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Sachs Desenvolvimento inciudente, sustentável sustentado Prefácio debate sobre o desenvolvimento vem sendo travado há algumas décadas, mas recentemente se intensificou, muitas vezes de maneira estimulante, com as drásticas mudanças políticas que o mundo tem sofrido, o forte acirramento das tensões sociais e a incessante degradação do meio ambiente. Nesse contexto delicado, surge a proposta de um Desenvolvimento Sustentável como alternativa desejável - e possível - para promover a inclusão social, o bem-estar econômico e a preservação dos recursos naturais. Essa tese, articulada pelo professor lgnaçy Sachs, da École des Hautes Études en Sciences Sociales, conquista cada vez mais apoio em todo o planeta. 0 professor Sachs, um profundo conhecedor dos problemas dos países do assim chamado Terceiro Mundo, e particularmente do Brasil, fundou na França o Centro de Estudos sobre o Brasil Contemporâneo e o Centro Internacional de Pesquisas sobre lVleio Ambiente e Desenvolvimento, para aprofundar e desdobrar essa problemática. Neste livro, ela é abordada, como sempre de maneira fecunda e criativa, com enfoques centrados nas questões do trabalho, da inclusão social, das políticas públicas, da distribuição de renda - todas elas perpassadas pelo fio condutor da ética, como eixo de um pensamento que alia o rigor científico a um humanismo veemente. Como diz Celso Furtado, "a leitura destes ensaios de Ignacy Sachs, grande e lúcido conhecedor da proble- mática do desenvolvimento e, mais especificamente, dos impasses que enfrenta o Brasil no momento atual, nos encoraja a trazer essas questões para primeiro plano." Esta obra é publicada em co-edição pela editora Garamond e o Sebrae, no contexto do Projeto Parcerias com Editoras, com o qual o Sebrae busca incentivar o setor editorial brasileiro - constituído majoritariamente por peque- nas e micro empresas - e simultaneamente direcionar suas publicações, em geral de conteúdo técnico, para todo o segmento dos pequenos negócios. O Projeto também visa a estimular o aparecimento de novos autores, especialistas em assuntos de interesse dos empreendedores e das micro e pequenas empresas, confirmando assim a vocação do Sebrae e seu compromisso com um projeto de desenvolvimento para o Brasil que seja includente, sustentável e sustentado. Ignacy Sachs Desenvolvimento ineludente, sustentável, sustentado G a r a m o n d Copyright © 2004, Ignacy Sachs Direi tos cedidos para esta edição à Editora Garamond Ltda. Caixa Postal: 16 .230 Cep: 2 2 . 2 2 2 - 9 7 0 Rio de Janei ro - Brasil Telefax: (21) 2 5 0 4 - 9 2 1 1 e-mail : ed i to ra@garamond .com.br Revisão Cláudia R u b i m Editoração Eletrônica Luiz Oliveira Capa Estúdio G a r a m o n d sobre "Quadrados com círculos concêntricos", óleo sobre tela de Wladimir Kandinsky CIP-BRASIL. CATALOGAÇÂO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. S126d Sachs, Ignacy, 1927- Desenvolvimento : ineludente, sustentável, sustentado / Ignacy Sachs. - Rio de Janeiro : Garamond, 2008 14x2; 1152p. ISBN 85-7617-04-X 1. Desenvolvimento econômico - América Latina. 2. Desen- volvimento social - América Latina. 3. Desenvolvimento sus- tentável - América Latina. 4. Brasil - Política e governo. 5. Desenvolvimento econômico - Brasil. I. Título. 0 4 - 2 5 6 0 . C D D 338.98 C D U 330.34 Todos os direitos reservados. A reprodução não-autorizada desta publicação, por qualquer meio, seja total ou parcial, constitui violação da Lei n° 9.610/98. Sumário PREFÁCIO - Celso Furtado 7 Desenvolvimento e ética - para onde ir na América Latina? 9 Desenvolvimento includente e trabalho decente para todos 25 Da armadilha da pobreza ao desenvolvimento includente em países menos desenvolvidos 69 Inclusão social pelo trabalho decente: oportunidades, obstáculos, políticas públicas 111 P R E F Á C I O A difícil leitura da realidade Celso Furtado Em um futuro que, imagino, não será muito remoto, parecerá simples devaneio de intelectual ocioso a referência ao que está ocor- rendo na América Latina, neste final de era marcado pelo funda- mentalismo mercantil. Ninguém, em sã consciência, acreditará que um país rico como a Argentina, dotado de uma classe política tão sofisticada, haja sido conduzido, em 2003, a uma situação de tama- nha ingovernabilidade e de liquidação de seus ativos. E também causará espanto o que está ocorrendo em outros países do continente. Com efeito, como explicar que uma economia com a vitalidade da brasileira, que, nos primeiros três quartos do século XX, beneficiou-se de um ritmo de crescimento superado apenas pelo do Japão, tenha se conformado com uma taxa de decrescimento (cresci- mento negativo, para usar o eufemismo da moda) no correr deste último decênio? Trata-se de satisfazer a exigências dos que arbitram as taxas de juros escorchantes que estão absorvendo mais que a tota- lidade da poupança nacional, conforme nos explicam consultores credenciados. E não se admite que as vítimas do sobre-endividamento apelem para métodos clássicos de autodefesa. Estas são questões que a coletividade tem não somente o direito, mas o dever de formular. A leitura destes ensaios de Ignacy Sachs, 7 grande e lúcido conhecedor da problemática do desenvolvimento e, mais especificamente, dos impasses que enfrenta o Brasil no mo- mento atual, nos encoraja a trazê-las para o primeiro plano. A leitura deste livro muito nos ajudará a evitar a reprodução da fábula platô- nica, em que os prisioneiros confundiram a realidade com as ima- gens projetadas na caverna. Rio de Janeiro, junho de 2004 8 Desenvolvimento e ética - para onde ir na América Latina? Estratégias de desenvolvimento nacional na era da globalização1 "Você poderia me dizer, por favor, por qual caminho devo seguir agora?", perguntou ela. "Isso depende muito de aonde você quer ir", respondeu o gato. Lewis Carroll, Alice'sAdventures in Wonderland. A - Algumas lições da tragédia desenvolvimentista da Argentina De acordo com Marshall Berman, a segunda parte de Fausto, de Goethe, configura uma tragédia desenvolvimentista. Na Argentina de hoje, somos espectadores de uma tragédia desenvolvimentista da vida real, e não de uma tragédia literária. Alguns chegam a atribuir ao FMI o papel de Mefístófeles. Uma avaliação mais realista é a de que o FMI não conspirou para desenca- 1 Paper apresentado no Encontro do BID sobre Ética e Desenvolvimento (Buenos Aires, 5 e 6 de setembro de 2002). Versão final de 6 de novembro de 2002. Traduzido do original em inglês, intitulado Development and Ethics. Whither Latin America? National Development Strategies in the Globalization Age, por José Augusto Drummond e Glória Maria Vargas. 9 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO dear o desastre. Ele apenas recomendou (ou aplicou, diria alguém) uma receita terrivelmente equivocada de políticas, inspirada por uma visão idealizada de uma globalização simétrica e mutuamente benéfica e pelo fundamentalismo de mercado - "má economia e má política", para empregar as palavras de Joe Stiglitz (Stiglitz, 2002a e 2002b). 1- A primeira lição da crise desenvolvimentista da Argentina si- naliza a falácia do pretenso fim da história e da ideologia. Tanto a teoria, com base no estudo histórico comparativo de experiências nacionais, quanto a ideologia, baseada em compromissos éticos, continuam a ser importantes. Devemos repensar a teoria do desen- volvimento e as políticas receitadas que derivam dela à luz do que aconteceu na Argentina - o casomais extremo de "pobreza na abun- dância" (Keynes, 2000) e de "desdesenvolvimento" (ou de involução, para usar um termo de Clifford Geertz) em circunstân- cias não bélicas, uma tragédia que resultou de uma mistura letal de dependência excessiva de recursos externos, de confiança cega no Consenso de Washington e de má governança. O colapso da Argentina significa o f im do Consenso de Washington e da versão neoliberal do fundamentalismo de merca- do, tanto quanto o colapso do "socialismo real", na Europa Oriental, significou o fim do estatismo e da economia de comando. Estes dois paradigmas extremos e diametralmente opostos, agora descar- tados, delimitam o campo de arranjos institucionais intermediários, as economias mistas (Kalecki, 1993; Rodrik, 2000; Sachs, 1998; 1999; 2000; Tsuru, 1994; Wade, 1990) ao qual pertence o futuro. Os mercados são uma instituição entre muitas; a governança democrática oferece o único esquema adequado à sua regulação (Sen, 2000). Como diz Pradab Bardhan, "cada mecanismo de coor- denação da sociedade - o Estado, o mercado, a comunidade - tem as suas próprias falhas, mas cada um tem algumas vantagens úni- cas que podemos tentar combinar a fim de coordenar a correção das falhas" (Bardhan, 2001). 