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0 1 Disciplina: Leitura e Produção de Textos Autores: M.e Luis Gabriel Venancio Sousa Revisão de Conteúdos: M.e Sonia Maria Packer Hubler Designer Instrucional: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm Revisão Ortográfica: Esp. Lucimara Ota Eshima Ano: 2021 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais. 2 Luis Gabriel Venancio Sousa Leitura e produção de textos 1ª Edição 2021 Curitiba, PR Faculdade UNINA 3 Faculdade UNINA Rua Cláudio Chatagnier, 112 Curitiba – Paraná – 82520-590 Fone: (41) 3123-9000 Coordenador Técnico Editorial Marcelo Alvino da Silva Conselho Editorial D.r Eduardo Soncini Miranda / D.ra Marli Pereira de Barros Dias / D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd / D.ra Wilma de Lara Bueno / D.ra Yara Rodrigues de La Iglesia Revisão de Conteúdos Sonia Maria Packer Hubler Designer Instrucional Alexandre Kramer Morgenterm Revisão Ortográfica Lucimara Ota Eshima Desenvolvimento Iconográfico Juliana Emy Akiyoshi Eleutério Desenvolvimento da Capa Carolyne Eliz de Lima FICHA CATALOGRÁFICA SOUSA, Luis Gabriel Venancio. Leitura e produção de textos / Luis Gabriel Venancio Sousa. – Curitiba: Faculdade UNINA, 2021. 57 p. ISBN: 978-65-5944-169-3 1. Autores. 2. Leitura. 3. Livros. Material didático da disciplina de Leitura e Produção de Textos – Faculdade UNINA, 2021. Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 4 PALAVRA DA INSTITUIÇÃO Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) à Faculdade UNINA! Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão Universitária. A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas também brasileiros conscientes de sua cidadania. Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e grupos de estudos o que proporciona excelente integração entre professores e estudantes. Bons estudos e conte sempre conosco! Faculdade UNINA 5 Sumário Prefácio ..................................................................................................... 07 Aula 1 – Ler vai além dos livros: reflexões iniciais ...................................... 08 Apresentação da aula 1 ............................................................................ 08 1.1 Leitura: por que, como e para que lemos ....................................... 08 1.1.1 A leitura é maior do que a gente imagina ................................... 12 1.2 Diferentes formas de leitura .......................................................... 14 Conclusão da aula 1 .................................................................................. 16 Aula 2 – A leitura: interpretar ou compreender um texto? .......................... 17 Apresentação da aula 2 ............................................................................. 17 2.1 Diferença entre interpretação e compreensão de textos ............... 17 2.2 Pré-leitura ..................................................................................... 19 2.2.1 Estrutura .................................................................................... 21 2.2.2 Linguagem ................................................................................. 21 2.3 A leitura ......................................................................................... 23 2.3.1 Leitura exploratória .................................................................... 24 2.3.2 Leitura analítica ou interpretativa ............................................... 24 2.3.3 Leitura crítica .............................................................................. 25 Conclusão da aula 2 .................................................................................. 28 Aula 3 – A escrita na Universidade: principais gêneros .............................. 28 Apresentação da aula 3 ............................................................................. 28 3.1 Condição de produção e leitura: a peça-chave do texto ................ 29 3.2 Tipos de conhecimentos no Ensino Superior ................................ 32 3.2.1 Conhecimento popular ............................................................... 32 3.2.2 Conhecimento filosófico ............................................................. 33 3.2.3 Conhecimento religioso .............................................................. 34 3.2.4 Conhecimento científico ............................................................. 34 3.3 Principais gêneros discursivos utilizados no Ensino Superior ....... 36 3.3.1 Gêneros discursivos mais lidos por estudantes de graduação .. 38 3.3.2 Gêneros discursivos mais produzidos por estudantes de graduação .................................................................................................. 39 Conclusão da aula 3 .................................................................................. 40 Aula 4 – A escrita: reflexões para produzir um bom texto ........................... 41 Apresentação da aula 4 ............................................................................. 41 4.1 Dissertação e descrição ................................................................ 41 6 4.1.1 A dissertação científica e a importância da argumentação ........ 44 4.2 Coesão e coerência ...................................................................... 50 Conclusão da aula 4 .................................................................................. 52 Índice Remissivo ........................................................................................ 54 Referências ............................................................................................... 56 7 Prefácio Olá, estudante! Seja bem-vindo(a) à disciplina Leitura e Produção de Textos. Nesta disciplina, vamos refletir sobre a leitura em diversos contextos: o ato de ler; como a leitura e o livro contribuem para construir uma imagem social de prestígio intelectual; como a leitura no ambiente digital é diferente do analógico; como se dá a leitura no Ensino Superior etc. Além disso, você vai aprender também como se dá a escrita no âmbito acadêmico e como ela se diferencia do que você fez ao longo da sua vida escolar. Nossa disciplina está organizada da seguinte forma: nas duas primeiras aulas, vamos contemplar discussões acerca da leitura; nas duas últimas, focaremos na escrita. Sugiro que acesse os links indicados ao longo do texto e assista, também, aos vídeos das aulas. Todos eles se complementam para que você tenha o máximo de aprendizado e sucesso nesta disciplina. Espero que seja tão prazeroso paravocê estudar quanto foi para mim, ao longo da escrita e do preparo dessas aulas. Desejo, desde já, um bom estudo e muito sucesso na sua caminhada acadêmica. Professor Luis Gabriel. 8 Aula 1 – Ler vai além dos livros: reflexões iniciais Apresentação da aula 1 Quantas vezes você já ouviu discursos de que fazemos parte de um país de pessoas não leitoras? A resposta para responder a esse argumento é complexa e exigiria mais que uma disciplina para debatermos as questões que a representa. Contudo, nesta aula, você vai poder ampliar seu conhecimento a respeito do que é ser leitor, do que lemos, quando lemos, por que lemos e como lemos! Bom estudo e boa leitura! 1.1 Leitura: por que, como e para que lemos Leitura tradicional em livro impresso/analógico Fonte: Pixabay (2021). Ao longo do tempo, criou-se um mito popular de que para ser considerado um leitor, seria preciso lermos livros literários. Isso se dá pelo fato de, antigamente, o acesso à cultura e à informação ser restrito a uma parcela pequena da sociedade, além de os valores de uma obra literária serem altos para os padrões sociais. Como uma parcela muito grande da sociedade mundial não era alfabetizada, a leitura e a escrita eram utilizadas como mecanismo de poder, 9 afinal, quanto menos as pessoas tivessem acesso à informação, mais fácil seria para que as camadas sociais de prestígio mantivessem os seus postos de controle. Além disso, ler também era questão de status, além de mostrar “cultura” por ser alfabetizado, ter uma biblioteca em casa também representava, de certa forma, poder social, uma vez que, além de mostrar nível intelectual, comprar livros também era ter acesso a artigo de luxo. Essa concepção se alastra ainda hoje, como foi percebido durante a pandemia de covid-19, em que as formas de interações foram alteradas, com a popularização das lives (eventos caseiros com transmissão ao vivo) e de pessoas trabalhando em suas casas, os cenários para que as pessoas surgissem ao vivo de seus espaços privados eram, aos poucos, cuidadosamente arquitetados. Divulgar seus espaços privados é divulgar parte de sua intimidade, parte de si. Nesse sentido, os livros ganharam grande destaque para compor os cenários de cantores, jornalistas, apresentadores, professores etc., ter estantes de livros ao fundo virou “tradição”, sites de papéis de parede chegaram a vender “fundo falso de livros”, para estampar bibliotecas, recurso utilizado, inclusive, por políticos em suas aparições online. Saiba mais A Revista Vogue, do Grupo Globo, publicou uma reportagem relatando que as estantes de livros eram os fundos favoritos de personalidades para suas lives. Quer ler? É só clicar no link a seguir: https://vogue.globo.com/celebridade/noticia/2020/05/estante-de-livros-e-o-pano -de-fundo-preferido-das-personalidades-para-lives.html Veja nas imagens a seguir algumas dessas utilizações dos/das livros/bibliotecas nas lives. 