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6 Historiografia brasileira contemporânea

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22/04/2024, 15:02 Historiografia brasileira contemporânea
https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/04411/index.html?brand=estacio# 1/57
Historiogra�a brasileira contemporânea
Prof. Rodrigo Perez
Descrição
Atualidade dos debates históricos no Brasil.
Propósito
Examinar a formação da historiografia brasileira contemporânea de
maneira a explorar as correntes historiográficas em voga para se manter
atualizado na área de estudos do historiador.
Objetivos
Módulo 1
A institucionalização do Sistema
Nacional de Pós-Graduação
Analisar a institucionalização do Sistema Nacional de Pós-
Graduação.
22/04/2024, 15:02 Historiografia brasileira contemporânea
https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/04411/index.html?brand=estacio# 2/57
Módulo 2
O topos explicativo das agências
subalternas
Analisar as principais características epistemológicas e políticas da
história social.
Módulo 3
Brasil em tempos de crise
democrática
Identificar os desdobramentos da crise democrática iniciada em 2013
na produção e na circulação social do conhecimento histórico.
Introdução
A Lei 14038/2020 regulamentou a profissão do historiador e foi o
desfecho de um processo legislativo iniciado em 2012. Até então,
só existia a profissão de professor de história, e não a de
historiador.
O campo disciplinar se envolveu diretamente nas discussões,
com alguns historiadores demonstrando entusiasmo com a
possibilidade de ver sua profissão reconhecida, o que significa
reserva de mercado de trabalho. Outros, no entanto,
demonstraram preocupação com os riscos daquilo que
entendiam ser a tentativa de uma corporação em monopolizar os
discursos sobre o passado.
Seja como for, essa legislação é marco de um processo de
delineamento da historiografia profissional no Brasil que teve

22/04/2024, 15:02 Historiografia brasileira contemporânea
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início da década de 1970, com a publicação do I Plano Nacional
de Pós-Graduação (IPNPG).
Existe produção historiográfica no Brasil desde o período colonial,
sendo o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) o
primeiro esforço de organização institucional dessa produção. No
entanto, não estava em questão na época a profissionalização da
história e do historiador.
Essa discussão começou a se manifestar na década de 1960,
com um amplo projeto de reforma universitária idealizado no
governo de João Goulart e interrompido pelo golpe de 1964. A
ditadura militar efetivou esse programa reformista a partir de
1968, sendo o IPNPG, de 1975, parte desse processo.
Estudar a construção desse campo historiográfico profissional é
nosso objetivo. Primeiro, nos concentramos na reforma
universitária efetivada pela ditadura militar, com atenção especial
à institucionalização do Sistema Nacional de Pós-Graduação,
estrutura na qual se deu a organização da historiografia
profissional.
Em seguida, examinamos a produção historiográfica das décadas
de 1980 e 1990, marcadas por uma modalidade de história social
fundada na ideia de agências subalternas. Então, examinaremos
os impactos da crise democrática iniciada em 2013 sobre a
produção e a circulação social do conhecimento histórico.
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1 - A institucionalização do Sistema Nacional de
Pós-Graduação
Ao �nal deste módulo, você será capaz de analisar a institucionalização do
Sistema Nacional de Pós-Graduação.
A reforma universitária de
1968
O ano de 1968 é lembrado como o momento mais violento da ditatura.
Foi quando o Ato Institucional 5 suprimiu as liberdades individuais e a
divisão entre os poderes. Porém, nesse momento, as universidades
brasileiras foram reformuladas por uma ampla legislação.
Invasão do campus da USP pelo Exército quatro dias após a edição do AI-5.
Entre outras medidas, a reforma substituiu o sistema de cátedras pela
organização departamental, o que modernizou e profissionalizou a
carreira do professor universitário, com a adoção de concursos públicos,
planos de promoção funcional baseados em critério de produtividade
científica e regime de trabalho de dedicação exclusiva.
Foi um passo decisivo para a criação de condições institucionais que
permitiram a transformação do professor universitário em cientista, e na
junção do ensino com a pesquisa/inovação tecnológica a partir das
universidades. No que se refere às ciências humanas, desmembrou as
faculdades de filosofia e humanidades da de letras, dando maior
autonomia à área e colaborando para a construção da identidade
profissional do historiador.
A reforma de 1968 modificou a organização territorial
das universidades. No Brasil, as primeiras
universidades, datadas do início do século XX, foram
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instituídas pela reunião de faculdades isoladas já
existentes.
Mais tarde, veio o modelo de cidade universitária, com faculdades
autônomas em edifícios isolados, distribuídos em uma extensa área,
urbana ou rural.
Com a reforma, adotou-se o modelo americano de campus, com
instalações separadas das cidades, possuindo edifícios com funções
bem delimitadas, primando pelo racionalismo da arquitetura modernista.
Apesar de ter sido implementado na ditadura militar, o
projeto da reforma universitária já vinha sendo
discutido desde 1945, quando o Brasil saiu da ditadura
do Estado Novo e entrou na ordem democrática.
Como demonstra Fávero (2006), ainda no Governo Provisório instalado
após a queda do Estado Novo, o Decreto-Lei 8.393/1945 concede
autonomia administrativa, financeira, didática e disciplinar à
Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Em cumprimento a esse dispositivo, o reitor passa a ser “nomeado pelo
Presidente da República, dentre os professores catedráticos efetivos,
em exercício ou aposentados, eleitos em lista tríplice e por votação
uninominal pelo Conselho Universitário” (art. 17, §1º) e a administração
superior da Universidade passa a ser exercida pelo Conselho de
Curadores, além do Conselho Universitário e da Reitoria. Segundo
Fávero:
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Para a autora, foi nesse momento que começam a esboçar-se nas
universidades algumas tentativas de luta por uma autonomia. Todavia, a
situação é complexa. Bitencourt observa que “Mesmo depois do Estado
Novo, quando essa Universidade se torna autônoma por decreto, a
situação não muda muito”, sendo suficiente pensar no DASP a intervir,
dia a mais dia, na vida das universidades federais, com aspereza e
inciência (2019, p. 562).
Quanto à institucionalização da pesquisa científica, Paim, fazendo um
balanço das instituições universitárias nos anos 1980, observa:
O impulso original que a pesquisa
científica veio alcançar entre 1935 e
1945 leva a uma grande frustração
na década de 50. Tornada
instrumento de consolidação da
universidade, que fora recusada
sistematicamente ao longo de mais
de um século, a pesquisa científica
não chega, contudo, a assumir
igualmente feição acabada.
(PAIM, 1982, p. 80)
A partir da década de 1950, acelera-se o ritmo de desenvolvimento no
País, provocado pela industrialização e pelo crescimento econômico.
Simultaneamente às várias transformações nos campos econômico e
sociocultural, surge a tomada de consciência, por vários setores da
sociedade, da situação precária em que se encontravam as
universidades no Brasil.