1 0 IGNACY SACHS 2- Para que isso ocorra, é preciso haver um Estado enxuto, lim- po, ativo, planejador e capaz de descortinar o futuro. Como José Serra nos lembrou recentemente, a cidadania global continua a ser, por enquanto, uma utopia. O Estado nacional tem três funções prin- cipais: a-A articulação de espaços de desenvolvimento, desde o nível local (que deve ser ampliado e fortalecido) ao transnacional (que deve ser objeto de uma política cautelosa de integração seletiva, su- bordinada a uma estratégia de desenvolvimento endógeno); b-A promoção de parcerias entre todos os atores interessados, em torno de um acordo negociado de desenvolvimento sustentável; c-A harmonização de metas sociais, ambientais e econômicas, por meio do planejamento estratégico e do gerenciamento cotidia- no da economia e da sociedade, buscando um equilíbrio entre diferentes sustentabilidades (social, cultural, ecológica, ambiental, territorial, econômica e política) e as cinco eficiên- cias (de alocação, de inovação, a keynesiana, a social e a ecoeficiência). 3- Em muitos países, como a Argentina, a sustentabilidade social é ainda mais frágil e sujeita à disrapção do que a sustentabilidade ambiental. Disto resulta a necessidade de construir a estratégia endógena de desenvolvimento com base na questão central do trabalho decente para todos (OIT 2001, 2002a e 2002b), por meio do emprego ou do auto-emprego na produção de meios de subsistência. Sem negar a importância da promoção de exportações, é preciso lembrar que nove entre cada dez pessoas em todo o mundo trabalham para o mercado interno (Ferrer, 2002). Portanto, as potencialidades do mercado in- terno devem ser aproveitadas como o primeiro passo para revigorar as economias em crise. Há três motivos para isso. a-A falta de oportunidades adequadas para que os países periféricos ampliem as suas exportações na atual ordem internacional 6 1 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO (CEPAL 2002; Oxfam 2002; Ricupero, 2002; UNCTAD 2002); "desenvolvimento a partir de dentro" (Sunkel, 1992) continua a ser a única opção viável para a Argentina e para toda a América Latina (ver também Ferrer, 2002); b-O mercado interno pode ser ampliado por meio da promoção da agenda inacabada de transformação rural (reformas agrárias) e do combate à heterogeneidade extrema das economias periféricas, agenda esta que consta nos escritos de Aníbal Pinto. Essas eco- nomias podem ser descritas como um arquipélago de empreendi- mentos altamente produtivos situados num oceano de atividades de baixa produtividade - o tecido conjuntivo do sistema econômi- co. Uma grande parte do PIB é produzida nesse arquipélago e as pessoas dão braçadas para sobreviver no oceano em volta. Resul- tados rápidos podem ser obtidos por uma estratégia centrada nas pessoas e no emprego, com a finalidade dupla de aumentar o nú- mero dos empregos de baixa produtividade e simultaneamente melhorar a produtividade destes empregos. Como o seu conteúdo de importações tende a ser muito baixo, a sua promoção não exige moeda estrangeira, nem financiamento externo. O limite para o crescimento induzido pelo emprego, que não seja inflacionário e que exija poucas importações, é dado pela elasticidade da oferta de bens de salário produzidos internamente (Kalecki, op.cit.); c-Um mercado interno em expansão fortalece a competitividade sistêmica da economia nacional. 4- Desde que cada crise constitui uma oportunidade, a Argentina, tão bem dotada de recursos humanos e naturais, tem o potencial necessário para dar início hic et nunc a uma operação de ajuste infor- mada pelo conceito de desenvolvimento sustentável, baseada nos cinco pilares da endogeneidade (oposta ao crescimento mimético): autoconfiança (oposta à dependência), orientação por necessidades (em oposição à orientação pelo mercado), harmonia com a natureza e abertura à mudança institucional (What now?, 1975). 1 2 IGNACY SACHS Daí a importância dos notáveis estudos, diagnósticos e propos- tas formulados pelos acadêmicos que preparam o Plan Fénix (ver em particular os números especiais de Enoikos, 2001, e de Encrucijadas UBA, 2001). B - De Aristóteles ao desenvolvimento sustentável 1- Nos seus textos Ethics and Economics, Amartya Sen (1990) nos lembrou que a economia e a ética estavam interligadas, desde Aristóteles, por duas questões centrais de fundo: • o problema da motivação humana (como deveríamos viver?); • a avaliação das conquistas sociais. No entanto, a outra origem da economia - as questões logísticas, que Sen chama de "abordagem de engenharia" - se tornou prepon- derante, hoje, a ponto de fazer a ética ser praticamente esquecida. Daí vem a insistência de Sen na reaproximação entre a economia e a ética, sem esquecer da política. O desenvolvimento, distinto do crescimento econômico, cum- pre esse requisito, na medida em que os objetivos do desenvolvi- mento vão bem além da mera multiplicação da riqueza material. O crescimento é uma condição necessária, mas de forma alguma suficiente (muito menos é um objetivo em si mesmo), para se alcançar a meta de uma vida melhor, mais feliz e mais completa para todos. No contexto histórico em que surgiu, a idéia de desenvolvimento implica a expiação e a reparação de desigualdades passadas, criando uma conexão capaz de preencher o abismo civilizatório entre as antigas nações metropolitanas e a sua antiga periferia colonial, entre as minorias ricas modernizadas e a maioria ainda atrasada e exausta dos trabalhadores pobres. O desenvolvimento traz consigo a pro- messa de tudo - a modernidade inclusiva propiciada pela mudança estrutural. 6 3 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO 2- Outra maneira de encarar o desenvolvimento consiste em reconceituá-lo em termos da apropriação efetiva das três gerações de direitos humanos: • direitos políticos, civis e cívicos; • direitos econômicos, sociais e culturais, entre eles o direito ao trabalho digno, criticamente importante, por motivos intrínse- cos e instrumentais; • direitos coletivos ao meio ambiente e ao desenvolvimento (Sen, 1999; Sengupta, 2001 e 2002). Igualdade, eqüidade e solidariedade estão, por assim dizer, em- butidas no conceito de desenvolvimento, com conseqüências de longo alcance para que o pensamento econômico sobre o desenvol- vimento se diferencie do economicismo redutor. Em vez de maximizar o crescimento do PIB, o objetivo maior se torna promover a igualdade e maximizar a vantagem daqueles que vivem nas piores condições,de forma a reduzir a pobreza, fenôme- no vergonhoso, porquanto desnecessário, no nosso mundo de abun- dância. a-O crescimento, mesmo que acelerado, não é sinônimo de desen- volvimento se ele não amplia o emprego, se não reduz a pobreza e se não atenua as desigualdades, conforme enfatizado, desde os anos 1960, por M. Kalecki e Dudley Seers. De acordo com o mesmo raciocínio, não é suficiente promover a eficiência alocativa. O desenvolvimento exige, conforme mencionado, um equilíbrio de sintonia fina entre cinco diferentes dimensões. Ele também exige que se evite a armadilha da competitividade espú- ria e, em última instância, autodestrutiva, com base na deprecia- ção da força de trabalho e dos recursos naturais. b-A eqüidade, traduzida em termos operacionais, significa o trata- mento desigual dispensado aos desiguais, de forma que as re- gras do jogo favoreçam os participantes mais fracos e incluam 1 4 IGNACY SACHS ações afirmativas que os apoiem. Este princípio se aplica tanto à ordem econômica internacional (conforme colocado por Myrdal, em 1956) quanto às economias nacionais. O recente relatório SEBRAE-PNUD sobre o futuro dos pequenos produtores no Brasil (Sachs, 2002) desenvolve detalhadamente esse ponto. 3- O conceito de desenvolvimento sustentável acrescenta uma outra dimensão - a sustentabilidade ambiental - à dimensão da sustentabilidade social. Ela é baseada no duplo imperativo ético de solidariedade sincrônica com a geração atual e de solidariedade diacrônica com as gerações futuras. Ela nos compele a trabalhar com escalas múltiplas de tempo e espaço, o que desarruma a caixa de ferra- mentas do economista convencional. Ela nos impele ainda a bus- car soluções triplamente vencedoras, eliminando o crescimento selvagem obtido ao custo de elevadas externalidades negativas, tanto sociais quanto ambientais. Outras estratégias, de curto pra- zo, levam ao crescimento ambientalmente destrutivo, mas social- mente benéfico, ou ao crescimento ambientalmente benéfico, mas socialmente destrutivo. Os cinco pilares do desenvolvimento sus- tentável são: a-Social, fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instru- mentais, por causa da perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares problemáticos do nosso planeta; b-Ambiental, com as suas duas dimensões (os sistemas de susten- tação da vida como provedores de recursos e como "recipien- tes" para a disposição de resíduos); c-Territorial, relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das atividades; d-Econômico, sendo a viabilidade econômica a condido sine qua non para que as coisas aconteçam; 6 5 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO e-Político, a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário para fazer as coisas acontecerem; a li- berdade faz toda a diferença.2 4- Para se progredir simultaneamente nessas cinco