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WWW.NINPE.COM.BR http://www.ninpe.com.br/ SUMÁRIO O PAPEL DO EDUCADOR FRENTE À EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS .... 3 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO ...................................................................... 13 O LETRAMENTO CRÍTICO ....................................................................................... 17 A FORMAÇÃO DO CIDADÃO LETRADO ............................................................... 19 LÍNGUA PORTUGUESA ............................................................................................ 25 MATEMÁTICA ........................................................................................................... 30 ESTUDOS DA SOCIEDADE E DA NATUREZA ...................................................... 33 OS SIGNIFICADOS DA ALFABETIZAÇÃO ............................................................ 37 ALFABETIZAÇÃO COMO BUSCA DE EMPREGO ............................................... 37 O ENSINO E A APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ... 40 A AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS .................................................. 43 O PROJETO INTERDISCIPLINAR ............................................................................ 50 UMA NOVA VISÃO DE MUNDO ...................................................................................... 56 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 57 REFERÊNCIAS............................................................................................................ 59 3 O PAPEL DO EDUCADOR FRENTE À EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Com o avanço da legislação educacional brasileira voltada para a Educação de Jovens e Adultos, o papel do educador em relação à EJA possui três dimensões de ensino, sendo elas a dimensão política, a dimensão pedagógica e a dimensão ética. O professor é um educador que contribui para a educação do educando e sendo assim tem que estar pautado em socializar seus conhecimentos, visando uma educação de qualidade para o educando; torna-se educador, no decorrer de sua existência, ensinando o conhecimento ao aprendiz; com isso o educador ganhou uma parte importante de responsabilidade sobre que é ensinar: Na atuação pedagógica deve ser acrescentada a dimensão educativa, que lhe é imputada por força de sua própria definição institucional. O Professor é um educador... e, não querendo sê-lo, torna-se um deseducador. Professor-Instrutor qualquer um pode ser dado que é possível ensinar relativamente com o que se sabe; mas Professor/ Educador nem todos podem ser, uma vez que só se educa o que se é (ROMÃO, 2001, p.61 ). De algum modo todos somos educadores, mas o educador é institucionalizado estabelecendo relações metódicas, formais e sistemáticas com outros educadores sempre procurando orientar e mediar o conhecimento cognitivo: Enquanto o saber sistematizado, com densidade epistemológica, pode ser adquirido em curós, treinamento e capacitações, o ser educador vai se construindo com o saber adquirido na teia das relações historicamente determinadas, que vão construindo as dúvidas, perplexidades, convicções e compromissos. Por isso, não há como fugir de uma análise da inserção do Professor na sociedade concreta, abordando todas as dimensões de seu papel – atribuído ou conquistado. E não se trata de qualquer Professor e de qualquer sociedade; trata-se do Educador de jovens e adultos, na sociedade brasileira, neste final de século (ROMÃO, 2001, p.64 ). 4 Na Dimensão Política, devemos reconhecer que o empenho na Educação Básica é dar um enfoque maior em que o compromisso do educador é a mobilização e organização dos projetos da Educação Básica. Sendo educadores nos gestos, atitudes, palavras de ordens; tornando-se necessário identificar com clareza os aliados e adversários. Em Escolas Públicas, o educador tem sido alvo de movimentos reivindicatórios, onde se reflete o cargo do educador que estuda as formas e estratégias de aula trocando experiências com outros educadores capacitados e, assim, em uma sala de aula tentam mudar o mundo pela educação e resultam em grandes gestos, iniciativas cotidianas, e a persistência. Atualmente, faz-se necessário a superação da concepção autoritária, em que o educador se coloca como único detentor do conhecimento e que tem o papel de repassar todas as informações, todo o conteúdo para o educando; o educador autoritário impõe um jeito impaciente de ensinar à sua atividade e com isso espera que os educandos absorvam os conhecimentos por ele demonstrados. Essa concepção autoritária de ensino implica em uma avaliação de classificar os educandos por quantidade de conhecimento obtido no decorrer das aulas. Com a Dimensão ética, a educação passou a ser um instrumento de desenvolvimento de diferenças econômicas entre os indivíduos nas classes sociais dentro da sociedade, onde muitas vezes o papel do professor resume-se a reproduzir as diferenças colocadas socialmente. Essa é uma profissão difícil que exige segurança, tranquilidade, equilíbrio, competência, compromisso, e acaba sendo pouco reconhecida. A formação do educador vem sofrendo falta de reconhecimento social. Um ponto fundamental é a relação com o educando perseguindo uma qualidade na prática do alfabetizador e sua experiência como leitor e escritor. Educar implica em ser referência para os alunos e a formação inicial não determina a qualidade do alfabetizador, mas contribui para que essa qualidade melhore paulatinamente nos espaços de formação continuada. A construção do conhecimento é uma formação científica que surge com um ponto de reflexão e uma pergunta, base para que seja a prática do educador pesquisador; às vezes responde-se as perguntas e com isso configura-se um educador crítico-reflexivo. A formação é uma pratica de conhecimento e todo conhecimento nasce com uma pergunta. A pergunta é o primeiro passo do conhecimento. As perguntas surgem 5 na ação, em sua grande maioria. Tentar responder as perguntas antes que elas surjam na cabeça do alfabetizador é, no mínimo, pouco racional. No entanto, isto que acontece nas formações que antecedem à ação. Temos, então, o absurdo de responder a perguntas não formuladas e depois, quando elas aparecem, não ter um momento de formação para respondê-las (BARRETO, 2001, p.81 ). Neste sentido, é fundamental o educador participar efetivamente de programas de formação continuada, onde a maioria das dificuldades enfrentadas ocasionam uma certa angústia e o professor não consegue resolvê-las, sentindo a necessidade de uma assessoria pedagógica como uma das melhores formas de interferir na realidade, e assim é aplicada essa teoria em prática e com isso a formação não tem a finalidade de trabalhar discursos e sim a prática com os educadores. A forma de estabelecer o conhecimento teórico é observando a prática. A única forma segura de identificar a teoria que sustenta a pratica do alfabetizador é a observação da pratica do próprio alfabetizador. É nesta pratica que se exprime no que o alfabetizador realmente acredita. Esta observação pode ser feita pela observação direta ou pelos relatos do próprio alfabetizador (BARRETO, 2001, pp.84- 85 ). Os conteúdos administrados devem ser o mais claro e assimiláveis possíveis, lembrando-se que ensinar o educando não é transmitir conhecimento, e sim criar as possibilidades para sua produção ou construção do conhecimento, pois quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Paulo Freire (1987) propõe que seja trabalhada a conscientização como forma de resgatar as pessoas da condição de vida que se encontram, isso implicaria numatransformação total da teoria e prática, que é abordado a necessidade da conscientização com objetivo de libertar os oprimidos da violenta opressão a que estão submetidos conduzindo para um viver generosamente autêntico, crítico. De acordo com Freire (1987) é usada uma concepção apontada por “Educação Bancária”, como instrumento de opressão às classes menos favorecidas, que seriam libertas mediante o fundamental papel da educação. Na Educação Bancária, o educando é visto como indivíduo que não sabe de nada, alguém que recebe conhecimento dos educadores que julgam saber de tudo, onde o educando é aquele que recebe depósitos na mente e os armazena. A narração de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas” em 6 recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo os recipientes com seus “depósitos, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem docilmente “encher” tanto melhores educandos serão (FREIRE, 1987, p.58). A Educação Bancária instiga o desacordo na medicação entre educador- educando, onde o educador é visto como quem educa, que sabe e pensa, impõe a disciplina, opta pelos conteúdos e métodos, mostrando-se que é a autoridade na sala de aula, em que os educandos não sabem nada, só escutam, são disciplinados, não podendo ser ouvidos. Para Freire (1987), essa perspectiva de trabalho docente é identificada como processo de alienação, não tendo criatividade nenhuma na sala de aula, uma vez não criativo não saberá transformar essa relação. Esse silêncio que o educador realiza no educando acaba criando a condição de um sujeito passivo que não participa do processo educativo. O educador, que aliena a ignorância, se mantém em posições fixas, invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão sempre os que não sabem. A rigidez desta posições nega a educação e o conhecimento como processos de busca (FREIRE,1987,p.58). Para superar a Educação Bancária que é a