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Ciencia Politica e Teoria do Estado

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educacional
gente criando o futuro
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou
transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo
fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de
informação, sem prévia autorização, por escrito, do Grupo Ser Educacional.
Diretor de EAD: Enzo Moreira
Gerente de design instrucional: Paulo Kazuo Kato
Coordenadora de projetos EAD: Manuela Martins Alves Gomes
Coordenadora educacional: Pamela Marques
Equipe de apoio educacional: Caroline Guglielmi, Danise Grimm, Jaqueline Morais, Laís Pessoa
Designers gráficos: Kamilla Moreira, Mário Gomes, Sérgio Ramos, Tiago da Rocha
Ilustradores: Anderson Eloy, Luíz Meneghel, Vinícius Manzi
Pedra, Ca io Benevides.
Ciência Política e Teoria do Estado / Ca lo Benevides Pedra: Gu i l he rme Ferreira Silva. — São
Paulo: Cengage — 2020.
Bibliografia.
ISBN 9788522129652
1. Direito 2. Silva, Guilherme Ferreira.
Grupo Ser Educacional
Rua Treze de Ma io , 254 - Santo Amaro
CEP: 50100-160, Recife - PE
PABX: (81) 3413-4611
E-mail: sereducacional&sereducacional.com
=——
“É através da educação que a igualdade de oportunidades surge, e, com
isso, há um maior desenvolvimento econômico e social para a nação. Há alguns
ànos, o Brasil vive um período de mudanças, e, assim, a educação também
passa por tais transformações. A demanda por mão de obra qualificada, o
aumento da competitividade e a produtividade fizeram com que o Ensino
Superior ganhasse força e fosse tratado como prioridade para o Brasil.
O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego — Pronatec,
tem como objetivo atender a essa demanda e ajudar o País a qualificar
seus cidadãos em suas formações, contribuindo para o desenvolvimento
da economia, da crescente globalização, além de garantir o exercício da
democracia com à ampliação da escolaridade.
Dessa forma, as instituições do Grupo Ser Educacional buscam ampliar
as competências básicas da educação de seus estudantes, além de oferecer-
lhes uma sólida formação técnica, sempre pensando nas ações dos alunos no
contexto da sociedade.”
Janguiê Diniz
Autoria
Caio Benevides Pedra
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e em Administração Pública pela
Fundação João Pinheiro (FIP). Suas pesquisas são relacionadas ao acesso à cidadania pela população
LGBT+ no Brasil.
Bacharel em Direito e Especialista em Gestão de Instituições de Ensino Superior também pela UFMG.
Autor dos livros CIDADANIA TRANS: o acesso à cidadania por travestis etransexuais no Brasil e DIREITOS
LGBT+: a LGBTfobia estrutural , e a diversidade sexual e de gênero no d i re i to brasileiro, ambos lançados
em 2020 pela Editora Appris.
Membro do projeto de extensão Diverso UFMG, do Grupo de Pesquisa Estado, Gênero e Diversidade
(EGEDI-FIP) e da Comissão de Diversidade Sexual da OAB/MG.
Guilherme Ferreira da Silva
Doutorando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), bolsista
da CAPES. Especialista em Direito Público.
Graduado em Direito pela PUC-Minas. Professor na Faculdade da Saúde e da Ecologia Humana (Faseh).
Membro do Grupo de Pesquisa Lévinas e Alteridades. Orientador de iniciação científica. Bolsista
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). Produtor do podcast Papo
Direto.
Advogado e professor colaborador de cursos de formação de servidores públicos pelo Instítuto de
Defesa da Cidadania e da Transparência (IDCT). Redator de questões de concursos na Fundação de
Ensino de Contagem (Funec). Foi consultor técnico-legislativo na Consultoria Técnico-Legislativa do
Estado de Minas Gerais.
Prefácio c i cs e e a as a a a e as ns es es a antas
UNIDADE 1 - Introdução e princípios básicos
Introdução
1 Introdução à Ciência Política e à Teoria do Estado
2 Teoria do Estado
3 A Teoria do Estado e o Direito: a teoria monística, dualística e paralelística
4 À sociedade: origem e seus elementos característicos
5 Teorias sobre os fundamentos da sociedade: a interpretação organicista e mecanicista da sociedade ...
PARA RESUNMIR
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
UNIDADE 2 - Estado e soberania
Introdução
1 Estado e soberania: a visão dos clássicos do pensamento político
2 Montesquieu, os três poderes e as leis
3 Regimes políticos
4 Formas de Estado
PARA RESUMIR,
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
UNIDADE 3 - O estado, sua evolução e a representação política
Introdução
1 Os tipos de Estados e a evolução histórica
2 O Estado e seus elementos constitutivos
3 Modelos de democracia
4 Representação política
5 Alexis de Tocqueville e o regime democrático
PARA RESUNMIR,
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
10
11
14
17
18
25
26
27
28
29
35
40
a44
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55
56
57
64
568
73
76
79
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 92
UNIDADE 4 - Partidos políticos e Estad 83
[La51,0 7» DE ve: o DOS 84
N UM 22Ta a foLe1-5 6 | a [or BORN 85
2 Sistemas Partidários... ne mero mero mero mero men te sen te seno sen men n ro 88
3 O Estado e o Indivíduo: os Direitos Individuais, Coletivos, Econômicos e Sociais. A Visão Neoliberal...92
4 Direitos Humanos, Estado e Transformação SOCIal...iliiiieie ces a en ess 56
5 Justiça de Transição: Direito à Memória, à Verdade é à JUSTIÇA acc i i e e e ns 101
PARA RESUMIR, 102
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 103
à
.
Ciência Política e Teoria do Estado apresenta, além de conce i tosjámuito na área, o
conteúdo parcialmente descrito a seguir em suas quatro unidades.
Introdução e princípios básicos, a primeira unidade, discute, de maneira geral,
a ciência política e teoria do Estado, dois assuntos fundamentais para quem está
começando a estudar Direito.
A segunda unidade, Estado e soberania, pretende apresentar ao leitor alguns dos
grandes pensadores da Ciência Política e do Estado. O texto traz informações sobre o
surgimento do Estado e da sua relação com o poder.
Na sequência, a terceira unidade, O Estado, sua evolução e a representação política,
apresenta algumas formas de Estado, com ênfase no Estado moderno e a relação com
o sistema democrático. O texto também aborda os sistemas democráticos e suas
variáveis, dando a oportunidade ao leitor de comparar o conteúdo com as informações
e notícias atuais.
Fechando a obra, a quarta e última unidade, Partidos políticos e Estado, aborda
assuntos importantes e muito atuais no cenário atual: partidos políticos, sistemas
partidários, os direitos (individuais, coletivos, econômicos e sociais), a visão neoliberal,
direitos humanos, transformação social, direito à memória, à verdade e à justiça, e mais.
Este é apenas um panorama do conteúdo que o leitor vai estudar.
Agora é com você! Sucesso!
UNIDADE 1
Introdução e princípios básicos
Entrodução
Olá,
Nesta unidade, começaremos a discutir um pouco sobre Ciência Política e Teoria do Estado,
dois ramos do conhecimento fundamentais para quem está começando a estudar Direito.
É muito importante, no entanto, ter em mente desde já que esse material é apenas uma
complementação aos seus estudos, o que pode te ajudar a tirar algumas dúvidas, mas não
dispensa a leitura dos autores aqui indicados.
Bons estudos!
“1 INTRODUÇÃO À CIÊNCIA POLÍTICA E À TEORIA
«DO ESTADO
Se você está se perguntando por que precisa estudar Ciência Política e Teoria do Estado no
início de um curso de Direito, saiba que essa pergunta vem sendo feita há muito tempo, por
inúmeros estudiosos. Historicamente, segundo Bonavides (2011, p. 48), a Ciência Política levou
muito tempo para se to rna r uma ciência au tônoma na França, po r exemplo. Antes disso, suas
discussões e temáticas eram todas abarcadas pelo Direito, principalmente o Direito Constitucional
(e essa aproximação ainda existe, como vocês vão perceber quanto mais se aprofundarem).
Até mesmo o nome “Ciência Política”precisou de tempo para se firmar e ser por todos
reconhecido como algo específico e determinado. Isso porque, na cultura anglo-americana,
por exemplo, o que se chamava “Ciência Política” era, na verdade, um acúmulo de relatos e
experiências vividas por instituições (casos em que os interesses em jogo eram sempre ditados
pelas forças políticas competitivas) ou análises técnicas que se constituíam ignorando os
desenvolvimentos teóricos. (BONAVIDES, 2011, p. 46).
Já na Alemanha, os juristas que se dedicavam a esse estudo, sempre envolvidos com
o culto e a superstição do poder, só recentemente passaram a reconhecer uma “Ciência
Política” propriamente dita, com contribuições e construções próprias, independentemente do
condicionamento jurídico, sob a influência de correntes americanas excessivamente pragmáticas.
Antes disso, esses estudos eram todos abarcados pela “Teoria Geral do Estado”, que apenas
reconhecia variações de método e conteúdo dentro de sua amplitude. (BONAVIDES, 2011, p. 46).
A denominação “Teoria Geral do Estado”, que foi forte na Alemanha, não teve a mesma força
na França e só chegou ao Brasil na década de 1940, durante a ditadura, ingressando nos currículos
dos cursos de Direito, por imposição do regime ditatorial e não por pertinência temática ou
pedagógica. À época, a Constituição da República de 1937 enfrentava grande resistência nas
escolas pelos professores de formação democrática. (BONAVIDES, 2011, p. 46).
