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Apostila Introdução à Microbiologia Profª Agnes Kiesling Casali Belo Horizonte 2015 INTRODUÇÃO À MICROBIOLOGIA Um curso de microbiologia é um curso de biologia avançada. Microbiologia é o estudo dos organismos vivos minúsculos. Micro significa muito pequeno, algo tão pequeno que precisa ser visualizado pelo microscópio (instrumento óptico utilizado para observar objetos muito pequenos). Microbiologia: Mikros (= pequeno) + Bio (= vida) + Logos (= ciência) A microbiologia envolve o estudo de organismos procarióticos (bactérias, archaeas), eucarióticos simples (algas, protozoários, fungos) e também os vírus. Lembre-se: Procarióticos: organismos sem membrana nuclear, sem mitocôndria, sem complexo de Golgi, sem retículo endoplasmático. Eucariótico: organismos com membrana nuclear (núcleo verdadeiro ou bem definido), com mitocôndria, com complexo de Golgi, com retículo endoplasmático. Classificação dos seres vivos Sistemas de classificação dos seres vivos Linnaeus (séc.18): reinos Animal e Vegetal Animal e Vegetal Haeckel (1866): introdução do reino Protista Animal, Vegetal e Protista Whittaker (1969): 5 reinos: divididos principalmente pelas características morfológicas e fisiológicas Monera:Procarióticos Protista:Eucarióticos unicelulares - Protozoários (sem parede celular) e Algas (com parede celular) Fungi:Eucarióticos aclorofilados Plantae:Vegetais Animalia: Animais Woese (1977): 3 domínios: sistema de classificação baseado principalmente em aspectos evolutivos (filogenética), a partir da comparação das seqüências de rRNA de diferentes organismos Archaea:Procarióticos Bacteria:Procarióticos Eukarya: Eucarióticos Célula procariótica - bactéria Célula eucariótica - animal Célula eucariótica - vegetal Segundo Woese (1977) os organismos são subdivididos em 3 domínios (contendo os 5 reinos de Whittaker), empregando-se dados associados ao caráter evolutivo (a princípio, acredita-se que estes 3 domínios divergiram a partir de um ancestral comum): Archaea São organismos procarióticos que, freqüentemente, são encontrados em ambientes cujas condições são bastante extremas. Muitos destes organismos são anaeróbios, vivendo em locais "inabitáveis" para os padrões humanos - fontes termais (com temperaturas acima de 100°C), águas com elevadíssimos teores de sal (até 5M de NaCl), em solos e águas extremamente ácidos ou alcalinos (espécies que vivem em pH 0, outras em pH 10) e muitas são metanogênicas. Bacteria São organismos procarióticos, anteriormente classificados como eubactérias, representadas pelos organismos patogênicos ao homem, e bactérias encontradas nas águas, solos e ambientes em geral. Dentre estas, temos as bactérias fotossintetizantes (cianobactérias) e as quimiossintetizantes (E. coli). Eukarya Compreende as algas, os protozoários e os fungos (além das plantas e animais). Os vírus são também assunto abordado em microbiologia, embora, formalmente, não exibam as características celulares, no sentido de não apresentarem metabolismo próprio. Como a maioria dos cientistas não considera os vírus seres vivos, estes são geralmente referidos como “partículas infecciosas”. História da microbiologia A microbiologia nasceu da especulação do homem sobre a origem da vida, sobre as fontes das doenças epidêmicas e transmissíveis, da putrefação da matéria e processos de fermentação. Esta área do conhecimento teve seu início com os relatos de Robert Hooke e Antony van Leeuwenhoek, que desenvolveram microscópios que possibilitaram as primeiras observações de bactérias e outros micro-organismos, além de diversos espécimes biológicos. Entre os mais significativos acontecimentos na história da microbiologia podemos citar o desenvolvimento do microscópio, os procedimentos de coloração Esquema do microscópio construído por Robert Hooke Réplica do microscópio construído por Leeuwenhoek bacteriana, as técnicas que tornaram possível cultivar micro-organismos em laboratório; e as etapas que provaram que micro-organismos específicos são responsáveis por determinadas doenças infecciosas. Robert Koch (1843-1910): descobriu as bactérias que causam a tuberculose (Mycobacterium tuberculosis) e a