prática que produz o falso saber tornando o educando um sujeito não critico, e poder conseguir trabalhar a educação como prática e tendo liberdade, é sugerido a Educação Problematizadora, onde a realidade é inserida no contexto educativo, sendo valorizado o diálogo, a reflexão e a criatividade, de modo a construir a libertação. Em verdade, não seria possível à educação problematizadora que rompe com os esquemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática da liberdade, sem superar a contradição entre o educador e os educandos. Como também não lhe seria possível fazê-lo fora do dialogo (FREIRE, 1987, p.68). Assim, a realidade da Educação problematizadora é inserida no contexto educativo, sendo valorizado o diálogo, a reflexão e a criatividade, de modo a construir a libertação, buscando trabalhar a teoria dialógica, opondo-se à manipulação das classes menos favorecidas pela cultura mediante os meios de comunicação, no qual devem ser conduzidas ao diálogo. Freire (1987) diz que a teoria da ação dialógica escrita pela organização e síntese cultural é forte arma de combate à manipulação se usada pela liderança revolucionária. O diálogo é necessário na educação como prática da liberdade, estando 7 presente em todos os momentos do processo ensino-aprendizagem, da busca e opção pelos conteúdos, métodos, temas geradores e seus significados até as relações homens- mundo. O diálogo aparece como o grande incentivador da educação mais humana e até revolucionária, o educador antes dono da palavra passa a ouvir, e segundo Freire (1987) “não é no silencio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação- reflexão”, assim foi chamado de mediatização pelo mundo, em relação ao educador- educando. É necessário que no diálogo, e na mediação haja humildade e fé no educando, o diálogo começa na busca do conteúdo programático, ou seja, a listagem de conhecimentos que o aluno tomará contato em determinado ano, série, escola. Para o educador, o conteúdo não é uma doação ou uma imposição, mas a devolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo daqueles elementos que esta lhe entregou de forma desestruturada. Para a escolha do conteúdo programático é proposto que seja construído a partir de temas geradores, e o conteúdo para o educando passa a ser investigado e destacado para tornar o trabalho em equipe de forma interdisciplinar. Na alfabetização (de adultos), o destaque é feito por meio de palavras geradoras, já que o objetivo é o letramento, porém de forma crítica e conscientizadora. É mostrada a teoria da ação dialógica sendo apoiada pela colaboração, organização e síntese cultural, tendo como compromisso a libertação das pessoas oprimidas que são vistas em um sentido, onde muitas vezes a vida é proibida de ser vivida. Isto devido às condições precárias em que vivem, convivendo com injustiças, misérias e enfermidades, onde é obrigada a manter a condição de opressão. Impõe-se, pelo contrario, a dialogicidade entre a liderança revolucionária e as massas oprimidas, para que, em todo o processo de busca de sua libertação, reconheça na revolução o caminho da superação verdadeira da contradição em que se encontram, como um dos pólos da situação concreta de opressão. Vale dizer que devem se engajar no processo com a consciência cada vez mais crítica de seu papel de sujeitos da transformação (FREIRE, 1987, pp. 123-124). Nos dia de hoje, a idade jovem e adulta veio ser reconhecida e é constituída e 8 exigidos saberes, habilidades, socializações, informações, conhecimentos, valores, que são próprios dessas idades, independentemente dos anos de escolarização tidos na infância, saberes que são construídos no conjunto de relações e experiências e que são exigidos para lidar com o trabalho, e a sua cultura, tornando-se importante que a educação oferecida aos alunos jovens e adultos seja dotada de estatuto teórico- metodológico próprio. Os educandos e educadores vão se transformando em sujeitos reais da construção e reconstrução em relação da qualidade na aprendizagem, e no saber onde não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino, cabe ao professor continuar pesquisando para melhor atualização de conhecimentos. A pesquisa se faz importante também, pois nela se cria o estímulo e o respeito à capacidade criadora do educando. Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade (FREIRE, 1996, p.29). A escola e os educadores precisam respeitar o educando podendo, assim, trabalhar seu conhecimento empírico, sua experiência anterior e aconselha-se a discussão sobre os problemas sociais que as comunidades carentes enfrentam e a desigualdade que as cercam. As teorias e as novas descobertas realizadas precisam ser debatidas e aceitas mesmo que parcialmente, porém é importante que se preserve de alguma forma, o conhecimento obtido anteriormente e as formas tradicionais de educação. Qualquer forma de discriminação seja ela: racial, política, religiosa, de classe social é imoral e lutar contra ela é um dever por mais que se reconheça a força dos condicionamentos a enfrentar, sendo uma ação de reprovação, pois a discriminação nega radicalmente a democracia e fere a dignidade do ser humano. O educador representa muito na vida do educando, onde um gesto mal interpretado pode ser fatal, e o que pode ser considerado um gesto insignificante pode valer como força formadora para o desenvolvimento intelectual e acadêmico do educando. Às vezes, mal se imagina o que podepassar a representar na vida de um aluno um simples gesto do professor. O que pode um gesto aparentemente insignificante valer como força formadora ou como contribuição à do educando por si mesmo 9 (FREIRE, 1996, P.42). Portanto, ensinar exige bom senso, observando como os educadores estão agindo ao cobrar os conteúdos das suas disciplinas, o exercício ou a educação do bom senso vai superando o que há nele de tendência natural na avaliação que é feita. O educador que pensa certo deixa manifestar aos educandos que a beleza de se estar no mundo é a capacidade de perceber que ao intrometer-se no mundo ele conhecerá e transformará o mundo. O educador que desacata a curiosidade do seu educando, a sua linguagem, a sua ortografia, que ironiza o aluno, que o minimiza entre outras ofensas em defesa da ordem em sala de aula, transgride os princípios fundamentais éticos de nossa existência e esta transgressão jamais poderá ser vista ou entendida como virtude, mas como abertura com a dignidade. Se há uma pratica exemplar como negação da experiência formadora é a que dificulta ou inibe a curiosidade do educando e, em consequência, a do educador. É que o educador que, entregue a procedimentos autoritários ou paternalista que impedem ou dificultam o exercício da curiosidade do educando, termina por igualmente tolher sua própria curiosidade. Nenhuma curiosidade se sustenta eticamente no exercício da negação da outra curiosidade (FREIRE, 1996, p.85). Com isso, o educando deve ser civilizado e determinado a lutar pelos direitos dos professores, apoiando sua luta por salários mais justos e respeito por sua profissão. O responsável da classe deve priorizar o empenho da formação permanente dos quadros do magistério como tarefa altamente política e repensar a prática das greves, inventando uma nova maneira de lutar que seja mais eficaz. A maioria dos educadores luta pela dignidade de sua função, não sendo somente importante como pode ser interpretada como uma prática ética. Quanto às comunidades carentes, a mudança é difícil, mas é possível, baseando-se neste saber fundamental, é que a ação político-pedagógica poderá ser programada com esperança, respeito e conscientização, não impondo a população expulsada e sofrida que se revolte, que se mobilize ou se organize para se defender. Mas sim trata de mostrar aos demais grupos populares um desafio para que percebam a violência e a profunda injustiça que caracterizam sua situação, desta forma a educação se faz presente como interferir no mundo. Consiste em uma exclusividade humana, em que o ato de educar exige segurança, competência profissional, comprometimento e generosidade. O educador 10 que não leva a sério sua formação, não quer aprofundar e melhorar o seu conhecimento; não tem força moral para coordenar as atividades de sua classe. Existem educadores preparados com seu conhecimento atualizado, mais a maioria deles são autoritários e arrogantes em relação ao educando, onde a incapacidade profissional e o despreparo comprometem a autoridade do educador. [...] nenhuma autoridade docente se exerce ausente desta competência. O professor não que não leve a serio sua formação, que não estude, que não se esforce para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar as atividades de sua classe. Isto não significa, porém, que a opção e a pratica democrática do professor ou da professora sejam determinadas por sua competência científica. Há professores e professoras cientificamente preparados mas autoritários a toda prova. O que quero dizer é que a incompetência profissional desqualifica a autoridade do professor (FREIRE, 1996, pp. 91-92). Seguindo esta linha de raciocínio é importante que o educador tenha autoridade, mas não seja autoritário: A autoridade coerentemente democrática, fundando-se na certeza da importância, quer da liberdade dos educandos para a construção de um clima de real disciplina, jamais minimiza a liberdade. Pelo contrario, aposta nela. Empenha-se em desafiá-la sempre e sempre; jamais vê, na rebeldia da liberdade, um sinal de deterioração da ordem (FREIRE, 1996, p.93). Educar não é transferir conhecimento e sim criar possibilidades para sua produção