O fato é que a evolução terminológica veio também acompanhada da evolução dos métodos
e delimitações da Ciência Política enquanto ciência, ramo do saber, Assim, segundo Soares (2004,
p. 5-7), a Ciência Política estuda “a realidade política, o fenômeno político, o mundo ou o universo
político e a res publica” (expressão do latim que significa “coisa do povo” ou “coisa pública”,
e que deu origem à palavra “república”). Seu objeto de estudo, então, é “o conhecimento do
universo político polarizado pelo fenômeno político do poder”, que ela analisa e transforma em
um “conhecimento ordenado, racional, objetivo e metódico” que pode ser recepcionado pelos
outros ramos do saber, inclusive a Teoria do Estado, que vai, a partir desse arcabouço de ideias,
buscar entender se o Estado deve se colocar e atuar diante dos fenômenos atuais, além de como
P
11
à
12
fazê-lo. Esse entendimento se dá a partir do conhecimento e da interpretação das relações de que
eles possuem com a história e com a realidade global.
Fonte: Corgarashu, Shutterstock, 2020
A HtParaCegoVer: balança que simboliza a justiça em um local com bancos de madeira típicos
sum tribunal
Utilize o QR Code para assistir ao vídeo:
E conceituação da Ciência Política e da Teoria do Estado
Desde que Kant (em seu livro Elementos Metafísicos das Ciências da Natureza) definiu como
“ciência” a “toda série de conhecimentos sistematizados ou coordenados mediante princípios”, a
ação intelectual dos positivistas e dos evolucionistas desenvolveu esse conceito de forma a torná-
lo cada vez mais preciso. Desenvolvimento esse que culminou na formulação de um conceito de
“ciência” como sendo “o conhecimento das relações entre coisas, fatos ou fenômenos, quando
ocorre identidade ou semelhança, diferença ou contraste, com existência ou sucessão nessa
P
13
ordem de relações”. (BONAVIDES, 2011, p. 26).
Como vimos, a Ciência Política precisou de muito tempo para se desvencilhar do Direito e
ser reconhecida como uma ciência autônoma, com seus próprios métodos e objetos. Uma vez
reconhecida, no entanto, vamos ver como ela é conceituada enquanto área de conhecimento a
partir desses critérios estabelecidos e desenvolvidos ao longo das décadas de estudo.
É Ciência Política
Para conceituar “Ciência Política” e “Teoria do Estado”, Pinto (2013) faz uma escolha
interessante e recorre à filologia e ao estudo da linguagem em fontes históricas escritas, de
forma a entender melhor os significados dos termos que compõem essas expressões e produzir
conhecimento a partir dessas nomenclaturas.
Primeiramente, então, ele recorre ao conceito de “ciência” disposto no dicionário mais
famoso e tradicional da língua portuguesa:
Atentos à objetividade desejada, lembramos que, para Aurél io Buarque de Holanda, ciência é “[... ]
saber que se adquire pela leitura e meditação; [...] Conjunto de conhecimentos socialmente adquiridos
ou produzidos, historicamente acumulados, dotados de universalidade e objetividade que permitem
Sua transmissão, e estruturados com métodos, teorias e linguagens próprias, que visam compreender
e [...] orientar a natureza e as atividades humanas [...]”. (PINTO, 2013, p . 3) .
Em seguida, para complementar essa análise, recorre à conceituação de um filósofo:
Para Régis Jolivet, o t e rmo ciência pode ser encarado nos pontos de vista objetivo e subjetivo:
“Objetivamente, a ciência é conjunto de verdades certas logicamente encadeadas entre si, de maneira
que fo rme um sistema coerente [...]. Subjetivamente, a ciência é um conceito certo das coisas por
Suas causas ou por suas leis.” A ciência demanda, portanto, objeto, método e lei. (PINTO, 2013, p. 3) .
Trabalhada a análise do termo “ciência”, o autor segue sua análise terminológica dedicando-
se, então, ao termo “política”, que é uma expressão bastante conhecida e discutida pela filosofia:
Os autores, normalmente, separam o conceito clássico e conceito moderno de política. Assim é,
por exemplo, no Dicionário de Política, de Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino.
Para o conceito propagado por Aristóteles em sua obra Política, o t e rmo significa a “Arte de Governar”,
abrangendo à natureza, as funções e as várias formas de governo, O termo política consagrou-se
classicamente no âmbito acadêmico como sendo estudo de atividades humanas referentes à existência
do Estado, do poder soberano e de seu exercício. (PINTO, 2013, p . 4).
A este significado, o autor acrescenta considerações sobre a utilização atualizada do termo
“política”, que tem hoje inúmeras outras acepções, podendo ser utilizado para denominar
“um conjunto de atividades estatais”, como a atuação do Estado em busca de um resultado
determinado. Acepção essa que dá origem às ideias de “política eleitora| “, política partidária”
h
14
uaou até “políticas públicas”, por exemplo. Nesse sentido, a “política” assume um conceito bastante
popularizado e amplamente utilizado em várias esferas e temáticas do Poder Estatal. (PINTO,
2013 ,p. 4).
A partir, então, dessas reflexões, Pinto (2013, p. 4) passa a construir uma conceituação de
“Ciência Política” que respeite a filologia dos termos que compõem a expressão e combine
esses significados. A “Ciência Política”, assim, seria um estudo metódico (com a metodologia e
os procedimentos sólidos e específicos que constituem uma ciência) cujo objeto seria a política
enquanto conjunto de atividades do Estado em suas mais diversas atuações e ramificações ligadas
ao exercício do poder soberano, na busca por abranger todo o fenômeno estatal.
Definir a atuação estatal como objeto de estudo da Ciência Política, no entanto, pode parecer
uma simplificação, mas não é, A força estatal é marcada pelo poder, e o poder perpassa todas as
estruturas sociais. O poder é histórico e geral, esteve e está presente em todos os momentos e
em todos os grupos sociais, mas se manifesta de formas variadas que precisam ser entendidas e
discutidas. Nesse sentido, o autor destaca a amplitude dos objetos de estudo a partir da grande e
dispersa presença do poder nas estruturas sociais:
Cabe à ciência política, portanto, o estudo de todo o processo histórico do exercício do poder,
desde as estruturas mais rudimentares até as mais complexas e as mais modernas; do matriarcalismo
instintivo ao patriarcalismo, como natural expressão de força. Cabe, do mesmo modo, à análise da
estruturação ideológica do poder, dos pré-socráticos aos pensadores da atualidade. Cabe ainda
o estudo detalhado da família como célula de poder, passando pelosclãs, tribos e as polis gregas,
o Império Romano, o Império da China e as civilizações pouco conhecidas como os incas, astecas e
maias, chegando mesmo ao Estado Moderno como hoje é conhecido. No campo filosófico, portanto,
mui to há o que se estudar em relação à política, e o mesmo se diga quanto aos campos sociológico,
antropológico, econômico e até o religioso. Não serão poucos, desse modo, 05 objetivos deste estudo
e não serão poucos os autores a serem consultados. (PINTO, 2013, p . 4).
Er ro RIA DO ESTADO
Pinto (2013), ainda seguindo a linha da análise terminológica, conjuga dois significados para
a palavra “teoria” a fim de construir um conceito para a “Teoria do Estado”. No mesmo dicionário
brasileiro, ele descobre que:
O te rmo teoria significa, para Aurél io Buarque de Holanda, o “[.. . ]Conhecimento especulativo,
meramente racional [...] Conjunto de princípios fundamentais duma arte ou duma ciência [...].
Doutrina ou sistema fundado nesses princíipiosL..]”. (PINTO, 2013, p. 5).
E, mais uma vez, conjugando essa definição filológica com uma definição filosófica, acrescenta
que:
Já no Dicionário da Filosofia Larousse do Brasil, teoria é conceituado como um
conjunto sistemático de ideias ou conhecimentos sobre terminado tema. Completa
R. Jolivet “[...] que tem por fim unificar ou mesmo sistematizar um grande número de
hipóteses ou leis em uma lei bastante geral”. (PINTO, 2013, p. 5).
A partir daí, é possível compreender a Teoria do Estado como o ramo da ciência que investiga
e analisa as principais características do Estado, bem como seus aspectos, contextos, estruturas,
origens, etc. Tudo isso com a finalidade de possibilitar reflexão e aperfeiçoamento.
Utilize o QR Code para assistir ao vídeo:
És A Ciência Política e suas três dimensões: a filosófica, a sociológica
tea jurídica
Inúmeros e reconhecidos teóricos e juristas acompanham a tendência universal de estudar a
Ciência Política a partir de um aspecto tríplice ou tridimensional que compreenda as dimensões
filosófica, sociológica e jurídica. (BONAVIDES, 2011, p. 45-46).
Esse entendimento é consequência direta da multiplicidade e da grande abrangência do
objeto de estudo da Ciência Política, que se detém, como vimos, sobre o Estado, o poder e as
relações que deles decorrem em todas as suas esferas e âmbitos. Os fatos e realidades que se
constroem e são discutidos pela Ciência Política são também apreendidos por outros ramos
do saber e essas compreensões se alimentam. Aqui, vamos analisar como se constituem essas
dimensões dentro da Ciência Política e de que forma elas se aproximam.
> Dimensão Filosófica
Os assuntos políticos são temáticas que interessam os seres humanos desde os tempos
mais remotos, principalmente desde Sócrates, Platão e Aristóteles. (BONAVIDES, 2011, p. 40).
É natural, então, que a filosofia enquanto ciência tenha sempre acompanhado a sucessão de
h
16
fatos históricos e a evolução da construção dos modelos que hoje naturalizamos na sociedade,
na tentativa de discutir as origens, a ideologia e a justificação do Estado enquanto fenômeno
político-cultural. Nesse sentido:
A Filosofia conduz para os livros de Ciência Política a discussão de proposições respeitantes
à origem, à essência, à justificação e aos fins do Estado, como das demais intuições sociais
geradoras do fenômeno do poder, visto que nem todos aceitam circunscrevê-lo apenas à célula
máter, embriogênica, que no caso seria naturalmente o Estado, acrescentando-lhe os partidos, os
sindicatos, a igreja, as associações internacionais, os grupos econômicos, etc.
Convive o debate filosófico ademais com a investigação sociológica com a fixação jurídica dos
fatos, normas e instituições políticas... (BONAVIDES, 2011, p. 41).
