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APOSTILA-COMPLETA-ÉTICA-FILOSÓFICA-2

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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ÉTICA FILOSÓFICA 
 
 
 
 
 
 
 
 
GUARULHOS – SP 
 
2 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 4 
2 O CONCEITO DE ÉTICA ..................................................................................... 5 
2.1 A função da ética ............................................................................................... 6 
2.2 Ética, moral e lei ................................................................................................ 6 
3 DIFERENÇA ENTRE ÉTICA E MORAL ............................................................... 7 
4 A ÉTICA É OU NÃO UMA DISCIPLINA FILOSÓFICA? ..................................... 10 
4.1 O objeto e a natureza da ética ......................................................................... 13 
5 A REFLEXÃO FILOSÓFICA COMO ATITUDE HUMANA .................................. 17 
5.1 A reflexão crítica sobre o ser, o pensar e o agir humano ................................ 20 
5.2 A reflexão filosófica e as três dimensões da vida individual: pessoal, profissional 
e pública .............................................................................................................. 22 
6 PRINCIPAIS TEORIAS SOBRE ÉTICA.............................................................. 23 
7 OS GRANDES DEBATES TEÓRICO-FILOSÓFICOS A RESPEITO DA ÉTICA 
................................................................................................................................26 
7.1 Os atuais debates teórico-filosóficos sobre as sociedades ............................. 28 
8 TEORIA DA LIBERDADE ................................................................................... 30 
9 TEORIA DO DETERMINISMO ........................................................................... 34 
9.1 Convergência entre as teorias da liberdade e do determinismo ...................... 36 
10 BIOÉTICA ......................................................................................................... 39 
10.1 Conceito ........................................................................................................ 39 
11 PROBLEMAS ÉTICOS CONTEMPORÂNEOS ................................................ 42 
11.1 Os problemas da bioética .............................................................................. 45 
11.1.1 Identificando possibilidades ........................................................................ 46 
12 A ÉTICA NA DIMENSÃO BIOTECNOLÓGICA ................................................ 48 
13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 52 
13.1 Bibliografia Básica ......................................................................................... 52 
 
3 
 
1 3.2 Bibliografia Complementar .......................................................................... 52 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
1 INTRODUÇÃO 
Prezado aluno! 
 
 O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é 
semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase 
improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e 
fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O 
comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos 
ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, 
as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão 
respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e 
organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura 
do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá 
reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o 
quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos 
para as atividades. 
 
 Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
2 O CONCEITO DE ÉTICA 
Para Cortella (2007), a ética é um grupo de princípios e valores que usamos 
para optar sobre três grandes situações da nossa existência. Essas três situações 
estão presentes em nosso cotidiano e, por esta razão; é necessário estar preparado 
para efetuar essas escolhas da melhor forma possível. 
As três grandes situações que nos afligem e requerem decisão são: 
 
 a. Quero? 
 b. Devo? 
 c. Posso? 
 
Muitas são as situações em que as decisões a serem tomadas se tornam 
conflitantes em função das possibilidades acima. Tais situações ocorrem no contexto 
social e profissional exigindo uma análise muito cuidadosa sobre as decisões e 
atitudes a serem tomadas. 
Há situações em que queremos agir de uma determinada forma, porém não 
devemos em função das consequências que essa atitude pode desencadear. Da 
mesma forma, há casos em que sabemos que devemos agir de certa forma, mas 
enfrentamos um conflito pessoal por não querermos caminhar nesta direção. 
Muitas vezes também nos deparamos com circunstâncias nas quais 
desejamos e até sabemos que ações deveríamos tomar, porém, não temos o poder 
ou autorização legal para fazê-lo. 
 Analisando estas e outras combinações possíveis, concluímos que o 
processo de tomada de decisão requer equilíbrio, conhecimento e sensatez, 
sobretudo por que nossas decisões também são influenciadas pelo contexto que nos 
envolve. 
Assim, a ética de um determinado grupo ou sociedade é definida ou moldada 
pelos princípios e normatizações ocorridas ao longo do tempo considerando 
inclusive aspectos da religiosidade daquela sociedade. 
Inicialmente a instituição de uma legislação que altera o comportamento ou 
costume das pessoas, demora a ser aceito e praticado. Quando isso ocorre, dizemos 
que os indivíduos não estão se comportando de forma ética. Porém, com o passar 
 
6 
 
do tempo, as pessoas vão incorporando estas novas regras ao seu cotidiano 
tornando-se assim um hábito natural e eticamente correto. 
2.1 A FUNÇÃO DA ÉTICA 
A ética tem por finalidade investigar e esclarecer uma realidade moral e 
estruturar seus respectivos conceitos. A realidade moral sofre variações como 
passar do tempo afetando de igual forma seus princípios e normas. As convenções 
e os princípios éticos doutrinários vigentes no passado se alteram em função de 
vários fatores e influencias que vão desde as mudanças culturais até o avanço cada 
vez mais veloz da tecnologia. 
A ética investiga a forma do comportamento humano e da moral, e busca 
explicá-lo. É nesse contexto que se concentra o verdadeiro valor da ética. Portanto, 
a ética fornece a compreensão racional do comportamento humano, o qual será 
posteriormente o elemento formador da consciência. A consciência por sua vez nos 
leva a buscar o que é realmente bom, correto e justo, buscando identificar e 
estabelecer os novos parâmetros que nortearão os limites e capacidades (Cortella, 
2007). 
2.2 ÉTICA, MORAL E LEI 
Outra questão que muitas vezes dificulta a compreensão do conceito e da 
importância da conduta ética pelos indivíduos reside em outro conflito conceitual em 
relação às seguintes instituições: ética, moral e lei. Como não fomos educados a 
pensar nas questões: Quero? Devo? Posso? Nosso comportamento segue padrões 
automáticos, repetindo soluções e fórmulas há muito presentes no meio social ao 
pertencemos. 
Esse padrão de comportamento provoca uma sensação de normalidade 
posto que nossas ações sejam aceitas pelo grupo, sobretudo porque os membros 
do grupo agem da mesma forma quando em situações semelhantes. Ora, isso não 
significa necessariamente que estamos agindo eticamente, antes, porém; indica que 
estamos repetindo um padrão, e isso se configura comportamento de grupo. Por isso7 
 
as pessoas oferecem grande resistência em romper com os costumes e aceitar as 
mudanças. 
 Isso nos leva a refletir sobre a questão da moral. O termo moral vem do 
latim mores que quer dizer costumes. Portanto moral trata-se de um conjunto de 
hábitos e costumes praticados por um grupo. Tais hábitos e costumes são aceitos e 
incorporados por serem considerados bons. Por consequência, os hábitos por serem 
bons; são considerados justos. Finalmente, os hábitos bons e justos cooperam para 
a realização das pessoas. Considerando que um conjunto de hábitos bons e justos 
se tornam imprescindíveis para os indivíduos, os mesmos são convencionados em 
forma de lei. Assim sendo, podemos dizer que a lei é um conjunto de bons costumes 
(moral) aceitos e praticados por um grupo social. Sintetizando o conceito de lei 
podemos dizer que as leis são acordos obrigatórios definidos entre os indivíduos de 
um grupo, no objetivo de assegurar o mínimo de justiça ou direitos. Desta forma fica 
explícito que a lei é um instrumento que possibilita efetuar a justiça. 
Conforme Camargo (1999), toda lei deve ser uma ordenação da razão com 
o propósito de promover o bem comum. Sendo assim, para que a lei atenda ao 
componente ético, ela deve ser justa, ou seja; indicar o que está em consonância 
com a natureza e a dignidade do homem. 
A justiça não uma qualidade humana ou um direito adquirido, mas sim um 
princípio ou pilar da fundação de uma sociedade bem estruturada. 
3 DIFERENÇA ENTRE ÉTICA E MORAL 
Comumente, a ética e a moral são confundidas e consideradas a mesma 
coisa em razão da grande relação que entre elas. Contudo, a ética envolve estudo, 
análise e compreensão dos sistemas morais presentes em uma sociedade, ou seja, 
é o conjunto de regras de um grupo. 
Mas, então, o que é a moral? De forma bem objetiva, podemos dizer que 
moral é o agrupamento de normas e regras que regem a conduta do indivíduo em 
sociedade e em um grupo. As regras são adquiridas por meio de cultura, costumes, 
tradição, educação e até mesmo do cotidiano; apesar de todas essas influências, 
são princípios pessoais criados e sustentados pelos próprios indivíduos. 
 
8 
 
Podemos afirmar, então, que a moral sempre existiu, visto que todo indivíduo 
possui consciência moral que o ajuda a distinguir o certo do errado, o bem do mal, 
no contexto em que convive. Logo, podemos dizer que a moral surgiu na época da 
sociedade primitiva, uma vez que, pelo que se tem conhecimento, nesse período da 
história humana, não existiam povos independentes, nem estados, e os homens 
viviam em pequenos grupos, clãs ou tribos (MANFRED, 2016). 
 
O que é uma conduta amoral? Nela, o indivíduo se encontra fora do contexto 
no qual as regras de convivência foram criadas, por não as conhecer, ignorá-las ou 
não ter senso moral. Um exemplo é o indivíduo absolutamente incapaz. 
Além disso, devemos lembrar que existem diversas culturas com diferentes 
sistemas morais para a organização da vida em sociedade, devido à diferença, em 
linhas gerais, entre a cultura brasileira e a de outros países. Por exemplo, existe a 
cultura da mutilação do genital feminina em países africanos, no Iémen, no Curdistão 
Iraquiano, em lugares da Ásia, entre outras localidades do mundo. 
O que é uma conduta imoral? É a praticada pelo indivíduo que conhece as 
regras de convívio estabelecidas pela sociedade em que vive, mas sua conduta é 
contrária aos princípios morais. Por exemplo, o desonesto ou libertino é o indivíduo 
que tem por hábito furar a fila do banco, a fila do ônibus, jogar lixo no chão, colar na 
prova, fazer fofoca, entre outros comportamentos. 
Logo, devemos ter em mente que, embora a moral seja o conjunto de 
princípios que conduz o indivíduo a escolher o que é certo ou errado, ela está ligada 
diretamente às regras sociais vivenciadas no local em que se mora. A Figura 1 
apresenta um exemplo de conduta imoral. 
 
