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1 MÓDULO III: ANEMIAS E PERDA DE SANGUE ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 OBJETIVOS 1. Relacionar os tipos de Hemofilia e caracterizar a gravidade. 2. Reconhecer as alterações da coagulação presentes nos pacientes hemofílicos e suas repercussões clínicas. 3. Identificar quais são os exames necessários para o diagnóstico. 4. Identificar os possíveis diagnósticos diferenciais. 5. Descrever aspectos básicos do tratamento e profilaxia. REFERÊNCIAS HOFFBRAND, A V.; MOSS, P. A H. Fundamentos em hematologia de Hoffbrand. 7ª. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018. ZAGO, Marco Antônio; FALCÃO, Roberto Passetto; PASQUINI, Ricardo. Tratado de hematologia. São Paulo: Atheneu, 2013. DEFINIÇÃO E EPIDEMIOLOGIA A hemofilia A (hemofilia clássica) e a hemofilia B (doença e Christmas) são doenças hemorrágicas hereditárias, decorrentes de deficiências quantitativas ou qualitativas dos atores VII e IX, respectivamente. Às hemofilias são herdadas como condições recessivas ligadas ao cromossomo X, acometendo quase que exclusivamente indivíduos do sexo masculino. masculino. A hemofilia A corresponde a 80% dos casos e sua prevalência é de cerca de 1/5.000 nascimentos do sexo masculino. A prevalência da hemofilia B é estimada em 1/30.000 nascimentos do sexo masculino. O Brasil possui a 4ª maior população de pacientes com hemofilia do mundo, cerca de 13 mil pessoas. Até 2020, havia 10.985 pacientes com hemofilia A, a mais comum, e 2.165 com hemofilia B, a mais rara, cadastrados no Sistema Hemovida Web Coagulopatias. PATOGÊNESE O defeito consiste numa atividade muito baixa do fator VIII (hemofilia A) ou do fator IX (hemofilia B). Os genes que codificam a síntese do fator VIII e IX encontram-se localizados no braço longo do cromossoma X. Uma história familiar positiva é encontrada em 65% dos casos. As mulheres da família podem albergar o gene da hemofilia em um de seus cromossomas X (heterozigota). Se tiver um filho homem, a chance dele ser hemofílico é de 50%. A detecção de carreador, importante para mulheres parentes de algum paciente hemofílico que desejam engravidar, envolve a medida da atividade do fator VIII e IX em comparação com a atividade do antígeno do fator de von Willebrand (vWF:Ag). MANIFESTAÇÕES CLÍINICAS As manifestações clínicas da hemofilia A e B são indistinguíveis. A maior parte dos pacientes com hemofilia A (70%) possui a forma grave, com uma atividade do fator VIII menor do que 1% do normal. Os 30% restantes dividem-se entre as formas moderada (atividade entre 1-5%) e leve (entre 5-30%). Na hemofilia B, a forma grave responde por 20-45% dos casos. Se o parto não for traumático e se o obstetra não lançar mão de procedimentos como extração a vácuo e uso do fórcipe, raramente ocorre sangramento intracraniano. Cerca de metade dos RN com a forma grave pode sofrer hemorragia profusa após circuncisão. Geralmente as manifestações clínicas da forma grave ocorrem por volta dos 2-4 anos Hemofilias Problema 08 2 MÓDULO III: ANEMIAS E PERDA DE SANGUE ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 de idade (pré-escolares), quando a criança começa a deambular sem ajuda dos pais, e se caracterizam pelo aparecimento de hemartroses. A hemartrose se manifesta como uma monoartrite de grandes articulações. A articulação mais frequentemente acometida é o joelho, seguida do cotovelo, tornozelo e quadril. Esta hemorragia é proveniente dos capilares subsinoviais e provoca edema e dor intensa. A articulação encontra-se inflamada, semifletida, com eritema e apresenta difícil mobilização. Geralmente, a reposição do fator de coagulação e o repouso articular ajudam a reabsorção do sangue na cavidade. A punção do espaço articular não deve ser realizada pelo risco de infecções (a não ser em caso de dúvida diagnóstica). Os sangramentos recorrentes e mal controlados podem levar ao espessamento da sinóvia e dano à cartilagem articular. Estes eventos, somados à subluxações que ocorrem com a deambulação, podem ocasionar