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Fundamentos de Cinesiologia Aplicados à Educação Física Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Ms. Eric Leal Avigo Revisão Textual: Prof. Ms. Claudio Brites Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano • Aspectos Gerais da Cinética Linear • Grandezas Físicas Associadas à Força e ao Movimento • Torques e Alavancas • Equilíbrio e Estabilidade · Permitir ao aluno conhecer os principais aspectos da cinética, mais especificamente a cinética linear, bem como os efeitos das forças no movimento do ser humano e de objetos utilizados por ele na prática de atividade física e esportes. OBJETIVO DE APRENDIZADO Seja bem-vindo(a) às nossas discussões sobre fundamentos de Cinesiologia aplicados à Educação Física! Saiba que esta Disciplina tem como propósito o estudo dos princípios da Ana- tomia aplicados à execução do movimento humano e dos fatores mecânicos internos e externos associados à execução desse movimento; conhecer a des- crição da terminologia de movimento adotada por profissionais da área da saúde e visão geral dos aspectos cinesiológicos e biomecânicos que são utiliza- dos na análise do movimento humano; além de lhe proporcionar momentos de leitura – textual e audiovisual – e reflexão sobre os temas que serão aqui dis- cutidos, contribuindo com sua formação continuada e trajetória profissional. Esta Disciplina está organizada em seis unidades, cujo eixo principal será conhecer os conceitos da Cinesiologia e Biomecânica, e relacioná-los às análises de movimentos dos executantes durante as aulas de Educação Física e prática de atividades físicas; criar meios de análise dos movimentos dos executantes nas aulas de Educação Física e durante a prática de atividades físicas; aplicar os conhecimentos teóricos adquiridos à atuação profissional; além de adequar os movimentos conforme a capacidade e necessidades individuais dos executantes. Isso é o que você encontrará nas próximas unidades, está preparado(a) para embarcar nesta viagem de estudos sobre o movimento do corpo humano? ORIENTAÇÕES Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Contextualização Qual o efeito das forças no movimento humano? É possível que exista movimento em um corpo e/ou objeto se não houver nenhuma força atuando sobre eles? Por que seria importante estudar os efeitos das forças no movimento? Acredite, as forças são muito mais importantes do que imaginamos! Sem elas não andaríamos, correríamos, realizaríamos qualquer habilidade motora, qualquer movimento, seja o mais simples possível. Existem forças internas e externas atuando sobre o ser humano. A forças internas você já conhece, podemos resumi- las principalmente às contrações musculares. Já as forças externas são muitas e apesar de certamente você também conhecer algumas delas, ao longo desta Unidade abordaremos esse assunto com mais detalhes. Fonte: iStock/Getty Images Como arremessar uma bola mais longe? Dentre as possibilidades, você provavelmente responderia: colocando mais força sobre ela. Como andar, correr, locomover-se de forma mais rápida? Dentre as possibilidades, provavelmente em sua resposta haveria algum aspecto de força relacionado, como correr colocando mais força para impulsão. Como saltar mais alto ou mais longe? Não há dúvidas que mais uma vez você associaria colocar mais força para um melhor desempenho. Força vai muito além de atividade física e esporte, pense nas tarefas do dia a dia, em praticamente tudo os aspectos de força estão envolvidos, afinal, vida é sinônimo de movimento e sem força não há possibilidade de movimento! Pense em uma possibilidade de movimento sem que haja alguma força envolvida. Assim, as forças são importantes de serem estudadas, principalmente por profissionais que lidam com o movimento humano. Mergulhe em nossa última Unidade de estudos com empenho e dedicação, pois é hora de encerrar os conteúdos em cinesiologia com chave de ouro. 6 7 Aspectos Gerais da Cinética Linear Mecanicamente, podemos definir movimento como a mudança de posição de um corpo ou objeto no espaço. O ser humano se movimenta para mudar a posição de partes do corpo (segmentos) ou do corpo todo no espaço a fim de interagir com os objetos, com outras pessoas e com o ambiente. Para que o movimento de um objeto ou de um corpo ocorra, é necessária a atuação de uma força que seja suficiente para gerar esse movimento. Mas, o que é força? Como podemos definir força? Importante! Força pode ser defi nida como a interação entre dois objetos na forma de tração ou tensão, compressão ou empurrão e atração. Simplifi cadamente, força também pode ser defi nida como um empurrão ou um puxão. Toda força pode gerar, alterar e parar um movimento. Por exemplo, quando um jogador de futebol chuta uma bola que está parada na marca do pênalti o contato ou interação entre o pé do jogador e a bola faz com que essa bola entre em movimento (o pé gera movimento da bola). Um jogador de voleibol quando defende a bola cortada pelo oponente muda a direção da bola, ou seja, altera sua trajetória. Por fi m, quando o goleiro agarra uma bola chutada pelo atacante ele interage com a bola, parando o movimento da mesma. Importante! Além de gerar, alterar ou parar um movimento, a força também pode gerar a deformação de um ou de ambos os objetos. Quando uma bola de tênis entra em contato com a raquete, ambas – a bola e as cordas da raquete – se deformam temporariamente. Após o término do contato entre a bola e a raquete os dois objetos retornam aos seus tamanhos a formas originais. Isso ocorre devido às propriedades elásticas apresentadas pela maioria dos objetos. Em muitos casos a força exercida pode ultrapassar certo limite – elástico – e a deformação de um ou ambos objetos podem se tornar permanentes. O matemático inglês Isaac Newton (1642-1727) elaborou três leis de movimento, além da lei de gravitação universal, baseado nos efeitos das forças sobres os corpos e/ou objetos. Muitas ideias sobre Mecânica (e cálculo) surgiram durante um retiro de dois anos na fazenda de sua família, devido à peste na Inglaterra que causou o fechamento temporário da Universidade de Cambridge, onde Newton trabalhava como professor. As três leis de movimento mais conhecidas como as três leis de Newton formam a base para a mecânica moderna. A primeira Lei de Newton, batizada como a “Lei da inércia” assume