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ESCOLA ESTADUAL AMÉRICO RENÊ GIANETTI APOSTILA DE SOCIOLOGIA Professora: Iara Neves Autora: Mariana Andrade B. Rosa Uberlândia 2012 2 MAX WEBER E A TEORIA COMPREENSIVA QUEM FOI MAX WEBER? Considerado um dos maiores pensadores do século XX, Max Weber nasceu em 1864, na cidade de Erfurt, Alemanha. Proveniente de uma família de burgueses liberais, desenvolveu estudos de direito, economia, filosofia, história e sociologia. Iniciou a carreira de professor em Berlim e, em 1895, foi professor universitário em Heidelberg, Alemanha. Na política, defendeu ardorosamente seus pontos de vista liberais e parlamentaristas e participou da comissão redatora da república de Weimar. Morreu devido a uma pneumonia aguda, em 1920, em Munique, Alemanha. Suas principais obras foram: Artigos Reunidos da Sociologia da Religião, Artigos Reunidos de Teoria da Ciência, Economia e Sociedade (obra póstuma) e A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. QUAL FOI A CONTRIBUIÇÃO DE MAX WEBER PARA A SOCIOLOGIA? POR QUE ELE É CONSIDERADO UM CLÁSSICO? A obra desse autor através de seus conceitos e tipologias contribuiu significativamente para a consolidação da Sociologia como ciência. Entre suas principais contribuições estão o desenvolvimento de uma rica metodologia para os estudos da sociedade e de um instrumento de análise dos acontecimentos ou situações concretas e os estudos sobre a burocracia, o sistema de estratificação social, a autoridade, a religião e o surgimento do capitalismo. Sendo assim, Weber é considerado um dos clássicos da sociologia, pois de sua teoria, assim como a de CURIOSIDADE! Max Weber participou da 1 a Guerra Mundial! Em 1914, ele se alistou como voluntário e foi nomeado capitão, sendo encarregado de organizar e administrar hospitais em Heidelberg. 3 Durkheim e a de Marx, partem os pressupostos que orientarão as teorias sociológicas de outros autores. CONTEXTO HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO DA SOCIOLOGIA WEBERIANA À época de Max Weber, estavam em evidência o positivismo na França e o idealismo na Alemanha. O ambiente intelectual em que Weber desenvolveu o seu pensamento, portanto, configurava-se um tanto diverso. Enquanto o positivismo era generalista e evolucionista, o idealismo enfatizava a importância da história, a diversidade e o esforço interpretativo. Nascido e criado na Alemanha, foi sob a influência do idealismo que Weber produziu a sua teoria. Nesse quadro teórico, não podemos deixar de salientar a importância de Karl Marx. O autor era considerado o interlocutor de Weber, isto é, aquele com quem Weber dialogava, uma vez que compartilhavam o mesmo objeto de estudo, o capitalismo ocidental, mas se diferenciavam em suas abordagens. Weber era crítico ferrenho do marxismo em suas formas vulgares, mais conhecido como economicismo. OBJETIVIDADE DO CONHECIMENTO Weber se preocupava com a objetividade do conhecimento na Sociologia, uma vez que esta era fundamental para garantir o reconhecimento da Sociologia como ciência. Partindo dessa preocupação, ele também definiu a conduta do cientista em relação à produção do conhecimento. Conforme o autor, a objetividade só poderia ser atingida se o cientista eliminasse seus juízos de valor, entendidos como opiniões, pré-noções e preconceitos, do discurso científico e estabelecesse uma relação com valores, isto é, uma relação com os conteúdos mais significativos e interessantes para o cientista, a fim de que pudesse selecionar seu objeto de estudo, obtendo, assim, o grau máximo de cientificidade. 