ou sua construção, não existe educador sem educando em uma sala de aula esperando para ter o conhecimento desejado, no entanto o educando é a única razão para o educador estar ali, o educador não pode deixar escapar nenhum detalhe de seu educando devendo sempre despertar e instigar a curiosidade e capacidade critica, exigindo pesquisa para conhecer e o que ainda não conhece comunicar a novidade. Para instruir os educandos é necessário respeito, criatividade, deixar de ser ingênuo passando a ser um indivíduo crítico no sentido de ser curioso em relação à aprendizagem dos educandos. Ensinar é dar vida as palavras, onde o educador que não consegue expressar aquilo que pensa com exemplos práticos de nada serve o que ele fala. Saber, quer dizer segurança no que diz. Segundo Paulo Freire (1996), o professor deverá ensinar a pensar certo, sendo a prática educativa a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo e a utilização de um critério para alargar o ensino antigo, estando presente a rejeição a qualquer tipo de 11 descriminação. Ainda destaca a importância de propiciar condições aos educando, em suas socializações com os outros e com o professor, de testar a experiência de assumir- se como um ser histórico e social. Acredita-se que a educação é uma forma de transformação da realidade, que não é neutra e nem indiferente, mas que tanto pode destruir a ideologia dominante como mantê-la. Segundo Paulo Freire (1996), os educadores têm a precisão de criar condições para a construção do conhecimento para os educandos como parte de um processo em que o educador e o educando não se reduzam à condição de objeto um do outro, porque ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. Os educandos e os educadores precisam ser acatados em sua autonomia, portanto a autoavaliação é um excelente recurso para ser utilizado dentro da prática pedagógica, necessitando de estímulos que despertem a curiosidade e, em decorrência disso, a busca para chegar ao conhecimento. O educador não deve barrar a curiosidade do educando, pois é de fundamental relevância à sua imaginação, intuição, senso investigativo, enfim, sua capacidade de ir além, e instigar a ser um indivíduo curioso. Paulo Freire (1996) protege a conquista de conhecimento e afetividade por parte do educador para que tenha liberdade, autoridade e competência no decorrer de sua prática docente, acreditando que a disciplina verdadeira não está na quietude do indivíduo presente e sim naquele que é um ser crítico. A autoridade e liberdade do educador deve ser exercida de forma que a liberdade deve ser vivida em sua totalidade com a autoridade em uma relação lógica, centrada em experiências estimuladoras de decisão e responsabilidade. Noutro momento deste texto me referi ao fato de não termos ainda resolvido o problema de tensão entre a autoridade e a liberdade. Inclinados a superar tradição autoritária, tão presente entre nos resvalamos para formas licenciosas de comportamento e descobrimos autoritarismo onde só houve o exercício da autoridade (FREIRE, 1996, p.104). Na maioria das vezes, o educador tem que saber escutar o educando, pois é somente escutando, crítica e pacientemente, que se é capaz de falar. O educador como um ser histórico, político, pensante, crítico e emotivo deve procurar mostrar o que pensa, indicando diferentes caminhos sem conclusões acabadas e prontas, para que o educando construa assim a sua autonomia. Escutar é obviamente algo que vai mais além das possibilidades auditiva de 12 cada um. Escutar, no sentido aqui discutido, significaa disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro. Isto não quer dizer, evidentemente, que escutar exija de quem realmente escuta sua redução ao outro que fala (FREIRE, 1996. p.119). Para Freire (1996), ensinar exige querer bem aos educandos, expressando a afetividade. A atividade docente é uma atividade também de caráter afetivo, porém de uma formação científica séria, juntamente com o esclarecimento político dos educadores. O JOVEM E O ADULTO NA SOCIEDADE LETRADA: QUESTÕES CURRICULARES EM FOCO Em sociedades industrializadas modernas, o uso da leitura e da escrita, assim como das diversas tecnologias, é cada vez mais exigido nas práticas sociais. Dessa forma, é importante que as pessoas saibam escrever, que compreendam as notícias dos jornais, que defendam seus direitos de consumidor, dentre outras atividades necessárias no cotidiano de um cidadão. Jovens e adultos que não sabem ler e escrever convivem em uma sociedade letrada, porém, sua participação nela é, muitas vezes, restrita. Vários são excluídos e se tornam alvo de fácil manipulação, pois seus conhecimentos são considerados inferiores em relação aos apresentados por pessoas escolarizadas. Assim, nessa unidade refletimos sobre o jovem e o adulto na sociedade letrada, iniciando por uma discussão sobre a dicotomia alfabetização e letramento, seguindo por definições e características do letramento crítico, por considerações sobre o cidadão letrado e por uma reflexão a respeito do educador de jovens e adultos. Para finalizar, incluímos, como leitura complementar, a reportagem “Histórias de jovens adultos”, publicada na Revista Nova Escola on-line, em 22/02/2008. A unidade tem como referências, diferentes obras e artigos científicos de pesquisadores como Leda Verdiani Tfouni, Magda Soares, Sylvia Bueno Terzi, Jaqueline Moll, Ângela Kleiman e Luiz Paulo da Moita Lopes. 13 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO De acordo com Tfouni (1995), nem sempre os termos escrita, alfabetização e letramento têm sido enfocados, pelos estudiosos, como um conjunto, já que muitos consideram a escrita como um produto cultural e a alfabetização e o letramento como processos de aquisição de um sistema escrito. Para a autora, a escrita “é o produto cultural por excelência” (Tfouni, 1995, p.10) e pode ser vista como uma das principais causas do surgimento das civilizações modernas, associando-se ao desenvolvimento científico, tecnológico, cultural, cognitivo e social dos povos. Além disso, ela se relaciona com os jogos de poder e dominação que estão por trás da utilização de um código escrito. Quanto à alfabetização, a autora aponta para duas concepções existentes. A primeira é vista como um processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a leitura e a escrita, considerada como algo que se chega a um fim, correspondendo a um modelo linear de desenvolvimento, em que se aprende a usar e decodificar símbolos gráficos que representam os sons da fala, partindo de um ponto e chegando a outro. A segunda concepção é vista como um processo de representação de objetos de diferentes naturezas, caracterizando-se pela incompletude, pois passa por variáveis, desde a questão da escolarização, até a consideração de que esse não é um processo linear, já que segue um percurso determinado pelas buscas sociais, nas quais os indivíduos se engajam. Dessa forma, conforme Tfouni (1995, p. 15), a partir de uma visão sociointeracionista, “a alfabetização, enquanto processo individual, não se completa nunca, visto que a sociedade está em contínuo processo de mudança, e a atualização individual para acompanhar essas mudanças é constante”. Por isso, a autora prefere falar em níveis de alfabetização. Quanto ao termo letramento, podemos dizer que é um vocábulo novo nas áreas da Educação, da Linguística e da Linguística Aplicada, o que causa certa polêmica 14 quanto à sua definição. De acordo com Soares (2004), o termo letramento surgiu na década de 80, simultaneamente, no Brasil, na França (illettrisme), em Portugal (literacia), nos Estados Unidos e na Inglaterra (literacy). Dessa forma, várias pesquisas surgiram em torno do tema que se operacionalizou em vários programas de avaliação do nível de competências de leitura e escrita. Na mesma época, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) sugeriu que as avaliações internacionais sobre domínio de competências de leitura e de escrita fossem além do medir apenas a capacidade de saber ler e escrever. Assim, nos países desenvolvidos: As práticas sociais de leitura e de escrita assumem a natureza de problema relevante no contexto da constatação de que a população, embora alfabetizada, não dominava as habilidades de leitura e de escrita necessárias para uma participação efetiva e competente nas práticas sociais e profissionais que envolvem a língua escrita (SOARES, 2004, p. 6). Na França, por exemplo, conforme a autora, o letramento surge para caracterizar jovens e adultos que possuem um domínio precário das competências de leitura e de escrita, dificultando sua inserção no mundo social e no mundo do trabalho. Já, no Brasil, o movimento se deu em outra direção, mantendo sua especificidade no contexto das discussões sobre problemas de domínio, de habilidades de uso da leitura e da escrita. Assim, em nosso país, os conceitos de alfabetização e letramento acabaram se mesclando e, frequentemente, sendo confundidos. Para Kleiman (1995, p. 19), letramento é definido como “conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”. A partir desse conceito, podemos dizer que as práticas de letramento mudam conforme mudam o contexto em que estão inseridas e, por conseguinte, podemos dizer também que as orientações de letramento são específicas em cada uma de suas agências, quais sejam: escola, família, igreja, local de trabalho, dentre outras. Kleiman (1995, p.20) afirma que a escola, principal agência do letramento, “preocupa-se, não com o letramento, prática social, mas apenas com um tipo de prática de letramento, a alfabetização [...]”