Essa luta começa a tomar consistência por ocasião da tramitação do
projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sobretudo na
segunda metade dos anos 1950. Limitados inicialmente ao meio
acadêmico, os debates e reivindicações deixam de ser obra exclusivade
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professores e estudantes para incorporarem vozes novas em uma
análise crítica e sistemática da universidade no País.
Escola de Cirurgia da Bahia, em Salvador, que junto com a Escola de Medicina do Rio de Janeiro
são as primeiras instituições de ensino superior no Brasil.
O movimento pela modernização do ensino superior no Brasil, embora
se faça sentir a partir de então, vai atingir seu ápice com a criação da
Universidade de Brasília (UnB). Instituída pela Lei 3.998/1961, a UnB
surge não apenas como a mais moderna universidade do País naquele
período, mas como um divisor de águas na história das instituições
universitárias, quer por suas finalidades, quer por sua organização
institucional.
Fundação da UNE em 1937.
Nesse contexto, a participação do movimento estudantil é densa, sendo
difícil analisar a história do movimento da Reforma Universitária no
Brasil sem levar em conta essa participação. Dos seminários e de suas
propostas, fica evidente a posição dos estudantes, por meio da União
Nacional dos Estudantes (UNE), de combater o caráter arcaico e elitista
das instituições universitárias.
Nesses seminários são discutidas questões como: autonomia
universitária; participação dos corpos docente e discente na
administração universitária, por meio de critério de proporcionalidade
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representativa; adoção do regime de trabalho em tempo integral para
docentes; ampliação da oferta de vagas nas escolas públicas; e
flexibilidade na organização de currículos (FÁVERO, 1994).
Os fundamentos programáticos da reforma universitária de 1968 foram
desenhados na ordem democrática entre 1945 e 1964, com forte
participação do movimento estudantil. Tratou-se de uma reforma,
portanto, de dimensão progressista, ainda que tenha sido efetivada pela
ditadura, que jamais relutou em perseguir professores e estudantes
universitários.
Polícia desocupa a Faculdade de Direito do Largo São Francisco em 18 de julho de 1968.
Segundo Reis (2014), essa aparente contradição se revolve quando
percebemos que, apesar de ter tido o objetivo de interromper a cultura
nacional-estatista, característica da década de 1950, o golpe de 1964
não foi capaz de estabelecer total ruptura com essa forma de conceber
o Estado como centro de planejamento do desenvolvimento nacional.
Um projeto de República perdeu-se em 1964.
Nacionalista, baseado no protagonismo do
Estado em aliança com as classes populares
das cidades e dos campos, o programa das
chamadas ‘reformas de base’ experimentou
estranha derrota, saindo de cena sem travar
nenhum combate. (...) O marco inicial, 1964,
não suscita dúvidas. A ditadura instaurou-se,
como se disse, contra determinado programa
– nacionalista e popular. A ruptura aí é clara,
embora as continuidades sejam também
evidentes, como se verá. Perdeu-se um tipo
de República na qual havia uma democracia
limitada, mas em processo de ampliação.
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Ganhou-se uma ditadura que se radicalizaria
com o tempo.
(REIS, 2014, p. 12)
Reis é autor paradigmático de uma corrente historiográfica que
interpreta a história da ditadura militar brasileira não apenas na chave da
ruptura com o período anterior, mas também na da permanência de uma
“cultura nacional estatista” que explica, por exemplo, como o
reformismo universitário plantado na década de 1950 foi efetivado pelas
administrações militares.
Motta é outro historiador que pensa a história da ditadura militar nessa
perspectiva da continuidade. Tratando especificamente das
universidades, argumenta que o espaço acadêmico mostra com
excelência como a relação da ditadura com a sociedade civil não foi
apenas baseada na repressão, mas também na negociação e na
acomodação de interesses.
A ditadura brasileira foi violenta, como
sabemos bem. Matou, torturou, exilou e
demitiu. Entretanto, o Estado autoritário
combinou a violência com estratégias de
negociação e acomodação, para aplacar as
oposições e reduzir a resistência ao seu
poder. Nesse sentido, as políticas de
modernização objetivaram também a
conquista de legitimidade, pois buscavam
atrair apoio social e desmobilizar os
opositores. Tais estratégias foram
particularmente visíveis na relação do Estado
com os as elites intelectuais, em particular
profissionais acadêmicos e produtores
culturais.
(MOTTA, 2014, p. 55)
Nesse sentido, a modernização da estrutura universitária foi um tipo de
concessão que a ditatura teria feito aos intelectuais, que também foram
perseguidos. Ao instituir a universidade nos moldes contemporâneos, o
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regime permitiu que frações da inteligência brasileira tivessem acesso a
posições funcionais estáveis no serviço público, com condições
relativamente favoráveis para o desenvolvimento de suas pesquisas,
algo que vinha sendo demandado desde a década de 1950.
Frei Tito no “Memorial em homenagem aos membros da comunidade USP que foram
perseguidos e mortos por motivações políticas durante o regime militar”.
Não podemos esquecer, entretanto, que essa atuação intelectual estava
condicionada pelo poder militar, que perseguia professores e
intelectuais, ao mesmo tempo em que tentava negociar com eles. É
nesse contexto de modernização da estrutura universitária que devemos
inserir a criação do Sistema Nacional de Pós-Graduação a partir da
década de 1970.
A criação do Sistema
Nacional de Pós-Graduação
Moura (1990) destaca as estratégias mobilizadas pelo governo Geisel
para enfrentar os primeiros efeitos do choque internacional do petróleo.
Para o autor, o II Plano Nacional de Desenvolvimento, publicado em
1975 e formulado para delinear estratégias para o desenvolvimento
nacional até 1979, representou o apogeu da história do nacional-
desenvolvimentismo brasileiro. O nacional-desenvolvimentismo posto
em prática por Geisel não ficou restrito ao plano das macroestruturas
econômicas, pois tinha como uma de suas prioridades:
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[...] a promoção de uma
distribuição de renda
mais justa, o que
requeria um alto
crescimento contínuo,
para que ninguém
perdesse em termos
absolutos.
(SKIDMORE, 1988, p. 31)
A sobrevivência e o fortalecimento do nacional-desenvolvimentismo
podem ser observados, também, no plano da política externa.
Presidente Ernesto Geisel durante jantar oferecido ao presidente dos Estados Unidos, Jimmy
Carter, em março de 1978, período da ditadura militar. Ao lado de Geisel, a primeira-dama norte-
americana, Rosalynn Carter.
Como destaca Reis (2014), sobretudo no governo Geisel, foi recuperada
[...] por meio do pragmatismo responsável, a chamada política externa
independente, de tradição estadonovista e muito presente nos anos
anteriores ao golpe (REIS, 2014, p. 25). O mais importante para a
reflexão que estamos desenvolvendo é que a consolidação e ampliação
da pós-graduação aconteceu nos quadros desse nacional-
desenvolvimentismo.
Como já sabemos, seria um equívoco afirmar que a política científica e
tecnológica brasileira nasceu em 1975. Na verdade, desde a década de
1950, o Estado brasileiro já vinha investindo no setor. Em 1951, quando
o poder público se empenhava em modernizar a estrutura produtiva
brasileira, foram criados a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
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de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq).