10 Caetano Veloso fazendo live Fonte: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/verso/caetano-veloso-retorna-as- lives-para-especial-de-fim-de-ano-com-espirito-natalino-1.3014847. (Acesso em: 12/11/2021, às 11h12 - Adaptado para fins pedagógicos) Repare que a live realizada por Caetano Veloso é para contemplar o gênero música. Conhecido por suas letras/canções que trazem reflexões sociais, políticas, literárias etc., os livros compondo a live podem reforçar os argumentos das letras escritas por Caetano. Além disso, o cantor também é uma personalidade de opiniões fortes que ultrapassam o espaço da música, ocupando destaque na camada intelectual brasileira. Desse modo, os livros corroboram para reafirmar a intelectualidade do cantor. Vamos ver mais um exemplo de como os livros podem contribuir ou não para a discussão apresentada até aqui, isto é, a leitura e os livros como construção para o status de intelectualidade. O jornalismo é um desses espaços culturais que exigem muita leitura de seus profissionais. Aqueles que atuam em colunas, opinando sobre assuntos/temas específicos, têm ainda mais prestígio pelo vasto conhecimento construído ao longo da vida. Por isso, os livros e as bibliotecas também ganharam grande destaque para reforçar esse status ao longo das lives e das aparições dos jornalistas em suas casas, como é possível perceber na imagem a seguir: 11 Livros compondo cenário de jornalistas durante período de trabalho remoto, causado pela pandemia por Covid-19 Fonte: <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2020/04/07/direto-da-estante-jornalistas- da-globonews-dao-dicas-de-livros.ghtml>. (Acesso em: 12/11/2021, às 11h27. Adaptado para fins pedagógicos). Repare que todos os jornalistas utilizam livros para compor os cenários durante as suas aparições ao vivo. Mais precisamente nesta foto, os jornalistas argumentam sobre cenários políticos/sociais, principalmente no contexto da pandemia por covid-19. Nesse sentido, trazer os livros ao fundo, endossa a composição social de que esses objetos foram lidos, trazendo ainda mais prestígio intelectual aos profissionais. Quanto mais livros compondo o cenário, mais impacto esses artefatos geram. No entanto, cabe salientar que a leitura e o prestígio intelectual nem sempre vêm dos livros impressos/analógicos. Hoje em dia, o conhecimento e a informação estão espalhados em diversos lugares, com mais acesso às múltiplas camadas sociais. 12 Importante Portanto, estabelecer relação de intelectualidade ou conhecimento com a leitura de livros impressos é equivocada. Os livros físicos, atualmente, dividem lugar com os e-books; as bibliotecas físicas também vão assumindo um lugar no âmbito online; os jornais vão dando lugar às notícias online etc. São inúmeras as alterações sociais que as tecnologias digitais têm trazido à modernidade recente, o que materializa ainda mais a concepção de que o conhecimento está em muitos espaços, além do que é visível aos olhos alheios. Vocabulário E-book: é um livro digital que abrange qualquer conteúdo de informação. Tem formato e diagramação quase sempre diferente dos livros impressos/analógicos, mas há aqueles que seguem a mesma padronização dos impressos. Pode ser lido em equipamentos eletrônicos (computadores, tabletes, Kindle – leitor de livros digitais – ou até mesmo em celulares smartphones). 1.1.1 A leitura é maior do que a gente imagina Ainda prevalece atualmente, em alguns casos, o estereótipo de que, para se ser um leitor, é preciso consumir livros literários clássicos, de autores de prestígio (ditos por quem, quando?), renomados ou premiados. Colocam numa balança o que é leitura boa ou ruim; leitura que ensina e leitura inútil. Reflita Como considerar os tipos de leitura e se o que eu leio ajuda a construir conhecimento ou não? 13 Com a popularização da internet, o acesso à informação e aos conhecimentos se tornaram mais fáceis. Claro que o termo fácil, aqui, estudante, precisa levar em consideração os grandes centros urbanos, uma vez que sabemos da grande desigualdade social que assola nosso país e o alto índice de pessoas ainda sem acesso a alimentos básicos, quiçá internet e tecnologias digitais. Dito isso e levando em consideração a popularização das formas de leitura na/pela internet, é preciso se considerar, primeiro, o que é leitura. A leitura é tudo aquilo pelo qual conseguimos construir sentido no mundo. Fonte: elaborado pelo autor (2021). Todo mundo consegue ler em algum momento da vida. Precisamos desmistificar que só quem lê são pessoas alfabetizadas ou aquelas que conseguem decodificar os símbolos da cultura letrada. Ler vai muito além de identificar e juntar letras, ler é construir sentido por meio das nossas vivências no mundo. Todasas experiências que as pessoas têm no seu cotidiano vão lhes dando bagagem e visão de mundo para que elas aprimorem cada vez mais as suas possibilidades de construir sentido. Claro que pessoas letradas têm mais acesso aos conhecimentos, justamente por terem oportunidade de buscar leituras formais em notícias, livros, publicidades etc. Portanto, para que se tenha êxito na construção dos sentidos, é preciso aliar a minha vivência de mundo com o texto inédito. Vamos aprofundar mais essas questões na aula 2. A partir de agora, você vai poder ampliar a sua visão com relação ao que é ler e produzir textos muito além dos estereótipos culturais que separam pessoas leitoras das não leitoras; pessoas que leem bem das que não leem etc. Você vai ver que todos somos leitores em algum momento, bem como aprenderá onde, quando e como é preciso ser um leitor específico, de acordo com a situação de exigências para tal fim. 14 1.2 Diferentes formas de leitura Ao longo da história, diferentes mídias comportaram os formatos de artefatos de leitura. Como nosso foco não é fazer um panorama da história do livro ou do quesito informação, vamos restringir essas mudanças em três grandes períodos: no primeiro; os livros eram escritos à mão, o que demorava meses/anos para serem reproduzidos e disponibilizados ao leitor; depois da prensa de Gutemberg, a impressão em massa ampliou o acesso à leitura; e depois da criação da internet, mais uma vez os formatos de leituras/textos foram ressignificados/expandidos. Mídias Quer saber mais sobre como foi a revolução social após a prensa de Gutemberg? É só clicar no link a seguir para assistir ao documentário. https://www.youtube.com/watch?v=2xSRTAxcYTY&ab_channel=Nerdologia É importante salientar que antes da criação da escrita, propriamente dita, e, consequentemente, dos livros, não havia leitores e escritores, por mais que existissem os desenhos rupestres. As histórias eram narradas e ouvidas, logo, tínhamos narradores e ouvintes. Como os acontecimentos eram propagados em forma oral, criou-se o que conhecemos atualmente como mito. Assim, surge nessa época a ideia da importância de se ter uma boa oratória. Importante É possível considerar, então, grosso modo, que a concepção de leitor só surge na humanidade após a criação da escrita. Com o surgimento da escrita, da prensa de Gutemberg e da internet, as formas de ler foram sendo modificadas nessa linha do tempo. Hoje, por exemplo, nunca se leu tanto no mundo, ao contrário do que alguns discursos propagam 15 por aí. As redes sociais são o grande exemplo dessa intensificação de leitura. Tudo o que fazemos virtualmente necessita, obrigatoriamente, de leitura. São leituras de textos verbais, não verbais, hipertextos, links e inúmeros outros tipos de textos que se aglomeram nos ambientes digitais e no nosso cotidiano. Veja na imagem a seguir os diferentes modos textuais, que compõem um único texto, presentes em uma notícia divulgada na internet. Texto típico da internet Fonte: <https://www.tecmundo.com.br/dispositivos-moveis/150244-acontece-voce-nao-ligar-o- modo-aviao-durante-o-voo.htm>. Acesso em: 12/11/2021, às 17h05 (Adaptado para fins pedagógicos) Repare na imagem a quantidade de marcações em vermelho. Todas essas marcações representam uma intencionalidade específica na construção de sentido do texto, mas para que essas intencionalidades obtenham sucesso, é preciso que o leitor as conheça e saiba as suas respectivas funções dentro do texto. Veja a seguir o que cada uma delas representa na imagem utilizada como exemplo. Repare, também, que os números indicam o local em que cada elemento está na imagem representada: 1. Possibilidade de compartilhar o texto em redes sociais. 2. Imagem (linguagem não verbal) que compõe a notícia. 3. Autor do texto e hiperlink para acessar a origem do texto. 16 4. Quantidade de compartilhamento da notícia, a fim de dar popularidade e credibilidade ao leitor. Na cibercultura, muitas vezes, um texto com muitos compartilhamentos pode ser considerado um texto de prestígio, por exemplo. 5. Quantidade de comentários dos leitores a respeito do texto. 6. Links com indicação de textos relacionados à temática. 7. Hiperlinks para direcionar a algo escrito com a palavra destacada. Também exerce a função de destacar as palavra-chave do texto, neste caso, avião e celular (o texto diz respeito ao uso do modo avião do celular durante voos). 