cólera (Vibrio cholerae). Os Postulados de Koch consistem em um procedimento científico para provar que um micro-organismo específico é a causa de uma doença infecciosa específica: 1. Um micro-organismo específico deve ser encontrado em todos os casos da doença e não deve estar presente em animais e seres humanos saudáveis; 2. O micro-organismo deve ser isolado a partir de animal ou ser humano doente e crescer em cultura pura no laboratório; 3. A mesma doença deve ser produzida quando o micro-organismo oriundo de cultura for inoculado em animais de laboratório saudáveis e suscetíveis; 4. O mesmo micro-organismo deve ser isolado dos animais experimentalmente infectados e crescer novamente em cultura pura. A Microbiologia na atualidade A definição clássica de "microbiologia" mostra-se bastante imprecisa, e até mesmo inadequada, frente a alguns dados da literatura publicados. Como exemplo pode-se citar duas premissas que já não podem mais ser consideradas como verdade absoluta na conceituação desta área de conhecimento: as dimensões dos micro-organismos e a natureza independente destes seres. Em 1999, na costa da Namíbia, foi descrito o isolamento de uma bactéria denominada Thiomargarita namibiensis que pode ser visualizada a olho nú, atingindo até cerca de 0,8 mm de comprimento e 0,1 a 0,3 mm de largura. Algumas bactérias encontram-se associadas, formando colônias, ou biofilmes (estruturas rígidas, adesivas, de natureza geralmente polissacarídica, que encontram-se fortemente ancoradas às superfícies, criando um ambiente protegido que possibilita o crescimento microbiano), estas passam a se comportar de forma social, exibindo divisão de tarefas e alterando seu perfil fisiológico de forma a apresentar uma cooperação que reflete-se em diferentes níveis metabólicos. Sabe- se que muitos genes de virulência são expressos somente quando a densidade populacional atinge um determinado ponto. Ubiqüidade dos micro-organismos Os micro-organismos são considerados ubíquos, significando que estão, praticamente, em todos os lugares. Em termos de habitat, os micro-organismos são encontrados em quase todos os ambientes, tanto na superfície, como no mar e subsolo. Desta forma, podemos isolar micro-organismos de fontes termais, com temperaturas atingindo até 130°C; de regiões polares, com temperaturas inferiores a -10°C; de ambientes extremamente ácidos (pH=1) ou básicos (pH=13). Alguns sobrevivem em ambientes extremamente pobres em nutrientes, assemelhando-se à água destilada. Há ainda aqueles encontrados no interior de rochas na Antártida. A associação homem-micro-organismo mostra-se com grande complexidade, com os micro-organismos habitando nosso organismo, em locais tais como a pele, intestinos, cavidade oral, nariz, ouvidos e trato geniturinário. Embora a grande maioria destes micro-organismos não cause qualquer dano, compondo a denominada “microbiota normal”, algumas vezes estes podem originar uma série de doenças, com maior ou menor gravidade. Nesta classe de organismos estão aqueles denominados patogênicos e potencialmente patogênicos. A importância dos micro-organismos Embora os micro-organismos sejam muito pequenos, desempenham importantes funçõesem nossa vida: - apresentamos na superfície e no interior de nosso corpo aproximadamente dez vezes mais micro-organismos do que o número total de células que constituem o nosso corpo. Esses micro-organismos são conhecidos como microbiota endógena e, em sua maioria, são benéficos para nós (inibem o crescimento de patógenos); - alguns micro-organismos produzem oxigênio pelo processo conhecido como fotossíntese (algas e cianobactérias); - muitos micro-organismos (decompositores ou saprófitas) estão envolvidos na decomposição de organismos mortos e produtos residuais de organismos vivos, muitas vezes ajudando na fertilização do solo; - alguns micro-organismos são capazes de realizar a decomposição de resíduos industriais (biorremediação); - muitos micro-organismos estão envolvidos nos ciclos dos elementos (por exemplo, do carbono, nitrogênio, oxigênio, enxofre e fósforo); - muitos micro-organismos são essenciais em várias indústrias de alimentos e bebidas; - certas bactérias e fungos produzem