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COSTA E SILVA - Os segadores e a messe

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Cândido d Costa e Silva 
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Os .Segado~es _ C a Messe . 
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orelha .para o lei'tor 
e cutar meu agradecimento 
àquele ue, acolhedores e 
di eretos, vivamente se 
empenhaéam na edição deste 
livro; bem assim,' aos que com 
dedicada competência criatam e 
realizara~ o seu projeto gráfico. 
Acredito que as pessoas dão ro to 
às instituiç~& e a superam. 
Quero reconhecer em cada nome, 
o tít-ulo intransferível da sua 
generosidade: 
Angela Dantas Garcia Rosa 
Flávia M. Garcia Rosa 
]oenilson Lopes 
Maísa Andrade 
Marcos Paraguassu de A. Câmara 
Maria Cândida D. Gauderui .. 
Maria Dantas 
Regina Zobiak 
Sônia Maria M. de ouza Bastos 
. . 
t· ~· . 
E D U f dade Fedelll d• B•hUI 
[dltof11 da Untw:rsi bo '5/n C.mpus de Onoin• 
RUI Sarlo de Geremol 
40170.290 S.lvador S.hia 
TWIX (71) 3283 6160/6164 
eóufba@u1bl br www.edufba ufba.br 
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Rua Auausto Vl•n• , sJn C•nela 
(estaclon•mtnto •tr•s d• Reitoria de UFBA) 
T~ (71) 3283 7075 
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Rui B~tlo de Geremoabo s/n campus de Ondlnl 
(81buo1ecl Central da UFBA) Tel (71) 3283 6165 
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Llvr•n• AtTo-Onental • Terreiro de Jesus, 17 
T~ (71) 3322 6742 
Cândido da Costa e Silva 
Os Segadores e a Messe 
O clero oitocentista na Bahia 
Universidade Federal da Bahia 
Reitor 
Heonir Rocha 
Vice-Reitor 
Othon Jambeiro 
Editora da Universidade Federal da Bahia 
Diretora 
Flávia M. Garcia Rosa 
Conselho Editorial 
Antônio Virgílio Bittencourt Bastos 
Arivaldo Leão de Amorim 
Aurino Ribeiro Filho 
Cid Seixas Fraga Filho 
Fernando da Rocha Peres 
Mirella Márcia Longo Vieira Lima 
Cândido da Costa e Silva 
Os Segadores e a Messe 
O clero oitocentista na Bahia 
Secretaria da Cultura e Turismo do Estado da Bahia 
. EDUFBA 
Salvador, 2000 
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©2000 by Cândido ela Costa e Sih·a 
Direitos para a língua portuguesa adquiridos pela Editora da 
l!ni\·ersiclade Federal da Bahia. Feito o depósito legal. 
Capa e Projeto gráfico: 
Angela D. Garcia Rosa e Jocnilson Lopes 
Eclitoraç:lo Eletrônica: 
Angcla D. Garcia Rosa, Gabriela Nascimento. 
Joenilson Lopes c Josias Almeida Junior. 
Tratamento de imagens: 
joenilson Lopes 
Rc\·isào de texto: 
do autor 
Planta de Sah·aclor. sec. XIX: 
Arq. Marcos Paraguassú de Am1da Câmara 
Fotos dos Arcebispos: 
Raimundo Bandeira 
Telas elos Arcebispos: 
Acervo do Mosteiro de São Bento - Salvador Ba 
Sih·a. Cândido da Costa e. 
Os Segadores e a Mcsse: o clero oitocentista na Bahia/ 
Cândido da Costa e Sih·a _Salvador: SCT, EDLTfBA. 2000. 
502 p.: il. 
ISBN :85-232-0215-1 
Igreja Católica - Brasil. 2. Historia - Bahia. 3 Biografia - Clero 
secular I. Título. 
CDU: 929:262.14 (8138) 
Lembrados sejam aqui dois Capitulares da Sé Primacial: 
Amilcar .Harques de Oliveira, cavaleiro andante na planície: 1898-1965. 
Rubem .ltesquita, amanuense da memória capitular: 1901-1972. 
À cidade do Salvador, em seus 450 anos de Urbe e Sé: 1549-1551. 
Aos que esperaram por este livro, mas se foram. 
Àqueles que me cobraram até hoje. 
Para meus filhos J.tarcos e Díogo, 
este labor tenaz, 
que sem a parceria fecunda de sua mãe, Conceição, 
teria sido canseira só. 
§ uM " RIO 
ABREVIATURAS · ····· ···· ···· ······ · ······· ···· ··· ···· ··· ·· ······· ··············· ·· ···· 09 
livro I 
I NTRODUÇÃO ... . ... ................. ............ ............... ...... .. ... ..... . .. ... . 13 
A CIDADE EPISCOPAL ................................................................ 2 1 
UM SERTÃO POR DIOCESE . ..... ................ ................ .. ... . ......... .... 4 7 
GENTILIDADE SOBREVIVA . .... .............. ................................ .. ...... 7 5 
A FACE CRENTE .................. .. . . . ..... ......... . ............. . ..... .. ........... 8 5 
As CHAVES DO REINO .......................... ..... ........... .... .......... .. .. 113 
0 ALTAR E OS DEGRAUS ... .. ... ......... ........................................ 141 
Os cóNEGos DA SÉ PRIMEIRA ................................................. 189 
SoB o SIGNO DE VÉSPER ........ ... ............. ... .............. ..... ....... . .. 217 
FoNTES .......... . .......... . ......... .... ..... . .. ... .......... ............ ........... 259 
BIBLIOGRAFIA ....................................................................... 267 
livro n - Os cônegos um a um 
ÍNDICE ONOMÁS'JlCO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 295 
Í NDICE NOMINAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 300 
•. 
:4. 
Abreviaturas 
AC:-.IS 
AC 
AISPCB 
APEB 
A!\IS 
AOTSF 
AOTSD 
A.SC!\1 
APES 
AN 
BN 
ACMRJ 
AHC 
BNL 
BA 
AtC 
REABa 
RIGHBa 
RIHGB 
AAPB 
ArquiH> ela Cúria 1\letropolitana ele SaiYador. 
Arqui\o do C1bido ela Sé da Bahia. 
,\rquiH> da lrmancbcle de S. Pedro dos Clérigos da Bahia. 
ArquiH) Público do Estado da Bahia. 
ArquiYo ."vlunicipal ele Sah·ador. 
Arqui\·o ela Ordem Terceira ele S. Francisco. 
Arqui\ o da Ordem Terceira ele S. Domingos. 
Arqui\·o da Santa Casa ela 1\lisericórclia. 
Arqui\·o Público do Estado de Sergipe. 
ArquiYo Nacional - R J. 
Biblioteca Nacional - R J. 
ArquiYo cb Cúria Metropolitana elo Rio de Janeiro. 
Arqui\·o Histórico Utramarino - Lisboa. 
Biblioteca Nacional ele Lisboa. 
Biblioteca da Ajuda - Lisboa. 
Arqui\·o da CniYersidacle ele Coimbra. 
Re\·ista Eclesi~1stica ela Arquidioccsc ela Bahia. 
Re\·ista do Instituto Geográfico e Histórico ela Bahia. 
Re\·ista elo Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. 
Anais do ArquiYo Público da Bahia 
1--------·--·-·--·· -·· 
i 
Este trabalho estuda o clero baiano no século dezenove. N~1o me 
pareceu possível pensá-lo, abstraindo da comunidade crente em que 
nasceu e onde atuou. Clérigos e leigos se configuram na teia dessas 
relações. Os primeiros em particular, remetem 3 instituiç:lo católica. 
forma histórica a mais est::í,·el e complexa entre quantas organizou-se 
o cristianismo. Não obstante no curso do tempo tenham evoluído 
tendências de diferenciaç:lo funcional e burocdtica, entendeu-se a 
Igreja Católica dotada de certa e imutá,·el "estrutura ministerial". E 
nesta, o ministério do bispo sempre legitimou a nucleaç;1o das Igrejas 
particulares ou locais, ainda que vinculadas 3 instância centralizante 
de certa catolicidade explícita - Roma, que relath·iza a autonomia, 
não só pelo controle doutrinai e normativo. mas também por inten·ir 
em seu governo e disciplina. 
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14 
Pelo bispo hierarquizou-se a Ordem funcbment:d e predomin;1nte. 
s:1cralizada com origem apostólicl. associando-lhe o presbítero ou padre e 
o di:tcono. Por ele organizou-se "politicllnente .. a geografi:1 clioces:ma. ou 
seja. o espaço elo seu pastoreio e repartiu-se o seJTi(o religioso em fun<;óes 
que se foram nisulizanclo 11:1 longa históri:1. Entre estas. encontra-se aque-
la constituicb em colcgi:lclo e conhecida por Capítulo ou C:1hiclo ela Sé. 
Eram presbíteros em número reduzido. mas cujo processo de ascens:1o e 
desempenho os constituía em elite representati\":1 c pri\ ilegiada. Tomei-a 
em paradigma definidor da pesquis:1 c an:tlise, IÜO só por permitir acomp:I-
nhar a duraç:lo do oitocentos. mas.por drios títulos. ser elite significtti\·a 
à comprecns:lo do clero como um todo. De iniício. hesitei por se me afigu-
rar um conjunto restrito.de n:lo f:lcil :Kesso e de renm·aç:lo morosa pela 
média de \·ida relati\amente alta. l\las logo me dei conta que na dur:1çào 
projetada. inteiTeio um fator nm·o ampliando a circula<;ào. Aos cônegos 
efeti\·os. residentes ao redor da Sé. ajunt:l\·am-se outros mais clisuntes. até 
mesmo da cidade episcopal. agregados a essa corporaç:lo por título hono-
r:írio. Por decis:lo própria. uns renunci;l\·am :1 cadeira canonicll par:l dedi-
car-se ?1 cura d'alm:1s em paróquias prestigiosas. Outros ascendiam ;1 essegrupo seleto. trazendo a pr:ítica do ofício paroquial. E ainda mais. num 
lugar e noutro. o que cumulati\amente lhes erJ atribuído de modo preferente 
e qu:1sc exclusi\ o. em funções curiais, na judicatura eclesi:ística. em 
atividades docentes c direti\·as n:1 forma~·:·lO dos futuros presbíteros. nas 
clelegaçôes que se foram multiplicando pelo interior da diocese. assim os 
\·ig:t rios gerais. \ ig{Jrios da \·ara ou for;'meos e \·isitadorcs. De um modo ou 
de outro. todos coadju\·;1\·am estreit:llnente o descmpe11ho episcopal. sob 0 
prestígio e honra da murça de cônego. Er:1 este título um dnculo forte à 
Igreja local. Raros dentre eles emigraram. mesmo para o Rio de Janeiro. 
onde a Corte se constituía em singular atratiYo. 
Busquei alcanç{l-los pelo caminho biogr:Hico. p:ua decifrar a iden-
tidade coleti\ a atran?s cbs incli\·idualidacles. Ao comenur a dimensão so-
cial n:1 biografia. Sohoul assinal:l\·a qué "o indidduo por mais excepcio-
nal que seja. n:lo pode escap:1r ao que o rodeia. O grupo social propóe 
Os Segadores e a Messe 
ou impõe aos indivíduos os seus quadros de pensamento e de atividade, 
atua sobre a formaçào deles, em que pese a contribuiçào indi\·idual na 
modificaçào do próprio meio ... 
1 
Tendo em conta essa rela<,'ào singular 
plural. fui le\·antando os indicadores mJis representativos ~~ composiçào 
das fichas biográficas. Sem trégua. corri à procura desses dados. com a 
obstinaçào de quem se lança a tomar um elo partido, prestes a sumir para 
sempre no areal. Importa\ J compreender como esse clero oitocentista se 
constituía no interior da Igreja local e se desincumbia na sociedade baiana. 