A Capes nasceu com a função de expandir e consolidar a pós-
graduação stricto sensu no país, e o CNPq tinha a finalidade de
promover e estimular o desenvolvimento da investigação científica e
tecnológica nos diversos domínios do conhecimento. Tudo isso estava
sendo pensado e planejado:
[...] em função das
demandas dos setores
considerados
estratégicos para a
modernização da
infraestrutura
produtiva.
(DANTAS, 2004, p. 163)
Uma breve análise do texto do I Plano Nacional de Pós-Graduação
demonstra como os pragmatismos estratégico-desenvolvimentista e
político orientaram as iniciativas do poder público para o setor.
Comentário
O objetivo máximo do IPNPG (BRASIL, 1975, p. 125) era transformar as
universidades em centros de atividades "criativas permanentes", o que
aconteceria na medida em que o sistema de pós-graduação exercesse
eficientemente suas funções formativas e praticasse um trabalho
constante de investigação e análise em todos os campos e temas do
conhecimento humano e da cultura brasileira.
O IPNPG precisa ser situado nas diretrizes estabelecidas no II Plano
Nacional de Desenvolvimento. Buscava-se:
Evoluir para uma nova etapa do sistema universitário
em atividades de pós-graduação assumiriam uma
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importância estratégica crescente (BRASIL, 1975, p.
119).
Havia a preocupação em consolidar o sistema de pós-graduação
brasileiro, que, mesmo datando dos anos 1950, ainda não estava,
segundo a avaliação de seus idealizadores, satisfatoriamente
estruturado. O documento é constituído por 57 páginas, dividido em
quatro capítulos, sendo o texto final assinado por Ney Braga, então
Ministro da Educação e Cultura.
A introdução do plano apresenta um vasto
panorama da evolução do sistema de pós-
graduação brasileiro desde a sua fundação. O
segundo capítulo, cujo título é ‘Análise da
Evolução da Pós-Graduação no Brasil’, está
dividido em três partes, que descrevem as
principais características das atividades
desenvolvidas, além de apresentar um
diagnóstico a respeito dos principais
problemas que comprometiam a eficiência do
setor. A primeira parte do segundo capítulo é
a que mais me interessa, pois temos aí uma
série de informações relativas à universidade,
cursos, áreas de concentração, vagas
preenchidas, número de professores e
titulação docente. Ainda que o próprio IPNPG
admita que esse levantamento estatístico
apresente falhas, os dados são fundamentais
para que tenhamos uma ideia da situação da
pesquisa historiográfica universitária
brasileira na época de sua institucionalização
a nível de pós-graduação.
(OLIVEIRA, 2018, p. 203)
Analisando os dados do IPNG, Oliveira (2018) demonstra que:
 Em 1975, 1.740 professores trabalhavam nos 117
cursos de graduação em história existentes no país,
t di 14 500 l t i l d
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O documento A Análise da área de Pós-Graduação em História é uma
importante fonte para a compreensão das expectativas que o Ministério
da Educação e Cultura tinha para a historiografia profissional. Segundo
ele, seria função do ensino pós-graduado em história:
[...] a capacitação de professores
para atuação nos níveis básicos e
que atendiam a 14.500 alunos matriculados.
Segundo o IPNPG, para que as metas de expansão
dos cursos de graduação no período 1975-1979
fossem atingidas, seria necessária a formação de
mais 1250 professores, o que representaria um
crescimento de 71%.
 Por conta dessa meta ambiciosa, a pós-graduação
em história, entendida como o espaço de
qualificação para professores universitários, era
vista como estratégica. Na época, não existiam
cursos de doutorado no Brasil e estavam
disponíveis apenas 255 vagas para os cursos de
mestrado, distribuídas de maneira desigual no
território nacional, já que 90% dessas vagas
estavam localizadas nas regiões sul e sudeste.
 Na esteira dos investimentos na consolidação do
ensino superior e da formação pós-graduada no
Brasil, havia o interesse do poder público em
aumentar o tamanho da comunidade historiográfica
nacional. Já em 1976, quando a Capes começava a
organizar os mecanismos de avaliação de área,
foram publicadas as diretrizes específicas para
vários campos disciplinares.
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superior de ensino e o
desenvolvimento de pesquisas que
lançassem luz sobre as
especificidades da história e da
cultura brasileira e da contribuição
do Brasil para o concerto geral das
nações na história ocidental
moderna.
(BRASIL, 1976, p. 3)
Assim, com a reforma universitária de 1968 e com o estabelecimento do
Sistema Nacional de Pós-Graduação, em 1975, estavam dadas as
condições institucionais dentro das quais os historiadores brasileiros se
profissionalizariam como cientistas sociais. A seguir, estudaremos a
produção desses historiadores ao longo das décadas de 1980 e 1990.
Os anos de 1970 – 1980 na
historiogra�a
Confira os principais aspectos relacionados a historiografia brasileira
nos anos 1970 e 1980.

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Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
As discussões sobre a reforma universitária da ditadura civil-militar
acabam por impactar o campo da História, uma vez que
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Parabéns! A alternativa A está correta.
A reforma universitária de 1968 promoveu o desmembramento
entre as faculdades de filosofia e humanidades e a faculdade de
letras. O desmembrar da área – tendência mundial – permitiu maior
autonomia às pesquisas e às experiências históricas.
Questão 2
A reforma universitária foi feita no período da ditadura militar no
Brasil. Devemos observar que
A desmembrou as ciências humanas.
B proibiu o estudo de História.
C redefiniu história como educação moral e cívica.
D reduziu a autonomia da área.
E interveio no curso de história.
A as proposições foram todas ditatoriais.
B a reforma queria acabar com a universidade.
C a reforma queria salvar a universidade.
D
a reforma queria garantir a vinculação ao
comunismo.
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Parabéns! A alternativa E está correta.
Embora os debates tenham tido culminância durante a ditadura
militar, a construção da reforma foi gestada e discutida em muitos
momentos, desde Vargas. Seus fundamentos foram desenhados na
ordem democrática ao sair da ditadura do Estado Novo, entre 1945
e 1964.
2 - O topos explicativo das agências subalternas
Ao �nal deste módulo, você será capaz de analisar as principais
características epistemológicas e políticas da história social.
História social hegemônica
nas décadas de 1980 e 1990
Na década de 1980, o sistema universitário brasileiro já estava
relativamente consolidado. Dentro dele, os vários campos disciplinares
se organizavam nos moldes que temos hoje: comunidades
especializadas formadas por estudiosos que monitoram as pesquisas
E
a reforma foi estudada e discutida muito antes
deste período.
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uns dos outros, definindo o que seria o conhecimento científico de
qualidade.
Atenção!
