estão sendo feitos, você estará fixando melhor o conteúdo trabalhado neste capítulo. Boa sorte. 01. Sobre a Criminologia, é correto afirmar que: a) ela não é considerada uma ciência para a maior parte dos autores. b) tal conhecimento encontra-se inteiramente subordinado ao Direito Penal. c) ela ocupa-se do estudo do delito e do delinquente, mas não se ocupa do estudo da vítima e do controle social, uma vez que tal assunto constitui objeto de interesse da Sociologia. d) ela ocupa-se do estudo do delito e do controle social, mas não se ocupa do estudo do delinquente e da vítima, uma vez que tal assunto constitui objeto de estudo da Psicologia. e) ela constitui um campo fértil de pesquisas para psiquiatras, psicólogos, sociólogos, an- tropólogos e juristas. 02. Assinale a alternativa correta, a respeito da Criminologia. a) Constitui seu objeto a análise apenas do delito e do delinquente, ficando o estudo da vítima sob a alçada da psicologia social. b) São características fundamentais de seu método o dogmatismo e a intervencionalidade. capítulo 1 • 29 c) É uma técnica de investigação policial, que faz parte das Ciências Jurídicas. d) São suas finalidades a explicação e a prevenção do crime bem como a intervenção na pessoa do infrator e avaliação dos diferentes modelos de resposta ao crime. e) É uma ciência dogmática e normativista, que se ocupa do estudo do crime e da pena oriunda do comportamento delitivo. 03. Constituem objeto de estudo da Criminologia a) o delinquente, a vítima, o controle social e o empirismo. b) o delito, o delinquente, a interdisciplinaridade e o controle social c) o delito, o delinquente,a vitima e o controle social. d) o delinquente, a vitima, o controle social e a interdisciplinaridade. e) o delito, o delinquente, a vítima e o método. 04. Para Garcia Pablo de Molina é entendido como o conjunto de instituições, estratégias e sanções sociais que pretendem promover e garantir a submissão dos indivíduos aos modelos e normas comunitárias. O texto se refere: a) Criminogênese. b) aos fatos condicionantes biológicos. c) ao controle social. d) aos fatos condicionantes sociológicos. e) aos fatos condicionantes criminais. LEITURA ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A Ilusão da Segurança Jurídica: do controle da violência à violência do controle penal. Porto alegre: Livraria do Advogado, 1997. BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: introdução à Sociologia do Direito Penal. 2 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2006. BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martins Fontes, 2004. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Vozes, 2006. 30 • capítulo 1 MULTIMÍDIA • Laranja Mecânica -1971. Sinopse: clássico do cinema; permite analisar questões importantes sobre crimino- logia e direito penal. • O Clã – 2016. Sinopse: Nem todo psicopata é criminoso, mas todo criminoso que apresenta alguma psi- copatia consegue desenvolvê-la de forma plena ao ser autorizado pelo Estado a praticar suas maldades, principalmente em regimes de exce- ção. Foi assim na Alemanha Nazista, no fascismo italiano, e, principalmente, nas ditaduras latino-a- mericanas. Um dos filmes mais vistos na Argenti- na no ano de 2015, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2016, "O Clã", conta uma história real que assombrou o noticiário policial portenho na década de 1980. Após o período de redemocratização, com o fim da sangrenta ditadura militar imposta ao país por ao menos 7 anos, e a eleição do presidente da UCR (Unión Civica Radical), Raul Alfonsín, a Argentina respira- va após muitos anos verdadeiros ares de liberdade e acerto de contas com seu brutal passado tota- litário. É nesse ambiente que uma das crias da ditadura militar, um ex-agente da inteligência, disfarçado de homem de negócios, inicia uma original e macabra jornada de crime e horror, que assombrou toda uma sociedade e é relembrada até hoje. capítulo 1 • 31 • Mente Criminosa – 2004. Sinopse: Uma esposa e mãe suspeita que seu marido, Buck, Esteja sendo Infiel. Após ser enganada por um detetive que con- tratou para encontrar provas do caso do ma- rido, Jodie decide tomar as rédeas da coisa e descobre um talento pessoal para a inves- tigação. Mas quando ela coloca suas habili- dades investigativas a serviço de uma outra mulher perturbada, as coisas se tornam mais perigosas do que ela havia imaginado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007. BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. Introdução à sociologia do direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006. BARROS, Renata Furtado de. Direito Constitucional I. 1º ed. Rio de Janeiro: SESES, 2016. CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Reação Social. Rio de Janeiro: Forense,1983. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Vozes, 2006. DELMAS-MARTY, Mireille. Modelos e movimentos de política criminal. 2 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2004. HULSMAN, Louk, BERNAT DE CELIS, Jacqueline. Penas Perdidas: o sistema penal em questão. Rio de Janeiro: Luam, 1993. RUSCHE, Georg e KIRCHHEIMER, Otto. Punição e estrutura social. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999. SHECAIRA, Sergio. Criminologia: Um Estudo das Escolas Sociológicas. São Paulo: Estúdio editores, 2014. 32 • capítulo 1 Análise histórica dos meios punitivos e do controle social 2 34 • capítulo 2 2. Análise histórica dos meios punitivos e do controle social Assim como toda ciência, a Criminologia é produto de construções típicas do momento histórico do seu nascimento, ou seja, surge fortemente influencia- da pelas ideias em voga na Europa do século XIX, especialmente o Positivismo de Augusto Comte e o Determinismo. Em consequência da complexidade e da transformação das relações sociais, oriundas da Revolução Industrial, a expan- são desenfreada das cidades europeias foi acompanhada do agravamento de questões de ordem pública como a criminalidade, o que explica o fato da maio- ria dos códigos penais dos países europeus terem sido promulgados no final do século. Com isso, o crime ganha especial relevo e um novo olhar em função da intensidade das novas produções literárias, sobretudo no campo das Ciências naturais e humanas. O desafio da ciência que dava os seus primeiros passos era entender o seu próprio objeto – o crime. • Punição e meios de produção - Ao longo dos séculos, a forma de pu- nir varia conforme a economia: quando há aumento da pobreza, as punições são mais cruéis, para controlar com maior rigor essa camada da população, capítulo 2 • 35 havendo açoites e penas capitais; se por doença ou guerra há pouca mão de obra, incrementa-se a pena de trabalhos forçados, conhecida como galés. Durante a Idade Média, com o fortalecimento da Igreja Católica, são criados o Santo Ofício e a Inquisição, tendo como finalidade caçar os inimigos da fé ca- tólica através de um processo sem contraditório, onde o acusador e o juiz eram a mesma pessoa ,presente ainda hoje no inquérito policial. • Ostentação dos suplícios - Nos séculos XVII e XVIII, tornou-se comum o uso do corpo do condenado para demonstrar o poder do soberano num es- petáculo de suplicio em praça pública, buscando o medo e o testemunho das pessoas, sendo a pena de morte para aqueles crimes mais graves antecipada pela aplicação de uma série de técnicas para aumentar a dor e o sofrimento do sujeito. • Iluminismo - Em meados do século XVIII, há o desenvolvimento de um conjunto de críticas àquele sistema punitivo cruel e irracional, momentos em que se clamou pelo humanismo e por um necessário limite ao Estado. Trata-se de um movimento que teve como base o Contratualismo, desen- volvido por Rousseau, Hobbes e Locke, e que influenciou autores dentro do di- reito penal. A Escola Clássica, como estes ficaram conhecidos, inclui Carrara, Feuerbach e, principalmente, Beccaria, que no seu livro "Dos delitos e das pe- nas", critica a pena de morte, a denúncia anônima, a tortura, os crimes de peri- go abstrato, dentre outras práticas desumanas da época. IMPORTANTE • Percursores do contratualismo © W IK IM E D IA .O R G © W IK IM E D IA .O R G © W IK IM E D IA .O R G Figura 2.1 – 1. Thomas Hobbes; 2. Jean-Jacques Rousseau; 3. John Locke. 36 • capítulo 2 • Escola Clássica © W IK IM E D IA .O R G © W IK IM E D IA .O R G © W IK IM E D IA .O R G Figura 2.2 – 1. Cesare Beccaria; 2. Francesco Carrara; 3. Paul Feuerbach. 2.1 Sociedades Primitivas Nas sociedades primitivas, um conflito se solucionava por meio da vingan- ça. Quando aplicada pela tribo, era pública, haja vista que, segundo Von Lis- zt, inicialmente não havia a ideia de indivíduo, a qual só vai surgir quando alguns membros começam a se dispersar com a finalidade de buscar ali- mento em locais mais distantes. Quando já se encontra desenvolvida a no- ção de indivíduo e de posse, era privada, sendo aplicada pela parte que se sente lesada. Acontece que essas reações sempre foram desproporcionais, como decor- rem do sentimento humano, o que gerava em grave problema, haja vista que, normalmente, o lesado procurava provocar em seu agressor uma lesão ainda maior do que a sofrida. Assim, para solucioná-lo, temos a criação do Estado que, no papel do Direito Penal, objetiva substituir a vingança, aplicando uma sanção proporcional à lesão causada. Então, surge a Lei de Talião, buscando o equilíbrio entre a agressãoe a rea- ção punitiva, com a conhecida regra “olho por olho, dente por dente”; o que se verificou injusta. O termo "talião" vem do latim "talis", que significa "idêntico" ou "semelhan- te". Assim, a pena para os crimes aos quais se aplica essa lei não é uma pena equi- valente, mas idêntica, semelhante. O termo "lei de talião" não aparece nem na Bíblia e nem no Código de Hamurabi, ele deriva da expressão latina lex talionis. Trata-se da primeira tentativa de controlar a vingança, estabelecendo uma pro- porção entre o dano recebido num crime e o dano produzido com o castigo. capítulo 2 • 37 A lei de talião é transformada por Jesus e citada na Bíblia: Ouviste o que foi dito: olho por olho e dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao homem mau; antes, àquele que te fere na face direita oferece-lhe também