9 
 
 
Como mencionado, a ética é um conjunto de regras de conduta de um 
indivíduo ou grupo. A sua principal finalidade é manter um equilíbrio e o adequado 
desempenho da sociedade, vislumbrando, assim, que nenhum homem venha a ser 
prejudicado. Logo, podemos afirmar que a ética está diretamente relacionada ao 
sentimento de justiça. 
 A ética está para a moral na qualidade de matéria-prima das suas reflexões 
e sem a qual não existiria assim como a moral pressupõe a ética para repesar, 
firmando entre ambas uma significativa conexão de circularidade ascendente e de 
complementariedade necessária (Camargo, 1999). 
Assim, podemos definir que a moral estabelece as normas e regras de como 
proceder diante de uma convenção social, que é a conduta praticada por um 
indivíduo, de acordo com a sua livre escolha. A moral é apenas o que se faz, assim, 
o indivíduo não racionaliza sobre isso. Por sua vez, a ética tem um caráter filosófico, 
nela, o indivíduo raciocina e apresenta uma conduta de acordo com aquilo que a 
sociedade estabelece como regra. 
 
10 
 
 
 
Segundo Camargo (1999), de forma prática, para não haver confusão entre 
ética e moral, basta ter em mente que a moral ordena e a ética aconselha. A moral 
vai responder ao seguinte questionamento: o que devo fazer? Por sua vez, a ética 
responderá à seguinte questão: como devo viver? 
4 A ÉTICA É OU NÃO UMA DISCIPLINA FILOSÓFICA? 
Tendo em vista a definição de ética como a reunião de informações obtidas 
por meio da análise de costume, hábito, cultura e prática humana, objetivando 
elucidar as normas morais de maneira racional e fundamentada, podemos afirmar 
que a ética é a parte da filosófica que estuda a conduta moral do indivíduo. 
Como teoria filosófica, a ética se define conforme o estudo das ações 
individuais dos seres humanos, cujo objetivo se fundamenta em compor uma 
 
11 
 
orientação normativa para as condutas individuais e que seja estabelecido como bem 
(SANTOS; TEIXEIRA; SOUZA, 2017). Da Antiguidade até hoje, são discutidas a 
origem e a problemática da ética, em um processo de evolução do termo e da sua 
compreensão. 
Primeiramente, surgiram os sofistas, de um movimento intelectual originário 
na Grécia (século V a.C.), os quais se consideravam os detentores da sabedoria. Os 
sofistas ministravam a arte de convencer, expor, argumentar ou discutir, levando 
dúvida não só à tradição, mas à existência de verdades e normas universalmente 
válidas. Para estes, não havia nem verdade nem erro, e as normas por serem 
humanas eram transitórias. 
 
 
Posteriormente, Sócrates (470–399 a.C.) instituiu que a ciência emerge 
como irradiadora de padrões de conduta. O filósofo buscou as virtudes morais e se 
esforçou para descobrir definições universais. A primeira consequência disso é a 
busca da verdade no interior do ser humano. Todo padrão ético-moral é fruto do 
mundo interior e, assim, a alma pode ser santa, boa e bela. 
A crítica a Sócrates é no sentido de que cada um possui conhecimento 
daquilo que lhe é bom, de modo que os valores e as particularidade dão as normas 
morais, não separando o acidental do contingente. 
 Platão (427–347 a.C.), discípulo de Sócrates, resumidamente, preocupava-
se com o correto modo de agir, submetendo a ética a critérios lógicos utópicos, 
sobrepondo a ética a qualquer interesse, família ou domínio privado do indivíduo. 
Para Platão, existem quatro virtudes fundamentais: 
 
 Sabedoria prática ou prudência: é a conduta racional do ser humano, 
ou seja, a capacidade de administrar eventos no âmbito pessoal e no 
público. 
 Força ou coragem: é a habilidade de encarar as dificuldades. 
 
12 
 
 Justiça: é a isonomia em analisar o direito e o valor devidos a um 
indivíduo. 
 Temperança: é a sobriedade em determinados prazeres. 
 
Aristóteles (384–322 a.C.), discípulo de Platão, afirmava que a ética está no 
meio-termo entre o excesso e a falta, o justo e o exato que é produzido pela razão. 
Um ato moralmente bom é preparado,ajustado, dirigido, medido pela razão e, 
também, deve tender a um fim último da existência humana: a felicidade. É tendendo 
para esse fim último que o ato moral é medido. A finalidade não é primaz na ordem 
do exercício, ela é o supremo critério dentro da ordem de especificação, 
determinando a conduta moralmente boa e humana. A virtude aparece como parte 
integrante da vida feliz. (Cortella, 2007) 
 
Além desses, surgiram outros filósofos com estudos acerca da moral, 
fazendo a ética se preocupar com a autonomia moral do indivíduo. Assim surgiu a 
ética acósmica e idealista de Kant (1724–1804 d.C.), em decorrência direta da 
absolutização judaico-cristã da moralidade, de uma ética da pura razão. 
 Temos, portanto, a ética descolada da realidade e da natureza, sem um fim 
último. Há apenas a ética do dever, descolada de tudo e de todos, sob a máxima da 
universalidade e deduzida normativamente por meio de um aspecto formal, da razão 
pura e prática. A razão é a medida dos atos humanos, mas de caráter instrumental, 
isolada de todas as contingências (aspectos naturais do ser humano) e considerada 
somente uma maneira puramente formal, a fim de dar apenas exigências de 
universalidade lógica. A lei é utilizada no sentido de que ela mesma se dê, de forma 
a priori, ou seja, um imperativo categórico. Os fenômenos jurídicos e éticos são bons 
quando conformados a uma máxima passível de universalização, desligados da 
realidade. 
 
13 
 
Já a ética pós-kantiana pode ser dividida em duas partes: 
 
 Fundada sob uma teoria moral acósmica e idealista, mas, ao contrário 
de Kant, ligada a uma metafísica totalmente idealista e apriorística, 
como em Rawls, em que se deduzem princípios éticos de uma 
escolha imaginária na qual os que escolhem não sabem a sua posição 
na sociedade, mas escolhem sobre fundamentos preestabelecidos; 
 Outro tipo de forma de tratar a ética e o Direito é sob o aspecto 
positivista-cientificista, em que há a negação de todo caráter 
normativo ao sentido kantiano, mas o que ocorre é a relativização e a 
formalização de toda ação. 
 
Hoje, de modo geral, temos que a ética serve para tratar as relações sociais 
entre os indivíduos dentro de uma sociedade e de uma organização, uma vez que, 
por muitos, é considerada a base do Direito e da justiça (CAMARGO, 1999). 
Assim, sinteticamente, para a existência da ética, é necessário que o 
indivíduo respeite o próximo, considerando-o na mesma condição, 
independentemente de sexo, orientação sexual, religião, posicionamento político, 
raça ou etnia, além de responsabilizar-se por sua conduta frente ao outro. 
 
4.1 O objeto e a natureza da ética 
A ética não pode ser limitada a um pequeno conjunto de normas do tipo: não 
ter relações sexuais antes do casamento, não roubar, não mentir, entre outras. No 
entanto, a ética serve como um condutor para um bom convívio dentro de uma 
sociedade, organização ou grupo de pessoas (CORTELLA, 2007). 
 
14 
 
Desse modo, podemos concluir que o objeto de estudo da ética é o 
comportamento humano, distinguindo-se este em objeto material, que está 
relacionado aos atos humanos, e objeto formal, que está relacionado aos atos do 
homem: 
 
Atos humanos ≠ atos do homem 
 
Os atos humanos (Figura 3) compreendem o comportamento realizado pelo 
indivíduo de forma livre, consciente, predeterminada e voluntária. Essa conduta 
atinge o próprio praticante, outros indivíduos, um determinado grupo ou até mesmo 
a sociedade como um todo. 
 
Os atos do homem compreendem o comportamento realizado de forma 
inconsciente, instintivamente, involuntária, automática, em outras palavras, é a ação 
em que a vontade humana não entra. São exemplos de atos do homem: nascer, 
crescer, morrer, cair, movimentar o corpo ao caminhar, respirar, sentir fome, sentir 
medo, entre outros. 
Temos assim que, antes de praticar qualquer ação, devemos avaliar os prós 
e os contras, além de termos consciência dos riscos e das consequências inerentes 
à nossa conduta, uma vez que toda ação tem uma reação (CORTELLA, 2007). 
Podemos dizer que a ética é uma característica intrínseca a todo e qualquer 
ato humano, tornando-se um componente indispensável para a formação do convívio 
social. Todos nós temos uma consciência moral, que nos conduz a constantemente 
analisarmos e julgarmos nossas ações para saber se nossa conduta é boa ou má, 
certa ou errada, justa ou injusta. 
Uma vez definido que a ética é a parte da filosofia que estuda o 
comportamento moral dos indivíduos em sociedade, podemos dizer que ela trata dos 
 
15 
 
fundamentos e da natureza das nossas atitudes, bem como da natureza humana. 
Manifesta-se efetivamente na conduta do homem livre (Figura 4). 
 
Segundo Camargo (1999), com base nesses apontamentos, podemos listar 
algumas características da ética. Das várias características, apresentaremos as que 
consideramos mais relevantes neste momento: 
 
 A ética é irredutivelmente diferente: o moral é essencialmente 
diferente e não redutível a outras realidades. 
 A ética é relativa à liberdade: o valor moral só existe se houver 
liberdade de ação. 
 A ética é pessoal: só se verifica a moralidade nos atos praticados 
voluntariamente pelo indivíduo (atos humanos) e não em atos do 
homem. 
 A ética é humana: o valor do ser humano está ligado diretamente ao 
que ele vale moralmente. Isso significa que o valor inerente ao ser 
humano como ser humano (valor moral) estende-se a todos de forma 
individual, familiar, profissional, entre outros. O mundo moral engloba 
todos os seres humanos. 
 A ética é relativa a normas: resumidamente é emitir um juízo de valor 
e asseverar a consonância ou não entre o que é e o que devia ser. 
 
