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NEUROBIOLOGIA DE ANSIEDADE

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DOCÊNCIA EM 
SAÚDE 
 
 
 
 
 
NEUROBIOLOGIA DA ANSIEDADE 
 
 
 
1 
 
Copyright © Portal Educação 
2012 – Portal Educação 
Todos os direitos reservados 
 
R: Sete de setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 
Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 
Internacional: +55 (67) 3303-4520 
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Endereço Internet: http://www.portaleducacao.com.br 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil 
 Triagem Organização LTDA ME 
 Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 
 Portal Educação 
P842n Neurobiologia da ansiedade / Portal Educação. - Campo Grande: Portal 
Educação, 2012. 
 91p. : il. 
 
 Inclui bibliografia 
 ISBN 978-85-8241-74-0 
 1. Ansiedade. 2. Neurobiologia. 3. Ansiedade patológica I. Portal Educação. 
II. Título. 
 CDD 616.8522 
 
 
2 
 
SUMÁRIO 
 
 
1 O QUE É ANSIEDADE: DEFINIÇÕES ....................................................................................... 4 
2 MEDO OU ANSIEDADE? ......................................................................................................... 11 
3 ANSIEDADE NORMAL E ANSIEDADE PATOLÓGICA ........................................................... 15 
4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE ANSIEDADE ..................................................................... 18 
4.1 Transtorno do pânico .............................................................................................................. 20 
4.2 Fobia específica ...................................................................................................................... 23 
4.3 Fobia social .............................................................................................................................. 26 
4.4 Transtorno obsessivo-compulsivo ........................................................................................ 30 
4.5 Transtorno do estresse pós-traumático ................................................................................ 35 
4.6 Transtorno de ansiedade generalizada ................................................................................. 40 
5 TESTE DE ANSIEDADE EM ANIMAIS DE LABORATÓRIO ................................................... 43 
5.1 Teste do sobressalto potencializado pelo medo .................................................................. 45 
5.2 Teste de pressão à barra ........................................................................................................ 48 
5.3 Teste do beber punido ............................................................................................................ 51 
5.4 Teste da hipertermia induzida por estresse .......................................................................... 53 
5.5 Teste do labirinto em cruz elevado ........................................................................................ 55 
5.6 Teste do labirinto em T elevado ............................................................................................. 58 
5.7 Teste da transição claro-escuro ............................................................................................. 60 
6 AS BASES NEUROBIOLÓGICAS DA ANSIEDADE ................................................................ 63 
6.1 O Sistema de Inibição Comportamental ................................................................................ 68 
6.2 O Sistema Cerebral de Defesa ................................................................................................ 71 
 
 
3 
 
6.3 Substâncias endógenas e ansiedade .................................................................................... 75 
6.4 O sistema GABA-benzodiazepínico ....................................................................................... 75 
6.5 A serotonina ............................................................................................................................. 77 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 80 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
1 O QUE É ANSIEDADE: DEFINIÇÕES 
 
 
“A ansiedade é um desejo daquilo que tememos, um temor 
daquilo que desejamos, uma antipatia-simpática. É um 
poder estranho que agarra o indivíduo sem que ele possa 
desvencilhar-se dele, nem queira desvencilhar-se, pois tem 
medo disso. Mas esse medo é também um desejo”. 
Sören Kierkegaard 
 
“Mas, em verdade, o que chora 
Na minha amarga ansiedade 
Mais alto que a nuvem mora, 
Está para além da saudade 
Não sei o que é nem consinto 
À alma que o saiba bem. 
Visto da dor com que minto 
Dor que a minha alma tem.” 
Fernando Pessoa 
 
“Se marco uma entrevista às 2 
1:15 já fumei 10 cigarros 
Se vou gravar uma faixa 
A mesa do estúdio está quebrada 
Não sei esperar, não sei esperar (...) 
Se tenho uma festa às 10 
8:30 já estou pronto 
Fico balançando os pés 
Sentado na beira da cama 
O tempo não passa pra mim (...)” 
Cazuza 
 
 
 
5 
 
Embora seja considerada um mal atual, relacionada ao ritmo acelerado da vida nos dias 
atuais, a ansiedade e as sensações desagradáveis que a acompanham têm sido alvo da 
preocupação, curiosidade e do interesse humano, desde tempos muito remotos, e têm ocupado 
o imaginário e a literatura nas mais diferentes culturas e nas mais variadas épocas históricas. 
Os três trechos transcritos acima ilustram o fato. O primeiro encontra-se na obra “O 
Conceito de Ansiedade”, de 1884, de autoria de Sören Kierkegaard, filósofo e teólogo 
dinamarquês. 
O segundo, retirado de um poema do poeta português Fernando Pessoa, foi escrito em 
meados de 1930. O terceiro trecho refere-se à letra da música “Alta Ansiedade”, de autoria do 
cantor e compositor carioca Cazuza, falecido em 7 de julho de 1990. Escritos em lugares 
diferentes do mundo e em épocas históricas também diferentes, os três trechos têm algo em 
comum: representam de forma clara a angústia experimentada por aqueles que acreditam sofrer 
de ansiedade. 
Embora esses relatos sejam de 1884, 1930 e da década de 80, respectivamente, 
portanto relativamente atuais, a ansiedade humana tem despertado o interesse e a curiosidade 
humana muito antes disso, há milênios. 
Inscrições descobertas remetendo à era antes de Cristo, bem como relatos na literatura 
leiga dos séculos subseqüentes, demonstram o antigo interesse das pessoas pelo tema. As 
primeiras reflexões sobre a ansiedade, registradas na Grécia clássica, já sugerem a possível 
existência de uma relação entre experiências subjetivas (aquilo que se sente) e sintomas 
corporais (aquilo que o corpo mostra). 
Embora o próprio Hipócrates, filósofo grego que viveu por volta de 370 a.C. e que é 
considerado o pai da medicina, já tivesse descrito casos óbvios de fobias e de outros tipos de 
ansiedade, a ansiedade raramente era tida como doença, até relativamente pouco tempo. 
A relação entre experiências subjetivas e sintomas corporais, característica da 
ansiedade, apresenta-se claramente na etimologia da palavra, bem como na de outras emoções 
correlacionadas. Do ponto de vista etimológico, a palavra “ansiedade” deriva do termo grego 
ansheim, que significa “estrangular, sufocar, oprimir”, remetendo à experiência subjetiva 
característica da ansiedade. Já a palavra “pânico”, também considerado um dos tipos de 
ansiedade, relaciona-se ao deus grego Pan, o qual, segundo a crença helênica, aterrorizava os 
incautos por sua fealdade e grande estatura. 
Outro deus grego que inspirava terror nos inimigos era Phobos,de onde deriva o termo 
“fobia”, utilizado para designar outras categorias de ansiedade. 
 
 
6 
 
Embora muito anteriormente registrada, foi somente a partir do final do século XIX que a 
ansiedade passou a ser encarada de forma diferente: as fobias adquiriram status de “problemas 
médicos” e a ansiedade passou a ter maior importância na cultura ocidental. 
Na Psiquiatria, a ansiedade adquiriu grande proeminência a partir da última classificação 
feita por Sigmund Freud, quando separou a neurose de ansiedade da neurastenia, e distinguiu a 
ansiedade crônica (a qual se relaciona à ansiedade generalizada do Manual de Estatística e 
Diagnóstico, em sua quarta edição) dos ataques de ansiedade (os quais, atualmente, 
denominam-se ataques de pânico). 
Nas últimas décadas, o tema tem sido alvo de inúmeros estudos. As palavras dos 
autores Dractu e Lader (1993) representam de forma clara o crescente aumento do interesse 
sobre o tema: 
 
“se a ansiedade não dá sossego aos homens, os homens, em resposta, resolveram não dar 
sossego à ansiedade” 
 
Os estudos científicos mais recentes sobre a ansiedade têm se dirigido às bases 
genéticas, ao conhecimento da neuroquímica, às interpretações de resultados farmacoterápicos 
e aprimoramentos de técnicas psicoterapêuticas, mas, via de regra, apresentam-se atrelados 
aos estados patológicos, particularmente àqueles descritos nos atuais sistemas classificatórios 
psiquiátricos, os quais serão mencionados de forma mais clara posteriormente: o Manual de 
Diagnóstico e Estatística, em sua quarta edição (DSM-IV), publicado pela Associação 
Psiquiátrica Americana, e a Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento do 
Código Internacional das Doenças, em sua décima edição (CID-10), publicado pela Organização 
Mundial de Saúde. 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 1 2 
 
 
 
 
 
 
As definições de ansiedade são inúmeras, bem como as causas de sua manifestação, e 
variam de acordo com diferentes autores. 
O professor Marcus Lira Brandão, um dos mais respeitados pesquisadores brasileiros 
sobre as bases neurobiológicas da ansiedade, define a ansiedade, de modo geral, como sendo 
um estado subjetivo de apreensão ou tensão, difuso ou vago, freqüentemente acompanhado por 
uma ou mais sensações físicas – como aumento da pressão arterial, da freqüência cardíaca, da 
respiração, urgência de micção ou defecação – induzidas pela expectativa de perigo, dor ou 
necessidade de um esforço especial. 
Na tentativa de se compreender as diferentes nuances da ansiedade, muitas outras 
definições foram sendo criadas. De maneira geral, portanto, a ansiedade pode ser considerada 
como sendo: 
 
a) um estado emocional com a qualidade subjetiva do medo ou emoção correlacionada (terror, 
horror, alarme, pânico, etc.); 
b) uma emoção desagradável, podendo manifestar-se através de um sentimento de morte 
iminente; 
1) Manual de Diagnóstico e Estatística, quarta edição, publicado pela Associação Psiquiátrica Norte Americana 
e 2) Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento do Código Internacional das Doenças, décima 
edição, publicado pela Organização Mundial de Saúde. 
 
