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INSTITUTO FEDERAL DA BAHIA – Campus Vitória da Conquista DISCENTE: Gianluca Nascimento Felix de Araujo DISCIPLINA: Operações Unitárias DOCENTE: Aline Magalhães MATRICULA: 2017218011 FICHAMENTO OPERAÇÕES UNITARIAS COAGULAÇÃO Etimologicamente, oriundo de raiz latina, o verbo coagular significa converter em sólido e o termo ‘coagulação’ surgiu em 1844 derivado do francês coagulation. Este processo decorreu inicialmente da necessidade de melhorar o aspecto visual da água para consumo humano. Ainda que a comprovação da água como veículo de doenças remonte somente aos meados do século XIX, era intrínseca a relação entre a maior concentração de partículas e a perspectiva da presença de microrganismos patogênicos. Esta percepção advinha em tempos imemoriais da contínua e inadequada deposição dos excretas no solo, posteriormente arrastados pelas chuvas. Desta forma, à elevação da turbidez associava-se a perspectiva de transmissão de doenças devido ao aporte de microrganismos aos corpos d’água. A coagulação consiste essencialmente na desestabilização das partículas coloidais e suspensas realizada pela conjunção de ações físicas e reações químicas, com duração de poucos segundos, entre o coagulante - usualmente um sal de alumínio ou de ferro -, a água e as impurezas presentes. Em solução aquosa os íons metálicos de ferro e de alumínio, positivamente carregados, formam fortes ligações com os átomos de oxigênio podendo coordenar até seis moléculas de água ao redor, liberando os átomos de hidrogênio (aumentando a concentração do íon H+) e reduzindo o pH da suspensão. Este processo denomina-se hidrólise e os produtos formados constituem-se as espécies hidrolisadas de ferro e alumínio, podendo culminar, em função da dosagem, no precipitado de hidróxido do metal. Posteriormente, verifica-se o transporte dessas espécies para o contato com as impurezas presentes, etapa denominada mistura rápida, causando - em função da magnitude da dosagem e pH de coagulação - sua desestabilização ou envolvimento nos precipitados. Em seguida, com a aproximação e colisão das partículas desestabilizadas, há formação dos flocos os quais podem ser removidos por sedimentação, flotação e filtração. Assim, espera-se remover especialmente turbidez, matéria orgânica coloidal, substâncias tóxicas de origem orgânica e inorgânica, e outras passíveis de conferir odor e sabor à água, microrganismos em geral e os precursores da formação de trihalometanos elevando-se a qualidade da água distribuída. A importância da coagulação testifica-se em duas vertentes distintas e complementares. No contexto sanitário à remoção de partículas de dimensões microscópicas associa-se a de microrganismos patogênicos. Tal assertiva assume maior relevância na comparação entre as dimensões médias dos microflocos77 formados após a coagulação e dos diversos tipos de microrganismos geralmente encontrados nas águas naturais. Ao passo que os primeiros apresentam usualmente dimensões variando de 2 a 4 pm, para as bactérias do gênero Salmonella e coliformes totais as variações são de 0,5 a 2,0 pm e, para os vírus de 0,025 a 0,1 pm. Protozoários, sabidamente mais resistentes à desinfecção com compostos de cloro, apresentam dimensões de 10 a 14 pm, para cistos de Giardia, e 4 a 6 pm de diâmetro para oocistos de Cryptosporidium. Da mesma forma, fibras de asbestos78, em relação às quais há indícios de que possuam propriedades carcinogênicas, apresentam dimensões inferiores a 2 pm. Como consequência, espera-se que os microrganismos sejam envolvidos na formação dos flocos de maior tamanho. A segunda vertente que confirma a relevância do processo de coagulação é essencialmente econômica. Partículas de síliça com diâmetro de 1 pm apresentam velocidade de sedimentação da ordem de 1 mm/b (figura 7.2) e cuja densidade (2,65) é significativamente superior à dos diversos microrganismos. À remoção de partículas desta magnitude de tamanho, certamente, há de se associar à dos microrganismos patogênicos cujas dimensões estão apresentadas na figura 7.1. Uma vez que as unidades de decantação de escoamento horizontal via de regra apresentam profundidade da ordem de 4 m, seria necessário tempo aproximado de 4000 h para que a deposição ocorra. Isto resultaria em áreas imensuravelmente maiores em razão do tempo de detenção usual de 1,5 a 3,0 h verificado nestas unidades. Em unidades de decantação de alta taxa, a despeito de sua pouca relevância, o tempo de detenção é frequentemente inferior a 10 min. Desta forma, o objetivo principal da coagulação, e da floculação como via de consequência, consiste em elevar significativamente a velocidade de sedimentação do aglomerado de partículas a ser formado pela adição do coagulante. Para estações de tratamento dotadas de unidades de flotação, persiste o objetivo da coagulação em fomentar a agregação das partículas, porém sem conferir-lhes elevada velocidade de sedimentação que prejudique o arraste pelas bolhas de ar. A referida importância da coagulação no contexto sanitário evidencia-se em ampla gama de circunstâncias. Vale salientar duas perspectivas contemplando estudos em escala real e unidades-piloto direcionados à remoção de cistos de Giardia e oocistos de Crypto. Tais microrganismos apresentam densidade inferior a 1,1 e os oocistos em particular velocidade de sedimentação inferior a 1 mm/h, não se sedimentando mesmo em reservatórios com elevados tempos de detenção. O primeiro estudo, fundamentado em levantamento realizado no Colorado (EUA) envolvendo oito estações de tratamento de água, apontou a ausência ou ineficiência da coagulação como o fator mais relevante na remoção de cistos de Giardia. Foram detectados cistos no efluente de duas das unidades - já tendo anteriormente ocorrido a presença em outras três - e em sete das oito águas naturais avaliadas. Quatro das estações não eram dotadas de dispositivos para mistura rápida, pois às mesmas afluíam água de baixíssima turbidez. Após a adequação da coagulação em duas outras - dotadas de unidade de mistura rápida não foram detectados cistos na água filtrada mesmo quando se fizeram presentes na água bruta (Hendricks et al., 1988). O segundo estudo, fundamentado