16 
 
 A ética é incondicional: a condição moral apresenta-se como 
incondicional, irrestrita e concreta, em outras palavras, nem 
presumida, nem disjuntiva. 
 A ética é transcendente: ela é superior (até certo ponto, 
excepcionalmente, ao valor religioso ao qual está de resto 
profundamente ligado a ele), preferível, não sacrificável e inegociável. 
 
Quanto aos tipos de ética, existem vários, como: 
 
 Ética filosófica; 
 Ética religiosa; 
 Ética cristã; 
 Ética social; 
 Ética sexual; 
 Ética profissional; 
 Ética econômica; 
 Ética política. 
 
Todo ser humano tem os seus valores próprios e intransmissíveis. Tem em 
si as suas convicções do que é certo ou errado, bom ou mal, ideias e opiniões que 
acabam manifestando-se e influenciando os relacionamentos pessoais entre 
indivíduos e até mesmo destes com a sociedade. 
Os valores éticos podem ser muitos, variados e com distintas percepções. 
Podemos dizer que são princípios morais por meio dos quais o indivíduo adquire a 
conduta ética, a qual guia a sua conduta dentro da sociedade. (POLITO; SILVA 
FILHO, 2013) 
 Elencaremos quatro valores éticos considerados fundamentais, sendo as 
suas aplicações essenciais para um bom convívio social: 
 
 Liberdade: a aptidão que o indivíduo tem de escolher o seu destino, 
seu caminho e as suas ações. 
 Justiça: é a qualidade de destinar a cada um aquilo que por direito lhe 
é proporcional, independentemente de ser bom ou ruim. 
 
17 
 
 Responsabilidade: é a capacidade humana de arcar com as 
consequências de suas ações, honrando as obrigações adquiridas, 
seja por meio de um contrato verbal ou escrito. 
 Verdade: o que define o real do falso. 
5 A REFLEXÃO FILOSÓFICA COMO ATITUDE HUMANA 
A reflexão filosófica, do ponto de vista histórico-ocidental e teórico, é datada 
do período grego clássico; ou seja, até onde se sabe, as primeiras obras que tratam 
da reflexão sobre o mundo são do período pré-socrático: VII e VI a.C. Pode-se dizer 
que esses primeiros filósofos se dedicaram a pensar uma possível cosmo-ontologia, 
que é um princípio primeiro, originário da realidade, ao que deram o nome de arché 
(um elemento essencial que compõe todasas coisas). Como o nome dado a esse 
período da filosófica já denota “pré-socrática”, trata-se de uma forma de pensar a 
filosófica anteriormente a Sócrates (POLITO; SILVA FILHO, 2013). 
O período posterior, conhecido como socrático, inaugura outra maneira de 
refletir filosoficamente. Se antes a preocupação central era um elemento essencial, 
a partir de Sócrates a filosofia se voltou à reflexão sobre o agir humano, entre outras 
categorias relacionadas à vida. Nesse contexto, a reflexão sobre um ethos assume 
um lugar central no pensamento filosófico. É atribuído a Sócrates o título de pai da 
ética, pois a sua forma de reflexão sobre a filosofia se dava, necessariamente, sobre 
o humano. Nesse sentido, a construção das virtudes humanas e a inclinação ao bem 
eram conceitos principais desenvolvidos pela filosofia socrática. Assim, ao seu 
método de fazer os homens enxergarem as suas inclinações naturais ao bem e, 
portanto, à felicidade, ele chamou de maiêutica (PLATÃO, 2000). 
 
 
18 
 
Posteriormente, a partir da filosofia de Platão, a ética ganhou espaço e 
começou a ter uma implicação política, pois a reflexão sobre o agir humano passou 
a ser relacionada à organização da pólis grega. Assim, Platão, além de desenvolver 
uma teoria da tripartição da alma, relacionou a sua concepção metafísica ao Estado. 
A alma, segundo Platão (2000), é dividida em três partes: 
 
 A racional: a superior, a cabeça, responsável pela atividade racional; 
 A do coração: inferior a primeira, é responsável pelos sentimentos; 
 A sexual: responsável pelo prazer. 
 
Sendo a parte superior responsável pelas duas inferiores, cabe à razão 
educar o resto do corpo de forma virtuosa, ensinando o coração a se tonar bondoso 
e corajoso, assim como a parte sexual a ser moderada. 
O Estado também é tripartido, ou seja, é constituído pelos lavradores, os 
guerreiros e os magistrados. Dessa forma, a saúde do Estado está no equilíbrio entre 
as três partes, assim como a alma. Entretanto, a reflexão que incorpora a atitude 
humana e a política é repensada seguidamente por Aristóteles, que vê o homem 
como um animal político que deve buscar a justa medida nas suas virtudes. Portanto, 
as virtudes devem ser trabalhadas como hábitos humanos em que nada deve ser 
demasiado, assim, o que caracteriza o homem virtuoso é o equilíbrio. (POLITO; 
SILVA FILHO, 2013) 
Posteriormente, ocorreu o período chamado de helenístico, em que a grande 
preocupação das correntes epicuristas e estoicistas era relacionada à natureza. Ora, 
se Deus está na natureza, viver de acordo com a natureza é seguir o caminho 
racional da vida. Dessa forma, tais correntes relacionavam o viver bem à natureza e 
ao prazer espiritual (NOVACK, 1999) 
Após o período grego, a reflexão passou a ser orientada, na Idade Média, à 
religiosidade. Assim, se antes se pôde pensar o agir relacionado à política da pólis, 
à metafísica e, por fim, à natureza, na Idade Média a reflexão ética se voltou à 
religião. Filósofos como Santo Agostinho (1995) e Tomás de Aquino (2001) 
desenvolveram concepções filosóficas relacionando à conduta moral a semelhança 
divina. Após a ascensão do cristianismo, a filosofia começou a pensar em noções 
 
19 
 
metafísicas a partir da religião; Deus, então, passou a ser visto na sua onipotência; 
o homem, a partir de categorias como bem e mal. 
 
Na Modernidade, com a ascensão de teorias científicas, a atitude humana 
passou a ser pensada por um prisma mais racional. Dessa forma, questões 
relacionadas ao agir bem passaram a ser discutidas a partir de noções mais 
racionalistas e individualistas e que, muitas vezes, sequer eram associadas a 
argumentos teológicos. Essa autonomia do indivíduo iniciou com a teoria de René 
Descartes (1596–1650), que fundou o conhecimento sobre o mundo na experiência 
humana com a sua máxima “penso, logo existo”. A atitude humana passou, então, a 
ser refletida segundo o empirismo (experiência humana), o racionalismo (predomínio 
da razão sobre a natureza) e o historicismo, em que a reflexão da ética se dá a partir 
da tradição (DESCARTES, 2001) 
 Com a proximidade da Contemporaneidade, surgiram correntes de reflexão 
ética que partiam de pressupostos extremamente diversificados. A partir da teoria 
marxista (MARX, 1986), por exemplo, foi possível entender a relação entre os 
indivíduos com base nas relações econômicas; de outro modo, pela teoria freudiana 
(FREUD, 2001), pode-se entendê-la a partir da noção de desenvolvimento cultural e 
sexual; ou, ainda, a partir da fenomenologia heideggeriana (HEIDEGGER, 2004), 
viu-se a ética pelas lentes da relação existencial. Esta acaba influenciando o 
surgimento do existencialismo, que acredita, na sua vertente sartriana (SARTRE, 
1973), que a ação humana é delimitada pelas exterioridades e, portanto, o homem é 
totalmente responsável pelas suas escolhas, assim, a sua reflexão ética se 
fundamenta em uma concepção de liberdade. 
 
20 
 
 
5.1 A reflexão crítica sobre o ser, o pensar e o agir humano 
A experiência de estar no mundo nos coloca defronte a várias questões, 
como a relação com o outro, que pode ser considerada central. Nesse sentido, a 
ética se faz necessária e tem um papel regulamentador do comportamento humano. 
O termo grego ethos, que tem por tradução “bom costume”, já era a necessidade dos 
gregos em pensar não só as atitudes humanas, mas a construção delas enquanto 
culturais, políticas, sociais e até mesmo metafísicas. Nesse contexto, tendo no 
horizonte que o bem é sempre a finalidade da ação humana ou ao menos deveria 
ser por ser a única possibilidade de ser feliz, o caminho do homem ao seu fim é certo. 
(Platão, 2000) 
Entretanto, como o pensamento moderno e contemporâneo bem acentua, 
deveríamos nos perguntar: mas, afinal, o que é o bem? Nesse sentido, visando a 
certa vertente relativista, podem-se afixar várias reflexões éticas mais atuais que 
divergem totalmente umas das outras, dado que não há mais um elemento norteador 
de uma ética. É com a teoria do filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1840–1900) que 
a crítica à moral cristã e à moral kantiana ganha mais espaço. Para Nietzsche (1999) 
não há como fundamentar a moral racionalmente como se deu em grande esforço 
ao longo da filosofia ocidental. Ou seja, a atitude correta, por assim dizer, está 
sempre fundamentada em uma perspectiva. 
Ao contrário de outro filósofo alemão, Immanuel Kant (1724–1804), que 
defendia a existência de condições mínimas para a regulamentação do agir humano 
(KANT, 2015), Nietzsche (1999) denuncia que a ideia de um agir moralmente correto 
está sempre fundamentada culturalmente e socialmente em uma época. Assim, não 
haveria como pensar um pressuposto bem originário, ou, ainda, lógico, uma vez que 
 
21 
 
“o que é correto a se fazer” está sempre relacionado aos padrões de determinada 
sociedade. A imposição de uma moral universal, ainda que minimamente, como 
sugere Kant, é extremamente valorativa, ou seja, é nesse aspecto que reside a crítica 
também à moral cristã: a cultura de rebanho (NIETZSCHE, 1999). Trata-se da 
imposição de um valor para o todo, como se esse valor tivesse uma origem 
metafísica ou racional. Nesse contexto, a massa ou o rebanho, como dizia Nietzsche 
massifica o que é singular, diferente, em nome de um ethos cultural (NIETZSCHE, 
1999). 
 