 
 
8 
 
c) direcionada para o futuro; 
d) relacionada tanto a um perigo reconhecível e real quanto a um perigo aquém da emoção 
evocada, muitas vezes apenas potencial; 
e) freqüentemente, a sensação subjetiva de apreensão ou medo é acompanhada por alterações 
somáticas também de caráter subjetivo, como sensação de constrição torácica (aperto no peito), 
de dificuldade de respiração (falta de ar, sufocamento), de fraqueza, etc. 
f) com freqüência também acompanhada por alterações somáticas perceptíveis, como sudorese, 
tremores, palpitação e outras funções relacionadas à atividade autonômica. 
 
Qualquer que seja a definição empregada, a ansiedade parece ser composta, de 
maneira geral, por duas categorias distintas de características: características mentais e 
características físicas. Esse fato é especialmente importante quando se leva em consideração 
que as características mais facilmente diagnosticáveis são as físicas: a taquicardia, os tremores, 
a falta de sono, as palpitações, os emagrecimentos súbitos (ou aumentos de peso súbitos), entre 
outros. 
Por serem mais facilmente percebidas, e causarem grande desconforto, as pessoas 
tendem a buscar ajuda médica para controlar especificamente esses quadros. Tem-se tornado 
muito comum, portanto, um paciente dar entrada ao hospital relatando estar sofrendo de um 
ataque cardíaco quando, na verdade, está sofrendo de uma crise de ansiedade. 
Muitos médicos cardiologistas, inclusive, têm incluído em suas prescrições 
medicamentos ansiolíticos, no lugar de medicamentos que atuariam especificamente sobre a 
função cardiovascular, ao perceberem que os sintomas relatados dizem mais respeito à 
condição ansiosa do paciente do que propriamente a um problema cardíaco. 
Esse pequeno exemplo ilustra a complexidade do quadro ansioso e a importância da 
multidimensionalidade da abordagem no tratamento de condições de ansiedade. 
Além de definições a respeito do que representa a ansiedade, ainda pode ser 
compreendida em termos de características individuais de personalidade. Assim, uma pessoa 
pode ter uma personalidade mais ansiosa ou menos ansiosa, de forma inata, ou ainda 
desenvolver um quadro de ansiedade que não faça parte de sua personalidade. 
Desta maneira, a ansiedade poderia ser distinguida como um estado ou como um traço: 
a ansiedade como um estado seria aquela transitória, passageira, geralmente voltada para um 
fato ou situação específica (exemplificado de maneira ilustrativa pela expressão “estou ansioso”). 
 
 
 
9 
 
Nessa situação, os sentimentos de tensão e apreensão acima mencionados estariam 
presentes, acompanhados pela hiper-reatividade autonômica, caracterizada pelos sintomas 
físicos perceptíveis: taquicardia, sudorese, respiração rápida, tremores musculares, entre outros. 
Já a ansiedade como um traço seria uma característica individual de personalidade 
(exemplificado ilustrativamente pela expressão “sou mais ansioso”): as pessoas reagem 
naturalmente com uma ansiedade maior ou menor a situações percebidas como estressantes. 
Por exemplo: a forma como Maria reage a um problema pode ser muito diferente da 
forma como Ana reage; se frente a um problema, de qualquer natureza, Maria se mostrar mais 
ansiosa que Ana, pode-se dizer que Maria apresenta uma ansiedade-traço, característica de seu 
modo de agir, de sua personalidade. 
Assim, torna-se compreensível que um indivíduo com maior grau de ansiedade-traço 
também apresente maior grau de ansiedade-estado, frente a situações que possam representar 
algum tipo de ameaça à sua integridade física ou sobrevivência. 
A ansiedade não se apresenta como um quadro constante: pode ser normal ou 
desproporcional às possíveis causas; ser branda ou ter alguma gravidade; ser benéfica ao 
indivíduo ou prejudicial; ocorrer esporadicamente ou de maneira persistente; ser causada por 
condições físicas ou condições psicológicas; ocorrer de maneira isolada ou juntamente com 
algum outro transtorno, como a depressão, por exemplo; pode afetar outras potencialidades 
humanas, como a memória, ou não afetar o funcionamento normal do organismo, entre outras 
condições. 
Em linhas gerais, a ansiedade não representa um quadro único e homogêneo, pelo 
contrário. Na dependência das características particulares, pode estar focada ou ser 
desencadeada por situações específicas (como no caso das fobias), aparecer subitamente e 
sem causa facilmente identificável (como no pânico), ser desencadeada por traumas anteriores 
(como no transtorno de estresse pós-traumático), entre outras condições associadas a diferentes 
tipos de ansiedade. 
De qualquer forma, qualquerque seja o fator desencadeante ou a caracterização do 
transtorno, uma coisa é fato: traz grande sofrimento para o indivíduo, muitas vezes atrapalhando 
a realização de suas atividades habituais e prejudicando o curso normal da vida. 
É importante mencionar, ainda, que os transtornos de ansiedade são muitas vezes 
encarados de maneira bastante preconceituosa por um número relativamente grande de 
 
 
10 
 
pessoas. Muitas vezes, o diagnóstico de transtornos de ansiedade é interpretado, por aqueles 
que não conhecem muito bem suas características, como falhas de caráter, fraqueza de 
personalidade ou outras condições de pouco valor. 
Essas interpretações equivocadas agravam ainda mais o sofrimento pessoal 
experimentado por aqueles que vivenciam transtornos de ansiedade e o apoio familiar constitui-
se um fator de grande importância no tratamento de tais condições. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
2 MEDO OU ANSIEDADE? 
 
 
Os progressos recentes das neurociências, o advento da Etologia (ciência que estuda o 
comportamento animal), a evolução da teoria da aprendizagem e o sucesso relativo da 
psicofarmacoterapia vêm orientando a Psiquiatria em direção à Biologia. 
Isso quer dizer que a Psiquiatria também vem interpretando a ansiedade de um ponto de 
vista biológico. 
Em outras palavras, a ansiedade também pode ser compreendida dentro do paradigma 
evolucionário e, nesse contexto, algumas perguntas parecem ser relevantes: Por que sentimos 
ansiedade? Como surge? Em que momento da história evolutiva dos seres humanos ela surgiu? 
Se ela persistiu como um padrão de comportamento até o estágio atual do ser humano, que 
vantagens biológicas pode ter proporcionado à espécie humana? 
Ao se tentar compreender a importância evolutiva da ansiedade para a espécie humana 
é imprescindível ter em mente a perspectiva instituída por Charles Darwin. Como se sabe, 
Charles Darwin foi o naturalista inglês que propôs que todas as espécies biológicas existentes 
fossem provenientes de um ancestral comum e que suas características, assim como as próprias 
espécies, seriam decorrentes de uma seleção natural e sexual. 
Essa é a teoria que representa o cerne dos fenômenos biológicos. 
Dessa forma, Darwin apresenta fatos que indicam que os diferentes comportamentos e 
emoções, tanto em animais quanto em humanos, tenham sido (e sejam até hoje) fundamentais 
para a sobrevivência e seriam, portanto, biologicamente baseados nos princípios evolutivos. 
Ou seja, os diferentes comportamentos e as diferentes emoções são características tão 
confiáveis e conservadas nas espécies quanto às características corporais, tais como as formas 
dos ossos, dos dentes ou qualquer outra estrutura corporal. Desta forma, Charles Darwin 
analisou e explicou todas as emoções existentes do seguinte ponto de vista: Qual a função 
dessas emoções? Como elas contribuíram para o processo de adaptação do indivíduo ao meio-
ambiente? Os princípios dessa análise feita por Darwin, sobre as emoções, encontram-se no 
livro escrito por ele e intitulado The Expression of the Emotions in Man and Animals (A 
Expressão das Emoções no Homem e nos Animais), publicada em 1872 e reeditada em1965. 
 
 
 
12 
 
De forma resumida, nesta obra, Darwin aponta o caminho de buscar o valor adaptativo 
dos processos comportamentais e psicológicos, caminho esse que hoje é percorrido pela 
Etologia. 
Tendo em vista esta perspectiva, pergunta-se: O que a ansiedade representou – e ainda 
representa – para espécie humana em termos de sobrevivência? Em que ponto ela pode ter 
representado um benefício à espécie, a ponto de permanecer até os dias de hoje? Que 
vantagens ela pode trazer? Uma segunda dúvida, muito freqüente no senso comum, é com 
relação às semelhanças e diferenças entre ansiedade e medo. Qual a diferença entre os dois? O 
que estou sentindo é ansiedade ou é medo? São padrões de emoção diferentes ou são iguais? 
Essas dúvidas são realmente pertinentes, principalmente quando se considera a história 
evolutiva desses dois padrões de emoção. 
Se considerarmos o medo e a ansiedade a partir da perspectiva evolutiva instituída por 
Charles Darwin, pode-se afirmar que ambos têm suas raízes nas reações de defesa dos 
animais. 
Ou seja, estariam baseadas no instinto de sobrevivência que determina estratégias de 
defesa contra perigos comumente encontrados no meio ambiente. 
Desta forma, quando um animal é confrontado com uma ameaça ao seu bem-estar, à 
sua integridade física ou à sua própria sobrevivência, ele apresenta um conjunto de respostas 
comportamentais e neurovegetativas, que caracterizam a reação de medo. Alguns exemplos das 
respostas comportamentais da reação de medo são: tremores, taquicardia, sudorese, posturas 
corporais de defesa, dilatação das pupilas, etc. 
Quais seriam os estímulos considerados perigosos e, portanto, que estariam aptos a 
desencadear tais comportamentos e reações? Isso varia de acordo com a biologia da espécie e 
envolve conhecer diversos aspectos de sua história biológica, tais como: quais são seus 
predadores naturais, quais situações representam perigo para aquela espécie, quais condições 
podem colocar sua sobrevivência ou integridade física em risco. 
Assim, por exemplo, as reações de medo de um gato podem ser provocadas pela 
presença de um cachorro, mas não pela presença de um rato, já que a última alternativa não 
representa para o gato um perigo biológico. Se transportarmos essa analogia para a espécie 
humana, podemos listar uma série de situações em que as reações de medo poderiam ser 
evocadas. 
No entanto, diferentemente dos outros animais, não é somente a constituição biológica 
que determina quais estímulos são considerados ameaçadores para os seres humanos; tão ou 
 