dimensões, muita coisa tem que ocorrer, de fato. A reunião de Joanesburgo foi uma oportunidade perdida para deslanchar uma transição planetária para o desenvolvimento sustentável, cujo conteúdo seria: a-Estratégias nacionais diferenciadas, mas complementares, no Norte (mudando os padrões de consumo e os estilos de vida, reduzin- do a dependência quanto a combustíveis de origem fóssil e dimi- nuindo o tamanho da "pegada" da minoria rica); b-No Sul, estratégias de desenvolvimento endógenas e inclusivas (em vez do transplante de modelos do Norte), propiciando um salto para uma civilização moderna, sustentável, com base na biomassa, especialmente adequada aos países tropicais; c-Um acordo Norte/Sul a respeito do desenvolvimento sustentável, aumentando substancialmente o fluxo real de recursos do Norte para o Sul (por meio da ajuda e, mais ainda, do comércio justo), estimulando simultaneamente as economias em crise do Norte; d-Um sistema internacional de impostos (sobre energia, pedágios para o uso de oceanos e espaços aéreos, e algum tipo de taxação sobre transações financeiras); e-Gerenciamento das áreas globais de uso comum. Gallopin (2001) está certo quando afirma que a transição para um mundo sustentável exige um progresso simultâneo em todas essas frentes. As perspectivas imediatas são sombrias. Enquanto prosseguem na batalha política na frente global, os países latino- 2 Amartya Sen, em artigo recente, afirma o seguinte: "Não é nem um pouco óbvio por que o fortalecimento das liberdades democráticas não deva fazer parte das demandas centrais do desenvolvimento sustentável." {International Herald Tribune, 16 de agosto de 2002). 1 6 IGNACY SACHS americanos, inclusive a Argentina, poderiam também usar o marco conceituai do desenvolvimento sustentável para desenhar as suas estratégias nacionais. C - Como chegamos lá? 1- Seria um erro isolar as urgências de curto prazo ligadas ao gerenciamento de crises da reflexão sobre a estratégia de médio e longo prazos. Ambas devem ser informadas pela mesma visão de desenvolvimento sustentável que, de um lado, oferece os cri- térios de avaliação para as políticas propostas e, de outro, median te um amplo debate societal, se desdobra gradualmente num pro- jeto nacional (de acordo com Jean-Paul Sartre, o homem é um projeto; afortiori, uma sociedade humana também deve ser um projeto). 2- A transição para o desenvolvimento sustentável começa com o gerenciamento de crises, que requer uma mudança imediata de paradigma, passando-se do crescimento financiado pelo influxo de recursos externos e pela acumulação de dívida externa para o do crescimento baseado na mobilização de recursos internos, pondo as pessoas para trabalhar em atividades com baixo conteúdo de importações e para aprender a "vivir con lo nuestro". Conforme mencionado, o único limite para o crescimento não inflacionário e induzido pelo emprego é dado pela disponibilidade de bens de salário. Como não é necessário ter moeda estrangeira para o financiamento de obras públicas, outras atividades poderiam ser financiadas por um Imposto de Valor Adicionado altamente pro- gressivo. Portanto, as condições necessárias para se levar à frente o cres- cimento induzido pelo emprego são: a-capacidade local de planejamento, entendido como a capacidade de identificação de gargalos e de recursos ociosos capazes de superá-los; 6 7 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO b-estímulo à capacidade de mobilizar recursos e iniciativas locais; c-reabilitação do sistema financeiro nacional, para dotá-lo de um mínimo de capacidade de atender às necessidades das empresas e do financiamento de obras públicas, sem excluir o recurso (em casos excepcionais) à quase-moeda e à promoção do escambo; d-uma reforma fiscal que criasse um Imposto de Valor Adicionado progressivo sobre o consumo: haveria isenção para os bens es- senciais, mas ele teria forte incidência sobre artigos de luxo, conforme sugerido por Kalecki, no seu texto sobre a índia (op. cit.); os salários baixos seriam subsidiados com este imposto (Bardhan, op. cit.); Cabe traçar aqui uma analogia com as políticas adotadas por alguns países da Europa e da Ásia, na primeira fase da reconstrução posterior à Segunda Guerra Mundial. Operações de auto-salvação eram a única opção para dar início à recuperação. A reconstrução e a industrialização posteriores à guerra começaram exatamente des- sa maneira, por meio do crescimento extensivo, com base na gera- ção de quantidades maciças de empregos de baixa produtividade.3 3- Paralelamente, o esforço deve começar em todos os níveis - do local ao nacional tendo em vista a montagem de uma agenda de médio prazo de criação de empregos. A emergência de conse- lhos quatripartites de desenvolvimento facilitaria muito essa tarefa, montando o cenário parao processo de negociação entre todos os atores envolvidos - autoridades públicas, trabalhadores, emprega- dores e o Terceiro Setor (sociedade civil organizada). O objetivo supremo é o emprego decente e/ou auto-emprego para todos - trata-se da melhor forma de assegurar simultanea- mente a sustentabilidade social e o crescimento econômico. Em 3 A transição para o crescimento intensivo, mais tarde, gerou problemas difí- ceis, que não precisam ser abordados aqui. 1 8 IGNACY SACHS outras palavras, a ênfase deve ser colocada na mudança da distri- buição primária de renda, em vez de se persistir com o padrão excludente de crescimento, a ser corrigido ex post por meio de políticas sociais compensatórias financiadas com a redistribuição de uma parcela do PIB. Tal abordagem exige a combinação de várias políticas comple- mentares: a-Explorar todas as oportunidades de crescimento induzido pelo emprego e com conteúdo zero ou baixo de importações, parti- cularmente: • obras públicas; • construção civil, especialmente programas voluntários de cons- trução de casas populares com apoio governamental (casas populares construídas pelo povo); • serviços sociais (países que pagam salários baixos têm uma vantagem comparativa absoluta na produção deste tipo de ser- viços); • empregos ligados à conservação de energia e de recursos e à reciclagem de materiais (em outras palavras, ao aumento da produtividade dos recursos), à melhor manutenção do estoque existente de infra-estrutura, equipamentos e prédios, de forma a ampliar o seu ciclo de vida e, dessa forma, poupar o capital necessário à sua reprodução (nos termos de Kalecki, estas são as fontes de crescimento que não exigem investimento). b-Desenhar políticas para consolidar e modernizar a agricultura fa- miliar como parte de uma estratégia para estimular o desenvolvi- mento rural com base na pluriatividade da população rural, dan- do um salto na direção de uma civilização moderna baseada na biomassa (biodiversidade-biomassa-biotecnologias); c-Promover ações afirmativas para melhorar a condição de traba- lhadores por conta própria e microempresas, para ajudá-los a 6 9 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO sair da informalidade, e apoiar diversas formas de atividade em- presarial compartilhada, com a finalidade de aumentar o poder de barganha e a competitividade dos pequenos produtores (pas- sando da competitividade espúria para a autêntica); criar uma entidade pública - mas não estatal - que atue como um planejador comprometido com os interesses dos pequenos produtores (o SEBRAE é um bom exemplo); d-Estabelecer conexões mutuamente benéficas entre grandes e pe- quenas empresas (condições jus tas de subcont ra tação , terceirização, integração de franquias de agronegócios); e-Usar as compras governamentais para promover as micro e pe- quenas empresas. "The Small Business Authority" (Agência para as Pequenas Empresas), dos EUA, criou um complexo sistema de preferências para as micro e pequenas empresas; f-Fortalecer as empresas industriais de grande porte e transformá- las em atores competitivos em escala global. Obviamente, é pre- ciso uma estratégia dupla; isto nos traz de volta à importância crucial do sistema financeiro nacional, da sua capacidade de in- vestir e de algum tipo de controle sobre o fluxo de moeda es- trangeira que entra e sai. 4- A insistência nessa modalidade de recuperação a partir das próprias forças e nas estratégias nacionais para o desenvolvimento sustentável endógeno não deve ser entendida como uma justificati- va para negligenciar a questão primordial da inserção na economia global. Ela tem as suas raízes numa crença dupla: • na configuração atual da economia mundial e do equilíbrio de poder, os países periféricos não podem agir de forma dife- rente; • quanto mais esses países tiverem sucesso na sua estratégia endógena, mais forte será o seu poder de barganha para alcan- çar a inclusão na economia global em termos mais favoráveis 1 0 IGNACY SACHS e para renegociar a sua dívida externa em circunstâncias que avaliem de maneira realista a sua capacidade de gerar exce- dentes de moeda estrangeira. Enquanto suportam os impactos negativos da globalização na sua forma assimétrica atual, os países periféricos deveriam mobili- zar as suas capacidades intelectuais e políticas para organizar em todos os foros internacionais, antes de mais nada na ONU, uma intensa campanha a favor da reforma necessária da ordem econô- mica internacional. A sessão especial da Assembléia Geral da ONU, em 1975, foi um fracasso. As propostas formuladas, naquela oca- sião, não são mais aplicáveis. No entanto, a agenda de 1975 conti- nua a ser bem pertinente. Propostas para a reforma das instituições nascidas em Bretton Woods e a adoção do comércio justo provavelmente não nascerão por iniciativa dos países do G-8, satisfeitos com o status quo. Ao contrário, virão do diálogo entre países periféricos e das suas dis- cussões com os setores progressistas da sociedade civil dos países centrais. O processo provavelmente será longo e difícil. No entan- to, podemos abrandar o nosso pessimismo ao pensarmos no pro- cesso de formação da UNCTAD, há 10 anos, graças à visão e à energia de Raul Prebisch e dos seus colaboradores. Referências BARDHAN, Pranab (2001): "Social Justice in the Global Economy". In: Economic and Political Weekly, February 3-10, p. 467-479. CEPAL(2002): "Desarrollo y globalízación", Santiago de Chile. ENCRUCIJADAS UBA - Revista de la Universidad de Buenos Aires (2001), Hacia el Plan Fénix. 