8. O texto propriamente dito. Essa multiplicação de textos dentro de um outro (o principal) exige de nós uma gama de conhecimentos para compreensão e interpretação. Caso o leitor não saiba a função de algumas dessas expressões típicas de textos publicados em espaços digitais, a possibilidade de construção de sentido e interpretação/compreensão pode ser comprometida. A leitura de um livro impresso, de um/uma jornal/notícia ou qualquer outro texto impresso também exige de você alguns conhecimentos prévios para que seja realizada com sucesso. É importante destacar que “as práticas de leitura se desenvolvem em aprendizagens culturais das quais os sujeitos se apropriam como parte de sua identidade” (BALTAR et al, 2011, p. 123). Logo, quanto mais acesso à cultura e percepção de mundo você tiver, mais amplo será seu conhecimento para se apropriar das temáticas dos textos e de conseguir interpretá-lo com êxito. Na próxima aula, vamos iniciar nosso estudo de quais são esses pré- requisitos necessários para uma boa leitura em diferentes meios (digitais ou analógicos). Conclusão da aula 1 Chegamos ao final da nossa primeira aula da disciplina Leitura e Produção de Textos. Você viu alguns mitos que permeiam a concepção de leitura, leitor e intelectualidade, além de compreender as novas formas de leitura no meio 17 digital. Além disso, analisamos um texto multimodal, específico do contexto da internet, e vimos como as formas de leituras, além do texto, ajudam a construir sentidos, como os livros utilizados em lives no período de pandemia por covid- 19. Atividade de Aprendizagem Ler vai muito além de identificar símbolos e juntar letras. Se a leitura for realizada no âmbito digital, outros recursos precisam ser mobilizados para que os sentidos sejam construídos, certo? Acesse algumas notícias de jornais online e repare na quantidade de recursos utilizados para compor uma notícia, quais são os outros links indicados e se eles estão relacionados à notícia principal. Aula 2 – A leitura: interpretar ou compreender um texto? Apresentação da aula 2 Na aula anterior, você aprendeu sobre os mitos relacionados à leitura e como o livro contribui para a construção de uma imagem intelectual do sujeito. Nesta aula, você vai ver como se dá o processo de leitura, perpassando por elementos desde a pré-leitura, caminhando também pela diferença de leitura e compreensão de textos e, por fim, conhecendo um arsenal de dicas para realizar leituras, principalmente em textos acadêmicos. Iniciaremos pela diferença do que é interpretar ou compreender um texto. Bom estudo! 2.1 Diferença entre interpretação e compreensão de textos A leitura é uma atividade humana que permite ao leitor ampliar o seu conhecimento de mundo, além de dar acesso ao conhecimento produzido ao longo do tempo. Assim, há inúmeras possibilidades de ações quando se pega um texto, entre elas, apenas absorver o que está contemplado lá ou refletir a 18 respeito da temática abordada. Portanto, lemos não apenas para abstrair conhecimento, mas também, e principalmente, para construir conhecimento. Por algum momento, pode ser que você imagine que compreender e interpretar textos seja a mesma coisa, isto é, sinônimos. No entanto, cada um indica uma intencionalidade específica para o leitor! Veja qual a diferençadesses dois termos, iniciando pela compreensão! A compreensão está atrelada ao que você entende do texto exatamente com as informações que o compõe, ou seja, é a análise que você faz do que está escrito/apresentado no próprio texto. Fonte: elaborado pelo autor (2021). Importante Dica 1 Um aspecto importante para você assimilar o que é a “compreensão do texto” é: você nunca vai opinar, criticar, concordar ou discordar. Quando alguma questão pedir que você compreenda o texto, é preciso que você responda exatamente como o texto apresenta o que for solicitado. Já a interpretação está atrelada ao que você entende do texto a partir das informações que o compõe, ou seja, é quando você lê e compreende o que está escrito, mas vai além das informações dadas, ampliando a sua reflexão da temática abordada. Importante Dica 2 Na interpretação, você sempre precisará opinar, refletir e criticar o que está escrito no texto. O seu conhecimento de mundo, as suas experiências de vida e o seu conhecimento intelectual serão fundamentais para que você interprete um texto. Um exemplo simples são as tirinhas, como as do Armandinho e da Mafalda, em que não há uma informação precisa e única; para que você as 19 compreenda, é preciso ter um conhecimento prévio do assunto contemplado nesses gêneros textuais. Saiba mais Clique no link a seguir para ler algumas tirinhas da personagem Armandinho e analisar como se dá o processo de interpretação desse gênero textual! Link: https://tirasarmandinho.tumblr.com/ Para ficar mais fácil ainda de você entender a diferença desses dois conceitos, essenciais para ser um bom leitor, analise a tabela a seguir com algumas dicas que podem ajudá-lo. Compreensão Interpretação Exatamente o que está escrito no texto. Está além do texto (implícito). Não depende do seu conhecimento de mundo. Vai depender do seu conhecimento de mundo. Nunca extrapola o texto. Vai sempre além do que o texto diz. Expressões típicas: “Segundo o autor”; “O texto ponta que...”; “o autor diz que...” etc. Expressões típicas: “conclui-se do texto”; “é possível refletir a partir do texto” etc. Fonte: elaborado pelo autor (2020), adaptado pelo DI (2021). Depois de saber se a sua intenção ao ler o texto é de interpretá-lo ou compreendê-lo, é preciso identificar alguns pontos específicos que o ajudarão na construção de sentido. 2.2 Pré-leitura De antemão, é importante você ter ciência de que cada leitor, por mais que vários leitores leiam o mesmo texto, terá uma interpretação única/particular, pois cada um tem uma experiência de vida individualizada e conhecimentos e 20 formação cultural individualizados também. Portanto, cada um terá uma percepção diferente de um texto, por mais que, no final, o conteúdo assimilado esteja no mesmo contexto. Importante Por isso há críticas quanto aos professores que propõem aos alunos perguntas de interpretação de texto, tal como: “o que o autor quis dizer?” Justamente porque a interpretação é individualizada e específica de cada leitor. Isso não quer dizer que cada um pode interpretar o que quiser de um texto, afinal, o autor tem uma intencionalidade ao escrever, no entanto, as percepções para construir o sentido da história será individual. Baltar et al (2011, p. 128) justifica essa ideia dizendo que “os textos serão lidos de modo particular pelos diferentes leitores nos diferentes momentos históricos em que isso se processar, o que, porém, não autoriza a cada leitor conferir ao texto uma interpretação tão particularizada a ponto de tangenciar ou deformar o que está escrito no texto ou tergiversar sobre tal conteúdo”. Vocabulário Tergiversar: virar de costas; usar de evasivas ou subterfúgios; e procurar rodeios. Sendo assim, as dicas a seguir de pré-leitura o ajudarão a construir um sentido do texto de forma que você não julga a proposta do autor, pois essa interpretação particularizada não significa que possa haver fuga da temática abordada. Uma das etapas da leitura começa muito antes de você iniciar o texto propriamente dito, ela começa com a pré-leitura. A seguir, você vai ver quais são os pontos a que você precisa ficar atento antes de iniciar a leitura de um texto. Vamos lá! 21 2.2.1 Estrutura A estrutura do texto vai indicar como ele foi elaborado e já dá indícios da intencionalidade do autor. Uma tirinha, por exemplo, será composta por linguagem verbal e não verbal; um artigo acadêmico conterá aspectos específicos e tamanho de texto longo; um resumo representará as ideias de um outro texto. E assim, identificando essa estrutura do texto, você consegue fazer uma das pré-leituras necessárias. Outro ponto específico da estrutura é identificar qual o gênero textual que você vai ler. Um romance contemplará uma narrativa longa e poderá ser uma ficção ou baseada em história real; uma notícia de jornal vai informar algo do cotidiano; uma tirinha vai fazer uma crítica a algo relacionado à realidade humana; um artigo de opinião vai expor o que o autor do texto acredita/pensa etc. Portanto, por meio da identificação da estrutura do texto, você consegue supor a que tipo de leitura você estará exposto e que tipos de reflexões você precisará ter para construir o sentido do texto. 