que um corpo permanece em seu estado de repouso ou de movimento uniforme (velocidade constante), em linha reta, a não ser quando influenciado por uma força externa capaz de modificá-lo. Baseado nessa Lei, dois pontos importantes para nós podem ser destacados: (1) é necessária força para mudar o estado de movimento de um corpo ou objeto; (2) objetos em movimento tendem a permanecer em movimento. Obviamente, qualquer pessoa que se movimenta ou que induz movimento em 7 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano algum objeto utilizado na Educação Física e esporte, é fruto de uma força que atua sobre ela, bem como uma força agindo sobre esse objeto, ou seja, se nenhuma força resultante atua não haverá movimento. A Lei de Newton que expressa a relação entre força e movimento é conhecida como “Lei da aceleração” ou segunda Lei do movimento de Newton. De acordo com essa Lei: “A mudança do movimento de um objeto é proporcional à força aplicada sobre ele e ocorre na direção de uma linha reta na qual a força é aplicada”. Ainda, a 2a Lei de Newton também pode ser enunciada como: “A força resultante que atua sobre um corpo é proporcional ao produto da massa pela aceleração por ele adquirida”. Em termos matemáticos, definimos que F = m . a, onde F é a força, m é a massa do objeto e a é a aceleração adquirida pelo mesmo devido à aplicação da força. A unidade de medida da força é kg . m/s2, ou seja, quilogramas metro por segundo ao quadrado, o que foi chamado de Newton em homenagem a Isaac Newton. Assim,1 N é equivalente a 1 kg . m/s2. Relação Força – Movimento Lei da aceleração (2ª Lei de Newton) A mudança de movimento de um objeto é proporcional à força e é feita na direção de uma linha reta na qual a força é aplicada. F = m ⋅ [(vf – vi)/∆t] F = m.a Unidade de medida: m = kg a = m/s2 F = kg ⋅ m/s2 1 kg ⋅ m/s2 = 1N (Newton) Várias forças podem atuar em objeto ao mesmo tempo, conforme é representado a seguir (Figura 1). O resultado é uma força única (força resultante), que reflete as magnitudes e direções das forças atuando no objeto. Box Box BoxBox 5 N 5 N 5 N 5 N5 N 5 N 3 N 5 N 2 N 2 N 2 N 2 N 2 N 2 N ( 1 ) ( 3 ) ( 4 )( 2 ) Figura 1 – Exemplos de forças em diferentes direções e sentidos atuando sobre um corpo ou objeto 8 9 Assim, para entendermos os efeitos de uma ou mais forças aplicadas a um objeto temos que saber da quantidade de força aplicada (magnitude), a direção em que a força é aplicada (força resultante); o ponto de aplicação, ou seja, o local onde a força é aplicada sobre o objeto, a linha de ação, ou seja, a linha reta que se estende através do ponto de aplicação e infinitamente ao longo da direção da força e, finalmente, a orientação da linha de ação de uma força que fornece informação sobre o ângulo de aplicação da força com relação à superfície do objeto. Essas propriedades de uma força são exemplificadas a seguir (Figura 2): A terceira Lei de Newton, denominada “Lei da ação-reação” assume que para toda ação há sempre uma reação igual em magnitude e oposta em direção. Vetor (magnitude e direção) Linha de ação Ponto de aplicação Ângulo de tração Figura 2 – Propriedades de uma força (contração muscular) agindo na articulação do cotovelo Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Dois pontos importantes precisam ser destacados: (1) as forças resultam em forças de “reação” que agem no corpo; e (2) para cada força aplicada pelo corpo a um objeto, o objeto aplica uma força igual contra o corpo. Um exemplo simples dessas forças de reação atuando no movimento humano é uma pessoa que corre impulsionando seu corpo a partir do contato dos pés com o solo. A partir da força exercida pela pessoa contra o chão uma força de reação oposta age contra ela na sola do seu tênis a impulsionando para frente. Outros exemplos poderiam ser citados, tais como uma pessoa que salta, quanto mais a mesma empurra o chão, mais o chão a “empurrará” de volta; uma pessoa que rebate uma bola com uma raquete, a força que ela exerce sobre a bola também é devolvida contra a raquete, sendo que o movimento, obviamente, acontece no corpo (bola) com menor massa. Alguns desses exemplos são ilustrados a seguir (Figura 3): ação reação Figura 3 – Exemplos da terceira Lei de Newton na Educação Física e esporte Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images 9 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Conforme já abordado em outras unidades, cinética é a área da Física que investiga os efeitos das forças sobre o movimento de um corpo ou objeto. As forças de reação, em função das suas características, podem ser classificadas como forças de contato e forças de não contato (ou de atração). A seguir abordaremos a força de não contato que é mais importante para o movimento humano, a força da gravidade. Força de Contato: Gravidade Importante! A força de não contato ou de atração principal é a força da gravidade, que pode ser definida como uma força que faz com que dois corpos sejam atraídos um em direção ao outro, sendo essa força diretamente proporcional à massa dos dois corpos e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles. Essa força é a que mantém a Lua próxima da Terra. Da mesma forma, a força da gravidade é a força que mantém ou tende a manter os corpos no chão; é a força que faz com que a bola lançada para cima retorne e bata no chão. Importante! Newton trouxe contribuições muito importantes a partir de suas três leis de movimento e da Lei da gravitação universal, em seu retiro na fazenda da família, após observar o movimento das maçãs que caiam de uma árvore, algo que só acontecia por conta de uma força externa de não contato, a força da gravidade agindo sobre elas. Figura 4 – Representação da queda das maçãs observadas por Newton, algo que impulsionou suas ideias sobre a força da gravidade Fonte: iStock/Getty Images O peso de um corpo representa a ação da força da gravidade sobre esse corpo e é calculada como a massa desse corpo (m) multiplicado pela aceleração de um corpo devido à ação da gravidade (g). Assim, a equação que define o peso de um objeto é P = m . g. 10 11 Importante! Qual seria o peso de um objeto de 10 kg na superfície da Terra? Sabendo que o valor de g na superfície do planeta Terra é de 9,81 m/s2, o peso desse objeto no planeta Terra é de 98 N. Mas por que a unidade de medida de peso é Newtons? Porque peso é uma força que