. Segundo a autora, a escola privilegia a aquisição do código escrito, em detrimento ao desenvolvimento de habilidades para usar a leitura e a escrita em diversos contextos socioculturais e possibilitar, ao aluno, o desenvolvimento da competência para se inserir nas diversas práticas de letramento, de 15 forma autônoma. Assim, segundo Tfouni (1995), o letramento pode ser entendido em caráter de produto, como: a) Aquisição da leitura e da escrita como código (alfabetização tradicional). b) A relação entre leitura e escrita e o desenvolvimento da sociedade e dos recursos tecnológicos. c) O aprendizado, como produto de atividades mentais do indivíduo. Tais perspectivas estão centradas apenas nas habilidades de leitura e escrita, entretanto, para esta autora, letramento é algo muito mais amplo e complexo, pois seu processo envolve uma natureza sócio-histórica. Magda Soares (1998) também considera o letramento como prática social de interação oral, em que a língua é vista como interação entre os interlocutores, os quais vão se construindo enquanto indivíduos ao longo de suas trocas linguísticas. Moita-Lopes (2004) postula que o letramento tem sido considerado apenas como habilidades de decodificação ou de cognição, sem considerar o sujeito letrado e as práticas sociais em que ele está envolvido. Logo, para o autor, o termo é entendido como práticas discursivas, ou seja, modos de usar a linguagem e fazer sentido, tanto na fala, como na escrita. Para ele, essas práticas discursivas estão diretamente ligadas à constituição da identidade das pessoas,assim, mudar de prática discursiva significa mudar de identidade. Percebemos, portanto, que Soares e Moita-Lopes vêm ao encontro de Tfouni (1995, pp. 2021), ao dizerem que o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade. Segundo a autora, estudiosos do letramento buscam responder as seguintes questões: - Quais mudanças sociais e discursivas ocorrem em uma sociedade quando ela se torna letrada? - Grupos sociais não-alfabetizados que vivem em uma sociedade letrada podem ser caracterizados do mesmo modo que aqueles que vivem em sociedades “iletradas”? - Como estudar e caracterizar grupos não-alfabetizados cujo conhecimento, modos de produção e cultura estão perpassados pelos valores de uma sociedade letrada? Dessa forma, a autora demonstra que os estudos do letramento não se 16 restringem às pessoas que adquiriram a escrita (alfabetizados), mas investigam as consequências da ausência da escrita em indivíduos ou comunidades perpassados pelos valores das sociedades letradas. Assim, Tfouni considera que há graus de letramento e argumenta que os termos “iletrado” e “letrado” não podem ser usados como antônimos, pois, em sua concepção, nas sociedades modernas, o “iletramento”, ou “letramento de grau zero” não existe, já que elas são perpassadas pela escrita. Letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto onde a escrita e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno. Magda Becker Soares, professora titular da Faculdade de Educação da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e doutora em educação, explica que ao olharmos historicamente para as últimas décadas, poderemos observar que o termo alfabetização, sempre entendido de uma forma restrita como aprendizagem do sistema da escrita, foi ampliado. Já não basta aprender a ler e escrever, é necessário mais que isso para ir além da alfabetização funcional (denominação dada às pessoas que foram alfabetizadas, mas não sabem fazer uso da leitura e da escrita). O sentido ampliado da alfabetização, o letramento, de acordo com Magda, designa práticas de leitura e escrita. A entrada da pessoa no mundo da escrita se dá pela aprendizagem de toda a complexa tecnologia envolvida no aprendizado do ato de ler e escrever. Além disso, o aluno precisa saber fazer uso e envolver-se nas atividades de leitura e escrita. Ou seja, para entrar nesse universo do letramento, ele precisa apropriar-se do hábito de buscar um jornal para ler, de frequentar revistarias, livrarias, e com esse convívio efetivo com a leitura, apropriar-se do sistema de escrita. Afinal, a professora defende que, para a adaptação adequada ao ato de ler e escrever, “é preciso compreender, inserir-se, avaliar, apreciar a escrita e a leitura”. O letramento compreende tanto a apropriação das técnicas para a alfabetização quanto esse aspecto de convívio e hábito de utilização da leitura e da escrita. Uma observação interessante apontada pela educadora Magda Soares diz respeito à possibilidade de uma pessoa ser alfabetizada e não ser letrada e vice-versa. “No Brasil as pessoas não leem. São indivíduos que sabem ler e escrever, mas não praticam essa habilidade e alguns não sabem sequer preencher um requerimento.” Este é um exemplo de pessoas que são alfabetizadas e não são letradas. Há aqueles que sabem como deveria ser aplicada a escrita, porém não são alfabetizados. Como no filme Central do Brasil – alguns personagens conheciam a carta, mas não 17 podiam escrevê-la por serem analfabetos. Eles ditavam a carta dentro do gênero, mesmo sem saber escrever. A personagem principal, a Dora (interpretada pela atriz Fernanda Montenegro), era um instrumento para essas pessoas letradas, mas não alfabetizadas, usarem a leitura e a escrita. No universo infantil, há outro bom exemplo: a criança, sem ser alfabetizada, finge que lê um livro. Se ela vive em um ambiente literário, vai com o dedo na linha, e faz as entonações de narração da leitura, até com estilo. Ela é apropriada de funções e do uso da língua escrita. Essas são pessoas letradas sem ser alfabetizadas. O LETRAMENTO CRÍTICO Terzi (2003, p. 228) define como letramento crítico “a relação que indivíduos e comunidades estabelecem com a língua escrita. Essa relação inclui: relação de uso cultural da escrita; relação de conhecimento da escrita; relação de valorização da escrita, e relação com a escrita permeada por crenças e valores”, conforme comentamos a seguir. Na relação de uso cultural da escrita, a autora aponta para o fato de que algumas comunidades utilizam-se mais da língua escrita que outras, devido a fatores econômicos, políticos, socioculturais e históricos. Assim, Terzi cita como exemplo a diferença dessa utilização em grandes e pequenos centros. Nas grandes cidades, o apoio na língua escrita é uma questão de sobrevivência, na identificação de um ônibus para se locomover, na identificação dos nomes das ruas, na procura por um emprego, a partir de ofertas afixadas em cartazes etc., já nas cidades pequenas, essa necessidade é bem menor. Porém, a relação do sujeito com a escrita não ocorre apenas pelo seu uso. As pesquisas mostram que há uma grande diversidade no conhecimento que cada um traz da escrita. Logo, conforme a autora, os jovens e os adultos não escolarizados já trazem um conhecimento da escrita, a partir de sua vivência. Para Terzi (2003, p. 230): Mesmo aqueles que nunca tiveram oportunidade de ter nas mãos um jornal sabem que ele traz notícias. No outro extremo, temos o jardineiro analfabeto que diariamente leva, da casa em que trabalha, o jornal para que sua esposa o leia para ele (...) e surpreende 18 ao participar de discussões sobre o conflito no oriente médio, sobre o terrorismo nos Estados Unidos ou sobre as eleições no Brasil. Segundo Terzi (2003), o letramento crítico do sujeito também se constitui pela maneira como cada indivíduo valoriza a escrita, sabendo ou não utilizá-la. Entre os indivíduos escolarizados, a autora cita como exemplo pessoas com nível superior de educação que não leem jornais, livros, manuais de instrução antes de utilizar um aparelho etc., usando a escrita somente nas ocasiões em que ela se faz muito necessária. Entre as pessoas não escolarizadas, também há diferença de valorização da escrita: para algumas, ela pode ser importante apenas para a assinatura de um documento, para outras, pode significar maiores oportunidades de emprego, ou realização pessoal a partir do acesso à informação. O letramento crítico também abrange a relação com a escrita permeada por crenças e valores do indivíduo ou da comunidade em que ele vive, como por exemplo, uma comunidade em que palavra dada e honra não se distinguem. Conforme a autora, Os membros dessa comunidade, embora tendo conhecimento de que um texto escrito – a escritura – é parte integrante da prática social de compra e venda de um pedaço de terra, e de que sem ele a transação não se oficializa, rejeitam o documento por acreditarem que a palavra empenhada por ocasião da realização do negócio vale mais (TERZI, 2003, pp. 232-233). Essas relações com a escrita se concretizam simultaneamente, caracterizando o letramento das pessoas. Por isso, podemos dizer que há diversos letramentos. De acordo com a autora, as situações de letramento são dinâmicas, pois se transformam constantemente, a partir de influências de fatores sociais, econômicos e políticos, como já citamos anteriormente. A autora apresenta alguns exemplos, dentre eles a implantação de um assentamento de sem terras em que a liderança passou a exigir a leitura de textos sobre agricultura, ecologia e outros, o que desencadeou na abertura de cursos de educação de jovens e adultos. Logo, esses cursos propiciaram a leitura de textos politizantes, o que contribuiu para uma transformaçãonas técnicas de plantio e a consequente melhora na produtividade. Dessa forma, temos, segundo Terzi (2003, p. 233), “uma decisão política influenciando o letramento e este, por sua vez, influenciando as condições políticas e econômicas”. Assim, Terzi (2003) nos mostra que a alfabetização não se encerra no desenvolvimento de uma habilidade