2.2.2 Linguagem Identificar a linguagem é o segundo passo mais importante na pré-leitura. Reflita em algumas questões: ➢ Qual o idioma? É primordial que isso seja identificado, caso você saiba mais de uma língua, pois as palavras podem ter sentidos diferentes em outros países, o que determina consideravelmente a compreensão/interpretação do texto. ➢ Existem palavras destacas em negrito, itálico, sublinhado ou como hiperlink? As palavras destacas nos textos têm relevância na construção do sentido. A intenção do autor ao destacá-las é chamar a atenção do leitor para algo específico. Geralmente, essas palavras representam um conceito-chave, o que pode ajudá-lo a enfatizar a temática do texto e direcionar a sua leitura para um caminho específico. Ao percebê-las, tente 22 analisar se elas têm relação com o título e com as imagens (quando estiverem presentes), pois essa relação é o que vai determinar a intencionalidade do autor com o assunto tratado no texto. ➢ Tem imagens, elas estão relacionas ao título? As imagens são complementos de ideias e têm papel fundamental na composição de construção de sentido do leitor. Fazer uma pré-leitura, antes de iniciar o texto, ajudará a ter uma prévia do que pode ser abordado. Assim, você conseguirá direcionar a sua atenção/reflexão para a temática. Portanto, uma dica valiosa é: analise o contexto da imagem com o título do texto para que você tenha uma ideia do que focalizar na sua leitura. ➢ Qual o subtítulo da imagem? Toda imagem tem uma legenda, a qual podemos chamar também de subtítulo. Essa descrição, aliada ao conteúdo da imagem e ao título ajudarão você a ter uma percepção e uma leitura prévia do que será abordado no texto. Assim, o ajuda-lo-á a não fugir do tema proposto pelo autor. Leitura em recursos digital Fonte: Pixabay (2020). ➢ Quem é o autor do livro? Você já o conhece? Sabe qual o estilo de escrita dele, os gêneros que ele mais escreve? Saber quem escreveu o texto que você vai ler é fundamental para compreender o conteúdo contemplado. Ao ler Machado de Assis, por exemplo, você vai saber que 23 ele remete seus textos a críticas sociais; ao ler um texto de Clarice Lispector, você vai saber que ela remete a crises existenciais do ser humano; se for ler texto de algum jornalista de posicionamento político específico, vai saber qual o teor apontado por ele. Portanto, conhecer e saber quem é o autor do texto o ajudará bastante nesse processo prévio de leitura, pois você pode ter ideiada linguagem, se haverá gíria ou expressões específicas que o autor utiliza etc. ➢ Identificar linguagens literais e não literais: saber identificar se o texto contém apenas linguagem literal ou não é outro fato predeterminante para você interpretar um texto. Alguns gêneros textuais, como os contos, as crônicas, as tirinhas etc. usam a linguagem não literal para fazer o leitor refletir a respeito de algo que não está dito no texto. A linguagem literal é usada em gêneros mais técnicos, como os manuais, os artigos acadêmicos etc. Portanto, saber identificar qual tipo de linguagem o autor usa em seu texto é importante para a sua leitura. Veja um exemplo: a expressão “levou um pé na bunda”, se você ler no sentido literal vai entender que a pessoa realmente sofreu um chute na nádega. Já, se você interpreta de forma não literal, vai entender que é uma expressão para dizer que alguém terminou um relacionamento ou foi dispensado de alguma situação. 2.3 A leitura Provavelmente você já leu um texto e, ao final dele, pensou: “Não entendi nada!” Depois disso, de duas, uma: ou leu de novo até entender, ou desistiu. Certo? Fatores como esses não são exclusivos a você, estudante. É muito comum que leiamos algum texto e não o compreendamos na primeira leitura, ainda mais se for de alguma temática a que não estamos habituados. Por isso é tão importante ler de tudo um pouco, inteirar-se de assuntos diversos e expandir a nossa capacidade cognitiva a outras áreas do conhecimento. É por isso que há contradições aos discursos de classificar pessoas como analfabetas funcionais ou que não sabem ler. A questão é muito mais complexa 24 e, para que você consiga ler e entender um pouco de tudo, este item contemplará algumas dicas de leitura, principalmente àquelas voltadas ao Ensino Superior. 2.3.1 Leitura exploratória A leitura exploratória é aquela que você faz investigando o que há de primordial no texto. Assim, quando você iniciar uma leitura e não estiver entendendo nada, leia até o fim. O foco inicial da leitura é você conseguir entender qual é a ideia central do texto. A partir disso, você vai conseguir explorar as outras ideias secundárias relacionadas à principal. 2.3.2 Leitura analítica ou interpretativa Esta é a leitura mais complexa, porque é nela que o seu conhecimento de mundo e linguístico (aquele relacionado à gramática) estarão presentes. Nesta leitura, no que tange à gramática, é primordial que você saiba pontuação, crase e ambiguidade, por exemplo. São três quesitos gramaticais que podem mudar completamente a interpretação do que está escrito. Veja o exemplo a seguir: Pontuação: ➢ “Não vai ter copa”. “Não, vai ter copa”. (Repare que as duas orações têm sentido diferente apenas por causa da inserção da vírgula depois do “não”. Na primeira, afirma-se que não existirá copa; na segunda, há uma negação da resposta e a afirmação de que haverá a copa. Debate muito aflorado durante a preparação da Copa do Mundo no Brasil, em 2014. ➢ “Vamos comer gente?”. “Vamos comer, gente?” (Na primeira, você é um canibal que como pessoas; na segunda, você está convidando as pessoas para irem comer alguma coisa. Consegue perceber a importância da vírgula para a construção de sentido de um texto?) 25 Crase: ➢ À tarde, ficava feliz com a sua chegada. (Nesta oração, “à tarde” exerce a função de tempo, ou seja, alguém fica feliz com a sua chegada apenas no período da tarde). ➢ A tarde ficava feliz com a sua chegada. (Neste caso, “a tarde” – sem crase – exerce a função de substantivo, isto é, é exatamente ela quem fica feliz com a sua chegada, independentemente, do horário que não está descrito.) Ambiguidade: ➢ “Vi o gato do seu irmão.” (Repare que, devido à oração não ter um contexto, não sabemos se a palavra “gato” se refere a um elogio ao irmão da pessoa ou ao animal que o irmão da pessoa tem. Questões como essas são essenciais para que você consiga fazer uma interpretação correta de um texto. Fique atento(a)! 2.3.3 Leitura crítica É aquela leitura que engloba todas as outras vistas até aqui, por ela, você consegue identificar a intenção do autor no texto e tecer críticas a ela: concorda, discorda etc. Importante A leitura crítica é você aliar a compreensão do texto e a sua interpretação dele. Nesse sentido, para fazer uma leitura crítica, você analisa, concorda, discorda, relaciona a outros exemplos etc. 26 Importante Ao ler um artigo científico, por exemplo, você deve ficar atento a alguns quesitos que podem ajudá-lo a interpretar o texto: identificar o objetivo geral e os objetivos específicos; qual a metodologia utilizada; quais os teóricos presentes; e, principalmente, qual a análise dos dados e a ideia defendida pelo autor. Cavalcante (2009, p. 4), ancorada nas questões socráticas de técnica de leitura, explica que questionar o que estamos lendo nos ajuda a fixar o conteúdo e apreendê-lo em seus diversos matizes. Também nos ajuda a adquirir um posicionamento crítico, essencial na construção de nosso conhecimento. É que temos o hábito de considerar como verdadeiro tudo aquilo que lemos, é mais fácil não pensar sobre o assunto, não questionar, não criticar (p. 4). Outras questões, segundo Cavalcante (2009), que podem guiar a sua leitura são: ➢ Perguntas de esclarecimento ➢ O que o autor quer dizer quando afirma que ______? ➢ Qual é o ponto crucial de seu texto? ➢ Qual é a relação entre _____ e _____? ➢ Isso pode ser explicado de uma outra maneira? ➢ Vejamos se entendi o ponto de vista do autor: ele quer dizer _____ ou _____? Qual é a relação entre isto e o foco do problema/discussão/argumento? ➢ Será que eu consigo resumir com as minhas palavras o que o autor disse? ➢ Ele traz algum exemplo? ➢ _____ seria um bom exemplo disso? ➢ Perguntas que verificam suposições 27 ➢ Qual é a suposição do autor aqui? ➢ O que eu poderia supor em vez disto? ➢ Todo o discurso do autor depende da ideia de que _____. ➢ Por que ele baseou a sua hipótese em _____ em vez de em _____? ➢ Parece que ele supõe que _____. Posso ter isso como uma verdade? ➢ É sempre assim? Por que ele acha que essa suposição é pertinente? ➢ Por que alguém partiria desta suposição? ➢ Perguntas que verificam evidências e linhas de raciocínio ➢ Qual a linha de raciocínio do autor? ➢ Como isso se aplica a este caso? ➢ Existe uma razão para duvidar desta evidência? ➢ Quem pode saber que isto é verdade? ➢ O que ele diria a alguém que afirmasse o contrário? ➢ Algum outro autor apresenta evidências a favor deste ponto de vista? ➢ Como ele chegou a essa conclusão? ➢ Como podemos descobrir se isso é verdade? ➢ Perguntas sobre pontos de vista ou perspectivas ➢ Em que implica essa afirmação? ➢ Quando ele diz _____, subentende-se _____? ➢ Mas se isto acontecesse, quais seriam os outros resultados? Por quê? ➢ Quais seriam os efeitos disso? ➢ Isso aconteceria necessariamente ou é apenas uma possibilidade? ➢ Existem alternativas? ➢ Se _____ e _____ são verdadeiros, o que mais poderia sê-lo? ➢ Se dissermos que ____ é ético, o que podemos dizer de _____? ➢ Perguntas que verificam implicações e consequências ➢ Como posso descobrir isso? 28 ➢ Qual é a suposição dessa pergunta? ➢ Seria possível elaborar essa questão de outra forma? ➢ Que outro autor poderia esclarecer essa questão? ➢ É possível subdividir essa questão? ➢ Essa pergunta é clara? Entendi isso? ➢ Essa pergunta é fácil ou difícil de responder? Por quê? ➢ Para responder a essa pergunta, que outras perguntas são preciso responder primeiro? ➢ Por que essa questão é importante? ➢ Essa é a pergunta mais importante ou existe umaoutra questão na qual essa se baseia? ➢ É possível relacionar isso a algum outro conteúdo ou área de estudo? Fonte: CAVALCANTE (2009) Conclusão da aula 2 Chegamos ao final da nossa segunda aula. Você viu a diferença entre compreensão e interpretação de textos, além de conhecer um arsenal de dicas para realizar leituras de diferentes gêneros/tipos. Na nossa próxima aula, vamos aprofundar essas questões relacionando- as aos textos mais comuns no Ensino Superior. Atividade de Aprendizagem Agora que você já sabe a diferença entre ler e compreender um texto, que tal procurar por provas de concursos públicos, Enem ou Enade, e analisar as questões propostas? Analise se os enunciados sugerem que o leitor faça uma interpretação ou compreensão da questão. Essa é uma ótima forma de estudar para esse tipo de prova e não fugir do tema proposto. 