 
13 
 
mais importantes são as características sociais e ambientais em que os indivíduos vivem, bem 
como as condições psicológicas de cada um e sua história de vida. 
Assim, embora um estímulo possa, de maneira geral, eliciar uma reação de medo na 
maioria das pessoas, muitas delas não irão considerá-lo como realmente associado a um perigo. 
Vejamos um exemplo: uma pessoa está andando por uma rua quando se depara com 
um grande cachorro. O fato da presença do cachorro eliciar ou não uma reação de medo vai 
depender da história de vida dessa pessoa e de sua constituição psicológica, embora o cachorro 
realmente pudesse representar um perigo à sobrevivência, se considerássemos apenas a 
história biológica humana. 
E muitos são os padrões de resposta possíveis, que variam de indivíduo para indivíduo: 
a pessoa pode paralisar de medo, sem nunca ter tido uma experiência negativa com cachorros; 
a pessoa pode sentir muito medo, por já ter tido experiências negativas com cachorros ou por ter 
se lembrado de outras pessoas que vivenciaram experiências negativas; ou ainda, a pessoa 
pode não se importar e não sentir medo, por ter contato freqüente com outros cachorros. 
A diferença de comportamento vai depender - como já mencionado - da história de vida 
e de características psicológicas individuais. 
Mas qual é a relação entre o medo e a ansiedade? No que se assemelham e no que 
diferem? 
Embora exista ainda alguma discussão a respeito, e novas possíveis teorias estejam sendo 
ainda desenvolvidas, de maneira geral, considera-se que as reações de MEDO seriam evocadas 
em situações onde o perigo é considerado REAL. 
Ou seja, é uma resposta a uma ameaça realmente existente, presente, definida. 
A ANSIEDADE, por sua vez, embora apresente respostas comportamentais e 
neurofisiológicas muito semelhantes às observadas nas reações de medo, seria evocada onde a 
ameaça ou o perigo é apenas POTENCIAL. 
Ou seja, embora a ansiedade possua a qualidade subjetiva do medo (sensação 
desconfortável, freqüentemente voltada para a dúvida de que algo poderá ou não acontecer), o 
perigo ou a ameaça podem não ser reais,concretos, iminentes. 
De forma geral, pode-se dizer que as reações de medo envolvem uma certeza de perigo; 
o perigo está presente; não há dúvidas sobre sua existência; é reconhecível. Já a ansiedade 
envolve uma possibilidade de perigo ou ameaça; o perigo pode ou não estar presente, ou às 
vezes nem existir; é um perigo potencial; não necessariamente é reconhecível. 
 
 
 
14 
 
Para exemplificar em termos práticos, pense na seguinte situação hipotética: Você está 
andando por uma rua quando uma pessoa encapuzada e segurando uma arma caminha em sua 
direção. Nessa situação, o que você sente: medo ou ansiedade? Muito provavelmente, sua 
resposta seja MEDO. A ameaça está ali, ela é real, reconhecível, não há dúvidas sobre sua 
existência. 
Agora pense na seguinte situação hipotética: Você está no trabalho quando é abordado 
por seu chefe, que diz que quer que você se dirija à sala dele em 1 hora. O que você sente 
nessa situação: medo ou ansiedade? Você pode acreditar que sente os dois, uma vez que a 
ansiedade possui a qualidade subjetiva do medo, mas é muito provável que, durante essa 1 
hora, você fique extremamente ansioso. Pode ser que exista uma ameaça, ou seja, ela é 
potencial, não é certa, é direcionada para o futuro, existem dúvidas. 
Se, apesar dessas diferenças, a ansiedade se assemelha tanto ao medo em termos de 
reações, isso significa que possui uma base neurofisiológica semelhante e que, portanto, 
também foi semelhantemente selecionada ao longo da história biológica humana. 
Ou seja, embora seja freqüentemente – e na maioria das vezes – interpretada como 
sendo uma emoção negativa, se a ansiedade se manteve presente na psicobiologia humana até 
hoje é porque algum tipo de benefício à sobrevivência da espécie ela representa. Portanto, 
pergunta-se: Que tipo de benefício a ansiedade pode acarretar? Ao contrário do que se pode 
pensar, a ansiedade não é um padrão patológico, doentio. 
A ansiedade tem sido reconhecida como uma resposta habitual e freqüente do ser 
humano ao seu meio. Mas pode, realmente, se tornar patológica. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
15 
 
3 ANSIEDADE NORMAL E ANSIEDADE PATOLÓGICA 
 
 
Como dito acima, a ansiedade é considerada uma resposta habitual do ser humano ao 
meio em que vive e às situações que vivencia. Do ponto de vista biológico, se ela está presente 
até os dias atuais como um padrão de comportamento humano significa que possui alguma 
função adaptativa. E realmente possui. 
A sensação de ansiedade prepara o indivíduo para situações que podem ser difíceis, 
sejam quais forem essas dificuldades. Ao se preparar para tais situações, a chance de sucesso 
pode, conseqüentemente, aumentar. Além disso, a ansiedade adverte o organismo a respeito de 
possíveis perigos, sejam eles físicos (dor, cansaço, esforço, ferimentos) ou psicológicos 
(impotência, punição, frustração, separação). 
Ou seja, a ansiedade motiva o indivíduo a providenciar o que é necessário para evitar o 
perigo ou a ameaça, ou pelo menos reduzir suas conseqüências. 
Um exemplo pode ser dado ao analisar a situação vivida por adolescentes que prestam 
vestibulares concorridos. Muito provavelmente, eles irão se preparar durante um ano inteiro, 
ansiosos por chegar o dia da prova. Mas essa ansiedade faz com que eles se preparem e se 
dediquem, com o objetivo de evitar o dano – nesse caso, representado pela não-aprovação. 
Essas medidas tomadas em função da ansiedade não irão garantir que esses 
adolescentes sejam, com certeza, aprovados, mas minimizarão a chance de não o serem. 
Portanto, como pode ser observado nessa e em outras inúmeras situações, a ansiedade não é, 
por si só, uma condição negativa. Ela se torna negativa quando passa a ser patológica. 
A própria Psiquiatria aceita que em todo ser humano existe um “grau” de ansiedade 
considerado normal e que tem função adaptativa, o que remete, novamente, à perspectiva 
biológica. No entanto, é difícil estabelecer o limite entre a ansiedade normal e a patológica, 
precisar o momento em que ela passa de vantajosa para prejudicial. 
Esse é, inclusive, um conceito que varia de acordo com diferentes autores, os quais 
estudam os distúrbios de ansiedade. 
Como mencionado, sabe-se que certo grau de ansiedade é necessário para um bom 
desempenho em tarefas cognitivas. 
 
 
 
16 
 
Contudo, uma ansiedade exagerada pode ser inadequada, perturbando acentuadamente 
o desempenho. Ou seja, conforme vai aumentando o grau de ansiedade de um indivíduo, o seu 
desempenho também vai aumentando, melhorando as chances de sucesso em determinada 
atividade; até que atinge um ponto a partir do qual o aumento da ansiedade passa a não ser 
mais associado a vantagens e, sim, a prejuízos, passando a alterar o comportamento normal do 
indivíduo e a afetar negativamente sua vida. 
Esse conceito pode ser representado esquematicamente pelo gráfico abaixo. 
 
 
 
 
 
É importante mencionar, no entanto, que delimitar qual é o ápice de ansiedade a partir 
do qual se torna prejudicial, ou patológica, é uma tarefa quase impossível, considerando ser a 
ansiedade uma experiência subjetiva e, portanto, altamente variável entre os indivíduos. 
Pode-se mesmo dizer que a linha divisória entre a ansiedade normal e a patológica é 
extremamente tênue, e sujeita a inúmeras variáveis, sendo praticamente impossível precisá-la. 
Mas o que é e o que caracteriza a ansiedade patológica? 
Segundo alguns autores, a ansiedade patológica pode ser considerada como uma 
resposta inadequada a um determinado estímulo (ou a vários estímulos, simultaneamente). 
Relação entre a ansiedade normal e a ansiedade patológica 
 
 
17 
 
Inadequada em função de sua intensidade e de sua duração (ser muito intensa e durar por muito 
tempo). 
Pode provocar, naqueles que a sofrem, confusão e distorções da percepção temporal, 
espacial - em relação a pessoas e ao significado dos acontecimentos. 
Diferentes pesquisadores afirmam que a ansiedade somente deverá ser considerada 
patológica e, portanto, alvo de intervenção médica, quando for desproporcional às possíveis 
causas aparentes, muito persistente e interferir no funcionamento global do indivíduo de maneira 
significativa. A ansiedade patológica pode ser de natureza primária ou secundária. É primária 
quando representa a manifestação principal ou única do quadro clínico e secundária quando é 
resultado de outras doenças, de natureza psiquiátrica ou não. 
De forma resumida, portanto, pode-se afirmar que a ansiedade é um estado emocional 
que possui tanto componentes psicológicos (como medo persistente, preocupação, entre outros) 
como componentes fisiológicos (como taquicardia, tremores, palpitações, sudorese, entre outros) 
e que faz parte do repertório normal de experiências humanas. 
Na grande maioria das vezes, inclusive quando a ansiedade é manifestada em 
intensidade normal, chega mesmo a ser propulsora do desempenho. 
Passa a ser patológica, portanto, quando é desproporcional à possível causa, persiste 
por tempo muito maior do que o necessário, quando se repete em pequenos intervalos de tempo 
ou quando não existe um fato ou situação específica, para os quais seja direcionada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 
 