representa a ação da força da gravidade sobre um objeto. Qual seria o peso desse mesmo objeto de 10 kg na Lua? E em Marte? É diferente do peso do objeto na Terra? A resposta é sim. Mas por quê? A Lua, por ter uma massa menor que a Terra, atrai os corpos com uma força menor e isso pode ser determinado pela aceleração de um objeto imposta pela força da gravidade da Lua. Da mesma forma, em Marte, o peso desse objeto será menor que o peso do objeto na Terra. Mas menor quanto? Sabendo que a aceleração devido à gravidade na Lua é igual a 1,62 m/s2 e em marte é de 3,71 m/s2, o peso do objeto de 10 kg na Lua é igual a 16,2 N e em Marte é igual a 37,1 N; bem menor que o peso desse objeto na Terra, 98,1 N. Trocando ideias... Se alguém lhe perguntar qual é o seu peso corporal, o que você responderia? Muitos, mesmo depois dessa explicação responderia, por exemplo: “Eu peso 76 kg”. Qual é o problema dessa afirmação? Quando o indivíduo diz que pesa 76 kg, na verdade ele está querendo dizer que a massa corporal dele é de 76 kg. Massa e peso são duas grandezas físicas relacionadas, mas diferentes. Massa é definida como a quantidade de matéria que compõe um corpo e tem como unidade de medida no sistema internacional (SI) o quilograma (kg). Já o peso representa a ação da força gravitacional sobre um corpo e tem como unidade de medida Newtons (N). A massa é constante, ou seja, é a mesma na Lua, na Terra, em Marte, no espaço. Já o peso de um corpo muda em função do campo gravitacional onde esse corpo se encontra. Por fim, a massa é uma grandeza física escalar, que é definida simplesmente pela sua magnitude e o peso é uma grandeza vetorial, definida pela sua magnitude, sentido e direção. Grandeza escalar: aquela que é defi nida apenas utilizando um número (magnitude) e uma unidade de medida. Exemplos: massa, temperatura, volume, área, tempo. Grandeza vetorial: aquela que somente fi ca caracterizada quando conhecemos, pelo menos, uma direção, um sentido, um número (magnitude) e uma unidade. Ex pl or Tabela 1 – Diferenças entre massa e peso Massa Peso É uma grandeza escalar. É uma grandeza vetorial. É uma característica do corpo, e não depende da posição nem local em que ele se encontra. Depende do campo gravitacional Exemplo: seu peso na Lua é diferente do seu peso em Marte, que é diferente do seu peso na Terra. É medida em quilogramas – “kg” (SI) É medido em Newtons – “N” (SI) 11 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Conceitos associados ao peso e à massa são centro de gravidade e centro de massa, respectivamente. O Centro de Gravidade (CG) ou baricentro é definido como um ponto imaginário em torno do qual o peso do corpo está igualmente distribuído em todas as direções. O CG é o ponto onde a força da gravidade age sobre o corpo. Um corpo girando livre no espaço também gira ao redor do seu CG. Sustentação Arrasto Empuxo Peso Figura 5 – Exemplos da localização do centro de gravidade em diferentes objetos Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Já o Centro de Massa (CM) é definido como um ponto imaginárioem torno do qual a massa do corpo está distribuída uniformemente e é considerado o ponto de equilíbrio do corpo. Na maioria dos casos, o CM e o CG são localizados no mesmo ponto do corpo e, por essa razão, pode-se utilizar os termos de maneira intercambiável, mesmo que indiquem conceitos diferentes. Figura 6 – Exemplos da localização do centro de massa em diferentes objetos Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images 12 13 A localização do CM no corpo humano varia com a idade, sexo e composição corporal. Ela também pode variar em função da posição assumida pelo corpo. Na posição anatômica de referência, a altura do CM a partir do solo é de aproximadamente 56% dessa altura para os homens e 54% dessa altura para as mulheres. Por exemplo, a altura do CM de um homem com 1,75 metros de estatura é 0,98 metros e de uma mulher de mesma estatura é 0,945 metros. Com relação à posição do CM na direção mediolateral, o mesmo se localiza na linha média do corpo, linha essa que divide os lados direito e esquerdo do corpo. Por fim, com relação à posição do CM na direção anteroposterior, o mesmo se localiza cerca de 2,5 cm à frente do maléolo lateral do tornozelo. Figura 7 – Exemplos da localização do centro de massa no movimento humano Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images 13 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Forças de Contato Em algum momento da sua vida você já deve ter ouvido alguém dizer que “dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo”. Isso realmente é verdade. Quando um corpo tenta ocupar o lugar de um outro corpo no espaço, esse corpo, de algum modo, reage à força imposta por esse outro corpo. Assim, podemos dizer que um corpo reage ao contato do outro. As figuras (8) a seguir são autoexplicativas e exemplificam que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço. Essa relação entre os corpos pode ser resumida pela terceira Lei de Newton, ou Lei da ação e reação: “Para cada ação, existe uma reação igual e contrária. Quando um corpo exerce uma força sobre outro, este segundo corpo exerce uma força de reação que é igual em magnitude e contrária em direção sobre o primeiro corpo” Figura 8 – Dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço, conforme a Lei da ação-reação de Newton Fonte: iStock/Getty Images Importante! As forças de reação podem ser decompostas em componentes. A componente de força que atua perpendicularmente à superfície de contato entre os corpos em contato é chamada de força de reação normal (N). Já a componente que age paralelamente à superfície de contato entre dois objetos é chamada de força de atrito. A Figura a seguir representa essas duas forças. Importante! Figura 9 – Representação das forças de contato normal e de atrito 14 15 A força de reação normal é definida como a componente de força que atua perpendicularmente (contra) a superfície de contato. A força de reação normal é equivalente ao peso de um objeto em magnitude, mas contrária em direção, quando este objeto se encontra parado em uma superfície plana. Da mesma forma, a força de reação normal é equivalente à força que aplicamos em uma parede, mas contrária em direção quando fazemos um exercício de alongamento do gastrocnêmio (Figura 10). Já quando seguramos um copo, a força normal é equivalente à somatória