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As discussões em torno deste tema contribuíram para o refina- mento do conceito, porém contrastam com o sombrio histórico do desenvolvimento existente em muitas partes do mundo. Daí a ne- cessidade de se revisitar a idéia de desenvolvimento, com vistas a torná-lo mais operacional, enquanto se reafirma, mais do que nun- 1 Artigo preparado para a Comissão Mundial sobre a Dimensão Social da Globalização, OIT, Outubro 2002. Traduzido do original Inclusive Development and Decent Work for Ali, por José Augusto Drummond e Gló- ria Maria Vargas. DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO ca, a sua centralidade, já que esta idéia está sendo contestada de dois ângulos distintos. Os autodenominados pós-modernos propõem renunciar ao con- ceito, alegando que o desenvolvimento tem funcionado como uma armadilha ideológica construída para perpetuar as relações assimétricas entre as minorias dominadoras e as maiorias domina- das, dentro de cada país e entre os países. Propõem avançar para um estágio de pós-desenvolvimento, sem explicar claramente o seu conteúdo operacional concreto. Estão certos, por suposto, quando questionam a possibilidade de crescimento indefinido do produto material, dado o caráter finito do nosso planeta. Porém, esta verdade óbvia não diz muito sobre o quê deveríamos fazer nas próximas décadas para superar os dois principais problemas herdados do século XX, apesar do seu progresso científico e téc- nico sem precedentes: o desemprego em massa e as desigualda- des crescentes. Quanto aos fundamentalistas de mercado, eles implicitamente consideram o desenvolvimento como um conceito redundante. O desenvolvimento virá como resultado natural do crescimento eco- nômico, graças ao "efeito cascata" (trickle down effect). Não há necessidade de uma teoria do desenvolvimento. Basta aplicar a economia moderna, uma disciplina a-histórica e universalmente válida. A teoria do "efeito cascata" seria totalmente inaceitável em ter- mos éticos, mesmo se funcionasse, o que não é o caso. Num mun- do de desigualdades abismais, é um absurdo pretender que os ricos devam ficar mais ricos ainda, para que os destituídos possam ser um pouco menos destituídos. Para enfrentar estes dois problemas, precisa-se urgentemente de uma reaproximação da ética, da economia e da política (A. K. Sen, 1987). Como escreveu Gandhi, "As economias que ignoram consi- derações morais e sentimentais são como bonecos de cera que, mes- 2 6 IGNACY SACHS mo tendo aparência de vida, ainda carecem de vida real" (M. K. Gandhi, Young índia, 27/10/1921). Na medida em que as desigualdades morais2 resultam da organi- zação social, elas só podem ser superadas mediante atos de voluntarismo responsável - políticas públicas que promovam a ne- cessária transformação institucional e ações afirmativas em favor dos segmentos mais fracos e silenciosos da nação, a maioria traba- lhadora desprovida de oportunidades de trabalho e meios de vida decentes, e condenada a desperdiçar a vida na luta diária pela sobre- vivência. Como observou Ricupero (2002, p. 64), as economias não se desenvolvem simplesmente porque existem. O desenvolvimento econômico tem sido uma exceção histórica e não a regra. Não acontece espontaneamente como conseqüência do jogo livre das forças de mercado. Os mercados são apenas uma das muitas ins- tituições que participam do processo de desenvolvimento. Sendo míopes por natureza, socialmente insensíveis e, segundo G. So- ros (2002), amorais, a sua regulação - melhor seria dizer a sua re- regulação - é urgente, tendo em vista o resultado negativo da apli- cação das prescrições neoliberais, resumidas pelo Consenso de Washington. De certa forma, o Consenso de Washington atuou como uma contra-reforma direcionada contra o capitalismo reformado, que atingiu a sua maturidade após a Segunda Guerra Mundial, inspirado 2 Para uma distinção entre desigualdades naturais, ver Jean-Jacques Rousseau: "Je conçois dans 1'espèce humaine deux sortes d'inégalités; l'une que j'appelle naturelle, et qui consiste dans la différence des âges, de la santé, des forces du corps, et de ses qualités de 1'esprit, ou de 1'âme, 1'autre q u o n peut appeler inégalité morale, ou politique, parce qu'elle dépend d'une sorte de convention, et quelle est établie, ou du moins autorisée par le consentement des hommes. Celle-ci consiste dans les différents privilèges, dont quelques uns jouissent, au préjudice des autres, comme d'être plus riches, plus honores, plus puissants queux, ou même de s'en faire obéir" (p. 77). 27 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO nos escritos de Keynes e Beverídge e nas experiências do New- Deal americano. O capitalismo reformado foi, assim, construído com o propósito de exorcizar as terríveis lembranças da Grande Depressão, com base nos conceitos de pleno emprego, Estado de Bem-Estar e planejamento. Ele proporcionou também uma alterna- tiva ao "socialismo real" do bloco soviético, que, naquela época, tinha credibilidade entre segmentos importantes da opinião pública, devido ao seu sucesso em mobilizar toda a força de trabalho dispo- nível para o crescimento econômico extensivoe rápido e para a industrialização.3 Os trinta anos dourados do capitalismo4 (1945-1975) coincidi- ram com a Guerra Fria entre os dois velhos blocos e com a corrida armamentista. Esta situação frustrou os esforços das Nações Uni- das de construir uma ordem internacional mais eqúitativa, porém, ao mesmo tempo, criou condições favoráveis para que os países em desenvolvimento se envolvessem em políticas de não-alinha- mento e tirassem proveito das melhores experiências dos dois blo- cos competidores.5 A situação mudou radicalmente durante os anos 70. A invasão da Checoslovaquia, em 1968, apagou as últimas ilusões quanto à capacidade do bloco soviético de construir uma versão do "socia- lismo com rosto humano". Os capitalistas perderam assim parte do seu medo e ficaram mais arrogantes. A crise de energia e suas con- seqüências foram usadas para desacreditar o keynesianismo e logo 3 Conforme colocado por Jean Ziegler (2002, p. 33), os partidos social- democratas ocidentais e os seus sindicatos transformaram em vantagens sociais para seus clientes o medo capitalista da expansão do comunismo (Les nouveaux mêtres du monde et ceux qui leur résistent, Fayard, Paris, 2002, p. 33). 4 "Les trente années glorieuses", segundo Jean Fourastier. 5 Este foi certamente o caso da índia durante o governo de Nehru, a tentativa mais importante de definição de uma terceira via. 1 8 IGNACY SACHS depois a contra-reforma neoliberal ganhou força, com as eleições de Margaret Thatcher e Ronald Reagan. A queda do muro de Berlim marcou o fim do socialismo real como paradigma de desenvolvimento e abriu o cenário para o evan- gelho neoliberal, que dominou a cena até o final dos anos 90. Po- rém, o paradigma neoliberal não cumpriu as suas promessas. A tragédia do desenvolvimento da Argentina6 pode ser considerada como o fim do Consenso de Washington, se não como um conceito ideológico - as ideologias alienadoras custam a morrer - pelo me- nos como programa pragmático. Não precisamos aqui entrar na polêmica sobre o papel do FMI (ver, em particular, J. Stiglitz, 2002). Reparemos simplesmente que os únicos países em desenvolvimento que se deram razoavelmente bem, na década passada, foram precisamente aqueles que se recu- saram a aplicar à la lettre as prescrições contidas no Consenso de Washington. Assim, estamos sentados em cima das ruínas de dois paradigmas. Chegou o momento de colocar o evangelho neoliberal entre parên- teses, como um interlúdio7 infeliz, e de revisitar a breve história da idéia do desenvolvimento, rica em apreciações e recomendações muito pertinentes para a nossa discussão. 