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DISCIPLINA: Ciência Política e Teoria do Estado - ARA0192 CURSO: Direito 1 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Tema: 1. Formação do Estado Nação Objetivos: Identificar a formação dos Estados Nacionais e do nacionalismo como ideologia política, fenômenos típicos da experiência histórica que chamamos de modernidade. Comparar as diversas revoluções sociais que, na modernidade, confrontaram a estrutura do Estado-nação. Em todos os planos de aula da disciplina de Ciência Política e Teoria do Estado e seus Temas estaremos conectados com o conteúdo digital que servirá de base essencial de nossos estudos. No plano de aula 02 estaremos conectados com os módulos 2 (A formação dos Estados Nacionais e do nacionalismo como ideologia política, fenômenos típicos da experiência histórica que chamamos de modernidade) e 3 (As diversas revoluções sociais que, na modernidade, confrontaram a estrutura do Estado-nação) do Tema 1: A Formação do Estado-nação. ATENÇÃO ALUNO/A: ACESSE O AMBIENTE VIRTUAL DA DISCIPLINA EM: https://estudante.estacio.br/login 2 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Situação-problema: O Estado Nacional, entendido como estrutura de poder centralizada e capaz de exercer soberania burocrática, política e militar sobre um território delimitado por fronteiras, é resultado da história europeia ocidental entre os séculos XIV e XVII. Nesse período, entende-se por Europa Ocidental, a aproximação de França e Inglaterra com a Península Ibérica, formada por Portugal e Espanha. Crises democráticas agudas, guerras civis religiosas, início da laicização das mentalidades e dos costumes, modernização das relações econômicas, urbanização. São essas as experiências que aconteceram em uma Europa Ocidental plural e extremamente diversificada, e que serviram de pano de fundo para o surgimento dos Estados Nacionais. A nação é um tipo de comunidade imaginada socialmente, construída de modo a fazer as pessoas pensarem sobre si próprias como parte de um grupo. A invenção da nação é de interesse direto do Estado, pois não há poder que consiga se sustentar apenas pela repressão, sem contar com nenhum consentimento. A afetividade e a identidade fomentadas pela simbologia da construção de identidades, nesse sentido, são fundamentais para a própria efetividade do poder público. Por isso, e essa foi uma das principais caraterísticas da história política do século XIX, o Estado investe tanto na invenção de tradições. Com base nessa problematização e a partir do estudo dos Módulos 2 e 3 do Tema 1 A Formação do Estado-nação, pergunta-se: o que significa a invenção das tradições? A afetividade e a identidade fomentadas pela simbologia identitária, nesse sentido, são fundamentais para a própria efetividade do poder público. Por isso, e essa foi uma das principais caraterísticas da história política do século XIX, o Estado investe tanto na “invenção de tradições”, como dizem os historiadores ingleses Eric Hobsbawm (1917-2012) e Terence Ranger (1929-2015). POR “TRADIÇÃO INVENTADA” ENTENDE-SE UM CONJUNTO DE PRÁTICAS, NORMALMENTE REGULADAS POR REGRAS TÁCITA OU ABERTAMENTE ACEITAS; TAIS PRÁTICAS, DE NATUREZA RITUAL OU SIMBÓLICA, VISAM INCULCAR CERTOS VALORES E NORMAS DE COMPORTAMENTO ATRAVÉS DA REPETIÇÃO, O QUE IMPLICA, AUTOMATICAMENTE, UMA CONTINUIDADE EM RELAÇÃO AO PASSADO. ALIÁS, SEMPRE QUE POSSÍVEL, TENTA-SE ESTABELECER CONTINUIDADE COM UM PASSADO HISTÓRICO APROPRIADO. 3 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação ESTADOS NACIONAIS E NACIONALISMO COMO IDEOLOGIA POLÍTICA DA MODERNIDADE A FORMAÇÃO DO ESTADO MODERNO O Estado Nacional, entendido como estrutura de poder centralizada e capaz de exercer soberania burocrática, política e militar sobre um território delimitado por fronteiras, é resultado da história europeia ocidental entre os séculos XIV e XVII. Tal Estado Moderno é aquele que, pela primeira vez, mostrou-se dotado de um poder próprio soberano e independente de quaisquer outros poderes, exercido dentro das fronteiras do seu território e sob sua população, já que a ideia de soberania una e indivisível somente surgiu com o fim do feudalismo e com o início do absolutismo monárquico. Este Estado Moderno, aqui vislumbrado como o Estado Nacional propriamente dito, surgiu nos momentos derradeiros das guerras religiosas, com o colapso do que costuma se chamar de Estado Medieval. Assim, os três elementos essenciais só irão coexistir após a superação da concepção dual de poder do Estado Feudal, cuja linha dominante era predominância das guerras religiosas. Dentro do possível, sempre faremos referência à visão de relevantes autores brasileiros dedicados aos temas, a fim de que possam ir se familiarizando com seus nomes. Assim, na direção do que afirmam Lenio Streck e Bolzan de Morais, podemos perceber que as deficiências da sociedade política medieval são determinantes para estabelecer as características fundamentais do Estado Moderno, ou seja: o território e o povo, como elementos materiais e o governo, o poder, a autoridade ou o soberano, como seus elementos formais. Embora tenhamos dado ênfase a estes três elementos, sempre é bom ressaltar que, para alguns autores, existe um quarto elemento: a finalidade. Para estes, o Estado deve ter uma finalidade peculiar, que justifique sua existência. No caminho percorrido anteriormente poderíamos dizer, por exemplo, que para Hobbes a finalidade seria garantir a vida, a ordem e segurança; em Locke, proteger a vida, a liberdade e a propriedade; e em Rousseau, a finalidade seria garantir a autonomia coletiva dos cidadãos. Mas como se deu o surgimento deste Estado Moderno? Desde sua origem, que remonta aos acordos de Paz de Vestfália, de 1648, o Estado absolutista buscou colocar nas mãos do monarca o poder característico da autoridade estatal, um poder de imperium, vale dizer, um direito absoluto do Rei sobre todos aqueles que se encontrassem no território do Estado. Assim, a noção de soberania cristaliza-se, historicamente, como única fonte do exercício do poder político, isto é, um poder uno e indivisível, que é juridicamente incontrastável. Em outros termos, é possível afirmar que o conceito de soberania una e indivisível, com base na capacidade de estabelecer uma única ordem jurídica válida para todos, afastou a concepção de poder fragmentado, típica do período Medieval. A Paz de Vestfália, de 1648, diz respeito a um conjunto de tratados que encerrou a Guerra dos Trinta Anos, cujo início havia se dado em razão da rivalidade política entre o Imperador Habsburgo do Sacro Império Romano-Germânico e as cidades-Estado luteranas e calvinistas no território do norte da atual Alemanha, que se opunham ao seu controle. Esta guerra envolveu, por um lado, as potências católicas administradas pelos Habsburgos (Espanha e Áustria), por outro lado, os Estados protestantes escandinavos e a França (que embora católica, temia o domínio dos Habsburgo na Europa). Vê-se que os embates políticos e religiosos se misturaram neste momento histórico. Por isso, entende-se que a Paz de Vestfália, além de consolidar a independência dos Países Baixos, abalou o poder do Imperador do Sacro Império, concedendo aos governantes dos estados germânicos a possibilidade de estabelecer a religião oficial dos territórios sem interferência externa. Expliquemos melhor este ponto. No período medieval não temos essa centralidade no exercício do poder. Com efeito, durante a Idade Média, essa fragmentação de poder é acentuada. A quem o indivíduo deve obedecer? ao rei? À Igreja? ao senhor feudal? às corporações de ofício? Eram muitas as fontes normativas, sem que houvesse uma organização centralizada entre elas. Essa disputa de poder evidenciava-se de forma mais aguda na disputa entre o poder temporal (do Imperador) e o poder eclesiástico (do Papa) pela supremacia política. A partir do declínio do Império Romano, a ordem medieval vivenciou o crescente poder político da Igreja Católica, em virtude do cenário de fragmentação política advindo das relações devassalagem do feudalismo europeu de então. Ao mesmo tempo, as relações entre os poderes temporal e espiritual durante a Idade Média foram regidas pela doutrina segundo a qual o Papa seria detentor de um poder, transmitido diretamente por Deus, o que o autorizava a intervir no poder temporal dos príncipes nas hipóteses de não observância do cumprimento da justiça. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, no decorrer da Idade Média, floresceu a ideia de que a autoridade dos governantes se fundava em um pacto, no qual, enquanto o povo se sujeitava a obedecer ao príncipe, este se comprometeria a governar com justiça, sendo Deus o árbitro do fiel cumprimento do contrato. Ora, mas quem poderia falar em nome de Deus? Sim, o Papa, Seu representante na Terra. Por isso, violando o príncipe a obrigação de justiça, exoneravam-se os súditos da obediência devida, pela intervenção papal. Em um contexto como este, vê-se que a autoridade do poder temporal do rei vale pouco em comparação com o poder espiritual emanado pela Igreja. É por este motivo, então, que, durante o período do feudalismo, não se pode ainda falar em Estado Nacional, em sua acepção mais própria. Somente após a celebração da citada Paz de Vestfália, de 1648, é que nasce o Estado Moderno, que pouco a pouco vai centralizando o poder nas mãos do monarca. Com isso vê-se que o Estado Moderno reveste-se, inicialmente, da roupagem absolutista. Isto significa dizer que a primeira versão do Estado Moderno é a configuração do Estado Absoluto. Neste contexto, é bom que se diga, o poder eclesiástico do Papa vai aos poucos sucumbindo diante do crescente poder temporal do monarca absoluto, criando as condições para que o conceito de soberania seja reconhecido como uno e indivisível. 