das forças aplicadas pelas pontas dos dedos sobre o copo. 5 N 5 N Figura 10 – Exemplos da força de contato normal: força exercida sobre a parede em um alongamento e força exercida sobre um copo que é segurado pelos dedos Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Quando andamos, corremos ou saltamos, aplicamos força contra o solo e o solo responde aplicando a mesma quantidade de força que aplicamos sobre ele, mas em sentido contrário. Quando essa força for perpendicular à superfície de contato entre o pé e o chão, chamamo-la de força de reação normal. Quando estamos parados, essa força é equivalente ao peso do nosso corpo. Quando nos movimentamos, essa força pode se apresentar menor ou maior que o peso corporal. Quando estamos andando e corremos, essa força é maior que o peso corporal, quando tocamos o calcanhar no chão após o balanço da perna (impacto) e quando propulsionamos nosso corpo para cima para iniciarmos o balanço da perna (movimento da perna para frente no ar) no final da fase de apoio. Já quando aplicamos um movimento para realizar um salto vertical, temos que executar uma força que equivale aproximadamente a três vezes para que possamos sair do chão direcionando nosso corpo para cima. Por outro lado, quando aterrissamos, temos que lidar com forças normais que podem chegar a cinco vezes o peso corporal e essa força deve ser dissipada ou amortecida pelos músculos do nosso corpo para não causar lesões nos ossos e articulações. A força de atrito é uma componente da força de reação que atua paralelamente na interação das superfícies em contato de dois objetos. Essa força atua na direção oposta àquela do movimento real ou iminente e que impede ou dificulta um objeto de deslizar sobre o outro. A força de atrito é um produto da força de reação normal (N) e do coeficiente de atrito (μ). A força de reação normal foi mencionada anterior- mente. Já o coeficiente de atrito expressa a dificuldade das superfícies de dois corpos em contato de deslizar uma em relação à outra. Essa dificuldade está relacionada ao grau de entrelaçamento das superfícies em contato. Quanto mais imperfeitas ou irre- 15 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano gulares são as superfícies dos objetos em contato, maior o coeficiente de atrito. Vale ressaltar que o coeficiente de atrito não é baseado nas características de apenas uma das superfícies em contato – e sim da interação das duas superfícies. Força Normal Força de atrito Força de peso Força Motriz Imagem ampliada do ponto indicado Figura 11 – Representação da relação entre força de contato normal e força de atrito, bem como ao que se refere ao coeficiente de atrito Na verdade, para cada interação entre superfícies, existem dois valores de coefi- ciente de atrito, um chamado de coeficiente de atrito estático e outro como coeficiente de atrito cinético ou dinâmico. O estático representa o coeficiente de atrito quando há relação entre as superfícies quando os objetos em contato estão parados (em repouso). O cinético representa o valor do coeficiente de atrito quando os objetos em contato estão em movimento, um em relação ao outro. Praticamente em todos os casos, o coeficiente de atrito cinético é sempre maior que o coeficiente de atrito estático. Tabela 2 – Exemplos de coeficientes de atrito estático e cinético (dinâmico) Superfícies em Contato Estático (ms) Cinético (mk) Teflon com Teflon 0,04 0,04 Borracha no Concreto (molhado) 0,30 0,25 Borracha no Concreto (seco) 1 0,8 Aço no Aço 0,74 0,57 Metal em Metal (lubrificado) 0,15 0,06 Articulações Sinoviais 0,01 0,003 Pranchas de esqui (sobre neve molhada) 0,14 0,1 Gelo em Gelo 0,1 0,03 Madeira em Madeira (Áspera) 0,5 0,4 Importante! Em atividades como andar e correr o atrito entre o calçado e a superfície (solo) deve ser apropriado. Se o atrito for baixo, a pessoa tende a escorregar, se o atrito for alto, a pessoa tende a tropeçar. Por exemplo, as chuteiras usadas por jogadores de futebol são utilizadas para evitar que a pessoa escorregue, pois os cravos aumentam o coeficiente de atrito entre a sola da chuteira e a grama. Porém, o aumento do atrito pode provocar lesões quando o pé fica preso na grama durante uma jogada. Podemos ainda ver a aplicação da força de atrito em vários esportes. Por exemplo, o goleiro usa luvas para aumentar o coeficiente de atrito entre a mão e a bola. A bola de basquetebol tem uma superfície áspera e cheia de pequenos pontos ressaltados para aumentar o coeficiente de atrito entre a bola e a mão a fim de evitar que escorregue durante o recebimento de um passe. Pense e descreva outros exemplos sobre a relação entre o atrito eo esporte. Você Sabia? 16 17 A força elástica também pode ser considerada uma força de reação. A força elástica pode ser definida como uma força de restauração – uma força que faz com que o material retorne ao seu tamanho original após este mesmo ser deformado (aumentar ou diminuir de comprimento). Uma mola quando não há força sendo aplicada sobre ela tem um comprimento de repouso. Quando uma força é exercida sobre essa mola, comprimindo-a ou alongando-a, tende a fazer uma força para voltar ao seu tamanho original. A essa força de restauração damos o nome de força elástica. Essa força depende da mudança no comprimento (∆S) e da constante elástica (k) que representa a rigidez do objeto. Materiais com propriedades elásticas são usados como ferramentas para a realização de exercícios visando o fortalecimento muscular. Por exemplo, atualmente, a realização de exercícios com fitas elásticas é uma tendência em locais de prática esportiva. Pode-se usar essas fitas elásticas também na escola para esse fim. Tubos de látex de baixo custo usados em hospitais também podem ser usados para realização de exercícios utilizando a força elástica como resistência. Figura 12 – Exemplos de força elástica Fonte: iStock/Getty Images Os nossos músculos também possuem propriedades elásticas. Quando alongamos os músculos, tendem a retornar ao seu comprimento de repouso. A propriedade elástica dos músculos é garantida pela presença de tecido conjuntivo elástico que forma o endomísio, epimísio e perimísio que envolvem as fibras, feixes de fibras (fascículos) e o músculo como um todo, respectivamente. Em muitos movimentos que realizamos diariamente, fazemos uso dessa força elástica gerada pelos músculos. Por exemplo, quando andamos, corremos, saltamos e arremessamos, alongamos os músculos em determinado momento e esse alongamento faz com que o músculo armazene força elástica que é restituída ou devolvida em forma de força quando o músculo encurta para gerar força. Assim, a força total que o músculo produz para realizar esses movimentos pode ser produzida de forma ativa, por meio da contração muscular; e de forma passiva, por meio da força elástica. 