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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/334545141 A tutela jurídica do ciclo urbano da água: elementos introdutórios Chapter · July 2019 CITATIONS 0 READS 87 2 authors, including: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: CONSÓRCIO LATINOAMERICANO - PROJETO INTERNACIONAL - Atividade Mineraria na Paraíba: a batalha intransparente da Turmalina Paraíba. Estudo de caso. View project WATERLAT-GOBACIT Network (www.waterlat.org) View project Jose IRIVALDO Alves Oliveira Silva Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) 68 PUBLICATIONS 15 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Jose IRIVALDO Alves Oliveira Silva on 18 July 2019. The user has requested enhancement of the downloaded file. https://www.researchgate.net/publication/334545141_A_tutela_juridica_do_ciclo_urbano_da_agua_elementos_introdutorios?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_2&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/publication/334545141_A_tutela_juridica_do_ciclo_urbano_da_agua_elementos_introdutorios?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_3&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/project/CONSORCIO-LATINOAMERICANO-PROJETO-INTERNACIONAL-Atividade-Mineraria-na-Paraiba-a-batalha-intransparente-da-Turmalina-Paraiba-Estudo-de-caso?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/project/WATERLAT-GOBACIT-Network-wwwwaterlatorg?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_1&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Jose_Alves_Oliveira_Silva?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_4&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Jose_Alves_Oliveira_Silva?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_5&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/institution/Universidade_Federal_de_Campina_Grande_UFCG?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_6&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Jose_Alves_Oliveira_Silva?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_7&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Jose_Alves_Oliveira_Silva?enrichId=rgreq-b6f2c14b716fed5b00bc38758da8110d-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMzNDU0NTE0MTtBUzo3ODIwMjA1NDAxMzMzNzZAMTU2MzQ1OTYzNDQxOA%3D%3D&el=1_x_10&_esc=publicationCoverPdf Gestão das águas G estão das águas Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor. Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Gina Vidal Marcilio Pompeu Ana Carla Pinheiro Freitas Tales de Mileto a� rmava que “tudo é água”, na defesa de que a ma- téria básica do cosmos seria o líquido primordial do qual tudo o mais derivaria. Já Zygmunt Bauman chama a contemporaneidade de ‘“modernidade líquida”. A liquidez serve como metáfora carac- terizadora das virtudes e mazelas que nos rodeiam. Seja na Anti- guidade ou na Pós-Modernidade a água sempre esteve presente no cotidiano dos seres humanos permeando o mundo concreto assim como o seu imaginário. A presença do tema “água” potencializa-se à medida que sua es- cassez se impõe no cenário mundial. Nesse viés os textos que compõem a presente obra têm o intuito de expor o problema e propor soluções para a falta de água de várias perspectivas. Dada a abrangência dos assuntos abordados, tem-se que o livro espelha a multi-trans- e interdisciplinaridade que o tema enseja. Serve como fonte de informação e de instigação à construção de novas soluções para o problema. Converge para o interesse de pro� ssio- nais do Direito, assim como das demais ciências a� ns. É indicado a pessoas comprometidas com a relação entre a gestão das águas e o desenvolvimento humano, por meio do fortalecimento das várias cadeias de valor propostas na obra. Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Doutora e Mestre em Derecho Ambien- tal y de la Sostenibilidad; pela Universi- dade de Alicante - Espanha. Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí - Brasil. Professora Perma- nente no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica, nos cursos de Doutorado e Mestrado e, na Graduação no Curso de Direito da Uni- versidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade. Gina Vidal Marcilio Pompeu Doutora em Direito pela Universida- de Federal de Pernambuco (2004), com estágio Pós-Doutoral em Direito pela Universidade de Lisboa, Portugal (2017). Advogada inscrita na OAB-CE sob o n. 6101. Coordenadora e Profes- sora Titular do Programa de Pós-Gra- duação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza, Mestrado e Doutorado. Coordenadora do grupo de pesquisas REPJAL, Relações eco- nômicas, Políticas, Jurídicas da Amé- rica Latina cadastrado no CNPQ, bem como é lider do CELA, Centro de Estu- dos Latino-Americano da Universidade de Fortaleza Ana Carla Pinheiro Freitas Doutora em Direito pela Pontifícia Uni- versidade Católica de São Paulo (2005). Pós-Doutorado em Direito pela UNI- FOR (2015). Atualmente é pesquisado- ra do REPJAL/UNIFOR e professora dos cursos de mestrado e doutorado na UNIFOR. Tem experiência na área de Psicologia e Direito Constitucional, Ambiental, Internacional, Psicologia Ju- rídica e Filoso� a do Direito. Utilizando-se de uma frase de Shakespeare: “a água corre tranquila quando o rio é fun- do”, os textos apresentados vi- sam verticalizar ou aprofundar as discussões acerca do tema “água” nas dimensões aponta- das. Nesse viés têm o escopo de contribuir para o incremen- to da proteção deste bem sui generis e favorecer, na medida do possível, a correnteza do rio que leva a soluções concretas para um dos maiores, se não for o maior problema da hu- manidade na complexa socie- dade do Século XXI: a escassez do líquido primordial. M aria Cláudia da Silva Antunes de Souza G ina Vidal M arcilio Pom peu Ana Carla Pinheiro Freitas ISBN 978-85-519-0991-1 www.lumenjuris.com.br Editor João Luiz da Silva Almeida Conselho Editorial Abel Fernandes GomesAbel Fernandes Gomes Adriano Pilatti Alexandre Bernardino CostaAlexandre Bernardino Costa Ana Alice De CarliAna Alice De Carli Anderson Soares MadeiraAnderson Soares Madeira André Abreu CostaAndré Abreu Costa Beatriz Souza CostaBeatriz Souza Costa Bleine Queiroz CaúlaBleine Queiroz Caúla Daniele Maghelly Menezes MoreiraDaniele Maghelly Menezes Moreira Diego Araujo CamposDiego Araujo Campos Firly Nascimento FilhoFirly Nascimento Filho Flávio Ahmed Frederico Antonio Lima de OliveiraFrederico Antonio Lima de Oliveira Frederico Price GrechiFrederico Price Grechi Geraldo L. M. PradoGeraldo L. M. Prado Gina Vidal Marcilio PompeuGina Vidal Marcilio Pompeu Gisele Cittadino Gustavo Noronha de Ávila Gustavo Sénéchal de Goffredo Jean Carlos Dias Jean Carlos Fernandes Jeferson Antônio Fernandes Bacelar Jerson Carneiro GonçalvesJunior João Marcelo de Lima Assafim João Theotonio Mendes de Almeida Jr. José Emílio Medauar José Ricardo Ferreira Cunha José Rubens Morato Leite Josiane Rose Petry Veronese Leonardo El-Amme Souza e Silva da Cunha Lúcio Antônio Chamon Junior Luigi Bonizzato Luis Carlos Alcoforado Luiz Henrique Sormani BarbugianiLuiz Henrique Sormani Barbugiani Manoel Messias PeixinhoManoel Messias Peixinho Marcelo Ribeiro UchôaMarcelo Ribeiro Uchôa Márcio Ricardo StaffenMárcio Ricardo Staffen Marco Aurélio Bezerra de MeloMarco Aurélio Bezerra de Melo Marcus Mauricius HolandaMarcus Mauricius Holanda Maria Celeste Simões MarquesMaria Celeste Simões Marques Océlio de Jesús Carneiro de MoraisOcélio de Jesús Carneiro de Morais Ricardo Lodi RibeiroRicardo Lodi Ribeiro Roberto C. Vale FerreiraRoberto C. Vale Ferreira Salah Hassan Khaled Jr.Salah Hassan Khaled Jr. Sérgio André RochaSérgio André Rocha Simone Alvarez LimaSimone Alvarez Lima Valter Moura do CarmoValter Moura do Carmo Vicente Paulo BarrettoVicente Paulo Barretto Vinícius Borges FortesVinícius Borges Fortes Conselheiros Beneméritos Denis Borges Barbosa (in memoriamDenis Borges Barbosa (in memoriamDenis Borges Barbosa ( ) Marcos Juruena Villela Souto (in memoriamMarcos Juruena Villela Souto (in memoriamMarcos Juruena Villela Souto ( ) Filiais Sede: Rio de Janeiro Rua Octávio de Faria - n° 81, sala 301 – CEP: 22795-415 Recreio dos Bandeirantes – RJ Tel. (21) 3933-4004 / (21) 3249-2898 São Paulo (Distribuidor) Rua Sousa Lima, 75 – CEP: 01153-020 Barra Funda – São Paulo – SP Telefax (11) 5908-0240 Minas Gerais (Divulgação) Sergio Ricardo de Souza sergio@lumenjuris.com.br Belo Horizonte – MG Tel. (31) 9-9296-1764 Santa Catarina (Divulgação) Cristiano Alfama Mabilia cristiano@lumenjuris.com.br Florianópolis – SC Tel. (48) 9-9981-9353 Editora LumEn Juris rio dE JanEiro 2018 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001 Copyright © 2018 by Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Gina Vidal Marcilio Pompeu Ana Carla Pinheiro Freitas Categoria: Direitos Humanos Produção EditoriaL Livraria e Editora Lumen Juris Ltda. Diagramação: Alex Sandro Nunes de Souza A LIVRARIA E Editora LumEn Juris Ltda. não se responsabiliza pelas opiniões emitidas nesta obra por seu Autor. É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, inclusive quanto às características gráficas e/ou editoriais. A violação de direitos autorais constitui crime (Código Penal, art. 184 e §§, e Lei nº 6.895, de 17/12/1980), sujeitando-se a busca e apreensão e indenizações diversas (Lei nº 9.610/98). Todos os direitos desta edição reservados à Livraria e Editora Lumen Juris Ltda. Impresso no Brasil Printed in Brazil O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001 CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE Gestão das águas : dignidade humana e sustentabilidade por meio do fortale- cimento das cadeias de valor / Maria Claudia de Souza Antunes, Gina Vidal Mar- cilio Pompeu, Ana Carla Pinheiro Freitas. – Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2018. 