individual que tem um fim em si mesma. Pelo 19 contrário, ela é um componente do letramento crítico, que, num mesmo processo, contribui para a formação do cidadão letrado, ou seja, capaz de fazer uso da língua escrita para a sua participação na sociedade. A educadora Magda Soares argumenta que a criança precisa ser alfabetizada convivendo com material escrito de qualidade. “Assim, ela se alfabetiza sendo, ao mesmo tempo, letrada. É possível alfabetizar letrando por meio da prática da leitura e escrita.” Para isso, Magda diz ser preciso usar jornal, revista, livro. Sobre as antigas cartilhas que ensinavam o ‘Vovô viu a uva’, a educadora afirma que é necessária a prática social da leitura que pode ser feita, por exemplo, com o jornal, que é um portador real de texto, que circula informações, ou com a revista ou, até mesmo, com o livro infantil. “Tem que haver uma especificidade, aprendizagem sistemática sequencial, de aprender”. A professora Magda Soares afirma que o PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), desenvolvido pelo MEC (Ministério da Educação), é excelente porque “avalia o livro didático segundo critérios sensatos”. Mas ela enfatiza que na alfabetização e letramento há um problema a ser resolvido. “As cartilhas desapareceram do mercado. Não se fala mais em cartilha, fala-se em livro de alfabetização. Mas com o desaparecimento das cartilhas, praticamente desapareceu também o conceito de método. Não é possível ensinar a ler e escrever, ou qualquer coisa em educação, sem um método. Há poucos livros de alfabetização que tenham uma organização metodológica para orientar professores e crianças envolvidos neste processo de aprendizagem. “Os professores usam precariamente os livros de que dispõem ou buscam as cartilhas nas prateleiras da biblioteca da escola”. A FORMAÇÃO DO CIDADÃO LETRADO Moll (2004a, p. 11) fala em “adultos em processo de alfabetização”, referindo-se, no contexto social brasileiro, “a homens e mulheres marcados por experiências de infância na qual não puderam permanecer na escola pela necessidade de trabalhar”. A 20 autora também se refere a adultos que, por vezes, tentaram voltar à escola, mas que “a assistematicidade dos programas de alfabetização e de educação para adultos no Brasil tornou-os reféns de uma lógica que, durante décadas, fez dessa temática um discurso político rentável e desconectado de compromissos reais”. Dessa maneira, muitos desses cidadãos acabam encontrando formas para driblar as situações que precisam enfrentar em seu dia a dia, como, por exemplo: “Que ônibus é este? Esqueci meu óculos em casa!” “Podes me dizer o preço deste produto? Não consigo compreender esta letra!” “Podes escrever este bilhete para mim? Minha letra é muito ruim!” “Podes ler esta carta para mim? Hoje acordei com muita dor de cabeça!” Conforme a autora, por encararem o analfabetismo como um problema social, muitas dessas pessoas constroem estratégias sociais e cognitivas para conseguirem decodificar o que lhe é básico, a fim de que os outros não percebam sua não escolarização. A volta ao ambiente escolar é o primeiro desafio do trabalho com esses cidadãos. Segundo Moll (2004a), muitos adultos retornam para a escola com uma visão daquela que permaneceu em suas memórias, seja na época da palmatória, dos castigos no grão de milho, do absolutismo do professor, dos cadernos cheios de cópias etc. Dessa forma, vários esperam esse tipo de instituição. Um exemplo, mostrado pela autora, se dá em salas de aula em que os professores valorizavam a palavra dos alunos, escutando-os e estes, por sua vez, perguntam quando terminará a conversa para poderem copiar e “encher o caderno”. Logo, o educador precisará levar em conta essas memórias trazidas por esses alunos, mas, aos poucos, “desconstruir” essa concepção de escola neles arraigada. Contudo, a autora alerta para o fato de que ressignificar essa bagagem não significa diminuir as exigências da produção escrita e da leitura, ou seja, não significa mudar “de uma escola na qual só se copiava para uma escola na qual só se conversa” (MOLL, 2004a, p. 14). Nesse contexto de formação do cidadão letrado, Ribeiro (1997, pp. 47-48) sintetiza os objetivos gerais da EJA, dizendo que, a partir dela, os educandos devem ser capazes de: • Dominar instrumentos básicos da cultura letrada, que lhes permitam melhor compreender e atuar no mundo em que vivem. 21 • Ter acesso a outros graus ou modalidades de ensino básico e profissionalizante, assim como a outras oportunidades de desenvolvimento cultural. • Incorporar-se ao mundo do trabalho com melhores condições de desempenho e participação na distribuição da riqueza produzida. • Valorizar a democracia, desenvolvendo atitudes participativas, conhecer direitos e deveres da cidadania. • Desempenhar de modo consciente e responsável seu papel no cuidado e na educação das crianças, no âmbito da família e da comunidade. • Conhecer e valorizar a diversidade cultural brasileira, respeitar diferenças de gênero, geração, raça e credo, fomentando atitudes de não-discriminação. • Aumentar a auto-estima, fortalecer a confiança na sua capacidade de aprendizagem, valorizar a educação como meio de desenvolvimento pessoal e social. • Reconhecer e valorizar os conhecimentos científicos e históricos, assim como a produção literária e artística como patrimônios culturais da humanidade. • Exercitar sua autonomia pessoal com responsabilidade, aperfeiçoando a convivência em diferentes espaços sociais. Um dos graves problemas que enfrentamos é que há pessoas que se preocupam com alfabetização sem se preocupar com o contexto social em que os alunos estão inseridos. “De que adianta alfabetizar se os alunos não têm dinheiro para comprar um livro ou uma revista?” A escola, além de alfabetizar, precisa dar as condições necessárias para o letramento. A educadora Magda Soares faz uma crítica ao Programa Brasil Alfabetizado, do Ministério da Educação que prevê a alfabetização de 20 milhões de brasileiros em quatro anos. Para ela, o programa irá, na melhor das circunstâncias, minimamente alfabetizar as pessoas num sentido restrito. “Onde elas aprendem o código, a mecânica, mas depois não saberão usar”. Um ponto importante para letrar, diz Magda, é saber que há distinção entre alfabetização e letramento, entre aprender o código e ter a habilidade de usá-lo. Ao mesmo tempo em que é fundamental entender que eles são indissociáveis e têm as suas especificidades, sem hierarquias ou cronologia: pode-se letrar antes de alfabetizar ou o contrário. Para ela, essa compreensão é o grande problema das salas de aula e explica o fracasso do sistema de alfabetização na progressão continuada. “As crianças chegam ao segundo ciclo sem saber ler e escrever. Nós perdemos a especificidade do 22 processo”, diz. A educadora argumenta que o educando precisa ser alfabetizado convivendo com material escrito de qualidade. Para os professores que trabalham com alfabetização, Magda recomenda: Alfabetize letrando sem descuidar da especificidade do processo de alfabetização, especificidade é ensinar e o aluno aprender. O aluno precisa entender a tecnologia da alfabetização. Há convenções que precisam ser ensinadas e aprendidas, trata-se de um sistema de convenções com bastante complexidade. O estudante (além de decodificar letras e palavras) precisa aprender toda uma tecnologia muito complicada: como segurar o lápis, escrever de cima pra baixo e da esquerda para adireita; escrever numa linha horizontal, sem subir ou descer. São convenções que precisam ser ensinadas pelo professor e aprendidas pelos alunos. A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS FRENTE AOS DESAFIOS CURRICULARES Existem muitas preocupações com relação à formação docente na esfera da EJA, pois muitos professores que nela atuam não foram preparados especificamente para o trabalho com esse público de alunado. Normalmente, encontramos professores recrutados no próprio corpo docente do ensino regular que, por vezes, recebem treinamentos e cursos rápidos para atenderem às demandas da EJA. Isso nos mostra certo descaso com relação a este segmento educacional, o que, de acordo com Moll (2004b), pode estar, aos poucos, começando a ser revertido pela ação local dos municípios e seus parceiros: O papel fundamental que o poder local pode desempenhar nesse processo, avançando em relações que permitam a ampliação da esfera pública, sem levar ao descomprometimento governamental, pode estar relacionado à leitura do universo dos sujeitos da educação de jovens e adultos, para além de sua designação como dados estatísticos anônimos (MOLL, 2004b, p. 22). Diversas pesquisas demonstram que, para se desenvolver um ensino adequado a esse público é necessário que haja um trabalho de formação continuada, porém, é na formação inicial, nos cursos de graduação, que esse ensino se consolida. 