em conjunto de pesquisas em unidades-piloto centradas nas perspectivas de remoção e inativação de Crypto realizadas até 1998, realça a importância do conceito de múltiplas barreiras como catalisador na remoção de oocistos deste protozoário. As pesquisas - e os resultados delas originários - foram divididas em quatro vertentes principais, quais sejam, coagulação-floculação/flotação-sedimentação, filtração em meio granular, filtração em membrana e desinfecção. Quando os resultados das pesquisas permitiram foram delineados modelos matemáticos, sempre considerando a remoção de Crypto como variável dependente, contemplando alguns dos diversos fatores intervenientes em cada estudo. Além dos coeficientes de determinação (R2), os modelos apresentaram distintas relevâncias em virtude do número de observações - os próprios resultados das pesquisas - que os fundamentaram. Destaca-se, especificamente para coagulação-floculação-sedimentação, com remoção estimada em 1 a 2 log, o modelo proposto que apresentou excelente aderência aos dados experimentais (R2 = 0,95; 24 observações). O mesmo foi composto por três variáveis explicativas: dosagem de coagulante, pH da água bmta e dosagem de polímero. Em segundo plano o modelo delineado para filtração rápida (R2 = 0,81; 24 observações) apresentou por sua vez como variáveis explicativas turbidez e pH do afluente, a taxa de filtração e a profundidade do meio filtrante como fatores mais relevantes na remoção de Crypto, estimada em 3 a 4 log (Haas et ah, 2001). Mecanismos de coagulação Inicialmente, para melhor compreender os mecanismos intervenientes no processo de coagulação, vale ressaltar que as partículas suspensase coloidais dispersas na água apresentam carga predominantemente negativa. A mobilidade eletroforética constitui-se um dos parâmetros de avaliação da magnitude da carga das partículas presentes nas águas naturais e, dependendo da tecnologia de tratamento, do próprio êxito da coagulação. Sua determinação usualmente realiza-se utilizando uma célula microeletroforética ao acondicionar a amostra de água em um tubo de pequeno diâmetro de plástico ou vidro. A aplicação axial de um campo elétrico à amostra e a inserção de dois eletrodos nas extremidades do tubo induzirá o deslocamento das partículas coloidais, fenômeno este denominado eletroforese. A razão entre a velocidade média das partículas presentes e o gradiente de voltagem ao longo do tubo constitui-se na mobilidade eletroforética, relacionando-se intrinsecamente com sua carga superficial. Um segundo parâmetro de controle do processo de coagulação e que também traduz a grandeza da carga superficial das partículas coloidais denomina-se o potencial zeta, relacionado à eletroforese e determinado com base na própria mobilidade eletroforética. Para a grande maioria das águas naturais, com pH da ordem de 7, a mobilidade eletroforética (medida em pm/s.cm/V) apresentará valores ligeiramente negativos para este parâmetro. Distintas suspensões - sílica, algas e, principalmente, argilas -, que haverão de conferir turbidez e eventualmente cor verdadeira às águas naturais, também apresentam característica similar (figura 7.3). Compressão da dupla camada O primeiro mecanismo de coagulação consiste na compressão da referida dupla camada. O aumento da força iônica, vale afirmar da concentração de íons, ocasiona a compressão da camada difusa. Segundo o modelo de Schulze-Hardy (1900) tal intento é obtido muito mais facilmente com a dispersão de íons de carga positiva trivalentes como ferro ou alumínio, a razões da ordem de 1:700 em relação aos íons monovalentes e 1:60 em relação aos bivalentes (Montgomery, 1985). Os íons de carga positiva atravessam a camada compacta, reduzindo a magnitude do potencial zeta e a espessura da dupla camada, permitindo a posterior aproximação das partículas. Duas grandes inconsistências da teoria da compressão da dupla camada residem na independência da dosagem de coagulante com a concentração de partículas coloidais e nos maus resultados auferidos com o emprego de sais de cálcio e magnésio como coagulantes com dosagens superiores às preconizadas pela lei de Schulze-Hardy. Tais inconsistências apontam para outras interações, além dos efeitos eletrostáticos, entre as espécies hidrolisadas do coagulante e as partículas dispersas na massa líquida. Adsorção-desestabilização O segundo mecanismo, também denominado adsorção-neutralização ou mesmo neutralização de cargas, ocorre imediatamente após a dispersão do coagulante na massa líquida. Dependendo do pH do meio, há formação de diversas espécies hidrolisadas de carga positiva que podem ser adsorvidas na superfície das partículas, desestabilizando-as. Em alguns casos minúsculas partículas do coagulante, produtos da hidrólise do sal, são adsorvidas pela superfície das partículas coloidais, podendo mesmo resultar na reversão da carga da partícula e consequente restabilização da suspensão. Tal fato explica a estreita faixa de variação - específica para cada água natural -, tanto em termos de dosagem de coagulante quanto do pH resultante, para a qual a coagulação neste mecanismo é exitosa. Vale enfatizar também que na maioria dos casos são esses produtos da hidrólise, e não os íons dos metais ferro e alumínio, os principais agentes na coagulação. Desta forma, o pH - usualmente entre 4.5 e 6,5, para coagulação com sulfato de alumínio - toma-se fator preponderante, pois governará a fornação das espécies predominantes e a eficiência do processo. A adsorção ocorre em intervalo de tempo inferior a 1 s e elevado gradiente de velocidade79, podendo suceder com dosagens inferiores às necessárias à compressão da camada difusa. A dosagem de coagulante necessária à neutralização da carga é diretamente proporcional à concentração e à área superficial do coloide, sendo, desta forma, influenciada pelo número e distribuição dos tamanhos de partículas que constituem a dispersão. Em vista deste fato, muito provavelmente duas águas com alcalinidade e turbidez de mesma magnitude desestabilizar-se- ão com dosagens distintas de coagulante, ou seja, a água que apresentar maior número de partículas de menor dimensão - provocando aumento da área superficial - há de necessitar