4 Nesse sentido, a seleção implicava na fragmentação da realidade e análise de suas partes. Tal implicação era justificada por Weber como necessária, visto que a realidade é infinita e, portanto, impossível de ser captada em sua totalidade. OBJETO DE ESTUDO A análise weberiana se concentra na ação humana. Segundo Weber, a previsibilidade do conhecimento científico da ação humana é tão possível ou mais do que no caso dos fenômenos naturais. O indivíduo é capaz de atribuir significado a sua ação, tornando-a inteligível. Portanto, a ação humana é explicável, isto é, passível de ser apreendida pelo nosso conhecimento. Daí ele definir a sociologia como uma ciência que pretende compreender interpretativamente a ação social e assim explicá-la causalmente em seu curso e em seus efeitos. MÉTODO COMPREENSIVO Segundo Weber, método é uma técnica de conhecimento e é comandado pela lei da eficácia. Não é possível eleger o melhor método antes do início da pesquisa, somente a partir dos resultados que podemos validá-lo cientificamente através da verificação empírica. Weber recorre à compreensão como método analítico que buscará as relações causais, isto é, a captação do sentido da ação. Ela é ao mesmo tempo método e resultado, ou seja, um esforço interpretativo e uma atitude (de compreensão). TIPO IDEAL O tipo ideal consiste em um dos instrumentos de análise construído por Weber para analisar a realidade social. Este é definido como uma racionalização utópica que 5 acentua traços distintivos, característicos ou típicos de uma dada situação. Como é produzido para efeito de análise, deve ser entendido como uma abstração que não pode ser encontrada na realidade. Devemos evitar tomá-lo como modelo perfeito a ser seguido. A sua finalidade é possibilitar a comparação de diferentes tempos e lugares a fim de captar os nexos causais das interações, qualquer outra atribuição deve ser negada. O exemplo mais expressivo da utilização do tipo ideal encontra-se na Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo quando Weber tenta identificar como se estabeleceu a relação entre religião e economia, ou seja, entre a ética protestante e o desenvolvimento do capitalismo. AÇÃO SOCIAL A ação social é um dos conceitos mais importantes de Weber. Ela é definida como uma conduta humana (ato, omissão, permissão) dotada de um sentido subjetivo dado por quem o executa, o qual orienta seu próprio comportamento, tendo em vista a ação – passada, presente ou futura – de outro ou de outros que por sua vez podem ser individualizados e conhecidos ou uma pluralidade de indivíduos indeterminados e completamente desconhecidos. Para entendê-la melhor, Weber propôs quatro tipos puros de ação social. TIPOS PUROS DE AÇÃO SOCIAL Para classificar as ações sociais, Weber partiu do pressuposto de que as condutas humanas são tanto mais racionalizadas quanto menor for a submissão do agente aos costumes e afetos e quanto mais ele se oriente por um planejamento adequado à situação. Por ordem de racionalidade Weber definiu quatro tipos puros ação social, são elas: 6 AÇÃO RACIONAL COM RELAÇÃO A FINS: Objetivos previamente definidos geram meios para realizar fins. Ex: Conduta científica ou ação econômica AÇÃO RACIONAL COM RELAÇÃO A VALORES: Orienta- se pela crença em valores absolutos. Não considera as conseqüências advindas de sua conduta, sendo a própria conduta o sentido último da ação. Nesse sentido, para o indivíduo que a pratica, é relevante a opinião do grupo social ao qual pertence. Ex: Religião ou Movimentos sociais. AÇÃO TRADICIONAL: Decorrente de hábitos e costumes arraigados. Ex: Batismo, casamento na Igreja com vestido branco, pedir a benção aos pais e aos avós. AÇÃO AFETIVA: Inspirada em emoções imediatas sem consideração de meios ou fins a atingir. Ex: Amor, paixão, ciúmes, inveja, orgulho, admiração, raiva, ódio, tristeza, felicidade. Numa só ação é possível combinar de modos diversos os tipos puros caracterizados. No caso da escolha da(o) namorada(o), por exemplo, um(a) jovem poderá levar em consideração: suas qualidades, o seu estilo de vestir, o seu nível de escolaridade, se for agir racionalmentecom relação a fins; os valores em vigência no grupo ao qual pertence, tal como a beleza, a castidade, entre outros, se for agir racionalmente com relação a valores; a tradição familiar da escolha de “moças e rapazes de família” transmitida de pai para filho ou de mãe para filha, se for agir racionalmente; e a paixão ou amor, se for agir afetivamente. Observe que podemos tanto agir baseados somente em um dos sentidos propostos quanto a partir da combinação de dois ou mais deles. É preciso ressaltar, por fim, que tais tipos puros foram criados para fins sociológicos, portanto, não reproduzem a totalidade de tipos de ações existentes na realidade. 