Uma vez que a Ciência Política se proponha à analisar os acontecimentos, as instituições e as ideias
políticas (bem como os seus históricos e desenvolvimentos), essas questões podem ser discutidas à
partir da análise do passado (como fo ram ou deveriam t e r sido), do presente (como são ou deveriam
ser) ou do futuro (como serão ou deverão ser). (BONAVIDES, 2011, p. 40).
Utilize o OR Code para assistir ao vídeo:
Dimensão sociológica
Se a Ciência Política estuda fatos sociais, como vimos, sua aproximação com a Sociologia
é inevitável e indiscutível. Sendo o fenômeno político um fato social por excelência, como
ensina Durkheim, a análise de um fato político vai fundamentar uma Sociologia Política, que vai
compartilhar com a Ciência Política noções e discussões sobre grupos, classes, ideologias, etc.
E esses são aspectos fundamentais que precisam ser considerados em qualquer análise da
evolução do Estado. Bonavides (2011, p. 42-43), citando a obra de Vierkandt, destaca o caráter
classista do Estado e da sociedade, as dinâmicas de luta pelo poder nas sociedades, os partidos
17
como representação de interesses e as tendências e movimentos reformistas que se constituem
considerando as relações de trabalho, a educação, a saúde espiritual da juventude, e o papel da
igreja, po r exemplo.
Também aproximam Sociologia e Ciência Política o forte caráter histórico necessário para a
análise da evolução política. (BONAVIDES, 2011, p. 42).
És Dimensão jurídica
A dimensão jurídica da Ciência Política tem como grande expoente o trabalho de Kelsen,
considerado o “Pai do Positivismo”, para quem o Estado e o Direito seriam uma única coisa. O
Direito, para Kelsen, seria a lei. E a lei seria o que definiria e constituiria o Estado. Nesse raciocínio,
o papel do Estado seria o de realizar a positivação do Direito. Seguindo essa abordagem, Kelsen
propõe também uma Teoria Geral do Estado com bases fundamentalmente jurídicas, que
assimilam o Estado ao Direito.
Ainda segundo Kelsen, o Estado pertenceria ao mundo do “dever-ser” (que ele chama de
“sollen”) e seria explicado pela “unidade das normas de direito de determinado sistema”, Assim,
para o autor, “quem elucidar o direito como norma elucidará o Estado”, porque a força coercitiva
do Estado é o mesmo que o grau de eficácia da norma jurídica. (BONAVIDES, 2011, p. 44). Essa
valorização do Direito é também o que faz com que a Ciência Política tenha sido (e ainda seja um
pouco) reduzida a um simples corpo de normas, objeto de estudo do Direito Político (BONAVIDES,
2011, p. 43).
O Estado, na teoria de Kelsen, é esvaziado de toda substantividade e de todas as implicações
de ordem moral, ética, histórica, sociológica. Território e população, elementos materiais que
compõem o Estado, assumem aqui as faces de “âmbito espacial” e “âmbito pessoal” de validade
do ordenamento jurídico. O que resta é o Estado como puro conceito, retintamente jurídico.
A valorização descomunal (e desproporcional) do poder (seu elemento formal) aproxima-o da
“santidade inviolável de normas concebidas como direito puro”. (BONAVIDES, 2011, p. 44).
“3 A TEORIA DO ESTADO E O DIREITO: A TEORIA
.MONÍSTICA, DUALÍSTICA E PARALELÍSTICA
Não foi só Kelsen quem se dedicou a estudar e discutir a relação entre o Estado e o Direito.
Essa é uma questão que há muito ocupa os pensadores. Maluf (2010, p. 1) inicia a sua obra já
chamando atenção para essa questão:
O Estado é uma organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, as condições universais
de ordem social. E o Direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado
h
18
cumpre assegurar.
Para o estudo do fenômeno estatal, tanto quanto para iniciação na ciência jurídica, o primeiro
problema a ser enfrentado é o das relações entre Estado e Direito. (MALUF, 2010, p . 1).
Como se pode ver no trecho reproduzido, essa já é uma concepção bem moderna,
que reconhece à separação entre as ideias de Estado e de Direito sem ignorar a relação de
interdependência. O Estado, para Maluf, se orienta e se mantém pelas normas criadas pelo
Direi to, e ao mesmo t empo é responsável po r garantir o seu cumprimento. É justamente por isso
que a compreensão dessa relação é importante desde já, noinício da formação jurídica.
Os estudos que se dedicaram a compreender as relações entre Estado e Direito dividem-se
principalmente em três teorias: a monística, a dualística e a paralelística, que vamos conhecer
brevemente a seguir.
TEORIA MONÍSTICA
A Teoria Monística é também chamada de “estatismo jurídico” e reúne os pensadores que
acreditam que o Estado e o Direito se confundem em uma só realidade. Para os monistas, o
Estado é a única fonte do Direito e não existe qualquer regra jurídica fora do Estado, somente
o “direito estatal”, É o Estado quem dá vida ao Direito quando a ele empresta a “força coativa”
de que detém o monopólio. Só o Estado pode agir por meio da coação e uma regra jurídica
sem coação seria uma “contradição em si, um fogo que não queima, uma luz que não ilumina”,
(MALUF, 2010, p. 1).
TEORIA DUALÍSTICA
A Teoria Dualística, também chamada de “Teoria Pluralística”, por sua vez, sustenta que o Estado
e o Direito são duas realidades “distintas, independentes e inconfundíveis”. Para os dualistas, o Estado
não se confunde com o Direito e nem mesmo é sua única fonte. O que o Estado detém é apenas
o Direito Positivo (e o poder de positivar o Direito), mas o Direito não é e não pode ser visto como
criação estatal. Trata-se de uma criação social que carrega em si os frutos do desenvolvimento e das
mudanças que se operam na vida de cada povo sob a constante influência de fatores sociais, como as
questões éticas, psíquicas, biológicas, e econômicas, por exemplo. (MALUF, 2010, p. 2). Nesse sentido:
O direito, assim, é um fato social em contínua transformação. A função do Estado é a de
positivar o Direito, isto é, traduzir em normas escritas os princípios que se firmam na consciência
social. Normas jurídicas têm sua origem no corpo social. (MALUF, 2010, p. 2).
TEORIA PARALELÍSTICA
A Teoria Monista, como vimos, é a que não vê separação entre Estado e D i r e i t o ,jáque os dois
P
19
são tão próximos e dependentes que se confundem, e que acredita que o Estado é a única fonte
do Direito. À Dualística, no sentido contrário, vê diferenças e separações claras entre o Direito e o
Estado, reconhece outras fontes de Direito e concebe o Direito enquanto fato social.
É nesse terreno que se desenvolve a Teoria Paralelística, uma corrente eclética, situada em
uma posição de relativo equilíbrio entre os extremos e que, segundo Maluf (2010, p. 2-5), vê
Estado e Direito como “realidades distintas, porém necessariamente interdependentes”,
A Teoria Paralelística, então, reconhece a existência de Direito fora do Estado ao mesmo
tempo que admite ser o Estado o detentor da “vontade social predominante” e, portanto, o único
capaz de positivar o Direito. (MALUF, 2010, p. 3). Assim:
A teoria do pluralismo reconhece a existência do direito não estatal, sustentando que vários
centros determinação jurídica surgem e se desenvolvem fora do Estado, obedecendo a uma
graduação de positividade. Sobre todos estes centros particulares do ordenamento jurídico,
prepondera o Estado como centro de irradiação da positividade. O ordenamento jurídico
do Estado representaria aquele que, dentro de todos os ordenamentos jurídicos possíveis, se
afirmaria como o “verdadeiramente positivo”, em razão da sua conformidade com a vontade
social predominante, A teoria do paralelismo completa a teoria pluralista, e ambas se contrapõem
com vantagem à teoria monista. Efetivamente, Estado de Direito são duas realidades distintas que
se completam na interdependência. (MALUF, 2010, p. 3).
“4 A SOCIEDADE: ORIGEM E SEUS ELEMENTOS
«CARACTERÍSTICOS
Soares (2004, p. 14), ao discutir os inúmeros conceitos de sociedade, começa pelo mais
“genérico”, a sociedade como “o gênero humano, considerado o conteúdo abstrato e todas
as formas de convivência humana ou a união entre os homens em geral”, ou, nas palavras de
Bonavides (2011, p. 57), “todo o complexo de relações do homem com seus semelhantes”, Esse
conceito genérico, no entanto, é bastante primário, uma vez que as sociedades se constituem de
formas cada vez mais complexas em razão do aperfeiçoamento de mecanismos como a divisão do
trabalho humano, o aproveitamento e controle de recursos naturais, as descobertas e invenções.
Verifica-se que, no decorrer do processo histórico, grupos sociais passaram a executar tarefas
específicas, atingindo um amplo e intr icado pluralismo social, que exige que recorra o jurista à Ciência
Política como condição para o desenvolvimento de estudo aprofundado dessas relações sociais e
jurídicas.
Assim, faz-se necessário estabelecer uma caracterização geral das complexas sociedades,
delineando os pontos em comum por meio de análise do conjunto de regras de atuação de cada
sociedade. (SOARES, 2004, p. 15).
h
20
Citando Dallari, Soares (2004, p. 15) elenca os elementos considerados necessários
pelos estudos dessa natureza para que os agrupamentos humanos sejam reconhecidos como
sociedades. os seguintes:
* Afinalidade ou valor social
* As manifestações de conjunto ordenadas (ordem social e ordem jurídica)
* O podersocial
Cada um destes tópicos poderá ser compreendido a seguir.
Fonte: Michael D Brown, Shutterstock, 2020
HParaCegoVer: imagem pictórica de pessoas em forma de desenho, em cima de um disco ou
."círculo, sendo que uma delas está do lado de fora e sendo ajudada por outra a subir nele.
e Finalidade ou valor social
Sobre a finalidade (ou valor social) da sociedade, é importante destacar que se trata de
um elemento bastante discutido pelas mais diversas teorias (ou concepções). Pela concepção
determinista, então, o homem é totalmente submetido às leis naturais e ao princípio da
causalidade, não podendo escolher um objetivo ou orientar a sua vida social pois esta estará
sempre condicionada a fatores que ele não pode controlar. (SOARES, 2004, p. 15).