6 Marshall Berman analisou a segunda parte de Faustus, de Goethe, como a primeira tragédia do desenvolvimento. Por analogia, podemos falar da tragédia de desenvolvimento argentino, desta vez verdadeira, e não produ- to da ficção literária. 7 Usa-se esta palavra em analogia com a observação de Gunnar Myrdal de que o capitalismo de livre mercado foi apenas um interlúdio entre dois perío- dos marcados pelo intervencionismo do Estado: o mercantilismo e, de- pois, o capitalismo reformado. 2 9 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO Desenvolvimento: um conceito fugidio e em evolução Está por ser escrita uma história abrangente da idéia de desenvol- vimento.8 Limitar-me-ei neste espaço a umas poucas observações, enfatizando alguns pontos relevantes para a presente discussão. 1. Recordemos que a reflexão sobre o desenvolvimento, tal como se conhece hoje, começou nos anos 40, no contexto da preparação dos anteprojetos para a reconstrução da periferia devastada da Eu- ropa no pós-guerra. Refugiados antifascistas húngaros, poloneses e alemães, residentes na Grã-Bretanha, foram mobilizados para esta tarefa, na suposição de que o Leste Europeu não cairia sob a influência soviética - a Conferência de Yalta não tinha acontecido ainda. Os problemas que estes países enfrentavam eram similares aos de outras periferias: estrutura fundiária anacrônica, agricultura cam- ponesa atrasada, condições adversas de comérc io para as commodities primárias, industrialização incipiente, desemprego e subemprego crônicos, e necessidade de um Estado desenvolvi- mentista ativo para enfrentar o desafio de estabelecer regimes de- mocráticos capazes simultaneamente de conduzir a reconstrução do pós-guerra e de superar o atraso social e econômico. Em grande medida, o trabalho da primeira geração de economistas do desen- volvimento foi inspirado na cultura econômica dominante da época, que pregava a prioridade do pleno emprego, a importância do Esta- 8 Um primeiro volume poderia tratar das discussões precursoras dos séculos XIX e XX sobre desenvolvimento avant la lettre, na Rússia, Índia, Japão, China e América Latina, bem como das contribuições dos autores dos países periféricos da Europa. Um segundo volume deveria focalizar os planos de reconstrução para a Europa escritos na Grã-Bretanha, princi- palmente por refugiados de países sob ocupação nazista, muitos dos quais subseqüentemente ingressaram nas Nações Unidas como a primeira gera- ção de funcionários. Um terceiro volume seria necessário para avaliar a importante contribuição das diferentes agências das Nações Unidas e de outras agências, com ênfase especial nas comissões regionais. Um quarto e último volume concentrar-se-ia no trabalho acadêmico, enfatizando as importantes contribuições de pensadores de países em desenvolvimento. 3 0 IGNACY SACHS do de Bem-Estar, a necessidade de planejamento9 e a intervenção do Estado nos assuntos econômicos para corrigir a miopia e a insensi- bilidade social dos mercados. Passado meio século, algumas das preocupações originais des- ses p lane jadores cont inuam vál idas . Como lidar com a heterogeneidade estrutural, tanto econômica quanto social? Uma das muitas definições do subdesenvolvimento insiste na impossibilidade de se empregar toda a força de trabalho disponível mediante a ado- ção de tecnologias avançadas, por falta de capital suficiente. Daí a necessidade de se achar um equilíbrio entre as metas de moderniza- ção e industrialização, de uma parte, e, de outra, a promoção do pleno emprego e/ou o auto-emprego sem perder de vista a necessi- dade de aumentar continuamente a produtividade do trabalho, em última instância, a fonte de progresso econômico. Mesmo hoje, as economias em desenvolvimento ainda podem ser descritas como arquipélagos de empresas modernas com alta produtividade do trabalho, imersas no oceano de atividades de pro- dutividade baixa ou muito baixa, que formam o tecido intersticial do sistema econômico.10 A maior parte do PIB vem do arquipélago. A maior parte das pessoas nadam no oceano, tentando sobreviver. Os padrões de crescimento econômico devem ser avaliados neste contexto. O crescimento rápido impulsionado por empre- sas modernas não reduzirá por si só a heterogeneidade inicial. Pelo contrário, tende a concentrar a riqueza e a renda nas mãos dos poucos felizardos que controlam o arquipélago, relegando ao oceano todos aqueles que se tornam redundantes, devido à substituição do trabalho pelo capital. Os autores latino-america- 9 Von Hayek, por causa de sua desconfiança quanto ao planejamento, ficou numa situação de dissidente solitário. 10 Esta descrição difere dos dois modelos setoriais das economias formal e informal. A O I T está certa quando afirma que as atividades podem ser formais ou informais, porém não representam setores separados. 6 1 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO nos estavam certos ao denunciar este padrão de crescimento como concentrador e excludente. Daí a necessidade de se ter uma estratégia dupla, na qual também se dê atenção às oportuni- dades para o que pode ser chamado de crescimento puxado pelo emprego,11 umassunto do qual falaremos em maior detalhe mais adiante. 2. A negociação política feita pelos aliados em Yalta colocou os países do Leste Europeu na trilha do "socialismo real", relati- vamente bem-sucedido, como foi dito, em promover um cresci- mento extensivo e acelerado durante as primeiras duas décadas do pós-guerra. Toda a força de trabalho disponível foi utilizada; embora mal paga, ficou protegida contra a maldição do desem- prego e se beneficiou de um sistema razoavelmente elaborado de proteção social. As dificuldades que levaram, em última instân- cia, ao colapso do sistema, ainda estavam por vir: a incapacida- de de passar de um sistema de crescimento extensivo para um crescimento intensivo guiado pela tecnologia e pelo consumo em massa, a impossibilidade de administrar eficientemente, sob re- gimes autoritários, economias e sociedades complexas, a repres- são manu militari às tentativas de se reformar internamente o sistema. A credibilidade do socialismo real perdeu-se definitiva- mente com a invasão a Praga pelos tanques soviéticos, em 1968. As reformas de Gorbatchev vieram tarde demais. A queda do muro de Berlim marcou o fim do paradigma de desenvolvimento não capitalista, conhecido como socialismo real, e a vitória da coalizão liderada pelos Estados Unidos na guerra fria contra o bloco soviético. O fim do socialismo real foi certamente um marco importante na breve história da idéia de desenvolvimento. Alguns se apressa- u A esse respeito, ver Sachs (1999), que trata da teoria do desenvolvimento de Kalecki (Mondes en développement). 1 2 IGNACY SACHS ram em ver nele a desqualificação final do conceito de desenvolvi- mento não capitalista, chegando até a proclamar o fim da história. Tal conclusão não tem fundamento. Como conceito histórico e social, o desenvolvimento é por natureza aberto, o que o diferen- cia da noção de desenvolvimento orgânico. Outras tentativas de transcender o capitalismo podem surgir, na China ou em qualquer outro lugar, e elas não precisam ter o mesmo destino do socialis- mo real. É ainda mais absurdo descartar o planejamento como tal, por causa do fracasso do planejamento autoritário, centralizado e abrangente do tipo soviético. As suas duas principais fraquezas foram a sua base técnica inapropriada - estávamos ainda na época pré-informática - e, mais importante, a falta de feedbacks da so- ciedade, por causa da natureza não democrática do regime. A ad- ministração de economias complexas requer transparência e res- ponsabilidade, circulação de informações exatas e liberdade de dis- cussão, bem como uma mídia plural. Em contraste com o tipo de planejamento soviético, o planeja- mento moderno é essencialmente participativo e dialógico, e exige uma negociação quatripartite entre os atores envolvidos no proces- so de desenvolvimento, levando a arranjos contratuais entre as au- toridades públicas, as empresas, as organizações de trabalhadores e a sociedade civil organizada. Certamente, este tipo de planejamento tem um futuro brilhante pela frente. 