4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE ANSIEDADE 
 
 
A classificação dos transtornos de ansiedade surgiu tardiamente, dentro da história das 
classificações de transtornos mentais, por dois motivos principais. 
Primeiro, pelo fato de que não eram reconhecidos como entidades clínicas distintas e, 
segundo, porque as primeiras classificações oficiais de que se têm notícia se destinavam 
basicamente a documentar pacientes internados em instituições psiquiátricas, sem a 
preocupação de diferenciar uma condição de outra. 
Nessas classificações iniciais, os sintomas mais representativos de ansiedade, quando 
descritos, relacionavam-se à depressão grave e não à ansiedade propriamente dita. 
Além do surgimentotardio, as classificações dos transtornos de ansiedade vêm 
sofrendo inúmeras modificações ao longo das últimas décadas, em função do maior 
conhecimento que vem sendo acumulado sobre as diferentes condições. 
Atualmente, em detrimento dos critérios de classificação inicialmente empregados pela 
Psiquiatria, os quais se mostravam muito subjetivos, foram adotados critérios mais operacionais, 
tanto pelo Código Internacional das Doenças como, principalmente, pelas últimas classificações 
elaboradas pela Associação Psiquiátrica Americana, designadas pela sigla DSM, do título em 
inglês Diagnostic Statistical Manual ou Manual de Estatística e Diagnóstico. 
Em 1994, a Associação Psiquiátrica Americana publicou a quarta edição do Manual de 
Estatística e Diagnóstico das doenças mentais. Nesta edição, cada categoria diagnóstica contém 
informações sobre aspectos diagnósticos, transtornos e aspectos associados, aspectos 
específicos de idade/cultura/sexo, prevalência/incidência/risco, curso, complicações, fatores 
predisponentes, padrão familiar e diagnóstico diferencial. A tabela abaixo apresenta os diferentes 
tipos de ansiedade, segundo o Manual de Estatística e Diagnóstico das doenças mentais, em 
sua quarta edição (DSM-IV). 
 
Classificação dos transtornos de ansiedade segundo o Manual de 
Estatística e Diagnóstico em sua quarta edição (DSM-IV) 
 Transtorno do pânico sem agorafobia 
 Transtorno do pânico com agorafobia 
 Agorafobia sem história de transtorno do pânico 
 
 
19 
 Fobia específica 
 Fobia social 
 Transtorno obsessivo-compulsivo 
 Transtorno de estresse pós-traumático 
 Transtorno de estresse agudo 
 Transtorno de ansiedade generalizada 
 Transtorno de ansiedade devido a uma condição médica geral 
 Transtorno de ansiedade induzido por substância 
 Transtorno de ansiedade não-especificado 
 
 
Embora, para fins práticos, a Associação Psiquiátrica Americana tenha organizado os 
diferentes tipos de ansiedade em 12 transtornos, com características sintomáticas e diagnósticas 
distintas, o diagnóstico preciso de um quadro de ansiedade é difícil de ser realizado e exige do 
psiquiatra um grande preparo e envolvimento com o quadro do paciente. 
Uma das dificuldades relatadas por esses profissionais como sendo a mais comumente 
encontrada é a superposição que existe entre os sintomas da ansiedade e os sintomas 
depressivos. Essa dificuldade, inclusive, não é relatada apenas pelos clínicos da área da 
Psiquiatria; muitos pesquisadores relatam grande dificuldade em separar a ansiedade da 
depressão, e vice-versa. Embora muitos pesquisadores tenham sugerido que ambos os quadros 
– ansiedade e depressão – sejam componentes de um processo único, os quais denominam de 
“estresse psicológico geral”, é importante salientar que possuem bases neurobiológicas distintas 
e, portanto, constituem realmente duas entidades separadas. 
Inclusive, alguns autores sugerem que essa aparente superposição entre os sintomas 
da ansiedade e da depressão seja devido ao fato de existirem limitações psicométricas nas 
escalas de avaliação de ansiedade utilizadas atualmente. Portanto, fica evidente a grande 
importância de um diagnóstico preciso realizado pelo psiquiatra, de forma a evitar, inclusive, 
tratamentos psicoterápicos e farmacológicos equivocados. 
Embora do ponto de vista neurobiológico exista uma evidente distinção entre as vias 
neurofisiológicas implicadas em cada uma dessas condições, muitas pessoas, no senso comum, 
não sabem diferenciar precisamente a ansiedade da depressão. 
De maneira geral, podem-se dizer esses dois quadros são diferentes basicamente em 
dois aspectos: no nível de estimulação autonômica e na qualidade do afeto apresentado. Em 
transtornos de ansiedade, há a presença de sintomas de hiperestimulação autonômica, tais 
como palpitação, tremores, aumento da freqüência cardíaca e respiratória, sudorese, 
 
 
20 
 
hiperatividade constante, entre outros, enquanto que a depressão apresenta o quadro inverso, 
uma hipoestimulação autonômica. 
Com relação à qualidade do afeto presente, a depressão pode ser distinguida da 
ansiedade pela presença do que se chama de anedonia (que é a perda da capacidade de sentir 
prazer). No entanto, em função da semelhança na questão da ausência do afeto positivo, que é 
observada tanto na depressão quanto na ansiedade, muitas vezes os quadros podem ser 
confundidos entre si, o que justifica o fato de que a depressão seja o principal fator de 
comorbidade em transtornos de ansiedade. 
Para fins de melhor compreensão, o presente Módulo apresentará os aspectos 
característicos dos principais transtornos de ansiedade observados atualmente na clínica. 
Portanto, serão detalhadas as principais características dos seguintes transtornos: a) 
transtorno do pânico (de maneira geral, e não subdividido em termos de presença ou ausência 
de agorafobia, que é o medo de estar em locais públicos, abertos ou no meio de multidões); b) 
fobia específica; c) fobia social; d) transtorno obsessivo-compulsivo; e) transtorno de estresse 
pós-traumático; e f) transtorno de ansiedade generalizada. Esses transtornos foram escolhidos 
para maior detalhamento em função de ocorrerem de forma mais freqüente na população em 
geral, quando comparados aos demais transtornos de ansiedade. 
 
 
4.1 Transtorno do pânico 
 
 
Segundo o DSM-IV, um ataque de pânico pode ser caracterizado por um período de 
medo ou desconforto intenso, o qual surge subitamente e aumenta progressivamente. Esse 
pavor súbito e crescente atinge um pico rapidamente (10 minutos ou menos, em geral) e é 
freqüentemente acompanhado por uma sensação de perigo e morte iminentes, e de urgência de 
fuga. 
A sensação de pavor é acompanhada por, no mínimo, 4 a 13 sintomas somáticos ou 
cognitivos, geralmente associados a uma hiperativação autonômica, incluindo: palpitações; 
sudorese; tremores; sensação de falta de ar ou sufocamento; sensação de abafamento; dor ou 
desconforto torácico; vertigens; despersonalização; medo de perder o controle ou de “estar 
 
 
21 
 
ficando louco”; medo de morrer; parestesias; arrepios ou ondas de calor. 
Em um ataque de pânico, podem não ocorrer todos esses sintomas, mas sempre um 
mínimo de 4 deles estará presente. 
Esses ataques ocorrem de maneira inesperada, recorrente, sendo freqüentemente 
seguido por pelo menos um mês de preocupação e medo persistentes a respeito da 
possibilidade de se ter um novo ataque e de não ser capaz de controlá-lo, caso venha a ocorrer. 
O transtorno do pânico, com ou sem agorafobia (medo de lugares abertos, públicos e 
de multidões), tem sido considerado como um dos transtornos de ansiedade mais 
incapacitantes, tanto em função da sensação experimentada por quem o apresenta como pelas 
constantes buscas por tratamento e hospitais. Na tentativa de controlar o transtorno ou 
simplesmente de evitar que novos ataques aconteçam. 
Os relatos mais freqüentes de pacientes, com relação à sensação experimentada em 
um ataque de pânico, dizem respeito ao medo intenso de morrer, e à sensação de que 
realmente irão morrer naquele instante. Isso faz com que essas pessoas criem uma expectativa 
de que isso pode ocorrer a qualquer momento, e que da próxima vez não haverá escapatória. 
Portanto, é fácil perceber a intensa angústia e sofrimento causados por esse transtorno. 
Outra característica relevante desse transtorno relaciona-se ao comportamento de 
evitação que a pessoa passa a desenvolver. Isso significa que, tendo ocorrido um ataque de 
pânico em um determinado local, a pessoa passa a evitar esse local ou outros que remetam 
àquele em que um ataque tenha ocorrido. Isso porque ela passa a acreditar que aquele contexto 
pode, novamente, desencadear uma nova crise. 
Esse comportamento acaba por limitar drasticamente a autonomia e a vida cotidiana 
desses pacientes, uma vez que passam a não querer mais realizar tarefas sozinhos,por medo 
de que ocorra um novo ataque e de que ninguém possa socorrê-lo. 
Em função dessa característica, a vida social e profissional de pessoas que sofrem 
com o transtorno do pânico pode se tornar muito comprometida, uma vez que eles passam a 
desenvolver uma ansiedade antecipatória a qualquer evento ou situação pelos quais precisem 
passar. 
Em alguns casos, o uso de substâncias psicoativas pode desencadear um ataque de 
pânico em pessoas que nunca o havia apresentado. 
É o caso da maconha, de alguns alucinógenos e de substâncias psicoestimulantes 
como a cocaína e algumas anfetaminas. 
No entanto, esses casos não caracterizam a existência de transtorno do pânico e, sim, 
 