dosagem mais elevada. A determinação da mobilidade eletroforética constitui importante parâmetro de monitoramento desse mecanismo de coagulação, uma vez que a adsorção se sucede nas vizinhanças do ponto isoelétrico para o qual o potencial zeta é nulo. A adsorção-neutralização como mecanismo de coagulação deve predominar em estações de filtração direta de escoamento ascendente e descendente, pois os microflocos formados apresentam baixa velocidade de sedimentação e alta resistência ao cisalhamento decorrente das forças hidrodinâmicas do escoamento, sendo assim eficientemente retidos nos interstícios do meio filtrante. Varredura Em função do pH de coagulação, à medida que se eleva progressivamente, a dosagem do coagulante passa a predominar o mecanismo da varredura, o mais recorrente nas estações de tratamento de água. Esse mecanismo foi definido como sweep coagulation, pela inexistência de uma relação estequiométrica entre a dosagem de coagulante e a área superficial das partículas (Packman, 1965). Em função das dosagens de coagulante e do pH do meio, as partículas coloidais são adsorvidas e as suspensas envolvidas pelo precipitado de hidróxido de alumínio ou de ferro. Interessante estudo sugere que o precipitado formado nas condições da coagulação por varredura apresenta carga positiva, explicando a atração eletrostática exercida sobre as partículas suspensas (Dempsey 1984 apud Dennet et al., 1995). O mecanismo da varredura inequivocadamente conduz a dosagens mais elevadas, quando cotejadas às necessárias à adsorção-neutralização. Desta forma, o floco formado adquire maior peso, sedimentando-se com maior facilidade nas unidades de decantação, tomando tal mecanismo predominante nas estações convencionais de tratamento de água. Também quando do emprego da flotação como etapa de separação dos flocos, a coagulação ocorre por varredura. Os flocos formados pelo mecanismo da varredura apresentam densidade80 pouco superior à da água (1,01 a 1,05), favorecendo em muitas circunstâncias a não sedimentação e consequente arraste às unidades filtrantes. Em qualquer mecanismo de coagulação o processo de desestabilização pode ser revertido caso haja variações no pH de coagulação ou da dosagem de coagulante, conduzindo à restabilização das partículas coloidais e evitando a agregação. Formação de pontes químicas No emprego dos polímeros, a coagulação pode efetuar-se por intermédio da formação de pontes químicas, quando as partículas coloidais são adsorvidas na superfície das diversas cadeias dos polímeros. Para tal finalidade, a molécula do polímero deve ser longa o suficiente para minimizar o efeito repulsivo da dupla camada quando da aproximação de mais de uma partícula e permitir a adsorção em sua superfície. Há relação direta entre a área superficial das partículas coloidais e a dosagem ótima de polímeros, e a melhor agregação não necessariamente ocorre para potencial zeta nulo. Íons como cálcio podem afetar a formação destas pontes químicas por interagirem com a superfície das cadeias dos polímeros (Letterman; Amirtharajah; 0 ’Melia, 1999). Uma vez que esse mecanismo de coagulação pode ocorrer com polímeros aniônicos, nos quais predominam sítios negativos, somente a compressão da camada difusa não explicaria o processo. Desta forma, tanto podem ocorrer ligações decorrentesde forças de atração eletrostática, quanto a prevalência de pontes de hidrogênio ou das forças de van der Waals. Também excessiva dosagem de polímeros evitará a formação de pontes pela ausência de sítios disponíveis, conforme apresentado na figura 7.6. Fatores intervenientes na coagulação Diversos fatores haverão de interferir em maior ou menor monta no processo de coagulação. Embora não existam hierarquias absolutas em termos da coagulação, dentre os principais fatores intervenientes destacam-se o tipo de coagulante, o pH e a alcalinidade da água bruta, a natureza e a distribuição dos tamanhos das partículas causadoras de cor e turbidez, e a uniformidade de aplicação dos produtos químicos na massa líquida. Em menor grau podem também ser mencionados a presença de íons, a concentração e a idade da solução de coagulante, a temperatura da água e, dependendo do mecanismo predominante, o gradiente de velocidade e o tempo de agitação na unidade de mistura rápida. Tipo de Coagulante É evidente que as características da água bruta vão influenciar na escolha do coagulante, mas o êxito do processo de coagulação é indissociável do tipo de coagulante utilizado. A característica fundamental para um coagulante ser empregado no tratamento de água consiste na capacidade de produzir precipitados e espécies hidrolisadas em dissociação no meio aquoso, capazes de desestabilizar ou envolver as partículas suspensas e coloidais presentes nas águas naturais. O cloreto de sódio constitui contraexemplo interessante. Ao se dissociar na água os íons (Na+ e CE) atuam como cargas localizadas e não produzem espécies hidrolizadas fundamentais à coagulação, sendo por vezes denominados eletrólitos indiferentes. Alealinídade e pH No inusual emprego de polímeros orgânicos como coagulantes primários, a alcalinidade e opH parecem não afetar significativamente o processo de coagulação, neste caso governado pela própria dosagem e concentração de partículas dispersas na massa líquida. Contudo, quando a coagulação se efetua com sais de ferro ou de alumínio, independente do mecanismo predominante, o pH assume importante papel na prevalência das espécies hidrolisadas do coagulante. Já a alcalinidade da água bruta, natural ou artificial, funcionará como tampão, minimizando a queda muito acentuada do pH de coagulação. Este fato adquire maior relevância no mecanismo da varredura quando o coagulante empregado é o sulfato de alumínio, pois este apresenta espectro de variação mais restrito do pH de coagulação para formação do hidróxido, comparado ao cloreto férrico. Em contrapartida, para estações de filtração direta, nas quais o mecanismo de coagulação predominante inclina-se para adsorção-desestabilização, alcalinidade mais significativa da água bruta pode tomar-se fator de restrição ao êxito do processo, que usualmente se sucede com valores mais baixos de pH. Neste mesmo contexto, embora