Já no séc. XX, pode-se ver a alteração mais acentuada de categorias éticas 
que, ao longo da história, considerava-se terem sido superadas, como o respeito à 
vida. Não que ao longo da história ocidental não tivesse havido grandes desastres 
endossados por vários sentimentos e atitudes humanas consideradas perversas, 
mas, após anos de construção cultural “civilizatória” e processos refinados de 
pensamento ético, considerou-se que não seriam possíveis desastres 
protagonizados pelo indivíduo na Contemporaneidade tal qual o holocausto nazista. 
E é justamente nesse contexto queuma possível crítica e crise ética se instauram 
(COIMBRA; SOUSA, 2015) 
Na medida em que não se tem mais um fundamento moral divino ou racional, 
o pensar ético recai sobre certo relativismo, ou seja: o bem se torna relativo. Assim, 
o agir ético fica submetido às circunstâncias e, por mais respeitosas e reflexivas que 
se mostrem as soluções dadas para um impasse X, elas se mostram profundamente 
ligadas a um modo de pensar cultural. Por exemplo: recentemente, no ano de 2010, 
na França, foi estipulada por lei a proibição do uso de véu para as mulçumanas em 
 
22 
 
espaços públicos, por questão de segurança (ALI, 2012). Tal lei ocasionou uma série 
de revoltas pelos movimentos feministas islâmicos, pois se trata de uma questão 
cultural e religiosa para as mulçumanas. 
Mesmo no Brasil por exemplo, há determinadas religiões que proíbem a 
transfusão sanguínea mesmo em crianças. Nesse contexto, na maioria das vezes, 
há a intervenção do Estado, pois a religiosidade dos pais ou familiares não pode se 
sobrepor ao bem-estar da criança, uma vez que quem pode decidir sobre aceitar ou 
não a transfusão são apenas indivíduos em maioridade, ou seja, com 18 anos 
(BAPTISTA; BRITO; FRANÇA, 2008). Tais exemplos, ilustram que o agir ético está 
submetido a diversas formas de se pensar o que é aceitável ou não, por isso, vários 
comitês de ética estão sempre debatendo casos e questões novas, a fim de se 
chegar, ainda que minimamente, a decisões que respeitem as diversidades das 
situações e dos indivíduos envolvidos. 
5.2 A reflexão filosófica e as três dimensões da vida individual: pessoal, 
profissional e pública 
Pode-se dizer que a reflexão filosófica está intrinsicamente relacionada à 
vida pessoal, profissional e pública, uma vez que, diante dessas esferas, sempre há 
que se ponderar os dilemas éticos que permeiam toda vida. Assim, se o surgimento 
da ética se desenvolve no seio da reflexão filosófica, a filosófica se reinventa e se 
depara com os dilemas éticos que também se reinventam. Pode-se dizer que o 
estudo da ética, ou a reflexão sobre os comportamentos individuais, busca sempre 
uma normatização do agir humano para compreender o que, em determinada 
sociedade e cultura, pode ser chamado de “bem” e “bom” (PEDRO, 2014). Nesse 
contexto, podem surgir dilemas tanto privados como públicos em que um indivíduo 
ou um grupo buscam refletir sobre um agir ético dadas as leis mais universais sobre 
determinados problemas. 
Dessa maneira, podemos dizer que a reflexão sobre o agir ético atravessa 
as três dimensões da vida do indivíduo. Bom, por mais que haja certos preceitos 
universais, nesse sentido, os mais básicos, como respeito à cultura de outrem, à 
vida, ajudar os mais necessitados, não roubar ou cometer outros crimes, há 
variações sobre o que pode ser considerado correto a se fazer. Desse modo, a 
reação de um indivíduo é determinada também pelo contexto sociocultural que o 
 
23 
 
formou, o constituiu, e por esse motivo pode-se dizer que a ação de uma pessoa 
frente a um dilema ético é determinada pela sua perspectiva cultural. Entretanto, no 
âmbito profissional, como é apontado no livro Social Responsibilities of the 
Businessman, de Howard Bowen (2013), as empresas atualmente têm enfrentado 
problemas com a posição relativista da ética. Ou seja, o equilíbrio entre a perspectiva 
sociocultural e um fundamento ético mais universal gera um perspectivismo que, por 
vezes, transmite às empresas o papel de mediadora do processo de “justa medida” 
do agir ético. 
Nesse sentido, a passagem entre o âmbito pessoal e o profissional, ou a 
coabitação das duas esferas, gera certa crise frente a dilemas éticos profissionais. 
Por esse motivo, Bowen (2013) aponta para a responsabilidade social de empresas 
que devem ter um papel comprometido com os debates éticos junto à sociedade, 
dado que os dilemas éticos pessoais afetam os dilemas éticos da empresa e estas, 
por sua vez, afetam a esfera pública. 
É nesse contexto que a reflexão filosófica se faz essencial, pois, ao 
pensarmos as esferas profissional e pública, o indivíduo inserido tem um papel a 
desempenhar. Assim, questões relacionadas à diversidade sobre outros indivíduos 
são fundamentais para o debate público e político. Como assinala a filósofa alemã 
Hannah Arendt (1906–1975), em A condição humana (ARENDT, 2000), a vida 
privada se configura como um espaço de isolamento em que o indivíduo não tem 
voz; portanto, a ação só é possível no âmbito público, quando os indivíduos se 
reconhecem em suas diferenças e onde a ação política se dá, ou seja, é na vida 
pública que o debate ético existe. 
6 PRINCIPAIS TEORIAS SOBRE ÉTICA 
Ao longo da história do pensamento filosófico-ético, pode-se dizer que quatro 
matrizes teóricas tiveram maior destaque acerca da problematização do 
comportamento humano em sociedade e das suas possibilidades de ação, direitos e 
deveres (Marcondes, 2007). Tais matrizes foram desenvolvidas em diferentes 
contextos da história, sempre propondo meios de justificar ou, ainda, legitimar a boa 
ação das sociedades. 
 
24 
 
 Nesse contexto, houve vários teóricos, como Aristóteles, Platão e Santo 
Agostinho, que trouxeram contribuições ao pensamento da ética. No entanto, foi com 
a teoria contratualista que se viu uma reflexão detidamente sobre o pacto ético-
social. 
 A corrente contratualista surgiu na Idade Moderna (1453–1789) com a 
problematização sobre o surgimento dos Estados. Ainda que o escopo central fosse 
a reflexão política sobre o poder, a reflexão ética se tornou também central, dado 
que buscar compreender os fenômenos políticos é buscar compreender as relações 
que possibilitam a ação política. Tal corrente reflexiva contou com as teorias de 
diversos filósofos, como John Locke (1632–1704) e Francis Bacon (1561–1626). 
Entretanto, os teóricos que contribuíram fundamentalmente para a disseminação do 
pensamento sobre o contratualismo foram Thomas Hobbes (1588–1679) e Jean-
Jacques Rousseau (1712–1778). Apesar de divergências teóricas, ambos tinham o 
mesmo objeto de reflexão: o pacto social que possibilita a formação de um Estado 
(Marcondes, 2007). 
Para Hobbes (2003), em relação ao comportamento humano, o homem é 
por natureza um ser instintivo que visa ao próprio bem; assim, o agir bem em relação 
ao outro só se dá mediante interesses. Ou seja, para Hobbes (2003), os indivíduos 
só se submetem à formação de um Estado desde que suas necessidades sejam 
atendidas, portanto, trata-se de um pacto. Já para Rousseau (2006), o humano é 
originalmente bom e busca viver em harmonia com os demais e a natureza, 
entretanto, quando ele percebe que o espaço em que vive pode ser chamado de 
“seu”, surgem a propriedade privada e a sociedade civil. Assim, o pacto social, para 
Rousseau (2006), se dá pela necessidade de um Estado que regule a sociedade e 
as apropriações privadas dos indivíduos; portanto, cabe ao Estado promover a 
igualdade e a liberdade. Dessa forma, compreende-se que o pensamento político 
contratualista tem como fundamento o comportamento humano em relação aos 
demais indivíduos, ou seja, em sociedade. 
Outra corrente que fundamenta referencialmente o pensamento ético é a 
baseada na teoria do filósofo alemão Immanuel Kant (1724–1804). O movimento 
chamado de iluminista, que faz alusão às luzes iluminando o pensamento, marcou 
uma nova forma de pensar a realidade e o humano durante os séculos XVII e XVIII, 
em oposição ao obscurantismo da Idade Média. Nesse contexto, a teoria de Kant 
 
25 
 
(2008), para pensar a ética, responsabiliza o humano pelo dever agir ético. Ou seja, 
se na teoria contratualista a atitude humana é gerenciada pelo Estado, na teoria 
kantiana, o indivíduo, dotado de capacidade intelectual e fazendo uso de sua razão, 
sabe os seus deveres. Assim, a atitude correta é aquela que obedece à máxima de 
que devemos agir de tal maneira que gostaríamos que agissemconosco (KANT, 
2008). Nesse sentido, não haveria como o indivíduo emancipado e racional praticar 
a má ação. 
Em contrapartida à kantiana, surge a doutrina ética denominada utilitarista, 
proposta pelos filósofos Jeremy Bentham (1748–1832) e Stuart Mill (1806–1873). Tal 
doutrina é pensada a partir das consequências que um ato pode acarretar; 
entretanto, ela defende que a ação boa é aquela que traz felicidade. 
 Contudo, há diferenças entre as teorias de Bentham e Mill. 
O utilitarismo de Mill (2006), ou o utilitarismo eudaimonista, baseado na ética 
hedonista doutrina grega baseada na busca do prazer como fim de toda ação, tinha 
como base três princípios: 
 
 Elucidar a importância das virtudes para se alcançar a felicidade, não 
apenas o prazer; 
 Aliar a teoria utilitarista à concepção de justiça e direitos humanos; 
 Buscar hierarquizar os prazeres e as suas consequências. 
 