4 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Por todos esses motivos é necessário que atentemos para a importância da Paz de Vestfália, especialmente à transformação paradigmática que produz e a arquitetura conceitual que traz em seu bojo. Pela primeira vez, no lento processo de evolução da formação do Estado Moderno, tem-se aquilo que se poderia chamar de percepção soberana de um Estado Nacional em relação aos demais. É que a temática reporta a outro tema fundamental: a formação de uma sociedade internacional composta de Estados territoriais soberanos. Esta é a antítese da ordem medieval, cuja arquitetura era calcada na fragmentação do poder. Na direção do que afirmam Hildebrando Accioly e Celso Mello, podemos concluir que é com base no pactuado em Vestfália que se cria um Direito Internacional propriamente dito, como o concebemos hoje, aplicável às relações entre nações estrangeiras, em que, ao menos teoricamente, é reconhecido o princípio da igualdade jurídica dos Estados, segundo o qual a lógica de relacionamento interestatal é o respeito mútuo, consolidado na impenetrabilidade da ordem jurídica nacional. Como bem alerta Norberto Bobbio, com a maestria reflexiva que lhe é peculiar, contra a fragmentada sociedade medieval, “as grandes monarquias absolutas do início da Idade Moderna se formam através de um duplo processo de unificação: 1) unificação de todas as fontes de produção jurídica na lei, como expressão da vontade do soberano (...) 2) unificação de todos os ordenamentos jurídicos superiores e inferiores ao Estado no ordenamento jurídico estatal, cuja expressão máxima é a vontade do príncipe”. Nesta mesma direção, outro grande nome do Século XX, Hans Kelsen, destacando a necessidade de coexistência dos três elementos essenciais do Estado (povo, território e soberania una e indivisível), relaciona Direito e Estado. Segundo o grande jurista vienense, se o Estado é uma ordem jurídica (lembremo-nos da concepção jurídica de Estado, anteriormente analisada), deve ser possível apresentar todas as propriedades do Estado como propriedades de uma ordem jurídica, sendo que as propriedades características de um Estado distingue três elementos: seu território, seu povo e seu poder. Em síntese: podemos dizer que o modelo westphaliano de Estado simboliza, a um só tempo: a) a passagem do Estado Medieval para o Estado Absoluto; b) a criação do Direito Internacional Público, tal qual é concebido nos dias atuais; c) o nascimento do Estado Nacional propriamente dito, formado a partir da coexistência dos seus três grandes elementos essenciais (povo, território e soberania una e indivisível). DIR INTERN PUBL: Trata-se de uma disciplina jurídica que estabelece, de forma regulatória, as relações entre os Estados e as organizações internacionais, bem como seus indivíduos, respeitando a ordem mundial dentro das diretrizes diplomáticas estabelecidas. 5 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Entre 1618 e 1648, a Europa conheceu uma das guerras mais devastadoras de sua História: a “Guerra dos Trinta Anos”. No início, o conflito era fundamentalmente religioso (disputas envolvendo católicos e protestantes) e concentrou-se nas diversas unidades políticas germânicas. Com o tempo, no entanto, os combates disseminaram-se pelo continente e logo passaram a levar em conta outros interesses e causas, como a expansão de territórios e a busca por hegemonia política na região. Tropas treinadas, uso da metalurgia, academias militares, amplo uso de exércitos mercenários e novas armas, tais como canhões móveis e mosquetões. A Guerra dos Trinta Anos foi, por conta disso tudo, uma guerra com um custo humano e material altíssimo. Os cálculos mais ponderados, sublinha o historiador Henrique Carneiro, apontam para quatro milhões de mortos no conflito. O número que pode parecer discreto se comparado com os mais de 45 milhões de mortos na Segunda Guerra Mundial, mas tendo a Europa do século XVII uma população de cerca de 20 milhões de pessoas, a Guerra dos Trinta anos foi proporcionalmente a guerra mais mortal do continente – 1/5 dos europeus teriam perecido nela. Em janeiro de 1648, depois de três fatigantes anos de conversas a fim de viabilizar uma conferência de paz e após um longo lastro de morte, destruição e esgotamento econômico, centenas de negociadores das mais de 100 unidades políticas envolvidas na Guerra dos Trinta Anos se reuniram nas cidades vestfalianas de Osnabrück e Münster (atual Alemanha) para selar um acordo de paz. Os acordos ali firmados (11 no total) consumiram voluptuosos recursos financeiros, levaram dez meses para serem todos costurados, mas a guerra foi, enfim, foi encerrada. Os chamados “Tratados de Vestfália” (também conhecidos como “Tratados de Münster e Osnabrück” ou “Paz de Vestfália”), no entanto, foram importantes não só porque colocaram um ponto final na guerra, mas porque a partir deles também se forjou um novo sistema internacional para a Europa. Como explica Valerio de Oliveira Mazzuoli, muitos autores consideram que antes da Paz de Vestfália não existia um Direito Internacional propriamente dito, que codificasse, por exemplo, leis pertinentes à navegação, à formação de forças militares permanentes ou ainda à instalação de embaixadas. Também não existia uma sociedade internacional com poder político para sujeitar os Estados ao cumprimento de suas regras de conduta. Neste sentido, Henrique Carneiro resume a importância dos 11 tratados firmados em 1648 afirmando que: “toda a política moderna e contemporânea, baseada no reconhecimento da legitimidade dos Estados e na constituição de um conjunto político de nações que se reconhecem como parte de um sistema em que rege um direito internacional, deriva do modelo criado e formalizado a partir da Paz de Vestfália”. Feito este panorama histórico e apresentada uma visão genérica do modelo de Estado Moderno, estabelecido pela Paz de Vestfália, passamos, em seguida, a analisar cada um dos elementos do Estado, iniciando pelo elemento “território”. Conteudo digital Nesse período, entende-se por “Europa Ocidental”, segundo o historiador inglês Perry Anderson (2004), a aproximação de França e Inglaterra com a Península Ibérica, formada por Portugal e Espanha. Crises democráticas agudas, guerrascivis religiosas, início da laicização das mentalidades e dos costumes, modernização das relações econômicas, urbanização. São essas as experiências que aconteceram em uma Europa Ocidental plural e extremamente diversificada, e que serviram de pano de fundo para o surgimento dos Estados Nacionais. Começar a contar a história da origem dos Estados Nacionais nos convida, segundo Guy Fourquin, a entender a dinâmica da prosperidade material vivida pela Europa no século XI. O crescimento produtivo aumentou a quantidade de alimentos disponíveis para o comércio, fazendo com que seus preços dos víveres alimentícios diminuíssem e a qualidade de vida aumentasse, resultando no crescimento demográfico e, consequentemente, no crescimento das cidades e na intensificação da atividade comercial. E essa evolução também pode ser percebida nos âmbitos artístico e intelectual. Na vida cultural, observou-se notória expansão das atividades artísticas e intelectuais, com a difusão de universidades pelo continente. Tratava-se, portanto, de um ciclo virtuoso experimentado em graus distintos em diversas regiões da Europa e que aponta para um cenário de desenvolvimento econômico, prosperidade material e grandeza cultural, bem diferente da imagem de uma Idade Média atrasada e decadente, que muitas vezes modula o imaginário histórico coletivo. No Brasil, a identidade monárquica é tão forte, que, mesmo na tentativa de ruptura republicana, as cores e muitos dos símbolos foram mantidos. Agora, uma casa aristocrática específica detinha o poder sobre as outras e sobre o território. Surgiu, assim, o Estado Nacional, impulsionado pela tentativa de salvar as hierarquias tradicionais da destruição, preservando o máximo possível a ordem social feudal. Para isso, entretanto, foi necessário mudar, e a nobreza perdeu suas antigas liberdades, passando a estar subordinada ao rei. Desse jeito foi possível impor ao campesinato a “segunda servidão”, novamente utilizando as palavras de Perry Anderson. Essa foi a contradição que caracterizou a formação dos Estados Nacionais. Para salvar a ordem feudal, o novo arranjo político deixou aquele que era um dos seus valores fundamentais: a autarquia aristocrática. Surgiu, junto com o Estado, um novo tipo de nobreza. Não mais aquela que vivia no campo, com hábitos rústicos e no controle de seu exército particular. O nobre deixou de ser o “senhor da guerra” para tornar-se o cortesão, sedentarizado, desarmado, vivendo na corte, sob controle do trono. 6 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação FORMAÇÃO DOS ESTADOS MODERNOS: PORTUGAL Portugal foi o primeiro caso de modernidade política na Europa, no sentido do termo, com sistema fiscal, exército e burocracia em dimensão centralizada, supralocal; O Estado surgiu em Portugal como um dos resultados de experiências de intensa movimentação militar e guerra civil provocadas pelo cenário geral da crise feudal. FORMAÇÃO DOS ESTADOS MODERNOS: ESPANHA O caso do Estado Nacional espanhol remete à principal experiência imperialista dos primeiros anos da modernidade, visto o poder que a Espanha exerceu sobre grande parte do continente americano e sobre o extenso território na própria Europa. CONTEUDO DIGITAL: PORTUGAL: Portugal foi o primeiro país a buscar fora da Europa solução para os problemas que estava passando. A descoberta de um novo caminho marítimo para as Índias fez-se urgente, pois eliminaria a intermediação muçulmana no Mediterrâneo e o monopólio das cidades italianas, Gênova e Veneza, e do comércio oriental. Observamos que Portugal se destacava dos demais países, pois era o lugar da perfeita movimentação de ideias. Com a Dinastia de Borgonha formou-se o estado nacional, e com a dinastia de Avis promoveu-se a expansão. Segundo Nobert Elias, a Nação lusitana tornou-se forte politicamente e foi o primeiro país europeu a constituir um Estado Moderno, dedicado à atividade comercial-marítima, assumindo práticas mercantilistas. Portugal percebeu rapidamente que o ocidente não se definia