A duraçào do oitocentos est{t assinalada por marcos Jssimétricos e 
heterogêneos. Em se trawndo de umJ biografia coletiva esboçada ao tlu-
xo das gerJções. começ·ei por integrar aquela que advinda do século XVIII, 
configurava o colegiado dos primeiros anos, quando ainda era um círculo 
quase exclusivo de doutores conimbrisenses que vào desJparecendo na 
conjuntura da Independência, encanecidos com a antiga ordem. Já o ter-
mo foi marcado com o ato político da implantação da República, 188<)/90. 
que ao extinguir as práticas decorrentes do regime ele padroado. acelerou 
no Cabido da Sé o colapso de sua funçào emblemática. e mudou inteira-
mente o proceder no provimento de suas cadeiras, das paróquias e até 
mesmo na escolha elos arcebispos. O ato republicano ao secularizar J 
instituiçào política. em separando o Esudo ela Igreja. explicitava o endos-
so das elites dirigentes e de setores da sociedade, ao processo ele que era 
parte. mas que o excedia. Ao longo do oitocentos reclefiniu-se o papel elo 
clero no ocidente latino. A teologia eclesiológica reconhecida interna-
mente, revigorou-se com significativa produçào de tratados cujo propósi-
to dominante e redutor era justificar o sacro poder nas prerrogativas elo 
Papa, dos bispos e presbíteros. Concomitante. efeti\·:n·a-se um conjunto 
de medidas relati\·as sobretudo à formaçào do clero em Seminários. Pro-
jetava-se uma imagem intemporal do padre. ajustada à instabilidade elo 
momento. As normas e expectativas com relaçào a ele. uma vez modifica-
das, incidiram em sua autocompreensào. sobre o seu papel. a sua relaçào 
com os leigos. com a sociedade, o mundo. "O padre. observa Certeau, se 
torna aquele graças a quem a Igreja .se clistingue.como .sociedJde religio-
Introdução 
15 
16 
sa. da sociedade civil" Essa teologia reducionista não reconhecia espaço 
à participação ati,·a dos leigos. Sem ao menos audiência consulti,·a, sem 
voz em qualquer assembléia, cuja e\ iclência maior era o silêncio no culto 
paracligmático; sem capacidade de inten·ir ou deliberar, tornavam-se exe-
cutores dóceis, quando assim o foram. elos imperativos hier:írquicos. 
Hipertrofia de lugar e funç{to, ainda hoje n~lo resolvida no plano normari,·o. 
mas que a pr:ítica por imposi~·óes exógenas. ,·em se encarregando de 
alterar; questão que extrapob a temporalidade deste trabalho. 
Esse fortalecimento hierarquico na Igreja era um reagente ao seu enfra-
quecimento externo. fruto de amplo processo de diástase ou disjunçào do 
que esta\·a articulado. Consum~l\·a-se no século XIX, a configuração da Igreja 
como uma grandeza social diferente. contraposta à sociedade. O pensamen-
to, as pr:íticas e as instituições católicas perdiam significaç~lo social. A rela-
çào genérica ela sociedade que se seculariLtva em rítmo e intensidade ,·ari:í-
veis conforme a hora e o lugar. estava definida destacadamente pelo religio-
so. Emancipava-se da tradiç~lo cristà, ainda que continuasse ,·inculacla ele 
múltiplas formas peb historicidade do espírito e da mesma rradi<;~lo. Procu-
rei reconhecer esses traços também na Rahia. nas relações clero e comunida-
de crente. clero e poder civiL clero e cultura secular. em cujo curso operou-se 
nele essa identificaç:lo de Igreja. 
Levei em conta algumas coordenadas que j{t corra,·am o século X\.IJI e 
progrediram. Antes. a Reforma ao gerar uma pluralicbcle na Igreja do Ociden-
te. relativizara a sua doutrina e permitira a difus:lo ele uma .. religi:k> natural' 
que teria preexisticlo :1 hisroriciclacle crist:l e contest:l\·a o seu exclusi,·ismo. 
Cresceu o papel do Estado que subordinou o clesempe~ho da Igreja. prO\ o-
cando conf1itos ele competência. E\ oluiu a cliferenciaçào entre a cultura leiga 
ou secular e a cultura dos clérigos ou edesi:ística. alcançando ní,·eis ele opo-
siçüo e conflito. Quando, então. a diferença elo padre foi compreendida cada 
,·ez menos como uma diferença de função. e cada ,·ez mais como uma dife-
rença culturaL assim observa Dominique _lu lia.' 
Pri,·ilegiei a fala elo clero na sua relaçJo com a sociedade. por julgá-
la preponderante no auto-retrato re\ elador elo conceito e ela diferença. 
Os Segadores e a Messe 
- · . - )orém 1)or ·thrangente. nem mesmo extensi\·a ao conjun-Nao a tt\ e mo:-. 1 · · • • 
I 
· ·.1 .10 e:xpress·u· su·t crítica tanto sobre as atitudes di,·ergen-to. A 1terarqut. · · · · · · · 
d l
.t - <lt1·1nro sobre ·ts pr·'tticts religios:ts consideradas anacrônicas tes as e t es. · · · · · · · 
I . s tr·t•"t\·· 1 -1 t"ronteira ela contraposiçào. E ainda aqui. a clistin-e popu ate.. · .,. · · · 
- c1, ··ofici'tl .. e 1x>puhr implica em reconhecer a historicidade çao mesm:t t.: • • _ 
de ambas. T~tmhém o clero reelahora o seu discurso ou doutrina. as tor-
mas e disciplina do culto. :ts normas elo ,.i, er. Relê suas certezas. realimenta 
sua mística. reim·ent:t seus instrumentos ele aç:lo. ainda que pressionado 
por fatores e:xôgenos. Sob inúmeros aspectos o que estava em jogo era o 
controle de pr:üicts comuns. decorrentes de represema~·ões comuns. mas 
em descompasso. 
A Bahia e:o.t:'t compreendida em sua extens:lo pro\'incial e em sua 
abrangência arquidiocesana que enr:lo incluía a Pnwíncia de Sergipe. As-
sim 0 cen:irio de atua(:lo desse clero em·oh·e a cidade do Sal\'ador e a 
diocese. Na Bahi:t oitocentista. o modo porque se alcan(:t\·a a condi<,_·:lo de 
presbítero ou padre intlectiu na cria~·:lo dos semin:írios. Primeiro, o de es-
tudos eclesi:'tsticos,depois o de preparatórios ou estudos secund:írios. Pro-
mo\·eram a homogeneid:tdc elo saber compartilhado e internalizaram ,-alo-
res e padróes ele conduta. HouYe uma lenta mas progressiYa passagem da 
suhjetiYidade do cmdidato em .. sentir-se chamado". para a racionalidade 
elo .. ser chamado ... funcbcb em critérios indigitados pelos formadores. Su-
hordituYa-se a .. , oz interior .. :1 e\ id(·ncia dos .. sinais ... Reclefinia-se interna-
mente o papel do padre. mas decresciam os candidatos na Rahia. apesar de 
ser aincb uma carreira de progress:lo funcional remunerada. 
Procurei compreender em trajetória de longa duraç:lo. o modo como 
na Bahia a Igrej:t se fez presente pela mediaç:lo do seu clero e porisso me 
afastei cb construc-to de esquemas generalizantes. explicatiH>S por si pró-
prios. amarrados a uma lógica condusi,·ae definiti,·a. 
:\s fontes prim:írias me permitiram identificar :ts indi,·idualidades. 
le\ antando-lhes os dados indispens:í,·eis ao perfil social do grupo. ,\ na-
turalicbde segundo a geografia das freguesias. A filia(.,':lo. n:lo só com os 
pais e a\·ú". a ocup:1 ~·:1o e :t cor. mas o tipo de \ ínculo. O batismo e o 
Introdução 
17 
18 
compadrio. Os passos da iniciaç:1o ao rito da Ordem que os constituía 
presbíteros. O desempenho eclesiástico e \ ínculos sociais. Trabalhei as-
sim. os processos ele ordenaçào que atendiam a três propósitos: identifi-
car a ascendência do candidato <de genere ); compro\·ar sua \·ida c costu-
mes após a puberdade (\·ira et moribus ); assegurar uma fonte de renda ?1 
sua sustentaçào. na eventualidade de nào assumir de logo um benefício 
colado (patrimônio l. Matrículas ele ordinandos. concursos. apresentações. 
colaçào de benefícios. conccssôes de honrarias. Registros uni,·ersitários 
em Coimbra. Documentos do Cabido ela Sé. Correspondência dos Arce-
bispos, emitida e recebida. relatórios. etc. Testamentos e im·ent:irios. Do-
cumentos ela Presidência cb Prodncia. No tocante às fontes impressas, as 
cartas pastorais e escritos dos mesmos Arcebispos; sermões dos cônegos: 
almanaques ela Pro\·íncia e folhinhas do Arcebispado; semanários católi-
cos e diários de Sah·ador. além cb literatura teológica, canônica e devocional 
de uso do clero. Crônicas ele costumes. relatos clássicos de \'iajantes es-
trangeiros pela Província, tudo que nos foi possível consultar. nào ape-
nas para as fichas biográficas. mas para acompanhar a evoluçào das prá-
ticas religiosas. o modo de encará-las. 
Nào ti\·c a prctensào de analisar esse clero sob os vários prismas 
que a dura garimpagem acabou por re\·elar. O destaque atendeu ao que 
me propus: o perfil do clero na sociedade baiana concebida e ainda mo-
tivada fortemente pelo sagrado. Creio que n:1o o enxerguei além ou aquém 
elos que lhe esta\·am à roda. Participante do seu tempo. \·ivenciou as 
contradições sociais e as aspirações religiosas dominantes. Deixo em màos 
do leitor estas p:ígin:1s que entre dú\·idas e certezas.- muito consumiram 
de mim. por tempo além do imaginado. 
Os Segadores e a Messe 
Notas 
1. SOBOL'L. Albert Descrição e medidas e111 história social. In: LABRO!.'SSE. His-
tória social: problemas. fontes c métodos. Colóquio S;tint-Claud. maio 196'i: 
p.26,r. 
2. CERTEAC. !\lichel de. A escrita da 1/itória. p.l 'iO. 
3. .Jl'LL\. Dominique 8.: FRI.JHOFF. Willem. Opadre(m11ci?s 11os tempos modemos. p.l21. 
Introdução 
19 
--.-1/Jrc esta costa do Brasil 1?111 treze grdus do parte do Sul. 111/W hoca. 
011 barra de tri?s lép,uas. a qual. alm;~Sando-se proporcionat111e11te para dl?ntro. 
(az unw /){lia tiio jónnosa. lm;(j,a e capaz. que por si'r tal. deu o 1/01/ie 
à Cidade. cbmnoda por o ntollu/Jidsia· Babio · 
-----------·--·· ··--- ·---·-·· ·--- ---- -·- -- ----· ----· --- -----··· -·-- --·--
Em sua trajetória bimilenária, o Cristianismo sempre enxergou um 
horizonte a alcan<,-ar. fascínio do seu uniYersalismo, sem hiatos no 
curso, nem exceção na pluralidade das confissôes em que \'CÍO a se 
configurar. Sua ótica teológicl dimensionou o tempo como o inten·a-
lo para o anúncio. a missão. Ora breYc. prestes a encontrar termo sob 
a premência elas conjunturas. ora longo. por lhe crer "longflnime a 
expectativa do Senhor" em se Ycr anunciado c crido pelos que hahi-
ta\'am os confins da terra. \las sempre uma linha que do :1contecido 
pascal nas origens. corre para o acontecer escatológico. plenific:1dor 
cb caminhada humana. Esse e\·angelho de comunhào tll1iYersal. no 
entanto. comunicou-se at1icubdo em projetos históricos ricos de 
consequências. ambiguidades e contradi<;ôes. 
22 
:I 
Assim que navegando no bojo do paradoxo, apottaram também 3 Bahb. os 
que vieram com o encargo específico de erguer ··a no\·a Igreja que o Senhor quer 
fundar". O que para o Padre Nóbrega, nesta cllta, se traduzia em dispor os que aqui 
eram e os que aqui chegavam, como "pedras vivas de um edifício espiritual", 1 ma-
nifesto sobretudo, quando ajuntadas no interior elos espaços a que :1 arquitetura asso-
ciou definitivamente o nome de igreja. 