De acordo com a concepção finalista, o homem deve ser sujeito de sua própria história e,
assim, contribuir para transformações sociais. Já a concepção tomista acredita que o homem tem
consciência de que deve viver em sociedade e, por isso, busca fixar como objetivo da sua vida
social uma finalidade condizente com o que lhe parece mais valioso e com as suas necessidades
fundamentais. (SOARES, 2004, p. 15).
Já Tomás de Aquino refere-se ao bonum commune (bem comum) como a finalidade principal
da sociedade organizada. Nesse raciocínio, é responsabilidade do Estado garantir aos membros
da sociedade as condições necessárias para que alcancem o bem-estar material e cumpram o
instinto humano de conservação. À finalidade social escolhida pelo homem, então, seria o bem
comum, que consistiria no “conjunto de todas as condições de vida que configurem e favoreçam
o desenvolvimento integral da personalidade humana”. (SOARES, 2004, p. 15-16).
FIQUE DE OLHO
Foi o Papa João XXIll que formulou esse conceito de “bem comum”, tido como a finalidade
das sociedades. Segundo ele, “o bem comum consiste no conjunto de todas as condições
de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade
humana” (Encíclica “Pacem inm Terris”, 11, 58)
&? Manifestações de conjunto ordenadas
A simples reunião de um grupo de pessoas em busca de um mesmo objetivo não é suficiente
para garantir que esse objetivo seja alcançado. Para isso, é preciso, antes, que esse grupo esteja
organizado para agir em busca desse fim, É disso que se trata a manifestação de conjunto
ordenada: a ação de um grupo em conjunto orientada para um fim específico. E, para isso, é
preciso que essas ações tenham reiteração, ordem e adequação.
A reiteração vem da ideia de que as manifestações de conjunto em busca de um objetivo
devem ser realizadas permanentemente, e os atos individuais devem se conjugar em um todo
coletivo. À ordem, que alguns autores dividem entre natural e humana e outros em social e
jurídica, diz respeito à produção das manifestações para que se alcance o objetivo planejado, seja
por causalidade ou por imputação. E, por fim, a adequação é a necessária preocupaçãocom as
exigências e possibilidades da realidade social.
é : Poder Social
O poder social é uma realidade verificável em diversas modalidades de relacionamento
humano e consiste na faculdade de alguém impor a sua vontade ao outro sem necessariamente
precisar recorrer ao uso da força. (SOARES, 2004, p. 18).
O poder social sempre existiu na sociedade humana, apresentando, em qualquer grupo social,
traços característicos de sociabilidade — o poder é um fenômeno social — e de bilateralidade — o
poder é a correlação de duas ou mais vontades, sendo que uma predomina. (SOARES, 2004, p . 18).
Ps
21
»
“5 TEORIAS SOBRE OS FUNDAMENTOS DA
SOCIEDADE: A INTERPRETAÇÃO ORGANICISTA E
«MECANICISTA DA SOCIEDADE
As sociedades organizam-se de formas variadas, que se distinguem pelos fins, pela amplitude
e pelo grau de intensidade dos vínculos que envolvem os membros do grupo social aos tipos de
associação existentes, Assim, a partir da análise das finalidades, pode-se distinguir dois tipos de
sociedades: as de fins particulares, que possuem objetivos definidos voluntariamente escolhidos por
seus membros, e as de fins gerais, que possuem objetivos indefinidos e genéricos que se destinam a
possibilitar aos indivíduos que busquem atingir seus fins particulares. (SOARES, 2004, p. 19).
O Estado é uma forma de sociedade que Soares (2004, p. 19) denomina como “sociedade
política”, que é a que se ocupa da “totalidade das ações humanas, coordenando-as em função
de um objetivo comum”, coexiste com outras estruturas sociais, tais como a família, as tribos e
os clãs, delas se diferenciando pelo monopólio legítimo da coação física para fazer valer as suas
determinações.
A interpretação organicista compreende a sociedade como “o conjunto de relações por
intermédio das quais vários indivíduos vivem e atuam solidariamente, de forma ordenada,
visando estabelecer entidade nova e superior”. Os principais teóricos que se destacaram nessa
corrente foram Aristóteles, Platão, Comte (organicismo materialista), Savigny (organicismo ético
e idealista) e Del Vecchio. (SOARES, 2004, p. 13).
Bonavides também relembra Aristóteles e Platão e os apresenta como o “tronco milenar da
filosofia grega" de onde procedem os organicistas. E destacajána produção aristotélica a ideia de
que os homens são partes de um todo que é social. (BONAVIDES, 2011, p. 58).
Na doutr ina aristotélica assinala-se, com efeito, o caráter social do homem. À natureza fez um
homem um “ser político”, que não pode viver fora da sociedade.
Se a sociedade é o valor primário fundamental, se a sua existência importa numa realidade
superior, subsistente por si mesma, temos o organicismo.
Reunião de várias partes que preenchem funções distintas e que, por sua ação combinada,
concorrem para manter a vida do todo. (BONAVIDES, 2011, p. 58).
Mas é importante anotar a observação de Bonavides, que apontou que os organicistas
apresentavam tendências a adotar posições ideológicas reacionárias em relação ao poder.
(SOARES, 2004, p. 13).
P
23
Entende esta que o homem jamais nasceu na liberdade e , invocando o fato biológico do
nascimento, mostra que desde o berço o princípio de autoridade o toma nos braços, rodeando-o,
amparando-o, gove rnando -o .Vinte e quatro horas fora da proteção dos país bastariam para acabar com
o ser que chega ao mundo t ão frágil e desprotegido. Dependência, autoridade, hierarquia, desamparo,
debilidade, e i sjáno núcleo familiar os vínculos primeiros que envolvem a criatura humana e dos quais
jamais logrará desatar-se inteiramente. Fazem os organicistas a apologia da autoridade. Estimam
o social porque veem na Sociedade o fato permanente, a realidade que sobrevive, à organização
superior, o ordenamento que, desfalcado dos indivíduos na sucessão dos tempos, no lento desdobrar
das gerações, sempre persiste, nunca desaparece, atravessando o t empo e as idades. Os indivíduos
passam, a sociedade fica. (BONAVIDES, 2011, p . 59).
Os mecanicistas, por sua vez, atacam a Teoria Organicista sempre negando que exista
alguma espécie de identificação entre os organismos biológicos e a sociedade, pois a sociedade
experimenta fenômenos que não encontram equivalência na realidade do sujeito, tal como
migrações, mobilidade social e suicídios, por exemplo. No organismo individual, as partes não
vivem por si mesmas, nem podem estar fora do ser que integram ou em outra posição que não
aquela que a natureza lhes determinou. (BONAVIDES, 2011, p. 60-61).
A teoria mecanicista é predominantemente filosófica, com especial destaque para os filósofos
jusnaturalistas, segundo os quais a “sociedade é um grupo derivado de um acordo de vontades
formalizado por seus próprios membros” que se unem por um “mesmo interesse comum”, que
depende da conjugação de seus esforços para que seja alcançado. De acordo com essas ideias,
o fundamento da sociedade é, então, o consentimento dos cidadãos firmado por meio do pacto
social. (SOARES, 2004, p. 13-14).
À teor ia mecânica é predominantemente filosófica e não sociológica. Seus representantes mais
típicos foram alguns filósofos do direi to natural desde o começo da idade moderna. Seus corolários,
com rara exceção, é Hobbes é aqui uma dessas exceções, acabam, sob o aspecto político, na explicação
e legitimação do poder democrático.
Das teses contratualistas, da postulação que estas fazem, infere-se que à base da Sociedade é o
assentimento e não o princípio de autoridade.
A democracia liberal e a democracia social partem desse postulado único e essencial de
Organização social, de fundamento a toda a vida política: a razão, como guia da convivência humana,
com apoio na vontade livre e criadora dos indivíduos. (BONAVIDES, 2011, p . 61).
FIQUE DE OLHO
De acordo com a Teoria Mecanicista, são três as hipóteses que podem expl icaro surgimento
da sociedade:
1- a sociedade originou-se da vontade humana formulada por meio de pacto;
2-a sociedade é resultado da última etapa de evolução da primeira hipótese, em perspectiva
material ou espiritual;
3- a sociedade teria nascido da predisposição e das necessidades da natureza humana.
(SOARES, 2004, p. 14).
Os organicistas, então, são os que “se abraçam ao valor Sociedade” e se esquecem das
liberdades individuais e da autonomia. Assim, com base nessas crenças, os organicistas tendem
a assumir posições antidemocráticas, autoritárias e de direita, bem como defender justificações
reacionárias do poder e autocracia. Os mecanicistas, ao contrário, são os que não reconhecem a
sociedade como uma realidade suscetível de subsistir fora ou acima dos indivíduos, mas apenas
como uma soma de partes. (BONAVIDES, 2011, p. 59).
Se o organicismo e o mecanicismo foram as duas mais importantes formulações históricas
sobre os fundamentos da sociedade, qualquer conceito que se desenvolva sobre “sociedade” vai
trazer maior influência de uma ou de outra concepção. Assim, quando se diz que “a sociedade
é o grupo derivado de um acordo de vontades, de membros que buscam, mediante o vínculo
associativo, um interesse comum impossível de obter-se pelos esforços isolados dos indivíduos”,
trata-se, na verdade, de um conceito bem alinhado ao mecanicismo. Todavia, quando se define
a sociedade como “o conjunto de relações mediante as quais vários indivíduos vivem e atuam
solidariamente em ordem a formar uma entidade superior”, estamos diante de um conceito
fundamentalmente organicista. (BONAVIDES, 2011, p. 57-58).