mais pela religião romana ou pela cultura latina, mas também pela liberdade política. A economia, que era baseada exclusivamente na agricultura, perdeu importância para outras atividades. As cidades portuárias cresceram e com isso surgiram novas profissões, as pequenas indústrias artesanais começaram a expandir e a imprensa foi aperfeiçoada. Ocorreu uma significativa transformação social nas pequenas cidades, composta por mercadores, comerciantes e artesãos, as quais passaram a “desafiar” o poder dos nobres. O homem lusitano começou a se redescobrir, mudar de valores e passou a ter uma nova visão do mundo e uma nova corrente de ideias, de novas sensibilidades, de novos costumes, de novas formas de fazer política. A ideia de que o destino estava traçado por forças superiores, a qual caracterizava o homem como ser passivo, foi substituída gradativamente pela convicção de que ele era o dono de seu próprio destino. A expansão portuguesa foi toda projetada. Sua preparação foi resultado de um detalhado estudo que deu origem à ideia desenvolvida pela Escola de Sagres, de chegar às Índias contornando a África; e Portugal foi mais longe, não se comunicou somente com a Europa ou o Norte da África, mas experimentara outros espaços como o “Brasil”, a Índia e o Extremo Oriente. Neste contexto, a Nação lusitana abriu-se para um mundo novo, ou seja, para as novas terras. O que era tão distante, com a expansão marítima ficou muito próximo. Como vimos, a unidade política portuguesa era forte; os reis eram bem assessorados, tinham informantes e contavam também com os relatos de viagens e assim sabiam com presteza onde navegar e aportar. As notícias que chegavam ao país certamente eram de cunho estrategista, informativo e faziam com que o rei acompanhasse, mesmo de longe, tudo o que se passava nas terras recém-descobertas e conquistadas por Portugal. Ao contrário do que pensamos ou acreditamos, a política portuguesa era ardilosa e os acordos com outros territórios aliados ou dominados, bem preparados. A existência de condições políticas e institucionais favoráveis foi fundamental para o sucesso dessa empreitada. Assim, as constantes navegações possibilitaram aos portugueses perceberem novos espaços, realidades, comportamentos sociais e culturais. Essas também possibilitaram a vivência de realidades até então desconhecidas. As velhas concepções medievais conviveram com as novas tendências modernas, mas o Estado Medieval Lusitano despareceu lentamente diante do Estado Moderno Português. Estado Moderno em Portugal O primeiro reino a utilizar o modelo de Estado Moderno foi Portugal. Ali, a centralização política ocorreu como consequência de campanhas militares da Guerra da Reconquista. O conflito, travado contra os muçulmanos, garantiu ainda a independência de Castela no século XII. A Revolução de Avis garantiu a consolidação do Estado Moderno em Portugal em 1385. Com apoio da burguesia, D. João, o Mestre de Avis, venceu Dona Leonor Teles, que tinha o apoio da nobreza portuguesa e do reino de Castela. Com uma série de vitórias na que ficou conhecida como Revolução de Avis, Dom João se tornou rei de Portugal e logo não somente favoreceu a burguesia, como incentivou a navegação, o comércio e a organização dos impostos. D. João foi coroado rei de Portugal e essa organização está entre os fatores decisivos para a expansão marítima europeia. Portugal à época, embora minúscula, era a única nação plenamente unificada e com barcos navegando em busca de novos horizontes e riquezas para formar o primeiro império global do planeta. ESPANHA: O início da formação da Monarquia Espanhola também se deu com a Guerra de Reconquista. No período havia quatro reinos, sendo Castela e Aragão dois deles. O primeiro governado pelo rei Fernando e o segundo pela rainha Isabel. Os dois se casaram e então formou-se um Estado Nacional e também como em Portugal, teve início uma expansão marítima. ESPANHA - Nos séculos XI e XII, surgiram na Espanha os reinos de Leão, Castela, Navarra e Aragão,que disputavam territórios entre si. Nessas disputas de reinos, Castela e Aragão anexaram Leão e Navarra. Em 1469 ocorreu a unificação definitiva entre esses reinos, com o casamento de Fernando, rei de Aragão, com Isabel, de Castela, os chamados "reis católicos". A união desses reinos fortaleceu a luta dos espanhóis contra Granada, o último reino mouro (muçulmano) na região da península. Em 1492, ocorre a Tomada de Granada, que foi a expulsão definitiva dos muçulmanos. A partir daí, a Espanha consolida o seu poder e tornar-se um dos grandes impérios marítimos da Idade Moderna, e parte em busca de novas terras. Justamente, no mesmo ano, Colombo chega às Américas financiado pelos "reis católicos" Esse mapa mostra a formação da Espanha e Portugal à partir das Guerras de Reconquista, ou a expulsão dos mouros da península ibérica. A “Reconquista da Península Ibérica” ou “Retomada Cristã” foi um movimento ibérico cristão de cunho militar e religioso, que opôs cristão e os muçulmanos numa guerra secular pela recuperação dos territórios perdidos para os conquistadores árabes na Península Ibérica, durante o século VIII, quando os muçulmanos invadiram a península e estabeleceram um domínio que durou de 711 a 1492. 7 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação FORMAÇÃO DOS ESTADOS MODERNOS: FRANCESES X INGLESES Na França, o Estado Nacional formou-se na transição do século XIV para o século XV, a partir da sobreposição de duas situações de crise: a crise estrutural do feudalismo e a famosa Guerra dos Cem Anos (1339-1453) contra a Inglaterra. Já na Inglaterra, a formação do Estado Nacional deu-se de maneira distinta quando comparada à situação dos países continentais (Portugal, Espanha e França). Após perder a guerra para os franceses, a Inglaterra, que tinha tradição de descentralização político-administrativa, foi dividida por uma guerra civil travada entre duas de suas principais casas aristocráticas. Na França, o Estado Nacional formou-se na transição do século XIV para o século XV, a partir da sobreposição de duas situações de crise: a crise estrutural do feudalismo e a famosa Guerra dos Cem Anos (1339-1453) contra a Inglaterra. Em desvantagem na guerra e pressionada pela crise das hierarquias feudais, a nobreza francesa permitiu que o rei Carlos VII concentrasse em si a talha, que era o imposto de sangue que o campesinato pagava à aristocracia em forma de serviços militares esporádicos. Nasceu assim a “talha real”, que direcionou à dinastia a prerrogativa de apropriar-se do serviço militar dos camponeses. O embrião da unificação inglesa ocorreu com a última invasão bem-sucedida da Grã-Bretanha ainda na segunda metade do século XI. Realizada pelo descendente viking, o normando Guilherme, o Conquistador, em 1066, tentou-se unificar a região de modo a conseguir estabilidade. Temos aqui, também segundo Perry Anderson, o evento que fundou o exército moderno, ao centralizar no rei o direito exclusivo de convocar e coordenar a força militar. A nobreza foi, então, desarmada, sedentarizada, em um ato voluntário, consentido, por uma questão de sobrevivência. Como se diz popularmente: “entregou os anéis para não perder os dedos”. Já na Inglaterra... A formação do Estado Nacional deu-se de maneira distinta quando comparada à situação dos países continentais (Portugal, Espanha e França). Para entender essas particularidades, precisamos conhecer a situação de quase colapso na qual se encontrava a Inglaterra na segunda metade do século XV. Após perder a guerra para os franceses, a Inglaterra, que tinha tradição de descentralização político-administrativa, foi dividida por uma guerra civil travada entre duas de suas principais casas aristocráticas. Foi a chamada Guerra das Duas Rosas (1450-1485), envolvendo os York e os Lancaster. A guerra foi tão longa e sangrenta que praticamente extinguiu as duas casas, abrindo um vazio de poder que foi ocupado por outra dinastia, a dos Tudor. Entretanto, séculos de guerras, como disputas internas e as Cruzadas, fragilizaram os senhores feudais, visto que estes (e o povo) eram constantemente cobrados por impostos cada vez mais proibitivos. Somente no ano de 1215, com a assinatura da Magna Carta, o rei João Sem Terra assinou (forçadamente) o tratado a dividir o poder com o que viria a se tornar o parlamento britânico séculos depois. Com esse controle, os impostos deveriam ser aprovados pela nobreza e pelo clero, nascendo, assim, um controle de poder no que viria a se tornar a Inglaterra (e que tantos vemos na tevê: o parlamento). Posteriormente, já no século XIV, com a Guerra dos Cem Anos (contra a França) e principalmente a Guerra das Rosas (guerra “civil” inglesa), além da Peste Negra, fome e revoltas camponesas, contribuíram para o declínio da nobreza. De modo similar à unificação inglesa, a francesa também decorreu da guerra, sendo a famosa e destrutiva Guerra dos Cem Anos (1337–1453), na qual, a muito custo, a França conseguiu repelir as pretensões dos ingleses. Também apoiado pela emergente burguesia, o rei Carlos VII, saiu fortalecido do conflito e com um exército bem-preparado, o que comprovou que um exército nacional bem equipado e profissional se firmaria para pôr ordem na França, como ocorreria em diversas regiões Contudo, diferentemente da Inglaterra, a França não conseguiu implementar um sistema de freios e contrapesos minimamente adequados e durável para evitar eventuais abusos de poder por parte do monarca reinante. O rei francês, qualquer que fosse, havia se tornado o poder máximo e indiscutível devido ao poder especialmente centralizado e que ficaria caracterizado como o Antigo Regime ― o Absolutismo. Ainda na França, em 1643, ascendeu ao poder o rei Luís XIV, o famoso rei-Sol que personificou o Absolutismo global em sua figura ao cultivar elementos que buscavam desenhá-lo à imagem de Deus. Contudo, nem mesmo o rei-Sol se atrevia a rivalizar com a burguesia, visto que esta havia se tornado amplamente poderosa e lhe trazia grandes fortuna 8 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação ELEMENTOS ESSENCIAIS DO ESTADO Território: a Delimitação Espacial do Poder Noções introdutórias: Como afirmamos anteriormente, o território, juntamente com o povo, perfaz o elemento material do Estado. Isso significa dizer que o território é componente material da estrutura do Estado, indispensável à sua existência (lembremo-nos do conceito de “essencial”!), pois é a base geográfica do poder estatal, a base física sobre a qual o Estado irá exercer sua jurisdição soberana. É nesse sentido que a ideia de território fixa a jurisdição do Estado, aqui compreendida como os limites dentro dos quais se exerce a soberania do Estado. Adota-se, então, a definição de Ferrucio Pergolesi, que estabelece ser o território “a parte do globo terrestre na qual se acha efetivamente fixado o elemento populacional, com exclusão da soberania de qualquer outro Estado”. Em essência, este conceito de território, enquanto delimitação espacial do poder, projeta a ideia de que a soberania se estende sobre o solo, o subsolo, as águas interiores, o mar territorial e o espaço aéreo sobrejacente, perfazendo assim o caráter multidimensional do território. Vale, portanto, examinarmos com maiores detalhes este citado aspecto multidimensional do conceito de território. Realmente, não resta nenhuma dúvida da importância dessa visão multidimensional do território, uma vez que mostra que a base física delimitadora da atuação jurisdicional do Estado não se restringe ao elemento terrestre, podendo ainda incluir os espaços marítimo e aéreo, bem como áreas destacáveis do núcleo territorial do Estado. Com isso queremos dizer que o conceito de território não precisa ser contínuo, isto é, a base física dentro da qual se exerce a soberania estatal pode ou não ser contínua, englobando os espaços geográficos destacáveis da superfície terrestre principal do Estado. Pode-se afirmar, então, que a dimensão espacial da validade de atuação jurídica do Estado, ou seja, a zona de impenetrabilidadeda ordem jurídica de qualquer outra entidade política (área interditada para qualquer ação soberana de outro Estado), engloba a superfície terrestre, o espaço aéreo, as águas territoriais, o subsolo terrestre e marinho, os rios, lagos, baías, bacias, golfos, enclaves e qualquer outro espaço destacável do núcleo central do Estado. Quando falamos de “jurisdição territorial do Estado” estamos nos referindo à ideia de impenetrabilidade de qualquer outra ordem jurídica (de outros Estados) que não seja a sua própria, sobre toda a base física - contínua ou não -, levando em conta do ponto de vista espacial as três dimensões: terrestre, marítima e aérea. O território e o poder de império do Estado: a ideia de que o território é a base geográfica do poder surgiu em um contexto de superação do feudalismo em que se passou a propugnar pela implantação de uma ordem jurídica única de soberania incontrastável, absoluta, seja no plano interno, seja no plano internacional. A partir do surgimento do que estamos denominando “Estado westfaliano”, o conceito de território passou a ser associado diretamente a um poder de império, dotado de latitude jurídico-política capaz de impor coercitivamente a vontade do Estado. Por isso, quando falamos de “jurisdição territorial do Estado” estamos nos referindo à ideia de impenetrabilidade de qualquer outra ordem jurídica (de outros Estados) que não seja a sua própria, sobre toda a base física - contínua ou não -, levando em conta do ponto de vista espacial as três dimensões: terrestre, marítima e aérea. Neste espaço, somente ele pode exercer soberania. Pela importância da questão, é importante examinar com atenção o contencioso envolvendo as Ilhas Malvinas no Atlântico Sul, região com imensas reservas de petróleo, que se encontra em disputa entre argentinos e ingleses. Embora esteja situada bem mais próxima da Costa Argentina, os ingleses alegam que ocupam as Ilhas Falklands (denominação usada por eles) desde 1883. A Argentina nunca aceitou esta ocupação e, em abril de 1982, resolveu retomar as Ilhas Malvinas empregando força militar, gerando a tão propalada Guerra das Malvinas. A Grã-Bretanha reagiu prontamente e, com o apoio dos Estados Unidos, recuperou o controle da região, obrigando os argentinos à rendição. Em termos geopolíticos, a Guerra das Malvinas representou um divisor de águas com relação à integração sul-americana. É que o Brasil, mesmo que de forma discreta, apoiou a posição argentina, deixando para trás uma antiga rivalidade cultivada no decorrer da história. Com isso, abriu-se a perspectiva de cooperação entre os dois países, que resultaria, mais adiante, na criação do Mercosul. Em suma, procurou-se demonstrar que a delimitação espacial do poder tem múltiplas dimensões. Mais: o conceito de território, na condição de base físicogeográfica delimitadora da ação soberana do próprio Estado, admite a descontinuidade geográfica, como é o caso das Ilhas Malvinas. Porém, o que se deve deixar claro é que o que não se mostra de forma alguma possível é a existência de um mesmo território sob a convivência de duas soberanias distintas. Com efeito, como já tivemos a oportunidade de examinar, é inadmissível a divisão do exercício da soberania diante dos princípios da unidade e da indivisibilidade do poder de império do Estado. O território e o poder de império do Estado No mundo antigo (Cidade–Estado) e na Idade Média (concepção medieval de Estado), a noção de território como elemento essencial do Estado não existia. Assim sendo, é importante compreender que somente com o Estado Moderno é que o território passou a ser considerado como elemento essencial do Estado. Desde então, a compreensão do que vem a ser Estado tem por pressuposto a existência de um território. 9 O território, juntamente com o povo, perfaz o elemento material do Estado. A ideia de território fixa a jurisdição do Estado, aqui compreendida como os limites dentro dos quais se exerce a soberania do Estado. “A parte do globo terrestre na qual se acha efetivamente fixado o elemento populacional, com exclusão da soberania de qualquer outro Estado”. Em essência, este conceito de território, enquanto delimitação espacial do poder, projeta a ideia de que a soberania se estende sobre o solo, o subsolo, as águas interiores, o mar territorial e o espaço aéreo sobrejacente, perfazendo assim o caráter multidimensional do território. SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Reflexões: No âmbito da demarcação das linhas essenciais do Estado, há quem levante a questão sobre a possibilidade de se reconhecer a existência de um Estado sem território. Nesse sentido, deve-se colocar o problema de ser ou não o território elemento essencial do Estado. Ou seja, existe Estado sem território ou não? O território é patrimônio do povo ou é propriedade do Estado? Existiria um limite mínimo de extensão para que o Estado seja reconhecido como tal? Dalmo de Abreu Dallari lembra que a quase totalidade dos autores concorda em reconhecer o território como indispensável para a existência do Estado, mesmo que a partir de diferentes argumentos. Enquanto para muitos deles o território é elemento material constitutivo essencial do Estado, há quem aceite a base territorial como condição necessária exterior ao Estado, afirmando que, embora necessária, esta base representa tão somente o quadro natural no qual os governantes exercem suas funções. Embora não devamos deixar de refletir sobre esta última posição, a verdade é que entendemos (na direção seguida pela maior parte dos autores) que o território é sim elemento essencial do Estado, de acordo com a doutrina majoritária. Na linha do que afirmou Hans Kelsen, a delimitação territorial é uma necessidade, pois torna possível a vigência simultânea de diversas ordens estatais. Outro ponto relevante: há que se reconhecer que a perda temporária do território não o desqualifica como elemento essencial, ou seja, o Estado continuará a existir enquanto não se caracterizar que esta perda foi definitiva, sem possibilidade de reintegração do território perdido. Nesse caso, ficando evidenciada a perda definitiva, segundo o percurso teórico por nós seguido, não existiria Estado, pois ausente sua base territorial. O mesmo raciocínio deve valer para perdas parciais de território, seja por alienação, seja por outro motivo qualquer. Alguns pontos são interessantes de serem abordados. Por exemplo: o território é patrimônio do povo ou é propriedade do Estado? Nos dias atuais, seguindo uma linha de respeito à pessoa, não há nenhuma divergência doutrinária no sentido de reconhecer que o território é patrimônio do povo e não propriedade e do Estado. Porém, há de se ter cuidado com a extensão a ser dada a esta formulação teórica, pois havendo interesse desse último (Estado), o território pode até ser alienado parcialmente, ou mesmo, em circunstâncias excepcionais de crise (Estado de Defesa ou de Sítio) ser usado com imposição de limites aos direitos de particulares sobre porções determinadas. Outra questão: existiria um limite mínimo de extensão para que o Estado seja reconhecido como tal? Não, não existe regra internacional que quantifique o mínimo de extensão territorial que um determinado Estado deva possuir. Nesse sentido, basta lembrar o caso do Vaticano, cujo território ínfimo, vale dizer, 0,44 km², está situado dentro da cidade italiana de Roma. E há outros muito pequenos como, entre os mais conhecidos, Mônaco, com 2 km² e San Marino com 62 km². 10 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Povo: Traços Característicos e Distintivos O conceito de povo em seu sentido jurídico-político: O conceito jurídico-político de povo está relacionado ao vínculo da nacionalidade entre a pessoa e o Estado e sua aceitação como elemento essencial para a constituição do Estado é unânime. Portanto, entende-se por “povo” o conjunto de indivíduos que em um dado momento se unem para constituir o Estado, estabelecendo, assim, um vínculo jurídico de caráter permanente. O “povo” será sempre oelemento humano do Estado e, na