Achou-se Igreja a Bahia no pleito que D. Joào 111 \·iu acolhido com a 
Bula Super spccula militantis Ecclesiae, ele 2'5 de fe\·ereiro de 1 '551. O Papa 
Júlio III justificou o ato por estar "o seu pensamento voltado para todas as 
Províncias elo Orbe. mormente para os lugares que, sob o bafejo da misericór-
dia de Deus Onipotente, foram recuperados ou conquistados, pelos Reis Cató-
licos às nações bárbaras e infiéis [. .. ] para que nesses mesmos lugares [ ... ] se 
enraíze profundamente a Religiào Cristã, e os seus habitantes c naturais sempre 
progridam na Fé, escudados na autoridade e doutrina dos veneráveis bispos". 
Fundado em informações que o Rei lhe passara. o Papa estatuiu a 
primeira Igreja no espaço português do Novo Mundo, certo de que na vasti-
&1o chamada Brasil, antes tào somente ela "gentilidacle bárbara, há muitos 
lugares vilas e povoações ele cristàos naturais destes reinos e de outras terras 
e assim como muita gente da terra que se fez, e faz cada dia cristào". Algumas 
igrejas e capelas curadas, abertas 3 missa e outros ofícios. já pontilhavam 
alvinitentes, as areias elas praias na moldura \·ercle da mata atlântica. Acudiam 
pregadores a "semearem a palavra ele Deus, para conduzir ;. luz ela verdade 
os seus habitanres". Implementando o propósito real que estan a criar na 
Capitania da Baia de Todos os Santos. um centro de poder estável e seguro, 
equidistante das capitanias ao norte e ao sul, elegeu eiclade e igreja sob a 
invocação do mesmo Santo Sah·ador do Mundo. e nelas instituiu a dignidade 
episcopal com Sé, [. .. ] bispo que deved ser chamado de Sào Salvador. para 
presidir à mesma Igreja, ness~1 acrópole, erguida em "asilo para guarda e 
refúgio dos crist~los que ali habitam e bdada a ser notável quer pela fertilida-
de dos campos, quer pela benignidade elo clima, frequência ele povo e co-
mércio". Assim enxergava o Papa, com os olhos elos que lhe infundiam cer-
tezas c projet;n·am \ isôes. 
Os Segadores e a Messe 
Só em parte o espaço ela diocese rccobriu as linhas da Capitania, cuja 
latitude estava em aberto ··por tantas léguas qu:.~ntas fossem conquistando··. 
A diocese espraiava-se "por cinquenta léguas de terra ao longo cb costa" e 
internava-se em "\·inte léguas para dentro da dita Capitania e sertào". Aproxi-
madamente trezentos quilômetros beirando o mar, "da foz do rio de Sào Fran-
cisco correndo para o Sul. até a ponta do Paddo na Bahia de Todos os 
Santos'·, e cento e vinte quilômetros para o interior. "perto da povoação", 
desenhando a partir da referida ponta, uma sinuosa linha ascendente até 
reencontrar as águas sanfranciscanas.
2 
Nítidas de norte a sul, imprecisas de 
leste a oeste; de qualquer modo, linhas uma e mais vezes alteradas no curso 
do tempo. Aqui, a base física dessa geografia eclesiástica. A Sé, em sua cida-
de, busca alcançar a diocese ainda muito mais natureza do que "mundo". 
Ao assinalar território à nova Igreja, obviamente a localizava, tornando-
a particular no seio do ecúmeno cristào católico.' Limites de evidente controle, 
mas que também propiciavam uma fisionomia peculiar. Na fissiparidade desse 
processo canônico, agregavam-se em uma só geografia, a populaçào católica 
aí advinda, aquela preexistente, destinatária ele uma açào especial que se que-
ria evangelizadora, e aqueloutra compulsoriamente introduzida. Permitia assim 
que se fosse plasmando um católico multiface, emergente do quotidiano de 
práticas herdadas dos ancestrais cristàos, c ele outras tantas práticas diversas. 
próprias aos naturais da terra e àqueles transmigrados em ferros. 
Povoar ocupando a terra para possuí-la; possuir para explorar; explo-
rar para auferir lucro. A dinâmica de tal empresa exigia critérios explícitos 
para a vidaem comum. Na dcfini<,·üo dos papéis. a Igreja se assumiu como 
legitimante da açào e geratriz de sentido para a existência imediata e históri-
ca de cada qual. Nesta área, promessa também de acrescentamento à cristan-
dade, pareceu necessário ao Rei, um bispo para administrar ··o que pertence 
à Ordem Episcopal c jurisdi<,·ào eclcsi{tstica ··. \"iver em Igreja. nucleada ao 
redor dele. Convinha uma disciplina ao circunstancial c disperso de leigos e 
clérigos. empenhados em incursões exploratórias. "para que nào venham a 
carecer ele incremcnro no espiritual. j{t que fazem progresso no temporal" 
Que fosse o bispo presença para congregar ··em clero as pessoas eclesiásticas 
A Cidade Episcopal 
23 
24 
e em po\·o - populus christianus- os secubres. Par:t semear .. o pahulo espi-
ritual·. nutriente do culto cli\·ino. Para instruir e confirmar os que j:í professa-
vam a k ortodoxa e a ela comcrrer os "infiéis". Assistir aos primeiros e rr:tzer 
;, fé os últimos .. 'VIas quem s:1o estes' N;lo er:tm os mouros "infiéis ... seguido-
res do Profeta \laomé, imagem imediata do n:1o nisr:1o. N:1o eram os di . .;;:-:.i-
denres "heréticos .. que naqueles dias clesafia\·:un :1 ortocloxi:t da rracli~.;·:1o ct-
tólica, em contlito irre\·ersível e proporçóes sem precedentes. Aqui. 0 "infiel" 
insuspeit:íYel era o homem índio. por certo mais próximo elo remoto "h:írha-
ro" com que se encontrou outrora a expansjo cristj. Era outro porém, em 
sua gcnrilidade. de que a surpresa cb descoberta logo se apercebeu. 
;} : 
De qualquer modo. 'dócil ou contrafeito. connKado já ;, com·ersào. 
emblem:ítico. qml o pintou \'asco-Fernandes entre J")(JJ e 1-';0). integrando a 
real tríade ante o ,\lenino Jesus. na sua Adoraç~lo dos .\lagos.' Promessa de 
crist:1o que ha\ ia ele suscitar generosidade mission:íri:t. apoiada em propósitos 
Os Segadores e a Messe 
religiosos. proselitisras sem dú\ icb. mas irreclutí\·eis a mer:t cunutbgem de 
objcti\·os outros. ainda que :munres e solicl:írios. l.e\ ant:tr:í contliro:-:. de cons-
ciência e perplexidades. compartilhados nos primórdios e que a marcha da 
conquista ir:í csYanecendo. para sobre\ i\·er apenas em escrúpulos de uns 
poucos mais sensí\ eis. Ent:lo. ob'ieJY:l\·a o Rei a Tomé de Souz:t: .. posto que 
em alguns capítulos deste regimento \os mando que faça is guerra :tos genti-
os [ ... ] c que rr:1balheis por castigados os que forem culpados nas coisas 
passadas. ha\ cndo respeito ao pouco entendimento que essa gente a ré ago-
ra rem a qu:tl coisa diminui muito em suas culp:ts [. .. 1 h:t\·erei por hem que 
\'ÓS pela melhor maneira que puderdes os tragais a isso porque como princi-
pal intento meu é que se com·enam a nossa Santa Fé. logo é raóo que se 
tenha com eles todos os modos que puderem ser para que o façais :tssim. E o 
principal h:í ele ser escusardes fazerde-lhes guerra porque com eb se n;lo 
; 
pode ter a comunicaç:1o que com·em que se com eles tenha para o serem ... 
Cham:mdo-o a ser crisr:lo também. implicitamente se lhe reconhecia :1 
condiç:1o humana e :Hribuía-se ;, Fé um Yalor destacado c inconreste. objeto de 
preocupaçóes e csfOI\'OS peculiares. Sem que implique de:;;caracrerizar o em-
preendimento expansionista do \·inco de esbulho c :1gress:1o cultural ao :tutóc-
tone. j:í que interesses c critérios diYcrsos mescb\·:un-se. e até mesmo o 
cristianiz:í-lo :tpresent:l\ a-se também como caminho hre\ e para incorpor:í-lo. 
parece do, no entanto, reduzir a moti\·aç:1o plural que esta\·a em jogo. a 
leitura única. como se fora imposta por um determinismo acim:t de qualquer 
discuss:1o. No desempenho pastoral do bispo e de seus colaboradores. com·er-
giam em propósitos o Rei e o Papa. Seguro da fidelicl:lde do monarc1 ;, fé 
católica. o Papa lhe comeria prerrogati\·as da csfer:1 religiosa.:\ Coroa lusí:lda e 
a Sé Roman:t mutuamente comprometiam-se com a noYa Igreja. Acorda\·am 
atribuiçóes n:1 expectati\ a de um êxito compartilhado. Padroeiro pleno e per-
pétuo seria o Rei ... O Rispo de Roma fiador e confirmante da ortodoxi:l e 
\·inculaç:1o carólicts. O momento requeria alianç:1s e o desempenho dos 
interlocutores \·inha :1 calhar. Júlio Ill. recém-eleito para a cadeira de S:1o Pedro 
! [")")()),fora o Cardeal dei :VIonte. primeiro entre os trt•s legados papais à pri-
meira etapa do Concílio de Trenro ! 1")-f.:; -i'"') e presidente das suas sessões. 
A Cidade Episcopal 
25 
26 
Afinado com o espírito de reformaçlo da Igreja, definira no calor elos debates 
que "a meta da reforma é a restauraç:lo ela cura d'almas". Dois meses e dias 
após expedir a Bula Supa specula, reabriu o Concílio em sua segunda etapa 
W 1.05.1551 ). Sua im·estidura acontecia no momento em que se acirr:n·a a ccm-
testação dos cristüos protestantes contra a tradiçüo cristã-católica e em especial 
a instituição do papado. D. Jo:lo 111 já intlectira para um exacerbado fervor 
religioso. Abrira as portas à nascente Companhia de Jesus< 1540J, encaminhan-
do os seus serviços ao campo missionário. Sua ortodoxia católica acreditara-se 
ao criar (1 '532) uma mesa destinada a assessora-lo em assuntos que afetassem 
a sua consciência- Mesa de Consciência e logo, pela uniào à Coroa do Mestrado 
das Ordens Militares de Cristo. de Sant' lago e Sào Bento ele Avis, acrescentou-
se a sua competência. Além disso, empenhou-se em alcançar do Papa Paulo lll 
autorizaçào para o Tribunal da Inquisição, de início com restrições ( 1 '536). e 
pleno em 1547. Nào passará o século sem que seus prepostos visitem este 
bispado de São Salvador < 1591 ). Por fim, enfeixou o padroado real e o elas 
ordens, consagrado em união perpétua pela Bula Praeclara <30.12.155U.x 
Ha\·ia uma evidente simbiose do "espiritual e do temporal". Esferas 
que se reconheciam distintas. mas indissociáveis e interdependentes. Aqui 
ainda estüo amalgamadas as realidades celestes e terrestres. A crença a um 
só tempo. era convicção e conveniência. Em dias futuros. esta última absor-
verá a primeira. Na parceria da aliança hào de percorrer caminho longo. lado 
a lado. mas em passo lento e inelutável de descompasso até a cisüo formal. 
Lm Estado que evoluirá assumindo a modernidade de se entender autônomo, 
buscando em si mesmo o fundamento das suas práticas. Discretamente. da 
religião para a raziío transmutt\·a-se a luz focal. Cma Igreja que a Reforma 
di\·idiu, enfraquecendo-a. Relativizou-se o absoluto dos seus postulados. E o 
recurso à proteç:lo do Estado será o caminho da submissào crescente, a fim 
de assegurar seu espaço de parricipaç:1o. sempre mais restrito pelas conveni-
ências ci\·is. até o momento em que se tornar dispensá\·el. 