águas coloridas tendam a apresentar pH e alcalinidade baixos, pode haver necessidade do emprego de ácido como auxiliar de coagulação, concorrendo para reduzir a dosagem do coagulante primário e a geração de lodo. FLOCULAÇÃO A floculação é uma das operações unitárias106 da clarificação que se constitui um conjunto de fenômenos físicos, nos quais se tenciona em última instância reduzir o número de partículas suspensas e coloidais presentes na massa líquida. Para tal, fomecem-se condições, em termos de tempo e agitação - como para as unidades de mistura rápida, vale afirmar, tempo de detenção e gradiente de velocidade -, para que ocorram os choques entre as partículas anteriormente desestabilizadas pela ação do coagulante objetivando a formação dos flocos a serem posteriormente removidos por sedimentação/flotação ou, nas estações de filtração direta, nas próprias unidades de filtração. Também no mesmo contexto das unidades de mistura rápida, a energia dissipada na massa líquida para fomentar a aglutinação das partículas pode ser de origem mecânica ou hidráulica. A figura 8.1 representa esquematicamente este conceito de progressiva redução do número de partículas presentes na água bruta (No) ao longo das sucessivas câmaras da unidade de floculação (Nb N2, N3, ...). Mecanismos de transporte e intervenientes na floculação Na realidade a menção aos mecanismos intervenientes na floculação refere-se à fonna como o transporte das partículas desestabilizadas realiza-se para a formação dos flocos. O mecanismo de transporte predominante será função das dimensões das partículas desestabilizadas e da progressiva formação e crescimento dos flocos. O transporte das partículas pode ocorrer em virtude basicamente de três fenômenos: i) ao movimento Browniano107 - denominada floculação pericinética; ii) às diferenças de velocidade das linhas de corrente do fluido em escoamento – denominado floculação ortocinética] iii) às distintas velocidades de sedimentação dos flocos {sedimentação diferencial). O movimento aleatório das partículas coloidais de dimensão inferior a 1 pm permite que ocorram os primeiros choques. Pode-se afirmar que os primeiros contatos entre as partículas desestabilizadas iniciam-se já na unidade de mistura rápida, decorrentes do movimento Browniano e da ação da gravidade. Nesta fase, as partículas coloidais desestabilizadas chocam- se e aglomeram-se formando pequenos flocos com dimensões usualmente inferiores a 1 pm. A despeito da menor relevância da floculação pericinética na formação dos flocos, a possibilidade de contacto entre os flocos já formados de maior dimensão com as partículas desestabilizadas remanescentes é governada pelo movimento Browniano. Já a floculação ortocinética decorre da introdução de energia externa que fomenta a aglutinação das partículas desestabilizadas e dos microflocos - formados inicialmente por intermédio do movimento Browniano -, para a formação de flocos de maior peso, passíveis de serem removidos por sedimentação ou flotação. Os parâmetros inerentes à eficiência da floculação são o gradiente de velocidade e o tempo de detenção hidráulico, quer no processo de agregação das partículas, quer no processo de erosão dos flocos. Assim, a floculação ortocinética é o único mecanismo no qual o profissional pode atuar de forma a otimizar a operação. Cabe ressaltar que este mecanismo continua a atuar mesmo após a unidade de floculação. Dependendo da configuração da estação de tratamento, o canal de água floculada, as comportas de acesso aos decantadores e a própria cortina de distribuição permitem que a floculação ortocinética ainda ocorra. Mecanismos de agregação e ruptura dos flocos O conjunto de fenômenos físicos que caracterizam os mecanismos de transporte intervenientes na floculação abordados anteriormente converge para outros dois mecanismos, tão essenciais quanto conflitantes à eficiência desta operação: a agregação e a ruptura dos flocos. Nessa premissa, em função das características da água e das condições de coagulação e floculação, o crescimento dos flocos efetua-se até um tamanho limite para o qual se equivalem as tensões de cisalhamento e as forças de aglutinação que mantêm as partículas desestabilizadas aderidas à estrutura do floco. Com o progressivo aumento das dimensões e da densidade, aliada à melhor sedimentabilidade, ocorre elevação da área superficial dos flocos favorecendo a prevalência das forças hidrodinâmicas que tendem a provocar o descolamento destas partículas. Concorre para maximizar os efeitos da ruptura o fato dos flocos rompidos dificilmente voltarem a se formar para as mesmas condições de floculação, mesmo quando se verifica o emprego de polímeros orgânicos como coagulantes primários. Nestes casos, após a ruptura do floco, há tendência de que os segmentos dos polímeros envolvam completamente a mesma partícula, reestabilizando-a e evitando a reagregação. Fatores intervenientes na floculação Evidentemente quetodos os fatores intervenientes no processo da coagulação podem ser listados como relevantes na eficiência da floculação. Além da coagulação propriamente dita, o gradiente de velocidade e o tempo de detenção ou tempo de floculação constituem-se indubitavelmente nos principais fatores intervenientes na floculação, ainda que para as unidades mecanizadas as geometrias das câmaras e das paletas possam também ser secundariamente mencionadas. Tais parâmetros governarão a densidade e o tamanho dos flocos formados, reduzindo a turbidez e/ou cor aparente da água decantada ou, para estações de filtração direta, conferindo aos flocos maior resistência aos efeitos de cisalhamento provocado pelas forças hidrodinâmicas do escoamento maximizando a retenção nos interstícios do meio filtrante. Geometria dos agitadores e das câmaras de floculação Para as unidades de floculação com tempos de detenção mais curtos é de se esperar que as câmaras de base quadrada apresentem desempenho inferior quando cotejadas às de base circular, em função da maior possibilidade de zonas mortas. Contudo, para tempos de detenção mais longos a forma das câmaras possivelmente não interferirá significativamente na eficiência da floculação e o desempenho da unidade será governado pelo número