verdade, a razão de ser deste. Assim, é ele o elemento essencial que possibilita que o Estado seja um ente dotado de vontade, o que é fundamental no aperfeiçoamento de algumas relações jurídico-políticas que desta não prescindem. O segundo elemento essencial material do Estado é o povo. O termo “povo” tem uso amplo e indiscriminado e acaba se confundindo com outros conceitos que lhe são completamente apartados, tais como população e nação. Por isso é importante que iniciemos nossa análise procurando, a partir de um grande esforço de sistematização, uma maneira de distingui-lo desses outros conceitos, evitando, assim, deformações conceituais. A noção jurídica de povo o diferencia do conceito de população. É nesse sentido que surge a seguinte controvérsia: para uns o povo é o elemento essencial do Estado, enquanto para outros é a população que se configura como elemento essencial de formação do Estado. Para que possamos adentrar na solução deste problema teórico, é necessário que estabeleçamos esta diferenciação. O conceito jurídico-político de povo está relacionado ao vínculo da nacionalidade entre a pessoa e o Estado e sua aceitação como elemento essencial para a constituição do Estado é unânime. Portanto, entende-se por “povo” o conjunto de indivíduos que em um dado momento se unem para constituir o Estado, estabelecendo, assim, um vínculo jurídico de caráter permanente. É deste vínculo que surge o que denominamos “nacionalidade”, que é um atributo que capacita esses indivíduos a se tornarem cidadãos e, com este status, participarem da formação da vontade do Estado e do exercício do poder soberano. Vejam que o “povo” será sempre o elemento humano do Estado e, na verdade, a razão de ser deste. Assim, é ele o elemento essencial que possibilita que o Estado seja um ente dotado de vontade, o que é fundamental no aperfeiçoamento de algumas relações jurídico-políticas que desta não prescindem. Quanto mais respeitada a vontade daqueles que constituem o elemento essencial material humano do Estado, maior é o reconhecimento de se estar diante de um Estado Democrático de Direito. 11 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação A diferenciação entre os conceitos de povo e população: O conceito de povo, considerado sob o aspecto puramente jurídico-político, é o elemento humano do Estado, sendo, portanto, um conceito mais restrito que o de população. Como Dalmo Dallari bem salienta, há quem entenda ser a “população” e não o “povo” esse elemento pessoal. A nacionalidade é a condição básica para o exercício da cidadania, vale dizer todo cidadão é nacional, mas nem todo nacional é cidadão. Como Dalmo Dallari bem salienta, há quem entenda ser a “população” e não o “povo” esse elemento pessoal. Ora, esta não é uma conclusão razoável se tivermos em conta que população pode ser conceituada como mera expressão numérica, demográfica ou econômica, que abrange o conjunto das pessoas que vivam no território de um Estado ou mesmo que se encontrem nele temporariamente. Portanto, a nacionalidade é a condição básica para o exercício da cidadania, vale dizer todo cidadão é nacional, mas nem todo nacional é cidadão. Aos estrangeiros, componentes da população, não é dada a faculdade de participar da vida política do País, seja votando, seja sendo votado. Os estrangeiros não se incluem na categoria de integrantes do povo porque, não sendo nacionais do país, não possuem o indispensável vínculo jurídico-político direto com o Estado. Por isso, ser parte integrante da população de um Estado nada revela quanto ao vínculo jurídico entre a pessoa e o Estado, pois não é necessária a constituição de uma vinculação jurídica especial para que alguém se inclua numa população. Imaginemos um brasileiro que saia para estudar nos Estados Unidos. No período em que estiver residindo naquele país não fará parte da população brasileira, muito embora seja membro do que denominamos “povo” brasileiro e, por isso, cidadão brasileiro. Porém, para os Estados Unidos, embora possa ele ser considerado parte integrante da população americana, não é um cidadão americano (não faz parte do povo dos EUA), pois não está habilitado a participar da formação da vontade política do Estado norte-americano. Assim, pelo exemplo acima, vê-se que “cidadão” só pode ser o “nacional” (componente do povo pelo vínculo jurídico-político da nacionalidade com o Estado) que esteja no pleno gozo dos seus direitos políticos. Totalmente diferente é a ideia de população que projeta o conjunto de pessoas que se encontram na base geográfica de poder do Estado, sem nenhuma ligação com a possibilidade de participar da vida política do País. Por isso tudo, da mesma forma que as expressões “povo” e “população”, sob a perspectiva jurídico-política, guardam sentidos específicos e diversos, também não é aceitável, no âmbito do estudo da Teoria Geral do Estado, confundir os conceitos de povo e nação. É o que veremos a partir de agora. Como Dalmo Dallari bem salienta, há quem entenda ser a “população” e não o “povo” esse elemento pessoal. Ora, esta não é uma conclusão razoável se tivermos em conta que população pode ser conceituada como mera expressão numérica, demográfica ou econômica, que abrange o conjunto das pessoas que vivam no território de um Estado ou mesmo que se encontrem nele temporariamente. 12 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação O conceito de “nação” a partir da análise de “povo”: O termo “Nação” refere-se a uma coletividade real que se sente unida pela origem comum, pelos laços linguísticos, culturais ou espirituais, por interesses, ideais e aspirações comuns. A nação pode ser entendida como grupo constituído por pessoas que, não necessitando ocupar um mesmo espaço físico, compartilham dos mesmos valores axiológicos e são movidos pela vontade de comungar um mesmo destino. O conceito de nação, diferentemente do conceito de Estado, não tem no território um elemento essencial. Outra diferenciação importante a ser feita é a comparação entre os conceitos de nação e povo, que também não se confundem. Já vimos o que representa a expressão “povo” em seu sentido jurídico-político; mas afinal, o que é “nação”? A expressão nação é um conceito inventado nos Séculos XIV e XV e que a partir do Século XX passou a ser exportado para todo o mundo. O termo “Nação” refere-se a uma coletividade real que se sente unida pela origem comum, pelos laços linguísticos, culturais ou espirituais, por interesses, ideais e aspirações comuns. Por isso, a ideia de identidade e pertença que compartilham os membros de uma nação os leva a desenvolver a consciência deste laço, fortalecido por um sentimento de elevado apego emocional. Assim, nação pode ser entendida como grupo constituído por pessoas que, não necessitando ocupar um mesmo espaço físico, compartilham dos mesmos valores axiológicos e são movidos pela vontade de comungar um mesmo destino. Como dissemos, existem diversos elementos que são importantes para configurar uma “nação” (religião, língua, cultura etc.). No entanto, não é necessário que aqueles que reivindicam ser partícipes de uma nação compartilhem de todos os elementos citados a fim de que se caracterize a existência de nação. Isto porque uma marca dos Estados modernos é exatamente a pluralidade (conforme veremos de forma mais detalhada na Unidade IV), sendo que, nas democracias deliberativas modernas, é natural que se dê o enfraquecimento desses laços comuns. Um exemplo claro é o Brasil, onde o povo, apesar da sua grande diversidade cultural, identifica-se com sua brasilidade. Outro aspecto importante é que o conceito de nação, diferentemente do conceito de Estado, não tem no território um elemento essencial. Vários são os exemplos pelo mundo em que povos que se reconhecem como parte de uma nação não possuem território próprio. Como exemplo podemos citar, entre muitos outros, os curdos (espalhados em partes do Irã, do Iraque, da Síria e da Turquia), os bascos (norte da Espanha e sul da França), os caxemires (entreÍndia, Paquistão e China). Ou seja, elementos de uma mesma nação podem estar vivendo em Estados diferentes. Neste caso, embora entendam fazer parte da mesma nação, fazem parte, sob a perspectiva aqui analisada, de diferentes povos. Como um fenômeno daí decorrente, é possível que um único Estado comporte em seu interior indivíduos que, embora tenham reconhecidas suas nacionalidades e cidadanias pelo Estado, consideram-se como pertencentes à outra nação, reivindicando a criação de um Estado próprio. A título de exemplo, podemos citar Espanha (bascos, catalães), China (tibetanos), Rússia (chechenos) e Bélgica (flamengos). Esses Estados possuem um povo que é formado por cidadãos de várias “nações”. 