No caso das ciênciassociais e humanas, incluindo a historiografia, essa
autonomização disciplinar foi muito impactada pelo ambiente político
da redemocratização, marcado pela crítica daquilo que se entendia ser a
tradição autoritária do Estado brasileiro. Essa cultura política da
redemocratização foi caracterizada pela afirmação da sociedade civil
sobre o Estado. O assunto precisa ser discutido com cuidado.
Pécaut (1989) demonstra que, entre os anos 1920 e a década de 1980,
os intelectuais brasileiros se envolveram nos grandes debates nacionais
de diversas maneiras. O autor afirma que a repressão atingiu
diretamente a comunidade intelectual no último trimestre de 1968,
quando “a censura se torna implacável e as sanções, terríveis” (PÉCAUT,
1989, p. 289).
Revista Civilização Brasileira.
Ele destaca o caso da extinção da Revista Civilização e a perseguição a
alguns professores universitários, como Florestan Fernandes, Octavio
Ianni e Fernando Henrique Cardoso. Segundo Pécaut, a situação da
comunidade intelectual se transformou sensivelmente após meados da
década de 1970, como resultado dos primeiros movimentos de
relaxamento da repressão. O autor destaca não apenas a maior
liberdade de trabalho, mas também o aprofundamento da
22/04/2024, 15:02 Historiografia brasileira contemporânea
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profissionalização dos intelectuais, por meio do fortalecimento da pós-
graduação.
O sociólogo Milton Lahuerta também aborda a cena intelectual brasileira
nas décadas de 1970 e 1980 –tendo especial interesse na atuação dos
intelectuais em instituições como o Centro Brasileiro de Análise e
Planejamento (CEBRAP), o jornal alternativo Opinião, o partido político
MDB (Movimento Democrático Brasileiro), a SBPC (Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência) e o Centro de Estudos de Cultura
Contemporânea (CEDEC) –, a qual deu origem a uma nova oposição à
ditadura, que também criticava o “populismo” dos anos 1950 e 1960. Tal
processo teria resultado no surgimento do “partido intelectual” ou “da
inteligência”, espaço no qual:
[...] os especialistas
saem de seus afazeres e
são impelidos a se
defrontarem com
problemas políticos
e/ou gerais.
(LAHUERTA, 2001, p. 20)
Os intelectuais brasileiros e a
redemocratização
Lahuerta (2001) argumenta que a ditadura quebrou expectativas de vida
ao alterar o cotidiano das pessoas, o que levou esses letrados a
desenvolverem “estratégias de racionalidade limitada”. Assim, nos anos
da abertura, foi inaugurada uma nova relação entre os intelectuais e a
sociedade:
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[...] de modo a ser fornecido um ‘mandato
público’ aos intelectuais, reativando os laços
entre ciência e política, mas de maneira
diferente do vigente no pré-64. Assim, os
intelectuais lutavam ao mesmo tempo pela
democracia e por condições adequadas à
produção científica. Essa institucionalidade
acadêmica dominante teria estimulado o
surgimento de abordagens sociológicas
privilegiadoras da análise das diversas
instituições da sociedade civil. Por outro lado,
pode-se pensar que tal ‘mandato público’
reforçaria a tendência de valorização dos
movimentos sociais da sociedade civil.
(LAHUERTA, 2001, p. 25)
Daniel Pécaut também destaca a junção de pesquisa acadêmica e
política no CEBRAP e no CEDEC, principalmente sob a forma de
consultorias aos “novos movimentos sociais”. Portanto, como podemos
perceber, tanto Daniel Pécaut quanto Milton Lahuerta chamam atenção
para o fato de que, no período aqui em tela, surgiram diversos polos de
pesquisa que passaram a atuar em termos acadêmicos e políticos de
modo muito significativo.
Podemos chamar de “engajamento intelectual político
direto” esse envolvimento dos intelectuais nessas
instituições, que Pécaut e Lahuerta conceituaram
como “Partido Intelectual”.
No geral, os historiadores performaram seu engajamento político de
modo um tanto distinto de sociólogos e antropólogos. Ao invés de
estarem atuando nos tais “partidos intelectuais”, os historiadores
politizaram suas produções dentro do sistema nacional de pós-
graduação, na forma de uma história social comprometida com o
empoderamento retroativo de sujeitos historicamente oprimidos e
fundada na ideia de agência subalterna.
Foram duas as áreas temáticas que mais traduziram esse tipo de
engajamento político: a “nova história da escravidão”, na década de
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1980, e a “nova história indígena”, nos anos 1990.
A “nova história da
escravidão”
Veja a citação extraída do livro Negociação e conflito: a resistência negra
no Brasil escravista, de João José Reis e Eduardo Silva, publicado em
1989, um dos textos mais emblemáticos daquilo que ficou conhecido
como a “nova história da escravidão”.
O texto tratou de uma contundente renovação na abordagem da
escravidão brasileira ao longo da década de 1980, sendo Silvia Lara,
Maria Helena Machado, Sidney Chalhoub, Manolo Florentino e o
brasilianista Robert Slenes os mais notórios historiadores envolvidos
nesse movimento.
É claro que os trabalhos desses autores têm suas particularidades, mas
todos eles, de alguma forma, criticaram a abordagem marxista que até
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então dominava a temática. O artigo de Maria Helena Toledo Machado,
publicado em 1988, resume bem a agenda teórico/política da nova
história da escravidão:
Dentre a variedade de questões que
têm chamado a atenção dos
historiadores interessados na
problemática da escravidão e sua
superação no novo mundo. (...)
Conceitos de resistência e
autonomia entre os escravos têm
sido apontados como núcleos
centrais para uma história
preocupada em reverter as
perspectivas tradicionais e integrar
os grupos de escravos em seus
comportamentos históricos, como
agentes efetivamente
transformadores da instituição.
(MACHADO, 1988, p. 146 [Grifos nossos])
A autora afirma que os conceitos norteadores da “nova história da
escravidão” eram:
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Em seguida, tensiona com as “perspectivas tradicionais” que estavam
sendo revisadas por esses novos estudos. As “perspectivas
tradicionais” eram as de inspiração marxista, que vinculavam a
escravidão brasileira às estruturas do capitalismo moderno. Esse tipo de
análise foi especialmente forte no grupo de pesquisadores que
integrava aquela que ficou conhecida como “escola paulista de
sociologia”, que teve na Universidade de São Paulo, a USP, seu centro
institucional.
Liderada por Florestan Fernandes e integrada por
nomes como Fernando Henrique Cardoso, Octávio
Ianni e Emília Viotti da Costa, a “escola paulista”
interpretou a escravidão brasileira à luz do aparato
conceitual marxista. Bebendo na fonte de Caio Prado
Jr., esses autores destacaram as marcas deixadas pela
experiência colonial na longa duração da história
brasileira.
Entre essas marcas, estaria a exclusão social de grandes parcelas da
população, notadamente as pessoas pretas, por conta da escravidão,
tratada como parte do modo de produção capitalista (ADOLFO, 2014).