Entretanto. ainda s:lo hor:1s de começos. Impunha-se ao Bispo ele Sào 
Salvador ampliar o espaço de sua Sé. avultando-a em Catedral. o que na 
verdade. foi le\·anrá-b nova: ia em meio o ano de 1552. E mais. organizar o 
Os Segadores e a Messe 
serviço religioso. dotando-a de um corpo de presbíteros erigido em Cabi-
do, com os auxiliares indispensáveis. Em síntese. tudo o que lhe parecesse 
acertado e conveniente "ao seiTiço ele Deus e ao seu culto". Acerto e com·e-
niência contidos. desde agora, nas disponibilidades do erário. Alega\·a o 
Rei que embora ti\·esse "o espiritual necessidade elo temporal para 
suportamento e mantença .. elos seus ministros. s:lo poucas nas terras do 
novo bispado. as rendas ela sua Fazenda e as elo Mestrado da Ordem de 
Cristo e "muito grandes os gastos que se fazem em as armadas que continu-
amente é necessário que andem na costa do mar destas terras para clefensào 
dos moradores". Cingiu-se por isso o Bispo ao que lhe parecia indispensá-
vel e, com o parecer e conselho reais, criou um Deào. um Mestre-escola, 
um Chantre e um Tesoureiro-mor. perfazendo quatro dignidades, pois a 
quinta. o Arcediago. só será acrescentada em 1 '576; seis cônegos, seis capelães 
e dois moços do Coro. Para sustento desse reduzido corpo, estipulou-se 
fossem distribuídos "aos quartéis do ano",quinhentos cruzados ao bispo 
para sua mesa episcopal: \·inte mil réis a cada uma das dignidades: doze mil 
réis a cada cônego; a cada capebo oito mil réis e quatro mil réis a um e 
outro dos moços. 
A nascente cidade j:í havia ancorado em firmes espaços de oraçào, 
duas elas im·oct\·ôes a que se confiaram para a travessia. as três naus da 
armada ele Tomé de Souza. Eram as edículas de Nossa Senhora da Conceiçào, 
na praia. e grimpada na acrópole, a do Salvador. com pároco predestinado 
desde 18 de fevereiro de 1549.
1
" Por algum tempo esta última sen·iu de Sé. 
identificada pela rosca cobertura ele palha, até que. deixando o sírio à terceira 
das invoct\·ôes. Noss:1 Senhor <.!'Ajuda. levou o título e a dignidade e se foi 
assentar mais ;, frente. onde Gabriel Soares a enxergou. já declinante o 
século: "a Sé esr~í situada com o rosto sobre o mar ela Bahia. defronte do 
ancoradouro elas naus. com um tabuleiro defronte da porta principaL bem a 
li 
pique sobre o desembarcadouro. donde tem grande \·ista ... 
Assim dehrU<.;ada. ante o seu pórtico abriram as emharct~·ôes nessas 
águas interiores. os sulcos dos primeiros caminhos ;, formaçào ele núcleos 
crisr:los. nas saliências e reentrâncias da sua orla. E1wolvenclo a Sé estaYa a 
A Cidade Episcopal 
27 
28 
cidade, cujo prestígio das edificações media- e pela vizinhança ou distância 
da sua sombra. Solitária unidade paroquial intra-muros, nesse século em 
que tudo tomava princípio. A cidade inteira vai se fazendo história, inscrita e 
reinscrita na contínua interferência dos fatores naturais e humanos. Perdu-
rando aos que lhe deram começo, na faina incessante de edificar e desfazer, 
de conservar e recobrir, Salvador ia mantendo a identidade na mudança cons-
tante do crescer.
12 
O casario, as edificações públicas, as ruas e praças, o limiar entre a 
urbe, o subúrbio e o campo, na aparente imobilidade do construído e do 
traçado, indicavam o dinamismo do quotidiano em que se revelava o viver 
coletivo. Aqui, na singularidade geomórfica do sítio, seus habitantes iam 
organizando o destino e uso do seu espaço. Criada para cumprir funções 
estratégicas que articulassem com o Reino o projeto colonizador, era a um só 
tempo, sede do governo central até 1763, porto escoadouro do que se produ-
zia para além mar, e de descarga do que se carecia por aqui. Mas Salvador na 
humanidade dos que faziam viger a ordem ou circular as riquezas, dos que 
ditavam e dos que eram submetidos, dos que suavam e dos que sugavam, 
dos que nasciam e dos que se finavam, era uma cidade de cristãos católicos, 
herdeiros da fé ou compelidos a ela, tementes a Deus ou temerosos aos 
senhores, por itinerários os mais variados e contraditórios que transitavam 
da unanimidade exterior cômoda ou conveniente, à interioridade da fé ingênua 
e confortante. 
E porque assim o foi, o sagrado envolveu e pontuou a cidade, orien-
tando-a. As edificações religiosas destacavam-se do conjunto quer pelo pri-
vilégio dos sítios em que se ergueram, quer pelo potte avantajado ou re-
quinte dos interiores.
13 
Nas últimas décadas do setecentos, sua topografia 
ostentava nos mesmos lugares das origens, os referentes sacros mais notá-
veis e o mapa eclesiástico, quase sem retoques, atravessará o oitocentos. 
Em sua dezena de freguesias, o zoneamento canônico situava a Sé como o 
núcleo irradiante e organizador da cidade religiosa, quer pelo título, quer 
pelo sítio no plano geral da urbe . Contida no perímetro correspondente à 
antiga cidade-fortaleza, quando já ignorados portas e baluartes pela força 
Os Segadores e a Messe 
expansionista, conservava-se inalterada como o espaço privilegiado e 
prototípico das práticas maiores do culto público, do acontecimento religioso, 
espelho das diferenças. À sua roda, igrejas de religiosos, de irmãos terceiros e 
outros, além de passos e cruzes, de nichos escavados no alçado do casario, 
esquinando ruas ou gradeados nas paredes externas dos templos, onde à noi-
te os aureolava a chama das lâmp~das votivas. Era~ focos sinalizando a 
espiritualidade devota que, dominante, iluminava a vida de todos. Aqui, a 
igreja da Santa Casa da Misericórdia e suas dependências, opulenta na elite 
afortunada dos seus irn1ãos, singular na organização leiga, bem servida de 
padres capelães a ponto de os ter em colegiada. Ali perto, despojado do seu 
destino de origem, expulsos os jesuítas que lhe deram vida, vai se desarticu-
lando o conjunto igreja e Colégio de Jesus, disputado por novos ocupantes. O 
templo, desde 1765, passara à administração do Arcebispado e se tornou alter-
nativa para os cônegos que entraram a desgostar da sua Sé. Para lá se transfe-
riram a fim de "celebrarem interinamente os officios divinos, enquanto a Sé 
não fosse reedificada, das ruínas em que se acha", e deixaram-se ficar, não sem 
conflito com os Irmãos do SS. Sacramento que contestaram o seu arruinamento, 
resistiram em acompanhá-los e alegavam contra a displicência dos capitulares, 
o quanto com eles despendiam anualmente, suplementando-lhes as prebendas 
com um sem número de benesses.
14 
Para a igreja de religiosos proscritos, des-
locava-se, assim que por distância de passos, a singularidade prestigiosa da 
Sé, ainda que da antiga não se lhe retirasse a primazia de matriz a ela anexa. 
Quanto ao corpo do edifício, outrora destinado às aulas e residência dos reli-
giosos, prevaleceu o interesse militar para alojamento e hospital, desapontan-
do o Arcebispo D. Fr. Antônio Correa em eu desejo de ali instalar o Seminário 
que, por fração de tempo, tivera começo anos atrás.
15 
Ao longo do Terreiro de 
Jesus, os clérigos do "hábito de São Pedro", sob cujo patrocínio reuniram-se 
em Irmandade desde fins do século XVI, ergueram muito depois, esta sua nova 
igreja consistório contíguo, onde circulava copia de capelães que por décadas 
do dezenove, ainda se via reconhecida em colegiada. A confraternidade empo-
breceu-se no lapso de meio século. Ao redor de 1759 era "a mais lustroza por 
rica e opulenta", "hoje porém, [no limiar do dezenove] está em decadência 
A Cidade Episcopal 
29 
pelos muitos prejuízos que experimentou com as frequentes ruínas no seu 
templo". Confronte ao antigo Colégio de Jesus, fechando um dos ângulos a 
este amplo terreiro aberto aos espetáculos, leigos prestigiosos, terceiros de 
São Domingos, ostentavam a sua igreja e anexos, com a particularidade de tê-
la "separada por não haver na Bahia convento daquela Ordem". 16 O que não 
acontecia aos terceiros franciscanos , um pouco adiante, que emparelhavam a 
sua, à igreja conventual dos. religiosos primeiros. Neste ponto estacava o cir-
cuito dos espaços sagrados sobranceiros ao casario, mas que se não completa-
va sem a igrejinha de Nossa Senhora d ' Ajuda, ao sul, com a Irmandade dos 
Santos Passos de Cristo e, plantada nas faldas limites do território paroquial, 
as capelas de Nossa Senhora de Guadalupe "dos homens pardos pobres e 
cativos", e a de São Miguel, legado do leigo fundador à Ordem Terceira de S. 
Francisco que alimentava singular Via Sacra, em cortejo bissemanal de quinze 
pobres, mendigos de ambos os sexos, cabendo a cada um a esmola de quaren-
ta réis e o dobro ao seu responsável. 
17 
Esse espaço, constelado de marcos religiosos dissímeis no porte, mas to-
dos concorrentes em sacralizá-lo, ensejava o constante afluxo de fiéis aos interi-
ores e o espraiar por seu adros e o circular por entre a teia de suas ruas estreitas, 
nos cortejos e concentrações maiores do ano cristão. Desfilavam as procissões 
quaresmais, as da Semana Maior ou Santa, a de Corpus Christi , primeira entre 
todas, e outras mais. E ainda que essa e aquela procedessem de além fronteiras, 
cumpriam aqui a maior parte do percurso obrigatório. 
18 
Era o espaço em que 
conviviam de modo paradigmático a elite privilegiada do clero secular, residente 
e atuante, os religiosos .de larga tradição na vida da cidade, as irmandades deleigos com evidente prestígio social, e os crentes anônimos e pobres, também 
frequentadores desses templos, ainda que contidos às suas entradas, mas sobre-
tudo, livres e criativos quando agrupados em cantantes orações coletivas ao pé 
dos oratórios nas ruas, mal se adensavam as sombras da noite. Daí o espelhar 
das diversidades e c::onvergências na vivência religiosa, não só entre camadas 
sociais, de leigo para leigo, mas entre leigos e clérigos, estampadas na fisionomia 
crente, adiante analisada. E as freguesias em que se vai desdobrando a cidade, 
com algumas variantes, também vão reproduzindo esse mosaico. 
O s Segadores e a Messe 
A proto-história registra em todas alguma ermida original , erguida na 
quase totalidade por iniciativa de leigos, atraindo ao fluxo anual de suas 
festas, romeiros e devotos que, flutuantes, vão contribuindo à fixação dos 
que se estabelecem. A freguesia de N. Sra. da Vitória (1561) congregou a 
antiga gente da povoação do Pereira e estabeleceu o primeiro recorte paro-
quial entre a urbe e seu subúrbio. Por volta de 1757, o pároco Manoel de 
Lima destaca a matriz "situada em hum alto e sobre a marinha olhando para 
0 poente"; duas capelas honrando os títulos marianos da Conceição e da 
Madre de Deus, uma estremando na linha do mar, ao Unhão, com a freguesia 
de S. Pedro; a outra dividindo espaço no Rio Vermelho, com a de S. Gonçalo. 
À entrada da barra, a capela de Santo Antônio e , isolada em seu outeiro a de 
São Lázaro. Mais duas casas de religiosos. O pequeno mosteiro beneditino de 
N. Sra. da Graça, centro de devoção e romagens e o convento das religiosas 
ursulinas na antiga capela de N. Sra. das Mercês; 
19 
esta última, marco confim 
da citada freguesia pela parte de cima, alimentava com os fiéis do século, 
algumas devoções de relevo, assim a do Senhor Bom Jesus da Porta, ou a de 
São Gonçalo de Amarante, que se vai tornando mais e mais estranha à nova 
mentalidade do clero ilustrado, a ponto do Arcebispo proibir "d'hora em 
diante [1854] a sua procissão e quaesquer outras que por ventura seja de 
costume fazer-se naquelle convento, as quaes só poderão ter lugar no interi-
or da clausura fazendo-se porém, na igreja do convento os mais actos religi-
zo 
osos concernentes à festividade". 