a esquerda; e àquele que quer pleiterar contigo, para tomar-te a túnica, deixa-lhe também o mando; e se alguém te obriga a andar uma milha, caminha com ele duas. Dá ao que te pede e não voltes as costas ao que te pede emprestado. Mateus 5, 38-42 O termo lex talionis não somente está a se referir a um literal código de jus- tiça “olho por olho, dente por dente”, uma espécie de “castigo-espelho”, mas aplica-se à mais ampla classe de sistemas jurídicos que formulam penas espe- cíficas para crimes específicos, que são pensados para serem aplicados de acor- do com a sua gravidade. Alguns propõem que este foi, pelo menos em parte, destinado a evitar ex- cessiva punição às mãos de qualquer um vingador, justiça feita pelas próprias mãos, privada ou do Estado. IMPORTANTE Código de Hamurabi – baseado na lei de talião 38 • capítulo 2 2.2 Criminologia na Antiguidade Desde os tempos mais remotos até o nascimento de Cristo a Criminologia já era conhecida. Passando de Moisés no séc. XVI A.C. até Sêneca 4 A.C – 65 D.C, os estudiosos já procuravam entender o fenômeno criminal e suas consequên- cias realizando pesquisas biopsíquicas. Na Idade Média a Criminalidade estava adormecida até São Tomás de Aquino (1226-1274) criou a “Justiça Distributiva” onde cada um deve receber o que é seu. Durante os séculos XIV e XVI tiveram destaques algumas ciências ocultas como a astrologia e fisiognomonia. Ainda existiram alguns precursores da criminologia de ordens distintas como filósofos, pensadores, médicos etc., cada um vendo a questão criminológica sob a sua especialidade. Criticava-se a criminalidade aos fenômenos socioeconômicos e classificavam-se os delitos ao bem jurídico ofendido. O desenvolvimento do conceito de justiça por São Tomás de Aquino, em concordâncias parciais ou totais com outros filósofos, precedentes ou pos- teriores, influenciou nas teorias de di- reito natural em latim lex naturalis ou jusnaturalismo, que passou ser uma teoria que postula a existência de um direito cujo conteúdo é estabelecido pela própria natureza da realidade. © W IK IM E D IA .O R G Figura 2.3 – São Tomás de Aquino, 1225 – 1274 São Tomás de Aquino, seguindo as lições do Philosophus1, aplicou em seu sistema filosófico a categoria do justo meio entre extremos opostos (mesotés), pois numa perfeita composição fornece à lei natural dois elementos que se con- jugam harmonicamente: o racionalismo e a experiência (empeiría). IMPORTANTE Podemos, então, destacar neste período da Antiguidade: • Ausência de estudo sistematizado sobre o crime e sobre o criminoso; 1 "Et ideo médium iustitiae consistit in quadam proportionis aequalitate rei exterioris ad personam exteriorem. Aequale autem est realiter médium inter maius et minus; ut dicitur in X Metaph. (lect. VII)" (Sum. Theol., quaest. LVIII, art. X capítulo 2 • 39 • Explicações sobrenaturais ou religiosas sobre o mal e o crime; • Crime como tabu ou pecado, avaliado em termos éticos e morais; • Demonismo: o delinquente como uma personalidade diabólica. 2.3 Período da Inquisição: 1232 – 1834 O termo Inquisição refere-se a várias instituições dedicadas à supressão da he- resia no seio da Igreja Católica. A Inquisição foi criada inicialmente para com- bater o sincretismo entre alguns grupos religiosos, que praticavam a adoração de plantas e animais e utilizavam mancias. A Inquisição medieval, da qual deri- vam todas as demais, foi fundada em 1184 no Languedoc no sul da França para combater a heresia dos cátaros ou albigenses. Em 1249, implantou-se também no reino de Aragão, como a primeira Inquisição estatal e, já na Idade Moder- na, com a união de Aragão e Castela, transformou-se na Inquisição espanhola (1478 – 1834), sob controle direto da monarquia hispânica, estendendo poste- riormente sua atuação na América. A Inquisição portuguesa foi criada em 1536 e existiu até 1821. A Inquisição romana ou “Congregação da Sacra, Romana e Universal Inquisição do Santo Ofício” existiu entre 1542 e 1965. Durante a Idade Média, com o fortalecimento da Igreja Católica, são criados o Santo Ofício e a Inquisição, tendo como finalidade caçar os inimigos da fé ca- tólica através de um processo sem contraditório, onde o acusador e o juiz eram a mesma pessoa. Ainda hoje se encontra presente no inquérito policial. No século XV, a Igreja ganha força política e usa efetivamente a Inquisição para caçar seus inimigos e acumular riquezas. Os crimes estavam definidos nos Éditos da Fé, podendo se destacar: a he- resia, ou seja, o desprezo pelas leis da Igreja, pelo papa e pelos santos, o judaís- mo, o islamismo, os luteranos, a adivinhação, a superstição, a invocação do de- mônio e posse de livros proibidos, tendo em vista que havia um controle sobre livros, livreiros e editores, pois os privilégios papais para impressão de livros duraram até 1606; obviamente, essa era uma forma de controlar a circulação e o acesso ao conhecimento. A pena poderia ser a excomunhão, o confisco, que muito auxiliou para o en- riquecimento da Igreja, o banimento ou a morte. Assim, como era relacionada à religião, sempre se buscava a confissão do herege, sendo legitimado o uso da tortura. 