308 p. : il. fotos ; 23 cm. Inclui bibliografia. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiço- amento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financia- mento 001. ISBN 978-85-519-0991-1 1. Direito de Águas. 2. Dignidade da Pessoa Humana. 3. Águas - Con- servação. 4. Desenvolvimento Sustentável. I. Pompeu, Gina Vidal Marcilio. II. Freitas, Ana Carla Pinheiro. III. Título. CDD 345 Ficha catalográfica elaborada por Ellen Tuzi CRB-7: 6927 Breve apresentação dos autores AnA CArlA Pinheiro FreitAs Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2005). Pós-Doutorado em Direito pela UNIFOR (2015). Atualmente é pesqui- sadora do REPJAL/UNIFOR e professora dos cursos de mestrado e doutorado na UNIFOR. Tem experiência na área de Psicologia e Direito Constitucional, Ambiental, Internacional, Psicologia Jurídica e Filosofia do Direito. Andrés MolinA GiMénez Doutor em Direito Ambiental pela Universidade de Alicante, Espanha. Graduado em Direito pela Universidade de Alicante. Atualmente é professor titular na Universidade de Alicante. Professor de Direito Administrativo da Licenciatura em Derecho, da Universidade de Alicante. BelindA PereirA dA CunhA Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento; Coordenadora do Gru- po de Pesquisa CNPq Saberes Ambientais - Homenagem a Enrique Leff: Sus- tentabilidade, Impacto, Gestão e Direitos. Pós-doutorado CAPES Universidade Autônoma do México, Instituto de Investigaciones Sociales, UNAM. Professo- ra Associada UFPB. Professora do PPGCJ e do PRODEMA CesAr luiz PAsold Doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco- -Universidade de São Paulo-USP; Pós Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná-UFPR; Mestre em Instituições Jurídico-Políticas pela Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC; Mestre em Saúde Pública pela Facul- dade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo-USP. Docente da Universidade do Vale do Itajaí. Presidente da Academia Catarinense de Letras Jurídicas Vice Consuelo YAtsudA MoroMizAto YoshidA Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2001). Professora Assistente do Departamento de Direitos Humanos, Difusos e Coletivos da PUC/SP. Professora de Direito Ambiental na Graduação e na Pós- -Graduação (Mestrado e Doutorado) e Coordenadora dos Cursos de Especia- lização em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade (PUC/ COGEAE/SP). Professora e pesquisadora do Programa de Mestrado - Centro Universitário Salesiano de São Paulo-UNISAL/Lorena-SP. denise sChMitt siqueirA GArCiA Doutora pela Universidade de Alicante na Espanha. Mestre em Derecho Ambiental y Sostenibilidad pela Universidade de Alicante na Espanha. Mestre em Ciência Jurídica. Especialista em Direito Processual Civil, Graduada em Direito. Atualmente é professora do Programa de Pós- graduação stricto sensu em Ciência Jurídica, de pós graduação lato sensu e da graduação. Coordenadora de pós graduação lato sensu em Direito Processual Civil da Universidade do Vale do Itajaí. GABriel reAl Ferrer Doutor Honoris Causa pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Doutorado em Direito pela Universidade de Alicante (1992). Doutorado em Direito pela Universidade de Alicante (1992). Professor Titular de Direito Am- biental e Administrativo e Subdiretor do Instituto Universitário da Água e do Meio Ambiente na mesma Universidade. Consultor do Programa das Nações Unidas (ONU) para o Meio Ambiente? PNUMA. GinA VidAl MArCilio PoMPeu Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2004), com estágio Pós-Doutoral em Direito pela Universidade de Lisboa, Portugal (2017). Advogada inscrita na OAB-CE sob o n. 6101. Coordenadora e Professora Titu- lar do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza, Mestrado e Doutorado. Coordenadora do grupo de pesquisas RE- PJAL, Relações econômicas, Políticas, Jurídicas da América Latina cadastrado no CNPQ, bem como é lider do CELA, Centro de Estudos Latino-Americano da Universidade de Fortaleza Email: ginapompeu@unifor.br iVAnnA Pequeno dos sAntos Doutoranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Especialista em Direitos Humanos Fundamentais pela Universidade Regional do Cariri - URCA. Professora Assistente da Universidade Regional do Cari- ri. Tem experiência na área de Direito Empresarial, Civil e Ambiental. Atua principalmente nos seguintes temas: Constitucionalização do direito privado e direito das águas. Pesquisadora dos grupos de pesquisa: GEDHUF (URCA/ CNPQ) e GEPEDI Ensinoe Pesquisa no Direito (UNIFOR/CNPQ). JAhYrA helenA Pequeno dos sAntos Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNI- FOR. Especialista em Direitos Humanos Fundamentais pela Universidade Re- gional do Cariri - URCA. Professora Assistente da Universidade Regional do Cariri - URCA. Tem experiência na área de Direito Constitucional e Teoria Geral do Direito. Pesquisadora do grupo de Estudos e Pesquisas em Direitos Humanos Fundamentais - GEDHUF (URCA/CNPQ) e membro do grupo de Estudo Ensino e Pesquisa no Direito - GEPEDI (UNIFOR/CNPQ). JoAquín MelGAreJo Moreno Doutor em Historia pela Universidade de Murcia (1993). Mestre em Ges- tão Sustentável e Tecnologias da Água (Instituto de Ciências da Água e do Ambiente da Universidade de Alicante) e Mestre em Tecnologias da Água (CUJAE, Havana). Na Espanha, é professor Catedrático de História e Institui- ções Econômicas na Universidade de Alicante -UA. Atualmente é Diretor do Instituto de Ciências da Água e do Meio Ambiente IUACA, vinculado a Uni- versidade de Alicante e também Diretor de projetos no INECA, vinculado ao IUACA. No Brasil, é professor visitante do Programa de Mestrado e Doutorado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí- UNIVALI. José iriVAldo AlVes o. silVA Pós-Doutor em Desenvolvimento Regional. Doutor em Ciências Sociais. Doutorando em Direito e Desenvolvimento. Pesquisador Produtividade do CNPq, nível 2. Em estágio Pós-doutoral no Programa de Pós-graduação em Direito, no Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental e Sociedade de Risco, na Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Sociologia. Espe- cialista em Gestão das Organizações Públicas. Especialista em Direito Em- presarial. É pesquisador com ênfase em conflitos ambientais, meio ambien- te, sociedade de risco, legislação ambiental, desenvolvimento sustentável, políticas públicas relacionadas ao acesso à água e saneamento. É membro atuante em diversos grupos de pesquisa. É membro da rede de pesquisa WA- TERLAT, http://www.waterlat.org/Members.html#brazil. E-mail: irivaldo. cdsa@gmail.com ou prof.irivaldo@ufcg.edu.br liAne MAriA sAntiAGo CAVAlCAnte ArAúJo Doutoranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR (2016-2020). Bolsista CAPES/BRASIL. Pesquisadora dos Grupos REPJAL e GEPEDI, ambos da Universidade de Fortaleza. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (2014). Especialista em Direito Processual: Grandes Transformações pela UNISUL (2009). Advogada com ex- periência em Direito Administrativo (Licitações Públicas e Contratos), Civil, Ambiental e Trabalhista. luCAs são thiAGo soAres Advogado. Pós-graduando em Direito Ambiental e Urbanístico pelo Com- plexo de Ensino Superior de Santa Catarina (CESUSC). luCiAnA Cordeiro de souzA FernAndes Doutorado (2005) e Mestrado (2001) em Direito pela Pontifícia Universida- de Católica de São Paulo (PUCSP), área Direitos Difusos-Direito Ambiental; Especialização em Direito Processual Civil (PUCCAMP - 1991) e em Direito Penal e Processual Penal (USF - 1999). Professora da Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas- UNICAMP. Professora Ple- na no Programa de Pós Graduação em Ensino e História das Ciências da Terra (PEHCT) no Instituto de Geociências - UNICAMP. Líder do Grupo de Pesqui- sa/CNPQ AQUAGEO AMBIENTE LEGAL da FCA/UNICAMP. Parecerista e Consultora em Direito Ambiental. MAnoelle BrAsil soldAti Doutoranda em Ciência Jurídica, com dupla titulação, pela Universidade do Vale do Itajaí, na cidade de Itajaí, estado de Santa Catarina, Brasil, e Universi- dade de Alicante. Pós-graduada em Direito Processual pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL, Mestre em Ciências Jurídico-empresariais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Juíza de Direito do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. MArCelo BuzAGlo dAntAs Doutor (2012) em Direitos Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Visiting Scholar do Environmental Law Program da Pace Law School (White Plains/NY), de janeiro a abril de 2012, tendo sido Bol- sista do PDSE da CAPES no período. Pós-Doutor (2014-2017) pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí. Professor Visitante dos Cursos de Mestrado e Doutorado do Instituto Universitario del Agua y de las Ciências Ambientales da Universidad de Alicante e da Widener University Delaware Law School MAriA CláudiA dA silVA Antunes de souzA Doutora e Mestre em Derecho Ambiental y de la Sostenibilidad; pela Uni- versidade de Alicante - Espanha. Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí - Brasil, Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - Brasil. Professora Permanente no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica, nos cursos de Doutorado e Mestrado e, na Gra- duação no Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade. Advogada e Consultora Jurídica. PrisCillA linhAres AlBino Doutoranda em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí. Pós- -Graduação em Direito Processual Penal (2006) e Direito Ambiental (2010) pela Universidade do Vale do Itajaí, e especialista em Proteção Jurisdicional dos Direitos da Criança (2009), pela Universidade Diego Portales, do Chile. Mestre em Saúde e Meio Ambiente pela Universidade da Região de Joinvil- le (2009) e mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (2014). Atualmente é Promotora de Justiça aposentada do Ministério Público do Estado de Santa Catarina rosAnGelA souzA BernArdo Mestre em Direito Constitucional na Universidade de Fortaleza-UNIFOR. Especialista em Direito Constitucional e Direito Processual Constitucional pela Universidade Estadual do Ceará (2015). Membro do Grupo de Pesquisa Estado, Política e Constituição (UNIFOR/CNPQ). Advogada (OAB/CE nº 17.198). XII Sumário Apresentação .................................................................................................. 1 Desenvolvimento humano e a gestão das águas: análise do fortalecimento das cadeias de valor .............................................................. 7 Gina Vidal Marcilio Pompeu Rosangela Souza Bernardo Novo constitucionalismo latino-americano: exemplo de acesso à água potável ................................................................................................35 Manoelle Brasil Soldati Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Cesar Luiz Pasold O direito fundamental de acesso à água potável no Brasil como condição para um desenvolvimento sustentável .........................................57 Ana Carla Pinheiro Freitas Ivanna Pequeno dos Santos Jahyra Helena Pequeno dos Santos “Pegada hídrica” e o valor da água: dimensões entre Capitalismo, Consumismo e Justiça Intergeracional ........................................................75 Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Priscilla Linhares Albino Vânia Petermann Gobernanza del agua y ods 2030 Agua y Sostenibilidad .........................115 Gabriel Real Ferrer Poluição hídrica e os desafios dos contaminantes emergentes ...............135 Luciana Cordeiro de Souza-Fernandes Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida 1 Apresentação Tales de Mileto, filósofo Pré-Socrático, afirmava que “tudo é água” na de- fesa de que a matéria básica do cosmos seria esse líquido primordial, do qual todas as demais derivariam. Zygmunt Bauman, filósofo Pós-Moderno, chama a contemporaneidade de "modernidade líquida”. Para ele, a "liquidez" serve como metáfora básica caracterizadora das virtudes e mazelas da atualidade. Seja na Antiguidade Pré-Socrática ou na Pós-Modernidade, a água sempre esteve e está presente no cotidiano dos seres humanos, permeando o seu mundo concreto assim como seu imaginário. É sobre a água como patrimônio natural, cultural e econômico que tra- ta o livro Gestão das Águas: DignidadeHumana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor. Utilizando-se de uma frase de Shakespeare: “a água corre tranquila quando o rio é fundo”, temos que os textos apresentados visam verticalizar ou aprofundar as discussões acerca do tema “água” nas dimensões apontadas, haja vista contribuir para o incre- mento da proteção deste bem sui generis e favorecer, na medida do possível, a correnteza do rio que leva a soluções concretas para um dos maiores, se não for o maior problema da humanidade na complexa sociedade do Século XXI: a escassez do líquido primordial. Os artigos que compõem a obra foram desenvolvidos por pesquisadores vinculados aos Programas de Pós-Graduação stricto sensu em Direito do Bra- sil e da Espanha. os temas discutidos decorrem, em seu maior número, dos estudos realizados pelo Grupo de Pesquisa “Direito Ambiental, Transnacio- nalidade e Sustentabilidade” vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica(PPCJ) da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) e pelo Grupo de Pesquisa “Relações Econômicas, Políticas, Socioambientais e Jurí- dicas na América Latina (REPJAL) da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). A contribuição de importantes pesquisadores do tema, catedráticos da Uni- versidade de Alicante, na Espanha, Professores Doutores Gabriel Real Ferrer, Joaquín Melgarejo Moreno e Andrés Molina Giménez, vem enriquecer e atu- alizar o aspecto transnacional e difuso de questões envolvendo a preservação, o acesso e o uso da água. 2 Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Gina Vidal Marcilio Pompeu Ana Carla Pinheiro Freitas No correr do livro são abordados temas como o fortalecimento das cadeias de produção rural na América Latina pelo viés da questão hídrica, por Gina Marcilio Pompeu e Rosângela Souza Bernardo. Ainda no que tange à Améri- ca Latina, melhor dizendo ao “Novo Constitucionalismo Latino-Americano”, Manoelle Brasil, Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza e Cesar Luiz Pa- sold desenvolvem temática acerca da "Justiça Hídrica" por meio do acesso à água potável e a materialização da democracia de acordo com o modelo latino-americano emergente, inicialmente vislumbrado nas Constituições do Equador e da Bolívia. Em texto de Ivanna Pequeno, Jahyra dos Santos e Carla Pinheiro, a água é apontada como o ouro emergente, o “ouro azul”, destronando o chamado "ouro negro" ou petróleo, que reinava como valor soberano até meados do Século XX. No mesmo texto, o Direito Fundamental de acesso à água potável no Brasil é abordado como condição imprescindível para o desenvolvimento sustentável, especialmente no que diz respeito à chamada "crise hídrica” que configura, na verdade, uma crônica escassez de água que assola a região Nordeste do Brasil desde o período da Colonização. O capítulo sobre “pegada hídrica e o valor da água: dimensões entre capi- talismo, consumismo e justiça intergeracional” de autoria de Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza, Priscilla Linhares Albino e Vânia Petermann, apre- sentam a conexão com a evolução do capitalismo e o consumismo humano, seja para aumentar as necessidades de uso de recursos naturais nas cadeias de produção, desde o início até o final, seja para o acompanhamento humano nas necessidades de consumir cada vez mais. Destaca-se a responsabilidade do Es- tado, da Sociedade, das empresas e dos cidadãos pelo uso consciente da água potável, responsáveis também pela sua (re) geração de modo que as futuras gerações possam dela desfrutar como Direito Fundamental. O tema “governança" da água e os objetivos do Desenvolvimento Susten- tável da ONU, desenvolvido com maestria por Gabriel Real Ferrer, aponta a necessidade de gestão adequada da água, que envolve a "arte de governar”. O autor aponta o alcance de desenvolvimento econômico, social e institucional duradouro, assim como a promoção do equilíbrio entre Estado, sociedade civil e mercado econômico como objetivos da governança. A poluição hídrica e os desafios dos contaminantes emergentes na complexa sociedade contemporânea, configuram o discurso textual de Luciana Cordeiro de Souza e Consuelo Yatsuda M. Yoshida. As autoras defendem como marco 3 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor inicial da problemática a Primeira Revolução Industrial. Como ápice da conta- minação por poluentes emergentes tem-se a catástrofe de Mariana, ocorrida em novembro de 2015. Elas descrevem como a referida catástrofe e suas consequên- cias configuram a maior ameaça aos recursos hídricos, no Brasil. Os apontamentos que abordam a pré-história da sustentabilidade até sua concepção atual, assim como a inserção da água no cenário de proteção ambiental é tratado no presente livro por Carla Pinheiro e Liane Araújo. Aponta-se no referido texto a ponte histórica que une o conceito de sus- tentabilidade, nomeado como Nachhaltigkeit na Alemanha há mais de 400 anos e o “Nosso Futuro Comum”, ou Relatório Brundtland, de 1987 e suas repercussões até a contemporaneidade. O mercado da água na Espanha como marco legal e sua respectiva análise econômica são abordados por Joaquin Melgarejo Moreno e Andrés Molina Gi- menez. O desenvolvimento do tema traz como premissa a ideia de que a gover- nança da água deve basear-se em critérios de racionalidade econômica que con- duzam a uma adequada gestão e preservação dos recursos naturais. Importante pois, segundo os autores, buscar mecanismo que demonstrem aos consumidores “sinais de escassez”, que lhes induza a valorizar a água e seu custo efetivo com o objetivo de balancear as demandas por esse precioso bem. A questão da água como bem ou mercadoria é abordada por Denise Schmitt Siqueira Garcia, no sentido de apontar a necessidade de efetiva proteção da qualidade deste patrimônio tendo em vista se concretizar o direito de acesso à água potável. Esse desiderato somente tornar-se-á possível se a água for tida como um bem ambiental, não enquadrável na clássica noção de bem como algo economicamente quantificável. Outro importante tema abordado por Welison Araújo Silveira e Belinda Pereira da Cunha diz respeito à “transposicão das águas do Rio São Francisco”. Discute-se, mais especificamente, acerca das crises política e ambiental que en- volvem o tema. Em seu discurso, os autores defendem a efetivação da transposi- ção como possibilidade de mitigar a escassez de água em Estados específicos do Nordeste brasileiro. Defendem, ainda, que os impactos negativos não arrolados no estudo de impacto ambiental, foram identificados a posteriori e que, apesar deles, a transposição continua sendo mecanismo viável no sentido de possibili- tar o acesso à água a muitos nordestinos. O licenciamento ambiental como instrumento de controle é apontado como importante mecanismo de proteção dos recursos hídricos por Marcelo Buzaglo 4 Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Gina Vidal Marcilio