7 Esquematizando... RELAÇÃO SOCIAL Relação social é definida por Weber como um comportamento reciprocamente referido quanto a seu conteúdo de sentido por uma pluralidade de agentes e que se orienta por essa referência. Ela diz respeito à probabilidade de que uma forma determinada de conduta social tenha, em algum momento, seu sentido partilhado por dois ou mais indivíduos numa sociedade qualquer. Como exemplos de relação social temos a amizade, a hostilidade, as trocas comerciais, a concorrência econômica, as relações eróticas e políticas. Para que ocorra uma relação social é necessário haver um mínimo de relacionamento recíproco, sendo que a reciprocidade deve ser aí entendida como a compreensão do sentido da ação dos outros. Os agentes podem conduzir-se como colegas, inimigos, parentes, comprador e vendedor, criminoso e vítima, admirador e astro, indiferente e apaixonado, patrão e empregado, ou dentro de uma infinidade de variáveis, desde que todas elas incluam uma referência comum ao sentido partilhado. A solidariedade e a reciprocidade de conteúdo são apenas possibilidades, isto é, a correspondência ou atuação do mesmo tipo por parte de cada um dos agentes envolvidos é provável. Para ilustrar podemos apontar a relação do cidadão com o assaltante. Um cidadão pode temer o assaltante que, embora reconheça seu sofrimento, é indiferente a ele. Assim, a relação social é mais uma vez marcada pelo entendimento do sentido, sem 8 necessariamente ocorrer uma reciprocidade de conteúdo. Sobre a relação social podemos ainda caracterizá-la como efêmera ou durável, o que implica em sua continuidade ou não, sua persistência ou não, sendo a mudança radical de sentido uma possibilidade durante o seu curso. Weber destaca dois tipos de relação social: RELAÇÃO SOCIAL COMUNITÁRIA: Fundado num sentimento subjetivo (afetivo ou tradicional) de pertencimento mútuo que se dá entre as partes envolvidas e com base no qual a ação será reciprocamente referida. Pode ocorrer entre os membros de uma família, estamento, grupo religioso, escola ou entre amantes. RELAÇÃO SOCIAL ASSOCIATIVA: Apóia-se num acordo de interesses motivado racionalmente (seja com base em fins ou valores) como que se dá entre os participantes de um contrato, de um sindicato, do mercado livre e de associações. Podemos encontrar na maioria das relações sociais elementos comunitários e societários. Esquematizando... RACIONALIZAÇÃO E DESENCANTAMENTO DO MUNDO RELAÇÃO SOCIAL COMUNITÁRIA ASSOCIATIVA 9 Weber, a partir da análise das sociedades contemporâneas, detectou que o mundo tende inexoravelmente à racionalização em todas as esferas da vida social. Um dos meios através do qual essa tendência à racionalização se atualiza nas sociedades ocidentais é a burocracia. Essa é a forma por excelência do Estado moderno que assim expressa a racionalização da dominação política por parte dos grupos que o controlam, seja numa sociedade capitalista ou socialista. Esse processo ocorre também na economia e na empresa moderna a partir do estabelecimento de um controle contábil de custos, das formas racionais de organização do trabalho e da mecanização. Weber aponta ainda para as conseqüências negativas, mas inevitáveis, do processo de racionalização. Elas se traduziriam na decadência geral da cultura clássica na medida em que as escolhas dos homens são cada vez mais limitadas e medíocres. Este processo foi denominado de desencantamento do