23 Esse profissional que atua na EJA, além de muito bem preparado, precisa atentar-se para questões curriculares que vão determinar os conhecimentos, os conteúdos, objetivos e metas que serão necessários ser perseguidos na organização do trabalho pedagógico nesta Modalidade de Ensino. De acordo com as recomendações internacionais (Conferência Internacional de Educação de Adultos – Confintea), a educação de jovens e adultos deve ter como princípios: • Sua inserção num modelo educacional inovador e de qualidade, orientado para a formação de cidadãos democráticos, sujeitos de sua ação, valendo-se de educadores que tenham formação permanente como respaldo da qualidade de sua atuação. • Currículo variado, que respeite a diversidade de etnias, de manifestações regionais e da cultura popular, cujo conhecimento seja concebido como uma construção social fundada na interação entre a teoria e a prática e o processo de ensino e aprendizagem como uma relação de ampliação de saberes. • A educação de jovens e adultos deve abordar conteúdos básicos, disponibilizando os bens socioculturais acumulados pela humanidade. • As modernas tecnologias de comunicação existentes devem ser colocadas à disposição da melhoria da atuação dos educadores. • A articulação da educação de jovens e adultos à formação profissional, no atual estágio de desenvolvimento da globalização da economia, marcada por paradigma de organização do trabalho, não pode ser vista de forma instrumental, mas exige um modelo educacional voltado para a formação do cidadão e do ser humano em todas as suas dimensões. • O respeito aos conhecimentos construídos pelos jovens e adultos em sua vida cotidiana. Para atingir esses princípios é importante esclarecer que os alunos constroem conhecimentos na interação com o contexto social, mesmo sem ter passado pelo processo de escolarização. Valorizar esses conhecimentos e relacioná-los com novos conteúdos é imprescindível para uma aprendizagem significativa, possibilitando ao professor o planejamento de situações de aprendizagem para ampliá-los e/ou transformá-los. Quanto maior a profundidade e qualidade das relações, maior a significatividade da aprendizagem. Os novos conteúdos devem ser significativos, cientificamente bem construídos, 24 ter funcionalidade, considerando-se as capacidades dos alunos, suas possibilidades cognitivas e afetivas. Tais conteúdos devem ser ressignificados, resgatando-se sua importância no processo de ensino e aprendizagem, entendendo-se como saberes culturais: conceitos, explicações, habilidades, linguagens, fatos, valores, crenças, sentimentos, atitudes, interesses, condutas, raciocínios etc., para o desenvolvimento do educando e sua formação integral. Ressignificar os conteúdos pressupõe entender o que o educando deve saber, o que deve saber fazer e como deve ser. As experiências realizadas por Paulo Freire na década de 60 indicam uma valorização dos conhecimentos construídos fora da escola pelos jovens e adultos e a consideração destes como pontos de partida para novos conhecimentos. Nessas experiências havia uma preocupação com o repertório linguístico dos alunos, afirmando que «a leitura do mundo precede a leitura da palavra». Estes conhecimentos são pontos de partida para a produção de novos conhecimentos. Sendo assim, quando se dirigem a uma escola, os jovens e adultos não se encontram «vazios», como muitas vezes a escola acredita. Em relação aos conteúdos e propostas curriculares, deve-se ressaltar as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para 1ª a 4ª séries. Em 1997, o MEC disponibilizou a proposta curricular para o 1º segmento da educação de jovens e adultos. Essas medidas irão proporcionar elementos que propiciam a elaboração e implementação de propostas curriculares adequadas às especificidades dos alunos dessa modalidade de ensino. A proposta curricular do 1º segmento pressupõe o trabalho com três áreas: Língua Portuguesa, Matemática e Estudos da Sociedade e da Natureza. É necessário, porém, também considerar todas as áreas do conhecimento e os temas transversais, de acordo com os PCN de 1ª a 4ª série. As orientações curriculares elaboradas pelo MEC para o Primeiro seguimento da EJA referem-se à alfabetização e pós-alfabetização de jovens e adultos, cujo conteúdo corresponde às quatro primeiras séries do 1º grau. Elas não constituem propriamente um currículo, muito menos um programa pronto para ser executado. Trata-se de um subsídio para a formulação de currículos e planos de ensino, que devem ser desenvolvidos pelos educadores de acordo com as necessidades e objetivos específicos de seus programas. A legislação educacional brasileira é bastante aberta quanto à carga horária, à duração e aos componentes curriculares desses cursos. Considerando positiva essa 25 flexibilidade, optou-se por uma proposta curricular que avança no detalhamento de conteúdos e objetivos educativos, mas que permite uma variedade grande de combinações, ênfases, supressões, complementos e formas de concretização. Como qualquer proposta curricular, esta não surge do nada; sua principal fonte são práticas educativas que se pretende generalizar, aperfeiçoar ou transformar. LÍNGUA PORTUGUESA A área de Língua Portuguesa abrange o desenvolvimento da linguagem oral e a introdução e desenvolvimento da leitura e escrita. Com relação à linguagem oral, o ambiente escolar deve propiciar situações comunicativas que possibilitem aos educandos a ampliação de seus recursos linguísticos. Em outras palavras, os educandos devem aprender a planejar e adequar seu discurso a diferentes situações formais e informais. Com relação à linguagem escrita, além da compreensão e domínio dos seus mecanismos e recursos básicos, como o sistema de representação alfabética, a ortografia e a pontuação, é essencial que os educandos compreendam suas diferentes funções sociais e conheçam as diferentes características que os textos podem ter, de acordo com essas funções. Todos sabem quão distintas são as linguagens que se usam numa carta de amor, bula de remédio, jornal e enciclopédia. Por isso, além dos tópicos que normalmente compõem os currículos de Língua Portuguesa, esta proposta curricular traz indicações de como trabalhar com textos escritos de modo a possibilitar que os educandos conheçam e experienciem suas diferentes modalidades. A aprendizagem da escrita exige ainda o desenvolvimentoda capacidade de análise linguística e o aprendizado de palavras que servem para descrever a linguagem. Esses aspectos compõem os blocos de conteúdo da área. 26 Linguagem Oral https://fundamentalnoeja.wordpress.com/ Os modos de falar das pessoas analfabetas ou pouco escolarizadas são a expressão mais forte de toda a bagagem cultural que possuem, de suas experiências de vida. Podemos encontrar adultos pouco escolarizados que têm um excepcional domínio da expressão oral: contadores de histórias, poetas, repentistas, líderes populares. Entretanto, deparamos também com aqueles que têm seu discurso marcado por experiências de privação, humilhação e isolamento, que se expressam de forma fragmentada e têm dificuldade de se fazer entender. Para a sala de aula, o professor deve planejar estratégias para que os alunos experimentem e ampliem suas formas de expressão, promover momentos em que os educandos se expressem em pequenos grupos, em grupos maiores, em conversas com o professor. É necessário criar oportunidades de ouvir e falar, reelaborar argumentos a partir de novas informações, construir conceitos, incorporar novas palavras e significados, compreender e avaliar o que ouvimos. Nessas ocasiões, o professor deve chamar a atenção dos alunos para os diferentes modos de falar e os efeitos que podem provocar sobre os que recebem a mensagem. No que diz respeito à linguagem oral, portanto, o papel do professor é mais desinibir, perguntar, comentar e sugerir do que propriamente corrigir. 27 Linguagem Escrita http://revistaemilia.com.br/a-producao-de-um-livro-na-eja/ Numa sociedade letrada, mesmo os jovens e adultos que nunca passaram pela escola têm conhecimentos sobre a escrita. Muitos conhecem algumas letras e sabem assinar seu nome. Todos já se defrontaram com a necessidade de identificar placas escritas, preencher formulários, lidar com receitas médicas ou encontrar o preço de mercadorias. Na escola, o professor deve criar situações em que os educandos exponham e reconheçam aquilo que já sabem sobre a escrita. Baseado no que os alunos já sabem é que o professor poderá decidir que novas informações fornecer, para quais aspectos chamar a atenção, de modo que o aluno vá elaborando seus conhecimentos até chegar a um domínio autônomo desse sistema de representação. Nosso sistema de escrita é alfabético e, no processo de aprendizagem, os alunos devem estabelecer as relações existentes entre os sons da fala e as letras. Entretanto, a escrita não é uma mera transcrição da fala. Não escrevemos do mesmo jeito que falamos, pois, a comunicação escrita têm outras exigências e utiliza- se de outros recursos. Quando escrevemos, nosso leitor não está presente, por isso temos de assegurar que a mensagem seja eficiente e para tanto é preciso usar recursos próprios de organização do discurso. A escrita é utilizada, muitas vezes, para registrar mensagens que devem perdurar no tempo ou atravessar grandes distâncias, por isso ela não pode ser tão flexível quanto à fala, obedecendo a normas mais rígidas de 28 organização. Para dominar o mecanismo de funcionamento da escrita é necessário conhecer as letras, pois são os signos que nosso sistema de representação utiliza. Também é necessário compreender a relação entre as letras e os sons da fala. Para cada fonema, temos uma representação gráfica (é por isso que nosso sistema de representação escrita é chamado de alfabético). É a partir do estabelecimento desta relação fonográfica e da compreensão de suas regularidades e irregularidades que se chega ao domínio do sistema alfabético. Essas irregularidades dizem respeito às peculiaridades da ortografia da Língua Portuguesa: um mesmo som pode ser representado por mais de uma letra e uma mesma letra pode representar sons diferentes dependendo da posição em que se encontra na palavra. Uma mesma palavra pode ser pronunciada de muitas formas, mas deve ter uma única grafia. Por exemplo, no Brasil, a pronúncia da palavra “muito” pode ser muintu, muinto, muntcho, munto ou outras, mas sempre ela é