As freguesias de N. Sra. da Conceição da Praia (1623), de Sto. Antônio 
além do Carmo (1642), de São Pedro (1679) e do SS. Sacramento e Sant'Ana 
0679) acudiram à expansão da cidade ao poente e ao norte , ·ao sul e ao · 
nascente, no curso do século XVII. Na Praia, a população cresceu alimentan-
do a fé nas práticas oferecidas pela primeira casa de oração que a nova 
cidade conheceu, agora transfigurada em matriz com estreita faixa de terra, 
contida entre a montanha suporte da acrópole, e o mar em frente , porto 
seguro e maior da baia. Não avançava além da ladeira da Preguiça, onde 
estavam os padres do Oratório em seu pequeno hospício. Duas capelas con-
corriamao fomento da vida religiosa. ma os mareantes ergueram a S. Pedro 
A C idade Episcopal 
31 
32 
Con<,::th es. o S:ío Telmo ou Corpo S:mto. protetor solícito aos riscos da n:l\·e-
g:t<,·:ío: antiga e ll1L.iltipla nas irnund:tdes que abrigou e lhes assistiu na lenta 
agonia. a exemplo da mesma que lhe deu origem e nome: do Senhor Bom 
Jesu . .., cbs Necessicbdes e Rcdenr;lo dos africanos jejes: de N. Sra. do Ten,x> 
dos homens p:trdos; cb De\·oc.-:lu de S .. los(· , cuja prociss:ío anual do \"oro de 
Cr:tças foi pretexto de sério incidente (I 9.0.). 1~22 ), no calor dos contlitos 
pela Independência. /\outra ctpela em honr;t da nürtir Santt B:írhara, tam-
lx.;m :tlimenta\·a com a gente do mar engenhos:t de\·o<.,·:lo. tecida entre uma 
im:tgem de N. Sr:t. da Bo:t Hor:1 e os mercadores da cidade do Porto que 
bziam a rota da Bahia.~' 
Deixando a cidade e olhando o mar da escarp:t, rumo ao norte, con-
centr:tr:tm-se fiéis em tal número que só as dtinus da bexiga \·ieram e\ iclen-
cbr, pois n:1o podia lhes assistir o Cura da Sé, pel:t dist:'tnci:t a \"C'ncer e j:í os 
anos n:lo lhe acompanharem os passos. Foi o quanto urgiu a clecis:1o do 
Bispo. destinando-lhes um p:íroco. Assentou-se :1 matriz de S:tnto .•\ntônio 
qu:tndo a faixa do altiplano começt de novo a enladeir:tr-se. Bem arr:ís, assi-
nalando limites. a casa e igrej:1 com·entuais dos religiosos cmnelitas ctkados. 
onde :to pé le\·anraram os irm:íos terceiros :1 sua igreja. No espaço porém, a 
que se foi reduzindo no setecentos, conta com a igreja de N. Sra. ela Conceiçto 
dos homens p:trdos. :1 Conceiçlo elo Boqueir:1o: com :1 c1pela do Patrocínio do 
Senhor S:1o .José dos :\goniz:tntcs e com du:ts casas de religiosas: as beatas em 
seu recolhimento do Senhor Bom Jesus dos Perdóes e as ursulinas do Com en-
to de N. Sra. da Soledade. Capebs outras, mais distantes ou mais n<Aas, além 
de orat<'>rios a céu :therto. curo rem:tnescenre nuis notÍ\"C'I. até pela concepç:lo 
e\octtiYa, é :1 coluna de N. Sr:t. do Pilar, conhecida por_Cruz do Pascoal.cc De 
quantas matrizes fesrej:l\·am o Di\·ino, nenhunu a excedia em atluenci:t e bri-
lho, com lrnuncbde reconhecida desdl' ~--2. 
S:lo concomitantes em 16-9. a de SJu Pedn.> ,'l(J .SLtl 1 s··s- s-e a c o , . . . :lera-
ml'nto e S:mt'An:l a leste, aponrando os rumos por onde :1 cicbcle ia \encen-
clo os limites d:ts origens. Em seu título. :1 primeira repristina\ a uma inspir:t-
do do primeiro bispo que penitenciou os parricipanres "ela assuada c pris:tm 
de hum cônego cb Sé·. a que :ts suas custas se fczesse hua hermida de Sam 
Os Segadores e a Messe 
Pedro no caminho da \"ila \dha ... Estende-se em reta. das portas de S:lo 
Bento ao ConYento das Merces. Aos olhos do p:íroco. em meados elo século 
\."VIII. era quase uma paróquia castrense, com "soldados ele hum c outro 
regimento c de gente de pouca utilidade, sendo os nobres poucos, por nJo 
haverem nesta matriz grandes edifícios. por ser a mayor parte cazas peque-
nas. a que ndgarmente chamão terreas ... No entanto. nela j:í demoravam os 
beneditinos em seu mosteiro de S:to Sebastião; os carmelitas descalços com 
igreja c casa sob a égide de Santa Teresa. :1 reformadora: os franciscanos 
esmoleres ela Terra Santa, cujo hospício deu nome :l rua. Para os confins, a 
leste, as religiosas conccpcionistas na grandeza conYentual de N. Sra. da Lapa 
e a sudeste, o 1\ecolhimcnto de S:lo 1\aimundo, onde o poder civil mandava 
"recolher algumas mulheres que pela sua m:í conduta o merecem, c algumas 
outras ... Na deprcss:1o que assinala o seu começo, estava a capela de N. Sra. 
da Rarroquinha reunindo negros na Irmandade elo Senhor dos Martírios e 
que também controla\·am a Devoç:1o it Sra. da Boa l\lorte. No confim sul, 
"tendo os pretos sofrido veixações [sicl , na igreja matriz, por parte do \·igário 
[. .. ] resolveram edificar capela própria par:1 o culto :l Senhora do Rosário [. .. ] 
na rua grande de .Joào Pereira Guimaràcs ... Porém. de todos os templos as-
sentados na :írea. nenhum alimentava maior dinamismo que o ele N. Sra. da 
Piedade. "frequentado de grande pc.Ao pela devoç:to deste Santu:írio", cuja 
atuaçJo exemplar dos religiosos capuchinhos fomcnt:l\·a "o exercício da ora-
ç:lo [ ... ]a frequência dos sacramentos cb Penitencia e Eucaristia [. .. ]além das 
prédicas ela doutrina e\·angélica com que incans:íveis o exortam". Inclua-se 
nessa afluência o notório concurso ele negros. sobretudo :1 concorrida bençJo 
ela cabeça aos s:íhados.-
A segunda freguesia resultou do crescente ajuntamento na elevaç~lo 
confronte :l retaguarda cb cidade antiga. ao levante. Sua matriz centralizava 
a :írea demarcada c tem junto a si a primeira casa de religiosas que chega-
ram ao Brasil em 16""""; casa erguida no mesmo sítio ele antiga ermida, com 
fluxo regular de ele\ otos :l im·oct<,·:lo da S:1grada Família em sua fuga e 
desterro para o Egito, e que por \ olta de 1673 transformara-se em curato. 
quando j;í em curso. entendimentos e providencias para a fundação 
ACidade Episcopal 
33 
34 
,,-
com·entual. Por mais de meio século :1 eclificaç:lo nO\·a do Com·ento elo 
Desterro abrigou simultaneamente, ainda que autônomas. a comunidade 
elas religiosas clarissas e a matriz ela freguesia criada em 1679. Ambiente de 
grandes celebrações s:1cras e mais notório ainda. por seu pequeno mundo 
claustral nada exemplar. 
A caminho do centro pelo arruamento suL duas capelas ass1st1am os 
soldados aquartelados ali. A de N. Sra. elo Rosário. no interior das instalações 
do Regimento Velho e a ele Sto Antônio ela J\louraria. inici:niva de um \'ice-rei 
devoto, com drios militares integrando sua primeira Irmandade até que reor-
ganizada no século XIX. veio a ser conhecida como de Sto. Antônio dos 1\.Iilita-
res. Próximos, e com cliscretíssinu presença na \·ida religiosa da cidade, salvo 
um ou outro pregador de fama. sob o teto do hospício de N. Sra. ela Palma 
estavam os religiosos agostinianos rccoletos ou descalços. nascidos ela refor-
ma quinhentista. Na direção oposta, a igreja de N. Sra. da Saúde e Glória. cujo 
título primeiro cL'i nome ao bairro, fomentava com sua Irmandade, a devora 
inspiração do casal fundadort além, a capela filial de N. Sra. de Nazaré e. aqui 
e ali, uma que outra ainda nos batentes de particulares. 
Já passante o meado do setecentos. perfazia-se o cinturão de fregue-
sias suburbanas envolvendo a cidade. Antes. estreit:n·am-se pelo Rio Ver-
melho, a antiga Freguesia de N. Sra. ciJ Vitória e a nova ( 1718) de N. Sra. 
das Brotas que seguia beirando a Freguesia do SS. Sacr:1menro e Sant'Ana 
ao nascenre, até alcançar a ele Sto. Antônio além do Carmo. Alonga,·a-se em 
três léguas. chão ancho para "mil e quarenta e cinco almas. das quais so-
mente vinte e cinco sào de comunh:1o". Rebanho disperso. à exceçào de 
dois pequenos lugares: "hum chamado o sítio da P.ituba e outro que con-
tem duas Armações de pescaria ... obsen·ava o \'ig:írio em 1 7')7. ''Das que 
circundavam as portas ela cidade. nenhuma espelhava melhor a distância 
entre o urbano e a solidào do campo: a pobreza de edificações sacras e a 
prática religiosa hem mais conforme i:ts comunidades crentes espalhadas 
pelo que se chamou sertào. Ambiência que perdura pelo dezenove, pois 0 
incremento :1lcançado sob este prisma. n:lo se lhe encurt:n·a o longe extremo 
quando \·ista da Sé. 
Os Segadores e a Messe 
Até J-')9. a península de ltapagipe que faz ;t\·an<,'ar S:th·ador para a sua 
baía. era uma língu:t ele terra comp:trticb :to longo. pelas Freguesias de Sto. 
Antônio além elo Ctrmo. cb parte de cima. e ele!". Sra. do Pilar. no prolonga-
mento cb prai;t urbana. Criou-se ent\o. :1 Freguesia de N. Sr:t. da Penha de 
Franp e n:t ponta exrrenu ele düo. onde o mar nunsamente exaure-se nu 
impulso cbs suas ondas. aí lc' :tntou-se :1 m:ttriz. lig:tda em cinco arcos de um 
passadiço. ;,s dependências que u Arcebispo fundador esuheleceu para seu 
último retiro e. ao depois, se constituiu em refúgio dos seus sucessores. nos 
meses nuis ctlmosos do quase perene 'er:·to hai:mo. Ainda que suhurh:tna, 
conferir:un-lhe prestígio a entào Ctpela do Senhor Bom .Jesus do Bonfim. 
centro crescente de clew)(,:;lo e romarias. sobrepujando a outro qualquer no 
interior d:t urbe. e também a residênci:t de repouso que os Primazes h:lo ele 
muito busctr no curso do oitocentos. ;\!arco sacro delimitando a no\:t fregue-
sia era a Capeb filial de 1\:. Senhora dos ~lares. Jté que se constituiu em 
matriz. única acrescida ao nup:t paroquial da cidade durante o Império. por 
proposta da Assembléia Pro,·incial ( Ifnll. confirmada pelo Arcebispo ( 18-1 l. 