de câmaras e pela disposição das passagens. Evidentemente que as câmaras de floculação de seção quadrada são as mais extensivamente empregadas por permitirem arranjos que viabilizam otimizar a área destinada à estação de tratamento e reduzir o custo da construção pelo aproveitamento comum das paredes. Câmaras de seção circular predominam nas estações pré-fabricadas, em especial com o uso de bandejas perfuradas como meio de conferir o gradiente de velocidade à massa líquida. Secundariamente, as vazões para as quais estas unidades são usualmente construídas concorrem para que a área, e consequentemente o material despendido, seja de menor magnitude. Tipos de unidades de floculação A distinção dos tipos de floculadores fundamenta-se na forma de transferir energia à massa líquida, hidráulica ou mecânica, para que possam ocorrer os choques entre as partículas desestabilizadas e a consequente formação dos flocos. Para quaisquer tipos de unidades, a relevância do gradiente de velocidade e do tempo de detenção como balizadores da floculação confirma-se pelos parâmetros de projeto recomendados na literatura técnica listados na tabela 8.7. Unidades de floculação hidráulica Antes da caracterização específica de cada tipo de unidade de floculação hidráulica, optou-se por apresentar as equações de estimativa do gradiente de velocidade, por se constituírem no balizador da magnitude da energia conferida à massa líquida para a formação dos flocos. Desta forma, para as unidades de floculação hidráulica, o gradiente de velocidade deve-se à perda de carga nas passagens entre as sucessivas câmaras. Floculadores de escoamento helicoidal Nas unidades hidráulicas de escoamento helicoidal comumente dispõem-se em lados alternados aberturas inferiores dotadas de anteparos ou curvas de 90° para impingir o escoamento sempre na direção ascendente. Quando construídas em concreto, usualmente, o número de câmaras é inferior a 12, podendo com emprego de divisórias em madeira atingir até 24 câmaras. Floculadores de escoamento horizontal As unidades de floculação hidráulica de escoamento horizontal, raramente empregadas no País - à exceção de algumas estações de pequeno porte no Espírito Santo -, constituem-se em última análise canais dotados de chicanas através das quais ocorrem as alterações da direção do escoamento que hão de favorecer a formação dos flocos (figura 8.22). Floculadores de escoamento vertical Os floculadores hidráulicos de escoamento vertical apresentam-se com chicanas ou aberturas superiores e inferiores. No primeiro caso ocorre escoamento livre por sobre as chicanas nas passagens superiores e estas unidades frequentemente são dotadas de até 40 câmaras. No segundo caso, as aberturas instaladas abaixo da linha d’água asseguram-lhes o escoamento forçado, com o número de câmaras via de regra inferior a 10. Com esta última concepção, diversas unidades foram construídas a partir da década de 1960 pela Fundação SESP (Fundação Serviços Especiais de Saúde Pública atual Funasa) em Minas Gerais, Espírito Santo e estados do Norte e Nordeste, com denominação de floculadores tipo Coxm. Assim como para as unidades de escoamento horizontal, recomendam-se velocidades de escoamento superiores a 0,10 m/s, objetivando minimizar a precoce deposição de flocos (figura 8.23). Unidades de floculação mecanizadas As unidades de floculação mecanizadas distinguem-se basicamente pelo eixo, vertical ou horizontal, por meio do qual as paletas, turbinas ou hélices estão conectadas aos conjuntos motor- redutor. Os floculadores de eixo vertical apresentam-se com até cinco câmaras, mais comumente três, e dotados de uma ou mais paletas paralelas ou perpendiculares ao eixo. A alternativa mais utilizada nas estações brasileiras constitui-se de paletas paralelas ao eixo de rotação, de duas a quatro instaladas em dois ou quatro braços, sendo raro o emprego de paletas perpendiculares ao eixo. A faixa de gradientes de velocidade de floculação usualmente aplicada culmina em rotação de 2 a 15 rpm. Para unidades mecanizadas com agitadores tipo turbina a determinação da potência dissipada na massa líquida - e consequentemente do gradiente de velocidade de floculação - é idêntica à utilizada para mistura rápida, valendo-se da grandeza adimensional denominada Número de Potência (Np).121 Floculação em malhas Embora não se constitua em upi dispositivo específico de floculação, as telas de fios de nylon ou arame têm sido utilizadas em canais de água coagulada ou mesmo nas passagens entre as câmaras das unidades de floculação. Sua aplicação apresenta-se como alternativa interessante para estações existentes, operando com sobrecarga, dotadas de canais de água coagulada ou floculada de maiores dimensões. Nesta última circunstância é possível com a instalação destas malhas prolongar o tempo de floculação. Evidentemente, pela mesma razão de minimizar a ruptura dos flocos, que no primeiro caso as malhas devem conferir gradientes de velocidade superiores ao da primeira câmara de floculação e no segundo inferiores ao da última. Quando utilizadas a jusante da unidade de mistura rápida, as malhas prestam-se a auxiliar a aplicação dos produtos químicos utilizados na coagulação, como os polímeros, ou mesmo dos compostos de flúor quando este processo é realizado no início do tratamento. A perda de energia que se sucede quando água em escoamento atravessa a malha – passível de ser desprezada na maioria dos casos práticos -, como para as unidades hidráulicas de floculação, a magnitude desta relaciona-se com o gradiente de velocidade aplicado à massa líquida. Comparação entre os tipos de floculadores Na definição do tipo de floculador a ser empregado, os métodos hidráulicos têm sido, via de regra, preteridos pelos mecanizados nos recentes projetos de construção e ampliação de estações de tratamento de água de médio e grande porte. A despeito desta supremacia,' na comparação entre as distintas unidades de floculação algumas constatações são inequívocas. Os floculadores hidráulicos praticamente prescindem de manutenção e não demandam gastos com energia elétrica, sendo a alternativa mais viável para as localidades distantes dos centros mais desenvolvidos. Adicionalmente, apresentam