anquilose e deformidade articular permanente. A ressonância magnética é o exame de eleição para avaliar com precisão tais alterações. Outras manifestações incluem hematomas intramusculares que podem comprimir nervos periféricos e provocar síndrome compartimental (com comprometimento isquêmico), hematomas retroperitoneais, hematomas do psoas (quadro que simula a apendicite aguda), sangramento gastrointestinal e geniturinário (hematúria). A hemorragia intracraniana ocorre em 10% dos pacientes, possuindo uma mortalidade de 30%. Este evento representa a 2ª causa de morte em pacientes hemofílicos, só “perdendo” para a SIDA. Outro evento hemorrágico ameaçador à vida (além da hemorragia cerebral) é o hematoma orofaríngeo, pela possibilidade de levar à obstrução de via aérea alta e morte por asfixia. Os pseudotumores ocorrem no músculo esquelético, ossos longos, pelve, dedos das mãos e pés. Eles resultam de hematomas que evoluíram com uma cápsula fibrosa. No osso, levam à destruição óssea, neoformação óssea, expansão do osso e fratura patológica. DIAGNÓSTICO O laboratório da hemofilia (seja A ou B) revela apenas um distúrbio da via intrínseca da coagulação, ou seja, um PTTa alargado, na ausência de outras alterações nas provas hemostáticas. O Tempo de Coagulação (TC) também pode se alterar, porém este teste é muito menos fidedigno do que o PTTa. O diagnóstico é confirmado pelo ensaio específico para os fatores VIII e IX, para diferenciar a hemofilia A da hemofilia B, cuja terapêutica é bem diferente. TRATAMENTO HEMOFILIA A Antigamente, os hemofílicos A eram tratados com crioprecipitado (precipitado do plasma, rico em fibrinogênio, fator VIII, fvW, fator XIII e fibronectina). Contudo, para tratar o hemofílico, muitas bolsas de crioprecipitado eram necessárias, aumentando muito a chance de infecções transmitidas por componentes do sangue (ex.: HIV). 3 MÓDULO III: ANEMIAS E PERDA DE SANGUE ANA LUÍZA A. PAIVA – 5° PERÍODO 2022/1 Atualmente, utiliza-se o fator VIII purificado (com inativação de agentes infecciosos por detergentes ou calor) e o fator VIII recombinante. No primeiro, o preparado é feito a partir de plasma de cerca de 10.000 doadores, passando por uma série de técnicas inativadoras de vírus. O fator VIII recombinante é obtido a partir de células de cabras geneticamente preparadas. A reposição dos preparados de fator VIII nos hemofílicos A está indicada sempre que houver hemorragia no preparo pré e peroperatório. A dose deve ser calculada de modo a manter a atividade do fator VIII entre 15-20% nos sangramentos leves, entre 25-50% nas hemartroses ou sangramentos de moderada gravidade e, ainda, em torno de 50% na hemorragia intracraniana e no preparo cirúrgico. A dose do hemoderivado deve ser administrada 2x ao dia e por um período de 3-14 dias, dependendo da gravidade do quadro. No pós-operatório, a duração da reposição é de 10-14 dias, para garantir uma cicatrização adequada. Terapia Adjuvante – Nos casos de hemorragia branda, podemos utilizar o DDAVP (desmopressina), que tem como efeito principal aumentar a atividade do fator para 5-10% (4-6 vezes). Os antifibrinolíticos (EACA, ácido tranexâmico) podem ser usados como adjuvantes antes de procedimentos na cavidade oral. A atividade fibrinolítica é maior nas mucosas, portanto o sangramento mucoso responde melhor a estes medicamentos. Obs: Vale ressaltar que os antifibrinolíticos são contraindicados na vigência de hematúria: pela chance de formar coágulos obstrutivos do sistema uroexcretor. HEMOFILIA B O tratamento no passado era a base da reposição de plasma fresco congelado, uma vez que o crioprecipitado não contém fator IX. O concentrado docomplexo protrombínico parcial (Prothromplex) contém os fatores II, IX e X da coagulação, sendo uma opção terapêutica. Contudo a presença de alguns fatores ativados neste concentrado pode levar a eventos tromboembólicos. Atualmente, a terapêutica de escolha para a hemofilia B é a reposição de fator IX purificado e de fator IX recombinante.
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