Pompeu Ana Carla Pinheiro Freitas Dantas e Lucas São Thiago Soares. A construção, instalação, ampliação e fun- cionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais efetiva ou potencialmente poluidoras ou capazes, sob qualquer forma, de cau- sar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental, como bem determina a Lei Complementar n.140/2011. No entanto, segundo os autores, deve-se estabelecer uma leitura atualizada da referida lei, leitura esta que atenda às demandas ambientais, econômicas e sociais da complexa realidade brasileira. A tutela jurídica do "ciclo urbano da água" é introduzida por Talden Farias e José Irivaldo Alves O. Silva. Os autores destacam que uma abordagem exclusi- vamente jurídica do ciclo urbano da água não seria suficientemente abrangente e que o problema da injusta distribuição e, por conseguinte, do injusto acesso à água deve ser inserida para que se possa refletir a partir de um marco teórico que transcenda o fenômeno jurídico. Tem-se em vista explicar as dinâmicas socio-jurídicasque atravessam o referido "ciclo urbano da água". Com o intuito de atar as duas pontas da apresentação deste livro, não é pos- sível se furtar de falar da água em forma de literatura, desta vez, de literatura cantada e cumprir assim, de forma pouco ortodoxa ou de modo poético, o que determinam as diretrizes do "Desenvolvimento Sustentável" ou do “Nosso Fu- turo Comum”: pensar global e agir local. Assim como iniciamos a apresentação com Tales, Bauman e Shakespeare, nomes da seara clássica e global, findamos com a poesia de Luiz Gonzaga, nome da clássica seara local, mais precisamente do Nordeste do Brasil. Luiz Gonzaga canta a esperança da chegada da água no sertão nordestino “quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação” e quando “o mandacaru florecer na seca”. Boa leitura a quem se aventurar a percorrer os caminhos da presente obra! Profa. Dra. Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Professora e Pesquisadora do Programa de Pós-Graduacão Stricto Sensu em Ci- ência Jurídica da UNIVALI e Líder do Grupo de Pesquisa “Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade" Profa. Dra. Gina Vidal Marcílio Pompeu Professora e Pesquisadora do Programa de Pós-Graduacao Stricto Sensu em Direito da UNIFOR e Líder do Grupo de Pesquisa REPJAL 5 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor Profa. Dra. Ana Carla Pinheiro Freitas Professora e Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da UNIFOR e Coordenadora do Grupo de Estudo “Água, Sustentabili- dade e Direitos Humanos”, vinculado ao Grupo de Pesquisa REPJAL Organizadoras 7 Desenvolvimento humano e a gestão das águas: análise do fortalecimento das cadeias de valor Human development and water management: an analysis regarding the strengthening of value chains. Gina Vidal Marcilio Pompeu1 Rosangela Souza Bernardo2 Introdução O objetivo geral exposto neste artigo é identificar de que modo pode-se fortalecer as cadeias de produção rural na América Latina e analisar sua rela- ção com as águas. Os objetivos específicos são três: identificar maneiras para implementar o desenvolvimento sustentável no espaço rural a partir do forta- lecimento das cadeias de valor nas atividades econômicas primárias e agregar tecnologia e inovação nos processos produtivos; demonstrar que o desenvol- vimento sustentável pressupõe o desenvolvimento humano e que o uso ético das águas nas atividades econômicas pressupõe a capacidade para produzir e acessar dados relevantes; propor a implementação da política industrial rural para fortalecer as cadeias de valor das atividades no campo. Para alcançar os objetivos elencados acima são discutidos o escopo das instituições para o de- 1 Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Direito (Direito e Desenvolvimento) pela Universidade Federal do Ceará (1994) e Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2004). Coordenadora e Professora do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (UNIFOR), Mestrado e Doutorado. Consultora Jurídica da Assembléia Legislativa do Estado do Ceará. E-mail para contato: ginapompeu@unifor.br 2 Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Especialista em Direito Constitucional e Direito Processual Constitucional pela Universidade Estadual do Ceará (2015). Mestranda em Direito Constitucional na Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Advogada. E-mail para contato: rosangela.bernardo@gmail.com 8 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo senvolvimento humano, especialmente a responsabilidade social das empresas. Debate-se a natureza de bem comum das águas e o reflexo dessa característica na gestão desse bem, importando em responsabilidade pelo destino comunitá- rio e relevância para o aperfeiçoamento humano. Por fim, indica-se as relações entre a agricultura familiar e a implementação da política industrial rural para o fortalecimento das cadeias de valor da economia no setor e os objetivos do de- senvolvimento sustentável. A metodologia baseia-se no estudo interdisciplinar entre economia, direito e sociedade. A pesquisa é bibliográfica e documental, descritiva e exploratória. Também, propõe-se a ofertar soluções para o enfreta- mento dos problemas identificados. Sabe-se que o constitucionalismo latino-americano, do final do Século XX e início do Século XXI, busca conciliar a ordem econômica com a ordem so- cial. Persiste o discurso uníssono a favor da redução das desigualdades sociais e regionais e da defesa dos direitos humanos de liberdade, de igualdade e de fraternidade, porém efetivar direitos previstos nas constituições dirigen- tes só se fará possível com a orquestração dos anseios e esforços da socieda- de, das empresas e do Estado em benefício da conciliação entre crescimento econômico e desenvolvimento humano, que obrigatoriamente perpassa pela formação do capital humano. Nesse contexto, analisar as condições físicas, geográficas, climáticas de cada local, assim como compreender as habilidades e capacidades da população são passos iniciais para a formulação de legislação e de políticas públicas adequadas. Vale lembrar que a América Latina é rica em recursos naturais em razão da quantidade de água presente em seu território. Dessa forma, as atividades agro- pecuárias se destacam entre as vocações produtivas da Região porque elas utili- zam intensivamente as águas como insumo produtivo. Nesse viés, cabe destacar o papel da agricultura familiar e do agronegócio que garantem o abastecimento nacional e internacional de gêneros alimentícios. No entanto, a promoção do desenvolvimento alicerçado em bases susten- táveis constitui desafio para as instituições e para os Estados. Essa visão cor- responde a implementar atividades econômicas que proporcionem, simultane- amente, ganhos ambientais e sociais, e o uso racional das águas nas atividades produtivas empreendidas na Região. O primeiro gargalo para produzir com base nos critérios éticos da sustentabilidade é o desenvolvimento humano. Verifica-se, nesse diapasão, que a Região apresenta números inferiores nos índices de capital humano. 9 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor Como consequência desta primeira dificuldade, gera-se outra, que se refe- re à capacidade para produzir e acessar dados relevantes para induzir novos e melhores comportamentos produtivos. Boas práticas econômicas e sociais são geradas a partir de informações que ofereçam análises econômicas e ambientais pertinentes aos interesses dos empreendedores, da sociedade e das agências de fomento e incentivo. Assim, cria-se fluxos de informações que permitem gerar conhecimento e processos que repercutem em novas cadeias de aplicação, ge- rando dados ainda mais complexos. Em seguida, observa-se que a produção e o acesso à tecnologia e a processos inovadores resultam da capacidade de gerar dados. A partir do diagnóstico das fortalezas e das fraquezas, da realidade ambiental econômica, comercial, huma- na, educacional, social e produtiva de dado território, pode-se contribuir para a construção dos meios e processos que promovam a superação das dificuldades apresentadas, e nesse viés valorizar as potencialidades locais. Pondera-se para que a América Latina alicerce os processos para implemen- tar os objetivos do desenvolvimento sustentável nos espaços rurais da Região a partir do fortalecimento das cadeias de produção rurícola. Assim, deve-se agre- gar tecnologia aos processos produtivos da atividade primária, os quais repercu- tirão nas cadeias industriais de transformação e manufatura de tais produtos, que agora apresentam maior qualidade e, portanto, agregam valor aos produtos. Ressalta-se que a produção alicerçada em tecnologia, além de oferecer pro- dutos melhores e com maiores resultados econômicos, deve também ser am- bientalmente limpa e repercutirna melhoria das condições sociais das comu- nidades direta e indiretamente influenciadas. Para tanto, necessário é ampliar as capacidades na Região, e construir valores que permitam o florescimento de boas práticas e por fim, desenvolvimento humano. Vale lembrar que a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe - CEPAL - propôs a efetivação da Política Industrial Rural para a implementa- ção da Agenda 2030 e para a promoção de diversos objetivos ligados ao espaço rural. A visão desta instituição para o desenvolvimento sustentável do campo em tal Região congrega, a partir dos critérios da sustentabilidade, o desenvolvi- mento humano, a inovação tecnológica, a reinvenção de práticas produtivas, o incremento das instituições, o fortalecimento das cadeias de produção ligadas às atividades agropecuárias e a construção da indústria rural, haja vista ser aquela que transforma os produtos das atividades primárias. 