custo de implantação inferior ao das unidades mecanizadas, à exceção, provavelmente, dos floculadores de escoamento horizontal de menor profundidade. Desta forma, como já foi ressaltado, constituem em número absoluto o tipo de unidade mais extensivamente empregada no País, sobretudo em estações de tratamento para pequenas e médias comunidades onde as prováveisdificuldades inerentes à manutenção dos equipamentos inviabilizariam o uso da floculação mecanizada. DECANTAÇÃO O verbo decantar surgiu em 1813, com significado de purificar ou filtrar, valendo-se do francês (décanter) derivado do latim medieval extensivamente utilizado pelos alquimistas (decanthare). O termo de decantação originou-se no mesmo ano e da mesma forma do francês décantation. A decantação, junto com a flotação, consiste na operação unitária que via de regra traduz a eficiência das etapas que a precedeu, ou seja, a coagulação e floculação, e em alguns casos mesmo a pré-desinfecção quando se objetiva a remoção de ferro e manganês. Na decantação aos flocos formados anteriormente são fornecidas condições que os permitam depositar pela ação da gravidade. Ambas operações objetivam diminuir o afluxo de partículas às unidades filtrantes, consistindo na última etapa da clarficação dentro do contexto de múltiplas barreiras no qual o tratamento de água se insere. Desta forma, a nomenclatura correta preconiza referir às partículas sedimentadas e ao efluente como água decantada. Muito provavelmente a decantação vem a ser a etapa do tratamento à qual em tempos imemoriais as populações primeiro se reportaram. Registros confiáveis referem-se ao hábito dos egípcios, por volta de 2000 a.C., acondicionarem as águas naturais em jarros para serem consumidas após determinado tempo com o intuito de reduzir a quantidade de partículas suspensas e dissolvidas. A motivação para se pensar em adicionar alguma substância que fomentasse a aglutinação certamente adveio das frustradas tentativas de reduzir a concentração de partículas coloidais presentes nas águas naturais. Distribuição de água floculada Provavelmente o primeiro fator interveniente relacionado especificamente à decantação consiste na equânime distribuição da água floculada. Em diversas estações, as unidades de floculação são construídas contiguamente em relação aos decantadores, de tal forma que se prescinde de dispositivo específico para permitir a afluência da água floculada. A saída do floculador conecta-se diretamente à entrada do decantador e nestas circunstâncias comumente associa-se uma unidade de floculação a uma de decantação. Contudo, para a maioria das estações de tratamento, esta distribuição, para uma ou mais unidades, efetua-se por meio de canais de água floculada que se comunicam com as comportas de cada decantador. Frequentemente, verifica-se na rotina operacional das estações que monitoram individualmente a água decantada, desempenho distinto de unidades de decantação idênticas, com período de funcionamento entre limpezas de mesma magnitude, decorrente da distribuição desigual de água floculada. Como consequência sucede-se um significativo aporte de partículas aos filtros, pois à maior vazão de água decantada estará associada o maior número de partículas, concorrendo em última instância na redução do intervalo entre as lavagens das unidades filtrantes. Adicionalmente, para algumas estações a concepção hidráulica da distribuição da água decantada proporciona que para alguns filtros aflua, preferencialmente, o efluente de decantadores operando com vazões superiores às de outras unidades. Sedimentação de partículas discretas A agregação das partículas e a perspectiva da formação dos flocos perdurar na unidade de decantação inviabilizam o delineamento de um modelo matemático que estime a velocidade de sedimentação e a consequente remoção das partículas suspensas e coloidais presentes na água bruta. Tais estimativas acabam por ser realizadas por meio de ensaios em reatores estáticos ou, de forma muito mais restrita no País, em colunas de sedimentação. Desta forma, a modelação matemática para sedimentação realiza-se de forma simplista considerando as partículas presentes como partículas discretas125, ou seja, mantêm sua individualidade na trajetória descendente mesmo se porventura se chocarem entre si, perspectiva que se aproxima da realidade para águas com baixa concentração de partículas. Nesta vertente, sobre um corpo imerso em um fluido agirão, em primeira instância, duas forças: a força da gravidade que o impelirá no sentido descendente e a força do empuxo idem no sentido ascendente. Sedimentação de partículas floculentas Conforme salientado, a impossibilidade de se prever a ocorrência e a efetividade dos choques entre os flocos na unidade de decantação, toma difícil sintetizar a sedimentação de partículas floculentas em termos de modelação matemática. Assim, a estimativa da taxa de aplicação superficial poderia ser realizada por meio de um contador de partículas que fornecesse o número e a distribuição dos tamanhos dos flocos - ainda assim seria necessário estimar a densidade destes -, utilizando-se a equação 9,12. Todavia, ao contrário do que se sucede com partículas de areia, a possibilidade de quebra dos flocos quando do uso deste equipamento é muito significativa, conforme mencionado no Capítulo 7. Em vista do exposto, as alternativas viáveis recaem para realização de ensaios em colunas de sedimentação ou reatores estáticos. Estes ensaios objetivam, apesar de intrínsecas limitações, abarcar os fatores que concorrem para favorecer a agregação dos flocos na unidade de decantação. Fomentam o prolongamento da floculação, em especial, o tempo de detenção - que se relaciona com a profundidade do decantador -, a concentração e distribuição dos tamanhos das partículas. Na primeira alternativa - de uso restrito mesmo nos países mais desenvolvidos - utiliza-se uma coluna de acrílico, ou mesmo de PVC, de altura idêntica à profundidade do decantador a ser preenchida com a água floculada. Embora haja recomendações distintas à realização deste tipo de ensaio – sobretudo no que se refere aos pontos de amostragem -, resultados fidedignos podem ser alcançados com apenas um ponto de coleta à