25 dá
,
* compreender que a Ciência Política passou por algumas evoluções terminológicas e,
Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
principalmente, pela evolução dos métodos e delimitações enquanto ciência, para
então conseguir ser reconhecida como ciência autônoma e se desvencilhar das outras
ciências, principalmente do Direito.
* saber que, apesar de ter se desvinculado do Direito, a Ciência Política e as Ciências
Jurídicas têm muitos pontos de encontro e se alimentam em vários pontos.
* ter sempre em mente que, conforme a Ciência Política possibilita,existe um caráter
classista do Estado e da sociedade, bem como dinâmicas de luta pelo poder nas
sociedades.
* compreender que o bem comum, tido como a finalidade social escolhida pelo
homem, consistiria no “conjunto de todas as condições de vida que configurem e
favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana”,
* entender que qualquer conceito que se desenvolva sobre “sociedade” vai trazer
maior influência d o organicismo ou do mecanicismo, já que estas foram as duas mais
importantes formulações históricas sobre os fundamentos da sociedade.
BONAVIDES, P. Ciência Política. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
MALUF, S&. Teoria geral do Estado. 30. ed, São Paulo: Saraiva, 2010,
PINTO, K. Curso de Teoria Geral do Estado: Fundamento do Direito Constitucional Positi-
vo. São Paulo: Atlas, 2013,
SOARES, M.L.O. Teoria do Estado: introdução. 2. ed. rev. atual. Belo Horizonte: Del Rey,
2004.
UNIDADE 2
Estado e soberania
Entrodução
Olá,
Esta nova unidade busca apresentar alguns dos grandes pensadores da Ciência Política e
do Estado. O material é uma referência do conteúdo básico da disciplina, então é essencial
a leitura de outras fontes de pesquisa. A leitura deve ser realizada pensando o contexto
histórico e as transformações sociais.
Traremos elementos teóricos e práticos do surgimento do Estado e da sua relação com
o poder. Nos tópicos sobre a separação de poderes, os regimes políticos e as formas de
Estado, trazemos a possibilidade de comparar o conteúdo com as informações e notícias
atuais. Sugerimos, inclusive, que o leitor pense o mundo atual a partir dos conceitos
debatidos.
Bons estudos!
P
29
“1 ESTADO E SOBERANIA: A VISÃO DOS CLÁSSICOS
DO PENSAMENTO POLÍTICO
O estudo da soberania é ponto importantíssimo na disciplina Teoria do Estado moderno, já
que se trata de um dos elementos essenciais na formação do Estado.
Mas mesmo antes deste conceito de Estado, a soberania era tema dos pensadores políticos
que, por sua vez, influenciaram a construção teórica do que hoje é chamado de governo soberano
e que traz os desafios contemporâneos sobre o tema. Por isso, é necessário compreendermos
alguns pontos das teorias mais comentadas na doutrina clássica.
Utilize o OR Code para assistir ao vídeo:
;Doutrinas teocráticas
Inicialmente, destacam-se as doutrinas ou teorias teocráticas, que desenharam o poder
soberano de uma forma em que a legitimação Última do exercício da soberania recaía sobre um
elemento divino ou natural.
É importanteter em mente que durante parte do Império Romano e a Idade Média os filósofos
eram pessoas ligadas direta ou indiretamente à religião. Além disso, o fundamento religioso
operava na ordem de uma ideologia que compunha o paradigma destes tempos, principalmente
na Idade Média,
Por esse contexto, os teólogos assumiram um papel de destaque na teoria filosófica, política
e social. Estes, por sua vez, escreveram que todo poder vem de Deus (omnis potestas a Deo).
Teólogos como Belarmino e Santo Tomás de Aquino fundamentaram a soberania no poder
divino, mas ressaltavam que este poder passava pelo povo. Para Santo Tomás de Aquino, o modo
h
30
como a soberania se externaliza e é usada são formas de manifestação do Homem, mas é Deus
quem confere o poder soberano. Assim, para o autor, quando os homens ultrapassam os limites e
os princípios divinos, eles são injustos, o que nos permite dizer que, apesar de haver alguém que
exerce o poder soberano, quem traz as regras e a legitimidade é um poder divino, de tal forma
que há um parâmetro para analisar se o poder tem sido exercido conforme a vontade e as leis
divinas. A síntese do pensamento de Santo Tomás de Aquino é expressada como: Omrnis potestas
a Deo per populum — Todo poder vem de Deus pelo povo.
Para compreender este ponto, é importante saber que, dentre os diversos teóricos que
explicavam a Soberania como um poder advindo de Deus, cada um possuía sua análise, tendo
complexidades e nuances diferentes que não cabem a este estudo aprofundar. Destacamos,
inclusive, que Azambuja menciona autores que, ao trazerem o elemento do povo para a questão
da soberania,já o fizeram em razão das aspirações democráticas.
“A teoria do direito divino providencial, cujos mais ilustres intérpretes modernamente foram De
Maistre e Bonald, ensinava que Deus não intervém diretamente para i nd i ca rapessoa que deve exercer
o poder, mas indiretamente, pela direção providencial dos acontecimentos humanos. É, pois, uma
doutrina semelhante à de Santo Tomás.” (AZAMBUIA, 2008, p. 77).
O poder político em Nicolau Maquiavel
Nicolau Maquiavel escreveu o famoso livro O Príncipe, de 1513, considerado como um dos
textos que funda a Política como arte de governar o Estado.
Assim, o exercício do poder seria uma forma de manutenção do próprio pode re da estabilidade
do Estado, sendo que a política “era precisamente a arte de conquistar o poder político, conservá-
lo e exercê-lo” (AZAMBUJA, 2008, p. 27), razão pela qual a política, o poder e a soberania estão
intimamente imbricados em Maquiavel.
Para Azambuja (2008), Maquiavel não quis classificar entre bons e maus os governos. Pelo
contrário, quis tentar sair desta classificação para mostrar como a história possui ciclos fatais,
em que homens bons tentam derrubar o governo anterior, mas seus filhos que não vivem os
sofrimentos dos pais acabam por cometer injustiças com os governados, e assim serão depostos.
A análise empírica de Maquiavel é inserida no contexto de uma Itália instável, formada por
diversos estados assimétricos e com invasões constantes, daí a preocupação central em estabelecer
um poder político que consiga perpetuar no tempo. Mário Lúcio Quintão Soares afirma:
“Maquiave l deve ser analisado em seu contexto histórico, pois fo i fiel à sua época e à sua
classe, ao justificar a organização das monarquias nacionais absolutas como forma política do
Estado moderno que permitiria e facil i taria um ul ter ior desenvolvimento das forças produtivas do
capitalismo” (SOARES, 2011, p. 49).
O autor analisou e trouxe diversas virtudes as quais o bom soberano deveria ter para unificar
a Itália, como ser um príncipe protegido pela fortuna e dotado de virtú. Dessas qualidades, o
governante acabaria por necessitar da sorte, em razão dos elementos externos que estão fora de
seu alcance, além de ambição e sabedoria para tomar as decisões políticas.
A somatória destas e outras características elencadas na obra traria o consentimento dos
cidadãos, que por sua vez permaneceriam fiéis ao poder soberano.
&: O concei to de soberan ia em Jean Bod in
Jean Bodin publicou em 1576 a obra Os Seis Livros da República, que teve grande impacto
sobre a temática da política, poder e soberania.
Mario Lúcio Quintão Soares (2011) relata como Jean Bodin foi o primeiro autor a descortinar
o elemento da Soberania e a buscar sua justificativa. Esse poder soberano clássico, também
chamado de summa potestas, não tinha relação como hoje a um direito internacional, mas em
um âmbito interno. Era o poder absoluto e eterno que não conhecia limites por ninguém, pois
não havia autoridade superior ao soberano (majestas est summa in cives ac súbditos legisbusque
soluta postesta). Era exceção justamente aquele que legitimaria este poder: Deus e as leis divinas.
Nina Ranieri (2019) aponta como Bodin, em Os Seis Livros da República, buscou uma
abordagem empírica do Estado, principalmente em razão da crise de justificação do final
do século XVI. Por isso ele também tinha relação com um modelo absolutista, no sentido de
conferir legitimidade a este modelo que poderia trazer estabilidade às nações europeias naquele
momento. Ranieri afirma que, “a despeito da descrição empírica da realidade estatal e de suas
exigências, nele se percebe, sobretudo, o desejo de restaurar o equilíbrio entre Moral e Política,
entre Direito e Poder.” (RANIERI, 2019, p. 65).
Bodin afirmava, inclusive, que a nação que possuía algum tipo de vínculo jurídico com outras
nações, como tratados,por exemplo, não poderia ser chamada de Estado soberano. Segundo
ele, um Estado que precisa de um acordo com outro Estado não pode se considerar soberano.
Se o cerne do poder político é a capacidade de legislar sobre todos que estão abarcados por
tal manifestação política de forma irrestrita, independentemente do consentimento, então os
tratados internacionais que impõem limites às nações iriam de encontro à sua noção de soberania.
Dos escritos de Bodin, podemos sintetizar que a soberania é esse poder perpétuo, inalienável
e imprescritível que não tem limites senão em Deus.
Contudo, uma visão rápida poderia nos levar ao erro de acreditar que o Soberano poderia
tudo. Mario Lúcio Quintão Soares (2011) anota que, da limitação das leis divinas, o summa
potestas deveria observar certos limites como a própria finalidade do Estado e do direito natural,
P
31
h
32
as leis de sucessão ao trono, os tratados que o Soberano pactuasse (em razão do princípio pacta
sunt servanda) e o consentimento dos estamentos.
A importância da teoria de Bodin, principalmente para superação do feudalismo, é indiscutível,
No entanto, por outro lado, o fortalecimento do âmbito internacional e dos tratados é justamente
um dos elementos que possibilitou que os Estados exercessem sua soberania com mais estabilidade
política, como será visto a partir da Paz de Westphalia e a teorização do Estado moderno.