"Os homens pretos" também aqui, constituíram-se por ,·olu de 1-.)'), C·~• 
Irmandade de N. Sr;~. do Ros:írio. pondo a im;~gcm santa n:1 C;~peb cb Penh:t, 
até que. por iniciatiYa e esforços dos nK·smos irnúos. transferiu-se em 1802 
para a su~t própria. n:1o longe da m;~triz de ;~gora. Nor:h·d era :1 teia de confra-
rias de negros no tecido p;~roquial de S:th ~tdor. quer sediadas nas matrizes. 
quer em templos próprios. o que. se por um belo. insinua coerç:lo cb religiào 
dominante, por outro. também re,·el:t recepti\ icbde ;, k· crist:l. manifest:l no 
empenho e esfon,:os consumidos que o af:l de reconhecimento social por si só 
não explica. tampouco a estratégia de deliberada dissimuLH,::Io. 
A presenç:1 ele religiosos na área. deYe-se a du:1s ermidas próximas, lega-
dos pios ele leigos enclinheir;~clos. cuja :tssistência est;~\·a confiada à presença de 
um ou dois religiosos. "seiYidos por um negro". :\os beneditinos. a ermida ele N. 
Sra. ele .\lonteserrate. enr;~izanclo aqui a ckn.><.::lo cataLI. Os franciscanos ergue-
ram em düo doado. :t de f\. Sr:l. cb Bo;~ \'iagem. com seu hospício. promm endo 
anualmente duas fest:ts dcsucacbs. quai." :1 titubr. com o concurso dos 
''· 
n:t\·egantes. e .t ele S;~o Gonç:1lo :1 que ;~comam cLt ctdade numerosos dCH)tos. 
A Cidade Episcopal 
, .. • J.• ...... 
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Quando a cidade. porém. volta a encontrar o seu núcleo, duas fregue-
sias, criadas por ato único que vinte vezes repartiu a geografia da diocese em 
1718. indicam então. o seu prolongamento na Praia e um endave concentrador. 
na parte alta. A primeira, sob o título de N. Senhora do Pilar, estira-se entre a 
montanha e a marinha. Sua matriz tinha junto a si. contestada casa de religi-
osos do Carmo. arguída de pessoal em excesso e estímulo ao contrabando. 
Contava apenas uma Capela filial de N. Sra. do Ros[trio e SS. Trindade que 
no oitocentos cederá seu espaço à Celestial Ordem Terceira da SS. Trindade. 
Entretanto, rotineira e sua\ e parada em rampa da montanha. à fim de fruir a 
brisa vespertina, cn·aqueando à porta de amigo seu. le\·ou o padre Antônio 
Borges 1\lonteiro a encontrar no pisado do chào. uma medalha de S. Francis-
co de Paula e reencontra-la ali mesmo, tendo-a por guardada na gaveta onde 
a pusera. Foi o quanto serviu de sinal e apelo. Empenhou seus haveres e, à 
honra do religioso austero (séc. XV), ergueu ampla capela no sítio onde antes 
o mato servia à sofrida resistência de quilombolas. Por t~dhas no administrar 
o legado, a manutenção do culto a que o gesto devoto abriu espaço, n:!o foi 
tranquila até por volta de 1843, quando os crioulos da Confraria de N. Sra. 
,'\1àe dos Pobres. alojados na portaria elo Convento de S. Francisco, alcll1ça-
ram do Arcebispo a cessão do templo e o assentir em irmandade própria para 
os louvores ao padroeiro. Caminho à frente. arruinando-se. a ampla constru-
çào do No\·iciado da Anunciada em .Jequitaia, onde os jesuítas ainda ontem 
apostavam a renovaçào da sua milícia. Após a Independência. revi\·eu como 
Casa Pia para meninos órfãos, sob o patrocínio de S. Joaquim. já sem a 
presença de quem a criou e a pretendeu ali instalada. o Irmão .Joaqui, 1 Fran-
cisco do Livramento. terceiro franciscano. andarilhó leigo que marcou com 
obras duradouras. sua passagem por diferentes pontos do Brasil. Integrante 
da área portuária e de melhor comércio, a matriz do Pilar tinha a seu encargo 
a desobriga quaresma! "dos soldados ela Guarniçào das Frotas que veem a 
esta terra··. acantonados em quartel próximo. Compens:l\·a-se da relativa po-
sição periférica. com uma irmandade do SS. Sacramento de prestígio. posses 
c efetivo controle do culto. Tão marcante atuaçào que preponderou muitas 
\·ezes, na identidade do título paroqu ia!.,-
Os Segadores e a Messe 
A segunda. do SS. Sacramento ela Rua elo Passo era traço de estreita 
união entre a Sé e Sto. Antônio além do Carmo. O p~troco a desenhou em 
síntese expressiva (1 '5~ ): "h e tão pequena que a sua longitude consiste em 
duas Ladeiras, uma que desce das portas ela cidade chamada do Carmo. e 
outra que sobe e se termina no Com·ento elos mesmos Religiosos". E arrema-
ta: "ainda que pequena [. .. ] h e bem pm oada com boas casas e todos os fogos 
dela são 408, com 2.028 almas". Mui próxima à Sé por bem situada na urbe. 
gozava de boa cotação entre as paróquias.Além das igrejas elo Carmo, a 
conventual e a dos terceiros, somente a Capela de N. Sra. do Rosário elos 
Pretos, de singular destino. Serviu provisoriamente de matriz e quiseram que 
assim permanecesse. em afrontoso esbulho à posse mansa e pacífica dos 
confrades negros que. com ingente esforço, a edificaram. Contestaram em 
recurso que subiu ao Rei e foi ganho pela Irmandade ( 1726 ). O mesmo não 
sucedendo, vale dizer. a outros espaços de culto, expropriados sem qualquer 
'" indenização, aos seus possuidores pobres, negros ou brancos.- Preservada, 
veio a constituir-se esta capela-igreja em síntese e símbolo da prática católica 
do negro em Sal\'ador. ainda que sob focos de hermenêuticas divergentes. 
Ao riscar em traços largos. a estrutura física da cidade episcopal, deli-
neia-se o cenário amplo, o espaço cênico dos ritos sacros de todo momento 
e os extraordinários dos grandes dias, contextualizados na teatralidade como 
"jogo cotidiano das interações face-a-face, onde todos são simultaneamente 
atores e espectadores". quer nas formas minúsculas dos hábitos. quer nos 
espetáculos onde o aspecto ritual ultrapassa a rotina. 
A cidade desperttYa e se recolhia ao som dos sinos. Insistentes. mas 
distintos no toque das horas. consoante a freguesia, o ato religioso a celebrar. 
e até a excepcionalidade ele uma ocorrência. Obsenou Wetherell que ''o 
repicar dos sinos é quase contínuo e torna-se muito desagradável até que, 
como ocorre com a maioria dos ruídos, a pessoa a ele se acostuma e não nota 
mais tal estrondo ... '') A concentraçào sonora porém. sinaliza\·a a vizinhança 
de complexos religiosos. hierarquizando as freguesias. aferidas em seu pres-
tígio'pela riqueza dos calendários litúrgicos. de marcante feiçào local. Não só 
nas matrizes onde particularmente. as Irmandades do SS. Sacramento se 
A Cidade Episcopal 
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38 
cubtirui:ttn em reais a<. '~1inistr:tdoras do culto. mas pelo que< .tcbum:t :t~_n:s­
centa-se <!e igrej:b con,·entu:lis e doutras. na \':lriedadc dos :1grup:1mcnu's 
reli!li· .-.us kigos. '-• 1ui. twss:ts gr:1d:1(óes. a cidade se ton1·: p:1r:1 <• clero '>ec·u-
Ltr ou diocesano. u centro de oportunidades na :1scen: ,,, ' r•_·i igi< >.'<I e soci:tl. 
por e\·idência maior. nwlhor remuner:tç:lo suplementar. !lJcltwres condiçóes 
de mor:1dia. maior acesso ;~o s:1hcr. 
O din:1mismo d:t \ id:t rcligios:1 por0m. ;1 , 1d:1dc '':i<' <' re,·eb\ :1 por 
inteiro. nos esp:l<,:os puhlicos que os olhos ohsen :td< m_·-; .tlc:tn<;:l\·am. No 
interior cbs residénci:1s. a piecbck f:unili:tr p:tlpit:l\ :1 11<' quarto dos s:lntos ... 
no canto cLt cts:l resen:1do :to or:1tório. ou nus registros dos s:1ntos 
enc1ixilh:1dos n:1s paredes. E mesmo nus :1111hientes de culto público. exp:m-
di:l-se :1 dus:lo ele\ ot:l. recolhendo-se n:1 multiplicicLtde de c1pebs menores 
ou bter:1is. nos resen :1dos d:1s im:1gens excepcion:tlnwnte expost:ls. clmhi-
antes cb dcH>c::lo que c:lr:lcteriz:l\·:1 a espiritualid:1de de clérigos e leigos. 
enr:1iz:1d:t no seleto hagiológio de c:1d:t qual. A compreens:lo d:1 cid:1cle epis-
copal impóe neo:·ss:lri:unente o r:1strear desse espírito religioso que lhe deu 
\ id:1. m:1s se foi :trrefecendo na dur:1ç;ío em c1us:t. projet:1ndo um:1 mutante 
fisionomia do crente. pelo p:1r:1doxo d:1 :1scendênci:1 do leigo sobre o clé·ri-
go. como propositor. organizador. fin:tnci:tdor cLts pr:ític1s religios:ls. e :1 
progressi\·:1 inYers:'lo que se oper:1. 
I. Annu:l, (()2-1 2'i .1 illl'({Sâo hn/m{(/csa da Ba/Jia :-;;tludor. Progres~o Ell.. (<)'i.). 
p.ll. ~ 
1. Hm.IO. 18: --Por tmb :1 tcn:1 se ditundiu ;t \UI. dele.>. c :tt0 :10~ contins cb tL'Jl:i ;t.> 
suas pabHas" .\t. 15. -1-: "Foi ~1ssim que nos ordenou o Svnhor: Eu te constitui 
luzeiro elas nacües. JXtr:l k-\·ares a s:1h·ac:·1o :tt(· :1s L'XtrvmicL1dvs cb tL'll':l .. NOIWEG.\. 
C:111:t do Pe. Nóhrvg~t :10 Pe .. \kstJ·e Sinüo: Bahi~t. o<).08.1'>-t'). Cr/11{/S do Fim-
si!: 1 5-í0-ú0 1-\l'io llnnzollle. ll:l!i;li:l; S.P:tulo. EDl.SP. 1'188. I Pcl. 2. -1-'i. 
2. \ll'LI.ER. Bul:t Supvr SpecuLt I. I .\lelllril'ia histr!rica -'"'m' <I rel(~iâo tw F:iahia. 
p. 2h6-6--6') p:tso;illl: B.\HI-\OS.\. D . .fo:'t<> 111 Ctl1:1 ck- ln~tituido do 1-\ispaclo .1 
~~re;a 110 Fiwsil. p _)()() p:tssim: .\CC!< )LI. Cu1:1 dv clo~1ç;io I .I :1 Francisco 
Pereir:t Coutinho. <: For:tl cLt Ctpil:lnl;t d:1 1-\.tlll:t. .1/en!lirias l>istl)/'icos l ... lp. 
1')0. \.ll' p.S. \.'i. 1-\.\HI-\OS.\. (.on>idc·ra<:óv~ .sohrl' a Bul:t Supvr SpecuLt 
ta(;/lntl n.--. p. ~ ?(' 
Os Segadores e a Messe 
3 Kt:NG. Hans. A Igreja. p. 22-26. \. 2 
-1. PORTCG,\1.. Viseu. !\luseu Grão Vasco. Primeira represenraçào de um nati\·o 
do Brasil. 
'i. Regimento de D . .João lil a Tomé de Souza. Duas págilws de 1111/a história. 
Sahador. Progresso. 19'i-t. p.92. 
6. "Concedemos o direito ele Padroado e ele apresent:tç~lo a Nós e ao Pontífice 
Romano que ent:lo existir. de uma pessoa idônea para ~~ dita Igrej:t ele S. 