mundo, visto que a humanidade partiu de um universo habitado pelo sagrado, pelo mágico, excepcional e chegou a um mundo racionalizado, material, manipulado pela técnica e pela ciência. Isso quer dizer que o cálculo promoveu o desencantamento do mundo ao dispensar a utilização dos meios mágicos para a busca de explicações às dúvidas humanas. Esquematizando... MUNDO RACIONALIZADO, MATERIAL, MANIPULADO PELA TÉCNICA E PELA CIÊNCIA UNIVERSO HABITADO PELO SAGRADO, PELO MÁGICO, FABULOSO, FANTÁSTICO, EXCEPCIONAL DESENCANTAMENTO DO MUNDO É SUBSTIUÍDO SUBSTITUI 10 A ÉTICA PROTESTANTE E O “ESPÍRITO” DO CAPITALISMO Weber buscava compreender as especificidades desenvolvimento do capitalismo nas sociedades ocidentais. Foi assim que ele estabeleceu uma relação causal entre a ética elaborada e pregada pela religião protestante e o capitalismo. Weber pensava o capitalismo enquanto cultura: uma cultura ocidental moderna que era vivenciada pelas pessoas em seu cotidiano e não havia como se desvencilhar dela. Além disso, essa cultura era muito mais avançada e desenvolvida no Ocidente do que em outras partes do mundo. Partindo dessa constatação, Weber buscou na Reforma Protestante do século XVI os primórdios do modo de pensar capitalista, já que se notava, naquela época, uma presença muito significativa de protestantes entre os empresários e os trabalhadores qualificados dos países capitalistas mais industrializados. A idéia principal desse modo de pensar as relações sociais referia-se a uma extrema valorização do trabalho. A Reforma Protestante baseou-se na noção do trabalho como vocação, isto é, na dedicação religiosa ao trabalho que viabilizava a criação de riqueza entendida como o sinal de salvação individual. Porém, o esbanjamento e a ostentação da riqueza eram recriminados. O indivíduo, para ser digno das glórias divinas, precisava viver uma vida ascética, ou seja, uma vida em que se atinja a plenitude da moralidade e em que a riqueza sirva apenas para ser reinvestida e não para ser desperdiçada. Por esse mesmo motivo, condenava-se também o ócio, a perda de tempo e a preguiça. O que interessa a Weber são as origens do capitalismo burguês e a racionalidade do trabalho. Ele percebeu que o capitalismo moderno era um vasto complexo de instituições interligadas que operavam com base na prática econômica 11 racional. As empresas organizavam-se a partir do trabalho livre e da divisão de trabalho que visavam, em última instância, ao funcionamento de uma economia de mercado. Inicialmente, Weber investigou os princípios éticos que estavam na base do capitalismo, constituindo o que ele denominou de “espírito” do capitalismo. Esses princípios foram encontrados na teologia protestante, mais especificamente no calvinismo. A hipótese elaborada por Weber foi a de que a vivência espiritual da doutrina e da conduta religiosa exigida pelo protestantismo teria organizado uma maneira de agir econômica necessária para a realização de um lucro sistemático e racional. Segundo a ética protestante, todos (ricos e pobres) trabalhavam pela vontade de Deus e para glorificá-lo. Um resultado notável dessa ética eram os operários disciplinados que se empenhavam no trabalho, considerando-o uma finalidade de vida desejada por Deus. Isso apontava para a noção de que a desigualdade social também era obra da Providência Divina que, rodeada de mistérios e fins obscuros, permitia as diferenças na distribuição de riquezas. Isso gerava nos empresários um reconfortante sentimento de bênção, pois se eram ricos, foi Deus quem lhes concedeu tamanha graça. Assim, sentiam-se satisfeitospor se dedicarem tanto à produção de riqueza. João Calvino, fundador do calvinismo O Calvinismo foi a seita protestante que mais influenciou o estudo de Weber sobre a Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo. Para essa seita, Deus não existia para os homens, pois eram os homens que existiam por causa de Deus. Porém, apenas alguns