3. A maior parte da reflexão sobre desenvolvimento realizado nas Nações Unidas ou induzido por esta organização tinha como base implícita o paradigma do capitalismo reformado, reconhecen- do, no entanto, uma diferença básica entre o funcionamento das economias desenvolvidas e das menos desenvolvidas. As primeiras são essencialmente limitadas pela demanda, enquanto que os países menos desenvolvidos compartilhavam com os países do socialismo real a característica de serem limitados pela oferta e, portanto, de- 6 3 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO penderem do investimento dirigido à expansão das capacidades pro- dutivas. Assim, concentraram-se diferentes modalidades e aspectos do desenvolvimento em economias periféricas, estruturalmente hete- rogêneas, com predominância de mercados capitalistas e mistas. Cada adjetivação exige uma explanação: • periféricas: opostas às economias capitalistas centrais, às quais estão vinculadas por relações assimétricas,12 analisadas por Raul Prebisch no seu célebre e ainda pertinente modelo de centro- periferia (ver, em particular, Beilschowsky, R., 2000, e Ricupero, R., 2002); • estruturalmente heterogêneas em vários sentidos: apresentam um contraste forte entre enclaves urbanos modernos e econo- mias rurais mais ou menos atrasadas, enormes disparidades sociais, culturais e de estilo de vida entre as elites ocidentalizadas e o grosso da população, padrões concentrados de distribui- ção de renda e de riqueza; • de mercado predominantemente capitalista: já que o setor ca- pitalista da economia, mesmo coexistindo com outros mode- los de produção pré-capitalistas ou protocapitalistas, é o mais dinâmico; • economias mistas, por terem diferentes configurações de seus setores privado e público e, pelo menos em alguns casos, um Estado desenvolvimentista enxuto, limpo e pró- ativo. 12 François Perroux definiu dominação como uma relação assimétrica e irreversível. 1 4 IGNACY SACHS Box 1 - Boa sociedade, meios de existência viáveis, trabalho decente. O desenvolvimento pretende habilitar cada ser humano a ma- nifestar potencialidades, talentos e imaginação, na procura da auto-realização e da felicidade, mediante empreendimentos individuais e coletivos, numa combinação de trabalho autôno- mo e heterônomo e de tempo dedicado a atividades não produ- tivas. A boa sociedade é aquela que maximiza essas oportunidades, enquanto cria, simultaneamente, um ambiente de convivência e, em última instância, condições para a produção de meios de existência (livelihoods) viáveis, suprindo as necessidades ma- teriais básicas da vida - comida, abrigo, roupas - numa varie- dade deformas e de cenários-famílias, parentela, redes, comu- nidades. A produção de meios de subsistência depende da combinação dos seguintes elementos: • Acesso a ativos requeridos para a produção de bens e servi- ços para autoconsumo, no âmbito da economia doméstica; • Acesso ao treinamento, técnicas e ativos necessários para a produção de bens e serviços orientados para o mercado mediante auto-emprego; • Disponibilidade de trabalho decente, de tempo integral ou parcial, para os membros da família que o desejam; • Acesso universal aos serviços públicos; • Acesso ã habitação autoconstruída, alugada ou adquirida mediante esquemas subsidiados de moradia popular; • Disponibilidade de tempo livre para atividades não pro- dutivas. Os aspectos qualitativos são essenciais. As formas viáveis de produção de meios de existência não podem se apoiar em esforços excessivos e extenuantes dos seus produtores, em empregos mal pagos e realizados em condições insalubres, na provisão inadequa- da de serviços públicos e em padrões subumanos de habitação. 6 5 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO Dois avanços conceituais importantes devem ser enfatizados: a- Desde os anos 70, a atenção dada à problemática ambiental levou a uma ampla reconceitualização do desenvolvimento, em termos de ecodesenvolvimento, recentemente renomeado desenvolvi- mento sustentável. O desenvolvimento sustentável obedece ao duplo imperativo éti- co da solidariedade com as gerações presentes e futuras, e exige a explicitação de critérios de sustentabilidades social e ambiental e de viabilidade econômica. Estritamente falando, apenas as soluções que considerem estes três elementos, isto é, que promovam o cresci- mento econômico com impactos positivos em termos sociais e ambientais, merecem a denominação de desenvolvimento, como se pode ver na tabela a seguir: Tabela 1: Padrões de Crescimento Econômico impactos sociais impactos ambientais 1- desenvolvimento + + 2- selvagem - - 3- socialmente benigno + - 4- ambientalmente benigno - +Durante as três décadas que separam a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente - a de 1972, realizada em Estocolmo, e a Cúpula sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em Joanesburgo, em 2002 - , o conceito de desenvolvimento sustentá- vel foi refinado, levando a importantes avanços epistemológicos. Para os propósi tos deste texto, é suf ic iente enfa t izar que a sustentabilidade social é um componente essencial deste conceito. Com relação aos critérios de sustentabilidade social, podemos re- ^ tomar a posição de Dudley Seers, para o qual o crescimento econô- / mico, mesmo quando rápido, não traz desenvolvimento, a menos que gere emprego e contribua para a redução da pobreza e das desigual- 1 6 IGNACY SACHS dades. Kalecki e Seers estiveram entre os primeiros economistas a assinalar, nos anos 60, a necessidade de se analisar o desenvolvimen- to econômico não só em termos de crescimento do PIB, mas tam- bém, e talvez em primeiro lugar, em termos do emprego. b- A segunda e talvez mais importante reconceituação foi forte- mente influenciada pelos trabalhos de A. K. Sen (1999). O desen- e* volvimento pode ser redefinido em termos da universalização e do exercício efetivo de todos os direitos humanos: políticos, civis e cívicos; econômicos, sociais e culturais; bem como direitos coleti- vos ao desenvolvimento, ao ambiente etc. Embora os direitos sejam indivisíveis, deve ser dado um status especial ao direito ao trabalho, visto o seu duplo valor, intrínseco, mas também instrumental, já que o trabalho decente abre o caminho para o exercício de vários outros direitos. 4. Podemos resumir a evolução da idéia de desenvolvimento, no último meio século, apontando para a sua complexificação, repre- sentada pela adição de sucessivos adjetivos - econômico, social, político, cultural, sustentável - e, o que é mais importante, pelas novas problemáticas. Mesmo assim, carecemos de um paradigma convincente capaz de lidar com os dois problemas aos quais já nos referimos, isto é, desemprego maciço/subemprego e desigualdade crescente. Segundo a OIT, um terço da força de trabalho está desemprega- do ou subempregado e os sucessivos relatórios do PNUD sobre o desenvolvimento humano documentam a brecha crescente entre a renda das minorias ricas e as maiorias pobres. A distribuição da riqueza é ainda mais desequilibrada. Vivemos em um mundo crescentemente fragmentado, a despeito de toda a fala sobre a globalização. E mais, as nossas economias se caracterizam por um alto grau de desperdício. De todas as formas de desperdício, a pior de todas é aquela que destrói vidas humanas por meio do déficit de oportunidades de trabalho decente. 6 7 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO Isso não quer dizer que as vítimas do desenvolvimento desigual não trabalhem. Como observou Joan Robinson, elas são pobres de- mais para poderem se dar ao luxo de não trabalhar. Ao mesmo tempo, quando desempregadas, descobrem que pior que ser explo- rado é não ser sequer explorado. De tal forma, e em sentido estrito, a maioria pobre não está totalmente excluída da esfera econômica. O sociólogo brasileiro José de Souza Martins (2002) tem razão quando fala de formas perversas, anormais e desiguais de inclusão social.13 Podemos di- zer, no entanto, que a maioria pobre está praticamente excluída do processo de desenvolvimento, entendido como a apropriação efe- tiva da totalidade de direitos humanos (ver, em particular, Kothari, 1993). Sob algumas circunstâncias, a inclusão justa se converte em requisito central para o desenvolvimento. Se o adjetivo deve colocar atenção no aspecto mais essencial do paradigma de de- senvo lv imen to , podemos fa la r então de desenvolvimento ineludente. Definindo a inclusão justa A maneira natural de definir o desenvolvimento ineludente é por oposição ao padrão de crescimento perverso, conhecido, como já se mencionou, na bibliografia latino-americana como "excludente" (do mercado de consumo) e "concentrador" (de renda e riqueza). Dois outros aspectos do crescimento excludente são: • mercados de trabalho fortemente segmentados, que mantêm uma grande parcela da maioria trabalhadora confinada a ativi- dades informais, ou condenada a extrair a sua subsistência precariamente da agricultura familiar de pequena escala, sem quase nenhum acesso à proteção social (ver Rodriguez, O., 13 Ver também a sua entrevista na Folha de São Paulo, "Mais!", 15 de setembro de 2002. 