17 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Figura 13 – Exemplos de força elástica no movimento humano Fonte: iStock/Getty Images Grandezas Físicas Associadas à Força e ao Movimento Grandezas físicas diretamente associadas à força e ao movimento e que devem ser mencionadas são impulso, momento linear, trabalho e potência. Impulso é definido como o produto da força e tempo de ação da força (I = Fxt). A unidade de medida do impulso é Newtons-Segundo (N.s). Por exemplo, podemos calcular o impulso que “impulsiona” e que leva uma bola a realizar um movimento. Para isso, precisamos saber quanta força é aplicada em uma bola e qual é o tempo de aplicação dessa força (tempo de contato entre o pé e a bola). Da mesma forma, podemos calcular o impulso que leva uma pessoa a saltar mais alto. Para isso, temos que calcular a força média aplicada durante o movimento do salto e o tempo que essa força foi aplicada. Outra grandeza física relacionada à força é o momento linear. Momento linear é definido como a quantidade de movimento que um corpo possui e é calculado multiplicando a massa do corpo pela velocidade de movimento (Q = mxv). A unidade de medida de momento linear é quilograma-metro por segundo (kg.m/s). Uma pessoa de massa 70 kg correndo com velocidade constante de 5 m/s possui momento linear de 350 kg.m/s. Se essa pessoa se choca de frente com outra pessoa de 100 kg, correndo a uma velocidade de 3 m/s resultaria em um movimento na direção da pessoa de 70 kg, pois apresenta um momento linear maior que a pessoa de 100 kg. Existe uma relação direta entre impulso e momento. Na verdade, podemos dizer que o impulso resulta em momento linear ou impulso é igual a variação de momento linear. Observe essa relação, matematicamente: 18 19 F m a a v t F m v t F t m v I F t Q m v I Q = × = = × ( ) × = × = × = × = / / Assim, uma pessoa que gera mais impulso durante um movimento para o salto vertical saltará mais alto, pois a quantidade de movimento ou momento linear gerada será maior. Para mais informações e exemplos sobre a relação de impulso e momento linear, inclusive como utilizar as fórmulas matemáticas, você pode acessar um dos livros da Referência básica desta Unidade (HALL, 2009), especifi camente o capítulo 12, sobre cinética linear do movimento humano. Ex pl or Trabalho mecânico é definido como o produto entre a força aplicada (F) e o deslocamento (d) gerado por essa força (τ = Fxd). A unidade de medida de trabalho é Newton-Metro, mas é chamada de Joule em homenagem a James Joule, um físico britânico que descobriu a relação entre o calor e o trabalho mecânico. 25kg 25kg 2m Figura 14 – Representação do trabalho mecânico no levantamento de peso Fonte: iStock/Getty Images Qualquer movimento que realizamos é consequência do trabalho mecânico produzido. Realmente, o trabalho só existe se há a realização de movimento. Quando fazemos força em um objeto de forma isométrica, embora a força seja produzida, não há produção de trabalho, pois não há deslocamento do objeto onde essa força é aplicada. Trabalho mecânico pode ocorrer como resultado de uma troca de energia. Por exemplo, em uma máquina a vapor, a energia térmi- ca causada pelo aquecimento da água se transforma em energia mecânica para mover um trem, navio ou um tear de uma tecelagem. A energia gerada para con- trair nossos músculos (eletroquímica pela quebra do ATP) será transformada em energia mecânica (trabalho mecânico) que gerará um movimento de segmentos corporais adjacentes. 19 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Potência mecânica pode ser definida como “taxa de mudança do trabalho” e, deste modo, pode ser calculada como o trabalho mecânico dividido pelo tempo (P =τ/t.). A unidade de medida de potência mecânica é Watts (W), em homenagem ao engenheiro escocês James Watt. Assim, se realizo um mesmo trabalho mecânico em um tempo menor, posso dizer que sou mais “potente”. Por exemplo, se levanto uma barra de 500 N por 2 metros, produzo um trabalho mecânico de 1.000 J. Se esse trabalho é realizado em 0,5 segundos, gero uma potência mecânica média de 2.000 W. Se esse mesmo trabalho for produzido em 2 segundos, a potência será de 500 W. A potência instantânea pode ser calculada também pelo produto entre a força aplicada no objeto e a velocidade instantânea desse objeto (P = Fxv). Atividades de alta intensidade, tais como corridas e saltos necessitam que os músculos sejam capazes de gerar força rapidamente, ou seja, que produzam potência. Chutes, arremessos e lançamentos para alcançarem longas distâncias também precisam que os músculos contraiam e gerem força de forma rápida, que produzam grandes magnitudes de potência muscular. Torques e Alavancas Quando aplicamos força em um objeto e esse objeto gira ao redor de um eixo, temos que ter em mente que a força aplicada é apenas parcialmente responsável pelo movimento (angular) do objeto ao redor desse eixo. Pense na simples ação de abrir uma porta. Por que será que a maçaneta da porta fica na posição oposta à dobradiça (eixo de rotação para os movimentos da porta) e não ao lado desta? A sua resposta certamente seria “porque eu preciso fazer menos força” quando se encontra longe da maçaneta. E por que será que isso ocorre, haja vista que a massa da porta não muda ou não há ninguém do outro lado tentando manter a porta fechada? A grandeza física que está relacionada à geração de movimentos de objetos ao redor de um eixo de rotação é o torque ou momento linear. Figura 15 – Representação do movimento angular de uma porta com forças aplicadas em diferentes distâncias em relação ao eixo de rotação (dobradiça) 20 21 Importante! Torque (ou momento de força) pode ser defi nido como o efeito rotatório de uma força aoredor de um eixo de rotação. Especifi camente, torque é o produto da força e da distância entre o ponto de aplicação da força e o eixo de rotação (T = Fxd). A unidade de medida de torque no SI é unidade de força por unidade