 Assim, Mill (2006) busca distinguir os prazeres, característicos do ego, das 
virtudes, que são próprias à racionalidade humana. Portanto, segundo Mill (2006), a 
ação deve ser avaliada a partir dos seus resultados: a ação boa é a ação que traz 
felicidade a despeito da ética kantiana, que problematiza a intenção da ação como 
ética ou não. Para Bentham (1974), o ser humano está subjugado naturalmente pela 
dor e pelo prazer; assim, busca sempre o prazer e evita a dor. Dessa forma, cabe ao 
legislador sempre visar, em suas ações, promover felicidade ao maior número de 
pessoas possível, devendo o Poder Legislativo aperfeiçoar as leis segundo a filosofia 
da utilidade. 
 A teoria ética mais atual é a relativista (IANNI, 1992). Tal concepção se 
fundamenta na arbitrariedade cultural que existe em julgar algo como correto ou não. 
Ou seja, essa corrente reflete as aberturas e consistências culturais diante de 
 
26 
 
determinadas ações; assim, algo que é considerado errado para uma sociedade 
pode ser considerado correto para outra. Dessa forma, o relativismo ético visa 
adequar normas e códigos aos grupos sociais que estão em questão (IANNI, 1992). 
Porém, não se trata simplesmente de um relativismo absoluto; essa doutrina ética 
tem como base os princípios do conhecimento científico, ou seja, não há justificativa 
para a aceitação de uma ação que seja prejudicial a um determinado grupo social 
tendo como base uma crença ou um preconceito individual. O surgimento dessa 
corrente se deu justamente como uma crítica à regra universal jurídica e ética (IANNI, 
1992). Ou seja, por vezes uma situação é julgada sem respeito à cultura de um grupo 
social; assim, tal ação é justificada em um preconceito cultural de quem está 
avaliando ou julgando determinada situação. 
 Enfim, pode-se compreender o desenvolvimento ético acerca de diversos 
contextos histórico-sociais, tendo sempre como objeto a ação humana. 
7 OS GRANDES DEBATES TEÓRICO-FILOSÓFICOS A RESPEITO DA ÉTICA 
Apesar de haver muitas questões que permeiam a reflexão ética ao longo da 
história, algumas se mostram atemporais (MARCONDES, 2007). Por exemplo, 
problemas como o limite entre a moral e a ética, entre o prazer individual e o bem 
comum, ou ainda se a ação ética deve ser submetida a um agente regulador ou é 
um dever individual. Tais problemáticas se encontram atuais, ou melhor, 
permanentes na história da humanidade. A teoria de Aristóteles (1987), por exemplo, 
defende que o humano é um animal político, cuja existência é vinculada à de outros 
humanos. Dessa forma, a reflexão sobre a ética torna-se incontornável, seja em 
relação a todos ou a si. No entanto, apesar da atemporalidade de certas questões, 
há momentos na história em que alguns dilemas se aprofundam. Foi assim em 
situações como a escravidão, o racismo cultural, sexual e de raças, as guerras e os 
holocaustos (MARCONDES, 2007). 
 Na Antiguidade, nas obras de Platão e Aristóteles, por exemplo, as virtudes 
tinham papel central para o pensamento sobre a ética (Marcondes, 2007). No diálogo 
intitulado Górgias (PLATÃO, 2010), Platão discorre sobre o mito do anel de Giges 
para questionar sobre o dever ético. Nesse mito, Giges é um pastor que encontra 
um anel de ouro no dedo de um cadáver, o que confere a Giges, conforme ele gira 
 
27 
 
o anel no seu próprio dedo (voltando o engaste para o lado de dentro ou de fora da 
mão), o poder de se mutuar em visível e invisível. Com isso, Platão (2010) ilustra o 
questionamento ético: age-se corretamente por medo da punição? De outro modo, 
Aristóteles também reflete acerca da ética, só que pelo argumento da felicidade. Ou 
seja, o fim de toda ação é o bem, dado que o homem virtuoso busca a felicidade e 
ela só é possível pelo bem. Assim, ao ponto que as virtudes desse homem, para 
Platão (2010), são inatas, para Aristóteles (1984) elas são possíveis de se alcançar 
pelo hábito. 
A partir da ressignificação cristã da filosofia grega na Idade Média, o 
problema voltou-se à questão do livre arbítrio (MARCONDES, 2007). Ou seja, como 
pensar uma liberdade de ação do ser humano se estamos todos submetidos à 
onipotência e à onipresença divina? Se Deus tudo prevê, como pode o ser humano 
ser livre? Questões como essas fundamentaram a reflexão filosófica nas teorias de 
pensadores como Santo Agostinho (354–430) e São Tomás de Aquino (1225–1274). 
Entretanto, o argumento de ambos se respaldou no fato de que se o livre arbítrio não 
existisse, não haveria como o homem ser dotado de vontade e agir como bem 
deliberar, ou, ainda, não seria necessário o papel da Igreja de interceder na vida de 
um religioso. Posteriormente, o filósofo inglês David Hume (1711–1776) 
fundamentou que não se pode esperar que do verbo “dever” conclua-se “é 
necessário” (MARCONDES, 2007). 
No mesmo sentido, tem-se a crítica de Friedrich Nietzsche (1844–1900) à 
concepção filosófica de fazer da ética um estudo científico, ou seja, de buscar 
estabelecer uma maneira correta de agir universal, dado que as sociedades têm 
culturas e simbolismos diferentes sobre o que é bom e correto: “[...] o que os filósofos 
denominavam ‘fundamentação da moral’, exigindo-a de si, era apenas, vista à luz 
adequada, uma forma erudita da ingênua fé na moral dominante” (NIETZSCHE, apud 
MARCONDES, 2007, p. 106). Nietzsche, dessa forma, abriu as portas para as 
reflexões contemporâneas de seu tempo ou, ainda, posteriores (MARCONDES, 
2007). 
A Contemporaneidade é marcada, assim, por questionamentos sobre a ética 
em obras de diversos campos do conhecimento, em especial da sociologia, da 
psicanálise e da filosofia. Nesse contexto, para Marcondes (2007), três autores e 
suas teorias se destacam: Max Weber (1864–1920), Sigmund Freud (1853–1939) e 
 
28 
 
Michel Foucault (1926–1984). Weber problematiza, enquanto sociólogo, as 
consequências das ações humanas relacionadas às situações práticas e 
econômicas; Freud apresenta a agência do inconsciente nas ações humanas, 
provando que nem toda ação se dá por meio da racionalidade; e Foucault demonstra 
em sua análise histórica da filosofia como a ação é atravessada por relações de 
poder que nem sempre são de controle do sujeito que age (FOUCALT, 2008). 
Nesse contexto, ou, ainda, na concepção histórica da filosofia, é possível 
compreender o panorama ético acerca da responsabilidade e das consequências da 
ação humana. Assim, a questão da ética se mostra transversal, pois se relaciona à 
intenção da ação, ao momento da ação, às consequências do agir e, ainda, à relação 
entre a interioridade e a exterioridade que levam o agente à concretude do ato. 
7.1 Os atuais debates teórico-filosóficos sobre as sociedades 
Não se pode dizer, na atualidade, que o estudo da ética seja estritamente 
pertencente à filosófica (MARCONDES, 2007). Desde o fim do séc. XIX o estudo da 
ação humana vem sendo realizado por diversas áreas do conhecimento, o que 
marca definitivamente a reflexão sobre o comportamento humano na 
Contemporaneidade. Neste contexto, surgemdiferentes formas de pensar a ética, 
inclusive em relação a situações de exceção ou nada ordinárias. Não há como trazer, 
por exemplo, problemas próprios da Antiguidade ou da Idade Média, que 
influenciavam o modo como o ser humano pensava o mundo, para a atualidade. Do 
mesmo modo, não há como estabelecermos uma discussão ética sobre células-
tronco, por exemplo, a partir do modo de pensar da Idade Média. 
Assim, a história da ética se atualiza e se compreende dada a complexidade 
de seu contexto temporal. Atualmente, a reflexão ética se debruça sobre uma 
amplitude de questões que vão da biologia e da medicina até a matriz mais 
tradicional: a política. Nesse contexto, as inovações tecnológicas trazem outras 
possibilidades de resolução de certas problemáticas, assim como outros impasses. 
Um dos grandes temas em questão desde os anos 1990 são as 
possibilidades científicas de resolução de problemas que antes eram detidamente 
discutidos com base em argumentos religiosos, tidos como possibilidades divinas, 
por exemplo: a clonagem, a inseminação artificial e a gestação de filhos alheios 
 
29 
 
(barriga de aluguel). O surgimento da bioética se dá justamente pela necessidade de 
uma reflexão que seja, até o ponto possível, neutra (NUNES; NUNES, 2004). Ou 
seja, questões que anteriormente eram amparadas em crenças religiosas, políticas 
ou mesmo no sujeito, passam a ser desmitificadas como uma intersecção de vários 
fatores que levam o sujeito a uma gama de escolhas e, quando se trata de 
argumentos que dizem respeito à vida, deve haver uma abordagem neutra do médico 
ou cientista. Dessa forma, pensar problemas como eutanásia ou transfusão 
sanguínea requer uma intervenção respeitosa de um profissional neutro (NUNES; 
NUNES, 2004). 
Outro ponto bastante problematizável da Contemporaneidade se dá em 
torno da política (MARCONDES, 2007). Apesar de esta ser tradicional, ou seja, velha 
conhecida, os fenômenos atuais trazem impasses políticos que exigem um exercício 
ético renovável. Ou seja, por mais que certas situações componham o cenário 
político ciclicamente, tais como a luta pelo poder, guerras e massacres, os modos 
como esses acontecimentos se constituem hoje são o que se mostra singular. 
Atualmente, há lutas que eram inexistentes em outros momentos históricos, a 
exemplo da austeridade imperialista, que muitas vezes trava uma guerra revestida 
de causa social, quando na realidade é motivo para extração de petróleo ou outras 
formas de exploração. 
No contexto do profissional de educação física (COLOMBO; LOPES; 
PRADO, 2010), o desafio contemporâneo se mostra com várias facetas ou 
problemáticas. A começar pelo estilo de vida adotado na atualidade. Ao mesmo 
tempo que se pode ver um aumento no número de pessoas preocupadas com a 
ingestão compulsiva de carnes, de enlatados e de embutidos, entre outros alimentos 
que, consumidos em excesso, prejudicam os organismos, vê-se também o aumento 
do consumo de fast food. Nesse sentido, outros fatores ajudam e levam ao 
sedentarismo, como a facilidade trazida pela digitalização da vida. Muitos indivíduos 
não veem necessidade alguma de se movimentar, nem mesmo para consumir algum 
alimento, pois basta acessar aplicativos de comida. Assim, juntamente à crise do 
sujeito tecnológico contemporâneo, veem-se também modos de vidas extremamente 
sedentários e desequilibrados. 
Outro embate ético que os profissionais de educação física têm que 
enfrentar, na atualidade, são as problematizações em torno das soluções avançadas 
 