1 8 IGNACY SACHS 1998, e Revista Latinoamericana de Estúdios dei Trabajo, 1999); • fraca participação na vida política, ou completa exclusão dela, de grandes setores da população , pouco ins t ruída , suborganizada e absorvida na luta diária pela sobrevivência, sendo as mulheres, sujeitas à discriminação de gênero, as mais fortemente atingidas. O desenvolvimento includente requer, acima de tudo, a garantia do exercício dos direitos civis, cívicos e políticos. A democracia é um valor verdadeiramente fundamental (A. K. Sen) e garante tam- bém a transparência e a responsabilização (accountability) neces- sárias ao funcionamento dos processos de desenvolvimento. No entanto, existe uma grande distância entre a democracia representa- tiva e a democracia direta, que cria melhores condições para o de- bate dos assuntos de interesse público. Todos os cidadãos devem ter acesso, em igualdade de condi- ções, a programas de assistência para deficientes, para mães e fi- lhos, para idosos, voltados para a compensação das desigualdades naturais ou físicas. Políticas sociais compensatórias financiadas pela redistribuição de renda deveriam ir mais longe e incluir subsídios ao desemprego, uma tarefa praticamente impossível naqueles países onde apenas uma pequena minoria está empregada no setor organi- zado e onde o desemprego aberto é bem menos significativo que o subemprego. O conjunto da população também deveria ter iguais oportunida- des de acesso a serviços públicos, tais como educação, proteção à saúde e moradia. Seguem-se alguns comentários a este respeito. A educação é essencial para o desenvolvimento, pelo seu valor intrínseco, na medida em que contribui para o despertar cultural, a conscientização, a compreensão dos direitos humanos, aumentan- do a adaptabilidade e o sentido de autonomia, bem como a autoconfiança e a auto-estima. É claro que tem também um valor 6 9 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO instrumental com respeito à empregabilidade. Porém, a educação é condição necessária, mas não suficiente, para se ter acesso a um trabalho decente. Deve vir junto com um pacote de políticas de desenvolvimento, mesmo que alguns prefiram apresentá-la como uma panacéia. Um dos paradoxos que prevalecem hoje é o desem- prego maciço de adultos existindo lado a lado com o intolerável fenômeno do trabalho infantil. Para poder colocar todas as crianças na escola é necessário distribuir bolsas para aqueles oriundos de famílias pobres, cuja sobrevivência depende do dinheiro que levam para a casa.14 Mesmo sendo muito importante o acesso aos serviços de saúde, eles fazem parte de um objetivo mais amplo, que é o de melhorar a saúde das pessoas. Isto depende de uma alimentação adequada (se- gurança alimentar), do acesso à água limpa, da melhoria das condi- ções de moradia e de trabalho, de uma melhor educação e de medi- das preventivas, como vacinação. Existe um debate a respeito de a moradia ser ou não um serviço público. Tratá-la desta forma, nos países do antigo bloco soviético, não trouxe resultados satisfatórios. No entanto, a provisão de mo- radia decente para todos, preenchendo, desta forma, uma necessi- dade básica, é certamente um enorme desafio para o desenvolvi- mento includente. Daí a importância de políticas de moradias popu- lares e, em particular,de esquemas baseados na autoconstrução assistida, nos quais as autoridades públicas se juntam aos esforços dos futuros moradores, cujo trabalho se constitui numa forma não monetária de poupança. Todos os quatro itens se serviços públicos citados acima - programas de assistência, a educação, a saúde, e a moradia - exi- gem financiamento público, por meio da redistribuição de uma 14 O programa pioneiro "Bolsa Escola", introduzido por Cristovam Buarque, em Brasília, merece todo o destaque neste contexto. 4 0 IGNACY SACHS parcela do PIB, independentemente da forma como sejam admi- nistrados: seja diretamente pela administração pública, por insti- tuições que pertençam ao terceiro setor da sociedade civil organi- zada ou até por empresas privadas. A questão de se as primeiras três devem permanecer completamente na esfera pública, devido ao seu valor para o bem-estar social, é matéria de acaloradas dis- cussões ideológicas. Os defensores do paradigma neoliberal pro- põem, em seu lugar, soluções de mercado, no que são auxiliados pelo fato de que, em muitos países, a atuação do setor público tem sido um tanto falha.15 Os limites entre as esferas pública e privada, assim como a defi- nição dos bens públicos, são outros assuntos a serem discutidos. Mais importante ainda é fazer uma distinção entre as políticas compensatórias financiadas pela redistribuição de renda mediante o sistema fiscal e as políticas de emprego que mudam a distribui- ção de renda primária. Ambas são necessárias, porém as primei- ras são de natureza puramente social e requerem despesas contí- nuas, ano após ano, enquanto que as segundas, mediante a criação de oportunidades de trabalho decente, geram renda e proporcio- nam uma solução duradoura ao problema social. Ceteris paribus, a geração de emprego deve ser p re fe r ida às po l í t i cas assistencialistas compensatórias, se não por outra razão, porque as segundas nunca proporcionam a dignidade que provém do em- prego.16 A economia capitalista é louvada por sua inigualável eficiência na produção de bens (riquezas), porém ela também se sobressai por sua capacidade de produzir males sociais e ambientais. Para 15 A este respeito, ver o prólogo de Kannan K. P. e Pillai N. V. (2002). 16 Segundo Há-Joon Chang (2002), J. Stiglitz apóia esta opinião e considera que se exige mais ênfase para que o pleno emprego e a maior participação do emprego sejam considerados como partes essenciais de uma sociedade genuinamente democrática. 6 1 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO os ideólogos do fundamentalismo de mercado, estes males são o preço inevitável do progresso econômico. Só podem ser mitiga- dos e compensados mediante a produção de bens públicos, tais como a redução da pobreza ou a proteção do meio ambiente. Em outras palavras, o desemprego maciço, o subemprego e as desi- gualdades sociais são inerentes ao sistema capitalista, porém estes inconvenientes seriam mais do que compensados pela eficiência da economia capitalista de mercado. Este argumento se apóia, no entanto, numa definição muito estreita de eficiência. Num importante livro sobre os limites do mercado, Kuttner (1997) distingue três tipos de eficiência: a alocadora, associada ao nome de Adam Smith, a inovadora (schumpeteriana) e a keynesiana, que consiste em pleno emprego de todos os meios de produção. Em outro texto, argumentei que há outros dois tipos de eficiência: a social (que se sobrepõe à keynesiana quanto ao pleno emprego e a força de trabalho) e a ecoeficiência. Não resta dúvida de que o capitalismo é muito eficiente em termos de alocação, porém deficiente em termos das eficiências keynesiana, social e ecoeficiência, que são essenciais ao conceito de desenvolvimento ineludente, fundamentado no tra- balho decente para todos. Longe de ser um parâmetro estimado a partir de comportamentos passados, a elasticidade de emprego do crescimento deve ser tratada como uma variável no planejamento do desenvolvimento, pois é a chave de uma estratégia de desen- volvimento ineludente. Taxas mais altas de crescimento econômi- co global presumivelmente trarão maior emprego. Porém, é igual- mente importante refletir sobre como maximizar o potencial de emprego para uma dada taxa de crescimento, influenciando a com- posição do produto (output-mix) e selecionando as técnicas apro- priadas, sem perder de vista o objetivo de aumentar a produtivida- de do trabalho, no qual se apóia, em última instância, o progresso econômico. 1 2 IGNACY SACHS Produtividade maior e mais empregos - maximizando o potencial de emprego do crescimento. A lamentável situação caracterizada pelo crescimento perverso (desdesenvolvimento) dos países periféricos e pela deterioração do emprego nos países centrais se relaciona muito com a transforma- ção estrutural da economia mundial e com os três descolamentos identificados por Peter Drucker (1986): 1 .descolamento entre a economia financeira e a economia real (financiarização); 2.descolamento entre o crescimento do PIB e a demanda por commodities, basicamente como uma conseqüência do crescimen- to da parcela de serviços nos padrões de consumo; 3.descolamento entre o crescimento do PIB e o emprego, devi- do à substituição de empregos causada pelo progresso técnico. O crescimento da produtividade do trabalho deve ser bem-vin- do, já que se constitui na base do progresso econômico. Em teoria, ele deveria nos permitir avançar pelo caminho da progressiva elimi- nação do trabalho heterônomo, doloroso e alienante, liberando tem- po para atividades autônomas, produtivas e não produtivas.17 Esta é a essência da visão generosa proposta, entre outros, por Ivan Illich (1977) e por André Gorz (1988). Não há dúvida de que os países industrializados avançados devem refletir sobre o uso ótimo do progresso técnico: quanto se destina à redução do tempo de trabalho e quanto vai para a acumulação de bens adicionais? Em que ponto se deve parar a busca do crescimento ma- terial, se se considera que o objetivo último do desenvolvimento é uma civilização do ser e não do ter, e, mais ainda, que a finitude do planeta estabelece um limite para a expansão da produção material? 17 Para uma distinção entre trabalho heterônomo (dirigido por outros) e autônomo, ver Ivan Illich. O mesmo autor nos lembra da etimologia da palavra francesa "travai/": a tortura medieval chamada tripallium. 