de distância, ou seja, Newton-Metro (Nm). Para descrever o torque completamente é preciso informar a magnitude desse torque, o eixo de rotação e o sentido de aplicação do torque. Quando o movimento ocorre no sentido horário, o torque é considerado negativo e quanto gera movimento no sentido anti-horário, o torque é considerado positivo. Importante! O conceito de torque se torna um pouco mais complicado, pois ele depende não só da magnitude ou quantidade de força aplicada e da distância entre o ponto de aplicação dessa força e o eixo de rotação. O torque também depende do ângulo de aplicação dessa força em relação à superfície do objeto. Especificamente, o torque depende da força aplicada sobre um objeto, que é efetivamente utilizada para fazê- lo girar em torno de um eixo. Apenas a componente de força perpendicular (90°) à superfície do objeto o faz girar. Por exemplo, se uma força é aplicada com um ângulo de 30° com relação à superfície do objeto, apenas a metade dessa força será usada para gerar movimento de rotação desse objeto ao redor de um eixo de rotação. A outra metade da força será usada ou para pressionar ou para retirar o objeto do eixo de rotação, dependendo da direção da força aplicada. Vejamos o exemplo a seguir. Suponhamos que uma pessoa aplica 10 N de força a 3 metros de distância do eixo de rotação. Se essa força for aplicada perpendicularmente (A) à superfície do objeto, o torque gerado será de 30 N.m (T = Fxd, T = 10x3, T = 30 N.m). Agora, se esta mesma quantidade de força for aplicada a 3 metros de distância com relação ao eixo de rotação, mas com um ângulo de 30° em relação à superfície do objeto, o torque não será mais de 30 N.m, mas sim de 15 N.m (B). Figura 16 – Representação do movimento angular de uma porta com forças aplicadas em ângulos diferentes (A = 90º, B = 30º) 21 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Para melhor compreendermos os efeitos de um torque, precisamos re- tomar alguns conceitos de Física no Ensino Médio, especificamente a par- te da Mecânica que trata de alavancas. Segundo Arquimedes de Siracusa, um cientista grego da Antiguidade, uma alavanca grande o suficiente e um ponto de apoio são capazes de mover o mundo. Mas o que é uma alavanca? Figura 17 – Representação de um sistema de alavanca segundo Arquimedes Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Importante! Alavanca é uma máquina simples que consiste de uma haste (barra) rígida, de um eixo de rotação no qual essa haste vai girar ao redor, e de uma força potência e uma força de resistência que são aplicadas sobre essa haste. Uma haste ou barra rígida por si não é uma alavanca. O que faz essa haste se tornar uma alavanca é o uso dela como uma máquina simples e a presença do eixo de rotação e de forças sendo aplicadas sobre ela. O corpo humano pode ser considerado um sistema de alavancas. No caso, os ossos funcionam como hastes rígidas, as articulações como eixo de rotação, a força (F) é gerada pelos músculos e a resistência (R) pode ser simplesmente o peso do segmento corporal ou o peso e mais uma força externa aplicada nessa haste. Importante! As alavancas podem ser classificadas em três tipos distintos, de acordo com a posição relativa do eixo, força e resistência. (1) As alavancas onde a força e a resistência são aplicadas em lados opostos ao eixo são chamadas de alavancas de primeira classe ou interfixas. Gangorra, tesoura, pé de cabra são exemplos de alavancas de primeira classe. (2) As alavancas onde a força e a resistência são aplicadas do mesmo lado, mas onde o ponto de aplicação da força está mais distante do eixo de rotação quando comparado ao ponto de aplicação da resistência são chamadas de alavanca de segunda classe ou inter-resistentes. Exemplos de alavanca de segunda classe são: carrinho de mão, chave de roda, quebra-nozes, abridor de garrafa. (3) Por fim, as alavancas onde a força (potência) e a resistência estão posicionadas do mesmo lado com relação ao eixo, mas com a força posicionada mais próxima deste são chamadas de alavancas de terceira classe ou interpotentes. Exemplos de alavanca de terceira classe são: vassoura, vara de pesca, remo e pá. F Eixo R Figura 18 – Representação de um sistema de alavanca no corpo humano Fonte: Adaptada de iStock/Getty Images 22 23 F F F Equilíbrio Arco de movimento A A R R Figura 19 – Exemplos dos três tipos de alavancas: interfi xa (1º classe), inter-resistente (2º classe) e interpotente (3º classe) Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Resumidamente, pode-se dizer que quando em um sistema de alavancas o eixo está no meio, o tipo de alavanca é interfixo; quando a resistência está no meio, o tipo de alavanca é inter-resistente; e quando a força (potência) está no meio, o tipo de alavanca é interpotente. A posição relativa do eixo, força e resistência de uma alavanca definirá sua eficiência mecânica. A eficiência de uma alavanca na produção de força é caracterizada pela sua Vantagem Mecânica (VM), que é definida pela razão entre Braço de momento de Força (BF) e Braço de momento de Resistência (BR), ou seja, o BF dividido pelo BR (VM = BF / BR). BF é a distância entre o ponto de aplicação da força e o eixo de rotação. Já BR é a distância entre o ponto de aplicação da resistência e o eixo de rotação. Quando o BF for igual ao BR, a VM é igual a 1. Uma vantagem mecânica igual a 1 significa que para mover uma alavanca na direção da aplicação da força, essa deve ser maior que a resistência. Já para manter a alavanca em equilíbrio, ou seja, sem movimento, a magnitude da força deve ser igual ao da resistência. Nesse caso, não existe uma vantagem mecânica de fato. BF BR Resistência 5m 5m VM=1 Figura 20 – Representação de uma VM=1 (ausência de vantagem) 23 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Quando a vantagem mecânica for maior do que 1 (VM>1), a magnitude da força utilizada pode ser menor que o valor da resistência para que a alavanca se mova na direção da aplicação da força. Quanto maior esse valor de VM, menor será a necessidade de geração de força para se mover uma resistência. Por exemplo, se a vantagem mecânica for igual a 4 e a resistência a ser levantada for equivalente a 98,1 N (m = 10 kg) a força necessária para mover essa resistência na direção da aplicação da força será de aproximadamente 24,6 N, o que equivale 2,5 kgf (quilograma-força). Todavia, o