É: A teoria contratual da origem do Estado
As teorias contratualistas estão inseridas em um movimento jusnaturalista que buscam
explicar as relações sociais e a formação do Estado em uma base hipotética racional, em que é
pressuposto um acordo entre as pessoas em algum momento após o estado de natureza. Assim,
as associações só existem porque os homens aceitarem se reunirem nestes moldes.
Neste sentido, destacamos as palavras de Nina Ranieri:
À doutr ina contratualista abriga uma grande diversidade de justificações a respeito do porquê
os homens decidiram unir-se e viver em sociedade. O ponto comum a todas é à negação do impulso
associativo espontâneo como elemento-chave do contrato social: o contrato social é intencional e
representa (RANIERI, 2019, p. 254).
Assim, antes de o ser humano viver em uma sociedade com regras, estruturada em
algum arranjo racional, ele teria vivido na natureza, de forma primitiva e apenas em busca da
sobrevivência.
Deste modelo de supor como ocorreu a evolução da humanidade é que foram criadas as
teorias contratualistas, que foi descrita por alguns autores. A partir de agora, vamos entender um
pouco melhor quem são eles e quais suas principais características.
&: O estado abso lu to de Thomas Hobbes
Thomas Hobbes viveu entre 1588 e 1679, e tem como principal obra O Leviatã. No que diz
respeito à justificativa do Estado e de sua soberania, o autor afirmou que o homem vivia em um
estado de natureza anárquico e caótico, em que o indivíduo vivia ameaçado pelas incertezas, o
ataque de oponentes e a mor te ,
Esse modelo imaginado seria a guerra de todos contra todos, criando no homem um instinto
agressivo sempre presente e natural.
O ser humano vivia em guerra com outros seres humanos em busca de poderes, e somente
um governo poderia punir os excessos destes e possibilitaria a vida em sociedade. Segundo
Hobbes, somente o medo da morte faz com que as pessoas busquem uma organização para se
PP
33
protegerem das outras.
Para pâr fim a essa situação caótica, o homem permitiu que um poder comum governe em
benefício de todos. Essa autoridade política única, que traria a estabilidade e segurança da vida
das pessoas seria, então, o Estado.
O Estado seria, portanto, uma abdicação da liberdade total do ser humano, por isso um mal,
um monstro, o Leviatã,
Utilizando-se da imagem bíblica do monstro mar inho Leviatã, descreve [Hobbes] o Estado,
significativamente, como o ente que assimila organicamente todos os integrantes da sociedade
política: “uma pessoa de cujos atos uma grande mult idão, mediante pactos recíprocos uns com os
outros, foi instituída por cada um como autora, de modo à ela poder usar a força e os recursos todos
da maneira que entender conveniente, para assegurar a paz. (RANIERI, 2019, p . 258).
Esse mandatário teria, para Hobbes, poderes ilimitados, indiscutíveis e absolutos. Uma
soberania ilimitada e acima da moral. O que, no contexto histórico, era exatamente a teoria que
os monarcas absolutistas queriam encontrar.
Podemos afirmar, a partir destes elementos e das leituras sobre Hobbes que o ser humano,
sob o medo da morte, decide abdicar de parte da sua liberdade para criar o Estado. Este, por sua
vez, terá seu poder e soberania para garantir a liberdade e segurança dos indivíduos.
&: O estado l i be ra l de John Locke
John Locke viveu entre 1632 e 1704, desenvolveu um contratualismo liberal para justificar
o Estado e o exercício de sua soberania. De forma diversa de Hobbes, não propunha um Estado
absolutista,
Para o autor, todos os homens são iguais, e essa premissa é muito importante para justificar
o direito natural de cada indivíduo em ser livre. Dessa forma, o homem inserido em um estado
natural percebeu que era necessário criar leis para trazer estabilidade e restabelecer a igualdade
e a justiça entre as pessoas que, por sua vez, teriam sido ameaçadas com a formação das
sociedades.
Ssahid Maluf (2009) destaca que na obra Ensaio sobre o governo civil, Locke desenvolve uma
teoria que justificaria o Estado inglês do final do século XVII. O autor destaca que Locke afirmou
que as pessoas podem delegam parte de suas liberdades, mas que o fariam apenas com aquelas
relacionadas às relações externas, em sociedade. Assim, por outro lado, algumas liberdades e
direitos fundamentais seriam indelegáveis, e o Estado não teria a possibilidade de restringi-los
aos indivíduos:
O homem não delegou ao Estado senão os poderes de regulamentação das relações externas
à
34
da vida social, pois reservou para si uma parte de direitos que são indelegáveis. As liberdades
fundamentais, o direito à vida, bem como todos os direitos inerentes à personalidade humana,
são anteriores e superiores ao Estado.” (MALUF, 2009, p. 77).
É interessante perceber que em Locke, apesar do grande destaque dado às liberdades em uma
lógica naturalista e racionalista, o autor coloca a questão ao lado do bem comum. Esta questão
seria a razão de ser do Estado, formado por um contrato nitidamente objetivo para garantir o bem
comum, juntamente com as liberdades.
Azambuja (2008) também extrai de Locke a ideia de que o poder deve ser exercido pela
maioria que, consente expressamente quando se cria a sociedade estatal e, tacitamente, os seus
descendentes. Para o inglês, a melhor forma de se governar a sociedade seria pela democracia,
só sendo admitido um monarca caso haja um legislativo.
Destacamos, inclusive, que apesar da notoriedade de Montesquieu e sua teoria sobre os
três poderes e os respectivos órgãos, lohn Locke em sua defesa pela democracia já distinguia os
poderes, com destaque para a função do legislativo.
7 A soberania popular de Jean Jacques Rousseau
Jean Jacques Rousseau (1712-1778) é considerado por Maluf (2009) como o teórico
contratualista que mais aprofundou em estudos sobre a justificação do Estado e a soberania,
como o au to r que mais inspirou a Europa e a América no século XVIII.
Maluf continua e afirma que em Rousseau temos a afirmação de que a soberania não vem da
coroa, mas dos indivíduos que, a partir da vontade da maioria, convencionam pelo surgimento
do Estado.
Neste sentido, considerando que a soberania é do povo, ela nunca poderá ser limitada por um
governante, que deverá garantir o bem comum sob pena de, em algtum momento, ser retirado do
poder, até mesmo com um novo pacto a fundar um novo Estado.
Para Rousseau, o homem era livre e feliz, e a sociedade e a propriedade privada trouxeram
consequências negativas aos homens. Para evitar maiores desigualdades e proteger aqueles que
foram subjugados é que foi criado oEstado.
O problema social consistia, assim, em encontrar uma fo rma de associação capaz de proporcionar
os meios de defesa e proteção com toda a força comum, às pessoas e aos seus bens, e pela qual cada
um, unindo-se a todos, não tivesse de obedecer senão a si próprio, ficando tão livre como antes do
pacto”. (MALUF, 2009, p. 81)
Assim, o homem abre mão de parte da sua liberdade por meio de um contrato social, que terá
um poder político que é a vontade geral. Sobra a cada indivíduo uma parcela da soberania, e por
P
35
isso a necessidade de uma maioria para a manutenção do Estado.
As leis trazem, portanto, a vontade geral e o conteúdo das normas deste contrato social que
funda e mantém o Estado. Mario Lúcio Quintão Soares (2011) destaca que o homem abre mão da
sua liberdade natural e, em contrapartida, recebe a liberdade civil.
Outro importante ponto para a compreensão do Estado segundo Rousseau é compreender
que só há a soberania popular quando os governados e os governantes possuem convergência
e uma consequente ação estatal que respeite a vontade do povo: a democracia (SOARES, 2011).
Fonte: Lisa-S, Shutterstock, 2020
í HtParaCegoVer: Juiz segurando um livro grande e virando a página. Não é possível ver o rosto
ÃO juiz.
Et MONTESQUIEU, OS TRÊS PODERES E AS LEIS
A divisão dos poderes é um desenho do exercício dos poderes políticos pelo Estado, também
conhecido como sistema de freios e contrapesos ou, na forma americana, checks and balances
system. Juliano Bernardes e Olavo Ferreira (2019) afirmam que esta forma de distribuir o exercício
dos poderes foi pensada porAr is tóte les,John Locke e Jacques Rousseau, apesar de que a definição
e divulgação se deu mesmo com Montesquieu, enquanto que para Soares (2011) a ideia remonta
a Platão, tendo Montesquieu inovado quanto à distinção orgânica entre esses poderes.
Charles-Louis de Secondat, barão de La Brêde e de Montesquieu, ficou conhecido apenas
como Montesquieu, e tem grande importância no estudo das ciências políticas, do estado e do
direito, principalmente pelo seu livro Vesprit des lois, traduzido como O espirito das leis, de 1747.
h
36
Destacamos que, apesar de o autor ser muito citado pela teoria da separação dos poderes, o
referido livro não se resume a isso, sendo na verdade uma teorização sociológica dos governos,
do direito e das organizações políticas. Destaca-se que, inserido em uma onda iluminista, o autor
permanece na tentativa de explicar a sociedade a partir de leis naturais.
Mario Lúcio Quintão Soares destaca que a obra “rompe com a tradicional submissão da
política à teologia, ao definir leis, em seu significado mais amplo, como relações necessárias
derivadas da natureza das coisas (liv. |, cap. 1)" (SOARES, 2011, p. 65).
