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A ORIGEM DO ESPORTE MODERNO A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE ESPORTE A DISCUSSÃO INTERNACIONAL DO TERMO ESPORTE O ESPORTE, A EDUCAÇÃO FÍSICA E OS DOCUMENTOS FILOSÓFICOS INTERNACIONAIS A FUNÇÃO SOCIAL DO ESPORTE ESPORTE, ESTADO E SOCIEDADE O ESPORTE MODERNO E OS ESTADOS CONTEMPORÂNEOS TEORIA GERAL ma& ̂ gr wÉHfî db ^ •̂•Vlflb MÍfl GOMES TUBINO o H LIVROS oue CONSTÜOCM TEORIA GERAL 00 ESPORTE M. J. Gomes Tubino O estudo do esporte a partir de um debate sobre a sua origem como esporte moderno, seguido^ através da evolução do seu conceito, da discussão internacional do seu termo, sua função social, depois passando pelas abordagens emitidas pelos organismos internacionais a seu respeito e terminando pelo aprofundamento das suas relações com o Estado e a Sociedade, inclusive descrevendo como os Estados modernos têm tratado esse fenômeno desportivo, estabeleceu a base inicial de uma Teoria Geral do Esporte. Esta teorização sob a forma.de ensaio, por sua vez, abriu a perspectiva da fecunda reflexão no Brasil sobre um novo campo de estudos, denominado DESPORTOLOGIA. (Cont. na 1? orelha) é LIVROS QUE CONSTRÓEM Biblioteca "DIDÁTICA" — 34 Teoria Geral do Esporte Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Tubino, Manoel José Gomes, 1939- C822t Teoria geral do esporte / Manoel José Gomes Tubino — São Paulo ': IBRASA, 1987. (Biblioteca didática ; 34) 1. Esportes - Aspectos sociais 2, Esportes - Filo- sofia 3. Esportes - História I. Título. II. Série. 87-1639 CDD-796 ^fjé -796.09 índices para catálogo sistemático: 1. Esportes : Aspectos sociais 796 2. Esportes : Filosofia 796.01 3. Esportes : História 796.09 TEORIA GERAL DO ESPORTE Manoel José Gomes Tubino .Edição orientada pelos professores MANOEL JOSÉ GOMES TUBINO CLÁUDIO DE MACEDO REIS IBRASA Instituição Brasileira de Difusão Cultural Ltda. São Paulo Direitos desta edição reservados à IBRASA INSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE DIFUSÃO CULTURAL LTDA. Rua Vinte e Um de Abril, 97 — Tel. 92-9639 03047 — SÃO PAULO Copyright 0 1987 by MANOEL JOSÉ GOMES TUBINO Capa: Ilustração de Wagner L. Coutinho Montagem de Carlos Cézar Publicado em 1987 MANOEL JOSÉ GOMES TUBINO IMPRESSO NO BRASIL — PRINTED IN BRAZI1 Doutor em Educação Física pela Universidade Livre de Bruxelas Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Presidente do Conselho Nacional de Desportos Decano de Ciências Humanas da Universidade Gama Filho — RJ Conselheiro do Comitê Executivo da Associação Internacional das Escolas Superiores de Educação Física (AIESEP). OBRAS DO AUTOR METODOLOGIA CIENTÍFICA DO TREINAMENTO DESPORTIVO l.a Edição — IBRASA — 1979 2.a Edição — IBRASA — 1980 3.a Edição — IBRASA — 1982 4.a Edição — IBRASA — 1983 5.a Edição — IBRASA — 1984 AS QUALIDADES FÍSICAS NA EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTOS 1.» Edição — FÓRUM — 1973 2.a Edição — FÓRUM — 1974 3.a Edição — IBRASA — 1979 4." Edição — IBRASA — 1985 5.a Edição — IBRASA — 1987 EM BUSCA DE UMA TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA AS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA l.« Edição — CULTRIX — MEC 1976 2.a Edição — IBRASA — 1980 EFICIÊNCIA E EFICÁCIA NAS UNIVERSIDADES l.a Edição — IBRASA — 1981 TECNOLOGIA EDUCACIONAL - DAS MÁQUINAS DE APRENDIZAGEM À PROGRAMAÇÃO FUNCIONAL POR OBJETIVOS DE ENSINO l.a Edição — IBRASA — 1984 OS CONCEITOS DE EFICIÊNCIA E EFICÁCIA COMO ORIENTADORES ADMINISTRATIVOS EM CURSOS DE GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA MEC — 1977 AVALIAÇÃO DO ENSINO DE FUTEBOL EM ESCOLAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA (Co-autor) MEC — 1976 A UNIVERSIDADE ONTEM E HOJE (Co-autor e organizador) l.a Edição — IBRASA - 1985 TERMINOLOGIA APLICADA À EDUCAÇÃO — UMA INTRODUÇÃO l.a Edição — IBRASA — 1985 SUMÁRIO Apresentação -*••* I. A Origem do Esporte Moderno 17 II. A Evolução do Conceito de Esporte . 