10 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo Nesse sentido, por meio dessa pesquisa, discute-se a relevância dos fatores humanos para o incremento da produção rural com base na análise das cadeias de valor, do uso intensivo da tecnologia e do desenvolvimento econômico sus- tentável. Todos esses debates têm origem nas características ambientais e so- ciais da América Latina e a produção econômica que apresenta. Nota-se que as águas são o fio condutor da análise em razão de sua relevância para os processos econômicos e sua abundância ou de sua escassez na Região. A análise inicia-se ao apresentar o cenário da relevância das águas para a América Latina e o desenvolvimento humano, nesse viés, abordam-se aspectos do desenvolvimento sustentável e da responsabilidade social das empresas e dos indivíduos para a construção de um futuro melhor e equânime. Em seguida, debate-se o papel da informação para o desenvolvimento humano e as reper- cussões para a economia e a sociabilidade. Logo após, relaciona-se a agricultu- ra familiar e os objetivos do desenvolvimento sustentável. Por fim, são tecidas considerações sobre o significado dessa atividade para a economia local. Por fim, apresenta-se a Política Industrial Rural delineada pela CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe e suas relações com todos os ele- mentos produtivos apontados acima, a saber, o desenvolvimento humano, a tec- nologia e o fortalecimento das cadeias de valor para o setor e a gestão das águas. 1. A relevância das águas na América Latina para o desenvolvimento humano A água é elemento estruturador da vida, no entanto, esse bem é escasso em razão da sua irregular distribuição na superfície do globo. Em virtude de tal fenômeno, a América Latina é privilegiada por concentrar elevado percentual desse fluido3 (ISTAKE; GELAIN, 2014, p. 8). No continente destacam-se a Bacia Amazônica, a maior do mundo, e a Bacia do Prata, cuja relevância ultra- passa os limites geográficos da região. Por outro lado, a ação humana pode tornar o acesso à água doce ainda mais exíguo, mesmo onde há abundância desse recurso. Portanto, para governar as 3 Segundo as autoras, o Brasil, o Peru e a Colômbia, juntos, detém 21,6% da água doce do globo ao formar a Bacia Amazônica. Por sua vez, a Bacia do Prata, que se encontra localizada na Argentina, no Brasil, no Paraguai e no Uruguai, está entre as maiores do mundo. 11 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor águas é necessário que a sociedade adote práticas construídas sob os paradig- mas da sustentabilidade e que reconheça a água como bem comum. No que se refere aos princípios da sustentabilidade, as diversas instituições, especialmente o Estado, as empresas, as universidades e as comunidades locais devem voltar suas ações para identificar e criar valores de matriz econômica que importem em ganhos de natureza social e ambiental. A gestão dos recursos naturais exige a visão, ora apresentada, para a construção de um futuro comu- nitário melhor e mais justo. Em razão de sua essencialidade para a vida, a água constitui elemento cen- tral para alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável. Tais objetivos foram fixados pela Agenda 2030, de 2017, que se constitui em um plano de ação global elaborado pela Organização das Nações Unidas a partir do Rela- tório O Futuro que Queremos, de 2012. O texto reuni 17 objetivos e 169 metas associadas a eles. O objetivo 6 relaciona-se diretamente às águas destinadas ao consumo humano. No entanto, outros objetivos possuem íntima ligação com esse recurso natural. Nota-se que acessar serviços básicos, direito de todos, inclui o acesso à água e ao saneamento (meta 1.4) e que reduzir a exposição das pessoas mais vulne- ráveis à fenômenos extremos, como secas e inundações, envolve a gestão de águas (meta 1.5). Por sua vez, a irrigação de cultivos incrementa a produtividade agrícola e exige eficácia no uso da água (meta 2.3). Ademais, garantir o acesso à água e ao saneamento implica em reduzir a mortalidade infantil (meta 3.1) e que a falta de acesso à água e ao saneamento adequados afasta número elevado de meninas da vida escolar, o que contraria as metas 4.1 e 4.2 e gera sobrecarga relevante para o trabalho doméstico que geralmente é não remunerado, em oposição à meta 5.4 (LAGUNES, 2017, p. 15). Ainda, no que se refere às atividades econômicas, a água entra no processo produtivo como insumo de maneira diversificada e, para que a performance econômica da sociedade cresça com sustentabilidade, os ganhos advindos dos múltiplos usos da água devem envolver benefícios econômicos, sociais e am- bientais. Em síntese, devido as características intrínsecas desse fluido, a tutela jurídica e a gestão desse bem devem considerá-lo como bem social e cultural, portador de valor econômico (SANTOS; SANTOS; TASSIGNY, 2017, p. 3). Do exposto, percebe-se a relevância da água para a vida e para alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável. Nesse diapasão, a gestão das águas está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento humano. Por ser bem comum, 12 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo seu governo implica a necessidade de auto-organização dos usuários (GATTO; MELO, 2014, p. 101). Essencial, nessa vertente, é incrementar a produção de dados relevantes e uma postura ética compatível com a fraternidade (MIRAN- DA, 2016, p. 161 e 163). Ademais, a gestão das águas suscita considerar que a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais fazem parte do desenvolvimento nacional, conforme estabelecido no artigo 3º da Consti- tuição Federal do Brasil. Para tanto, urge ter em mente que o governo das águas não deve ficar adstrito ao Poder Público em sua atividade de planeja- mento e regulação. Cabe aos agentes usuários do líquido, diretos e indiretos, compor as soluções para o controle da utilização de tal bem em parceria com o Estado e com as instituições. Nessa esteira de pensamento, reitera-se que a gestão de bens comuns exige capacidade de auto-organização dos agentes que pertencem aos grupos de usuá- rios em razão da possibilidade de atingir-se melhores resultados, comparando-se a uma regulamentação externa (GATTO; MELO, 2014, p. 101). Por sua vez, o desenvolvimento sustentável requer a construção de parâmetros éticos adequa- dos para a responsabilização dos agentes ao longo de toda a cadeia de produção dos bens e serviços e pelos diversos modos de vida adotados pelas sociedades. Verifica-se, no caso dos empreendimentos econômicos, que eles também utilizam a água, porém, numa condição específica, pois geram bens e riquezas para a sociedade utilizando-se de um bem comum. Para atender aos critérios éticos da sustentabilidade, a atuação dos empresários deve estar voltada para, ao aplicar os recursos que detêm, gerar empregos, incorporar novas tecnologias, produzir bens e serviços e, sobretudo, criar um compromisso que resulte em um ciclo virtuoso na economia (BRITTO,2016, p. 32). O escopo das empresas, para promover as condições para o desenvolvimen- to da vida com base na responsabilidade individual, reside na adoção de um conteúdo moral. Realizar essa tarefa consiste em perceber as ligações existentes entre a empresa e as demais instituições e compartilhar com todos os stakehol- ders4 o sucesso do empreendimento. Para tanto, os agentes empresariais, além 4 Stakeholders são partes interessadas nas atividades das empresas. Existem diversos grupos deles, primários e secundários em relevância, porém todos eles influenciam as empresas para que ofereçam os resultados que anseiam. As empresas se alimentam das informações dos colaboradores e oferecem respostas aos seus desejos. O diálogo travado permite às corporações antecipar e construir vantagens competitivas (POMPEU; SANTIAGO, 2012, p. 40-43). 13 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor dos lucros, devem visar desenvolver uma cultura empresarial comprometida em apurar e criar valores na sociedade (POMPEU; SANTIAGO, 2012, p. 40-43). Para tanto, é preciso que a realidade empresarial construa suas relações so- ciais e adote o ponto de vista dos agentes que influenciam e que são atingidos por sua atuação. Aponta-se que canais de comunicação adequados viabilizam às empresas conhecer os interesses, os objetivos e as motivações dos diversos parceiros. Então forma-se uma rede de relacionamento ético entre os envolvidos (POMPEU; SANTIAGO, 2012, p. 40-43). Cabe a cada agente envolvido nos processos produtivos, que são os forne- cedores, os consumidores, os sócios, os empregados, as agências de fomento e de regulação e a sociedade, receptáculo último dos fins da atuação empresarial, contribuir para a construção de valores associados à fraternidade, e aos direitos difusos. Incorporar esta ética ao sistema produtivo significa absorver as capaci- dades humanas ao ciclo econômico e reconhecer que as vantagens competitivas que cada região pode agregar ao sistema precisam ser compartilhadas entre os povos de maneira racional (MIRANDA, 2016, p. 163). Cumpre ressaltar que, ao adotar a sustentabilidade ambiental, os Estados carecem incluir a redução das desigualdades regionais e sociais como princípios da atividade econômica, conforme apregoa o artigo 170 da Constituição Federal do Brasil. Caberá às empresas e aos stakeholders orientarem as dinâmicas produ- tivas para que gerem valores econômicos, sociais e ambientais. Dessa maneira, a água, como insumo de produção, deve, ao ser utilizada, assegurar a realização de todos esses aspectos. Pelo exposto, percebe-se que a gestão