Para Soares, Montesquieu contemplou em um Reino Unido construída como protótipo os
seguintes poderes:
“O Legislativo:
como vontade geral do Estado, deve ser confiado aos representantes do povo e a uma
assembleia de nobres, retratando o pluralismo político do parlamento. Este, como órgão
representativo da comunidade política, deve ser dotado de competência para criar leis por um
tempo ou para sempre, e corrigir ou anular aquelas que foram feiras, e, ainda, servir de obstáculo
às eventuais arbitrariedades perpetradas pelo monarca” (SOARES, 2011, p. 66-67);
“O Federativo:
como poder executivo das coisas atreladas ao direito das gentes, deve ser conferido ao
príncipe ou magistrado, encarregado de fazer a paz ou à guerra, exercer o direito de legação,
instaurar a segurança e prevenir invasões estrangeiras” (SOARES, 2011, p. 66-67);
“O Executivo:
como executivo da vontade geral do Estado ou daquelas coisas que dependem do governo
civil, deve ser outorgado a um monarca inviolável, rodeado de ministros responsáveis, incumbidos
da execução das leis. O poder de julgar os crimes e decidir sobre querelas entre os particulares
deve ser exercido por pessoas tiradas do meio do povo, em certos momentos do ano, de maneira
prescrita na lei, para formar um tribunal que só dure o tempo necessário que a necessidade
requer”, (SOARES, 2011, p. 66-67).
Nina Ranieri (2019), aponta que no estudo das leis dos governos e na tentativa de garantir
a liberdade de se fazer aquilo que a lei permite, essa separação de poderes proposta por
Montesquieu visa limitar e moderar o poder do Estado. Dessa forma, se cada um dos poderes for
independente, com a possibilidade de frear os abusos do outro, teríamos uma organização estatal
racionalmente limitada,
A autora aponta como Montesqu ieu centrava seu pensamento em uma supremacia
37
do parlamento britânico, com a fórmula King in the Parliament, que busca exatamente
desconcentrar o poder, para que ele não ficasse acumulado em uma única mão. Daí a necessidade
de funções dividas, harmoniosamente, sem haver usurpação. Os poderes seriam separados e
complementares.
Em síntese, o avanço teórico de Montesquieu é pensar a divisão das funções estatais também
em órgãos. Cada órgão teria uma das três funções do poder estatal, o que, para a época, trazia
um modelo racional de superar o absolutismo centralizador.
Em uma análise mais criteriosa e científica, devemos alertar que o mais adequado não é
considerar uma divisão dos poderes, uma vez que o poder político é uno, indivisível e indelegável.
Mas, há uma divisão de funções entre órgãos autônomos, independentes e harmônicos.
Nesse modelo de divisão de funções, três órgãos acabaram por receber o nome de poderes,
cada um com suas funções precípuas.
As constituições norte americanas e francesas, do final do século XVIIl, tiveram grande
influência deste pensamento orgânico da separação das competências dos poderes. Era um
movimento em que além do pensamento federalista, havia também o discurso sobre a limitação
do Estado e seu controle, como alguns artigos escritos por James Madison e Thomas Jefferson.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2015) destaca que a divisão funcional dos poderes nas
democracias ocidentais não foi fruto de uma genialidade de um teórico inspirado, mas o resultado
da prática do constitucionalismo inglês que consagrou o Bill of Rights de 1689, Neste sentido,
podemos destacar também o empirismo federalista norte americano.
O conceito de checks and balances está preconizado na Constituição norte americana, logo
nos três primeiros artigos. Sugerimos a consulta do documento, para a melhor compreensão
deste arranjo, em que os papéis estão bem delimitados, inclusive com mecanismos de controle,
como o julgamento de impeachment do Presidente dos Estados Unidos, que será presidido pelo
Presidente da Suprema Corte e julgado pelos senadores.
Assim, com a teoria de Montesquieu atualizada nos tempos atuais, podemos dizer que temos
o Poder Legislativo, Poder Executivo e o Poder Judiciário.
O poder legislativo tem como razão de ser a representação da população e, quando for caso,
dos entes federados para criar e extinguir leis, bem como fiscalizar as ações do poder executivo
para o cumprimento fiel da legislação.
O poder executivo, assim, tem a competência de executar as leis, políticas públicas, serviços
públicos e as atividades decorrentes da administração da máquina estatal, sendo, por isso,
chamada também de função administrativa.
h
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Por sua vez, o poder judiciário tem a competência de analisar a lei nos casos concretos
quando provocado, resolvendo os conflitos de interesses existentes na sociedade, para que todas
as pessoas, inclusive o estado, sejam compelidas a obedecer a legislação.
Podemos assim, sintetizar a divisão entre as competências típicas dos órgãos estatais:
a) Poder legislativo:
legislar e fiscalizar — a r t . 44 da CF/88.
b) Poder executivo:
administrar o estado — art. 76 da CF/88.
c) Poder judiciário:
julgar casos concretos — Art. 92 da CF/88,
Apesar deste modelo bem delimitado de competências, a explicação teórica teve de criar
aquilo que convencionou-se chamar de funções atípicas dos poderes estatais. Isso ocorreu porque,
apesar de cada órgãoter sua competência justificada em um sistema que traz equilíbrio para o
Estado, a prática exige que algumas funções sejam exercidas, excepcionalmente, por aquele que
originalmente não teria tal competência.
Como visto, se a separação funcional e orgânica dos poderes se dá para evitar o abuso e a
concentração de poderes em um só órgão, a teoria estatal criou mecanismos de fiscalização e
responsabilização dos poderes estatais, o que Pedro Lenza (2019) chama de desenho institucional
dos freios e contrapesos.
Destacamos que este desenho institucional variará conforme cada ordenamento jurídico,
se mencionamos os três primeiros artigos da Constituição norte americana como exemplo, em
nosso ordenamento este arranjo é feito em diversos artigos. Pedro Lenza destaque os seguintes:
art. 59, XXXV:
o Poder Judiciário pode rever atos de determinada CPI (Legislativo) que extrapolem o
postulado da reserva constitucional de jurisdição, quando, por exemplo, o seu presidente expede
um mandado de busca e apreensão em total violação ao art. 5º, Xl;
ar t . 52 , |:
compete privativamente ao Senado Federal (legislativo) processar e julgar o Presidente e o
Vice-Presidente da República (Executivo) nos crimes de responsabilidade;
39
art. 53, 8 1º, c / co art. 102,1, “b” :
eventual condenação pelo STF (ludiciário) de parlamentar federal corrupto (Legislativo) que
se vale de seu cargo para indevidamente enriquecer (cf. julgamento do denominado “mensalão”
na AP 470);
ar t . 62 :
as medidas provisórias adotadas pelo Presidente da República (executivo) poderão ser
rejeitadas pelo Congresso Nacional (Legislativo);
ar t . 66 , 8 1 º :
o Chefe do Poder Executivo pode sanc iona rou vetar projetos de lei aprovados pelo Parlamento
(Legislativo);
art. 66, 88 4º a 6º:
o Parlamento (Legislativo) poderá “derrubar” o veto lançado pelo Chefe do Poder Executivo;
ar t . 66 , 8 7 º :
se a lei não for promulgada dentro de 48 horas pelo Presidente da República (Executivo), nos
casos dos $8 3º e 5º, o Presidente do Senado (Legislativo) a promulgará, e, se este não o fizer em
igual prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado (Legislativo) fazê-lo;
ar t . 63 , l e l :
cabe emenda parlamentar (Legislativo) em projeto de lei de iniciativa exclusiva do Presidente
da República (Executivo);
ar t . 64 , 8 1 º :
o Presidente da República (executivo) poderá solicitar urgência para o Parlamento (Legislativo)
apreciar os pro je tos de sua iniciativa;
a r t . 97 :
os juízes (Judiciário) poderão declarar a inconstitucionalidade de lei (Legislativo) ou ato
normativo do Poder Público (inclusive, como exemplo, de decretos autônomos elaborados pelo
Executivo);
art. 101, parágrafo único (c/c o art. 52, 111, “9%, e o art. 84, XIV):
h
40
os Ministros do STF (Judiciário) serão nomeados pelo Presidente da República (Executivo),
depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (Legislativo);
art. 102, | , “a":
compete ao STF (Judiciário) declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal
ou estadual (Legislativo). (LENZA, 2019, p. 569-570).
Temos, portanto, as funções típicas de cada um dos três poderes, que justificam a existência
de cada um destes órgãos, e as funções atípicas, que possuem uma natureza distinta daquela
originariamente pensada para cada um dos três poderes.
Para ilustrar e não deixar dúvidas: o poder legislativo tem como função típica legislar e
fiscalizar, contudo, ele também julgará o Presidente da República nos crimes de responsabilidade.
Importante: essa função atípica está prevista na constituição e, exatamente por isso, é uma
exceção legítima dada ao poder legislativo.
Atenção: O STF (na ADIn 135/PB) já manifestou que o judiciário e o legislativo também terão
de exercer a função administrativa Contudo, tal atividade não é uma exceção às competências
dos órgãos. Se a independência destes órgãos dá a eles a garantia de gerirem seu patrimônio e
suas atividades internas, uma consequência é que eles terão de gerir os servidores públicos que
lá trabalham, executar os contratos de compra e prestação de serviço, realizar licitações, dentre
várias outras atividades consideradas administrativas.
É importante perceber que essas atividades serão unicamente no âmbito de cada um dos dois
poderes mencionados e para a fiel execução das suas atividades finalísticas (típicas) e, portanto,
trata-se apenas de meio necessário para seu funcionamento.
É REGIMES POLÍTICOS
Os regimes políticos são formas de concretização de ideias de como se exercer o poder e
tomar decisões no Estado. Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2015) explica que, apesar da falta
de consenso entre terminologias, é possível dizer que o sistema político é normatizado pela
Constituição do Estado e o regime é o modo efetivo como esse sistema é exercido. Logo, se a
Constituiçãofor inteiramente respeitada, o sistema político e o regime político serão equivalentes.
Esses regimes são conceituados de formas opostas entre os democráticos e os autoritários,
sendo certo que essa classificação se dá gradualmente, a partirda análise de diversos instrumentos
estatais de tomadas de decisão e exercício do político.
Utilize o OR Code para assistir ao vídeo:
E Regimes autoritários
Azambuja (2008) aborda aquilo que compreendemos como regime autoritário e como
ditadura. Diversos outros autores, como Ferreira Filho (2015), Maluf (2009) e Ranieri (2019),
dedicam-se pouco a falar do autoritarismo enquanto regime político porque, em alguma medida,
sua antítese é o regime democrático.