40 • capítulo 2 IMPORTANTE Séculos XV e meados do XVI: Destacamos um grande aumento da população miserável da Europa, o que veio a repercutir incremento de penas mais cruéis. 2.4 Ostentação dos suplícios Nos séculos XVII e XVIII, tornou-se comum o uso do corpo do condenado para demonstrar o poder do soberano num espetáculo de suplício em praça públi- ca, buscando o medo e o testemunho das pessoas, sendo a pena de morte para aqueles crimes mais graves, antecipada pela aplicação de uma série de técnicas para aumentar a dor e o sofrimento do sujeito. Assevera Michel Foucault em sua obra Vigiar e Punir, que o suplício faz cor- relacionar o tipo de ferimento físico, a qualidade, a intensidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a pessoa do criminoso, o nível social de suas vítimas. Há um código da dor; a pena, quando é suplicante, não se abate sobre o corpo ao acaso ou em bloco; ela é calculada de acordo com regras de- talhadas: número de golpes de açoite, localização do ferrete em brasa, tipo de mutilação a impor, podendo ser a mão decepada, os lábios ou língua, furados, o tempo da agonia na fogueira ou na roda, pois o tribunal decide se é o caso de estrangular o paciente imediatamente, em vez de deixá-lo morrer, e ao fim de quanto tempo esse gesto de piedade deve intervir. Todos esses diferentes elementos multiplicam as penas e se combinam de acordo com os tribunais e os crimes. capítulo 2 • 41 O suplício penal não corresponde a qualquer punição corporal, haja vista que é uma produção diversificada de sofrimentos, um ritual organizado para a marcação das vítimas e a manifestação do poder que pune. Não é de forma alguma a exasperação de uma justiça que, esquecendo seus princípios, per- desse todo o controle. A economia do poder se investe toda nos “excessos” dos suplícios. Para exemplificar, temos a Execução de Damiens pelo crimede parricídio em 1757, publicada na Gazeta de Amsterdam da época: “... um executor tomou umas tenazes de aço (...) atenazou-lhe primeiro a barriga da perna direita, de- pois a coxa, daí passando às duas partes da barriga do braço direito; em seguida os mamilos... o mesmo carrasco tirou com uma colher de ferro do caldeirão daquela droga fervente e derramou-a fartamente sobre cada ferida...”. ATENÇÃO Execução de Damiens: 1757 42 • capítulo 2 © W IK IM E D IA .O R G 2.5 Iluminismo Originário do período compreendido entre os anos de 1650 e 1700, o iluminismo foi despertado pelos filósofos Baruch Spinoza (1632-1677), John Locke (1632- 1704), Pierre Bayle (1647-1706) e pelo matemático Isaac Newton (1643-1727). O Iluminismo foi um movimento intelectual surgido durante o século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão e ficou conhecido também como Século das Luzes, contra o antigo regime conhecido como a idade das trevas e pregava maior liberdade econômica e política. O iluminismo procurou mobilizar o poder da razão, a fim de reformar a so- ciedade e o conhecimento herdado da tradição medieval. O iluminismo flores- ceu até cerca de 1790-1800, após o qual a ênfase na razão deu lugar à ênfase do romantismo na emoção e um movimento contrailuminista ganhou força. Este movimento promoveu mudanças políticas, econômicas e sociais, baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. O Iluminismo ti- nha o apoio da burguesia, pois os pensadores e os burgueses tinham interes- ses comuns. capítulo 2 • 43 AUTOR Os Pensadores do Movimento Iluminista © W IK IM E D IA .O R G As críticas do movimento ao Antigo Regime eram em vários aspectos como: • Mercantilismo; • Absolutismo monárquico; • Poder da igreja e as verdades reveladas pela fé. Baseado nos três pontos mencionados acima se pode afirmar que o Iluminismo defendia: • A liberdade econômica, ou seja, sem a intervenção do estado na economia; • O Antropocentrismo, ou seja, o avanço da ciência e da razão; • O predomínio da burguesia e seus ideais. 44 • capítulo 2 As Principais Concepções ou Características do Iluminismo são: RACIONALISMO Ênfase na razão esclarecida pelas Luzes do Conhecimento. NATURALISMO Crença na perfeição da natureza. LIBERALISMO Reconhecimento da liberdade como direito natural do homem. Tal liberdade seria nos níveis econômico, polí- tico e intelectual, o que levou os iluministas a condenar o Absolutismo, o Intervencionismo e a intolerância. Não obstante, a liberdade deveria ser limitada pelos valores morais e respeito aos demais. IGUALDADE PERANTE A LEI A lei não poderia privilegiar alguém com base em seu nascimento ou condição social. ANTICLERICALISMO Vários pensadores e filósofos do período eram teístas, acreditavam em um Deus criador, mas eram contra a Igreja, principalmente a Católica , eis que esta apoiava o absolutismo e também se colocava acima da razão. Nos meados do século XVIII, desenvolveu-se um conjunto de críticas àquele sistema punitivo, irracional e cruel, momento em que se clamou pelo humanis- mo e por um necessário limite ao Estado. 