Nessa perspectiva, escravizados e seus descendentes aparecem como
vítimas de uma estrutura econômica e social sobre a qual não possuem
agência. Nas palavras de Fernando Henrique Cardoso:
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A possibilidade efetiva de os
escravos desenvolverem ações
coordenadas tendo em vista
propósitos seus era muito pequena.
Não tinhamcondições para definir
alvos que levassem à destruição do
sistema escravista e não dispunham
dos meios culturais (de técnicas
sociais ou materiais) capazes de
permitir a consecução dos
propósitos porventura definidos.
(CARDOSO, 1977, p. 139)
Segundo Robert Slenes, essa abordagem se caracterizou pela
“marginalização dos homens livres pobres e pela vitimização do
escravo, ocasionadas por um sistema econômico perverso” (SLENES,
1999, p. 32). A “nova história da escravidão” confrontou essa tese,
considerada incapaz de perceber os movimentos dos sujeitos
escravizados em suas práticas de agenciamento cotidiano.
Silvia Lara argumentou que os “uspianos”, com sua
abordagem “exclusivamente econômica”, colaboraram
para produzir uma imagem caricata da colonização e
da escravidão, como se todos os que viveram sob esse
regime de poder fossem “incapazes de estabelecer
qualquer agência sobre a vida social, sendo tão
somente marionetes controladas por estruturas
maléficas e perversas” (LARA, 2005, p. 24).
O interesse em destacar a agência das pessoas escravizadas dessa
“nova história da escravidão” ia ao encontro dos movimentos sociais
organizados que se formava nos anos da redemocratização, incluindo o
movimento negro. Essas organizações afirmavam a importância de
fortalecer a atuação no sentido de pautar o Estado, não se deixando
cooptar pelo poder público.
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Definitivamente, “agência” era a categoria que, acionada pelos
historiadores profissionais da época, melhor expressava o ambiente
político da redemocratização. Algo semelhante pode ser observado para
a “nova história indígena”.
A “nova história indígena”
A historiadora Maria Regina Celestino de Almeida é referência
incontornável na renovação dos estudos especializados na história
indígena que se consolidou no Brasil na década de 1990:
A historiadora Maria Regina Celestino de Almeida é referência
incontornável na renovação dos estudos especializados na história
indígena que se consolidou no Brasil na década de 1990. A “nova
história indígena” se formou a partir de duas críticas. A primeira é
direcionada aos estudos que desde o século XIX tratam os indígenas
como pertencentes a uma espécie de menor idade civilizatória, como se
vivessem em temporalidade menos evoluída.
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Carl von Martius e Francisco Varnhagen são as matrizes dessa
perspectiva evolucionista que inspirou a “tese da extinção”,
pressupondo o desaparecimento das comunidades indígenas pela
assimilação ao mundo tido como “civilizado”. A “tese da extinção”
teria sido a responsável por sedimentar uma “visão pessimista do
futuro indígena no imaginário nacional, pois aos indígenas restaria a
apenas a extinção pela assimilação” (MONTEIRO, 1995, p. 222).
A segunda crítica é direcionada à historiografia marxista que teria
reduzido os indígenas à posição de “vítimas incapazes” da conquista
europeia, tratada como parte da história do capitalismo. Aqui, a “tese da
extinção” é reconfigurada a partir das ideias de “genocídio” e “extermínio
étnico”. Os principais representantes dessa interpretação seriam
Florestan Fernandes e Darcy Ribeiro.
Florestan Fernandes.
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Darcy Ribeiro.
A “nova história indígena” aciona o topos explicativo da agência
subalterna para confrontar a tese da extinção. Segundo John Monteiro:
Ao passo que aquelas subordinavam o
pensamento e a ação dos índios às
estruturas inconscientes enquanto estas
enquadravam as sociedades invadidas como
inermes e inocentes vítimas de processos
externos, a tendência geral era a de
minimizar, ou mesmo eliminar, os índios
enquanto atores históricos. Em contrapartida,
a antropologia histórica buscava qualificar a
ação consciente – agency, em inglês – dos
povos nativos enquanto sujeitos da história,
desenvolvendo estratégias políticas e
moldando o próprio futuro diante dos
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desafios e das condições do contato e da
dominação.
(MONTEIRO, 1995, p. 226-227)
Aconteceu na década de 1990 em relação à história indígena
movimento semelhante ao dos anos 1980 em relação à história da
escravidão. A coletânea organizada por Manuela Carneiro da Cunha
(1992) é marco fundador dessa “nova história indígena”. O livro reuniu
textos que abordam aspectos que até então recebiam pouca atenção,
como as formas de resistência por meio da religião, da cultura, da
diplomacia e da negociação com os colonizadores.
O trabalho de Vainfas (1995), outro marco importante dessa renovação
historiográfica, mostra como as religiosidades indígenas não foram
passivas no processo de conversão, sendo capazes de pautar a
inquisição portuguesa, inspirando normas, punições e até mesmo
negociações e práticas informais de tolerância ao que era considerado
“heresia” pelo Santo Ofício.
Pataxós e seus maracás em ritual.
A trilha aberta por John Monteiro, Manuela Carneiro da Cunha e Ronaldo
Vainfas foi seguida por outros autores. Os trabalhos da já mencionada
Maria Regina Celestino de Almeida se debruçam sobre como as aldeias
coloniais dirigidas pela administração portuguesa eram um:
[...] mal menor para os
índios, diante das
guerras, escravizações
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em massa e crescente
redução de territórios
livres e recursos
naturais.
(ALMEIDA, 2003, p. 32)
O trabalho do brasilianista Warrean Dean (1996) impactou
profundamente a percepção que os estudiosos brasileiros tinham a
respeito da devastação da mata atlântica, ao afirmar que os indígenas
eram:
[...] indiferentes à
noção contemporânea
de ecologia, estando
bem longe de serem
guardiões da
integridade da �oresta.
(DEAN, 1996, p. 16)
Dedicado ao Maranhão do século XVII, o trabalho de Rafael Rocha
(2013) mostra como cargos e títulos eram distribuídos a chefes
indígenas que prestavam serviços à Coroa. Já o estudo de Silvana de
Godoy (2017), sobre a Vila de São Paulo do século XVI, examina a
formação de uma elite mestiça por meio da estratégia do matrimônio
que atendia aos interesses de colonizadores e indígenas.
Por mais diversificadas que sejam as abordagens
propostas por esses estudos, a perspectiva da agência
subalterna é o topos que atribui identidade
teórico/política à “nova história indígena”. A história
social dos sujeitos subalternos foi, portanto, o gênero
predominante na historiografia brasileira nas décadas
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de 1980 e 1990, quando a ordem democrática que
sucedeu a ditatura se consolidou.
Os historiadores estavam acolhendo as demandas dos movimentos
sociais organizados que se formaram no contexto da redemocratização,
e que tiveram influência suficiente para inspirar a produção de toda uma
legislação de proteção às minorias, como pessoas pretas e indígenas.