 
22 
 
um ataque de pânico secundário, induzido por substância. 
Na comunidade norte-americana, parece haver uma prevalência do transtorno do 
pânico da ordem de 3,2% nas mulheres e 1,3% nos homens. 
Outros levantamentos, no entanto, sugerem que as mulheres apresentem ainda 
maiores prevalências de ocorrência do transtorno do pânico: 4 mulheres para cada homem com 
relação ao transtorno do pânico com agorafobia e 1,3 mulheres para cada homem com relação 
ao transtorno do pânico sem agorafobia. Existem dados que indicam que, ao longo da vida, 
exista uma prevalência de transtorno de pânico da ordem de 3,5%, considerada relativamente 
alta quando comparada a outras doenças incapacitantes. 
Essas proporções são similares ou maiores que as de outros distúrbios médicos 
comuns, como a hipertensão, o que sugere a relativamente alta ocorrência do distúrbio nessa 
população. Pacientes com transtorno do pânico, assim como os pacientes com ataques de 
pânico, mas que não se enquadram no critério para o transtorno do pânico, tendem a ser 
grandes usuários de serviços médicos. 
Uma explicação para o fato é que estes pacientes são predispostos a considerar sua 
saúde como estando sempre frágil e necessitando de consulta e tratamento médico. Isso 
representa enormes custos anuais aos programas de saúde. 
Com relação à idade de aparecimento dos sintomas, alguns levantamentos sugerem 
que os primeiros sintomas do transtorno do pânico surjam entre o final da adolescência (por volta 
dos 17 anos) e o início da idade adulta (em torno dos 25 anos), embora muitas variações 
individuais ocorram. Alguns estudos indicam que existe uma correlação positiva entre a 
ocorrência de transtornos de ansiedade na infância e o desenvolvimento de transtorno do pânico 
na idade adulta. 
Isso quer dizer que, em grande número de casos, pacientes adultos com ataques de 
pânico podem ter sido crianças dependentes, medrosas, com intensa ansiedade e, muitas vezes, 
que tenham apresentado dificuldades no período escolar. 
Sugere-se, inclusive, que indivíduos que tenham apresentado ansiedade de separação 
na infância (ansiedade excessiva em relação ao afastamento dos pais ou de seus substitutos. 
Não adequada ao nível de desenvolvimento da criança) tenham maior probabilidade de 
desenvolver ataques de pânico (bem como fobia social e transtorno obsessivo-compulsivo) na 
vida adulta quando confrontados com situações de perdas ou separações. 
Mas quais são as causas do transtorno do pânico? Muitos trabalhos encontram-se 
atualmente em curso, nas mais diferentes áreas do conhecimento, na tentativa de se responder 
 
 
23 
 
a esse questionamento. Acredita-se que a etiologia do transtorno, como a maior parte dos 
transtornos de ansiedade, seja de ordem multifatorial; ou seja, não pode ser explicada em 
termos de apenas uma causa e, sim, como um conjunto delas. Nesse contexto, incluem-se 
fatores biológicos, genéticos, psicológicos, sociais e cognitivo-comportamentais, os quais, em 
conjunto, contribuem para o seu aparecimento. 
O tratamento do transtorno do pânico baseia-se numa combinação do uso de 
medicamentos e técnicas psicoterapêuticas comportamentais. Considerada muito eficaz, a 
terapêutica farmacológica é baseada nos antidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos da 
recaptação de serotonina, inibidores da enzima monoaminoxidase e em alguns 
benzodiazepínicos. 
As principais drogas utilizadas no tratamento do transtorno do pânico têm sido a 
imipramina, a qual é considerada como a droga referência para comparação de outros 
medicamentos. 
A clomipramina, que parece ser tão eficiente quanto à imipramina, mas atuando em 
doses menores, benzodiazepínicos como o alprazolam e inibidores seletivos da recaptação de 
serotonina tais como a fluoxetina, a paroxetina, a fluvoxamina, a sertralina e o citalopram. Além 
desta abordagem farmacológica, as abordagens psicoterapêuticas comportamentais e cognitivas 
têm alcançado êxito no tratamento dos sintomas fóbicos e nas conseqüências psicológicas do 
pânico. 
 
 
4.2 Fobia específica 
 
 
Medo de barata, medo de voar de avião, medo do mar, medo de lagartixa, medo de 
altura. Esses são, entre tantos outros, medos muito comuns. No entanto, o medo direcionado a 
determinada situação somente passa a constituir um quadro de fobia específica quando 
influenciar decisivamente a vida e a saúde do indivíduo. 
 
 
 
24 
 
Fobias específicas são caracterizadas pelo medo intenso e pavor, muitas vezes 
paralisante, de determinadas situações, altamente específicas, ainda que a situação 
desencadeante seja inofensiva e o medo pareça irracional. 
Além do pavor à determinada situação realmente presente, a fobia específica se 
caracteriza pela antecipação da situação temida (chamada de situação fóbica); ou seja, a pessoa 
tem intenso medo de se deparar com tal situação, mesmo que ela não esteja presente. Alguns 
exemplos de estímulos fóbicos são: lugares fechados (claustrofobia), animais, altura (acrofobia), 
alimentos, trovão, ventos, escuridão, tratamento dentário, avião, ferimentos, dirigir, entre outros. 
Da mesma forma como ocorre nos demais transtornos de ansiedade, esse medo é um 
medo persistente, excessivo e, na maioria das vezes, irracional. 
A pessoa que apresenta fobia específica tem consciência da irracionalidade ou 
improcedência do medo que sente a determinadas situações, mas não consegue controlá-lo, e a 
consciência da irracionalidade do seu medo acaba por trazer um sofrimento ainda maior, pois 
sabe que existe, mas não pode controlá-lo. 
Em função disso, a pessoa passa a evitar inúmeras situações com medo de que a 
situação fóbica se apresente - o que interfere diretamente em seu fluxo de vida, ou acaba 
limitando suas ações. Tanto o medo intenso da possível ocorrência da situação fóbica quanto o 
comportamento de evitar inúmeras condições, fazem com que a rotina dessas pessoas seja 
significativamente alterada, bem como seus relacionamentos, aumentando ainda mais o quadro 
de angústia gerado por esse transtorno de ansiedade. 
Até o início da década de 90, a fobia específica era chamada de fobia simples, 
principalmente em função do DSM-IV assim classificar esta condição. Após a renomeação, em 
sua quarta edição, a fobia específica passou a ser subdividida em cinco tipos principais: 1) fobia 
específica tipo animal; 2) fobia específica tipo ambiente natural; 3) fobia específica tipo sangue-
injeção-ferimentos; 4) fobia específica tipo situacional; e 5) fobia específica de outro tipo não 
classificado. Os critérios diagnósticos do DSM-IV para fobias específicas são os seguintes: 
 
A – Temor significativo e persistente, excessivo ou irracional, desencadeado pela presença ou 
antecipação de um objeto ou situação específica; 
 
 
25 
 
B – A exposição ao estímulo fóbico quase invariavelmente provoca ansiedade, que pode tomar a 
forma de um ataque de pânico situacional; 
C – A pessoa reconhece que seu temor é excessivo e irracional (exceto em crianças); 
D – As situações temidas são evitadas ou são vividas com intensa ansiedade e desconforto; 
E – A evitação, a ansiedade antecipatória ou o desconforto na situação temida interferem 
significativamente com a rotina normal da pessoa,desempenho acadêmico ou profissional, 
atividades ou relacionamentos, ou há um desconforto significativo por ter a fobia; 
F – Em pessoas com menos de 18 anos, a duração deve ser de pelo menos seis meses; 
G – A ansiedade, ataques de pânico ou evitação fóbica associada com o objeto específico ou 
situação, não é mais bem classificada como outra doença mental, como transtorno obsessivo-
compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno de ansiedade de separação, fobia 
social, transtorno do pânico com agorafobia ou sem agorafobia, sem história de transtorno do 
pânico. 
 
Geralmente, a fobia específica se inicia na infância ou adolescência, com exceção das 
fobias de origem traumática, as quais não apresentam necessariamente uma idade característica 
para início. 
É, muitas vezes, subdiagnosticada, ou seja, os pacientes acabam por não procurar 
atendimento médico, somente quando apresentam alguma comorbidade que agravam o quadro, 
como no caso dos ataques de pânico em contexto fóbico. Há uma estimativa de que somente 12 
a 30% dos pacientes busquem ajuda profissional. 
O índice de comorbidade é relativamente alto: estima-se que entre 50 e 80% dos 
pacientes com fobia específica tenham algum outro transtorno psiquiátrico. 
É um transtorno de ansiedade com prevalência relativamente alta: alguns estudos 
indicam cerca de 10% de taxa de prevalência de fobias específicas em algumas comunidades. 
As prevalências são, em geral, maiores em mulheres, o que pode refletir diferenças genéticas ou 
ambientais nos padrões etiológicos das fobias. 
 
 
26 
 
Alguns pesquisadores discutem o fato de que a transmissão social de medos poderia 
ser mais freqüente e facilitada nas mulheres, daí a maior prevalência nesse gênero. Qualquer 
que seja a explicação constata-se que a fobia específica é o transtorno mental mais comum em 
mulheres e, nos homens, perde apenas para abuso de substâncias. 
Dados existentes sugerem que familiares de pacientes com fobia específica 
apresentam maior chance de também apresentar tal transtorno. Existe uma possível agregação 
familiar pelo tipo de fobia, embora tal conclusão necessite de estudos adicionais para sua 
confirmação. 
No Brasil, não existem muitos estudos sobre fobias específicas. Um grupo de 
pesquisadores, os quais investigaram a morbidade psiquiátrica na população da região de Porto 
Alegre, verificou uma prevalência estimada de fobia específica de 12,8%. 
Ao contrário do que ocorre com a maioria dos transtornos de ansiedade, os quais 
possuem duas vertentes de tratamento, o psicoterapêutico e o farmacológico, a fobia específica 
possui um tratamento preponderantemente psicoterapêutico, sendo a abordagem farmacológica 
empregada apenas em quadros de comorbidade. 
O tratamento mais eficaz para as fobias específicas tem sido a exposição sistemática 
ao objeto ou situação fóbica, quando o indivíduo é exposto à fonte de pavor. Geralmente, são 
realizadas sessões semanais de exposição gradual até a resolução do problema. Atualmente, 
com o desenvolvimento da tecnologia, exposições a situações fóbicas por meio de realidade 
virtual têm sido empregadas com sucesso. 
 