29 Aula 3 – A escrita na Universidade: principais gêneros Apresentação da aula 3 Olá, estudante. Seja bem-vindo à terceira aula da disciplina Leitura e Produção de Textos. Até agora, você viu as diferentes possibilidades de leitura e algumas dicas de como realizá-las. Nesta aula, você vai conhecer os principais tipos de textos utilizados no Ensino Superior e como ler/escrever alguns deles. Vamos lá?” 3.1 Condição de produção e leitura: a peça-chave do texto A escrita e a leitura na Universidade têm aspectos particulares daqueles que conhecemos ao longo da vida escolar, por isso muitas pessoas têm dificuldade de compreender e/ou produzir um texto acadêmico. Entender as condições de produção e circulação de um texto é peça- chave para que consigamos compreendê-lo da melhor forma possível. Para explicar esses fatores, vale mencionar dois elementos elucidados por Koch e Elias (2009) ao falarem dos contextos de produção e leitura do texto: 1) O fato de que um texto pode ser lido em um lugar e tempo muito distantes daquele em que foi produzido; 2) O fato de que um texto pode ser reescrito de muitas formas, objetivando atender a tipos diferentes de leitor. Vocabulário Texto: compreenda texto como toda e qualquer forma materializada de linguagem, isto é, tudo aquilo com que temos contato no mundo e produzimos sentidos pode ser considerado como um texto, desde um quadro ou uma fotografia a um artigo de opinião ou um livro escrito. 30 O primeiro elemento indicado por Koch e Elias (2009) nos possibilita dizer que o tempo e o espaço onde um texto é/foi produzido e, posteriormente, lido, interferem diretamente nos sentidos que ele pode proporcionar. Dessa forma, conhecer quando, onde, por quem e em quais condições o texto foi elaborado podem ser determinantes para o leitor. Além disso, como trazido no segundo elemento, o texto pode ter muitas formas de escrita, assim como uma história pode ser contada por diferentes lentes. Vamos ver como esses fatores acontecem no exemplo a seguir: Exemplo 1 — “Caíram só trezentos, nada mais nada menos”. Fonte: elaborado pelo autor (2021). Lendo o exemplo apenas com o texto descrito, o que você consegue compreender? Alguém falando de vítimas de uma guerra? Falando de dinheiro? É difícil responder sem saber todas as condições de produção, certo? As possibilidades de relações seriam infinitas se tentássemos adivinhar sobre o que diz respeito o fragmento. Agora, se essas condições de produção são elucidadas ao leitor, possivelmente os sentidos que você vai construir do texto serão outros, certo? Vamos ver no exemplo a seguir. Exemplo 2 Ainda era dia 2. Carla tinha recebido o pagamento há exatos dois dias. Durante uma conversa com sua amiga Lilian sobre a crise financeira que assolava o país, em 2021, quando muitas empresas estavam parcelando os salários dos funcionários, a professora relatou: — “Caíram só trezentos, nada mais nada menos.” Fonte: elaborado pelo autor (2021). 31 Observe que no exemplo 2 há uma gama de informações das condições de produção do texto, possibilitando uma leitura mais detalhada e limitada dos fatos. Assim sendo, conseguimos perceber os dois elementos destacados por Koch e Elias (2009): ➢ Elemento 1 - um texto pode ser lido em um lugar e tempo muito distantes daquele em que foi produzido: a) ao identificar que há uma crise econômica no país, em 2021, temos uma marcação temporal de quando esse texto foi produzido, logo, se for lido em outra época, terá aqui uma marcação histórica desse fato; b) devido à crise, empresas estão parcelando salários dos funcionários, portanto Carla fala do que recebeu equivalente ao seu salário, isto é, 300 reais. ➢ Elemento 2 - um texto pode ser reescrito de muitas formas, objetivando atender a tipos diferentes de leitor: a) quem produz o texto/a mensagem principal é uma professora, Carla; b) a situação de produção do texto é uma narração de alguém que sabe da história; c) há uma descrição da conversa entre amigas, o que direciona a informalidade da linguagem; c) há um relato de um acontecimento, que podemos considerar como exemplo de um período histórico; d) se o texto fosse produzido em uma notícia de jornal ou em uma postagem em rede social, por exemplo, as formas de escrita poderiam e seriam outras. Apresentada a importância de se compreender e explicitar as condições de produção e leitura de um texto, no Ensino Superior isso se torna ainda mais fundamental, devido aos diferentes tipos de conhecimentos que circulam nesse espaço, cada um com suas particularidades e importância. Vamos conhecer, sucintamente, algumas das diferenças desses conhecimentos que circulam no Ensino Superior para, depois, ver como eles são formalizados/escritos. Uma das condições essenciais para se compreender o texto é saber a que tipo de conhecimento ele está atrelado, uma vez que ele vai direcionar a sua veracidade ou relevância, de acordo com a situação de circulação. Fonte: elaborado pelo autor (2021). 32 3.2 Tipos de conhecimentos no Ensino Superior No nosso cotidiano e por meio das nossas relações sociais, temos diferentes formas de acessar e produzir conhecimentos. Nesta seção, você vai conhecer, sucintamente, os quatro principais deles: o popular, o filosófico, o religioso e o científico. 3.2.1 Conhecimento popular Também conhecido como conhecimento empírico, vulgar, popular ou senso comum, é o tipo de conhecimento que vamos adquirindo pelas nossas experiências, interações e vivências no mundo; vai passando de geração para geração, isto é, são conhecimentos que surgem a partir das interações do sujeito com o ambiente que o rodeia, sem ter necessidade de uma comprovação científica para ele (MENEZES, 2021). Vale destacar, segundo Menezes (2021) afere, que nesse tipo de conhecimento não há uma preocupação em refletir criticamente sobre o objeto em observação, nem necessidade de explicação lógica, porque ele não tem pretensão de ser tomado como uma verdade absoluta, ele é subjetivo ao sujeito e atrelado apenas a uma dedução. É possível trazer como exemplo os aprendizados passados ao longo do tempo pela humanidade, como tratamentos por meio de ervas naturais, tradições culturais, simpatias, procedimentos de colheitas por agricultores, artesanatos etc. As simpatias são exemplos de conhecimentos populares Fonte: acervo do autor (2021). 33 Importante O conhecimento popular ou empírico pode ser utilizado no Ensino Superior como objeto de investigação/estudo. No entanto, é preciso ter cuidado, pois ele não deve ser utilizado como verdade absoluta, mas como exemplo de experiências de vida ou objetos de análises. Por isso, pode ser trazido em gêneros discursivos/textuais como: relatos de experiência, documentários, contos e crônicas etc. (veremos como isso é possível na próxima seção, quando você for conhecer os gêneros discursivos/textuaisdo Ensino Superior). 3.2.2 Conhecimento filosófico Já o conhecimento filosófico surgiu a partir da capacidade de o ser humano refletir, principalmente a respeito de questões subjetivas, imateriais, conceitos e ideias. Desse modo, tem como objetivo questionar à luz da razão a realidade humana para diferenciar o que é mais correto ou verdadeiro sobre todas as coisas. Esse tipo de conhecimento é racional e valorativo e traz como principal característica sua forma inacabada, isto é, está sempre em transformação. Como exemplo, é possível relacionar os estudos de filósofos como Aristóteles e Platão com os de filósofos contemporâneos, como Byung-Chul Han e Slavoj Zizek, cujos pensamentos se diferenciam e refletem a respeito de questões diferentes em suas respectivas épocas. Saiba mais Clique no link a seguir para conhecer uma lista de 11 dos principais filósofos contemporâneos e quais foram suas principais contribuições de conhecimentos filosóficos para a humanidade. https://www.ebiografia.com/grandes_filosofos_contemporaneos/ O conhecimento filosófico é muito utilizado no Ensino Superior, tanto como ancoragem teórica em pesquisas quanto em reflexões das teorias levantadas pelos seus autores. Alguns dos gêneros discursivos/textuais mais 34 tradicionais para esse tipo de produção de conhecimento são os ensaios e os artigos de opinião. 3.2.3 Conhecimento religioso O conhecimento religioso, também conhecido como conhecimento teológico, tem como principal característica a sua verdade indiscutível, baseada na fé das pessoas, isto é, toda a verdade desse conhecimento está pautada em uma divindade. Nesse sentido, esse conhecimento é inquestionável, justamente por ele ser a verdade absoluta. Um dos exemplos mais emblemáticos é o fato de que, para os cristãos, Deus criou o homem. Os principais gêneros discursivos/textuais desse tipo de conhecimento são: salmos, versículos e ritos religiosos em geral. No ambiente acadêmico, ele tem espaço para ancoragens teóricas que se relacionam aos contextos subjetivos-reflexivos, tal como os filosóficos. Importante Cabe salientar que, quando relacionado ao contexto acadêmico, esse tipo de conhecimento não é inserido como uma verdade absoluta, mas como um aporte para reflexões e indagações de um objeto específico. 