das águas não é tema exclusivo da pauta dos Poderes Públicos, pois compete, também, às empresas e aos usuários pertencentes às comunidades locais contribuir para o incremento da sustenta- bilidade a partir da criação e da difusão de valores compatíveis com o consumo racional. Dessa forma, o conhecimento dos bens comuns e do desenvolvimento coletivo demanda capacitação e educação em favor da conciliação entre cresci- mento econômico e desenvolvimento humano. Nessa línea de raciocínio, dotar valores compatíveis com o consumo racional dos recursos naturais difere da atitude do homem racional atomizado. A diferença consis- te no contínuo processo educativo envolvendo os valores da sustentabilidade, capaz de limitar, em parte, os excessos do individualismo. No entanto, o apelo à responsabilida- de não deixa de gerar efeitos patológicos, pois o apelo à consciência exterior tende ao desaparecimento de toda consciência. Mas a única maneira de preservar e promover 14 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo outras liberdades consiste na renúncia da liberdade da criação (HARDIN, 1968, p. 4 e 12). Então, como todas as atividades econômicas desenvolvidas pelo homem exigem o uso da água, racionalizar sua utilização implica em gestão responsável. Verifica-se que, economicamente, diversos países5 da América Latina des- tacam-se pela produção de commodities6 (CARNEIRO, 2012, p. 7) agrícolas voltadas para a exportação. Essa atividade utiliza intensivamente a água como insumo produtivo. Nesse sentido, a agricultura é a responsável por consumir 70% da água doce do planeta (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRICULTURA, 2014, p. 1). Por outro lado, as atividades industriais, incluindo o setor energético, conso- mem cerca de 19% da água doce do planeta. Especificamente o setor industrial de produção de energia consome 15%, enquanto os 4% restantes são destinados para a indústria pesada e de manufatura. Entretanto, o consumo das pequenas e médias indústrias não entra nos percentuais apresentados acima. Tal demanda é contabilizada nas águas que abastecem os sistemas de distribuição municipal, os quais são destinados, precipuamente, para o consumo doméstico. Por sua vez, o referido abastecimento urbano utiliza cerca de 10% da água doce total do globo (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2016, p. 3). No caso brasileiro, o Nível de Estresse Hídrico7 aumentou de 0,7 para 0,9, entre os anos de 2007 e 2012, e deve crescer ainda mais. No ano de 2015, a de- manda por água para o consumo urbano brasileiro foi de 570,2 m³/s, enquanto a previsão de demanda para o ano de 2025 chega a 630,4 m³/s (BRASIL, 2016b). Esse aumento da utilização de água doce no Brasil acompanhou o crescimento do número de estabelecimentos agrícolas que utilizam técnicas de irrigação, que expandiu em 39%, assim como houve a ampliação da área irrigada destinada à agricultura, em torno de 42% (BRASIL, 2006, p. 137), e o crescimento das ex- portações dos produtos agropecuários brasileiros, que registrou um crescimento de 65% entre os anos de 2008 e 2013 (ISTAKE, GELAIN, 2014, p. 17). 5 Os cinco maiores exportadores de água virtual do mundo são Índia, Argentina, Estados Unidos, Austrália e Brasil. Ademais, países como Colômbia e Peru, que abrigam parte significativa da Bacia Amazônica e são exportadores de produtos primários, atuam no mesmo cenário, mesmo que em menor proporção ((BRASIL É..., 2015, p. 1). 6 De acordo com Carneiro, as commodities se caracterizam por serem produtos indiferenciados, com baixo processamento industrial e elevado conteúdo de recursos naturais. 7 Segundo a ONU, o indicador Nível de Estresse Hídrico revela a retirada de água doce numa proporção com os recursos de água doce disponíveis (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2017). 15 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor Os dados apresentados acima revelam que a indústria demanda uma quanti- dade pequena de água numa escala global. No entanto, requer suprimento aces- sível, confiável e ambientalmente sustentável para um funcionamento eficiente. Ademais, o percentual de água utilizado na indústria varia entre os países em pro- porção direta com a renda da população. Em países com renda menor, a extração de água gira em torno de 5%, enquanto em países de maior renda, tal percentual sobe para 40% (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2015, p. 4). Salienta-se que na indústria, a pureza e a quantidade da água, assim como os efluentes resultantes do seu uso, dependem, primeiramente, do tipo de ativida- de e do porte do empreendimento. No entanto, quanto mais pura for a água uti- lizada nos processos, menor será a quantidade de produtos químicos necessários para proteger os materiais com os quais a água entrará em contato, provocando a redução da toxidade dos efluentes e sua reutilização em usos compatíveis com sua qualidade (MIERZWA, 2002, p. 91-92). Por outro lado, para reduzir a quantidade e otimizar a qualidade da água no processo industrial é preciso realizar estudo no local das instalações para per- ceber os processos industriais desenvolvidos. De maneira geral, cada indústria descreve seus processos de produção em documentos, porém, muitos aspectos relevantes sobre o uso da água não se encontram impressos ali,fazendo-se ne- cessário visitas de campo para perceber e aperfeiçoar as técnicas produtivas a partir dos objetivos de eficiência no uso das águas (MIERZWA, 2002, p. 77-79). Dessa forma, percebe-se a relevância das motivações das pessoas envolvidas nas atividades empresariais para o aprimoramento das tarefas e à utilização racional das águas. Nas atividades agrícolas a percepção é idêntica. Neste ramo da produção, os principais problemas relacionados ao uso de água, além da natural necessidade de elevada quantidade do líquido, relacionam-se aos excessivos níveis de desperdício. Instalar sistemas de irrigação, que comportam variadas técnicas, a depender das culturas, da região e da época da produção, mostra-se como solução racio- nal para reduzir o desperdício nas atividades agrícolas. A irrigação também representa o aumento da produtividade e do valor que alcança a produção no mercado, além de diminuir a necessidade de expansão em áreas de mata nativa (BRASIL, 2016, p. 33). A eficiência da rega programada decorre da percepção local das necessida- des das culturas no território e período da produção. Assim, os responsáveis pela produção devem construir para si motivações fundadas na produção sustentável. Essa assertiva é válida para todos os setores produtivos, em toda a cadeia. 16 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo Ademais, a disponibilidade hídrica na região em que as atividades produti- vas são desenvolvidas interfere diretamente nos resultados do empreendimento em razão dos processos produtivos criados. Nos territórios que possuem reduzi- da capacidade hídrica, as atividades se tornam sustentáveis quando produzem bens e serviços que demandam diminuta quantidade de água. Por outro lado, mesmo em áreas abundantes em água, para que o uso seja racional, é preciso assegurar a padronização do uso, que proporcione ganhos econômicos, ambien- tais (CASTRO, 2016, p. 218-220) e sociais, compartilhados entre as nações. Nessa seara, percebe-se que produzir alimentos em escala que demanda quantidade elevada de água, independentemente do local da produção, contra- ria as possibilidades de aumentar os ganhos ambientais e, portanto, prejudica os demais aspectos da sustentabilidade. Tal constatação implica em mudança de consumo e da cultura alimentar do Ocidente. No entanto, para obter tais resultados, será necessário informar e educar as pessoas e promover valores ins- titucionais para o consumo responsável baseado na sustentabilidade. Do exposto, verifica-se que para as produções agrícolas e industriais torna- rem-se sustentáveis, dependem do acesso às informações econômicas e ambien- tais relevantes, de tecnologia agregada aos processos de produção e de conduta ética compatível com os objetivos do desenvolvimento sustentável em todas as etapas dos processos produtivos. Desenvolver todos esses fatores está associado, necessariamente, ao desenvolvimento humano. 