 
4.3 Fobia social 
 
 
Embora o termo “fobia social” tenha sido cunhado em 1903, para designar o medo que 
algumas pessoas têm de serem observadas enquanto realizam tarefas, o transtorno de fobia 
 
 
27 
 
social somente passou a ter mais importância a partir da terceira edição revisada do DSM. A 
fobia social é um transtorno de ansiedade caracterizado pelo medo de ser observado ou 
analisado pelos outros, ou ainda pelo medo do embaraço durante a interação com outras 
pessoas, ou em situações de exposição pública. 
A pessoa com transtorno fóbico social apresenta um medo intenso e persistente de 
uma ou mais situações nas quais poderá ser exposta à possível avaliação por parte de outras 
pessoas, como por exemplo: comer, beber, falar em público, ser o centro das atenções, interagir 
com o sexo oposto, entre outras situações. A pessoa tem constante pavor de fazer algo em 
público, temendo comportar-se de maneira humilhante ou embaraçosa. 
Em função desse medo, acaba evitando qualquer tipo de situação em que a 
possibilidade de interagir com outras pessoas exista, isolando-se e criando um quadro de 
angústia do qual não consegue sair. O comportamento de evitar o contato com outras pessoas, 
temendo ser analisado ou apenas observado, caracteriza o quadro chamado de esquiva fóbica. 
Em função de muitas dessas situações não poderem ser evitadas, a pessoa acometida 
pela fobia social apresenta intensas manifestações de ansiedade, o que fornece uma leve 
perspectiva do grande sofrimento individual experimentado por esses pacientes. A fobia social 
pode ser classificada em dois subtipos: generalizada e não generalizada. 
O subtipo generalizado inclui indivíduos com amplo espectro de medos sociais, ao 
passo que o subtipo não generalizado envolve a ansiedade limitada a situações específicas. 
A despeito de ser um dos transtornos de ansiedade mais freqüentes na população em 
geral, a fobia social ainda é um transtorno relativamente negligenciado. Isso porque a grande 
maioria das pessoas não a considera como um quadro patológico, portanto, consideram que não 
há necessidade de tratamento médico e acompanhamento. 
Pelo contrário, muitas vezes interpretam a grande dificuldade de interação com outras 
pessoas como falta de sociabilidade ou até mesmo como uma fraqueza ou falha de caráter. Isso 
demonstra o duplo sofrimento experimentado pelos fóbicos sociais: sofrem com o medo que 
sentem da possível interação com outros e sofrem pelo julgamento que é feito deles pela grande 
maioria das pessoas. 
 
 
 
28 
 
Os próprios clínicos de outras áreas, que não a Psiquiatria, muitas vezes subestimam 
ou sub-reconhecem um quadro de fobia social. Isso é preocupante, uma vez que o diagnóstico 
precoce pode evitar o desenvolvimento de comorbidades, favorecendo um melhor prognóstico. 
Estima-se que a prevalência de fobia social ao longo da vida fique entre 10 e 15%, 
sendo o terceiro transtorno psiquiátrico mais comum na prática clínica, ficando atrás da 
depressão e da dependência ao álcool. 
Na prática médica, costuma ser a razão primária para a busca de tratamento, embora o 
desenvolvimento de comorbidades psiquiátricas, como depressão, pânico ou abuso de 
substâncias, acabem muitas vezes por ser o principal motivo para buscar tratamento médico. 
Esse é um importante aspecto associado à ocorrência de fobia social: a relação 
estreita existente entre este transtorno e o desenvolvimento de dependência a substâncias 
psicoativas, como o álcool e outras. 
De acordo com alguns autores, os transtornos de ansiedade, e em especial a fobia 
social, quando têm um início precoce na adolescência, parecem trazer severas conseqüências 
potenciais, predispondo os indivíduos afetados a uma maior vulnerabilidade para a depressão e 
para transtornos envolvendo o abuso de substâncias. Diversos estudos, utilizando evidências 
clínicas e epidemiológicas, têm demonstrado que a fobia social tende a preceder o início dos 
problemas com o álcool. 
Os pesquisadores explicam essa relação em termos de tentativa de automedicação: ao 
experimentar bebidas alcoólicas, as pessoas com fobia social experimentam uma sensação de 
relaxamento, de maior sociabilidade, de diminuição do medo e dos sintomas ansiosos pelos 
quais eram dominadas anteriormente. Assim, a ação do álcool acaba por reforçar seu uso 
contínuo, podendo levar ao abuso comórbido, que representa uma importante complicação dos 
quadros de fobia social. 
E essa situação, infelizmente, é muito mais freqüente do que se pensa: um grande 
número de parentes de alcoolistas relata que seus familiares passaram a fazer uso de grandes 
quantidades de bebidas alcoólicas para se tornarem mais sociais e conseguirem conviver em 
sociedade, o que, para eles, era muitodifícil antes da bebida. Isso é um aspecto a ser 
considerado no tratamento do alcoolismo, uma vez que pessoas com fobia social devem ser 
 
 
29 
 
acompanhadas de maneira mais próxima, em função deste quadro contribuir para a recidiva do 
uso de álcool. 
Apenas a título de exemplo, um estudo realizado em 1998 mostrou que 70% dos 
pacientes com fobia social estudados relataram que o quadro fóbico se iniciou antes do 
alcoolismo, sendo que 60% destes bebiam deliberadamente para suportar a fobia, o qual reforça 
a hipótese da automedicação. 
A etiologia da fobia social ainda não se encontra totalmente esclarecida, embora 
existam algumas evidências sugerindo uma grande importância de fatores familiares, genéticos e 
neurobiológicos. A ocorrência de traumas e dificuldades na infância estão implicados como 
fatores de contribuição na gênese da fobia social. 
Com relação à transmissão genética, sabe-se que familiares de pacientes com fobia 
social apresentam o mesmo diagnóstico com uma freqüência maior que familiares de pacientes 
com síndrome do pânico ou que pessoas sadias. 
É necessário fazer uma diferenciação entre pessoas que sofrem com timidez excessiva 
e aquelas que possuem fobia social. 
Embora os dois quadros apresentem muitas semelhanças, tais como: ocorrer em 
situações de desempenho social, reconhecer o medo como irracional e produzir fortes sintomas 
ansiosos, se diferenciam em outros aspectos: pacientes com fobia social são acometidos por um 
medo paralisante de situações de interação com outras pessoas, enquanto que pessoas tímidas, 
embora se sintam desconfortáveis, não sentem um medo tão intenso; embora os tímidos possam 
sentir-se encabulados em determinadas situações, não desejam sair correndo por medo daquela 
situação, nem ficam com pensamentos obsessivos sobre a possibilidade de uma interação 
pública, como ocorre com fóbicos sociais; pacientes com fobia social freqüentemente 
apresentam ataques de pânico frente a situações sociais, o que não acontece com pessoas 
apenas tímidas; e, tão importante quanto os demais aspectos, embora os tímidos possam sentir-
se desconfortáveis em algumas situações, não chegam a experimentar o sofrimento intenso 
experimentado por aqueles que possuem fobia social. 
 
 
 
 
30 
 
Com relação às formas existentes de tratamento, embora a busca por tratamento 
médico para tal condição seja relativamente pequena, a fobia social responde tanto à terapia 
medicamentosa quanto ao tratamento psicoterapêutico. 
Do ponto de vista farmacológico, o tratamento da fobia social tem quatro objetivos 
principais: reduzir e controlar a ansiedade antecipatória; controlar as manifestações físicas e 
subjetivas da ansiedade quando da exposição a estímulos eliciadores de ansiedade; eliminar a 
esquiva fóbica associada; e tratar adequadamente, também, os transtornos comórbidos 
associados. 
Nesse contexto, três classes de fármacos têm se mostrado eficazes na fobia social: os 
betabloqueadores (em casos de fobia social não generalizada, ou seja, circunscrita a uma 
determinada situação) e os benzodiazepínicos e antidepressivos (em casos de fobia social 
generalizada). 
Do ponto de vista psicoterapêutico, certos tipos de psicoterapia podem auxiliar os 
pacientes e, muitas vezes, representam a principal e mais vantajosa alternativa, uma vez que 
muito do que se aprende durante a psicoterapia pode ser usado no decorrer da vida do paciente, 
funcionando como um instrumento para a prevenção de recaídas. 
A terapia do tipo cognitivo-comportamental tem sido amplamente utilizada com este 
intuito, embora muitos pacientes apresentem apenas uma diminuição parcial dos sintomas. 
 
 
4.4Transtorno obsessivo- compulsivo 
 
 
O ator norte-americano Jack Nicholson interpreta no filme “Melhor Impossível” (As 
Good As It Gets), aclamado pelo público no ano de 1997, um homem chamado Melvin Udall. 
Melvin é um escritor solitário e grosseiro, que leva uma vida no mínimo peculiar. 
 