A Constituição de 1988, alicerce da “nova democracia brasileira”,
traduziu essas vitórias. Na segunda década do século XXI, entretanto, a
democracia brasileira entrou em um ciclo histórico de crise, deflagrado
pelos eventos que ficaram conhecidos como “jornadas de junho de
2013”. Essa situação de crise democrática impactou diretamente a
historiografia profissional.
A predominância da história
social
Confira alguns detalhes sobre a recuperação das principais discussões
sobre o topos inaugurado por um novo momento da historiografiabrasileira.

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Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
O predomínio de abordagens sociais na historiografia brasileira é
marco de uma integração autônoma do campo e do aparecimento
de vozes e temas que eram subalternizados. Qual alternativa
melhor exemplifica o impacto de novas abordagens teóricas sobre
um campo historiográfico?
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Parabéns! A alternativa E está correta.
As abordagens sociais dos intelectuais, que trazem a noção de
grupos desenvolvendo as ideias de vozes e valores, são o ponto
central do debate para uma historiografia que supera o pensamento
colonial.
Questão 2
A rediscussão de valores predominantes na historiografia trouxe um
importante papel aos estudos sobre o “Descobrimento” do Brasil.
Podemos citar como uma consequência desses estudos
A História das ideias
B História da cultura imigrante
C História dos escravos no Brasil
D História dos índios.
E História de resistência e visões decoloniais.
A
a reconsideração do movimento idealizado e
heroico do colonizador.
B
as empresas de fomento concentraram o
investimento em história indígena.
C
o MEC passou a obrigar o estudo de todas as raças
formadoras do Brasil.
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Parabéns! A alternativa A está correta.
O movimento idealizado de descobrimento e os feitos europeus
vinham sendo criticados e assumiram uma condição de
reposicionamento para conquista e invasão.
3 - Brasil em tempos de crise democrática
Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car os desdobramentos
da crise democrática iniciada em 2013 na produção e na circulação social
do conhecimento histórico.
Produção e circulação social
de conhecimento histórico
Já é um consenso na bibliografia especializada na história brasileira
contemporânea que o ano de 2013 marcou o início da crise do sistema
D
intelectuais passaram a defender um clima de
confraternização como marco de nossa história.
E
a luta de classes entre índios e portugueses passou
a ser a tônica.
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político edificado nos anos da redemocratização e instituído pela
Constituição de 1988.
As crises políticas são caracterizadas pela hipertrofia do campo
político, do espaço de debates e disputas pelo poder. Em situações
de estabilidade social e pleno funcionamento das instituições, é
comum observar certa indiferença em relação ao campo da política
institucional, pois as pessoas tendem a estar envolvidas com suas
atividades cotidianas. Nas crises, a situação é diferente, já que a
desestabilização da realidade libera energia de politização, aumenta
o interesse pelo político e reduz o consenso social.
Uma sociedade em crise estabelece poucos consensos e disputa tudo,
inclusive sentidos diversos para o seu passado. A crise democrática,
portanto, impacta diretamente o trabalho dos historiadores profissionais
brasileiros, que precisam negociar constantemente sua autoridade no
debate travado nas mídias digitais, na imprensa e na sociedade em
geral.
A relação entre o reconhecimento da legitimidade do sistema e o seu
questionamento tem marcos, não como um início ou um fim, mas um
marco de leitura analítica que nos remete como historiadores a perceber
o campo desta produção historiográfica.
A partir do movimento dos historiadores profissionais brasileiros, o
campo de estudo entra em discussão, e os debates se tornam intensos,
mais grupos apresentam debates como sendo embates de narrativas,
mas, de fato, são exercícios negacionistas que ainda devem ser objeto
de análise, e é necessário perceber sua existência no próprio campo.
Anos 1990
Os debates se
concentravam em quem
eram os produtores
Pós-2013
Encontramos em
multiplataformas,
debates que buscam
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legítimos do campo
historiográfico pelo
crescimento de autores
populares “não
canônicos”, ou que
respeitam os debates e
os reconhecimentos da
historiografia.
inutilizar o discurso dos
grupos de produtores
especialistas em
detrimento a uma
tradição de verdade que
precisa ser recuperada.
É sob esse trajeto de tensão, manifestado dentro e fora do campo, que
nos deteremos. Explorar os desdobramentos da crise democrática na
historiografia profissional brasileira é o objetivo desta parte de nosso
estudo. Começamos pelo mercado editorial.
Consumo de historiogra�a
comercial no Brasil
Analisando o mercado editorial brasileiro contemporâneo, o historiador
Rodrigo Perez Oliveira identificou, entre os livros mais vendidos no
gênero de não ficção, a constante presença de textos que classifica
como historiografia comercial, amplamente consumidos como livros de
história, pouco importando se seus autores são ou não historiadores de
ofício. Nas palavras do autor:
O que distingue a historiografia profissional
da historiografia amadora são os protocolos
que autorizam os textos. Se a historiografia
profissional é autorizada por um campo
disciplinado relativamente autônomo a ponto
de delimitar seus próprios procedimentos e
interesses, as ‘obras fronteiriças’ são
autorizadas pelas preferências de um público
que não tem compromisso com os
protocolos que regem o conhecimento
histórico disciplinado. Por isso, na prateleira
de uma livraria comercial, é irrelevante se o
texto foi escrito por um historiador

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profissional, se passou pelo crivo de uma
banca avaliativa, se atende aos critérios de
qualidade estabelecidos pela comunidade
acadêmica.
(OLIVEIRA, 2020, p. 65-66)
Os textos arrolados como os best-sellers da historiografia comercial
são:
Guia politicamente incorreto da história do
Brasil (2009), de Leandro Narloch.
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1808 (2009) 1822 (2010) e 1889 (2013), de
Laurentino Gomes.
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Brasil, uma biogra�a (2015), de Lilia Moritz
Schwarcz e Heloísa Starling.
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A elite do atraso (2017), de Jessé Souza.
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O pecado original da República (2017), de
José Murilo de Carvalho.
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Sobre o autoritarismo brasileiro (2019), de
Lilia Moritz Schwarcz.
Todos esses textos, de alguma forma, produziram interpretações da
realidade brasileira que pretensamente buscavam explicar a realidade
da crise, e isso explicaria, em parte, o sucesso editorial dos títulos. É
importante examinar com cuidado essas interpretações, pois isso nos
permite entender melhor as demandas que a sociedade apresenta aos
profissionais especializados na produção de conhecimento histórico.
É interessante perceber a mudança de perspectiva
olhando um pouco para trás. Pouco mais de umadécada antes desse novo “sucesso” editorial, os nomes
que surgiam eram os de Laurentino Gomes, Eduardo
Bueno e Elio Gaspari. Esses já tinham sido criticados,
mas foram importantes no sentido de adaptação de
linguagem e diferenciação entre o espaço de consumo
de história e o espaço de produção intelectual dos
pares.