2. Capacitação humana e gestão das informações O desenvolvimento humano encontra-se intimamente relacionado com a capacidade para produzir informações. Enquanto o agir representa a transfor- mação necessária no íntimo do ser capaz de tornar possível a realização externa do ato, que é a dimensão do fazer (AQUINO, 2014, p. 33), as informações ofe- recem as condições para que as devidas transformações íntimas aconteçam e permitam a realização do ato adequado. Dessa forma, percebe-se que conhecer significa poder fazer, isto é, realizar os próprios desígnios. Assim, para construir os objetivos do desenvolvimento sustentável na Amé- rica Latina, necessário se faz ampliar a capacidade dos Estados e das institui- ções para a produção de dados relevantes. A Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, em 2012, elaborou o documento O Futuro 17 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor que Queremos. Nele, a percepção da comunidade internacional para o desenvol- vimento sustentável aponta como estratégia a formação de capacidades (OR- GANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2012, p. 5). O desenvolvimento humano depende do direito à informação e do fortale- cimento de suas capacidades. Tal direito perpassa a geração e o acesso a dados relevantes e fundamenta as ações indispensáveis para a ampliação das capaci- dades. A partir da realidade local, associado ao nível de informação disponível, é possível perceber as oportunidades para construir o desenvolvimento susten- tável (MIRANDA, 2016, p. 147). A relação entre a capacidade hídrica e humana da América Latina orienta as condições para construir os empreendimentos econômicos locais. A elevada biodiversidade e a abundância de recursos naturais, proveniente da quantidade de água na Região, sugerem uma diversidade econômica que, no entanto, não se verifica. A especialização econômica da América Latina é indicada por re- levante participação no comércio internacional de commodities (CARNEIRO, 2012, p. 29). Isso significa, que a contribuição dos fatores humanos para o incre- mento da economia é determinante para os resultados obtidos. A relação entre os índices de desenvolvimento humano encontrados na Região e os valores alcançados pelo Produto Interno Bruto de alguns países ilustram quan- to o desenvolvimento humano é relevante para a construção de sociedades mais justas e igualitárias. Comparando-se Brasil, Argentina, Colômbia e Peru, observa-se que o desenvolvimento humano é inversamente proporcional aos valores do PIB. TABELA 01 – Índice de capital humano e os valores em milhões de dólares do Produto Interno Bruto a preços correntes de mercado e per capita da Argentina, do Brasil, da Colômbia e do Peru. PAÍSES PONTUAÇÃO CLASSIFICAÇÃO MUNDIAL PIB PIB per capita ARGENTINA 70.70 56ª 632.841.4 14.615.9 BRASIL 64.51 83ª 1.774.722.2 8.542.6 COLÔMBIA 69.58 64ª 292.080.2 6.056.2 PERU 66.31 79ª 189.209.8 6.029.0 Fonte: Informe de Capital Humano 2016. World Economic Forum8 (pág.4-5) e Anuário Estatístico da América Latina e Caribe 2016. CEPAL (pág. 40). 8 O Fórum Econômico Mundial, comprometido em melhorar o estado do mundo e a organização internacional para a cooperação público-privada, desenvolveu o Índice de Capital Humano que quantifica como 130 países estão desenvolvendo e implantando o capital humano, por meio de 18 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo O Brasil representa o melhor PIB da América Latina, no entanto, apresen- ta o pior desempenho em capital humano no grupo dos países estudados. A Argentina, melhor colocada em capital humano, apresenta o segundo melhor desempenho em PIB no grupo, que, no entanto, é menos de um terço do PIB brasileiro. A Colômbia, com menos de um sexto do PIB brasileiro, ocupa a segunda posição em capital humano, enquanto o Peru, que possui PIB inferior a um oitavo do brasileiro, ocupa a terceira posição entre os quatro Estados. A disparidade entre o total de pecúnia produzido pelos países e o índice de capital humano encontrado indica desigual distribuição de renda. As condições para produzir exigem das sociedades elevado padrão de de- senvolvimento das capacidades individuais, pois o processo de formação huma- na possui íntima relação com o processo econômico. Para construir vantagens competitivas no mercado internacional é preciso considerar os recursos natu- rais e o capital humano (GONÇALVES, 2005, p. 102-104). Em tal contexto, as políticas dirigidas pelos Estados revelam-se significativas para a criação de oportunidades sociais que possam ser compartilhadas. A justiça social e a equidade somente podem ser alcançadas quando as opor- tunidades criadas pela sociedade podem ser desfrutadas por expressiva parcela populacional. Ao Estado cabe atuar com a finalidade de influenciar o acréscimo na qualidade de vida com reflexos sobre as habilidades produtivas. Assim, ga- rantir acesso amplo à educação formal e aos equipamentos de saúde, por exem- plo, permite o florescimento econômicoporque qualidade de vida implica em melhores condições para partilhar os conhecimentos produzidos socialmente (SEN, 2010, p. 190-191). A atuação estatal relevante é, portanto, aquela que cria ambiente propício para a construção de laços econômicos equitativos, os quais viabilizam a incor- poração dos valores produzidos localmente, voltados para incrementar a vida dos agentes econômicos envolvidos. O ciclo produtivo enriquece a vida coletiva quando viabiliza a vida local, isto é, quando realça e dignifica as potencialida- des humanas e naturais da localidade a que pertencem os sujeitos econômicos. Conclui-se que o crescimento econômico verificado no Estado brasileiro não realiza as condições ideais para o incremento da economia de forma equita- tiva uma vez que o índice de capital humano apresentado não acompanhou avaliação dos resultados de aprendizagem e emprego, em escala de 0 (pior) a 100 (melhor), entre cinco grupos etários distintos. 19 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor o crescimento do PIB na mesma proporção, o que se observa ao comparar o desempenho dos outros três países analisados, os quais ostentam cifras menores e, no entanto, ocupam posição superior ao Brasil em desenvolvimento humano. Consequentemente, discute-se a atuação das empresas para fomentar os meios necessários para atender as exigências sociais de ampliação das capaci- dades. A busca por lucros não é mais o único foco das empresas socialmente responsáveis e, nesse contexto, surgem as empresas sociais, que são aquelas que produzem bens úteis para atender o mercado, administradas por pessoas locais em benefício das comunidades em que vivem (YUNUS, 2008, p. 101). Tais firmas não desprezam seus rendimentos, mas são constituídas preci- puamente para atender demandas de grupos sociais excluídos do mercado e, que, portanto, permanecem afastados de práticas sociais que favorecem atuação produtiva e melhor qualificada. Os pilares que compõem essa visão empresarial se coadunam com a equidade econômica e, consequentemente, incrementam a necessária ampliação das capacidades. A produção econômica da América Latina, especializada em produtos indi- ferenciados, com baixo processamento industrial e elevado conteúdo de recur- sos naturais não atende aos valores da sustentabilidade, (CARNEIRO, 2012, p. 7). Para construir uma realidade econômica com tais critérios éticos, isto é, quando as atividades econômicas proporcionam ganhos sociais e ambientais, é preciso produzir dados relevantes que propiciem a criação de atitudes produti- vas sustentáveis e equitativas. Cumpre ressaltar que, diante do significado da água para a vida, faz-se ne- cessária a produção de dados e informações sobre o assunto que possam funda- mentar condutas e decisões das instituições e dos Estados. A produção de dados estatísticos nacionais sobre as águas é considerada prioridade pela Organização das Nações Unidas desde 2007, quando desenvolveu o conceito de Contas Eco- nômicas Ambientais da Água - SCEA-Água com o intuito de facilitar a per- cepção da interação dos recursos hídricos com outros recursos naturais, assim como os serviços ecossistêmicos decorrentes do seu uso. O SCEA-Água é um sistema que normatiza a compilação de dados eco- nômicos e ambientais ligados ao tema da água. Os resultados obtidos devem permitir a percepção das interações entre a economia e o meio ambiente e des- crever as ações e as mudanças quanto aos estoques de ativos ambientais. Cada Estado deverá produzir suas estatísticas de acordo com os princípios elencados 20 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo nas Recomendações Internacionais para as Estatísticas da Água – RIEA, de 2010 (LAGUNES, 2017, p. 9-11). Assim, implementar o SCEA-Água permite produzir informações que subsi- diem o acompanhamento da implementação dos objetivos do desenvolvimento sustentável pelos Estados em razão da íntima relação da água com os diversos objetivos da Agenda 2030 (LAGUNES, 2017, p. 16). Por exemplo, as contas de água podem indicar se os fluxos monetários que circulam no país são capazes de custear os serviços de água potável e de saneamento de maneira sustentável. Sob essa ótica, construir a proposta do SCEA-Água requer mudança nas motivações dos agentes responsáveis por produzir as estatísticas nacionais, tan- to dos profissionais responsáveis últimos para tratar e publicar os dados, como dos diversos agentes que produzem as informações que serão compiladas. E, por outro lado, dados produzidos com base em distintos paradigmas influenciarão decisões diferenciadas no seio das instituições, dos Estados e dos variados usuá- rios dos serviços da água. Instalam-se assim, a partir da renovação das perspec- tivas pessoais, novas realidades. Conclui-se que o processo de produção de conhecimento é escasso, porém, o dado gerado proporciona múltiplos usos. Recomenda-se que a sociedade te- nha condições para produzir informações, e nesse diapasão tire proveito delas e multiplique dados. Assim, contribuir para o fortalecimento das cadeias de valor significa a produção de dados que possam ocasionar impacto em cada realidade econômica específica, isto é, proporcionar condições para a produção de novos conhecimentos a partir daqueles anteriormente conquistados. As informações relevantes que permitirão aos usuários da água contribuí- rem para a formação das cadeias de valor na agricultura e na indústria deverão abordar temas de significação estratégica para enfrentar os problemas decorren- tes do uso inadequado da água nesses dois setores econômicos. Apenas os agen- tes que vivenciam cada realidade produtiva podem compreender os desafios do setor e orientar os demais elos da cadeia sobre suas prioridades. A atitude de geração e troca de informações relevantes precisa envolver todos os níveis e práticas sociais das instituições. Nos estabelecimentos pro- dutivos tal exigência resulta no desenvolvimento de efetivos mecanismos de otimização do uso da água, assim como desenvolve a responsabilidade de cada agente produtivo pelos resultados da instituição em implementar os objetivos do desenvolvimento sustentável. 