bônus referente à necessidade de menor produção de força vem com um ônus. Quando a vantagem mecânica for maior do que 1, invariavelmente a amplitude de movimento linear no ponto de aplicação da força também será maior do que a amplitude de movimento linear do ponto de aplicação da resistência. No caso do exemplo anterior, se a vantagem mecânica for igual a 4 e se quiser fazer com que o movimento linear do ponto de aplicação da resistência seja de 10 cm, deve-se realizar um movimento linear no ponto de aplicação da força de 40 cm, ou seja, 4 vezes mais. Figura 21 – Representação de uma VM>1 (situação de vantagem) Por fim, quando você tem uma alavanca com vantagem mecânica menor do que 1 (VM<1), significa que você terá que fazer mais força que o valor da resistência para mover essa alavanca na direção da aplicação dessa força. Com isso, podemos dizer que a vantagem mecânica menor do que 1 não é uma vantagem e sim uma “desvantagem” mecânica. Porém, depende do que se pretende, nem tudo é desvantagem, pois há sim uma vantagem nesse tipo de alavanca. O ponto positivo ou bônus desse tipo de alavanca seria que a amplitude de movimento no ponto de aplicação da força é invariavelmente menor que a amplitude de movimento no ponto de aplicação da resistência. Assim, suponhamos que se tenha uma alavancacom vantagem mecânica de 0,2 (VM = 0,2) e uma resistência de 98,1 N para movimentar com 24 25 essa alavanca. Para mover essa alavanca teria que fazer 5 vezes mais força que o valor da resistência (o inverso de 0,2 é 5), ou seja, teria que exercer uma força maior que 490,5 N. Porém, se se quisesse mover essa resistência por 50 cm, teria que mover 10 cm no ponto de aplicação da força. Figura 22 – Representação de uma VM<1 (situação de desvantagem) Importante! As vantagens mecânicas de uma alavanca de primeira classe podem ser menores, maiores ou iguais a 1, ou seja, as posições relativas da força e da resistência, quem está mais próximo ou distante do eixo, que defi nirá se é uma situação de vantagem ou desvantagem mecânica. No caso de as distâncias serem iguais (ausência de vantagem), vencerá quem exercer maior magnitude de força no sistema. Já as alavancas de segunda classe sempre apresentarão vantagens mecânicas maiores do que 1, afi nal, por estar no meio, a resistência sempre estará mais próxima do eixo e, consequentemente, seu braço de momento sempre será menor. Nesse caso, as forças necessárias para movimentar as alavancas de segunda classe sempre poderão ser menores do que as resistências agindo sobre a alavanca. Por fi m, as alavancas de terceira classe sempre apresentarão vantagens mecânicas menores que 1, afi nal, por estar no meio, a força (potência) sempre estará mais próxima do eixo e, consequentemente, seu braço de momento sempre será menor e, desse modo, as forças necessárias para se mover as alavancas de terceira classe sempre serão maiores que os valores das resistências. Importante! Primeira classe Interfixa VM = 1 >1 <1 Segunda classe Interesistente VM>1 Terceira classe Interpotente VM<1 Qual seria a relação entre torque e alavancas? Ex pl or 25 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano O movimento gerado em uma alavanca ocorre em função do torque gerado pela aplicação da força e pela aplicação da resistência. Se o torque maior for gerado pela força, ocorrerá um movimento angular da alavanca na direção da força aplicada. Se o torque maior for gerado em função da resistência, um movimento dessa alavanca em direção da aplicação resistência ocorrerá. No exemplo a seguir, qual seria o sentido do movimento da alavanca? No sentido da força (ou anti-horário), ou da resistência (ou horário)? Ou não haveria movimento? Por quê? Figura 23 – Exemplo da relação torque x alavanca Nesse caso, não haveria movimento, pois essa alavanca encontra-se em equilíbrio, ou seja, o torque gerado pela resistência é igual ao torque gerado pela força: 20 N.m (T = Fxd, T = 10x2 e T = 20x1). Lembre-se, torque é o produto da força e da distância entre o ponto de aplicação da força e do eixo de rotação, que no caso é o BF ou o BR. Importante! Feitas essas considerações, podemos voltar ao que mais nos interessa: qual seria a aplicação do conceito de torque e alavancas no movimento humano? Trocando ideias... Os movimentos do nosso corpo no espaço (lineares ou translacionais) dependem dos movimentos angulares realizados pelos segmentos corporais ao redor das articulações. Mencionamos anteriormente que o corpo humano é um complexo sistema de alavancas, onde os ossos são as hastes rígidas, as articulações os eixos de rotação, as forças são aplicadas pelos músculos e as resistências podem ter origem nas forças externas que atuam nesse corpo (e.g., peso do segmento e do halter que a pessoa carrega com esse segmento). Assim, em qualquer movimento que realizaremos devemos gerar torque muscular (em função das forças produzidas pelos músculos) para vencermos o torque gerado pela resistência. Torque muscular é o que cria o efeito de rotação para que nossos membros se movimentem ao redor das articulações. Grande parte das alavancas do corpo humano são de terceira classe, ou seja, estão em situação de desvantagem mecânica. Isso quer dizer que sempre temos que produzir mais força que a magnitude da força da resistência. 26 27 No caso dos seres humanos nem tudo é desvantagem, esse fato tem lá suas vantagens. Lembremos que em uma alavanca de terceira classe há a necessidade de se gerar mais força do que a magnitude de resistência em função da vantagem mecânica desse tipo de alavanca ser menor que 1. Porém, a amplitude de movimento é maior onde essa resistência está sendo aplicada. Assim, pode-se dizer que no “design” do corpo humano foi priorizada a amplitude de movimento e não a necessidade de força que esse movimento geraria. Obviamente, se a maioria dos sistemas de alavanca do corpo humano está em desvantagem (VM<1), os músculos sempre precisarão gerar maior quantidade de força por sua contração muscular, se comparado às cargas (forças) de resistência que agem sobre o corpo, entretanto, isso vem a ser recompensado pela grande amplitude de movimento concedida à maioria de articulações do nosso corpo. Na verdade, o corpo humano possui os três tipos de alavancas, destacando-se, é claro, por uma maior quantidade de alavancas interpotentes ou de terceira classe. Alavancas de segunda classe