Por sua vez, a democracia é um regime que poderá ser graduado, de forma que permite uma
comparação entre regimes ou teoria de sistemas políticos, para concluirmos se o regime é mais
ou menos democrático do que o comparado.
Dessa forma, um estado autoritário é aquele que tem menos instrumentos de decisão política
considerados democráticos.
Podemos dizer que alguns regimes autoritários se instauram sob a justificativa de
transitoriedade e por isso podem, a depender do caso concreto, ser chamados desta forma:
regimes de transição.
De toda sorte, se a reflexão perpassa pelo debate atual de regimes de governo, bem como os
tratados internacionais e os debates que focam nos direitos humanos, esses regimes autoritários,
ainda que transitórios, seriam considerados reprováveis.
Podemos afirmar, portanto, que os regimes autoritários são aqueles em que há supressão ou
redução de direitos fundamentais e de instrumentos democráticos que possibilitam à população
participar da instância política do Estado.
hà
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E resimos democráticos
Os regimes democráticos trouxeram uma complexidade maior na intervenção do Estado
na vida dos indivíduos. Diferentemente do que propunha o liberalismo político, o Estado está
presente de forma intensa na vida dos cidadãos mas, por outro lado, busca não restringir direitos
individuais. Além disso, são exigidas dele intervenções para que os projetos de vida, múltiplos,
possam ser exercidos. Há o crescimento da esfera pública e da participação popular, bem como
um espaço de possibilidade de diálogo em que os cidadãos possam deliberar sobre a vida pública.
Depois da segunda guerra mundial, algumas Constituições, como a de Bonn (Alemanha —
1948), a Constituição italiana de 1948, espanhola de 1978, a portuguesa de 1976 e a brasileira de
1988, são exemplos de Estados que adotaram regimes democráticos que visam o reconhecimento
da diversidade e do pluralismo social.
As Constituições passam a ter uma importância de destaque. Com um papel mais do que
político, assumem a supremacia em um sistema jurídico que serve de contenção para abusos das
demais esferas da sociedade, incluindo os poderes econômico e político.
Neste contexto, o legislativo tem seu papel reafirmado, pois é a instância na qual a vontade
popular se manifesta. Contudo, o poder judiciário passa a ser o órgão constitucionalmente
legitimado para ser o guardião do sistema jurídico e das instituições.
Os direitos humanos passama integrar os princípios democráticos em seu rol na terceira
onda geracional e, numa via de mão dupla, os Estados democráticos somente serão assim
considerados se há um elevado grau de tutela aos direitos humanos. Assim, só podemos falar
em um Estado democrático se a participação popular vier acompanhada de proteção efetiva aos
direitos humanos.
É: Regimes totalitários
Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2015), o regime totalitário
“Apresenta-se marcado por uma ideologia oficial, um partido único, de massa, que controla t oda à
mobilização política e 0 poder concentrado em mãos de um pequeno grupo que não pode ser afastado
do poder por meios institucionalizados e pacíficos.” (FERREIRA FILHO, 2015, p . 107).
Nina Ranieri (2019) anota que, filosoficamente, os Estados totalitários se opõem ao liberalismo,
e no plano dos regimes políticos à democracia. Tal forma de organização política parte do
pressuposto de que o Estado é eticamente superior aos indivíduos, razão pela qual se colocam de
forma a suprimir a individualidade em nome do bem comum, com um único governante ou partido.
O Estado que adota tal regime não admite conceitos que estejam fora da máquina estatal
e, por isso, aniquilam a subjetividade e a identidade dos indivíduos. Suas ações só poderiam ser
aquelas autorizadas pelo poder Soberano.
Apesar dessa oposição ao modelo filosófico liberal, Azambuja (2008) anota que na perspectiva
política não há uma identificação com as teorias, sendo possível encontrarmos estados totalitários
com ideias socialistas, como a União Soviética, ou modelos capitalistas como na Itália Fascista.
Como forma de demonização ideológica, esses regimes políticos utilizam do discurso
nacionalista, em busca de identidade popular que coadune com a ideia de povo, em que as
pessoas convirjam para esse bem comum que o Estado simbolizaria e materializaria.
Apesar detersemelhanças práticas entre Estados liberais e o Estado autoritário (autoritarismo),
eles não se confundem, pois a ideia de oposição política não existe em nenhuma medida no
totalitarismo que, como o nome indica, tem tudo sob o domínio do governante ou seu partido.
Os clássicos exemplos de Estados totalitários, que foram responsáveis por anularem direitos
individuais e colocarem o Estado sempre acima do indivíduo, foram a Alemanha nazista, a Itália
fascista e a União Soviética.
Recomendamos ao estudante que se aprofunde sobre o tema, que é de grande relevância no
momento político atual e, assim, possa formar sua opinião enquanto cidadão crítico. Sugerimos
a leitura do livro literário 1984, de George Orwell, e da obra política As origens do totalitarismo,
de Hannah Arendt.
Fonte: tlegend, shutterstock, 2020
HtParaCegoVer: Um martelo de juizem cima de um grande livro. Ao lado, outros dois livros
grandes e sobre eles uma balança, símbolo da justiça. Tudo está sobre uma mesa de madeira, e
ão fundo há um armário de livros e algumas cadeiras.
»
E ForRMAS DE ESTADO
A forma de Estado relaciona-se com a maneira como o Estado organiza suas funções políticas,
em uma análise a partir do grau de centralização destes poderes políticos que compõem o Estado.
Na prática é objeto de debates pois, se há mais ou menos centralização, é possível ampliar ou
reduzir a proximidade daqueles que governam com os cidadãos, o que variará muito em relação
à extensão territorial do país, a quantidade da população e o arranjo adotado.
Sobre as formas de Estado, Ranieri afirma:
“Um Estado pode adotar diferentes formas de organização política e administrativa, conforme o
grau de descentralização territorial do poder entre os entes que o compõem. Essa descentralização é
denominada vertical, posto que, em qualquer hipótese, promoverá a repartição de competências entre
a entidade central e as periféricas, dotando-as ou não de autonomia política.” (Ranieri, 2015, p. 145).
É Estados unitários
O Estado é considerado como unitário (ou também chamado de simples) se organiza-se
em um poder central, ainda que se divida em regionais e províncias, que por sua vez não têm
autonomias de poderes.
Azambuja (2008) tenta uma forma empírica de analisar e conceituar o estado unitário,
diferindo o que é um Estado e o que são apenas circunscrições territoriais descentralizadas, que
por sua vez estão presentes em estados unitários.
O autor sublinha, portanto, que há nestes estados um único poder legislativo, um poder
executivo e um poder judiciário. Há, neste ponto, uma ênfase ao poder legislativo que, sendo
apenas um órgão, terá poder para editar regras neste Estado.
Ainda que haja alguma descentralização administrativa, com administradores das províncias,
ou até mesmo com conselhos, estes terão algum grau de subordinação, hierarquia e serão
fiscalizados pelo poder central, o que não ocorre no modelo estatal antagonista, o federalismo.
Anotamos aqui para o estudante que a descentralização política não deve ser confundida com a
administrativa. Enquanto a política refere-se à capacidade de editar leis, a segunda está ligada ao
gerenciamento da máquina administrativa estatal que tem por finalidade a prestação do serviço público
— e este é um assunto relevante para a disciplina do Direito Administrativo e da Administração Pública.
Nina Ranieri (2019), por sua vez, elenca três características aos Estados unitários: a)
centralização política, com unidade jurídica; b) descentralização decisória, sob determinadas
condições; c) burocracia única.
Azambuja (2008) alerta que esse modelo essencialmente centralizado só existiria em lugares
P
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muito pequenos e pouco populosos. Podemos afirmar, assim, devido à raridade deste estado
unitário puro, que a melhor forma de analisá-los seria por graus de centralização. Propomos,
portanto, a separação dos estados mais ou menos centralizados segundo os seguintes critérios:
a) centralizados: os estados unitários são centralizados quando o governo é exercido com
centralização total na figura do governante, ou a delegação de competência da gestão está
centralizada em órgãos próximos a ele.
b) descentralizados: por outro lado, temos a possibilidade de o governo central repassar
serviços públicos a outras instâncias, que terão algum grau de autonomia na gestão dos serviços,
ainda que reste ao governo central os poderes de fiscalização.
Mais uma vez, é necessário não confundir com descentralização política, que seria a
possibilidade de outros entes ou órgãos editarem leis. Nesse caso, identificada tal características,
estamos diante de um estado federado,
Um exemplo que os autores sempre citam como Estado unitário é a França (além de Portugal e Uruguai).
Neste sentido, anotamos que na França temos coletividades territoriais, que são organizações
regionais, que podem administrar os serviços público por meio de conselhos, mas estes não
possuem um poder legislativo e, portanto, não têm a possibilidade de exercer autonomia política.
&? Estados compostos
Os Estados compostos, também chamados de estados complexos, são formas de Estado que
apresentam mais de um centro político. Mario Lúcio Quintão Soares (2011) afirma que esta forma
de Estado é resultado da aglutinação de vários outros estados e que a centralização do poder não
é acentuada, como no Reino Unido.
4.3 Estados federados
O termo federação possui sinônimo de união, aliança, cooperação. Um Estado federado, por
Sua vez, surge do pacto de entre outros estados (que geralmente serão chamados de estados-
membros) que decidem perder sua soberania em favor da União Federal. Há, portanto, o
surgimento de um novo Estado.
Geralmente, a formação deste estado federado se dá pela Constituição, que instrumentaliza
a criação da União a partir desse movimento político dos estados-membros.
46
Azambuja (2008) aponta que uma das características do federalismo é que a união tem a
intenção de ser perpétua, razão pela qual os estados-membros não terão direito a sair do Estado,
ou seja, não há no estado federado o direito de secessão.
No Estado federado, da perspectiva

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