2.6 Evolução da Criminologia no Brasil Nas ultimas décadas do século XIX, foi que a criminologia começou a ganhar força no Brasil. O maior recepcionador no país das ideias sobre criminologia expostas pelo médico italiano Cesare Lombroso, foi João Vieira de Araújo. Não obstante, Tobias Barreto, foi o primeiro crítico brasileiro de Cesare Lombroso, posto que, segundo ele, pelos princípios dados por Lombroso, seria preciso recolher ao hospital a humanidade inteira. Os autores Lyra e Araújo Júnior (1990, p. 80), mencionam o que Barreto es- creveu sobre o criminoso: capítulo 2 • 45 “O criminoso é fato natural sujeito a outras leis que não as leis de liberdade e o homem é todo feito à imagem, não de Deus, porém da natureza. Pregou a reforma do homem pelo homem mesmo, acrescentando que “não se corrige o homem, matando-o ou aviltando”. Por sua vez, Silvio Romero estudou os tipos étnicos, os caracteres das cole- tividades, a alma dos grupos, as índoles individuais, moldadas nos vícios am- bientais, e os vincos deixados nos espíritos pela atmosfera social. Ainda, conforme Lyra e Araújo Júnior (1990, p. 84), Romero definia o bem como: “O bem é uma flor do cérebro do próprio homem; a fisiologia é a alma da psicologia; o homem tem afeição do meio que habita pela tirania dos fatos exteriores; há uma espécie de paralisia moral ou intelectual determinada pela ignorância, os criminosos saem das prisões três vezes piores; assim como há ideias com a cor da bílis, existem atos com a cor do sangue; o homem é o que ele come.”. No ano de 1896, Clóvis Beviláqua, publicou a primeira obra sobre crimino- logia, denominada “Criminologia e Direito”, onde ele retratou a criminologia no Estado do Ceará em relação ao tempo e à população, a distribuição geográ- fica dos crimes etc.. Euclides da Cunha foi o primeiro estudioso sobre criminologia a aplicar a Sociologia Criminal no Brasil. Ele ainda comparou a teoria de Lombroso a uma topografia psíquica. No seu livro “Os Sertões” (1902), Cunha examinou as causa da denominada por ele “delinquência sertaneja”, que segundo Lyra e Araújo Júnior (1990, p. 94) eram: “Vastas galerias de indivíduos que são índices ou sumários de um meio [...] como fei- xes de fatos, cada um com seu rótulo, sua rubrica inapagável e eterna [...]. Cada indi- víduo é um resumo, um compêndio. E todos são reais e apanhados em flagrante. São cristalizações humanas obtidas por quatrocentos anos de labutar em meia-cultura.” 46 • capítulo 2 Euclides da Cunha ainda revelou que fatores naturais ou sociais retardam ou interrompem o desenvolvimento mental, criam à loucura do deserto, exci- tam a fraqueza irritável das gentes supersticiosas e incultas predispostas ao de- safogo máximo das paixões. Uma das receptoras da teoria lombrosiana no Brasil foi Nina Rodrigues. Ela foi considerada pelo próprio Lombroso, apostolo da Antropologia Criminal na América do Sul. Criadora da teoria da criminalidade étnica defendia que em uma mesma sociedade, poderiam ser encontradas raças em diferentes fases de evolução, quais sejam moral e jurídica. Acreditava também, que a civilização era boa para os brancos e má para os negros. Nina Rodrigues achava que para o Brasil deveria ser criado quatro tipos de códigos penais, para que desta forma, pudesse atender às diversidades princi- palmente as de clima e raça. Nina, como Lombroso, também costumava estudar crânios, sendo que começou seus estudos por meio de experiências com o “exame do crânio de Lucas”. Afrânio Peixoto foi um crítico assíduo da concepção de Durkhein e Lacassagne, e conforme ensinamentos de Lyra e Araújo Júnior (1990, p. 94) cos- tumava dizer que: “A sociedade tem os criminosos que merece; o meio social é o caldo de cultura da criminalidade; o micróbio é o criminoso que só tem importância quando encontra o caldo que o faz fermentar.” Peixoto defendia ainda, que o código penal deveria ser reescrito de tempos em tempos. Júlio Pires Porto-Carrero , costumava dizer que a Pedagogia destruirá a Penologia. Conforme Lyra e Araújo Júnior (1990, p. 101), costumava dizer que: “Determinar o destino a dar ao criminoso, de um ponto de vista humano, do verdadeiro ponto de vista do interesse social. O homem que delinquiu continua a ser homem, como qualquer de nós, que não estamos livres de um dia também cair nas malhas da lei.” capítulo 2 • 47 Luis Carpenter foi o primeiro estudioso da criminologia a aplicar suas vi- sões criminológicas ao Direito Militar. Ele escreveu os livros “O Velho Direito Penal Militar Clássico e as Ideias Modernas da Sociologia Criminal”, em 1914. Descreveu os denominados crimes propriamente militares, as contraven- ções disciplinares e os chamados crimes impropriamente militares, ou seja, as entidades bifrontes, as híbridas, dacintura para cima crime comum, da cintura para baixo crime militar. Evaristo de Moraes foi presidente da Sociedade Brasileira de Criminologia. Sobre o tema criminologia, escreveu os livros “Crianças Abandonadas e Crianças Criminosas” (1900); “Teoria Lombrosiana do Delinquente” (1902); “Ensaios de Patologia Social” (1921); “Criminalidade da Infância e da Adolescência" (1927); “Criminalidade Passional” (1933) e “Embriaguez e Alcoolismo”. Joaquim Pimenta estudava o alcoolismo como fonte direta da criminalida- de e as lutas das famílias e sua persecução na sociedade sertaneja. ATIVIDADES Ao responder os questionamentos que estão sendo feitos, você estará fixando melhor o conteúdo trabalhado neste capítulo. Boa sorte! 