 
 
31 
 
Quem assiste ao filme percebe claramente os principais sintomas do transtorno 
obsessivo-compulsivo, o qual será denominado a partir deste ponto apenas pela sigla TOC. 
Melvin sofre deste transtorno, o que significa dizer que sua vida é delineada em função 
das manias que desenvolveu ao longo dos anos. Apenas a título de exemplo, Melvin tem, em 
seu armário do banheiro, uma dezena de sabonetes, uma vez que utiliza cada um apenas uma 
vez, jogando-o no lixo em seguida. 
Outra mania sua diz respeito ao número de vezes que precisa verificar se a porta está 
trancada antes de ir se deitar. A posição dos chinelos à beira de sua cama também deve estar 
precisamente correta, entre outras manias apresentadas pelo personagem. 
Embora provoque risos e surpresas, é fácil perceber, ao assistir o filme, como esse 
quadro psiquiátrico acaba por afastá-lo do convívio com outras pessoas, as quais o consideram 
um excêntrico, ou apenas uma pessoa muito esquisita, e isso vai trazer problemas mais sérios à 
sua vida. É uma sugestão de filme que vale a pena assistir para se compreender um pouco mais 
das características sintomáticas do TOC, embora esteja representada anedoticamente. 
Do ponto de vista psiquiátrico, o TOC é caracterizado pela presença de obsessões, 
compulsões e/ou manias que causam profunda ansiedade e sofrimento. 
Obsessões podem ser definidas como processos mentais – pensamentos, idéias, 
impulsos e imagens – que são vivenciados como intrusivos, repetitivos e incômodos. Podem ser 
criadas a partir de qualquer evento mental, tais como palavras, medos, preocupações, 
memórias, imagens, músicas, pessoas ou cenas. Já as compulsões são definidas como 
comportamentos ou pensamentos repetitivos, intensos, que são realizados para diminuir o 
incômodo ou a ansiedade causada pelas obsessões, ou para evitar que uma situação temida 
venha a ocorrer, e estes acabam virando regras a serem cumpridas rigidamente. 
Assim, no caso do personagem Melvin Udall, mencionado anteriormente, sua 
compulsão por limpeza se dava pelo temor de contrair alguma doença, e o fator doença era, 
para ele, uma obsessão. 
É fácil perceber, portanto, como as duas situações se acompanham: desenvolve-se um 
quadro de obsessão por alguma idéia e um quadro de compulsão pode ser desenvolvido à 
medida que comportamentos para evitar a idéia obsessiva passam a ocorrer repetitivamente. 
 
 
32 
 
Existe uma imensa variedade de obsessões e compulsões possíveis. 
O diagnóstico para TOC, entretanto, é feito quando as obsessões e/ou as compulsões 
causam profunda interferência nas atividades do indivíduo, ou as limitam, quando consomem 
tempo (pelo menos uma hora por dia para realizá-las). E quando passam a causar sofrimento e 
incômodo tanto para o paciente quanto para seus familiares. 
Assim como outras condições psicopatológicas, não existe um diagnóstico laboratorial 
para identificação deste quadro psiquiátrico, estando o diagnóstico vinculado apenas à avaliação 
clínica. Entretanto, é importante ressaltar que, apesar dos casos mais típicos de TOC em geral 
não serem de difícil identificação, trata-se de um quadro que faz fronteira com vários outros 
transtornos mentais, o que pode dificultar seu diagnóstico diferencial. 
Em geral, seus sinais e sintomas parecem seguir um contínuo entre os transtornos de 
movimentos repetitivos, que variam dos tiques simples à ideação obsessiva, formando um 
espectro de quadros patológicos que incluem, entre outros: 
 
 Transtornos somatoformes: presença repetida de sintomas físicos associados à 
busca constante de assistência médica, sem que os médicos consigam encontrar algo anormal; 
 Transtornos alimentares; 
 Tricotilomania: distúrbio caracterizado por arrancar cabelos de maneira 
compulsiva e sem finalidade estética; 
 Transtornos do controle dos impulsos: comportamentos repetitivos baseados no 
fracasso em resistir a um impulso ou à tentação em executarum ato que pode ser nocivo à 
própria pessoa ou a outros; 
 -Outras condições. 
Quando alguns sintomas do quadro de TOC passam a ocorrer em conjunto, esses 
sintomas podem ser agrupados e analisados como um único quadro. 
Assim, já foi possível estabelecer algumas categorias sintomatológicas desta condição 
psiquiátrica: obsessões religiosas, sexuais e compulsões relacionadas; obsessões de agressão e 
compulsões relacionadas; obsessões de simetria e compulsões de ordenação e arranjo; 
 
 
 
33 
 
obsessões de contaminação e compulsões de limpeza ou lavagem; e obsessões e compulsões 
de colecionismo. 
É importante ressaltar, ainda, que a simples ocorrência de sintomas obsessivo-
compulsivos não determina o diagnóstico do TOC. 
Eles podem fazer parte da apresentação clínica de outro transtorno primário, como 
depressões, esquizofrenias e demências. Podem também ser manifestações normais de 
determinadas fases da vida, como os rituais na hora de dormir observados na infância e outros 
rituais presentes durante a gravidez e puerpério, tais como pensamentos intrusivos sobre a 
saúde do feto ou rituais de verificação de bem-estar do recém-nascido. 
Por isso, assim como no caso dos outros transtornos psiquiátricos mencionados nesta 
apostila, torna-se extremamente importante o treinamento médico adequado para fazer o preciso 
diagnóstico de uma real condição de TOC. 
Vários autores salientam que, no início do processo de instalação de um quadro de 
TOC, nem sempre os sintomas têm um caráter claramente classificável como obsessivo. No 
início, o TOC pode ser manifestado apenas como sintomas de ansiedade, principalmente fobias, 
ou como distúrbios do humor, com quadros depressivos ou certa disforia, acompanhada de 
tensão e irritabilidade. Acredita-se que tende a se instalar inicialmente entre a infância e o início 
da adolescência, persistindo na fase adulta. No entanto, ainda não existe um consenso sobre 
como determinar a idade de início do aparecimento dos sintomas. 
A maioria dos estudos existentes considera o surgimento dos sintomas como a idade 
de início do transtorno; outros consideram o início do incômodo causado pelos sintomas ou a 
primeira vez em que o paciente procurou ajuda profissional como a idade de início. 
Um estudo epidemiológico americano, entrevistando uma amostra populacional de 
20.862 indivíduos, constatou que 64% dos portadores de TOC apresentaram início dos sintomas 
antes dos 25 anos de idade, e 74% antes dos 30 anos. 
Esses dados confirmam observações de estudos clínicos de que o TOC instala-se 
predominantemente na infância, na adolescência e no início da idade adulta. Para alguns 
pesquisadores, quanto mais precoce for o início do transtorno, maior parece ser a gravidade dos 
sintomas obsessivos, e pior tende a ser sua evolução. 
 
 
34 
 
De uma maneira geral, parece haver uma grande demora entre o início dos sintomas 
obsessivos e a busca por tratamento. Alguns estudos indicam que esse tempo costuma ser, em 
média, de sete a dez anos. 
Essa demora talvez possa ser explicada, em parte, pelo caráter secreto e reservado 
dos sintomas, que faz com que os pacientes evitem ao máximo o contato com psiquiatras e só 
procurem auxílio quando a intensidade do quadro se acentue a tal ponto que os familiares e 
amigos precisem intervir. 
Estudos sobre a evolução dos quadros obsessivos demonstram que ela é crônica na 
maioria das vezes, sendo raros os períodos de remissão completa dos sintomas. Os sintomas 
obsessivos, ainda, apresentam flutuações, com períodos de melhora e piora, sem que ocorra 
remissão completa na maioria dos casos. 
Existem evidências de que, na fase adulta, o curso do TOC pode ser mais episódico e 
menos grave em mulheres do que em homens. Além disso, mulheres com TOC podem ter um 
início mais agudo do transtorno do que homens, o que facilitaria tanto o diagnóstico quanto o 
tratamento. No período da infância, entretanto, parece haver uma preponderância do transtorno 
em meninos. 
Alguns estudos epidemiológicos sugerem que o TOC seja menos raro do que se 
supunha anteriormente e, segundo a Organização Mundial da Saúde, é atualmente a décima 
causa de incapacitação no mundo. 
A influência de fatores genéticos na etiologia do TOC tem sido investigada por meio de 
estudos de famílias, estudos com gêmeos e, mais recentemente, estudos de genética molecular. 
Em vários estudos com gêmeos, as taxas de concordância de TOC entre gêmeos 
monozigóticos variam entre 53 e 87%. 
Enquanto para gêmeos dizigóticos elas variam entre 22 e 47%, sugerindo um 
componente genético forte para este transtorno, embora os fatores ambientais pareçam 
contribuir decisivamente para o seu aparecimento, uma vez que a concordância em gêmeos 
monozigóticos é inferior a 100%. Além disso, parece haver maior prevalência de TOC, sintomas 
obsessivo-compulsivos, Síndrome de Tourette (caracterizada pela presença intensa de tiques) e 
 
 
35 
 
transtorno de tique motor ou vocal crônico entre familiares de pacientes com TOC, o que sugere 
um forte componente familial. 
Com relação ao tratamento empregado para quadros de TOC, e seguindo a tendência 
já manifestada e mencionada nos subtipos de ansiedade mencionados anteriormente, a 
psicoterapia aliada à intervenção medicamentosa parece ser a melhor escolha. 
A introdução de terapia do tipo cognitivo-comportamental parece induzir uma melhora 
dos sintomas, além de diminuir o risco de recaída após o término do tratamento medicamentoso. 
As drogas de escolha no tratamento do TOC têm sido na última década os inibidores 
da recaptação de serotonina, principalmente a clomipramina, a fluvoxamina e a sertralina. 
No entanto, o tratamento com tais medicamentos deve ser feito apenas quando os 
sintomas apresentam-se muito graves, ou quando houver risco de suicídio ou quadro depressivo 
muito pronunciado. Além disso, é importante ressaltar que, com os tratamentos disponíveis, 
muitos pacientes podem esperar melhora significativa ao longo do tempo, mas muito raramente 
ocorre a remissão completa dos sintomas. 
 