profundidade da mesma ordem de grandeza à da unidade de decantação. Tanto quanto possível, a água floculada deve ser mantida a temperatura constante e o diâmetro da coluna deve permitir que a retirada das amostras não induza ao abaixamento significativo do nível d’água e minimizando os efeitos de parede - desta forma há recomendações de diâmetro mínimo de 150 mm. Como segunda alternativa, estes ensaios podem ser realizados nos reatores estáticos de 2,0 L dos equipamentos de jar test. Aliada à maior exequibilidade, tais ensaios podem fornecer resultados confiáveis acerca da taxa de aplicação superficial. Os resultados podem ser interpretados131 da mesma forma utilizada para a sedimentação discreta com base na equação 9.16. Tipos de unidades de decantação A decantação pode ocorrer, basicamente, por meio de três variantes: decantadores de escoamento horizontal, decantadores de alta taxa e decantadores de manto de Iodos (floco- decantadores). Nesta última alternativa - quase inexistente no Brasil, mas de extensivo emprego nos EUA e Canadá – as operações de floculação e sedimentação sucedem-se na mesma unidade. Decantadores de escoamento horizontal Aspectos geométricos Estas unidades constituem as mais comumente utilizadas no Brasil e na maioria dos países, respondendo por 60 a 70 % da área das unidades integrantes da estação de tratamento. Usualmente os decantadores de escoamento horizontal apresentam-se na forma retangular em planta, mais facilmente adaptável ao lay-out das estações e com a perspectiva de aproveitamento comum das paredes para construção de floculadores e filtros. Esta afirmativa testifica-se pela figura 9.8. As formas circulares apresentam utilização mais restrita, a despeito da facilidade de raspagem do lodo sedimentado. Por vezes, estações originariamente construídas para filtração direta em linha, nas quais a deterioração das características da água culminou na alteração para tecnologia convencional, apresentam decantadores de seção circular.As mencionadas circunstâncias motivaram a construção do floculador hidráulico de 13 câmaras e decantador circular mostrados na figura 9.9. FILTRAÇÃO No que tange ao tratamento de água, a filtração constitui-se no processo144 que tem como função primordial a remoção das partículas responsáveis pela cor e turbidez, cuja presença reduziria a eficácia da desinfecção na inativação dos microrganismos patogênicos. Apesar desta evidência, a filtração e outras etapas do tratamento tomam-se prescindíveis quando a qualidade da água bruta, oriunda sobretudo de mananciais subterrâneos, permite efetuar apenas a desinfecção. Nas estações de tratamento convencionais cabe à filtração provavelmente a função mais relevante, por se constituir na etapa na qual as falhas - porventura ocorridas na coagulação, floculação e sedimentação/flotação - podem ser corrigidas, assegurando a qualidade da água tratada. A referida relevância da filtração está consolidada no meio técnico, quer pela recente Portaria 518 (Ministério da Saúde, 2004b) quer pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA (USEPA- United States Environmental Protection Agency), pois ambas estabelecem, embora com distintos requisitos de qualidade, a necessidade desta etapa na distribuição da água captada em mananciais superficiais. Mecanismos intervenientes na filtração A filtração rápida consiste na conjunção dos mecanismos de transporte e de aderência. Os primeiros constituem-se fenômenos físicos e hidráulicos afetados pelos parâmetros que governam a transferência de massa. Em outro contexto, os mecanismos de aderência são influenciados por fenômenos predominantemente químicos, tais como formação de pontes químicas - quando do emprego de polímeros como auxiliares de coagulação -, forças eletrostáticas e de van der Waals, balizados por parâmetros físicos e químicos também intervenientes nas etapas de coagulação e floculação ( 0 ’Melia; Stumm, 1967). Desta forma, conforme assinalado, espera-se remover na filtração ampla gama de partículas que, se presentes na água filtrada, reduziríam a eficiência da desinfecção. No funcionamento dos filtros lentos - a serem abordados neste capítulo ao mencionado mecanismo de transporte, agrega-se a filtração biológica realizada pelos microrganismos que se desenvolvem no interior do meio filtrante, responsável pela elevada eficiência destas unidades na remoção de patogênicos. Mecanismos de transporte Os mecanismos de transporte são significativamente influenciados pela temperatura da água - que por sua vez há de intervir, por meio da viscosidade, na laminaridade do escoamento -, pelas características do meio filtrante (diâmetro e forma dos grãos, espessura e porosidade) e pela taxa de filtração. A prevalência de um ou outro mecanismo de transporte dependerá da concentração e, sobretudo, da distribuição dos tamanhos das partículas do afluente, além dos fatores intervenientes na velocidade intersticial, quais sejam, a porosidade do meio filtrante e a taxa de filtração. A velocidade intersticial é o quociente entre a taxa de filtração e a porosidade do meio filtrante, por consequência, cresce gradativamente à medida que a retenção de partículas se sucede no interior do filtro. Coagem ou ação de coar O referenciado emprego de filtros no tratamento das águas de consumo humano norteou-se pela perspectiva de remoção das partículas de maior dimensão, quando comparadas aos interstícios do meio filtrante, que podem variar de 0,1 a 0,2 mm, para grãos de 0,5 mm, até 0,3 a 0,6 mm para grãos de 1,2 mm. Embora vinculadas ao êxito da coagulação e floculação, pode- se admitir que as dimensões dos flocos variem de 0,5 a 2,0 mm (figura 10.2). Desta forma, a coagem ou ação de coar constitui-se no primeiro e mais evidente mecanismo de transporte responsável pela retenção de partículas e pela evolução mais significativa da perda de carga no topo do meio filtrante. Estima-se que a retenção por coagem seja governada pela relação entre os diâmetros das partículas e dos grãos que integram o meio filtrante, e sua relevância cresce quando esta for superior a 0,2, tomando-se o mecanismo predominante na filtração para partículas maiores que 100 pm. Para estações de filtração direta, o emprego de