5.4 Soberania: o império estatal e sua base de sustentação Embora o conceito de soberania seja uma das bases do Estado Moderno, ele é teoricamente bastante complexo e tem variado no decorrer do tempo e do espaço. Há uma grande quantidade de acepções conceituais que buscam explicá-lo. Podemos, de qualquer forma, extrair que se trata de um termo que designa o poder político no Estado Moderno. Internamente, o 13 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação O Nacionalismo Hobsbswam diz que o uso da palavra "nacionalismo" apareceu no final do século XIX para designar grupos ideólogos de direita na França e na Itália, que defendiam a expansão territorial e se manifestavam contra os estrangeiros, os liberais e os socialistas, cunhando a bandeira nacional. IDEOLOGIA: Conjunto de ideias, princípios e valores que refletem uma determinada visão de mundo, orientando uma forma de ação, sobretudo uma prática política. Tem por objetivo justificar o domínio exercido e manter coesa a sociedade, apresentando o real como homogêneo, a sociedade como indivisa, de forma a evitar os conflitos típicos de uma sociedade pluralista e exercer a dominação. Conteudo digital: Trata-se de convencer todos os que nasceram no território controlado por determinado Estado de que fazem parte de uma comunidade, de que existem vínculos afetivos que os irmanam. Para isso, foi fundamental o “nacionalismo”, um ambiente político-cultural que teve seu lugar na Europa e nas Américas durante o século XIX. Os diversos nacionalismos mobilizaram os estudos históricos, geográficos, e os rituais da cultura popular com o objetivo de inventar ritos e tradições capazes de fomentar sensações de pertencimento à nação que, antes de ser o território e seu aparato de poder institucional, é uma “comunidade imaginada”, nas palavras do historiador norte-americano Benedict Anderson (2008). A nação é um tipo de comunidade imaginada socialmente, construída de modo a fazer as pessoas pensarem sobre si próprias como parte de um grupo. A invenção da nação é de interesse direto do Estado, pois não há poder que consiga se sustentar apenas pela repressão, sem contar com nenhum consentimento. A afetividade e a identidade fomentadas pela simbologia identitária, nesse sentido, são fundamentais para a própria efetividade do poder público. Por isso, e essa foi uma das principais caraterísticas da história política do século XIX, o Estado investe tanto na “invenção de tradições”, como dizem os historiadores ingleses Eric Hobsbawm (1917-2012) e Terence Ranger (1929-2015). POR “TRADIÇÃO INVENTADA” ENTENDE-SE UM CONJUNTO DE PRÁTICAS, NORMALMENTE REGULADAS POR REGRAS TÁCITA OU ABERTAMENTE ACEITAS; TAIS PRÁTICAS, DE NATUREZA RITUAL OU SIMBÓLICA, VISAM INCULCAR CERTOS VALORES E NORMAS DE COMPORTAMENTO ATRAVÉS DA REPETIÇÃO, O QUE IMPLICA, AUTOMATICAMENTE, UMA CONTINUIDADE EM RELAÇÃO AO PASSADO. ALIÁS, SEMPRE QUE POSSÍVEL, TENTA-SE ESTABELECER CONTINUIDADE COM UM PASSADO HISTÓRICO APROPRIADO. A Catalunha é uma comunidade autônoma espanhola, com o status oficial de “nacionalidade”. O território compreende quatro províncias: Barcelona, Girona, Lleida, e arragona. A capital e maior cidade é Barcelona, que também é a segunda maior cidade de toda a Espanha, depois de Madrid. Catalunha cobre uma área de cerca de 32.000 km² e tem uma população oficial de 7.535.251 habitantes. Compreende a maior parte do que foi o território do na extinto Principado da Catalunha, sendo o resto da região agora pertencente ao sul da França. A comunidade faz fronteira com a França e com Andorra ao norte, e com o Mar Mediterrâneo ao leste, com uma costa de 580 km. As línguas oficiais são o catalão, o espanhol e o aranês. A Catalunha é um território da Espanha e uma das 17 comunidades autônomas do país. A rica região possui 7,5 milhões de habitantes e gera um quinto da economia espanhola. A cidade mais conhecida é Barcelona, um dos pontos turísticos mais visitados do mundo. A Catalunha possui um governo regional autônomo, porém, subordinado ao Estado da Espanha. No dia 1º de outubro de 2017, a Catalunha realizou um referendo (consulta aos eleitores) para saber se a população queria que a região se separasse da Espanha ou não. De acordo com as autoridades locais, 2,6 milhões de cidadãos foram às urnas e o resultado foi 90% a favor da separação. O processo de votação foi marcado por polêmicas. Finalizamos o capítulo anterior buscando analisar várias teorias que tentam explicar como se deu o surgimento desta complexa instituição que denominamos Estado. Como é possível perceber, é no ambiente estatal que se desenvolvem algumas das mais importantes relações entre os membros de uma sociedade política, o que acaba por conceder ao Estado um papel central na organização das complexas sociedades contemporâneas. Faz-se, então, necessário que avancemos a análise. Neste sentido, nossos objetivos estarão voltados para outra questão fundamental: conhecer quais são os elementos essenciais do Estado na contemporaneidade. Mas o que é “essencial” em alguma “coisa”? Essencial é tudo aquilo que faz a coisa ser o que é. Ou seja, retirando-se qualquer um dos elementos essenciais da “coisa”, ela deixa de ser “a coisa”. Parece complicado, mas não é. Por exemplo, você já viu um automóvel ser vendido sem rodas? Certamente que não, pois sem rodas ele pode ser qualquer coisa, mas não um automóvel. Mas já viu vários automóveis serem vendidos sem rádio. É que, se as rodas são essenciais na composição de um automóvel, o rádio (mesmo que você o considere muito importante) pode ser considerado somente um acessório. Um carro sem rádio ainda é, certamente, um automóvel. Voltando ao tema de nosso interesse, o que estamos querendo dizer é que faltando qualquer um dos elementos considerados essenciais do Estado, este não poderá mais ser assim considerado. E quais são os elementos essenciais do Estado? Há um grande consenso de que sejam o povo, o território e a soberania (una e indivisível). Estes são elementos que coexistem e, conjuntamente, materializam a existência do Estado, sendo lícito afirmar que, quando se fala em Estado Moderno, avoca-se a coexistência desses três elementos essenciais e suficientes, que concedem concretude ao conceito. Porém, para que entendamos a razão pela qual esses são apontados como essenciais, é importante que examinemos o contexto histórico em que surgiu o chamado Estado Moderno, no Século XVII, que é a base das atuais configurações estatais contemporâneas. Orgulho em pertencer a uma nação Onacionalismoé a palavra usada para descrever os sentimentos e o orgulho do indivíduo em pertencer a uma determinada nação, motivado por razões de semelhança histórica ou cultural. Ele é visto como um movimento político, na qual são valorizadas todas as características de uma nação, principalmente aautodeterminação, ou seja, a forma de governar e desenvolver as próprias culturas e costumes. Antes de adentrar nos pontos mais importantes do nacionalismo é importante conhecer a diferença entre Estado e nação. Estado: representa a entidade administrativa ou pessoa jurídica formada por uma sociedade que vive em um determinado território, subordinada a uma autoridade soberana. Ou seja, trata-se dos poderes políticos e administrativos de uma nação. Nação: corresponde a um agrupamento de indivíduos ligados por laçoshistóricos, culturais, econômicos e linguísticos.Uma nação pode estar dividida em vários Estados, assim como um Estado pode agrupar várias nações. Deste modo, o nacionalismo representa uma ideia que exalta o Estado ao qual o indivíduo pertence. VER MAPAS 14 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Soberania: o império estatal e sua base de sustentação Noções introdutórias: Embora o conceito de soberania seja uma das bases do Estado Moderno, ele é teoricamente bastante complexo e tem variado no decorrer do tempo e do espaço. Há uma grande quantidade de acepções conceituais que buscam explicá-lo. Podemos, de qualquer forma, extrair que se trata de um termo que designa o poder político no Estado Moderno. Internamente, o conceito de soberania acaba por expressar uma específica situação de quem comanda, ou seja, a plenitude da capacidade de direito em relação aos demais poderes dentro do Estado. Por outro lado, a soberania também pode significar, sob uma perspectiva externa, o atributo que possui o Estado Nacional de não ser submetido às vontades estatais estrangeiras, já que situado em posição de igualdade para com elas. Nessa linha, a soberania consiste na capacidade de subsistência por si da ordem jurídica estadual, não dependente quanto à sua validade, de qualquer outra ordem jurídica. Somente o Estado é dotado de soberania, pois é ela que o distingue de todas as outras comunidades ou pessoas coletivas de direito interno que, no limite, podem tão somente ser dotadas de autonomia (é o caso de cada um dos Estados da Federação). Assim, mesmo que estejamos vivenciando um tempo de grande pluralismo das ordens jurídicas, a verdade é que apenas a ordem jurídica estatal tem, utilizando- nos da célebre expressão da doutrina alemã, a competência das competências. Nesta linha, todas as regras jurídicas estabelecidas no âmbito estatal são derivadas da emanação deste poder soberano do Estado. A ideia de soberania, estando submetida a contingências históricas, nem sempre existiu. É mais correto concebê-la como uma construção intelectual do Estado Moderno em oposição ao fragmentado poder da era medieval. Na verdade, o caminho da construção do conceito de soberania inicia-se por meio de Jean Bodin, que para legitimar o poder do Rei de França no contexto de disputa entre o poder temporal e o poder espiritual, engendra a sua teoria da soberania absoluta do Estado. Posteriormente, o tema foi examinado e desenvolvido pelas lentes contratualistas de Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau, em linhas teóricas coerentes com suas concepções de Estado. Por outro lado, é necessário apontar as consequências fundamentais do fim da bipolaridade no que diz respeito à perda de autonomia dos Estados nacionais diante do sistema internacional pós-social (por alguns denominado “pósmoderno”), deixando para a reflexão do aluno a questão da subordinação geopolítica dos Estados periféricos. 