escrita da mesma forma. Não podemos escrever do jeito que falamos, pois isso tornaria o registro escrito extremamente instável e seria muito difícil conseguirmos nos entender. Além da ortografia, há outros recursos e normas que caracterizam a escrita, como o sentido da esquerda para a direita, a segmentação das palavras, a pontuação, os diferentes alfabetos (maiúsculo e minúsculo, de imprensa e cursivo etc.). Utilizamos todos esses recursos e mecanismos da escrita para produzir textos. Existem vários tipos de texto, nos quais esses recursos se combinam de forma característica. Para que os alunos leiam e escrevam com autonomia, precisam familiarizar-se com a diversidade de textos existente na sociedade. Precisam reconhecer as várias funções que a escrita pode ter (informar, entreter, convencer, definir, seduzir), os diferentes suportes materiais onde pode aparecer (jornais, livros, cartazes etc.), as diferentes apresentações visuais que pode adquirir e suas características estruturais (organização sintática e vocabulário). O objetivo central em Língua Portuguesa é formar bons leitores e produtores de textos, que saibam apreciar suas qualidades, encontrar e compreender informações escritas, expressar-se de forma clara e adequada à intenção comunicativa. Portanto, atividades que envolvam leitura e produção de textos são essenciais para alcançar esse objetivo. Para aprender a escrever é preciso escrever, e o mesmo vale para a leitura. Na interação com este objeto de conhecimento — o texto — e com a ajuda do professor, o aluno poderá realizar essas aprendizagens. 29 O trabalho com a linguagem escrita deve estruturar-se, desde o início, em torno de textos. Para as turmas iniciantes, podem ser selecionados textos mais curtos e simples, como listas, folhetos, cartazes, bilhetes, receitas, poesias, anedotas, manchetes de jornal, cartas, pequenas histórias e crônicas. Quanto maior o domínio do sistema de representação, maiores as possibilidades de ler e escrever textos mais longos e complexos. O professor de jovens e adultos deve ter um cuidado especial com a busca e seleção de textos para trabalhar com os alunos, já que ele não conta com a abundância de materiais didáticos já elaborados disponíveis para a educação infantil. Além dos textos literários, outros podem ser usados em sala de aula: receitas culinárias, textos jornalísticos, artigos de divulgação científica, textos de enciclopédias, cartas, cartazes, folhetos informativos ou textos elaborados pelos próprios alunos. O professor deve dispor de uma boa coletânea de textos, organizar pequenas bibliotecas na sala de aula ou levar seus alunos a bibliotecas. Escrever textos significa saber usar a escrita para expressar conhecimentos, opiniões, necessidades, desejos e a imaginação. Nessa aprendizagem, entra em jogo a disponibilidade da pessoa de se expor e criar. Para expressar-se por escrito, o educando terá que lançar mão de um sistema de convenções já estabelecido, mas deverá utilizá- lo para expressar suas próprias ideias ou sentimentos, apropriando-se criativamente dos modelos disponíveis. Os textos que os educandos encontram dentro e fora da escola são os modelos a partir dos quais eles aprendem a escrever. Para isso, será essencial a ajuda do professor, orientando-os na análise dos sons da fala e dos sinais escritos, chamando-lhes a atenção para as regularidades e irregularidades. No processo de aprendizagem, entretanto, os modelos não são simplesmente copiados, sem um trabalho de reelaboração do educando. O professor deve procurar compreender esse processo de elaboração da escrita dos alunos para poder prestar-lhes uma ajuda adequada. Para isso, é preciso criar situações em que os alunos possam colocar em jogo aquilo que sabem,expor suas elaborações sobre a linguagem escrita, discutir sua produção com outros colegas, sentir a necessidade de melhorá-la. O professor não pode simplesmente rejeitar os erros dos alunos, pois é baseando-se neles que se pode saber que tipo de ajuda oferecer. É a análise de seus próprios erros que possibilita aos novos escritores avançar para produções escritas cada vez mais adequadas. Na sala de aula, a produção de um texto deve ser compreendida como um processo que passa por 30 várias reescritas, até que o produto seja satisfatório. Uma boa forma de organizar o trabalho com a escrita é articulá-lo com o da leitura, dentro de uma mesma modalidade textual. À medida que leem e analisam modelos variados de cartas, por exemplo, os educandos podem ser encorajados a escrever suas próprias cartas, inicialmente ainda com bastante ajuda do professor, paulatinamente com maior autonomia, fazendo e refazendo, relendo e comparando e, finalmente, enviando suas cartas, experimentando o poder e o prazer da escrita em situações reais de comunicação. A Análise Linguística A alfabetização implica, desde suas etapas iniciais, um intenso trabalho de análise da linguagem por parte do aprendiz. Nesse processo, ele acabará aprendendo e servindo-se de palavras e conceitos que servem para descrever a linguagem, tais como letra, palavra, sílaba, frase, singular, plural, maiúscula, minúscula etc. Mais adiante, ele poderá ainda aprender outros conceitos mais complexos, como as classificações morfológicas (substantivo, adjetivo etc.) e sintáticas (sujeito, predicado etc.). É necessária uma proposta curricular que sugere atividades de análise linguística que estejam voltadas para a reflexão sobre a produção do texto, ajudando os alunos a melhorarem cada vez mais a forma de escrever. MATEMÁTICA Saber Matemática torna-se cada vez mais necessário no mundo atual, em que se generalizam tecnologias e meios de informação baseados em dados quantitativos e espaciais em diferentes representações. Também a complexidade do mundo do trabalho exige da escola, cada vez mais, a formação de pessoas que saibam fazer perguntas, que assimilem rapidamente informações e resolvam problemas utilizando processos de pensamento cada vez mais elaborados. 31 No ensino fundamental, a atividade matemática deve estar orientada para integrar de forma equilibrada seu papel formativo (o desenvolvimento de capacidades intelectuais fundamentais para a estruturação do pensamento e do raciocínio lógico) e o seu papel funcional (as aplicações na vida prática e na resolução de problemas de diversos campos de atividade). O simples domínio da contagem e de técnicas de cálculo não contempla todas essas funções, intimamente relacionadas às exigências econômicas e sociais do mundo moderno. Como acontece com outras aprendizagens, o ponto de partida para a aquisição dos conteúdos matemáticos deve ser os conhecimentos prévios dos educandos. Na educação de jovens e adultos, mais do que em outras modalidades de ensino, esses conhecimentos costumam ser bastante diversificados e muitas vezes são encarados, equivocadamente, como obstáculos à aprendizagem. Ao planejar a intervenção didática, o professor deve estar consciente dessa diversidade e procurar transformá-la em elemento de estímulo, explicação, análise e compreensão. Muitos jovens e adultos, pouco ou nada escolarizados, dominam noções matemáticas que foram aprendidas de maneira informal ou intuitiva, como, por exemplo, procedimentos de contagem e cálculo, estratégias de aproximação e estimativa. Alguns chegam a manejar, com propriedade, instrumentos técnicos de alta precisão. Embora tenham um conhecimento bastante amplo de certas noções, poucos são os que dominam as representações simbólicas convencionais, cuja base é a escrita numérica. Esses alunos, ao entrarem na escola, demonstram grande interesse em aprender os processos formais. Porém, é fato que eles não costumam abandonar rapidamente os informais, substituindo-os pelos convencionais. Resolução de Problemas Para que a aprendizagem da Matemática seja significativa, ou seja, para que os educandos possam estabelecer conexões entre os diversos conteúdos e entre os procedimentos informais e os escolares, para que possam utilizar esses conhecimentos na interpretação da realidade em que vivem, sugere-se que os conteúdos matemáticos sejam abordados por meio da resolução de problemas. Uma situação-problema pode ser entendida como uma atividade cuja solução não pode ser obtida pela simples evocação da memória, mas que exige a elaboração e 32 execução de um plano. Não se pode confundir essa ideia com os problemas que são tradicionalmente trabalhados nas salas de aula ou que aparecem nos livros didáticos, nos quais a situação é apresentada por um texto padronizado que, por sua vez, evoca uma resposta também padronizada, como neste exemplo: João tinha 35 reais, gastou 22 reais, com quanto ele ficou? 35 - 22 = 13. Explorar os conteúdos mediante questionamentos leva os alunos a estabelecerem conjecturas e buscarem justificativas, o que pode ajudá-los a se dar conta do sentido das ideias matemáticas, além de favorecer a capacidade de expressão. A resolução de problemas matemáticos na sala de aula envolve várias atividades e mobiliza diferentes capacidades dos alunos: • compreender o problema; • elaborar um plano de solução; • executar o plano; • verificar ou comprovar a solução; • justificar a solução; • comunicar a resposta. Ler, escrever, falar e escutar, comparar, opor, levantar hipóteses e prever consequências são procedimentos que acompanham a resolução de problemas. Esse tipo de atividade cria o ambiente propício para que os alunos aperfeiçoem esses procedimentos e desenvolvam atitudes como a segurança em suas capacidades, o interesse pela defesa de seus argumentos, a perseverança e o esforço na busca de soluções. A comunicação e a interação com os colegas favorecem não apenas a clareza do próprio pensamento, mas as atitudes de cooperação e respeito pelas ideias do outro. Números e Operações Numéricas Esse bloco de conteúdos engloba o estudo dos números naturais, de suas funções e representações, das características do sistema decimal de numeração, dos números racionais na forma decimal e fracionária; do significado da adição, subtração, multiplicação e divisão, dos fatos fundamentais, dos diferentes procedimentos de estimativa, cálculo mental e cálculo escrito. 