01. Dentre os modelos de reação ao crime destaca-se aquele que procura restabelecer ao máximo possível o status quo ante, ou seja, valoriza a reeducação do infrator, a situação da vítima e o conjunto social afetado pelo delito, impondo sua revigoração com a reparação do dano suportado. Nesse caso, fala-se em: a) modelo dissuasório; b) modelo ressocializador; c) modelo integrador; d) modelo punitivo; e) modelo sociológico. 02. Assinale a afirmação correta: I. O Código de Hamurabi, concebido na Babilônia entre 2.067 a 2.025 AC e na atualidade pertencente ao acervo do Museu do Louvre em Paris, não continha disposições penais em sua composição. II. Segundo a “Lei Térmica da Criminalidade” de Quetelet, fatores físicos, climáticos e geo- gráficos podem influenciar no comportamento criminoso. III. Entende-se por “Cifra Negra” da criminalidade, o conjunto de crimes cuja violência pro- duz elevada repercussão social. 48 • capítulo 2 IV. Seguidor da Antropologia Criminal, Lombroso entendia que havia um tipo humano irre- sistivelmente levado ao crime por sua própria constituição, de um verdadeiro criminoso nato. V. Em sua obra “Dos Delitos e da Penas”, escrita por volta de 1765, Cesare Bonesana, o Marquês de Beccaria, defendeu uma legislação penal rigorosa, aprovando a prática da tortura e da pena de morte. a) Apenas I, III e V estão corretos. b) Apenas II e IV estão corretos. c) Apenas IV e V estão corretos. d) Apenas II e III estão corretos. e) Apenas III, IV e V estão corretos. 03. L’uomo deliquente ou O homem delinquente é uma obra clássica da Criminologia, de autoria de: a) Marquês de Beccaria; b) Césare Lombroso; c) Francesco Carrara; d) Pellegrino Rossi; e) Enrico Pessina. 04. O período antropológico de estudo da criminalidade foi iniciado pelo médico: a) Enrico Ferri; b) Césare Lombroso; c) cesarre Bonesana; d) Emile Dürkheim; e) Hans Von Hentig. 05. Dentre as ideias defendidas pelo Marques de Beccaria, relativamente aos delitos e às penas, a pena deveria: a) ser prontamente imposta para que o castigo pudesse relacionar-se com o crime; b) ser imposta somente após um período de prisão do delinquente para que este pudesse refletir sobre seus atos; c) sempre ser imposta de forma a configurar um confisco de bens do delinquente; d) ser imposta de forma a corresponder a uma ação ofensiva àquela praticada pelo ofensor; e) imposta somente pelo Santo Ofício da Inquisição. LEITURA LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal alemão. Campinas: Russel Editores, 2003. BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral, tomo 1º. Rio de Janeiro: Forense, 1967. VERRI, Pietro. Observações sobre a tortura. Trad. Frederico Carotti. São Paulo: Martins Fontes, 1992. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 2000. RUSCHE, Georg e Kirchheimer, Otto. Punição e estrutura social. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999. capítulo 2 • 49 MULTIMÍDIA • O Nome da Rosa -1986 • Palavra e Utopia - 2008 50 • capítulo 2 • As Bruxas de Salem - 1996 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007. BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. Introdução à sociologia do direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2006. BARROS, Renata Furtado de. Direito Constitucional I. 1º ed. Rio de Janeiro: SESES, 2016. CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Reação Social. Rio de Janeiro: Forense,1983. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: História da Violência nas Prisões. Petrópolis: Vozes, 2006. DELMAS-MARTY, Mireille. Modelos e movimentos de política criminal. 2 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2004. HULSMAN, Louk, BERNAT DE CELIS, Jacqueline. Penas Perdidas: o sistema penal em questão. Rio de Janeiro: Luam, 1993. RUSCHE, Georg e KIRCHHEIMER, Otto. Punição e estrutura social. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999. SHECAIRA, Sergio. Criminologia: Um Estudo das Escolas Sociológicas. São Paulo: Estúdio editores, 2014. As escolas criminológicas 3 52 • capítulo 3 3. As escolas criminológicas © W IK IM E D IA .O R G Todas as legislações sustentam o poder e autoridade do Estado para orientar, controlar e punir os seres humanos, com a finalidade de regular a vida social harmoniosamente. A historicidade da sociedade humana, por conseguinte, tem sua imagem nas regulamentações jurídicas. Desta maneira tendem a se adequar aos projetos político-sociais de cada sociedade, nação ou Estado. O pensamento jurídico-penal, longe da uniformidade, orienta-se por filo- sofias jurídicas chamadas de Escolas Penais. Não é hegemônica, até mesmo a aceitação da denominação de Escola Penal. Não obstante, cabe ressaltar que a denominação se impôs e foi incorporada ao estudo do direito criminal. Alguns autores conceituam a Escola Penal como sendo o elenco de soluções típicas do problema penal, abrangendo-o em todos os