3.2.4 Conhecimento científico Este é o principal conhecimento mobilizado no Ensino Superior, por isso vamos nos debruçar sobre ele a partir de agora. Além de entender o que é e como ele é produzido no ambiente acadêmico, vamos ver detalhadamente quais são os principais gêneros discursivos/textuais que o materializam nesse cenário. Segundo Menezes (2021, n.p.), o conhecimento científico “está relacionado com a lógica e o pensamento crítico e analítico. É o conhecimento que temos sobre fatos analisados e comprovados cientificamente, de modo que sua veracidade ou falsidade podem ser comprovadas”. 35 Importante Em suma, o conhecimento científico procura encontrar respostas para os fenômenos que norteiam o ser humano. Veja na tabela a seguir uma síntese dos quatro tipos de conhecimentos apresentados aqui. Depois, vamos aprofundar como os conhecimentos científicos são produzidos, registrados e circulados no Ensino Superior, vendo quais são os principais gêneros discursivos/textuais utilizados para esse fim. Síntese dos tipos de conhecimentos Popular Científico O que é? Esse tipo de conhecimento surge a partir da interação do ser humano com o ambiente que o rodeia. Engloba informações e fatos que foram comprovados, tendo como base análises e testes científicos. Valor Valorativo, apoiando-se nas experiências pessoais. Factual, lida com fatos e ocorrências. Verificação É verificável. É verificável. Exatidão Falível e inexato. Falível e aproximadamente exato. Sistema Assistemático, pois é organizado com bases nas experiências de um sujeito, e não em um estudo para observar o fenômeno. Sistemático, pois é um saber ordenado logicamente. Religioso Filosófico O que é? Acredita que a fé religiosa possui a verdade absoluta e apresenta todas as explicações para justificar esta crença. É o conhecimento lógico- racional orientado pela construção de conceitos. Valor Valorativo, apoiando-se nas doutrinas sagradas. Valorativo, pois lida com hipóteses e teorias que 36 podem ou não ser comprovadas. Verificação Não é verificável. Pode ou não ser verificável. Exatidão Infalível e exato. Falível e aproximadamente exato. Sistema Conhecimento sistemático do mundo. É sistemático, pois é um saber lógico-racional, mesmo que não haja comprovação. Fonte: Adaptado de Menezes (2021, n.p.). 3.3 Principais gêneros discursivos utilizados no Ensino Superior Koch e Elias (2009) salientam que nos processos que envolvem a linguagem na construção de sentido, tanto na leitura quanto na escrita, há como base as suas formas padrão e relativamente estáveis de estruturação. Por isso, no nosso cotidiano, em nossas atividades comunicativas, são incontáveis as vezes em que não somente lemos textos diversos, como também produzimos ou ouvimos enunciados, como: “escrevi um e-mail”; “mandei um áudio no whatsapp”; “postei um texto no facebook”; “li um anúncio da série de que gosto”; “ouvi uma piada ótima”; “fiz um resumo do livro” etc. (KOCH; ELIAS, 2009). Portanto, para materializar os conhecimentos que circulam no mundo usam-se os gêneros discursivos/textuais. Já para os conhecimentos científicos produzidos e que circulam no Ensino Superior, alguns gêneros discursivos/textuais são mais específicos. Antes de falarmos de alguns deles, é importante salientar que o Ensino Superior está fragmentado em alguns espaços que acabam diferenciando os principais gêneros utilizados em cada um deles, por isso vamos nos ater àqueles utilizados por estudantes em cursos de graduação. Vocabulário Gêneros discursivos/textuais: Bakhtin (2015[1979]) define os gêneros do discurso como formas estáveis de enunciados elaborados de acordo com as 37 condições específicas de cada campo da comunicação verbal. Logo, os gêneros são infinitos, porque nossas formas de nos comunicarmos também são infinitas. Alguns autores preferem o termo gêneros textuais, por isso ao longo desse livro, você encontra a grafia “discursivos/textuais”. A partir de agora, você vai conhecer os principais gêneros utilizados no ambiente acadêmico e como eles são estruturados/organizados. Vamos organizar da seguinte forma: primeiro, os gêneros mais lidos pelos estudantes; depois, os mais produzidos na escrita; por último, os gêneros orais. Saiba mais Para saber mais como são/devem ser estruturados cada um dos gêneros apresentados aqui, acesse o Manual de Normas Acadêmicas para elaboração de trabalhos científicos da Faculdade Unina, disponível no link a seguir: https://unina.edu.br/wp-content/uploads/2020/12/Manual-de-Normas-de-Trabalh os-Acad%C3%AAmicos-Faculdade-Unina.pdf. Manual de Normas Acadêmicas Fonte: https://unina.edu.br/wp-content/uploads/2020/12/Manual-de-Normas-de-Trabalh os-Acad%C3%AAmicos-Faculdade-Unina.pdf 38 3.3.1 Gêneros discursivos mais lidos por estudantes de graduação ➢ Artigo Científico: é o gênero mais comum no ambiente acadêmico tanto para a leitura quanto para a escrita. Segundo a ABNT (NBR 6022, 2003, p.2), o artigo científico pode ser definido como a “publicação com autoria declarada, que apresenta e discute ideias, métodos, técnicas, processos e resultados nas diversas áreas do conhecimento”. É uma forma mais rápida de apresentar os resultados e as discussões sobre uma investigação. Não traz uma verdade absoluta, mas um recorte de um assunto determinado. Além da linguagem obedecer às normas específicas, como da ABNT, também apresentaestrutura textual que deve seguir alguns critérios básicos, tais como: elementos pré-textuais, textual e pós-textual. Saiba mais Quer saber dez dicas de como produzir um artigo científico de qualidade? No link a seguir, você tem acesso ao texto do pesquisador Maurício Pereira mostrando dez passos para a construção de um artigo. Não deixe de ler. http://scielo.iec.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-497420170003 00661 ➢ Resenhas: outro gênero muito comum no ambiente acadêmico tem como objetivo aferir reflexões críticas ou comentários a respeito de um texto, livro, filme etc. É importante você se lembrar de que, como a resenha se refere a um outro texto, alguns procedimentos são essenciais para que as vozes dos autores (da resenha e da obra resenhada) não se misturem. A linguagem deve seguir a norma culta, bem como devem ser utilizadas as normas da ABNT para organização do texto. ➢ Livros teóricos: este é o principal gênero para acessar os conhecimentos históricos produzidos na humanidade. Não há uma forma padrão de escrita, como é corriqueiro nas resenhas e nos artigos científicos, por 39 exemplo, isso fica a cargo dos estilos dos próprios autores e das editoras. Nesse gênero, você tem acesso às discussões de intelectuais que formam o aporte teórico de áreas específicas. Além disso, são esses teóricos que contribuem para reforçar as concepções e os resultados encontrados em pesquisas científicas. Curiosidade Converse com o seu professor-tutor e pesquise quem são os principais autores da sua área de formação. Quais livros são os carros-chefes para compreender os estudos/conhecimentos produzidos na sua área? A biblioteca online da Faculdade é um ótimo espaço para você encontrar esses livros. 3.3.2 Gêneros discursivos mais produzidos por estudantes de graduação ➢ Resenha crítica: é um dos gêneros mais pedidos em atividades acadêmicas. Nele, você expõe comentário e opinião sobre um outro texto, fazendo relações com as suas experiências de mundo e aporte teórico que teve ao longo da vida. Justamente por você intervir na discussão apresentada, é uma forma de construir e aprimorar conhecimento sobre assuntos específicos. ➢ Resumo: muitas vezes confundido com a resenha, no resumo você apenas relata, de forma sucinta, os pontos principais de um texto. Nele, você jamais deve expor sua opinião ou tecer comentários sobre o texto, deve-se, apenas, apresentar as ideias principais do que você empreendeu do texto. ➢ Fichamento: outro gênero muito comum no ambiente acadêmico, serve para o registro de informações sobre livros, artigos, dissertações, teses etc. Nele, você apresenta informações resumidas sobre o texto lido, tais como: a autoria, o conteúdo e onde o material original pode ser encontrado. Muitos estudantes usam os fichamentos para organizar 40 citações de um determinado autor, assim, quando vão produzir textos (artigos, resenhas, TCC etc.) já têm um aporte de citações específicas para reforçar e enriquecer a discussão apresentada. ➢ Fórum (na EaD): muito comum na EaD, o fórum é um espaço de interação entre estudantes e professores para discussões sobre determinados assuntos. Nele, os estudantes não seguem uma forma específica de escrita, mas utilizam-se de linguagem formal para apresentar sua opinião a respeito do tema proposto. ➢ Relatórios: os relatórios são registros de informações utilizadas para reportar resultados parciais ou totais de uma determinada atividade, experimento, projeto, ação, pesquisa ou outro evento que esteja acabado ou em andamento. Conclusão da aula 3 Chegamos ao final da nossa terceira aula. Você viu os tipos de conhecimentos e como eles estão relacionados ao Ensino Superior, além disso pôde conhecer os principais gêneros discursivos/textuais do ambiente acadêmico. Na próxima aula, você vai entender mais precisamente como se dá o processo de escrita na esfera acadêmica. Atividade de Aprendizagem Agora que você sabe melhor os tipos de conhecimentos, realize uma pesquisa breve na internet identificando se os conhecimentos dispostos podem ser questionados ou não, além disso, tente classificá-los como conhecimentos religioso, filosófico, popular ou científico. Esses conhecimentos se relacionam e acrescentam a sua formação acadêmica? Como eles estão registrados, isto é, em qual gênero discursivo/textual? Reflita! 