33 Medidas Este bloco de conteúdos reúne conhecimentos de grande utilidade prática, que também podem ser articulados com o estudo do espaço, das formas, dos números e das operações. Os conteúdos deste bloco envolvem a noção de medida e de proporcionalidade, de unidade de medida e das relações entre suas diferentes representações. Tais noções são desenvolvidas a partir do estudo e utilização de diferentes sistemas de medida: tempo, massa, capacidade, comprimento, superfície e valor (sistema monetário). Geometria O eixo “Geometria” trata da construção das noções espaciais por meio da percepção dos próprios movimentos e da representação gráfica do espaço. As figuras bidimensionais e tridimensionais são exploradas a partir da observação das formas dos objetos e também de representações que possibilitam a identificação de semelhanças e diferenças, além de algumas propriedades dessas figuras. Introdução à Estatística Aqui, reúnem-se conteúdos relacionados a procedimentos de coleta, organização, apresentação e interpretação de dados, leitura e construção de tabelas e gráficos. Esses conteúdos, que não costumam aparecer nos currículos de Matemática das séries iniciais, justificam-se pela sua grande utilidade prática, como potentes recursos para descrever e interpretar o mundo à nossa volta. Basta abrirum jornal ou um livro didático de Geografia ou Ciências para constatar como é frequente o uso dessas formas de apresentação e organização de dados e, portanto, como é importante para os jovens e adultos poder compreendê-las. ESTUDOS DA SOCIEDADE E DA NATUREZA O processo de iniciação dos jovens e adultos trabalhadores no mundo da leitura e da escrita deve 34 contribuir para o aprimoramento de sua formação como cidadãos, como sujeitos de sua própria história e da história de seu tempo. Coerente com este objetivo, a área de Estudos da Sociedade e da Natureza busca desenvolver valores, conhecimentos e habilidades que ajudem os educandos a compreender criticamente a realidade em que vivem e nela inserir-se de forma mais consciente e participativa. A complexidade da vida moderna e o exercício da cidadania plena impõem o domínio de certos conhecimentos sobre o mundo a que jovens e adultos devem ter acesso desde a primeira etapa do ensino fundamental. Esses conhecimentos deverão favorecer uma maior integração dos educandos em seu ambiente social e natural, possibilitando a melhoria de sua qualidade de vida. Os caminhos para atingir esses objetivos são vários, assim como vários são os fenômenos sociais e naturais que podem ser estudados. Nessa proposta, tratamos de organizar blocos de conteúdos de modo a auxiliar os educadores na seleção, organização e integração de temas a serem abordados. A ordem em que esses blocos temáticos são apresentados não é necessariamente a que deve ser seguida no desenvolvimento da atividade didática, uma vez que eles não estão hierarquizados por grau de importância ou de complexidade. Caberá aos educadores, na elaboração de seu plano de ensino, selecionar, recombinar e sequenciar conteúdos e objetivos de acordo com as características de seu projeto pedagógico. O Educando e o Lugar de Vivência São conteúdos que podem ter uma aplicação imediata, especialmente no desenvolvimento de atitudes favoráveis ao convívio no centro educativo, na comunidade e no ambiente natural. Esses conteúdos podem constituir pontos de partida para abordagens mais gerais sobre a sociedade e a natureza, assim como para o desenvolvimento de algumas ferramentas cognitivas básicas como as noções de espaço e tempo, a capacidade de observar, comparar, classificar, relacionar, elaborar hipóteses etc. Igualmente, é válido abordar os conteúdos desse bloco como pontos de chegada; por exemplo, depois de tematizar a organização política do Estado brasileiro, refletir sobre a organização política da escola ou sobre a política do bairro. 35 O Corpo Humano e Suas Necessidades Neste eixo, articulam-se conteúdos relativos ao conhecimento dos educandos sobre o próprio corpo, seu esquema e aspecto externo, formas de relacionamento com o meio exterior, mecanismos de preservação do indivíduo e da espécie. Destacam-se aspectos relativos à nutrição, reprodução e preservação da saúde, visando fomentar atitudes positivas com relação à manutenção da qualidade de vida individual e coletiva. Propõe-se, ainda, que se abordem as necessidades das diferentes fases do desenvolvimento, especialmente da infância, no sentido de promover uma educação voltada à paternidade e maternidade responsáveis. O conceito de cultura é um dos principais elementos explicativos da condição humana, da condição de um ser que é capaz de pensar, acumular conhecimentos e transmiti-los às novas gerações. Por esse motivo, esse conceito deverá emergir constantemente no trato dos conteúdos desta área. Para desenvolver o sentido crítico dos alunos em relação aos conhecimentos, é fundamental que eles reconheçam que, enquanto produtos culturais, os conhecimentos são dinâmicos, transformam e diferenciam-se no tempo e de um grupo social para outro. Cultura e Diversidade Cultural Nessa perspectiva, julgou-se pertinente ordenar um conjunto de conteúdos e objetivos orientados especificamente para um enfoque pluralista de aspectos da cultura brasileira. Os temas reunidos neste bloco, Cultura e diversidade cultural, também são fundamentais para o aprendizado de atitudes de não discriminação e tolerância, respeito à pluralidade cultural e étnica, às diferenças de credo, gênero e geração. Essas atitudes são essenciais para o convívio democrático numa sociedade diversificada como a brasileira. Os Seres Humanos e o Meio Ambiente Neste eixo, articulam-se conteúdos que extrapolam as vivências imediatas dos educandos e dão lugar à introdução da linguagem cartográfica (estudo de mapas) e 36 sistemas conceituais das ciências naturais e sociais. Destacam-se aspectos relevantes sobre as relações que se estabelecem entre os seres vivos, em particular os seres humanos e o ambiente físico. Questões relativas à degradação ambiental são relacionadas à atividade produtiva e contextualizadas nos espaços urbanos e rurais. Como suporte à estruturação das noções de tempo e espaço, inclui-se nesse bloco, em caráter introdutório, o estudo da Terra como corpo celeste em movimento, ao qual estão associados fenômenos como o dia e a noite, as estações e as marés. As Atividades Produtivas e As Relações Sociais Enfatizam-se relações que os seres humanos estabelecem entre si para a produção de sua existência, além da nova qualidade que o trabalho humano adquire mediante o desenvolvimento tecnológico. São introduzidas então periodizações históricas relativas à História do Brasil, ampliando-se as possíveis conexões entre as atividades produtivas e outras dimensões da cultura. Cidadania e Participação Aqui, o foco é a dimensão política da vida humana, visando-se aprimorar a consciência cidadã dos educandos. Aí estão implicados a adesão a valores democráticos e o conhecimento da organização social e política do país, dos direitos políticos, sociais e trabalhistas que a posição de cidadãos lhes confere, dos espaços e formas de organização e participação na sociedade. ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O PROCESSO DE AVALIAÇÃO Aprender exige tempo, paciência e participação em situações reais de interlocução, você concorda comigo? O aluno aprende a ler e a escrever interagindo com pessoas e com “objetos” escritos. Desse modo, quanto maior for sua familiaridade com a língua escrita (jornais, livros, poemas etc.) e sua reflexão sobre os modos e usos 37 da linguagem escrita, maior será a probabilidade de que rapidamente compreenda o funcionamento deste complexo sistema de representação que é a escrita. Nessa unidade, buscamos, primeiramente, compreender os significados da alfabetização para aqueles que a buscam na fase jovem ou adulta de suas vidas. Em seguida, refletimos sobre o ensino e a aprendizagem na EJA. Após, apresentamos a importância da avaliação nesta modalidade de ensino. OS SIGNIFICADOS DA ALFABETIZAÇÃO Para iniciar o trabalho com essa unidade, gostaria de fazer a você algumas perguntas: Quais fatores levam jovens e adultos a iniciarem ou reiniciarem seus estudos? Muitos são os fatores que contribuem com essa busca pela escolarização, entre elas, tomar um ônibus, escrever cartas, ler a Bíblia etc. é o desejo de muitos jovens e adultos não escolarizados. Normalmente, o analfabetismo é visto por eles como uma mancha, que os impede de progredir social ou economicamente e, por isso, sentem-se culpados. Garcia (2005) realizou uma pesquisa em que mostra os diferentes significados da alfabetização para jovens e adultos. A partir de relatos de alunos, a pesquisadora categorizou esses significados em: • Alfabetização como busca de emprego. • Alfabetização como valorização da imagem social. • Alfabetização como prazer em aprender. • Alfabetização como exercício da cidadania. • Alfabetização como uso da norma-padrão da língua. Alfabetização Como Busca de Emprego Na realidade
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