6 3 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO Essas são, sem dúvida, perguntas muito importantes para um debate prospectivo de longo prazo. Porém, elas não devem nos dis- trair quanto às urgências sociais que devem ser resolvidas com prio- ridade. Embora proponha como a meta do desenvolvimento uma civilização do ser, Joseph Lebret especifica como pré-condição ne- cessária um compartilhamento eqüitativo do ter.18 A nossa preocupação deve dirigir-se imediatamente às imensas desigualdades que existem hoje no acesso às oportunidades de tra- balho, na remuneração do trabalho, na proteção e participação so- ciais e na geração de renda e riqueza. Na ausência de condições e regras de conduta eqüitativas em todos estes quesitos, o fim do trabalho (heterônomo) não tem chance de se converter numa meta realista. Tanto mais que as pessoas ainda têm que aprender a apre- ciar como uma verdadeira medida de sua liberdade cultural o tempo liberado para atividades autônomas e a dar preferência a elas, em vez de alocar o seu tempo liberado aos prazeres do consumismo. Hic at nunc o nosso problema consiste assim em reconciliar os objetivos do progresso econômico, alimentado pelo aumento da pro- dutividade do trabalho, com o imperativo de proporcionar oportuni- dades de trabalho decente para todos. Várias observações cabem aqui. • Primeiro, a redução do conteúdo do trabalhopor unidade de um dado produto pode ser compensada pelo incremento na demanda total por este produto, estimulada pela redução do preço e pelo crescimento geral do PIB, ocasionado pelo pro- gresso técnico. • Segundo, as reduções na incorporação direta de trabalho são compatíveis com o incremento da demanda por trabalho a mon- tante da cadeia produtiva (pesquisa, desenho) e a sua jusante (;marketing, distribuição, manutenção). 18 "La civilisation de l'être dans lepartage équitable de 1'avoir". 44 IGNACY SACHS • Terceiro, o progresso técnico é instrumental para a criação de novos produtos e para o estímulo a novas necessidades. • Quarto, e mais importante, a perda de empregos em alguns setores pode ser compensada com a ampliação do emprego em outros setores, dependendo das mudanças realizadas na composição do produto e na escolha das técnicas. Estas são as duas variáveis-chaves do jogo do planejamento que visa à harmonização dos dois objetivos aparentemente contraditórios, a saber, o progresso técnico veloz e o pleno emprego. Para isto, faz-se necessária uma estratégia dupla. De uma parte, o progresso técnico rápido é uma exigência nas indústrias de bens comercializáveis que competem nos mercados mundiais. Nenhum país pode se dar o luxo de não ter firmas quali- ficadas que atuem como global players, mesmo que isto implique em enxugamento do seu pessoal. De outra parte, as mesmas pressões não se aplicam à produção de bens e serviços não comercializáveis, nem de muitos bens que pertencem à categoria de comercializáveis, mas que, na prática, não enfrentam uma competição externa nos mercados internos, pois estão protegidos pela distância, pelos altos custos de transporte ou pelas preferências dos consumidores (por exemplo, alimentos pe- recíveis). Nove de cada dez pessoas, pelo menos, estão emprega- das na produção de não comercializáveis. Portanto, as tendências negativas do emprego nas indústrias modernas deveriam ser com- pensadas por meio da ampliação da participação dos bens e serviços não comercializáveis no perfil da produção. Isto requer uma participação maior nos padrões de consumo de serviços e alimentos produzidos localmente (segurança alimen- tar local), bem como uma maior prioridade para investimentos em infra-estrutura e construção civil (especialmente vivenda social). Richard Méier (2000) se aventurou a sugerir que os países africa- nos deveriam dar o pulo do gato na direção da sociedade de servi- 6 5 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO ços, sem necessariamente ter que repetir os estágios de cresci- mento pelos quais os países industrializados passaram. O universo do crescimento puxado pelo emprego deveria ser plena- mente explorado, recorrendo-se, em todas as esferas da produção de não comercializáveis, a métodos intensivos em trabalho. Em outras palavras, precisamos investigar até onde podemos avançar por esta via antes de encontrar a barreira da oferta adequada de bens de salário (uma condição para evitar pressões inflacionárias) e/ou a da escassez de divisas. Como regra, a maior parte dos bens não comercializáveis tem um conteúdo baixo em importações. Em muitos países, a agricul- tura e as indústrias manufatureiras locais têm a possibilidade de ajustar a oferta de bens de salário até a demanda incrementada que advém dos empregos adicionais gerados pelas obras públicas. Mudando o foco para outros setores da economia, as seguintes margens de liberdade devem ser exploradas: • examinar as sinergias potenciais entre empresas modernas de grande porte e empresas de pequeno porte, trabalhando com métodos re la t ivamente in tens ivos em mão-de-obra (subcontratação da produção e terceirização dos serviços); um caso especial é a integração de pequenos produtores rurais com os agronegócios (sobre conexões entre empresas, ver UNCTAD, 2000 e 2001); • avaliar as possibilidades de expansão da produção de vários tipos de biomassa agrícola, florestal e aquática para usos diversificados, como alimento, rações para animais, ener- gia, fertilizantes, materiais de construção, matéria-prima in- dustrial, fármacos e cosméticos. Diversos países em de- senvolvimento terão um futuro brilhante se conseguirem explorar competentemente a sua biodiversidade, mediante o uso de biotecnologias, tanto para aumentar a produção de biomassa quanto para aumentar o espectro de produtos de- rivados dela. Desta forma, podem se engajar, antes dos 1 6 IGNACY SACHS países industriais, num padrão relativamente intensivo e ge- nuinamente sustentável de emprego, desde que sejam res- peitadas as regras de um manejo ecologicamente viável das florestas, dos solos e dos recursos hídricos (ver Sachs, 2000b, 2001 e 2001b); • ativar, mediante métodos intensivos em emprego, fontes de crescimento independentes de investimento, de duas manei- ras: (a) prestando mais atenção à produtividade dos recursos naturais, por meio da conservação da energia e da água, reciclando o lixo e usando produtivamente os resíduos agrí- colas (Sachs, 1988, Weizsacker, Lovins and Lovins, 1997); (b) garantindo uma melhor manutenção do estoque de infra- estruturas, equipamentos e prédios, para prorrogar o seu ci- clo de vida e, desta forma, liberar para investimento produti- vo adicional o capital que seria de outra maneira exigido para a sua reposição;19 • por último, cuidar do futuro da maioria trabalhadora dos pe- quenos produtores, auto-empregados, que trabalham na agri- cultura familiar e em pequenos negócios e que se pautam por um padrão de racionalidade similar àquele observado por Chayanov na agricultura camponesa.20 Esta questão será abor- dada na seção seguinte. 19 Kalecki, em sua teoria do crescimento, introduz dois parâmetros responsá- veis pelo crescimento sem investimentos: a taxa de depreciação real e o coeficiente de melhor utilização das capacidades produtivas existentes. Quanto mais baixa a taxa de depreciação (atingida mediante melhor ma- nutenção), maior será ceteris paribus a taxa de crescimento econômico. Uma melhor utilização da capacidade produtiva existente também levará a uma maior taxa de crescimento global. 20 O dinheiro flui com facilidade dos bolsos das empresas até os bolsos domés- ticos, e vice-versa, algo totalmente contrário à racionalidade observada em empresas organizadas. 6 7 DESENVOLVIMENTO: INCLUDENTE, SUSTENTÁVEL, SUSTENTADO Box 2 - Taxas de crescimento do emprego A taxa de crescimento do emprego (e) depende das taxas de crescimento do PIB (r) e da produtividade do trabalho (p): e - r - p A tabela seguinte apresenta as taxas de crescimento do empre- go (e) resultantes das diferentes combinações de r e p. As taxas de crescimento de r figuram na primeira linha horizontal, as taxas de crescimento da produtividade p figuram na primeira coluna à esquerda e as taxas de emprego resultantes da combi- nação de r e p na interseção das duas. Para muitos países em desenvolvimento, um crescimento anual do emprego de 2% é o mínimo exigido para absorver os recém- chegados ao mercado de trabalho. A redução do desemprego e do subemprego exige combinações de r e de p localizadas à direita da diagonal 2 (assinalada em negrito). Todas as combinações à esquer- da da diagonal representam uma deterioração de emprego. De pequenos produtores a microempresários A categoria de "pequenos produtores" inclui todos aqueles en- volvidos em atividades de pequena escala realizadas fora do univer- 1 8 IGNACY SACHS so das empresas modernas. Estas últimas abrangem tanto firmas grandes e médias, como uma variedade de pequenas empresas in- dustriais, comerciais e de serviços, algumas delas unipessoais, que vão desde lojas e restaurantes até sofisticadas empresas de alta tecnologia e firmas de consultoria. As micro e pequenas
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