são raras no corpo humano, mas é algo que pode ser encontrado na articulação do tornozelo, por exemplo, se estamos em pé e fazemos o movimento de flexão plantar. Nessa situação de alavanca inter-resistente, o eixo encontra-se no ponto de apoio dos pés no chão (articulação metatarsofalangiana), a resistência está no meio pois é a força peso (massa x aceleração da gravidade) do corpo que se concentra em seu cento de massa, e a força (potência) é gerada pelos músculos posteriores da perna (gastrocnêmio e sóleo). Força Eixo Resistência Figura 24 – Alavanca de segunda classe (inter-resistente) no corpo humano Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images Já as alavancas interfixas ou de primeira classe não são assim tão raras no corpo humano, mas não existem em grande quantidade como as alavancas interpotentes. Os movimentos de flexão, extensão e hiperextensão que acontecem no pescoço movimentando a cabeça para frente e para trás são exemplos de alavancas interfixas. No caso, a articulação do “pescoço” é o eixo que está no meio, os músculos extensores e flexores (como o esplênio da cabeça e o esternocleiodomastóideo) geram força (potência) e estão posicionados em uma extremidade, enquanto o “peso da cabeça” é a resistência posicionada na extremidade oposta. A Figura a seguir exemplifica os três tipos de alavancas no corpo humano: 27 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Figura 25 – Exemplos dos três tipos de alavancas: interfixa (1º classe), inter-resistente (2º classe) e interpotente (3º classe) no corpo humano Fonte: Adaptado pelo autor Para mais informações e exemplos sobre torques e alavancas no corpo humano, inclu- sive como calcular o torque muscular, você pode acessar um dos livros da Referência básica desta Unidade (HALL, 2009), especificamente o capítulo 13, sobre equilíbrio e movimento humano. Ex pl or Equilíbrio e Estabilidade Importante! Equilíbrio é um estado em que todas as forças e torques estão balanceados. Um corpo completamente imóvel encontra-se em equilíbrio estático. Um corpo em movimento encontra-se em equilíbrio dinâmico. Mecanicamente, um corpo se encontra em equilíbrio quando todas as forças e torques agindo sobre e/ou produzidas por esse corpo estão balanceadas, ou seja, a somatória de todas as forças e torques agindo sobre esse corpo é igual a zero (∑F e ∑T = 0). Já estabilidade pode ser definida como a capacidade de um corpo ou objeto retornar ao seu estado de equilíbrio ou à posição original após ser deslocado (perturbado). Consequentemente, estabilidade está relacionada à capacidade de resistir à perda de equilíbrio. Importante! Alguns fatores influenciam o equilíbrio e a estabilidade. Dentre eles podemos destacar cinco: (1) massa; (2) força de atrito; (3) altura do centro de gravidade; (4) tamanho da base de suporte; e (5) linha de projeção na basede suporte. Esses fatores serão sucintamente descritos a seguir: 28 29 1. Quanto maior a massa de um objeto, maior a sua inércia e, consequentemente, maior seria a força e o torque necessários para causar perda de equilíbrio e perturbar e estabilidade desse objeto. Porém, quanto maior a massa do objeto maior a dificuldade desse objeto em retomar o equilíbrio após uma perturbação (menor estabilidade); Figura 26 – Infl uência da massa corporal no equilíbrio e estabilidade Fonte: iStock/Getty Images 2. Quanto maior a magnitude da força de atrito entre as superfícies de dois corpos em contato, maior a força necessária para iniciar e manter o movimento, ou seja, maior o equilíbrio e a estabilidade; Figura 27 – Infl uência da força de atrito no equilíbrio e estabilidade Fonte: iStock/Getty Images 3. Quanto mais baixo o centro de gravidade de um corpo, maior a sua estabilidade. Assim, a estabilidade de um corpo é inversamente proporcional à altura do seu centro de gravidade; CG Figura 28 – Infl uência da altura do centro de gravidade no equilíbrio e estabilidade Fonte: Adaptado de iStock/Getty Images 29 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano 4. Quando maior a área da base de suporte, maior é a estabilidade de um corpo. Essa área é limitada pelas regiões mais externas de contato entre o corpo e a(s) superfície(s) de apoio; Figura 29 – Influência do tamanho da base de suporte no equilíbrio e estabilidade Fonte: iStock/Getty Images 5. Um corpo é mais estável se a linha de projeção vertical do centro de gravidade estiver dentro da base de apoio. Quanto mais próxima a proje- ção do centro de gravidade estiver dos limites da base de suporte, maior é o grau de instabilidade de um corpo. Toda vez que a linha de projeção do centro de gravidade ultrapassa a área da base de suporte, o corpo encon- tra-se em desequilíbrio. Figura 30 – Influência da linha de projeção do centro de gravidade no equilíbrio e estabilidade Para mais informações e exemplos sobre equilíbrio e estabilidade, bem como os fatores que os influenciam, você pode acessar um dos livros da Referência básica desta Unidade (HALL, 2009), especificamente o capítulo 13, sobre equilíbrio e movimento humano. Ex pl or 30 31 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Biomecânica Básica HALL, S. Biomecânica Básica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. Cinesiologia Clínica e Anatomia LIPPERT, L. S. Cinesiologia Clínica e Anatomia. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. Vídeos O Salto Campeão de Fabiana Murer e Curiosidades do Salto com Vara https://youtu.be/dpYwcMp92To Análise Biomecanica do Salto em Altura https://youtu.be/KiMZXVbbq-k Lançamento de Dardo: Analise Biomecanica https://youtu.be/G5u-MF5lI1g A Receita para o Salto em Distância Perfeito https://youtu.be/-2_c85LYiAI Leitura Atlas Fotográfico de Anatomia COLICIGNO, P. R. C. et al. Atlas fotográfico de Anatomia. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009. https://goo.gl/4ppM6u Manual de Cinesiologia Estrutural FLOYD, R. T. Manual de Cinesiologia Estrutural. 16. ed. Barueri, SP: Manole, 2011. https://goo.gl/vdKG4S 31 UNIDADE Conceitos de Cinética para Análise do Movimento Humano Referências HALL, S. J. Biomecânica Básica. 5. ed. São Paulo: Manole, 2009. HAMILL, J.; KNUTZEN, K. Bases biomecânicas do movimento humano. 2. ed. Barueri, SP: Manole, 2008. MCGINNIS, P. M. Biomecânica do esporte e do exercício. Porto Alegre, RS: Artmed, 2015. 32
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