Sah·aclor. todas as \·ezes que a mesma \·enha a se \agar. ao dito Rei Joào. ou 
ao Rei que entào existir. a qual será nomeado bispo ela Igreja de S.Sah-aclor 
por Nós ou pelo Pontífice Romano que entào for; também reservamos e 
concedemos ao Gdo Mestre ou administr~tdor ela referida Milícia (Ordem ele 
Cristo( ~~ apresentaíJio de pessoas idôneas para as dignidades, canonicatos. 
prebendas e outros benefícios todas as vezes que acontecer estarem \·agos a 
fim de serem colados pelo referido bispo; e declaramos que o direito de 
Padroado e de apresentaçào existe com todo o vigor. essencia e eficácia em 
\'irtucle de \·erdadeiras e totais fundação e dotaçào reais e ao dito Rei compete 
como Gdo 1\lcstre ou administrador. como igualmente lhes compete em \'irtu-
de de \·ercladeira e total cloat;·ào e n:lo poderá de ser derrogado nem mesmo 
pela Santa Sé, sem primeiro inten·ir o consentimento expresso ele Jo~lo. Rei e 
Grão !\kstre, ou administrador que ent:1o for" MCLLER Bula ( ... ( p. 2"73 
~ JEDIN, Co11cílios Ecumellicos p. 11-: TCCHLE & BOCMAN . .\'oml-listória da 
Igreja. Petrópolis, Vozes. p.1-t'i. \'. 3: LLORCA 1/ist. de la Iglesia. p798. \'. 3. 
8. 1\IARQUES. O. 1/istúria de Portugal. p. 300 e 26'i,28'7 \-. 1: !\IARTINS, O. Histó-
ria de Portugal. p.3-t8 e 3Tss: RUBERT. A Igreja 110 Brasil. p. -19, \ .1. 
9 EDEL\VEISS. F. N. Sra. da Conceiç~1o ela praia: a primeira igreja da cidade do 
Sah·ador e o :tmbito primiti\·o de sua freguesia. O l>i-cente!lário de 11111 1/lOilll-
lllellto baimw. p.--. Sobre a cheg:1cla do bispo cf. Vat. Odulfo van der. Prillcipios 
da Igreja 110 Brasil. p. 28--8-t: !\lt'LLER. Bula (.I p.268-69; BARBOSA, Catta 
inst.Bispado 1 ... ] p. 30"": RLBERT A Igreja !lO Brasil. p r:·-. \'1. 
10. COSTA. Luis !\lonteiro cb. O primeiro \·ig{trio da cidade elo Sahaclor. Diário de 
.\'otícias Sah·aclor. 191 10· 19'i8.p.2i 2-t 
11. SOCZA. Gabriel Soares ele. Tratado descritiro do Brasil. p. 13'i. 
12. GOI'riA. Fernando C. Brere história delurballiSIIlO !\ladricl. Ali:mza Editorial 
19-o. p. 36 
13 !\1,\R.X. i\lurillo Cidade brasileira p. 91-98. 
1-t. ACCIOLI. Carta ( .. I p. 110-111 e 'i83: AHC. Brasil-Baia. Cx. -tl. Does -o63 '76. 
l'i. :\Hl'.Brasil-Baia. Cx 111. n 19.-t--t .-- Escre\·enclo a D. Roclrigo ele Souza 
Coutinho diz o Arcebispo em 219 1-99: --( ... ] o go\·ernador me manda 
particcipar a suJ rezoluç~to em se fazer no Collegio hum Hospital [ .. I Collegio 
que estava destinado para Semin;írio. Concluo assim Exmo. Snr. quanto eu 
sinto nào ter no meo tempo hum Seminário". 
A Cidade Episcopal 
39 
40 
16. Rl.BERT p. 18--88: '\1:\"ITOS. Emluçâo histórica e cultural do Pelourinho. Hio 
de .f;tnciro. SEN:\C. 19-8. p. 98: C\LD,.\S . .\oticw gemi[ .. ] p. 2-1. \"ILHEN.\. ,·1 
Rabia nos. XI'IJI p.-1-'i2--'i3 1·. 2. 
1-. RLY. Affonso. :\ igreja d:t Ajuda c a dc1·oçào dos p:tssos. Pequc11o iiltia das 
igrejas da Bahia. Sahador. Prefeitura '\lunicipal. 19-'iO. p. 18: \'11.1-IEN.\ [ .. ]p. 
-1-. 1. 1: :\:\1.\R:\L. Resu/Jlo cbmno/!!gico [. l p. -11-'i: .-\1.\"ES.\Ltriet:t Folhas 
IJ/Ortas f .. J p. 8-10. 
18. Collstituiçôes PrilJleiras I. J LiiTo 111. Tit I f. n. -1<)1. 
19 BARBOSA. A Padroeira doEwado da Bahia. Sal\ ador.Bcneditina. I 9--'i. p.l r. 
ACCIOI.I. Hela\·:1o da freg. de 1\.Sr:t. da Vitória. p. 3-6, 1·. -'i: SANT\ ,\JARI:\. Fwi 
.-\. de Sallfuârio .\/ariano. Tit I, p. 23-28: \'!LI IEN.-\. p -1-'il. 1·. 2. 
20. DANTAS. 1/istôria das 111:~uli11as 110 Brasil. p. 0-'i-98: Portaria de 2-'i.Ot.18-'i-l. O 
Xoticiador Catbo/ico. n.-1). 2W-1 18-'i-1. 
21. Rl..BEHT p. 108.200.218. 1· 2: BARBOSA . .-\ paróqui:t do SS. Sacramento c 
Sant'Ana. p. 3-'i3-69: VII.HENA. p. -1-18. 1.2: SANT\ '\1.1\RIA Fr. Tits. -1<)-)0. p.-6-
80: BARBOSA. Ffe/Jleridcs (. .. ] p. 60. 13-1.36-1. -192: Cartas Baia11as.· 18-21-.24. p. 
3-'i-"49; BARBOSA.Reta!hos de 11111 a!lfUii'O. p. 9-t. 
22. ACC!OLI. Notícia sobre a freg. de Sto Antônio além do Carmo. p.3-3. 1.-'i. 
23 DIAS. Carlos 1\lalhciros. Carta do Bispo ele S.Sah-:tdor ao Rei: II.0-1.1-'i-'i-1. 
História da Colo11izaçào Portuguesa do Brasil Porto. Lit. Nacional. 1921. 
p.369. 1. 3: ACCIOLJ. Dcscri<;·ào ela freg. S Pedro 1-.:;-. p.r), 1·.): RO\\.ER. A 
ordelJI frallciscmw 110 Brast!. Petrópolis Vozes. 19·1- r 1-'i--W: VIU IENA. 
p.-16.1. I e r<-~-1-. 1· 2: VERGER. Xotícias da Bahia 1850. p.6-'i. 93-9-'i: S,\L-
Gl.'EIRO. Notícia das igrejas da capital da Bahi:t: 188-. p.-10: SAN \IARINO. 
Os capuchinhos na Bahia. Aliais do f Co11g. de llist. da Bahia. Sah·:tdor. 
IGHB .. 19-'iO. p.-'i-18. 1·.-1 
2-1. NASCI!\ lENTO. Ana A. O Coll!'ellfo do Desterro da Bahia. p 29-31: SANTA '\IA RIA. 
Fr. Tit.2. p. 30: S:\LGl'EIRO. Notíci:t [ .. ] p. -11: ACCIOLJ. Represcntaç:1o d:t 
Ahacless:t do Desterro ao Rei. p. -189-91. 1·. -'i: ARAGAO _Ir .. . l!elJlória histórica 
da Capela de Sto. A11t6nio da .llouraria.: .-\1.\'ES. \brieta. Igreja de N. Sra.•da 
Saúde c Glóri:t. Peque11o (,'uia das Igrejas da Bahia: 
2-'i. ACCIOLJ. Relação da freg. de N. Sra. da \'icroria- 1-.:;'- Norícia de N. Sra. d:ts 
Brotas. p. 3-6. 1·. -'i: r\ H L. Ah·ar;í Regi o de 11.0-1.1-18. Códice I T6. tl 112: 
26. '\IOREIRA. Jerônimo Igreja de !\i.Sr:t.d;t Penha de Itaragipe. Peque/lo (/ttia 
das Igrejas da Bahia. RI 'BERT. /1 Igreja 110 Brasil p. 1-9. 1·.3: BARBOSA. Os 
quatro primeiros p:írocos da Paróquia dos \lares. p. 2-13--1): COSTA. Luis 
'\lonteiro da. A de1 o<;·Jo ele NSr:t.do Ros:írio na cidade do Sah-ador. Rer. do 
lnst. Genea!ó._gico da Bahia. n. 11. p. HH-6-'i. 10-'i9: \'ll.IIENA. p. -10. 1·.2: RLY. 
Affonso. :\lont-Serrat: o forte e a igrej:t. Peque/lo Guia .. 
r. \'ll.IIENA. p. F.~- 1: S:\l.GL'EIRO. Notícia[ .. ] r -'iO--'il: PINHEIRO. Osmar. 01_jáos 
de S.joaqui111. 111eu co!IC'gio 111i11ba !'ida. Sah·:tclor. Contemp. I 986. p. +12: ACC!Ol.l. 
Os Segadores e a Messe 
. . 1 t., 1· Plu--1-.:;- p :r) ,. -'i: OTT. Ctrlos. Atll'idade mt(,tica 11as Descn<.;:to c a lcg. c o I. . . -· . . . -
. · .. 1- p1·1c11 -1, (/(' '){11!(-l.JW 11a cidade do SalradorBahi:t l rB:t. 19 9. l/5 rCfil.' li •-' · ' 
28
_ -\CCIOI.I. Jkl:tç:lo d:t frcg. do Sacr:tmento da ru:t do Passo-1-.:;-_ p. 3--1. 1·.-'i: 
~~OSlA. 1..\1 d:t. .\ cleYoç:lo de N. Sr:t. do Ros:'trio [ .. ] p. <)-'i-11-. Par:t os_ msucessos 
1-er: 0.-\NT-\S. 1 Iistóri:t cl:ts ursulinas p ~9: COST\. 1.. \1. d:t. lgr. c Com· ele N. 
Sr:t. d:t Solecl:tcle. p:tssim: S:\l.GI.EIRO. F Notíci:l[.J p. 31-32. (13. 
BIAO. \nninclo.J. Tc:ttr:tlid:tdc c cspl'l:teul:tricbclc. A Tarde0t!turc":_l501 1~90. 29
. p 6_-: :\ . \I. c ,\ 1 oz e a alma dos sinos A Tarde. O<) o-. I (r -1. p.-1: \\ El H E REI.!.. 
I . 1'1'>-..., Pl Brasil- apulltall!ellt(>S sobre aBa na - ' -L. -' · p. - . 
A Cidade Episcopal 
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·A distânci{f he htítl dtscu/j)(t culurid{f. co111 que /tufo se disculf•o. 
tudo jXI,,:,o. e tudo nus 11/CSI//us descunn·rtosjlul 
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A baía que nas origens. à honra ele Todos os Santos. quiseram os 
ách-cnas assim nomeá-la, quando se lhes deparou a l ele non:m-
bro de 1-'íOI, impôs-se com tal força ao ponxuncnto circuncbnte. 
constituindo-se em referência que abso1Yeu por inteiro a configu-
ra~·ào da Capitania e. mais tarde a Prodnci:l. 
.. Toma esta Capitania o nome da Bahia. infere Frei \'icente do Sah·aclor. 
por ter uma t~1o grande que por antonomásia e excelência se lcYanta 
com o nome comum e aprop1iando-se a si se chama a Bahia. c com 
razão. porque tem maior recônGIYO, mais ilh;lS e 1ios dentro de si que 
quantas são descobe1tas em o munch tanto que, tendo hoje 1162""'] 
cinquenta engenhos de açucare para cada engenho mais de dez la\Ta-
clores ele .canas .... todos têm seus esteiros e po1tos paniculares: nem h[l 
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tc1Ta que tenha tantos caminhos. por onde se naYega ... 