15 Internamente: a plenitude da capacidade de direito em relação aos demais poderes dentro do Estado. Externamente: o atributo que possui o Estado Nacional de não ser submetido às vontades estatais estrangeiras, já que situado em posição de igualdade para com elas. A soberania consiste na capacidade de subsistência por si da ordem jurídica estadual, não dependente quanto à sua validade, de qualquer outra ordem jurídica. Somente o Estado é dotado de soberania, pois é ela que o distingue de todas as outras comunidades ou pessoas coletivas de direito interno que, no limite, podem tão somente ser dotadas de autonomia (é o caso de cada um dos Estados da Federação). SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Evolução histórica do conceito: Quando afirmamos anteriormente que o conceito de soberania é um fenômeno histórico, nosso interesse era alertar para o fato de que esse conceito é reflexo da realidade experimentada em uma determinada era política. Na Antiguidade, nem mesmo os grandes filósofos gregos enfrentaram a temática, certamente porque as circunstâncias históricas não o exigiram. Para não afirmar que não houve nada que se aproximasse à ideia de soberania, vale lembrar que, não apenas na Antiguidade, mas também na Idade Média, utilizavam-se termos como summa potestas, summum imperium, maiestas e plenitudo potestatis (esta última retirada de doutrinas teocráticas) para indicar uma última instância de poder. É que o sistema medieval de poder acabou por copiar parcialmente o modelo imperial de poder político da Roma Antiga. Aliás, no período medieval já se conhecia a expressão “soberano”, para se referir à figura do rei, mas não se conhecia o termo “soberania” e menos ainda o conceito que visava expressar. É bem verdade que o conceito de “soberano” vai se alterando no decorrer da Idade Média, buscando representar uma posição de superioridade em um sistema social profundamente hierarquizado. Como já dissemos, tal conceito nem sempre existiu, sendo na realidade uma criação do Estado Moderno que, em oposição ao antigo Sistema Medieval de poder, precisava de um alicerce teórico para reafirmar a autonomia do monarca absoluto. Assim, seria inútil separar a noção de soberania das condições político-jurídicas de uma determinada época histórica. Apesar de uma interpretação mais ampla, a Idade Média não apresentou definição exata de soberania em sua essencialidade. É que igualmente ao período anterior, o pensamento medieval foi incapaz de formular um conceito de soberania que simbolizasse essa ideia de supremacia de uma única fonte de poder, ou seja, a capacidade do Estado de delimitar a sua jurisdição exclusiva dentro de seu próprio território. Aliás, pelo contrário, o período medieval foi uma época de multiplicação das fontes de poder, sem que houvesse uma instância que pudesse ser apontada como última ratio. Com isso, reafirmamos, entre as mais altas instâncias do que denominamos por poder secular (que foram perdendo progressivamente seus poderes até o momento do florescimento do Estado Moderno) e o cidadão comum, existiam autoridades intermediárias que realmente conduziam a vida em sociedade, dentro de uma coexistência de múltiplas ordens jurídicas (Direito da Igreja, das Universidades, das Corporações, dos Senhores Feudais etc.). Para tornar o quadro mais complexo, permeando toda esta emaranhada arquitetura juridicamente multidimensional, despontava a rivalidade entre o Estado e a Igreja. A Idade Média pode ser interpretada como sendo uma era na qual qualquer noção de soberania sofria grandes restrições pelo fato de que a organização social se via diante de uma multiplicidade de poderes rivais que lutavam entre si, em especial a Igreja e os poderes seculares. Influenciada por todas estas concepções, a Teoria da Soberania finalmente ganha corpo e validade no alvorecer da Idade Moderna com Jean Bodin. A concepção de Estado nos primórdios da Idade Moderna, na teoria de Jean Bodin, vai apontar para a radicalização do caráter absoluto da soberania no exercício do poder. Em Bodin, a soberania é una, indivisível, irrevogável, perpétua, indelegável, ou seja, é um poder supremo que não pode ser desafiado por qualquer tipo de oposição. Com efeito, a Cúria Romana e o Império travaram uma luta obstinada pela conquista do poder político. Era uma lide entre duas ordens distintas, o poder temporal versus o poder espiritual, César contra Cristo, matéria contra alma. Em suma, a Idade Média pode ser interpretada como sendo uma era na qual qualquer noção de soberania sofria grandes restrições pelo fato de que a organização social se via diante de uma multiplicidade de poderes rivais que lutavam entre si, em especial a Igreja e os poderes seculares. A concepção medieval de Estado tinha sua pedra angular pautada na dualidade, de um lado, envolvendo a autoridade divina, extra e supraterrena, mas com firme ponto de penetração dentro da atividade política terrena; de outro lado, a autoridade crescente dos novos monarcas surgidos com a desintegração dos antigos feudos. É neste contexto que o pensamento filosófico de SantoTomás de Aquino passa a ter enorme influência na formação das doutrinas teocráticas do poder. Em sentido filosófico, a escola de Santo Tomás de Aquino, a partir de uma concepção fundamentalmente aristotélica, consegue criar um deísmo que de certa maneira tem um caráter fictício, mas que é aceito pela Igreja Católica, em razão das circunstâncias históricas que começam a se delinear. Sem negar a essência divina, Santo Tomás de Aquino aparta a fé e a razão, faces de uma mesma moeda, porém, situadas em planos distintos. Esse é o quadro teórico que vai circunstanciar a disputa pela supremacia do poder político. Ao preconizarem que todo o poder vem de Deus, as teorias do direito divino, como espécies das chamadas doutrinas teocráticas, acabavam por enfatizar a crença em um poder originário supra-humano (omnis potesta a Deo). Como bem lembrado por Darcy Azambuja, no início estabeleceu-se a Teoria do Direito Divino Sobrenatural que justificava o poder político a partir de uma hierarquia social criada por vontade de Deus. Assim, a Teoria do Direito Divino Sobrenatural ensina que Deus não só é a causa do poder, mas também sua origem. Como criador de tudo e de todos, será a vontade de Deus responsável também pela criação do Estado e pela designação daquele que exercerá a titularidade do poder temporal, isto é, o Rei. A Teoria do Direito Divino Sobrenatural acabou por ser, então, a doutrina primitiva da igreja católica. Com o passar do tempo e sob a crescente influência do pensamento escolástico de Santo Tomás de Aquino, tal doutrina foi evoluindo lentamente até a construção de uma concepção que distinguia as leis divinas sob a égide da fé cristã das leis terrenas sob o pálio da razão. Ou seja, a origem do poder político vem de Deus, porém o uso do poder e a maneira de exercê-lo provêm dos homens. Isto significa dizer que a Teoria do Direito Divino Providencial ensinava que a intervenção de Deus na escolha dos governantes seria de maneira indireta, através de acontecimentos humanos. Entretanto, permanecia o entendimento da supremacia da autoridade espiritual e, portanto, da manutenção do poder extra-humano dos governantes. Em outro dizer, muito embora já começassem a separar a fé da razão, a organização política medieval não se libertou da ideia de que a fonte de todo o poder vem de Deus, logo, permanecia atrelado à existência de um poder divino originário. E mais: esse poder originário da Santa Sé se estenderia sobre toda a Terra, na medida em que a tendência geral era o estabelecimento de um Estado Universal sob o controle do Papa. Influenciada por todas estas concepções, a Teoria da Soberania finalmente ganha corpo e validade no alvorecer da Idade Moderna com Jean Bodin. Com sua obra Les six livres de la république, pode ele ser considerado o primeiro grande teórico da soberania, ao formular sua tese acerca da soberania absoluta, com o claro propósito de legitimar o Rei de França perante seus principais rivais políticos e, com isso, reafirmar sua independência política em relação ao Império e ao Sacerdócio. Por isso, a concepção de Estado nos primórdios da Idade Moderna, na teoria de Jean Bodin, vai apontar para a radicalização do caráter absoluto da soberania no exercício do poder. Dos seus ensinamentos já é possível extrair que a soberania é um elemento essencial do Estado, o que auxiliou a elevá-la ao patamar de verdadeiro dogma do Direito público, elemento irrefutável dentro do ordenamento político-jurídico de um Estado. Em Bodin, a soberania é una, indivisível, irrevogável, perpétua, indelegável, ou seja, é um poder supremo que não pode ser desafiado por qualquer tipo de oposição. Com esta construção teórica, embora seja um homem de forte religiosidade, ele coloca em xeque o paradigma do sistema medieval, cuja concepção de mundo buscava demonstrar a prioridade do poder espiritual sobre o poder temporal (ou, no limite, concordar sobre a necessidade de conciliação entre eles). A Idade Moderna aos poucos inverterá esta lógica. Para consolidar o poder do monarca absoluto, foi necessária a construção de uma doutrina capaz de fortalecer a posição do monarca absolutista perante seus principais rivais. 16 Na Antiguidade, e também na Idade Média, utilizavam-se termos como summa potestas, summum imperium, maiestas e plenitudo potestatis (esta última retirada de doutrinas teocráticas) para indicar uma última instância de poder. É que o sistema medieval de poder acabou por copiar parcialmente o modelo imperial de poder político da Roma Antiga. No período medieval já se conhecia a expressão “soberano”, para se referir à figura do rei, mas não se conhecia o termo “soberania” e menos ainda o conceito que visava expressar. É bem verdade que o conceito de “soberano” vai se alterando no decorrer da Idade Média, buscando representar uma posição de superioridade em um sistema social profundamente hierarquizado. SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação REVOLUÇÕES SOCIAIS QUE CONFRONTARAM A ESTRUTURA DO ESTADO-NAÇÃO (MÓDULO 3. TEMA 1). ESTADO NACIONAL: REAFIRMAÇÃO E REVOLUÇÕES O período compreendido entre os séculos XVII e XIX foi, ao mesmo tempo, o momento de consolidação e crise dos Estados Nacionais. REVOLUÇÃO INGLESA: a independência dos Estados Unidos REVOLUÇÃO FRANCESA O período compreendido entre os séculos XVII e XIX foi, ao mesmo tempo, o momento de consolidação e crise dos Estados Nacionais. Foi nessa época que o modelo de Estado centralizado, originado na Europa Ocidental no século XIV, se espalhou pelo mundo, mas foi também quando a sociedade civil questionou e confrontou a autoridade centralizada. Estudaremos aqui o ciclo de rebeliões sociais e políticas que aconteceu na Europa e nas Américas nesse período. Foram experiências tão transformadoras que chegaram a modificar o vocabulário político, como demonstra a filósofa alemã Hannah Arendt (1998), que identificou aquela que teria sido a principal transformação político-semântica trazida pela modernidade: a mudança no sentido do conceito “revolução”. Se antes “revolução” era uma palavra associada ao movimento circular