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O que Oliveira acaba por estruturar é que esta “nova” abordagem se vale
das novas dinâmicas das redes e, assim, assume um discurso pautado
em narrativas e disputas destas narrativas, até culminar na reconstrução
de uma verdade relativa, facilmente validada diante dos movimentos
das redes. Vamos detalhar:
Guia politicamente incorreto da
história do Brasil de Leandro Narloch
Publicado em 2010, esteve no topo da lista dos mais vendidos na
categoria “não ficção” entre fevereiro e março de 2014 no mercado
editorial brasileiro.
A elite do atraso de Jessé Souza
Esteve na posição de mais vendido em novembro de 2017, voltando a
ocupá-la em janeiro e junho de 2018.
Com todas as diferenças ideológicas que fizeram de Narloch e Souza os
autores prediletos, respectivamente, da direita e da esquerda brasileiras
contemporâneas, há entre eles algumas semelhanças naquilo que se
refere ao procedimento adotado para identificar, e denunciar, as causas
do atraso nacional. Segundo Rodrigo Perez:
Leandro Narloch e Jessé Souza
compartilham a premissa teórica de
que não existe dicotomia entre
pensamento e ação política, de que
todo pensamento é o resultado de
um conjunto de interesses políticos
práticos e que toda ação política é
modelada por linhagens de
pensamento. Nesse sentido, ao
criticar a ‘historiografia
politicamente correta’ e os
‘viralatismos dos intelectuais
uspianos’, Leandro Narloch e Jessé
Souza, respectivamente, abordam o
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atraso nacional a partir de um
exercício de crítica intelectual.
(OLIVEIRA, 2021, p. 18)
Lilia Schwarcz é outro best-seller que se dedicou ao problema do atraso
nacional, apropriando-se diretamente de algumas teses formuladas
pelos “intérpretes do Brasil”. A autora frequentou a lista dos mais
vendidos em duas ocasiões:
Brasil, uma biogra�a de 2017
Livro assinado junto com Heloísa Starling.
Sobre o autoritarismo brasileiro de
2019
Foi o livro mais vendido em outubro de 2019.
Em Brasil, uma biografia, Lilia Schwarcz e Heloísa Starling mobilizam a
alegoria da biografia para sugerir que o Brasil é dotado de uma
“subjetividade”, de um traço de temperamento que atravessaria a
história do país.
Inspiradas em Lima Barreto e Sérgio Buarque de
Holanda, as autoras argumentam que o “bovarismo”
estaria entre as mais perniciosas “manias nacionais”,
consistindo em uma distorção de autoimagem, pois ao
se “olhar no espelho [os brasileiros] se enxergam
sempre diferentes do que são. Ora mais portugueses,
ora franceses, ora mais americanos, ora mais
atrasados, ora até adiantados” (SCHWARCZ;
STARLING, 2017, p. 49).
Junto com o bovarismo, estaria outro vício de temperamento
responsável pelo atraso: o “familismo”, e novamente a referência é
Sérgio Buarque de Holanda, que não é lido como “intérprete do Brasil”,
no sentido que os estudos sociais universitários atribuíram ao termo,
mas sim como “historiador”, ou “sociólogo”, capaz de oferecer um
diagnóstico preciso, e verdadeiro, da realidade nacional. Esses são
apenas alguns exemplos trazidos pelo historiador Rodrigo Perez Oliveira
que mostram como a sociedade brasileira tem demandas por
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conhecimento histórico que seja capaz de produzir sensação de
orientação coletiva em um momento marcado por profunda crise.
Se as produções de caráter identitário cresciam e
levavam a novos olhares, a busca por uma verdade
alternativa e a construção de que historiadores
representavam um projeto de negação do Brasil
cresciam em bordas. A questão da construção de uma
narrativa envolvente, uma retórica bem estruturada e a
idealização de que o trabalho do historiador é somente
recuperar um documento do passado e trazê-lo sem
interpretação complexa ao presente tornaram-se um
problema.
A percepção dessas demandas impactou o trabalho dos historiadores
profissionais, que cada vez mais entenderam a necessidade de
desenvolver estratégias que lhe permitissem dialogar com o público não
especializado. Surgiu, assim, um dos mais importantes campos da
historiografia brasileira contemporânea: a história pública.
A História Pública
Já sabemos que, desde a década de 1970, no contexto da construção
do sistema universitário brasileiro, se formou entre nós a identidade do
historiador profissional, associada ao professor universitário. A partir de
então, as universidades públicas, com seus programas de pós-
graduação em história, seriam os espaços principais de produção do
conhecimento histórico no Brasil, sendo a autoridade dos historiadores
garantida por essa localização institucional:
Negacionismo
histórico
O advento e a
massificação da
internet fragilizaram as
autoridades
disciplinares, em todas
as áreas. A
História pública
A partir dessa realidade
que, no Brasil e no
mundo, os historiadores
profissionais passaram
a investir na divulgação
do conhecimento que
produzem, o que
originou uma área de
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historiografia não ficou
imune a isso. A crise
democrática iniciada no
Brasil em 2013 implodiu
consensos a respeito
do passado traumático
brasileiro, sobretudo em
relação à ditadura
militar, dando origem
àquilo que se
convencionou chamar
de “negacionismo
histórico”.
especialização cada vez
mais influente chamada
"história pública”.
Segundo o historiador Jurandir Malerba (2014), as origens da história
pública estão na década de 1970, quando, no mundo ocidental,
aconteceu a explosão do mercado editorial de massa. Os livros
passaram a ser consumidos por milhares de pessoas, o que teve como
um dos efeitos o aumento do interesse público pelo conhecimento
histórico.
O renomado historiador francês Jacques Le Goff falou em uma “vitória
da história” nessa mídia de massa, tal era o interesse do público por
temas históricos. No Brasil, o mercado editorial consagrou muitos
autores que exploraram o assunto, sem o diploma, mas poderosos em
seu “carinho” com a história, tais como Ruy Castro, Fernando Morais,
Zuenir Ventura, Jorge Caldeira e, depois, Elio Gaspari. Eles escreveram
uma espécie de “jornalismo de época” de qualidade, na melhor acepção
do termo “história popular”. Dedicaram-se à escrita de biografias de
personagens famosos, apoiando-se em pesquisa bibliográfica e
documental rigorosa e em uma linguagem saborosa, com enredos de
romance.
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Metrópole à beira-mar, livro de Ruy Castro.
Com o sucesso desse nicho de mercado, passaram a escrever sobre
períodos históricos, como os da época da bossa-nova, o Rio de Janeiro
da época de D. João VI ou os anos da ditadura militar.
A potência de seu discurso era “a reconstrução”,
negada pela história, e os discursos do campo como
sendo objetivo fundamental da produção histórica,
assumindo o papel de discutir o tempo e não remeter
os eventos, facilmente engolidos pelas paisagens
construídas por esses autores, gerando ambiência e
valor na narrativa.
Além de boa informação e uma prosa de alta qualidade, esses livros
tinham em comum tiragens enormes, com dezenas de milhares de
exemplares vendidos em poucas semanas depoisdo lançamento.