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Nos primórdios, para pisar o sert~1o era o h~tstante deixar a cicbde. ,\Ial 
sumi~un ~ts hordas da concha deste mar interior. as matas cerraYam-se ao 
desafio das entradas. Porém no passo declinante do setecentos. subir ao 
serr:1o e li estar. era ter por desconhecido o litoral. em grada<,·ôes que do 
sert~1o ele baixo estir~n·am-se ao sert:1o de cim:t.c 
O processo colonizador mais concentrado e contínuo. a cana de a~·uctr 
da economia exportador:t, ampliaram o espaço elo Recônct\ o e estreitar:tm ;, 
cicbde os seus núcleos florescentes. fazendo recuar o sert~1o. Até mesmo hab 
afora. rumo ~tu sul. o f:ícil ctminho do mar. o domínio nuis antigo e seguro 
dessa costa, \ arrida ele seus naturais habitantes integrar:tm mais c mais ao 
circuito desse intcrc:'unbio. :1 faixa que corre até :1 baía de Camamú. incorpu-
rando<t ao Recônca\·o. em e\ iclente sub\ crs:1o geogr~ítka. 
O que se sobrepunha em critério último de m:trcmtc clareza. er:1 a 
circum·izinh:mça ou lonjura. definindo o maior ou menor cont:tto com S:th a-
dor. Daí as \·acibçôes no zoneamento de ent:lo. desnortc~mtes para o moder-
no rigor carrogr:tfico. Acuda em exemplo. o inserir no sert;lo de baixo as 
freguesias de S:tnto Amaro do Ipitang:t. do Di\·ino Espírito Santo da , il:t de 
Abrantes e de S. Pedro do Assú da Torre. listadas pelo Cônego Antonio Borges 
Leal, atendendo em 1 '798 ao Conselho ( ·ltramarino. quando s~1o litor:'tne:ts c 
próximas à cidade. 
O que importa é n:1o dissociar a expans:1o cb Igreja na Bahia. da gente 
que a constituiu c a cb se foi incorpor:mdo. Soh este prisnu, n:1o é difícil 
perceber uma Igreja ancorada em larga escala. na urbe e em seu RecônctnJ. 
E assim foi pens:tcb e sua prática se orient:n·:t a p:trtir dess:t circunst:lncia. Os 
problemas eram aqueles que os olhos cb :tlta hier:trquia -;tlctnct\·:tm. E os 
que surgiam :1 dist:'mcia e repercutiam por d. eram em geral, filtr:tdos por 
este foco redutor. Seguramente, confrontando o sert~1o. era uma Igreja litorft-
nea que mal conseguia soltar as am:trras dessa ancoragem e encurtar a dis-
t:ínci:t de um campo a outro. Contudo, a\ anç;n·a c seus passos percorreram 
os c:uninhos abertos :1 explorac~1o econômica e ao controle político-adminis-
tratiHl. quer antecip:mdo-se em frentes mission;írias. quer :tcompanhando as 
concentracóes produtor:ts. quer assistindo aos grupos menores e dispersos. 
Os Segadores e a Messe 
Assim foi que se Yoltou para o interior da baía, aproximou o litoral sul, 
pontuou amiudando o litoral norte e lentamente ascendeu ao sertão. 
As portas do setecentos< 1698), em circunstanciada informação ao Rei, 
sobre as condições do \·iver católico no sertão da Bahia. o anônimo missioná-
rio aponta que "a sahir da cidade [. .. ], ou de suas circunferências, se abrem 
tres caminhos mais communs para aquelles dilatadissimos Sertoens: chama-
se hum a estrada da Costa, por se ir encostando a ela pela parte do mar: o 2º, 
o Caminho daMata, ou do Sertào do meyo: o 3º pella agoa fria da Cachoeira: 
buscando a Pinda. e mais em breve o Caminho do Sertão de sima [. .. )todos 
tres vão cortando, como para o seu centro, para o ryo de S. Francisco distante 
da Bahia 100 legoas, e por algumas partes mais, segundo o maior ou menor 
gyro das estradas, que a elle se encaminhão"_< 
Dos dias fundadores ao ano de 1676, quando elevada a Igreja Metro-
politana. a Arquidiocese de Sào Salvador da Bahia dilatara em muito o seu 
espaço e a grande linha fronteiriça recortando-a para o interior. era agora o 
rio de São Francisco. Águas além, s:lo terras da Diocese de OI inda, sufragânea 
com a do Rio de Janeiro ao novo Arcebispado, criadas à mesma altura. De-
pois de sulcar essas terras quase a prumo, o rio começa a int1ectir, dando 
contorno ao norte até lançar-se no mar. Recorde-se neste ponto a Bula de 
1551, fevereiro 25, que ao descer da foz sanfranciscana pela costa à ponta do 
Padrão na entrada da Bahia, recobrindo o rumo do Fora!, integrava pela praia 
a futura Capitania de Sergipe d' El Rei que assim permaneceu até 1910. Avan-
çou pelo litoral sul até alcançar na divisa do rio Jequitionha a Capitania de 
Porto Seguro, que era parte ela Prelazia, logo Diocese do Rio de Janeiro. 
Ajunt;n·am-se ainda algumas freguesias ao norte das l'vlinas Gerais, que mes-
mo quando incorporadas à administraç:lo ciYil da sua Capitania, continuaram 
eclesiasticamente ligadas ao Arcebispado.' 
Em face ele t:lo \·asto território continuadamente ampliado, compreen-
de-se a hipérbole elo mesmo anônimo missionário, quando asseverava que 
para ;n·aliar com acerto, as condições da Yida cristã nessas áreas. "he de 
advertir. que sendo tantos os Portuguezes, q' em cada anno recolhem em sy 
aqueles sertoens, sen:lo tem j:í por ellcs muitos povos congregados. n:1o 
Um Sertão por Diocese 
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nasce de os moradores serem poucos sen:1o de serem as terras tào prolonga-
damente \·astas. que para encher em po\·oaç:1o mystica qualquer cbquelcs 
Sítios, apenas bastaria toda a gente deste Reino, e para enchellos todos. n:1o 
hastari;1o todos os de Europ:1 junctos'". 
l·ma mar de terras e um quase deserto humano. Campo sem fim inter-
pondo-se no modo de ser cristào, no aparecer de \'ocacionados, no desem-
penho do clero diocesano, na formaçào das paróquias. "A geografia, sem 
condicionar os homens de modo irremedi:ível, esr;í por detr;ís da história"." 
O mapa dessa geografia diocesana só alcançar;í estabilidade em mea-
dos do oitocentos, quando desdobra-se aincb mais. Buscando alinhar-se ao 
mapa cb Pro\'íncia, o Arcebispo alcançou da romana Congregaçào Consistorial, 
atran~s do Decreto de 2') de maio de 18'54, incorporarar as freguesias cons-' 
tantes da Comarca do São Francisco que desde 1827 Pedro I anexara à Bahia, 
hem assim aquelas da antiga Capitania de Porto Seguro, esta que no plano 
civiL junto à de S . .Jorge dos Ilhéus jú forma\·am terras baianas desde 177'5. 
Por outra parte, a criação da Diocese de Diamantina. nesse mesmo ano de 
18'54. ahsoJTeu as treguesias mineiras que asstm se desligaram. 
Esse sertào que para ser desmesuradamente grande. bem dispensaria o 
que lhe foi acrescentado no século XIX, começou efetivamente a contar com 
um clero diocesano menos escasso. pela crescente criaç:lo de freguesias. 
resultantes das concentrações demográficas em áreas economicamente prós-
peras e da desarticulaç:lo das missões permanentes, fruto abrupto da política 
pombalina. Ainda que em traços largos. a relev:'tncia do seu delineamento se 
impôe por permitir situar o clero em destaque. É que este deixa de ser ape-
nas urbano. fixando-se também no interior. donde começ-a\·a a pro\·ir candi-
datos em maior número. O desempenho rural propiciar;í o exercício de fun-
ções prestigiosas n:1o só ach-incbs ele clelegaçào eclesiástica. mas no Brasil 
Império, oriundas também cb inst:'mcia política. por deput:1ç:lo pro\·incial ou 
liderança articuladora. o que ele uma parte ou de outra abrirá caminho para o 
rol elos notá\·eis. 
A diocese que é o espaço institucional m:lior, repartiu-se em um sem 
número ele outros menores que s:1o as freguesias ou paróquias. S:lo estas o 
Os Segadores e a Messe 
"cenário pri\ ilegiaclo n;1o só por stta qualicbcle de apresentar o quotidiano 
da Igreja particular. quanto por sua inegável posi\·ão como instituiç;lo especí-
fica da mesma" s Ao circunscre\·er parte da popubç:1o crente, intensific1va-se 
0 
controle hierárquico. A incorporaç:lo, o aferir e o acompanhar a prática 
religiosa ao longo cb vida, através elos ritos sacramentais e afins, conferidos 
com exclusi\·idade por seu titular ou com sua licen\·a. privilegiou o lugar em 
que 0 presbítero diocesano se desincumbe do ofício que lhe é próprio. Sob 
este prisma constituiu-se em referência que permitia perceber a efetiva ocu-
paçào do espaço como Igreja local. Aqui patenteiava-se a pertença, expressa-
va-se 0 \'i\·er eclesial e revelava-se sobretudo. a mediaçào elo clero. Atente-se 
porém que ao destacar esse ângulo, ele modo algum ignora-se o viver cristào 
informaL particular. doméstico que independia dess:1 mecliaçào. quer por 
inacessí\·eL quer pela reserva com que a dist3ncia hierárquica inibia a procu-
ra. ainda que a ela se nào opusesse. Recorre-se neste estudo ao institucional 
e ao conjunto dos fiéis enquanto concorrem na compreensão do ser e \·iver 
do clero. É pela relaçào clero e fiéis que se corporifica a Igreja e o lugar por 
excelência em que essa relaçào se exercita é a paróquia. 
O processo cb gênese e evolu<..'ào elas freguesias nào foi unilinear. como 
pareceu ao Pe .. loào de Barros: --a história cb Bahia carhólica começa com a 
Um Sertão por Diocese 
SI 
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catechese, desdobra-se com as missões e completa-se com as freguesias".'' 
Desde as origens, apareceram dois campos nitidamente distintos: a missão e 
os núcleos povoadores. Converter a uns e a outros alimentar a Fé. Aos pri-
meiros, a missão que por se revelar aqui algo realmente novo, sem preceden-
tes, exigia isenção para o trabalho catequético. Aos segundos, a freguesia ou 
paróquia no contexto da cristandade que se pretendia cominuada pelo aten-
dimento ordinário às necessidades crescentes, ainda que em habitar muito 
singular. Progressivamente a primeira perderá espaço e prioridade. Multipli-
cavam-se as freguesias, prevalecendo como fatores de homogeneidade cultu-
ral que acabavam por dissolver a missão. 
Na viela das freguesias que nasceram, floresceram, declinaram ou ex-
tinguiram-se, interagiram fatores tais a área e seu meio ambiente, o afluxo ou 
o êxodo da população pelo incremento ou decadência da sua economia, o 
nível de organização social. Gradações e variantes que não cabem esqueci-
elas no ajuntamento ou dispersào da gente fiel que reclamava assistência. 
A base física da freguesia era esse recorte espacial, atribuído à respon-
sabilidade elo pároco ou vigário, a quem se confiava a cura d'almas dos que 
ali residiam. Na Igreja Latina sua história desdobra-se em processo descontínuo, 
ligado a circunstâncias regionais. As primeiras criadas no Brasil, a inclicaçào 
de seus titulares, aconteceram sob a expectativa e realização elo Concílio de 
Trento < 1')4')-1')63) que assinalou uma etapa nova em sua configuração, bus-
cando sanar abusos com medidas que lhe pareciam remédios. O costume 
clivisórioclevia ser mantido. Onde assim nào acontecesse por n3o possuírem 
limites precisos, nem seus pastores um povo certo para dirigir, "adminstrando 
indiscriminadamente os sacramentos a quem os pede. devetn os bispos para 
uma cura mais eficiente das almas. dividir o povo em determinadas paróqui-
as, confiando cada urna delas a um Pároco próprio e perpétuo''.
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Nestas terras brasílicas, a realidade paroquial ainda que jungicla às dis-
posições tridentinas, apresentava condições imeirameme diversas do ociden-
te europeu, em particular o ibérico. Admitindo-se segmentar o curso em que 
se multiplicaram,

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