dos corpos celestes, agora passa a ser um sinônimo de ruptura social e política drástica, que transforma para melhor as sociedades, que acelera a marcha da história rumo ao futuro, como, por exemplo: 17 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Revolução Inglesa (1640-1688) Constitucionalismo; Enquanto Christopher Hill, em perspectiva marxista, afirma que a evolução Inglesa foi o evento de inauguração da fase moderna da luta de classes, ao decretar a primeira grande vitória da burguesia sobre a aristocracia; Stone argumenta que o processo de aburguesamento da Inglaterra se deu pela modernização da própria nobreza rural, a gentry; Ambos os autores interpretam as revoluções inglesas do século XVII como o momento de fundação da ordem capitalista; Independência dos Estados Unidos Revolução Inglesa é o nome dado a uma série de conflitos ocorridos na Inglaterra entre os anos de 1640 e 1688 e que levaram à transição da monarquia absolutista para a monarquia parlamentar - modelo adotado até hoje no país. Essa revolução marca o fim do absolutismo e acontece no contexto de ascensão da burguesia, que se fortaleceu entre os séculos XV e XVI e passou a exigir mudanças políticas. A Revolução Inglesa foi a primeira revolução burguesa na mundo, ela abre o caminho para que a Inglaterra seja o palco principal da Revolução Industrial no século XIX. O período de 48 anos da Revolução Inglesa pode ser dividido em 4 fases: Guerra Civil e Revolução Puritana, República de Oliver Cromwell, Restauração da dinastia Stuart e Revolução Gloriosa. Mas antes de entrar nas fases da revolução, é importante entender o contexto dos séculos XVI e XVII na Inglaterra. https://www.significados.com.br/revolucao-inglesa/ Conteudo digital: Ainda no século XVII, a Inglaterra foi desestabilizada por um conjunto de revoltas sociais que acabaram por instituir aquele que se tornaria um dos valores mais sagrados das democracias liberais modernas:o Constitucionalismo, que, como vimos no módulo 1, está fundado na premissa de que o poder do Estado deve ser limitado pela lei. A Revolução Inglesa foi bastante estudada na bibliografia especializada, que apresenta diferentes, e por vezes conflitantes, interpretações do evento. Certamente, as duas principais referências para o assunto são os livros O mundo de ponta cabeça: ideias radicais durante a Revolução Inglesa de 1640, de Christopher Hill, publicado em 1987, e o livro As causas da Revolução Inglesa, de Lawrence Stone, publicado em 1988. Enquanto Christopher Hill, em perspectiva marxista, afirma que a Revolução Inglesa foi o evento de inauguração da fase moderna da luta de classes, ao decretar a primeira grande vitória da burguesia sobre a aristocracia; Stone argumenta que o processo de aburguesamento da Inglaterra se deu pela modernização da própria nobreza rural, a gentry. Seja como for, apesar das diferenças, ambos os autores interpretam as revoluções inglesas do século XVII como o momento de fundação da ordem capitalista, que passaria a estruturar a vida social e política no mundo ocidental. A Revolução Inglesa (1640-1688) foi um processo plural, cheio de idas e vindas e atravessado por diversas guerras civis. Desde o século XVI, a burguesia inglesa (famílias ricas, mas sem signos aristocráticos de distinção) era um grupo influente devido ao processo de cercamento dos campos, que pioneiramente passou a subordinar o espaço rural às demandas comerciais e industriais urbanas. O campo inglês especializou-se em criar ovelhas para servirem como fonte de matéria-prima para a incipiente indústria têxtil. Esse foi o “cercamento dos campos”, enclosures, aquilo que Karl Marx (1818-1883) chamou de “acumulação primitiva do capital”. Entretanto, essa burguesia ascendente estava sub-representada na estrutura da monarquia aristocrata inglesa. Podemos dizer que essa situação de sub-representação foi um dos principais focos de tensão que implodiram o sistema político inglês. No processo, o rei Carlos I foi morto, em janeiro de 1649, no primeiro regicídio, ou seja, assassinato do rei, moderno da história. INDEPENDÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOS: Na segunda metade do século XVIII, o mundo inglês protagonizaria outro evento que seria reconhecido como um dos momentos de fundação da cultura democrática moderna. Foi a independência das treze colônias inglesas, ou a Revolução Americana, que trouxe ao mundo a novidade de um país independente na América. Diferentemente das revoluções inglesas do século XVII, a Revolução Americana não questionou a monarquia ou a autoridade do rei, mas sim o parlamento, acusado de violar direitos coloniais adquiridos. Até o fim do processo, as elites coloniais insurgentes pediram a proteção do rei contra a espoliação feita pelo parlamento britânico. Por isso, como afirma John Pocock, a independência dos EUA deve ser inserida no contexto mais amplo das transformações das instituições britânicas que vinham se processando desde o século XVII. 18 SEMANA DE AULA 2. Tema 1. Formação do Estado Nação Revolução Francesa A partir de 1792 até 1795, começaria o momento de maior radicalidade do conflito, quando a própria estrutura da sociedade francesa foi posta em questão pelo projeto jacobino, comandado pela aliança entre operariados urbanos e a pequena burguesia liderada por Maximilien François Marie Isidore de Robespierre (1758-1794). https://www.politize.com.br/revolucao-francesa/ Em 1789, acontecia na França a revolução que marcaria o fim da Idade Moderna e início da Idade Contemporânea. A Revolução Francesa causou a queda de uma monarquia, o enfraquecimento da Igreja e o fim da aristocracia. Entretanto, essa foi apenas uma das revoluções que ocorreram no mundo entre os séculos XVIII e XIX, mas por que ela é considerada um marco da história francesa e mundial? Vamos entender, mas para isso, primeiro precisamos compreender o que não ia bem no reino da França em 1789 para que a revolução acontecesse. Veremos que durante as décadas anteriores à Revolução, alguns fatores sociais, políticos e econômicos serviram de fagulhas para o “espírito da Revolução” e foram essenciais para culminar nos acontecimentos que conhecemos como a “Revolução Francesa”. As causas da Revolução Francesa A Revolução Francesa não aconteceu sem aviso na história da França, tampouco a forma de pensar que norteou os ideais dos revolucionários surgiu do dia para a noite. Entretanto, nem Luis XVI nem a Igreja estavam preparados para o que se iniciou em 1789 e se estendeu até o último ano do século XVIII. Podemos mencionar 4 como sendo as causas principais da revolução: O pensamento iluminista; A influência da Revolução Americana na economia e no imaginário da França; A desigualdade entre diferentes grupos sociais; Uma grande crise econômica que gerou fome e mortes. Os Girondinos eram da alta burguesia, composta por empresários e comerciantes. Esse grupo queria uma reforma com foco no liberalismo econômico e no fim das isenções de impostos e privilégios dos nobres. Eram conhecidos pela moderação nas pautas que defendiam, contrários ao uso da violência e defensores da monarquia constitucional. Os Jacobinos, por sua vez, eram a baixa burguesia. Esse grupo era formado principalmente por intelectuais, advogados, trabalhadores da justiça e médicos. Os Jacobinos eram considerados mais radicais e queriam uma revolução mais profunda, com reformas econômicas e fiscais, mas também políticas, sendo que alguns deles defendiam a erradicação total da monarquia constitucional que se instaurou, para criar um regime republicano. Girondinos se sentavam à direita na Assembleia, e jacobinos à esquerda. Essa divisão foi o origem do que definimos hoje como esquerda e direita. Conteudo digital: A partir de 1792 até 1795, começaria o momento de maior radicalidade do conflito, quando a própria estrutura da sociedade francesa foi posta em questão pelo projeto jacobino, comandado pela aliança entre operariados urbanos e a pequena burguesia liderada por Maximilien François Marie Isidore de Robespierre (1758-1794). Esses grupos situavam-se mais à esquerda do espectro político francês e demandavam mais do que apenas o fim da monarquia absolutista e o fim da feudalidade. Desejavam questionar a estrutura fundiária, a divisão de terras, a miséria dos trabalhadores urbanos. Mas, politicamente, quem eram os jacobinos? Politicamente, os jacobinos eram republicanos e não estavam dispostos a negociar com a estrutura monárquica. O resultado foi o acirramento dos conflitos sociais e a militarização efetiva da crise francesa, dando início àquilo que já na época ficou conhecido como “terror”, quando o tribunal revolucionário executou milhares de pessoas, incluindo o rei Luís XVI e o próprio Robespierre. Os efeitos da guerra revolucionária atravessaram o oceano Atlântico, chegando à ilha de Santo Domingo, colônia francesa na América. Santo Domingo era uma sociedade escravocrata, em que a minoria branca comandava uma economia agroexportadora, movida pelo trabalho escravo da maioria negra. Nos anos da Revolução Pacífica girondina, como explica Eugene Genovese, a elite colonial manifestou o desejo de ser representada na Assembleia dos Estados Gerais e gozar da ampliação dos direitos políticos. Porém, com a radicalização jacobina, a escravidão foi abolida em todo o império colonial francês. Se, entre os séculos XIV e XVI, a Europa construiu o Estado Moderno, com sua estrutura política, administrativa e militar centralizada e com seu espírito aristocrático, os séculos XVIII e XIX questionaram tanto a centralização como a dimensão feudal dos Estados Nacionais, dando origem a uma série de disputas ideológicas que marcariam a história humana no século XX. 19 Ciência Política e Teoria do Estado Orientações para programação depois da aula: Leitura específica: Leia o Capítulo 2. O Estado como forma específica de sociedade política em RANIERI, Nina. Teoria do Estado: do Estado de Direito ao Estado Democrático de Direito. 2.ed. Barueri: Manole, 2019. Navegue no
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