seus aspectos principais, quais sejam: o delinquente, a responsabilidade penal, o crime e a pena. Dentre os movimentos que se propuseram encaminhar soluções carac- terísticas aos problemas penais, tentando explicar o crime, a pena, o homem delinquente, sua responsabilidade, temos: a Escola Clássica, a Positiva, a Intermediária (Eclética) e a da Nova Defesa Social. capítulo 3 • 53 As causas do crime sempre foram objeto de estudo para diversos pensado- res. Platão sem dúvida foi um deles e descreveu o crime como uma doença, com causas de natureza tríplice, quais sejam: as paixões (inveja, ciúme, ambição, cólera etc.), a procura do prazer e por último a ignorância. Platão descreveu a pena como um remédio, capaz de curar o delinquente. No entanto, apontou a chamada “pena de morte” como à sanção ideal para os resistentes ou irrecuperáveis ao tratamento penal. Guiado pela mesma linha de raciocínio, Aristóteles descreveu o criminoso como um inimigo da sociedade, que deveria ser castigado. Aristóteles via na política o principal fator determinante do crime, pois ela atribuía grandes desi- gualdades e miséria o que gerava a revolta. Antigamente, por volta do final do século XVIII, as escolas penais lutavam para melhor conceituar sobre o crime e o criminoso. No entanto, foi a partir de estudos científicos que o homem passou a ser o foco dos estudos, principal- mente com a Psicologia e a Sociologia, sendo possível verificar os vários tipos de comportamentos humanos, entre eles o delitivo. Nesta época que começaram a surgir as Escolas Criminológicas, tendo como objeto de estudo o criminoso, essas escolas lutavam para encontrar res- postas sobre a origem do crime, a maneira de combatê-lo e de preveni-lo. As Escolas que eram criadas usaram a interdisciplinariedade, ou seja, com a cooperação de várias disciplinas para realizarem seus estudos. Contudo, ciên- cias como a Biologia, Psicologia, Sociologia, Psiquiatria entre outras, serviram de base de análises criminológicas, sendo fundamental o auxílio de estatísticas e observações, para definir o método de pesquisa para cada período. Foi desta forma, que constatou que o delito em si não poderia ser o principal centro de questionamentos, e que merecia importância o delinquente que gerou a conduta delitiva, para então se concluir que relevanteestudo deve ser-lhe aplicado, impedindo com que ele e outros agentes delitivos de cometerem os mesmo atos. São muitas e controvertidas as concepções que se sustentam sobre o delito e o delinquente. Quatro respostas são paradigmáticas, não obstante hoje já não ensejem o consenso científico necessário: a clássica, a positivista, a correcionalista e a marxista. O apogeu do Iluminismo deu-se na Revolução Francesa, com o pensamento liberal e humanista de seus expoentes, dentre os quais se destacam Voltaire, Montesquieu e Rousseau, que teceram inúmeras críticas à legislação criminal 54 • capítulo 3 que vigorava na Europa em meados do século XVIII, aduzindo a necessidade de individualização da pena, de redução das penas cruéis, de proporcionalidade etc. Merece destaque a teoria penológica proposta por Cesare Beccaria, consi- derado o precursor da “Escola Clássica”. No século XIX surgiram inúmeras correntes de pensamento estruturadas de forma sistemática, segundo determinados princípios fundamentais. Tais cor- rentes, que se convencionou chamar de Escolas Penais, foram definidas como “o corpo orgânico de concepções contrapostas sobre a legitimidade do direito de punir, sobre a natureza do delito e sobre o fim das sanções.”. Dada à relevância do assunto, discorreremos sobre as principais Escolas Penais ou Criminológicas nos subitens seguintes. 3.1 Escola Clássica - século XVIII O mundo clássico partiu de uma imagem sublime e ideal do ser humano, como centro do universo, como dono e senhor absoluto de si mesmo, de seus atos. O dogma da liberdade tornou iguais todos os homens, no esquema clássico, ou seja, entre o homem delinquente e o não delinquente não há diferenças quali- tativas e fundamentou a responsabilidade. Não existiu propriamente uma Escola Clássica, que foi assim denominada pelos positivistas em tom pejorativo. Com a proposta de humanização das ciências penais, as ideias consagra- das pelo Iluminismo acabaram por influenciar a redação do célebre livreto de Cesare Beccaria, intitulado Dos delitos e das penas (1764), outros autores como, Francesco Carrara e Giovanni Carmignani despontam como grandes intelectos dessa corrente, além de Beccaria. Os Clássicos partiram de duas teorias distintas: o jusnaturalismo que decor- ria da natureza eterna e imutável do ser humano, e o contratualismo, em que o Estado surge a partir de um grande pacto entre os homens, no qual estes cedem parcela de sua liberdade e direitos em prol da segurança coletiva. A burguesia em ascensão procurava afastar o arbítrio e a opressão do po- der soberano com a manifestação desses seus representantes através da junção das duas teorias, que, embora distintas, igualavam-se no fundamental, isto é, a existência de um sistema de normas anterior e superior ao Estado, em oposição à