Como homens de mídia (eles próprios a “cara” da mídia), com nomes
reconhecidos e de credibilidade, não lhes foi difícil usar a seu favor os
meios de comunicação onde já atuavam havia décadas. Seu trabalho
pioneiro foi decisivo para a expansão do público leitor de história no
Brasil. Segundo Malerba:
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História e ciências humanas têm um
expressivo papel mobilizador junto aos
indivíduos e grupos, uma vez que lidam com
identidade, memória, participação e
organização públicas, interação e confrontos,
assim como condições de existência. São
processos que têm uma linha direta com o
debate nas universidades e centros de
pesquisa e, por isso, difundir o que pensamos
ali é alcançar interlocutores até então alheios,
reformular conceitos cristalizados por aí,
formar novos referenciais de consciência.
Logo, cuidar da formação de um público.
Desde aqui deve ficar claro o que chamamos
de ‘divulgação científica’ para não
embaralharmos a discussão proposta por
esta entrevista. Trata-se da apresentação de
conhecimento acadêmico, acompanhada por
especialistas da área, sob novas formas e
suportes, para um público ampliado.
(MALERBA, 2014, p. 34)
Fato é que, cada vez mais, o diálogo com o público não especializado
está na agenda dos historiadores profissionais. Por isso, a história
pública se torna tema indispensável para os estudos na história da
historiografia contemporânea.
A história pública não deve ser pensada somente como
um campo de produzir uma narrativa popular, ou
negando debates e avanços. É a compreensão do
interesse vinculado à história e, como a produção de
qualidade do campo, preparada e traduzida, pode ser
levada e gera interesse ao grande público.
Percebam os seguintes produtores do campo da História, como Leandro
Vieira, carnavalesco da Mangueira, e as dezenas de historiadores
presentes nos carnavais, festas do boi bumbá e outros grandes eventos
populares.
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Bandeira Nacional revisitada em obra do carnavalesco Leandro Vieira, para o desfile da Mangueira no
Carnaval, de 2019, do Rio de Janeiro.
Ou ainda historiadores como Francisco Vieira, que atuou como consultor
na novela Novo Mundo, sendo somente um entre muitos.
Recentemente as redes têm ganhado nomes e formas que chamam
atenção. Professores ou pessoas interessadas em temas históricos que
produziram para os pares e estiveram nos cânones por muito tempo,
como Leandro Karnal, equipes que dão suporte a grandes canais como
Nerdologia e Felipe Castanhari (canal Nostalgia e Mundo Mistério, na
Netflix), são exemplos de uma nova forma de pensar a história e sua
produção.
A historiografia, então, deve abandonar seus debates entre pares e
pensar em cliques e no público?
Resposta
Não! Até porque essa marcha de qualidade só se dá diante dos debates
e dos diálogos necessários. Se esse espaço não for ocupado por ela, as
práticas de negação com pouco ou sem nenhum fundamento se
solidificam, e aí as disputas e os debates ficam bem mais complicados.
O papel da história pública como estratégia e debate historiográfico não
corresponde a um campo de trabalho, mas à reafirmação do
compromisso dos historiadores diante dos movimentos
antidemocráticos, que pululam desde então e são reforçados pela
dinâmica das redes. Discursos do primeiro movimento de mídias de
massa são retomados como extrema novidade e encontram eco e são
reproduzidos de forma acrítica.
O conhecimento produzido e debatido no campo não deve ficar restrito,
e deve chegar àqueles que desejam e também ao conjunto social, para o
reconhecimento da História pela nossa sociedade.

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A historiogra�a em tempos
de crise democrática
Confira agora um resumo sobre os períodos de crise política no país.
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Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
A história pública parte da seguinte percepção:
Parabéns! A alternativa E está correta.
A difusão de conhecimentos e debates é parte dos novos
compromissos do historiador diante das crises democráticas e a
A A historiografia acabou.
B A história virou literatura.
C
É necessário um projeto para destruir a deturpação
dos historiadores.
D O historiador deve fazer consultorias.
E O discurso do historiador não deve estar restrito.
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retomada de narrativas que se entendiam até então como
superadas.
Questão 2
A ideia de que o campo da subjetividade em História, em especial
como ela foi praticada no Brasil, permite visões de crise ao se “olhar
no espelho” se refere a uma prática/reconhecimento/vício nacional
que chamamos de
Parabéns! A alternativa E está correta.
Segundo Lilia Schwartz, esse movimento gera uma negação à
identidade nacional, uma distorção da autoimagem, sendo um vício
que precisa ser superado.
Considerações �nais
Existe historiografia (entendida como práticas intelectuais de
conhecimento do passado) no Brasil desde o período colonial. A
A bolivarianismo.
B terrorismo.
C culturalismo.
D decolonialidade.
E bovarismo.
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fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foi o
primeiro esforço de coordenação institucional da historiografia no Brasil.
Aqui, nos dedicamos ao momento mais recente da história da
historiografia brasileira. Vimos como a partir da década de 1970, na
conjuntura da construção do sistema universitário brasileiro, formou-se
a identidade profissional do historiador, associada à figura do professor
universitário.
Desde então, e cada vez mais, as universidades públicas no Brasil se
tornariam, por meio de seus programas de pós-graduação em história, o
principal espaço de produção do conhecimento histórico. Essa lógica foi
desafiada pelo advento da internet e pela crise democrática iniciada em
2013.
Consensos estabelecidos a respeito do passado nacional (como a
repulsa à ditadura) foram implodidos, e os historiadores profissionais
passaram a disputar e negociar autoridade no debate público ampliado
pela esfera digital. Essa nova realidade impactou profundamente o
trabalho dos historiadores profissionais, que passaram a se esforçar em
fazer circular seu conhecimento entre o público não especializado, em
práticas de trabalho que configuraram uma nova área de especialização
na historiografia: a história pública.
O conhecimento histórico sempre traduz as inquietudes e expectativas
do tempo em que é produzido. Nesse sentido, contar a história da
historiografia significar contar a história das sociedades humanas. Foi
isso que fizemos aqui, com atenção ao Brasil contemporâneo.
Nos últimos 50 anos, o país transitou da ditadura para a ordem
democrática e viu essa nova democracia colapsar. Nesse período,
formou a identidade profissional dos historiadores. Mas muita coisa
mudou ao longo desses anos: uma modalidade de história social se
tornou dominante à luz dos valores que pautaram a redemocratização e
a autoridade disciplinar do historiador foi desafiada na conjuntura da
crise democrática, potencializada pela internet.
Podcast
Para encerrar, ouça um resumo dos aspectos mais relevantes deste
conteúdo.
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A formação do regime de autonomia avaliativo no Sistema Nacional de
Pós-graduação e o futuro das relações entre historiografia, ensino e
experiência da história
O engajamento político e historiográfico no ofício dos historiadores
brasileiros: uma reflexão sobre a fundação da historiografia brasileira
contemporânea (1975-1979)
Para aprofundar seus conhecimentos sobre História, escute os podcasts
História Preta e Nerdcast.
Referências
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entre os anos de 1970 e 1980: uma reflexão teórica sobre
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