auxiliares de coagulação e, em vários casos, de sais de ferro como coagulantes primários reduz a perspectiva de erosão dos flocos. Esta constatação confere maior relevância ao mecanismo da coagem, pois os flocos retidos na superfície do meio filtrante hão de apresentar maior resistência aos crescentes efeitos de cisalhamento em razão da progressiva elevação da velocidade intersticial, motivada pela redução dos vazios intergranulares (porosidade). Adicionalmente, a consequente redução das dimensões dos interstícios favorece a remoção por coagem de partículas ainda menores. Todavia, nas estações convencionais, a relevância deste mecanismo decresce significativamente pelo fato de que os flocos de maior dimensão, passíveis de serem retidos por coagem, são majoritariamente removidos nas unidades de decantação. Também não são removidos por este mecanismo os coloides (0,01 a 10 pm), as bactérias (1 a 10 pm) e os cistos e oocistos de protozoários (4 a 14 pm). Sedimentação Para as partículas com densidade superior à da água - flocos de sais de ferro e de alumínio apresentam usualmente densidade de 1,01 a 1,05 - descortina-se a perspectiva da sedimentação como mecanismo de transporte responsável pela eficiência do processo de filtração. Este mecanismo revela-se nos inúmeros canalículos formados pelos interstícios do meio filtrante que se comportam como microunidades de sedimentação. O escoamento da água no interior do meio filtrante sucede-se em regime laminar, governado pelas forças viscosas e assegurando o paralelismo entre as linhas de corrente. As partículas de maior tamanho e densidade podem desviar-se da trajetória das linhas de corrente e depositarem-se na superfície dos grãos, vinculando a eficiência deste mecanismo à relação entre a velocidade de sedimentação da partícula, função da lei de Stokes - mencionada no Capítulo 9 - , e a velocidade de aproximação. Interceptação O deslocamento das partículas ao longo de uma linha de corrente tangencial à superfície dos grãos pode favorecer a interceptação como relevante mecanismo de transporte interveniente na filtração. O choque das partículas com os grãos do meio filtrante, e posterior deposição, ocorre quando a distância da linha de corrente à superfície do grão for inferior à metade do diâmetro da partícula. Desta forma, os modelos propostos para estimar a relevância da interceptação, também utilizando coeficiente adimensional r|I, relacionam os diâmetros da partícula e do grão do meio filtrante, sintetizados na equação 10.2: Difusão A difusão como mecanismo de transporte interveniente na filtração decorre do movimento aleatório das moléculas de água que transfere, e confere, às partículas coloidais de dimensões inferiores a 1 pm, um movimento difusivo denominado Browniano146. A intensidade do movimento Browniano vincula-se duplamente à elevação da temperatura da água - pelo aumento da energia termodinâmica das moléculas e redução da viscosidade -, à dimensão e densidade das partículas dispersas, e à velocidade de aproximação. Para tais partículas a perspectiva de desvio da linha de corrente, e posterior deposição, ocorre nas regiões do meio filtrante onde as velocidades intersticiais são ainda mais baixas. Um dos modelos propostos para estimar a eficiência da difusão foi estabelecido, por meio do parâmetro adimensional r|D, materializado na equação 10.3 (Levich, 1962 apud Montgomery, 1985): Forças hidrodinâmicas A remoção de partículas de maiores dimensões pode também ocorrer pela ação das forças hidrodinâmicas decorrentes da diferença das velocidades tangenciais à superfície da partícula, assegurada pela laminaridade doescoamento. O consequente gradiente de velocidade produz diferença de pressão na direção perpendicular ao escoamento, impelindo a partícula para a região de velocidades mais baixas favorecendo a deposição na superfície dos grãos. Este mecanismo explica a remoção de partículas de maiores dimensões, cuja densidade próxima à da água minimiza o efeito da sedimentação, e cujas dimensões o da difusão. Impacto inercial Por fim, partículas de maiores dimensões e densidade podem adquirir quantidade de movimento suficiente, mantendo sua trajetória original, para se chocarem com os grãos e serem retidas, quando ocorrer a divergência das linhas de corrente na proximidade destes. Este mecanismo denomina-se impacto inercial e sua relevância foi estimada por Ives por meio do parâmetro adimensional E, conforme a equação 10.4: Mecanismos de aderência Diversas pesquisas confirmaram que a retenção de partículas no meio filtrante transcende à simples ação dos mecanismos de transporte. Como exemplo, para a filtração de suspensão de argila à taxa de 130 m3/m2.dia (1,5 mm/s) através de meio filtrante de areia obteve-se remoção da ordem de 20 % em termos de turbidez. Posteriormente, após coagulação com sais de ferro ou alumínio, e a consequente desestabilização das partículas, a eficiência elevou-se para 95 %, evidenciando a relevância dos mecanismos de aderência no desempenho das unidades de filtração (Kaufman, 1969 apud Di Bernardo, 1980). A atuação dos mecanismos de aderência fomenta a retenção das partículas suspensas afluentes às unidades filtrantes na superfície dos grãos ou por agregação às partículas anteriormente retidas. Estes mecanismos congregam forças de van der Waals, interações eletrostáticas, pontes químicas e adsorção específica. Forças de van der Waals O êxito da coagulação há de produzir a plena desestabilização das partículas reduzindo a magnitude das forças de repulsão eletrostáticas e favorecendo a supremacia das forças de van der Waals. Estas forças constituem-se sempre forças de atração, podendo existir entre partículas de mesma carga, neutras ou de cargas opostas, sendo, porém, seu campo de ação limitado a distâncias muito curtas. A grandeza das forças de van der Waals e, por conseguinte, a adesão das partículas ao meio filtrante são também governadas pela dimensão e densidade das partículas afluentes à unidade filtrante, tendendo a aumentar com a redução da distância entre as mesmas e os grãos. No entanto, tais forças exercem relativa importância no processo de adsorção entre partículas.
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