tirania e violência reinantes. capítulo 3 • 55 Os princípios fundamentais da Escola Clássica são: a) o crime é um ente jurídico; não é uma ação, mas sim uma infração (Carrara); b) a punibilidade deve ser baseada no livre-arbítrio; c) a pena deve ter nítido caráter de retribuição pela culpa moral do delin- quente (maldade), de modo a prevenir o delito com certeza, rapidez e severida- de e a restaurar a ordem externa social; d) método e raciocínio lógico-dedutivo. A responsabilidade criminal do delinquente, para a Escola Clássica, leva em conta sua responsabilidade moral e se sustenta pelo livre-arbítrio, este inerente ao ser humano. Significa dizer que se parte da premissa de que o homem é um ser livre e ra- cional, capaz de pensar, tomar decisões e agir em consequência disso; ou seja, quando alguém enfrenta a possibilidade de cometer um delito, faz um cálcu- lo racional dos benefícios esperados (prazer) e os confronta com os prejuízos (dor) que acredita vão derivar da prática do delito; se os benefícios são superio- res aos prejuízos, tenderá a cometer a conduta delitiva. Trata-se de um pensamento derivado do utilitarismo, um pouco esquecido hoje em dia, em que se defende a ideia de que as ações humanas devem ser julgadas conforme tragam mais ou menos prazer ao indivíduo e contribuam ou não para maior satisfação do grupo social. IMPORTANTE Escola Clássica Escola Clássica– princípios e expoentes Pena retributiva com base na culpa moral, restauração da ordem social Cesare Beccaria, Francesco Carrar e Giovanni Carmignani Crime como ente jurídico Livre-arbítrio Método lógico-dedutivo 56 • capítulo 3 3.2 Escola positiva - século XIX Em contraposição à escola Clássica, surge a Escola Positiva, influenciada pelos avanços científicos surgidos durante o século XIX, como as teorias de Darwin e Lamarck e pelo pai da sociologia, Auguste Comte. Seus estudos, ao contrário dos clássicos que usavam o método dedutivo, baseavam-se no método empíri- co, ou seja, na análise, observação e indução dos fatos. A Escola Positiva considerava o crime como fato humano e social. A pena de- veria então ter por fim a defesa social e não a tutela jurídica. Os positivistas re- chaçaram totalmente a noção clássica de um homem racional capaz de exercer o livre arbítrio. Os pensadores positivistas sustentavam que o delinquente se revelava automaticamente nas suas ações e que estava impulsionado por forças que ele mesmo não tinha consciência. Para eles, o criminoso era um prisionei- ro, escravo de sua carga hereditária, ou seja, determinismo. Como expoentes de maior vulto desta escola temos: Cesar Lombroso, Enrico Ferri e Raffaele Garófalo. A chamada Escola Positiva deita suas raízes no início do século XIX na Europa, influenciada no campo das ideias pelos princípios desenvolvidos pe- los fisiocrata se iluministas no século anterior. Pode-se afirmar que a Escola Positiva teve três fases: antropológica (Lombroso), sociológica (Ferri) e jurídica (Garófalo). O positivismo criminológico insere o comportamento do indivíduo na dinâ- mica de causas e efeitos que rege o mundo natural ou o mundo social, em uma cadeia de estímulos e respostas: fatores internos determinantes, endógenos, ou seja, biológicos, ou externos e exógenos, isto é, sociais, explicam sua condu- ta de forma inexorável. Para o positivismo criminológico, o infrator é um prisioneiro de sua própria patologia, o determinismo biológico, ou de processos causais alheios a ele, o determinismo social: uma criatura escrava de sua carga hereditária, fechada em si e separada dos outros, que vê o passado e sabe que seu futuro fatalmente está escrito. É importante lembrar que, antes da expressão “italiana” do positivismo (Lombroso, Ferri e Garófalo), já se delineava um cunho científico aos estudos capítulo 3 • 57 criminológicos, com a publicação, em 1827, na França, dos primeiros dados estatísticos sobre a criminalidade. Tal publicação chamou a atenção de importantes pesquisadores, dentre os quais o belga Adolphe Quetelet, que ficou fascinado com a sistematização de dados sobre delitos e delinquentes. Foi justamente em função disso que em 1835, Quetelet publicou a obra Física social, que desenvolveu três preceitos importantes: a) o crime é um fenômeno social; b) os crimes são cometidos ano a ano com intensa precisão; c) há várias condicionantes da prática delitiva, como miséria, analfabetis- mo, clima etc. Formulou ainda a teoria das leis térmicas, por intermédio da qual no inver- no seriam praticados mais crimes contra o patrimônio, no verão seriam mais numerosos os crimes contra a pessoa e na primavera haveria maior quantida- de de crimes contra os costumes, ou seja, crimes sexuais. Portanto, Quetelet tornou-se defensor das estatísticas oficiais de medição de delitos; não obstan- te, guardou certa cautela, na medida em que se apercebeu que uma razoável quantidade de crimes não era detectada ou comunicada aos órgãos estatais, significando cifra negra. Ainda que se considere que o positivismo criminológico tenha raízes nesses estudos estatísticos,
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