30 
 
dadas pela junção de medicina, tecnologia e farmacologia, entre outras áreas. Muitas 
vezes, tal profissional se vê em um embate ético até mesmo no ambiente familiar: 
pessoas que se encontram em situações complicadas de saúde e às vezes precisam 
de atendimento (domiciliar ou não). 
 Nesse contexto, a complexidade das questões éticas que se apresentam na 
Contemporaneidade traz impasses totalmente novos, uma vez que, por mais que se 
trate de problemas de ordem política e científica, entre outros, a configuração desses 
impasses se mostra nova (MARCONDES, 2007). 
Assim, vê-se que a ética é um estudo mutável ao longo da história. Mas se 
a ética se altera é porque os modos de vida se alteram trata-se, dessa forma, de uma 
correspondência e de um caminhar juntos. Os desafios que várias áreas do 
conhecimento ou mesmo as instituições produzem necessitam desse importante 
estudo para se desenvolverem. Ou seja, sem o escopo que o estudo da ética fornece 
a todas as áreas do conhecimento, as sociedades não se desenvolveriam. Portanto, 
o estudo da filosofia, que concentra uma multiplicidade de reflexões, está na base 
de todas as outras áreas do saber, sejam elas de cunho prático ou não. Assim, toda 
e qualquer atuação profissional só evolui a partir do exercício reflexivo e diversos o 
que prova que a ética se faz necessária para toda e qualquer sociedade e para toda 
e qualquer conduta. 
8 TEORIA DA LIBERDADE 
Há diversas maneiras de conceber a liberdade. Você pode entendê-la como 
a capacidade de ter algo ou como a possibilidade de falar o que se quer. Contudo, é 
necessário identificar algumas características e princípios que fundamentam seu 
conceito e que levaram a humanidade a defini-la. 
Primeiramente, é interessante que você faça uma reflexão em torno do 
seguinte questionamento: a liberdade de expressão, por exemplo, seria menor do 
que a liberdade de comer? Para alguns estudiosos, a liberdade é considerada uma 
fantasia, pois está condicionada a muitas circunstâncias e situações que implicam e 
refletem condicionamentos psicológicos e sociais. 
Chauí (1995, p. 257) destaca suas concepções sobre liberdade a partir da 
análise de alguns poemas que demarcam esse como um importante tema a ser 
 
31 
 
tratado sob a ótica da ética. Ou seja, a autora considera que tais poemas remetem 
a questões filosóficas, ressaltando: “O que está e o que não está em nosso poder? 
Até onde se entende o poder da nossa vontade, de nosso desejo, de nossa 
consciência? ” (CHAUÍ, 1995). Complementa em outras palavras: 
Até onde alcança o poder da nossa liberdade? Podemos mais do que o 
mundo ou este pode mais do que nossa liberdade? O que está internamente 
em nosso poder e o que depende inteiramente de causas e forças exteriores 
que agem sobre nós? Por que o pior é a falta de sede e não a torneira seca, 
o gosto do escuro e não a luz apagada? A chave imobilizada e não a porta 
fechada? O que depende do “vasto mundo” e o que depende de nosso “mais 
vasto coração”? (CHAUÍ, 1995) 
Esses questionamentos levantados pela autora referem-se às reflexões e 
dúvidas realçadas a partir de poemas de José Paulo Paes e de Carlos Drummond 
de Andrade. A ideia aqui não é prolongar a discussão dos poemas mencionados, 
mas aproveitar as indagações feitas para identificar elementos que levam a outros 
questionamentos relacionados à concepção de liberdade. 
Portanto, as pessoas são de fato livres? Quais obstáculos se encontram 
diante da liberdade? Durante anos, os principais filósofos se preocuparam em 
responder ou pelo menos imprimir os seus pontos de vista acerca da liberdade e 
também de seus possíveis aspectos limitantes. Para Platão, a liberdade era 
considerada plena e se encontrava na alma. Esse filósofo acreditava que o mundo 
era uma visão distorcida do mundo perfeito, ou seja, do mundo das ideias, que 
apenas é acessado pela razão (BENSON, 2011). 
Já Aristóteles afirmava que esse mundo das ideias não existia. Para ele, o 
mundo que existe é esse no qual se vive, pois é aqui que as pessoas precisam fazer 
escolhas, ou seja, é no mundo real que elas decidem (KRAUT, 2009). Descartes, por 
sua vez, defendia a liberdade plena, entretanto afirmava que ela era encontrada na 
dúvida, uma vez que as pessoas são livres para duvidar (BROUGHTON, 2011). 
Kant ampara sua teoria assegurando que a liberdade está na vontade e que 
o desejo escraviza.Ele concebia a vontade como uma forma de refletir sobre os 
desejos. Acreditava no dever pelo dever, razão pela qual a ação é lei universal 
(WOOD, 2008). Já Hegel valoriza o coletivo e não a individualidade, ou seja, a 
liberdade está no coletivo. O todo é verdadeiramente livre. Ele reforça a dialética 
histórica, a qual é considerada o motor do mundo, uma vez que pressupõe a 
existência da tese e da antítese. Com base na negação da primeira (tese) e a partir 
 
32 
 
das concepções da segunda (antítese), parte-se para a determinação da síntese. 
Você pode considerar que essa dinâmica ocorre de maneira interna a partir de 
contradições (SALGADO; HORTA, 2007). 
Para esclarecer o raciocínio sobre tese, antítese e síntese, considere o caso 
da escravidão, que antigamente era legítima (tese). Com o passar dos anos, uma 
forte corrente de negação (antítese) surgiu. A partir desse conflito, veio a síntese, ou 
seja, a abolição da escravidão. Por isso, a dialética histórica é denominada como 
motor do mundo, pois favorece e impulsiona mudanças. 
Baruch Spinoza argumentava que apenas há liberdade caso sua vida seja 
conduzida por você mesmo, isto é, o sujeito é livre para escolher, seja para o bem, 
seja para o mau. O que importa é que a decisão é essencialmente do indivíduo 
(SPINOZA, 2014). 
Ainda é importante que você conheça a corrente existencialista de Jean Paul 
Sartre. Ela apregoa que as pessoas são condenadas à liberdade. Para ele, 
primeiramente há a existência e depois vem a essência. O filósofo justifica esse 
argumento com base no fato de que o indivíduo, por exemplo, não escolheu nascer 
(existência), mas, a partir do momento em que nasce, isto é, de que existe, tem a 
liberdade para escolher e decidir. Resumidamente, o sujeito tem liberdade para fazer 
valer a sua existência, ou seja, é livre para dar sentido à sua vida. Tal condição 
reforça e está calcada na ética de existir (MORRIS, 2009). 
Sartre ainda afirma que todos são livres, mas a liberdade provoca angústia. 
Para ilustrar o sentimento de angústia, você pode refletir sobre o fato de que o sujeito 
atribui, por exemplo, a falta de iniciativa ou a falta de liberdade a fatores externos. 
Para isso, Sartre define o conceito de má-fé. Pense na frase “eu seria livre se não 
fosse casado”: atribuindo a não liberdade ao fato de estar casado, a opção pelo 
casamento foi determinante? (MORRIS, 2009). 
 Por todos esses questionamentos e situações, o conceito de liberdade leva 
a um debate muito intenso. Atualmente, você pode se questionar o seguinte: sou 
livre pelo fato de poder votar nos governantes? Sou livre em função de poder postar 
nas redes sociais tudo o que me convém? O conceito de liberdade acaba 
convergindo no conceito de ser humano, bem como na questão sobre se ele é feliz 
ou não a partir da liberdade. Com isso, você pode considerar que as pessoas não 
são livres para decidir o que lhes acomete (nascimento, núcleo familiar, acidentes, 
 
33 
 
etc.), entretanto são livres para responder como quiserem diante do que lhes 
acontece (podem aceitar, negar, entre outros). Savater (1995) diria que as pessoas 
não são livres para escolher o que lhes acontece, mas são livres para responder ao 
que lhes acontece com diferentes tipos de ação. 
 Você deve considerar também a liberdade física. Ela corresponde ao fato 
de as pessoas serem livres para destinar seu corpo ao seu prazer, de ser possível ir 
aonde elas desejarem. Há ainda a concepção sobre liberdade política, segundo a 
qual se é livre para decidir os governantes e também para interferir no modo como 
estão governando. Além disso, existe a questão da liberdade jurídica, que apregoa 
que perante a lei são todos iguais. Você pode levar em conta igualmente a liberdade 
de expressão, que reflete a possibilidade de as pessoas falarem aquilo que quiserem 
(CARRASCO, 2011). 
 Voltaire, citado por Gouveia (2005, p. 30), afirmava: “Não concordo com 
uma só das palavras que dizeis, mas defenderei até a morte o vosso direito de dizê-
las”. Com isso, queria dizer que é possível não concordar com o que os outros têm 
a dizer, mas se deve defender até a morte o desejo de qualquer um de se expressar. 
Nesse sentido, cabe ainda considerar a responsabilidade sobre o que se diz. As 
pessoas podem dizer o querem, mas são responsáveis pelas consequências de suas 
palavras, de seus atos. 
A razão da responsabilidade sobre os atos reside no fato de que as ações 
humanas precisam ser conscientes. Por princípio, ter um ato de liberdade significa 
que o sujeito deva ter um ato consciente. Também implica que todo ato de liberdade 
demanda o conhecimento sobre as suas consequências. Em resumo, a ação com 
liberdade, em qualquer instância, pressupõe que o indivíduo se responsabilize. 
Assim, a liberdade é um ato racional, noção que leva também a outro tema, o da 
consciência moral, isto é, o indivíduo é livre para ser mal, mas será responsável pelos 
seus atos de maldade. 
 Você deve atentar ainda ao termo livre-arbítrio, que corresponde à doutrina 
filosófica que defende que o sujeito tem o poder de escolher suas ações. Bossuet 
(séc. XVII, Tratado sobre o livre-arbítrio), citado por Aranha e Martins (1993, p. 299), 
dizem o seguinte: 
 
 
 
34 
 
Por mais que eu procure em mim a razão que me determina, mais sinto que 
eu não tenho nenhuma outra senão apenas a minha vontade: sinto aí 
claramente a minha liberdade, que consiste unicamente em tal escolha. É 
isto que me faz compreender que sou feito à imagem de Deus. 
 