21 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor Lembra-se que o fazer humano é orientado por certa ética, portanto, cabe à sociedade debater e construir práticas que privilegiem o desenvolvimento co- letivo. Tal empreendimento torna-se viável quando as capacidades humanas são consideradas relevantes para os processos econômicos. Para tanto, urge a produção de informações aptas a construção de novas realidades produtivas num ciclo ininterrupto. 3. Agricultura familiar e os objetivos do desenvolvimento sustentável A agricultura familiar é caracterizada por atividades múltiplas, desde o ma- nejo de diversas culturas agrícolas e o trato de animais diferenciados, à produ- ção artesanal e o turismo rural. Essa atividade econômica também é marcada pela preocupação com a reprodução das condições da vida familiar e envolve interação pessoal com os demais produtores nessa mesma condição. Ressalta-se que o conceito da Organização das Nações Unidas para a Ali- mentação e a Agricultura, FAO, para a agricultura familiar inclui as ativida- des agrícolas baseadas na organização da família e envolve todas as atividades rurais, isto é, a silvicultura, a pesca, o pastoreio e a agricultura. A segurança alimentar decorre da variedade alcançada nesse modelo de produção (OR- GANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRICULTURA, 2014, p. 1). Sabe-se que a agricultura familiar possui características compatíveis com os princípios éticos da sustentabilidade. Assim, a preocupação com a repro- dução da família introduz elementos valorativos que criam uma simbiose entre os produtores e o bioma onde labutam. As tradições culturais são for- temente influenciadas pelo meio e são repassadas às gerações futurasatravés de interações práticas. Amparados por técnicas tradicionais, os agricultores relacionam-se com o meio ambiente e na sociedade de modo mais harmôni- co (BERTUZZI, 2012, p. 40). Nesse viés, a agricultura realizada em bases familiares é compatível com a Agenda 2030. A meta 2.3 é dobrar a produtividade agrícola e a renda dos pe- quenos produtores de alimentos, entre eles, os agricultores familiares. A meta 2.3 destaca ainda o trabalho agrícola das mulheres, dos indígenas, dos pastores e pescadores. Para tanto, a ONU prevê meios, tais como o acesso seguro e igual 22 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo à terra, aos recursos produtivos e insumo, ao conhecimento, aos serviços finan- ceiros, aos mercados e oportunidades de agregação de valor e de empregos não agrícolas. Para esta meta não estão previstos indicadores, cabendo aos Estados, em parceria com a sociedade, construí-los. Pondera-se que outra meta, para acabar com a fome e promover a agricultura sustentável, é aquela de garantir sistemas sustentáveis de produção de alimentos e implementar práticas agrícolas resilientes. Sabe-se que estas aumentam a pro- dutividade, contribuem para manter os ecossistemas, fortalecem a capacidade de adaptação às mudanças no clima e, por fim, melhoram a qualidade da terra e do solo. Para a meta 2.4 também não estão previstos indicadores particulares. A agricultura familiar, por suas características, é sistema de produção de alimentos que preserva a base de recursos naturais envolvida na atividade agrí- cola, isto é, o clima, a água, o solo e a biodiversidade, além de produzir em quantidade. No mundo, 90% das fazendas são administradas por um indivíduo ou uma família e dependem principalmente do trabalho familiar. As explora- ções agrícolas familiares ocupam cerca de 70% a 80% das terras agrícolas e produzem cerca de 80% dos alimentos consumidos mundialmente (ORGANI- ZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E A AGRI- CULTURA, 2014, p. 1). Nessa esteira de pensamento, a expectativa da ONU em dobrar a produção de alimentos a partir do trabalho dos pequenos produtores representa, simulta- neamente, o fortalecimento da agricultura familiar e uma medida para garantir o funcionamento adequado dos mercados de commodities de alimentos e seus derivados, com a finalidade de limitar a volatilidade extrema dos preços dos alimentos, que constitui a meta 2.c. Para aumentar a capacidade de produção agrícola nos países em desen- volvimento, a meta 2.a prevê a necessidade de aumento dos investimentos em infraestrutura rural; a pesquisa em serviços agrícolas, bem como sua extensão e desenvolvimento de tecnologia e os bancos genéticos de plantas e animais. Assim, todas essas medidas devem estar associadas à meta 2.3, isto é, devem ser dirigidas para atender, prioritariamente, as necessidades dos pequenos produtores. Implementar a agricultura de maneira sustentável requer a valorização dos elementos que são determinantes para sua construção, já que as ações humanas são baseadas em concepções que precedem as ações. Para tanto, é preciso considerar o desenvolvimento humano como base para a superação 23 Gestão das águas: Dignidade Humana e Sustentabilidade por meio do Fortalecimento das Cadeias de Valor dos desafios da sustentabilidade. Sob esse viés, a ampliação de capacidades torna-se fundamental para alcançar a meta de dobrar a produtividade dos pequenos produtores rurais. A agricultura familiar também representa o direito de acesso aos alimentos. Tal direito compreende os meios para produzi-lo. Essa garantia representa o direito de contribuir para a melhoria das próprias condições de existência. A segurança alimentar envolve a capacidade de produzir o volume necessário, a estabilidade da oferta e o acesso efetivo aos víveres, tudo isso sem comprometer outras necessidades (CASTRO; DENNY; FILHO et al., 2017, p. 135-136). Contrariamente ao exposto, o mercado de commodities agrícolas altera as premissas da segurança alimentar, especialmente quando os produtos são ne- gociados a partir das instituições financeiras. Ao produzir elevada especulação, as transações nas bolsas de valores provocam elevados gastos com alimentação nos países tradicionalmente produtores agrícolas, ao passo que garante preços mais baixos para os consumidores dos países importadores dos referidos produ- tos (STAFFEN, 2016, p. 109). Por sua vez, ao operar com formas diretas de escoamento da produção, a agricultura familiar garante o abastecimento dos mercados e, simultaneamente, as condições de subsistência aos próprios produtores e a segurança alimentar, nos moldes anteriormente apontados. Ademais, outro aspecto da agricultura familiar que se relaciona aos objetivos do desenvolvimento sustentável é sua capacidade para fazer parte de redes de produção. As fazendas familiares são unidades produtivas que integram cadeias de valor na economia rural e, como tal, consolidam estratégias e potencializam sua margem produtiva. E quando reunidos em cooperativas, os pequenos agri- cultores potencializam ainda mais essa característica. A prática do associativismo amplia as possibilidades de desenvolvimen- to humano, assim como fortalece as cadeias de valor econômico. Optar por organizar-se enquanto cooperativa pressupõe o aprimoramento das condições pessoais dos participantes para o desenvolvimento de projetos comuns e que geram impacto para o grupo envolvido e para aqueles por eles influenciados. Em síntese, o associativismo desenvolve características sociais que viabilizam o compromisso coletivo (AGOSTINI, 2016, p. 86). Os pequenos agricultores, ao desenvolver práticas associativas em torno das cooperativas de produção, ampliam sua sociabilidade. A ação cooperativa se expressa através de práticas que representem ajuda mútua, o fortalecimento da 24 Gina Vidal Marcilio Pompeu e Rosangela Souza Bernardo democracia e da participação autônoma e solidária. De maneira voluntária as pessoas se reúnem para formar uma empresa de propriedade comum em busca de satisfação econômica, social e cultural (BRITTO, 2016, p. 78). Tais entidades contribuem para o desenvolvimento rural quando integradas aos demais elos da cadeia produtiva agregando valor à rede; difundindo boas práticas; realçando as vantagens desse tipo de sociabilidade para os participan- tes diretos e suas comunidades; criando oportunidades para o incremento do papel da entidade na cadeia produtiva e melhorando a renda e aspectos sociais da vida dos seus membros. A agricultura familiar, como toda a produção agropecuária, liga-se às metas e aos objetivos de sustentabilidade no que se refere às águas e ao desenvolvi- mento humano. Práticas agrícolas sustentáveis devem representar a manuten- ção da biodiversidade característica da região e realizar ganhos sociais, além dos econômicos. A produção familiar é capaz de concretizar os aspectos da susten- tabilidade sem perder suas características elementares e, ainda, fomentar outras cadeias produtivas, que utilizam maior tecnologia e capital humano qualificado. 4. A política industrial rural e o fortalecimento das cadeias de valor O desenvolvimento sustentável na América Latina liga-se ao incremento da produção rural porque a região contém abundância em recursos naturais e é tradicional exportadora de commodities agrícolas. Tal prosperidade advirá da promoção integrada das atividades econômicas do campo e do fortalecimento das cadeias de valor formadas com base na ética da responsabilidade. Definir o espaço rural não tem sido tarefa simples, no entanto, não pode ser confundido com a agricultura. O mundo rurícola reuni diversos setores e atividades econômicas. É também multifuncional, pois relaciona funções pro- dutivas, ambientais, ecológicas e sociais. De um modo geral, indica-se a baixa densidade populacional como característica elementar. Também é marcante o fato de que não há isolamento absoluto entre os espaços rurais e as áreas urbanas, pois