41 Aula 4 – A escrita: reflexões para produzir um bom texto Apresentação da aula 4 Chegamos à nossa última aula da disciplina Leitura e Produção de Textos. Com toda a bagagem adquirida ao longo da disciplina, vamos finalizar nosso estudo entendendo quais são os principais elementos a que você deve ficar atento(a) para produzir um bom texto. Bom estudo! 4.1 Dissertação e descrição Na aula 2, você viu que a diferença entre interpretar e compreender um texto vai direcionar ações específicas para responder a uma questão, escrever um texto etc., certo? Da mesma forma, na aula 3, viu a importância dos gêneros discursivos/textuais para organizar as formas de comunicações. Outro fator fundamental para escrever um texto é saber a que você se propõe nele. Para isso, é importante identificar se a sua intenção é dissertar, narrar ou descrever algum fato. Nesta seção, você vai ver a diferença desses três indicadores e como cada um deles o ajuda a organizar a sua ideia e o seu texto/escrita de uma forma diferente. Vamos iniciar pela descrição, que, segundo Fiorin e Platão (2007, p. 297), “é um tipo de texto em que se relatam as características de uma pessoa, de um objeto ou de uma situação qualquer, inscritos em um certo momento estático do tempo”. Veja como isso acontece no exemplo a seguir: “Luzes de tons pálidos incidem sobre o cinza dos prédios. Nos bares, bocas cansadas conversam, mastigam e bebem em volta das mesas. Nas ruas, pedestres apressados se atropelam. O trânsito caminha lento e nervoso. Eis São Paulo às sete da noite” (FIORIN; PLATÃO, 2007, p. 297). 42 Repare que no texto, ainda que de forma poética, o autor apenas descreve ações e fatos que acontecem de forma simultânea. Além disso, perceba que nesse texto: 1) não existe um enunciado que possa ser considerado cronologicamente anterior ao outro, eles podem ser reorganizados sem alterar sentido algum; 2) ainda que se fale de ações (conversam, atropelam e caminha), todas elas estão no presente, não indicando, portanto, nenhuma transformação de estado; 3) se invertêssemos a sequência dos enunciados, não correríamos o risco de alterar nenhuma relação cronológica (poderíamos, inclusive, inverter o último enunciado colocando-o no início do texto, colocar o segundo enunciado por último etc., sem alterar os sentidos do texto); (FIORIN; PLATÃO, 2007). Importante Vale destacar que a descrição não relata as transformações de estado que vão ocorrendo progressivamente com as pessoas ou coisas, como é feito em um texto narrativo, por exemplo, mas descreve as propriedades e os aspectos desses elementos em um certo estado, considerando como se estivesse parado no tempo (FIORIN; PLATÃO, 2007). A dissertação é uma das formas mais utilizadas nos textos acadêmicos. Ela é um tipo de texto que analisa e interpreta dados da realidade por meio de conceitos abstratos. É possível fazer relação com a interpretação de texto, em que você aciona outras referências de mundo e leituras para construir sentidos. Fiorin e Platão (2007) explicam que na dissertação predominam os conceitos abstratos, isto é, a referência ao mundo real acontece por meio de conceitos amplos e genéricos, muitas vezes abstraídos do tempo e do espaço. Curiosidade Se na descrição não há relação de anterioridade e posteridade entre os enunciados, porque se relatam aspectos simultâneos de um objeto, na dissertação,em princípio, não existe progressão temporal entre enunciados. Nesse tipo de texto, no entanto, os enunciados guardam entre si relações de 43 natureza lógica, isto é, relações de implicação (causa e efeito; um fato e sua condição; uma premissa e uma conclusão etc.)” (FIORIN; PLATÃO, 2007, p. 299). Vista essa diferença entre a descrição e a dissertação, é importante, estudante, que você não confunda a dissertação com outro estilo de texto: a narração. Vamos diferenciá-los, para, depois, aprofundarmos a discussão quanto à dissertação de textos científicos. Na narração, segundo Fiorin e Platão (2007), o autor se propõe a relatar fatos, em um espaço concreto e um tempo definido, além disso, os fatos narrados não são simultâneos como na descrição e há mudança de um estado para o outro e, por isso, entre os enunciados, existe uma relação de anterioridade e posteridade. É comum em textos literários que a narração seja de uma história criada, isto é, não real. Diferente disso, na dissertação, quem a escreve expressa explicitamente a sua opinião, trazendo como objetivo a análise e a interpretação das transformações relatadas (FIORIN; PLATÃO, 2007). Veja na síntese a seguir as principais características dos textos narrativos, descritivos e dissertativos. Síntese conceitual dos tipos de escrita Fonte: elaborado pelo autor (2021). Es cr it a Narração: narra fatos concretos, em um espaço concreto e um tempo definido; os enunciados são simultâneos e há uma relação de anterioridade e posteridade. Descrição: é um tipo de texto em que se relatam as características de uma pessoa, de um objeto ou de uma situação qualquer, inscritos num certo momento estático do tempo. Dissertação: é um tipo de texto que analisa e interpreta dados da realidade por meio de conceitos abstratos; predominam os conceitos abstratos, isto é, a referência ao mundo real acontece por meio de conceitos amplos, genéricos, muitas vezes abstraídos do tempo e do espaço. 44 4.1.1 A dissertação científica e a importância da argumentação A dissertação científica é o modo de escrever um texto mais presente no ambiente acadêmico, logo, há pontos cruciais que precisam ser observados, justamente porque não é uma dissertação comum, em que você apenas expõe a sua opinião, explicitamente. Alguns fatores linguísticos precisam ser considerados, como o gênero discursivo/textual, por exemplo. Não vamos retomar os gêneros, uma vez que você já aprendeu sobre isso na aula 3. Veremos, a partir de agora, quais cuidados linguísticos precisam ser considerados quando você se propuser a dissertar cientificamente. Importante Vale lembrar que sempre deve-se considerar, também, as condições de produção de um texto. Como Fiorin e Platão (2007, p. 309) explicam: “qualquer enunciado pressupõe que alguém o tenha produzido, uma vez que nenhuma construção linguística surge sem que alguém a tenha elaborado”. Além das condições de produção, outro fator que você precisa ter em mente é: qual efeito de sentido você quer trazer para o seu texto? Ter esse objetivo em mente vai condicionar diretamente a forma como será conduzida a escrita do seu texto, mais principalmente o sentido que ele terá. Vamos ver como isso acontece nas duas sentenças do exemplo a seguir. 1. O reajuste do salário do professor é menor que o aumento da inflação. 2. Eu afirmo que o reajuste do salário do professor é menor que o aumento da inflação. Fonte: elaborado pelo autor (2021). Repare que tanto o enunciado 1 quanto o 2 pretendem transmitir o mesmo conteúdo, isto é, de que o reajuste do salário do professor é menor do que o aumento da inflação. No entanto, há uma diferença importante entre eles. A principal diferença está na identificação de quem profere o texto, ao marcar a posição “eu afirmo”, na segunda sentença. Enquanto na primeira essa 45 informação é omitida, na segunda fica explícita. Isso gera uma diferença de sentido, conforme explica Fiorin e Platão (2007): No primeiro caso, pretende-se criar um efeito de objetividade, pois se enfatizam as informações a serem transmitidas; no segundo, o que se quer é criar um efeito de sentido de subjetividade, mostrando que a informação veiculada é o ponto de vista do indivíduo sobre a realidade (p. 309). Curiosidade “Usa-se um ou outro modo de construir os enunciados em função do sentido que se quer criar. Há textos que são mais convincentes se forem elaborados de maneira a criar efeitos de sentido de objetividade. Outros persuadem melhor se mostrarem um efeito de subjetividade” (FIORIN; PLATÃO, 2007, p. 309). Na dissertação científica o sentido construído sempre estará voltado para a objetividade, neutralizando o “dono do texto”. Vale ressaltar que mesmo que se tenha o intuito de “esconder” quem é o autor, todo texto é produzido por alguém, em um determinado contexto, trazendo a visão de mundo de quem o escreve. Isso deve sempre ser levado em consideração, ok?! Importante O discurso dissertativo de caráter científico deve ser elaborado de maneira a criar um efeito de sentido de objetividade, pois pretende dar destaque ao conteúdo das afirmativas feitas (o texto) e não à subjetividade de quem as proferiu (no caso o autor) (FIORIN; PLATÃO, 2007, p. 309). Ademais, para se conseguir escrever o texto de modo a “esconder” ou não marcar a posição explícita do autor, alguns recursos linguísticos são essenciais. Você vai ver três dicas de como utilizar esses recursos nas suas produções textuais. 