Na visão de Santo Agostinho, o livre-arbítrio possibilita que o homem seja 
um sujeito moral, autônomo, pois é responsável pelos seus atos em virtude de 
possuir o livre-arbítrio. Ele é dado ao homem por Deus com a intenção de que viva 
plenamente o bem. Resumidamente, a liberdade refere-se ao uso adequado do livre-
arbítrio (CLARAVAL, 2013). 
Há aqueles que afirmam ainda que você arbitra a sua própria vida e que a 
sua liberdade termina onde a do outro começa. Afinal, você só exerce a sua liberdade 
em função do outro, ou seja, apenas em sociedade você pode cometer um ato de 
liberdade. 
9 TEORIA DO DETERMINISMO 
O determinismo é um sistema filosófico que subordina as determinações da 
vontade humana à ação providencial, negando o livre-arbítrio (FERNANDES, 1993). 
Você pode considerar que o determinismo é uma doutrina filosófica segundo a qual 
os acontecimentos têm uma causa, ou seja, não podem existir sem um motivo. 
Sucessivamente, a causa ocorre quando acontece o efeito. Para exemplificar, 
considere a chuva. Antes de chover, aconteceu a evaporação. Logo após, o 
arrefecimento, depois, a condensação do vapor e assim continuamente. 
Segundo o determinismo, tudo o que existe tem uma causa. O mundo 
explicado pelo princípio do determinismo é o mundo da necessidade, e não o da 
liberdade. Necessário significa tudo aquilo que tem de ser e não pode deixar de ser. 
Nesse sentido, a necessidade é o oposto da contingência, que significa “o que pode 
ser de um jeito ou de outro” (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 298). 
 Com base nesse conceito, determina-se que as coisas aconteceram porque 
necessariamente tinham de acontecer. A partir desse raciocínio, a liberdade estaria 
comprometida pelo fato de não poder interferir nas coisas que necessitam acontecer 
naturalmente. 
 
35 
 
O pressuposto do pensamento deTaine é o determinismo positivista. Para 
ele, o ato humano não é livre, já que é causado por determinados fatores e deles 
não pode escapar. A literatura também foi influenciada pelo determinismo positivista: 
a estética naturalista oferece inúmeros exemplos da tentativa de explicar o 
comportamento humano como decorrente de fatores determinantes, sem nenhuma 
possibilidade de transcendência (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 298). 
Para compreender os aspectos relacionados à teoria do determinismo, é 
importante que você conheça algumas de suas influências históricas. Determinismoé o termo empregado, a partir do século XIX, para referir-se à realidade conhecida e 
controlada pela ciência. No caso da ética, o termo se refere particularmente ao ser 
humano compreendido como objeto das ciências naturais (química e biologia) e das 
ciências humanas (sociologia e psicologia), portanto como completamente 
determinado pelas leis e causas que condicionam seus pensamentos, sentimentos 
e ações, tornando a liberdade ilusória (CHAUÍ, 1995, p. 358). 
O par contingência-liberdade também pode ser formulado pela oposição 
acaso-liberdade. Contingência ou acaso significa que a realidade é imprevisível e 
mutável, impossibilitando deliberação e decisão racionais, definidoras da liberdade. 
Num mundo onde tudo acontece por acidente, as pessoas são como frágeis 
barquinhos perdidos num mar tempestuoso, sendo levadas em todas as direções, 
ao sabor das vagas e do vento (CHAUÍ, 1995, p. 358–359). 
No que se refere à contingência e ao acaso, Chauí (1995, p. 359) afirma que 
significam que: “não há lugar para a liberdade, porque não há curso algum das coisas 
e de nossas vidas sobre o qual pudéssemos intervir”. A autora exemplifica essas 
afirmativas com base em alguns importantes exemplos sobre a necessidade oposta 
à liberdade: 
Não escolhi nascer numa determinada época, num determinado país, numa 
determinada família, com um corpo determinado. As condições do meu 
nascimento e de minha vida fazem de mim aquilo que sou e minhas ações, 
meus desejos, meus sentimentos, minhas intenções, minhas condutas 
resultam dessas condições, nada restando a mim senão obedecê-las. 
Como dizer que sou livre e responsável? (CHAUÍ, 1995). 
A autora ainda tece exemplos acerca de questionamentos que remontam à 
discussão sobre a liberdade do sujeito: 
 
 
36 
 
[...] nasci negra, mulher numa família pobre, numa sociedade racista, 
machista e classista, que me discrimina racial, sexual e socialmente, que 
me impede o acesso à escola e a um trabalho bem remunerado, que me 
proíbe a entrada em certos lugares, que me interdita amar quem não for da 
mesma “raça” e classe social, como dizer que sou livre para viver, sentir, 
pensar e agir de uma maneira que não escolhi, mas foi-me imposta? 
(CHAUÍ, 1995, p. 359). 
 
Você pode notar que o determinismo parte também do princípio da 
casualidade. Nesse sentido, todo fenômeno da natureza possui uma causa e se 
estabelece que essa causa está relacionada diretamente a um efeito, o qual ocorre 
da mesma forma, isto é, deve ser sempre o mesmo. Quando se acreditava 
fortemente nessa teoria, se o efeito não ocorresse como esperado, poderia ser 
considerada a possibilidade de que a ciência não existia. 
Para elucidar o fato de causa e efeito, reflita sobre o episódio do 
aquecimento da água. Ou seja, quando você aquece a água, ela atinge 100 °C e, 
nesse estágio, ela evapora. A causa da evaporação evidentemente foi o seu 
aquecimento. Se esse mesmo resultado for obtido em outras condições, não ocorre 
o efeito e, por conseguinte, não há ciência. Em função disso, o determinismo, 
enquanto abordagem científica, apregoa que todos os fenômenos ou 
acontecimentos podem ser explicados racionalmente com base em leis 
perfeitamente definidas. 
9.1 Convergência entre as teorias da liberdade e do determinismo 
Na verdade, o homem é determinado e livre. É preciso considerar os dois 
polos contraditórios, superando o materialismo mecanicista, segundo o qual o 
homem é determinado, bem como a tese da liberdade incondicional. Segundo a 
concepção dialética, embora os polos determinismo e liberdade se oponham, na 
verdade estão ligados: 
O homem é realmente determinado, pois se encontra situado em um tempo 
e espaço e é herdeiro de uma certa cultura; mas o homem também é um 
ser consciente, capaz de conhecer esses determinismos; tal conhecimento 
permitirá a ação transformadora que, a partir da consciência das causas (e 
não à revelia delas), pode construir um projeto de ação (ARANHA; 
MARTINS, 1993, p. 299). 
 
 
37 
 
Com base nessas afirmações, a autora reforça que apenas os ideais teóricos 
do determinismo não são suficientes, uma vez que a legítima liberdade acontece 
somente quando acarreta a ideia de poder, ou seja, um domínio do homem sobre a 
natureza e sobre a sua própria natureza. Isso significa que o fato de as pessoas 
terem consciência sobre os acontecimentos, suas causas e seus efeitos permite a 
elas, a partir da racionalidade, interferir, escolher, decidir e, por fim, intervir. 
 Para exemplificar essa posição, você pode refletir sobre o avanço da 
medicina. Antigamente, diversas doenças assolavam os seres humanos. Assim, eles 
não podiam fazer nada contra os seus males e, consequentemente, contra a sua 
morte. Entretanto, por meio da necessidade, do aprimoramento dos seus 
conhecimentos, da racionalidade sobre os fatos, das investigações realizadas pelos 
homens e do avanço da ciência, foi possível identificar muitas das causas que 
levavam a determinadas doenças. Consequentemente, foram descobertas formas 
de intervir nelas, ou seja, se criaram antídotos e tratamentos que romperam com a 
morte natural. 
Aranha e Martins (1993) ainda reforçam a convergência entre determinismo 
e liberdade justificando que a discussão não se restringe ao campo teórico. Os 
autores consideram a liberdade abstrata e defende que se trata de uma liberdade do 
homem situado, do homem enquanto ser de relação, ou seja, que interage, interfere 
no meio. O conceito de facticidade, elucidando que se trata da dimensão de “coisa” 
que todo homem tem, é o conjunto das suas determinações. São os “fatos” (donde 
facticidade) que estão aí, tais como são e sem possibilidade de ser de outra forma. 
Cita ainda o fenomenológico Luijpen, que afirma: 
Refletindo sobre sua existência, o homem se encontra, com efeito, como 
“já” imerso em determinado corpo e “já” envolvido em determinado mundo. 
Acha- -se como holandês, judeu, inteligente, aleijado, operário, emocional, 
doente, rico, gordo, ou outra coisa qualquer. Tudo isso constitui o que ele já 
é, a saber, seu passado. Esse “já” é também chamado “determinação” do 
homem. A transcendência é a ação pela qual o homem executa o 
movimento de se ultrapassar a si mesmo. É a sua dimensão de liberdade. 
A liberdade não é uma dádiva, algo que é dado, nem é um ponto de partida, 
mas é o resultado de uma árdua tarefa, alguma coisa que o homem deve 
conquistar. A liberdade não é a ausência de obstáculos, mas o 
desenvolvimento da capacidade de dominá-los e superá-los (ARANHA; 
MARTINS, 1993, p. 300). 
Para esclarecer a perspectiva da liberdade, é possível caracterizar o homem 
sob diversos aspectos. São eles: o homem enquanto ser empírico, contemplado 
 