homens eram predestinados (a Graça Divina é cheia de mistérios e não se sabe quem é, e quem não é, predestinado) e esses é que poderiam entender a palavra de Deus. Os calvinistas consideravam, ainda, que o objetivo do indivíduo era alcançar a graça divina, manifestada através da riqueza e da prosperidade. Contudo, essa riqueza deveria ser reinvestida e não usada para o lucro e para a preguiça. Essa seita recomendava, principalmente, a intensa atividade profissional como meio de salvação individual (o trabalho é visto como uma vocação). Considerava-se ainda que os homens existiam para glorificar a Deus e erigir obras sociais relacionadas a seus mandamentos como um ato de homenagem. VOCÊ SABIA??? 12 Cabe lembrar que na época de Weber a religião católica era predominante. Para essa religião, a ambição e a usura eram condenáveis, pois ela pregava o desprendimento material. O protestantismo discordava, pois considerava o desejo de ser pobre extremamente absurdo (era como desejar ser doente, ao gozar de plena saúde). Para os protestantes, a prosperidade era uma espécie de recompensa por levarem uma vida santa, sem excessos e ascética. Segundo essa doutrina, o mal não estava na posse da riqueza, mas sim no uso indevido da riqueza para o prazer e o luxo. Daí Weber propor que a combinação entre a restrição do consumo e a liberação da riqueza, oriunda da ética protestante, resultou na acumulação capitalista através da compulsão ascética da poupança. Em última análise foi esse espírito de acumulação, como parte de um estilo de vida ascético, que possibilitou a congruência entre a teologia da Reforma Protestante e as motivações econômicas do capitalismo ocidental. O interessante a constatar é que o protestantismo foi responsável apenas pelo impulso inicial do capitalismo. Esse modo de agir e pensar se libertou do espírito religioso, processo denominado secularização, e a busca por riquezas passou a atender apenas às paixões mundanas dos indivíduos. O capitalismo moderno já não necessita de uma base religiosa e ainda considera que a influência religiosa na esfera econômica é bastante prejudicial. PODER E DOMINAÇÃO Weber, interessado na regularidade das relações sociais, buscará compreender aquilo que fundamenta a organização social: a dominação ou a produção da legitimidade (aceitação) da submissão de um grupo a um mandato (ordem). 13 Movimento dos Caras Pintadas - 1992 Inicialmente, distinguir os conceitos de poder e dominação. Segundo Weber, poder “significa a probabilidade de impor a própria vontade dentro de uma relação social, mesmo com toda a resistência e qualquer que seja o fundamento dessa probabilidade” (WEBER,1984: 43). Isto é, o poder não se restringe a situações específicas e qualquer um pode impor sua vontade em diversas situações. Os meios para se alcançar o poder podem ser vários, desde a utilização da violência até a de recursos mais sutis, como o poder de persuasão, a influência social, o dinheiro e outros. A dominação, por outro lado, se baseia na probabilidade de alguém ou algum grupo social obedecer a determinado mandato. Nesse caso, não há imposição, mas sim obediência. A dominação é ainda tanto um elemento da esfera política como da vida social. Nas palavras do próprio autor, a dominação é: um estado de coisas pelo qual uma vontade manifesta (mandato) do dominador ou dos dominadores influi sobre os atos dos outros (do dominado ou dos dominados), de tal modo que em um grau socialmente relevante, estes atos têm lugar como se os dominados tivessem adotado, por si mesmos e como máxima de sua ação, o conteúdo do mandato (obediência) (WEBER, 1984: 699). Entretanto, para que a dominação se concretize, é necessária a legitimação, ou seja, tanto dominados quanto dominadores devem aceitar a situação de dominação. A legitimação está relacionada à durabilidade do mandato. Quando não há persistência deste, a dominação deixa de ser legítima e pode ocorrer a