antibióticos; - durante muitos anos os micro-organismos foram utilizados como “modelos celulares”; - os micro-organismos causam duas categorias de doenças: as infecciosas e as intoxicações microbianas. Micro-organismos e doenças A grande maioria dos micro-organismos conhecidos não causa doença. Os micro-organismos causadores de doença são tecnicamente conhecidos como patógenos. E, somente cerca de 3% dos micro-organismos conhecidos são patogênicos. Alguns dos micro-organismos não patogênicos nos são benéficos, enquanto outros não apresentam qualquer efeito sobre nós. Os micro-organismos, eventualmente provocam doenças no homem, outros animais e plantas. Apesar dos enormes avanços em relação ao tratamento de doenças infecciosas, estas vêm se tornando novamente um tema preocupante, em virtude do crescente surgimento de linhagens bacterianas cada vez mais resistentes às drogas. Atualmente, a Organização Mundial da Saúde vem demonstrando crescente interesse nas doenças emergentes e re-emergentes, de origem infecciosa. A importância da microbiologia O declínio do Império Romano, com Justiniano (565 AC), foi acelerado por epidemias de peste bubônica e varíola. Durante a Idade Média varias novas epidemias se sucederam, sendo algumas amplamente disseminadas pelos diferentes continentes (tifo, varíola, sífilis, cólera e peste). Novas epidemias da peste ocorreram nos séculos XVI e XVII. A epidemia mais recente de peste bubônica ocorreu na China (1892) e Índia (1896) sendo responsável pela morte de 6 milhões de pessoas. Até a década de 30, este era o quadro, quando Alexander Fleming, incidentalmente, descobriu um composto produzido por um fungo do gênero Penicillium, que eliminava bactérias do gênero Staphylococcus, um micro- organismo que pode produzir uma vasta gama de doenças no homem. Este composto - denominado penicilina - teve um papel fundamental no desfecho da II Guerra Mundial, uma vez que passou a ser administrado às tropas aliadas, enquanto o exército alemão continuava a sofrer pesadas baixas no campo de batalha. Além destas epidemias, vale ressaltar a importância das diferentes epidemias de gripe que assolaram o mundo e que continuam a manifestar-se de forma bastante intensa até hoje. Temos ainda o problema mundial envolvendo a AIDS, o retorno da tuberculose (17 milhões de casos no Brasil), o surgimento da gripe aviária, o bioterrorismo e o aumento progressivo dos níveis de resistência aos agentes antimicrobianos que vários grupos de bactérias vêm apresentando atualmente. A microbiologia é uma área da Biologia que tem grande importância seja como ciência básica (estudos fisiológicos, bioquímicos e moleculares - modelo comparativo para seres superiores) ou aplicada (processos industriais, controle de doenças, controle de de pragas, produção de alimentos, etc.). Algumas áreas de estudo da microbiologia são: Odontologia - estudo de micro-organismos associados à placa dental, cárie dental e doenças periodontais. Estudos com abordagem preventiva. Medicina e Enfermagem - doenças infecciosas e infecções hospitalares. Nutrição - doenças transmitidas por alimentos, controle de qualidade de alimentos, produção de alimentos (queijos, bebidas). Biologia - aspectos básicos e biotecnológicos. Produção de antibióticos, hormônios (insulina, GH), enzimas (lipases, celulases), insumos (ácidos, álcool), despoluição (herbicidas, petróleo), biofilme, etc. Biotecnologia - uso de micro-organismos com finalidades industriais, como agentes de biodegradação, de limpeza ambiental, etc. Bibliografia BURTON, G.R.W.; ENGELKIRK, P.G. Microbiologia para as Ciências da Saúde. 7 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. 426p. MURRAY, P.R.; ROSENTHAL, K.S.; PFALLER, A. Microbiologia médica. 5 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006. 979p. PELCZAR, M.J.; CHAN, E.C.S.; KRIEG, N.R. Microbiologia: conceitos e aplicações. 2 ed. São Paulo: Makron Books, 1996. v. 1, 512p. TORTORA, G.I.; FUNKE, B.R.; CASE, C.L. Microbiologia. 8 ed. Porto Alegre: ArtMed, 2005. 894p. TRABULSI, L. R.D; ALTERTHUM, F. Microbiologia. 4 ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2004. 718p.
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