23 III. A Discussão Internacional do Termo Esporte 37 IV. O Esporte, a Educação Física e os Documentos Filosóficos Internacionais 43 V. A Função Social do Esporte 55 VI. Esporte, Estado e Sociedade 61 VIL O Esporte Moderno e os Estados Contemporâneos 71 APRESENTAÇÃO A história dos esportes nas civilizações antigas passa por diversas evidências importantes, mas de registros impre- cisos. Civilizações primitivas como a dos chineses, maias, incas, egípcios, japoneses, aztecas, hindus, e outros povos, deixaram vestígios de jogos praticados com o caráter es- portivo, e que permitiram diversas especulações sobre a verdadeira origem do esporte. Foi na Grécia antiga que os exercícios físicos e as ati- vidades esportivas tiveram realce, primordialmente pela importância que receberam na Educação e pelo lugar que ocuparam nas celebrações e nas festas. O momento culmi- nante da história dos esportes na Antigüidade grega é atingido nas celebrações dos Jogos Olímpicos, disputados em Olímpia durante 12 séculos, de 884 a.C., a 394 d.C., «de quatro em quatro anos, provocando, inclusive, perío- dos de trégua entre as guerras, durante o período das disputas. As provas de caráter individual, abertas so- mente para o sexo masculino, ofereciam aos vencedores como recompensa uma coroa traçada por ramos de oli- veira, colhidos em árvores consagradas a Zeus. Nos anos de intervalos dos Jogos Olímpicos na Antigüdade os gre- gos celebravam outras competições desportivas como os Jogos ístmicos, Píticos, Nemeus e Fúnebres. Após a con- quista da Grécia pelos romanos, os jogos entraram em decadência até o seu encerramento por Teodósio. O esporte, na sua conceituação e revisão histórica, in- dependente da educação física, isto é, com forma insti- tucionalizada, foi recriado no século XIX na Inglaterra por Thomas Arnold. Após a institucionalização esportiva descrita, o outro período importante do movimento esportivo moderno teve início com o francês Pierre de Coubertin, quando restau- rou os Jogos Olímpicos em 1896. Coubertin, após viagem à Inglaterra, ficou entusiasmado em reformar o sistema educativo francês, utilizando-se dos esportes. Após várias campanhas neste sentido, resolve estender sua proposta para o campo internacional, integrando-se totalmente ao resgate do ideal olímpico, reconceituando-o de acordo com a modernidade daquele momento histórico. 14 A partir da instalação das Olimpíadas Modernas, o mo- vimento esportivo internacional cresceu em torno dessas competições promovidas pelo Comitê Olímpico Interna- cional e nas atividades das federações internacionais de cada modalidade esportiva, criadas já no século XX. O esporte na perspectiva da alta competição perma- neceu até 1964, quando, depois dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em documento assinado por Noel Baker, o es- porte passou a ser estendido também para o homem co- mum, isto é, o não-atleta, na expectativa da utilização esportiva para a qualidade de vida. Este renovado enten- dimento do fato esportivo, depois de referendado pelo Conselho da Europa em 1966 e por organismos interna- cionais, como a UNESCO, através de importantes do- cumentos filosóficos, interferiu inclusive com as respon- sabilidades sociais do Estado diante do esporte. Desse modo, uma teoria geral para o esporte, conside- rando toda a sua modernidade, e colocando-o nas suas in- terseções efetivas com a Sociedade e o Estado, pôde contri- buir para novas reflexões sobre este fenômeno, sem dú- vida, um dos mais importantes deste final de século XX. 15 I - A Origem do Esporte Moderno Uma revisão sobre a origem do esporte, segundo Ueber- horst (1973) justifica-se pela busca do conhecimento do homem sobre o próprio homem e no sentido do questio- namento sobre a importância que o homem deu ao corpo na sua natureza e na sua vida pessoal e comunitária. Para Diem (1966), a história do esporte é íntima da cultura humana, pois com ela compreendem-se épocas e povos, onde cada época tem o seu esporte e a essência de cada povo nele se reflete. Esta percepção de Diem é expli- 17 cada pelo fato de que aquele estudioso alemão entendeu o esporte pertencendo ao domínio do jogo. Entretanto, Ulmann (1965), mesmo tentado a acre- ditar numa perenidadedo esporte, e considerando uma diferença de séculos e de civilizações e até o atestado da história sobre a permanência dos jogos em todas as épocas, insiste em explicar o esporte na sua origem, a partir da interpretação moderna deste fenômeno. Nesta perspec- tiva, o esporte teria o seu início formal com Thomas JrS f <3O^**\? 