ruptura da obediência por parte dos dominados, que perdem a crença no mandato do dominante. Um exemplo disso é o caso clássico no Brasil do impeachment (impedimento) do mandato do presidente Fernando Collor de Melo em 1992. Naquela ocasião, todos confiavam no presidente e aceitavam suas idéias, isto é, a dominação era legítima. Porém, Collor foi acusado de corrupção e tomou medidas econômicas que desagradaram a muitos brasileiros. Dessa forma, o mandato dele perdeu sua legitimidade, pois os dominados deixaram de acreditar em suas linhas de ação. Isso provocou um movimento grandioso em que os dominados se mostraram insatisfeitos e romperam com o mandato, causando o seu impeachment. 14 Nesse sentido, é possível perceber que o esforço para se estabelecer uma dominação legítima objetiva definir o conteúdo das relações sociais. Os indivíduos tendem a orientar suas ações motivados pela crença em uma ordem legítima que reflete os interesses e a vontade do dominante. Sendo assim, a dominação é o elemento mantenedor da coesão social e que garante a permanência das relações sociais e a existência da própria sociedade. Conforme Weber, a dominação legítima pode justificar-se por motivos racionais, tradicionais ou afetivos de submissão. O motivo racional fundamenta-se em interesses e considerações utilitárias de vantagens e inconvenientes por parte daquele que obedece. O tradicional depende do mero costume ou de hábitos arraigados. Por fim, o afetivo se funda no puro afeto ou inclinação pessoal do dominado ao dominante. Weber define, então, três tipos puros de dominação legítima: DOMINAÇÃO LEGAL, RACIONAL OU BUROCRÁTICA: É baseada num estatuto, ou seja, em regras formalmente definidas. Seu tipo mais puro é a burocracia. O dominador é uma associação composta por funcionários eleitos ou nomeados por critérios de competência profissional. Obedece-se a ordens impessoais, objetivas e aos superiores designados, não importando quem ocupe o cargo ou a posição. Ex: Burocracia estatal, burocracia parlamentar, burocracia empresarial, etc. DOMINAÇÃO TRADICIONAL: Fundamenta-se na devoção de hábitos costumeiros, na crença na santidade das ordenações e dos poderes senhoriais há muito existentes. Seu tipo mais puro é o patriarcal. Aquele que ordena é o senhor e aquele que obedece é o súdito. Obedece-se ao dominante em virtude da fidelidade pessoal. O conteúdo das ordens está fixado pela tradição e baseia-se na dignidade do senhor. Os servos são dependentes do senhor ou escolhidos por vínculos de fidelidade. Ex: Senhores feudais, senhores de engenhos, príncipes, etc. 15 DOMINAÇÃO CARISMÁTICA: Ocorre em virtude de devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes sobrenaturais (carisma). Seus tipos mais puros são a dominação do profeta, do herói guerreiro e do grande demagogo1. A associação dominante é de tipo comunitário. Aquele que ordena é o líder e aquele que obedece é o apóstolo. Obedece-se exclusivamente à pessoa do líder por suas qualidades excepcionais. A obediência só é mantida enquanto existir carisma, caso contrário ela é extinta. Ex: Jesus Cristo, Gandhi, Getúlio Vargas, etc. É preciso ainda salientar que tais tipos ideais dificilmente aparecem de forma pura na realidade. De modo geral, eles aparecem associados. Esquematizando... TRÊS TIPOS PUROS DE DOMINAÇÃO LEGÍTIMA LEGAL TRADICIONAL CARISMÁTICA CAUSA Estatuto Hábitos costumeiros Qualidades excepcionais (carisma) TIPO MAIS PURO Burocracia Patriarca Profeta,herói guerreiro, demagogo TIPO QUE MANDA Funcionário Senhor Líder TIPO QUE OBEDECE Cidadão Súdito Apóstolo QUADRO ADMINISTRATIVO Competência profissional Dependência ou fidelidade pessoal Confiança pessoal ESTADO E BUROCRACIA Se o desenvolvimento das instituições sociais, econômicas e culturais, nas sociedades ocidentais modernas, foi desencadeado por um processo geral de racionalização, o núcleo organizativo do Estado Moderno caracteriza-se, entre outros aspectos, por