46 Saiba mais Ficou curioso e quer melhorar sua escrita? Saber aspectos específicos para escrever um bom texto, além daqueles apresentados nesta disciplina para você? O livro O texto e a construção dos sentidos, publicado pela Editora Contexto, e escrito pela linguista Ingedore V. Koch é excelente para auxiliá-lo nessa evolução. Não deixe de procurá-lo na biblioteca online. O texto e a construção dos sentidos Fonte: Ingedore V. Koch (2003). A primeira dica de recursos linguísticos para a escrita de uma dissertação científica é: evite usar verbos na primeira pessoa do singular. Ao deixar o texto impessoal, você elimina a ideia de que o conteúdo escrito por você seja uma verdade absoluta ou mera opinião. Portanto, evite usar verbos como: digo, penso, acho, na minha opinião, afirmo etc. Veja como isso acontece no exemplo a seguir: 1) Textos em que o autor marca sua posição, utilizando verbos na primeira pessoa, deixa o sentido como mera opinião, isto é, sem relevância para textos científicos: ➢ Eu acredito que 5 milhões de pessoas morreram em decorrência da Covid-19, apenas em 2021. ➢ Na minha opinião, 3 em cada 10 crianças são criadas pelos avós ou não têm registro do nome dos pais no documento. ➢ Penso que o governo deveria investir em energia eólica, a fim de diminuir a emissão de carbono na atmosfera. Fonte: elaborado pelo autor (2021). 47 2) Textos em que o autor marca sua posição de forma explícita, deixando o sentido do texto objetivo e impessoal, distante de uma mera opinião de quem o escreveu: ➢ Cerca de 5 milhões de pessoas morreram em decorrência da Covid-19, apenas em 2021. ➢ É possível apontar que 3 em cada 10 crianças são criadas pelos avós ou não têm registro do nome dos pais no documento. ➢ O governo deveria investir em energia eólica, a fim de diminuir a emissão de carbono na atmosfera. Fonte: elaborado pelo autor (2021). Repare que a opinião no segundo exemplo continua explícita, mas sem a pessoalidade de quem escreve. Vale destacar, estudante, que esse uso de verbos na primeira pessoa deve ser evitado e não proibido. Em alguns momentos, você pode encontrar ou utilizar essa escrita no seu texto, mas de modo a “indicar certeza e cujo sujeito se dilui sob a forma de um elemento de significaçãoampla e impessoal, indicando que o enunciado é produto de um saber coletivo, que se denomina ciência” (FIORIN; PLATÃO, 2007, p. 310). Aqui está, então, a segunda dica: a impessoalidade e a generalização. Para isso, utilizam-se verbos como: pode-se, conclui-se, constata-se, temos, acredita-se, fala-se etc. Veja como isso acontece no exemplo a seguir: ➢ Constata-se que o analfabetismo digital é... ➢ Fala-se que, atualmente, o índice de desempregados no Brasil... ➢ Pode-se considerar que as mulheres são vistas... ➢ Temos como consequência do desemprego pessoas... Fonte: elaborado pelo autor (2021). A terceira dica é: argumentação. No texto dissertativo científico, você precisa a todo tempo argumentar para conseguir defender a ideia central proposta no seu texto. Para isso, utilizam-se de citações, de exemplos do mundo real, de comprovação de fatos etc. Vamos ver agora alguns desses tipos de argumentos e como eles podem ser utilizados: 48 O argumento de autoridade é o mais utilizado nas dissertações científicas. Segundo Fiorin e Platão (2007, p. 311), nesse tipo de argumento, “apoia-se uma afirmação no saber notório de uma autoridade reconhecida em um certo domínio do conhecimento. É um modo de trazer para o texto o peso e a credibilidade da autoridade citada”. Geralmente, utiliza-se desse tipo de argumento ancorando-se em textos teóricos, isto é, de autores renomados e reconhecidos pelos seus trabalhos intelectuais, bem como em pesquisas e outros textos científicos. É importante salientar que há formas específicas de utilizar esse tipo de argumento em trabalhos científicos. As normas da ABNT padronizam essa estrutura, indicando quais são os critérios para esse uso, por exemplo, citações diretas longas e curtas, citações indiretas, paráfrases etc. Saiba mais No Manual de Normas Acadêmicas você tem acesso a explicações e exemplos de cada uma dessas formas de citações. Clique no link a seguir para conferir: https://unina.edu.br/wp-content/uploads/2020/12/Manual-de-Normas-de-Trabalh os-Acad%C3%AAmicos-Faculdade-Unina.pdf Manual de Normas Acadêmicas Fonte: https://unina.edu.br/wp-content/uploads/2020/12/Manual-de-Normas-de-Trabalh os-Acad%C3%AAmicos-Faculdade-Unina.pdf Outra forma de trazer argumentos ao seu texto é no apoio na consensualidade. Fiorin e Platão (2007, p. 311) explicam que “há certos enunciados que não exigem demonstração nem provas, porque seu conteúdo 49 de verdade é aceito como válido por consenso, ao menos dentro de um certo espaço sociocultural”. Veja alguns exemplos a seguir: ➢ O investimento na Educação é indispensável para o desenvolvimento econômico de um país; ➢ A fome é um dos fatores que atrapalham na aprendizagem das crianças. O argumento trazendo provas concretas é outro bastante utilizado, principalmente em textos jornalísticos. Nele, você busca dados em pesquisas que comprovem seus argumentos, utilizando gráficos, tabelas ou apenas números que enfatizam esses dados. Veja o exemplo a seguir. O tema da redação do Enem 2021 trouxe à tona um problema antigo no país: a população sem registro civil. Apesar de ter diminuído desde o início do século, o número de pessoas invisíveis ao Estado ainda é alto: cerca de 3 milhões, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2015, dado mais recente sobre o problema, contingente semelhante à população do Uruguai. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/direitos-humanos/tema-da-redacao- do-enem-falta-de-registro-civil-atinge-ao-menos-3-milhoes-25287754. Acesso em: 27/11/2021. Por fim, é importante você se atentar, estudante, em um fator fundamental para a sua escrita: seu texto deve ser escrito sempre respeitando a linguagem padrão/culta da língua portuguesa. Não seria possível trazer toda a discussão quanto a esse tipo de linguagem nesta disciplina, por envolver diversos fatores linguísticos como ortografia, sintaxe, morfologia etc. No Programa de Letramento Acadêmico (Prolac) da Faculdade Unina, mais precisamente na disciplina Conhecimentos em Língua Portuguesa/Nivelamento da Língua Portuguesa, você teve a oportunidade de compreender melhor as diferentes formas de escrita e alguns conteúdos basilares para uma boa escrita. Caso tenha necessidade, volte ao material disponibilizado e releia o livro da disciplina, bem como assista novamente aos 50 vídeos. Além disso, os professores-tutores do Prolac estão disponíveis para ajudá-lo(-la) com indicações e explicações de conteúdos relacionados à linguagem padrão/culta da língua portuguesa. Para finalizar a nossa disciplina, vale relembrar dois conceitos fundamentais para a escrita de um texto, principalmente o dissertativo científico, que você viu no Prolac: a coesão e a coerência. 4.2 Coesão e coerência Ao ler um texto, frequentemente, opinamos se ele faz sentido, se é coerente; se não faz sentido e se não é coerente. Certo?! Isso acontece devido ao fato de acionarmos outros recursos e experiências de mundo para que um texto faça sentido ou não para o leitor. Vimos como isso ocorre nas aulas 1 e 2, quando discutimos sobre a leitura e os processos de construção de sentido por meio dela. Na escrita também é preciso ter esse cuidado, por isso a coesão e a coerência merecem atenção especial. Primeiro, pelo fato de o autor não ter a oportunidade de conversar com o leitor caso este tenha dúvidas; segundo, porque um texto bem escrito é aquele que consegue passar a mensagem de modo a não gerar dúvidas ao leitor. Nesse sentido, Koch e Elias (2009) explicam que a coesão não é condição necessária nem suficiente da coerência: as marcas de coesão encontram-se no texto (“tecem o tecido do texto”), enquanto a coerência não se encontra no texto, mas constrói-se a partir dele, em dada situação comunicativa, com base em uma série de fatores de ordem semântica, cognitiva, pragmática e interacional (p. 189). Fiorin e Platão (2009) dizem que a coerência deve ser entendida como unidade de sentido do texto. Segundo os mesmos autores, “um texto coerente é um conjunto harmônico, em que todas as partes se encaixam de maneira complementar de modo que não haja nada destoante, nada ilógico, nada contraditório, nada desconexo” (FIORIN; PLATÃO, 2009, p. 261). Os tipos de coerência são diversos, mas vamos nos ater, sucintamente, a alguns deles: 51 ➢ Coerência sintática: relacionada ao conhecimento linguístico do autor, diz respeito ao uso adequado de estruturas linguísticas. O uso inadequado de palavras, pontuação etc. podem gerar ambiguidade e mudança de sentido no texto, como no caso da crase, da ausência de pontuação, da escrita ortográfica ou uso de palavras com duplo sentido. ➢ Coerência semântica: está relacionada às relações de sentidos de expressões presentes no texto. Não podemos dizer, por exemplo, que você viu o sol nascer pela janela do seu quarto voltado para o oeste, se o sol nasce ao leste, certo? ➢ Coerência narrativa: quando toda a história precisa estar contemplando a mesma ideia. Não se pode, por exemplo, dizer que em um momento do texto que mais da metade da população foi dizimada pela covid-19 e depois apresentar uma informação de que 70% da população foi apenas contaminada pelo vírus. ➢ Coerência figurativa: está relacionada à harmonia entre o que o texto se propõe a discutir e os exemplos trazidos para elucidar os fatos/a história. Não podemos, por exemplo, falar que uma pessoa estava descansando nas férias no Nordeste, na praia, e relatar que ela usava roupas como casaco de pele. Também não podemos dizer que ela estava viajando para Curitiba/PR e foi ver o pôr do sol na praia (Curitiba não tem praia). Já a coesão, grosso modo, é que vai ligar as ideias do seu texto. Vai tecer um parágrafo e outro, um enunciado
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