 
4.5 Transtorno de estresse pós-traumático 
 
 
Embora os sintomas presentes no transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) já 
tenham sido descritos há cerca de 100 anos, embora ainda não apresentasse essa denominação 
nessa época, foi somente após a Guerra do Vietnã que foi dada maior atenção a esse 
transtorno. Ao regressarem aos Estados Unidos após servirem nessa guerra, os soldados 
passaram a manifestar sintomas de trauma psicológico pronunciado, com significativo prejuízo 
de sua vida pessoal, e os médicos passaram a se interessar por esta condição. 
Em 1980, o transtorno passou a compor, oficialmente, o quadro dos subtipos de 
transtornos de ansiedade apresentados pela terceira edição do DSM. A partir daí, muitos 
 
 
36 
 
estudos psicológicos, farmacológicos e neurológicos foram sendo desenvolvidos em ordem de 
se conhecer melhor o TEPT. 
O TEPT é um transtorno caracterizado por sintomas que surgem após a exposição do 
indivíduo a um evento traumático grave. Esses sintomas incluem: 
 
 Sentimentos de estar revivendo a situação indefinidas vezes; 
 Comportamento de evitação a situações ou estímulos que lembrem a situação 
traumática; 
 hiperexcitabilidade associada a essas condições; 
 Embotamento afetivo; 
 Intenso e constante medo, horror e sentimento de impotência; 
 Diminuição do interesse geral em relação às pessoas ou situações; 
 Sintomas persistentes de ansiedade que não estavam presentes antes do 
trauma. 
 
Para o diagnóstico do TEPT, esses sintomas devem ocorrer em conjunto e persistir por 
no mínimo três meses. Muitas vezes, ocorre uma latência entre a ocorrência do evento 
traumático e o aparecimento dos sintomas. O indivíduo sente-se como se estivesse revivendo o 
evento traumático indefinidamente, o que é vulgarmente chamado de flashback. Neste momento, 
as sensações psíquicase físicas experimentadas são exatamente as mesmas que se teve no 
momento exato do trauma psicológico. Geralmente, a pessoa tende a evitar ativamente 
situações e conversas associadas ao evento e, adicionalmente, desenvolve um medo extremo, 
verdadeiro pavor, de que venha a ocorrer novamente, consigo ou com outros. 
Em conjunto, essas sensações acabam por diminuir significativamente seu interesse 
em atividades rotineiras, perde a vontade de interagir com outras pessoas ou de participar de 
eventos sociais. Afastando-se dos amigos e até mesmo da família, e criando um isolamento que 
tende a agravar não só seus sentimentos negativos com relação ao trauma; como cria novos 
sentimentos negativos, relacionados à solidão provocada pelo evento traumático. Além dos 
sintomas comportamentais mencionados, sintomas físicos também são manifestados, 
principalmente os associados a uma hiperativação autonômica, com profundas alterações do 
 
 
37 
 
sono, dificuldade de concentração, presença constante de palpitações, sudorese ou tremores, 
hipervigilância e reações exageradamente intensas de sobressalto a qualquer estímulo. 
Apenas a título de exemplo, abaixo está descrito um depoimento verídico de um 
paciente atendido pelo Ambulatório de Ansiedade, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das 
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, para exemplificar o 
sofrimento experimentado por quem sofre de TEPT: 
 
“Aquele dia poderia ter sido apenas mais um, mas na realidade ele mudou 
completamente minha vida. Estava com meu pai em um pequeno 
supermercado perto de casa e, quase já saíamos, quando apareceram 
dois indivíduos encapuzados. Foi tudo muito rápido. Apontaram suas 
armas para nós, que estávamos no caixa, e deram uma coronhada no 
dono do mercadinho para intimidá-lo. Meu pai, por puro reflexo, tentou 
ampará-lo e acabou levando dois tiros. Enquanto ele estava caído, 
sangrando muito, um dos ladrões mantinha sua arma em minha cabeça e o 
outro roubava. Fui levado como refém, sofrendo ameaças de morte 
constantes. Após rodar duas horas pela cidade e ter que sacar dinheiro em 
caixas eletrônicos, fui abandonado numa avenida muito longe do local 
onde eu estava anteriormente. Quando cheguei ao hospital meu pai já 
estava morto. Já faz três meses e não consigo esquecer, tenho pesadelos 
diários com o ocorrido ,não entro mais em supermercados, não tenho 
vontade de sair com meus amigos, falar a respeito de tudo aquilo me faz 
muito mal, começo a suar e tremer. Ultimamente, não tenho conseguido 
dormir direito. Passei a andar armado, tenho tido algumas visões, parecem 
pedaços de um filme que passam em minha mente, flashes do ocorrido. 
Desconfio de todos, tenho até medo de atirar em alguém suspeito” 
 
Um dado importante a ser mencionado é que o TEPT pode ser desenvolvido não 
somente pela pessoa que vivenciou diretamente o evento traumático. Indivíduos que tenham 
testemunhado um evento traumático ocorrido com terceiros, ou pessoas que tenham apenas 
 
 
38 
 
tomado conhecimento da ocorrência de um evento traumático, também podem vir a desenvolver 
o TEPT. 
No caso de eventos ocorridos diretamente à pessoa, as situações traumáticas mais 
freqüentemente associadas ao desenvolvimento do TEPT são: assaltos; vivência de guerras; ser 
vítima de atos terroristas; de seqüestro; torturas ou violência sexual; acidentes automobilísticos 
graves; receber notícia de estado grave de saúde; violência infantil; entre outros. 
Entre os estímulos eliciadores de TEPT em pessoas que tenham testemunhado o 
evento estão: presenciar um assassinato ou violência extrema; encontrar corpos humanos; 
presenciar evento traumático ocorrido com parente ou amigo íntimo. Já entre as situações que 
podem vir a desencadear o TEPT em pessoas que apenas tomaram conhecimento de uma 
situação traumática estão: saber da ocorrência de um ataque violento; sério acidente ou 
ferimentos graves sofridos por um membro da família ou ente querido; saber da morte súbita ou 
inesperada de um membro da família ou ente querido; saber da ocorrência de doença com risco 
de vida a filhos ou pais; entre outros. 
Um fator interessante é o fato de que nem todas as pessoas que vivenciaram um 
evento traumático acabam por desenvolver o TEPT, e essa é uma questão que tem intrigado os 
pesquisadores. Segundo algumas pesquisas, apenas 15 a 30% dos indivíduos que vivenciam 
situações traumáticas acabam desenvolvendo o TEPT. Embora ainda não se saiba exatamente 
o motivo disso, acredita-se que existam alguns fatores predisponentes ao desenvolvimento deste 
transtorno. 
Acredita-se que o sexo feminino apresenta maior predisposição ao TEPT, uma vez que 
o transtorno ocorre em uma proporção de 2:1 em relação ao sexo masculino. Além disso, outros 
fatores parecem contribuir ao seu aparecimento, tais como: já ter vivenciado outras situações 
traumáticas; ter uma história pessoal ou familiar de outros transtornos psiquiátricos; ter 
vivenciado história de separação precoce (seja com relação aos pais e cuidadores, sejam em 
relação a companheiros afetivos); ter vivenciado situações traumáticas na infância; entre outros 
fatores. 
Além disso, parecem existir alguns fatores específicos os quais dispõe o indivíduo a 
uma maior vulnerabilidade ou tolerância à ocorrência do TEPT, como fatores que precedem o 
 
 
39 
 
trauma (variações genéticas); fatores concomitantes ao trauma (severidade e duração); e fatores 
que estão presentes após o trauma (apoio social e compreensão familiar). 
Diferentes estudos comprovam a existência de elevadas taxas de comorbidade nas 
pessoas com TEPT. Indivíduos com TEPT têm duas a quatro vezes maior probabilidade de 
apresentar outro transtorno psiquiátrico, em relação às pessoas sem TEPT, e os mais 
freqüentemente observados são depressão severa, transtorno de abuso de substâncias e 
transtornos de personalidade. 
Além disso, é importante ressaltar que as pessoas com TEPT tendem a tentar o 
suicídio seis vezes mais do que outras pessoas, sendo o transtorno de ansiedade com a maior 
relação com tendências suicidas, daí sua elevada importância em termos de tratamento, apoio e 
acompanhamento. 
Outro aspecto importante em relação à vida produtiva dos indivíduos com TEPT se 
refere ao comprometimento no trabalho, o qual é similar ao prejuízo associado às pessoas com 
depressão, mas menor que o comprometimento dos indivíduos com transtorno do pânico. Esse 
comprometimento refere-se tanto à alta porcentagem de ausências quanto ao fato de que 
pacientes com TEPT tendem a se submeter a atividades profissionais que lhes pagam salários 
inferiores, em função do fato de se julgarem incapazes de lidar com o estresse provocado por 
um trabalho que lhes remunere melhor. 
Com relação ao tipo de tratamento deste transtorno, as abordagens psicoterapêuticas 
e farmacológicas são de fundamental importância, principalmente quando administradas em 
conjunto. O tratamento psicoterápico facilita à adesão ao tratamento farmacológico, bem como 
evita recidivas, e o tratamento farmacológico permite a melhora dos sintomas, para que o 
paciente possa se dedicar mais ao tratamento psicoterapêutico. 
Do ponto de vista farmacológico, diferentes categorias de medicamentos têm sido 
empregadas no tratamento do TEPT, na dependência da sintomatologia e das características 
individuais do paciente. 
Entre essas categorias estão: antidepressivos (como a imipramina, fluoxetina e 
paroxetina), benzodiazepínicos (como o diazepam) e outras drogas, embora de uso menos 
comum, como o topiramato e o valproato de sódio. Do ponto de vista psicoterapêutico, a técnica 
 
 
40 
 
com maiores níveis de sucesso no tratamento do TEPT tem sido a psicoterapia do tipo cognitivo-
comportamental. Neste ponto, é importante ressaltar que um estudo realizado na Universidade 
de São Paulo. 
Ele mostrou por meio de investigações com neuroimagem, que

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