meio da introdução de um central e contínuo sistema de arrecadação de impostos, um central comando militar, pelo monopólio do uso da violência e por uma administração burocrática. Segundo Weber, a existência do Estado Moderno depende de quatro condições básicas, a 16 saber: i) uma administração e uma ordem jurídica, na qual as alterações se dão por normas; ii) uma administração militar, na qual os seus serviços realizam-se em concordância com rigorosos deveres e direitos; iii) o monopólio de poder sobre todas as pessoas, tanto sobre as que nasceram na comunidade quanto aquelas que estão nos domínios do território; iv) a legitimação da aplicação do poder nos limites do território por concordância com a ordem jurídica. Para Weber, o Estado, sociologicamente, só se deixa definir pelo meio específico que lhe é peculiar, ou seja, o uso da coação física. Em outras palavras, o Estado define-se como a estrutura ou o agrupamento político que reivindica, com êxito, o monopólio do constrangimento físico legítimo (a violência). A esse caráter específico do Estado, acrescentam-se outros traços: de um lado, comporta uma racionalização do Direito com as conseqüências que são a especialização dos poderes legislativo e judiciário, bem como a instituição de uma polícia encarregada de proteger a segurança dos indivíduos e garantir a ordem pública; de outro lado, apóia-se em uma administração racional baseada em regulamentos claros que lhe permitem interferir nas esferas as mais diversas, desde a educação até a saúde, a economia e mesmo a cultura. O Estado, enfim, pode ser definido, resumidamente, como uma comunidade humana que, dentro dos limites de determinado território, detém a posse sobre o uso legítimo da força física. De acordo com Weber, o Estado é uma instância tanto de poder quanto de dominação na medida em que impõe sua vontade contra qualquer resistência e obtém obediência a suas ordens por meio de seus mecanismos jurídicos e coercitivos. A dominação no Estado moderno encontra-se na aplicação diária da administração, necessária e inevitavelmente nas mãos do funcionalismo público, seja militar ou civil. A forma, por excelência, adquirida pelo Estado moderno é, portanto, a burocracia. Esta é conceituada como uma organização composta por cargos distribuídos segundo poderes que são limitados por normas específicas as quais 17 obedecem a critérios de eficiência e preveem a submissão ao cargo e não à pessoa que ocupa o cargo. Embora considerasse a burocracia como a mais eficiente forma de organização criada pelo homem, Weber temia esta grande eficiência cujos resultados, advindos da crescente burocratização do mundo moderno, seriam uma enorme ameaça à liberdade individual e às instituições democráticas das sociedades ocidentais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira; QUINTANEIRO, Tânia. Max Weber. In: Um Toque de Clássicos: Durkheim, Marx e Weber. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1996. COHN, G. (Org). Sociologia - Para ler os clássicos: Durkheim, Weber e Marx. Rio de Janeiro: Azougue editorial, 2005. p. 15-29; 15-124. COSTA, Cristina. Sociologia: introdução à ciência da sociedade. 2.ed. São Paulo: Moderna, 1997. DIAS, Reinaldo. Introdução à Sociologia. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. FREUND, J. Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 67-100. SAINT-PIERRE, H. L. Max Weber: entre a paixão e a razão. Campinas: Ed. Unicamp, 1994. WEBER, M. Economia e sociedade. 5. ed. Brasília: Ed. UNB, 1991. WEBER, Max. A Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo.In: PIERUCCI, Antônio Flávio (Ed.). MACEDO, José Marcos Mariani de (Trad.). São Paulo: Companhia das Letras, 2004. 18 WEBER, Max. A política como vocação. In: GERTH, H. H., MILLS, C. W. (Org.). Max Weber: ensaios de sociologia. DUTRA, Waltensir (Trad.). Rio de Janeiro: Zahar, 1979, p. 97 – 153.
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