38 
 
enquanto corpo, submetido às leis da física; o homem enquanto ser biológico, 
submetido às influências do mundo, tendo em vista sua constituição de organismo 
vivo; o homem psicológico, que reage emocionalmente diante de suas vivências e 
também como um ser cultural, que carrega costumes, mas também transforma o 
mundo por meio de sua ação. 
Para Aranha e Martins (1993, p. 300), o aspecto empírico refere-se à 
facticidade humana. Se você considerar apenas o aspecto empírico do homem, 
concluirá que ele é determinado e não é livre. Contudo, é necessário considerar 
ainda o aspecto pessoal. Diante do determinismo, o homem reage, e o aspecto 
perceptivo que caracteriza o homem é capaz de fazer uma abordagem além da 
percepção, ou seja, o homem pensa de forma abstrata, conceitual, intelectual. Por 
fim, destaca-se ainda a dimensão social da liberdade, que corresponde às duas 
formas de o social interferir no sujeito. 
 A seguir, você pode ver algumas concepções de Kant sobre as 
fundamentações da lei moral. A partir delas, é possível extrair algumas reflexões 
aprofundadas sobre o contexto de liberdade: 
 
A Formula da Anatomia é usada na dedução da lei moral na terceira seção 
da Fundamentação e no seu tratamento alternativona Crítica da razão 
pratica (KpV 5:28-33). Ambos envolvem a pretensão de que a lei moral e a 
liberdade da vontade impliquem-se reciprocamente uma à outra (GMS 
4:447, KpV 5:29). Essa pretensão sustenta-se na concepção kantiana da 
liberdade pratica como uma causalidade de acordo com leis auto impostas 
(ou seja, normativas). Pensar o meu próprio eu como livre é pensá-ló como 
apto a agir de acordo com princípios auto legislados. Kant mostrou na 
segunda seção que, se há́ um imperativo categórico, então ele pode ser 
formulado como a FA, isto é, como um princípio normativo auto imposto por 
minha vontade racional. Portanto, se há́ uma lei moral que seja válida para 
mim, então ela é tal se é somente se eu sou livre (nesse sentido) Na 
Fundamentação, Kant argumenta que considerar o próprio eu como 
fazendo inclusive juízos teóricos é olhar o próprio eu como livre, visto que 
julgar (mesmo em questões teóricas, como a da liberdade da vontade) é ver 
o próprio eu seguindo normas lógicas ou epistêmicas. Isso significa que 
seria autorrefutante julgar que não se é livre e apresentar o próprio eu como 
fazendo esse juízo na base de boas razões. Esse argumento não é uma 
prova teórica de que somos livres, mas demonstra que a liberdade é uma 
pressuposição necessária de qualquer uso da razão, sendo que isso 
significa que qualquer uso da razão vincula qualquer um à validade do 
princípio da moralidade como Kant formulou-o na segunda seção da 
Fundamentação. [...] percebe-se, enfim, que a concepção da liberdade de 
Kant como uma causalidade noumenal é explicitamente uma concepção 
não empírica, introduzida apenas para resolver um problema metafísico 
sobre como a pretensão de que somos livres não contradiz logicamente a 
pretensão de que nossas ações sigam leis da causalidade natural. Essa 
concepção, portanto, não tem quaisquer implicações para o modo como a 
 
39 
 
ação moral deva ser concebida empiricamente. Será́ uma má́ compreensão 
se isso for tratado como um dogma metafísico sobre como nossa liberdade 
opera. Os princípios do próprio Kant descartam a possibilidade de inclusive 
conhecermos qualquer coisa sobre isso. A concepção kantiana da liberdade 
como uma causalidade nominal não pretende favorecer ou recusar qualquer 
teoria empírica sobre a historicidade ou a condicionalidade empírica de 
nossa liberdade na experiência. Se inferimos disso que ele concebe a 
liberdade humana como “a-histórica” ou não sujeita a variações de acordo 
com o tempo e a cultura, então não só́ fazemos inferências inválidas daquilo 
que Kant defende, como também chegamos a conclusões que contradizem 
diretamente as teorias efetivas da história e da antropologia empírica 
encontradas nos próprios escritos de Kant (WOOD, 2008, p. 172–173). 
Trazendo ainda os elementos inerentes à liberdade individual, Aranha e 
Martins (1993, p. 302) reforçam que ela “[...] surge como ponto de partida e ponto de 
chegada, onde se alicerçam as relações possíveis entre as pessoas. A expressão 
clássica dessa concepção é: ‘A liberdade de cada um é limitada unicamente pela 
liberdade dos demais’”. 
A mesma autora esclarece ainda que: 
A escravidão é condenada e o contrato de trabalho se representa como uma 
forma legal de acordo livre entre iguais: o dono do capital paga o salário ao 
operário; este, por sua vez, vende sua força de trabalho. Mas também já 
vimos que a democracia liberal é uma democracia de direito e não de fato, 
formal e não substancial, pois permite a elitização do poder: apenas as 
pessoas que têm propriedade têm poder político. A decorrência é que os 
homens não são tão iguais assim, e, portanto, a “liberdade de escolha” não 
é tão “livre” quanto se poderia imaginar. Na verdade, as condições de 
escolha já estão predeterminadas e reduzidas para aqueles que não são 
proprietários. O princípio do liberalismo é: “A raposa livre no galinheiro livre” 
(ARANHA; MARTINS, 1993, p. 302). 
Em resumo, as autoras enfatizam que “[...] ao tentar exercer sua liberdade, 
o proletário verifica que a livre escolha dos indivíduos privilegiados delimita cada vez 
mais o seu próprio espaço de ação” (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 302). Contudo, 
diante de toda a discussão e da evolução dos conceitos de liberdade e determinismo, 
é possível afirmar que existem liberdades e liberdades. 
10 BIOÉTICA 
10.1 Conceito 
O termo “bioética” é a junção das palavras gregas bio (vida) e éthos (ética). 
Ou seja, esse termo designa uma ética aplicada à vida. Tal estudo pertence a 
 
40 
 
correntes teóricas divergentes: biologia, direito, filosofia, entre outras. Nesse 
contexto, a bioética se concentra em buscar um tratamento respeitável à vida 
humana, mesmo em questões que não são unanimidade. O termo “bioética” foi 
utilizado pela primeira vez em 1927 por um protestante alemão, Fritz Jahr, em um 
artigo em que se referia à bioética relacionada à vida animal e vegetal. 
Posteriormente, em 1971, Van Rensselaer Potter escreveu uma proposta a que deu 
o nome de “bioética”. Tal proposta tratava da junção do estudo da biologia e suas 
extensões com os valores morais. 
Dessa forma, a bioética surge também a partir do desenvolvimento técnico 
e científico dos últimos cem anos (CHANGEUX, 1997). Ou seja, dadas as mudanças 
em relação às soluções e alternativas sobre questões médicas, ambientais e morais, 
se fez necessário um estudo que atendesse reflexivamente a essas problemáticas. 
A partir do início do século XX, devido a experimentos médicos que aconteciam em 
humanos, surgiu uma regulamentação ética da medicina e das pesquisas científicas. 
Nesse contexto, ainda não existia um código que regulasse a conduta médica-
científica. Assim, os pacientes muitas vezes passavam por experimentos sem 
mesmo saber. 
 Foi o que aconteceu, por exemplo, no processo de investigação sobre o 
parto cesariano. Apesar de a cesariana ser um processo cirúrgico datado da 
Antiguidade, em que o feto era retirado por meio de um corte após a morte da mãe, 
foi na virada do século XIX para o século XX que o procedimento conseguiu êxito 
medicinal, ou seja, que foi possível preservar a mãe e o bebê. Entretanto, até ter 
êxito, os médicos faziam experimentos nas próprias gestantes, que muitas vezes 
não sobreviviam, assim como os bebês. Na maioria das vezes, o parto envolvia risco, 
e por diversas vezes as mães nem sabiam que seriam submetidas a uma cirurgia. 
Apesar de existir um primeiro código de ética prussiano, datado de 1900, em 
que se exigia que os pacientes fossem informados e consentissem em participar de 
experimentos e procedimentos médicos, muitos profissionais o ignoravam. Em 1931, 
após a morte de cerca de cem crianças na Alemanha pela aplicação de uma vacina-
teste contra tuberculose sem o consentimento dos responsáveis, foram 
estabelecidas as Diretrizes para Novas Terapêuticas e Pesquisa em Seres 
Humanos. Entretanto, essas diretrizes passaram a ser ignoradas com a ascensão 
nazista. No governo nazista, eram feitas “pesquisas” em judeus e qualquer tipo de 
 
41 
 
opositor capturado. Ocorriam procedimentos como a aplicação de tinta azul nos 
olhos de um judeu vivo a fim de verificar se era possível melhorar a raça alemã. Após 
a Segunda Guerra Mundial e a criação do código de Nuremberg, em 1949, ainda 
continuaram a surgir casos de abuso científico-medicinal em humanos. 
Nos Estados Unidos, aconteceram alguns dos casos mais famosos da 
segunda metade do século XX, como o caso de Tuskegee Syphilis Study. 
Nesse caso, cerca de 400 pessoas negras foram submetidas à infecção de 
sífilis sem garantia do medicamento de cura, a penicilina. Os pesquisados desejavam 
entender como o vírus funcionava, principalmente em pessoas negras. 
Posteriormente, em 1963, em Nova Iorque, cerca de 20 idosos já doentes 
desenvolveram cânceres devido à aplicação de injeções com células cancerígenas 
sem o consentimento deles ou de seus responsáveis. Outro caso famoso aconteceu 
em 1950, quando pesquisadores aplicaram

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