'oaiO rnold em 1$28, quando exercia a direção do Colégio de Rugby, na Inglaterra e, utilizando-se dos jogos físicos praticados pela aristocracia e burguesia inglesa, incorpo- rou-os aos métodos de educação, deixando nessa prática esportiva uma autonomia tal que seus alunos pudessem dirigi-lo, levando-os a organizarem-se segundo os precei- tos do "fair play". Além disso, as regras começaram a surgir naturalmente das práticas e, logo, passaram os limites de Rugby, estendendo-se rapidamente para fora da Inglaterra, atingindo outros países da Europa e o resto do mundo. As percepções de Arnold são consideradas o início do esporte institucionalizado, do esporte popular e do esporte escolar, isto é, constituem o marco histórico da modernização do esporte. Esta teorização da origem do esporte defendida por Ulmann também recebe o apoio de Poplow, citado por Ueberhorst (1973). Thomas Arnold, no seu entendimento e utilização do esporte, identificou dois aspectos diferentes, mas insepa- ráveis: o fornecimento de prazer para os jogadores e espec- tadores, e a oportunidade de formação moral. Segundo 18 Ulmann, o esporte recebeu com Arnold uma influência específica do darwinismo, ao recuperar o utilitarismo no qual o pensamento inglês estava compreendido. O esporte moderno, então originado na concepção de Arnold, apresentava neste seu momento histórico inicial três características principais: a) é um jogo; b) é uma competição; c) é uma formação. Essas características, segundo Ulmann, se aproximam às dos gregos antigos. Apenas quanto à formação do, homem, o esporte não é compreendido do mesmo modo, pois Arnold colocou o esporte a serviço da ação moral, ofe- recendo ao corpo a função de ajudar o homem a obedecer à lei moral. Nesta expectativa, o corpo tornou-se um agen- te, um meio da moralidade, e o esporte um auxiliar do corpo. Ao contrário, esta percepção não representa o ponto de vista dos gregos antigos. Platão, citado por Ulmann (1965), que expressou bem o espírito grego, dizia que o corpo deveria ter beleza para que a alma fosse bela e reciprocamente a alma deveria estar pura e bela para que a beleza e o vigor do corpo não fossem somente apa- rentes. Verifica-se que o esporte para os gregos, diferen- temente da concepção arnoldina, era valorizado, sem tor- nar-se num meio de um meio. Pierre de Coubertin, citado por Gillet (1975), e que teve influência dos pensamentos de Arnold na sua inicia- tiva, na final do século XIX, de restaurar os Jogos Olím- 19 picos, disse que o esporte enquanto cultivado como arte pelos gregos provocou um florescimento magnífico e per- sistente. Mas, para ele, ao ficar sem a proteção de certas atenções, debilitou-se, reaparecendo em estado selvagem e com vigor na Idade Média para ser aquecido diante do próprio avanço da sociedade, até reencontrar-se no século XIX num processo que o submeteria a uma força inten- siva que o conduziria a um crescimento rápido e a uma produção de variedades de modalidades que, muitas vezes, se tornou incontrolada. As reflexões sobre outras teorias sobre a origem do es- porte, embora reconhecendo-as subjetivas em função das próprias interpretações, das dificuldades do restabeleci- mento das estruturas de passado e das imagens de homem na cosmovisão de cada autor, tornam-se imperativas para que se possa desenvolver uma melhor compreensão do presente do fenômeno esportivo. Uma dessas teorias mais aceitas e consideradas no estu- do do esporte é a de Eppensteiner (1973), que se refe- rencia nas motivações da ação esportiva. Ao distinguir que essas motivações derivam de duas vertentes, a natu- reza e a cultura, e ao entender a cultura como tudo aquilo que advém da vivência do homem em sociedade, esse autor refere-se à origem do esporte como um fenômeno biológico e não histórico. Para ele, em todas as épocas, as causas culturais e biológicas do esporte coexistem, crian- do um instinto esportivo, que pode ser considerado a re- sultante da combinação dos instintos do lúdico, do mo- vimento e da luta. 20 Outra teoria importante sobre a origem do esporte mo- derno é a dos historiadores norte-americanos Van Dalen, Mitchel e Bennet, os quais, segundo Ueberhorst (1973), concebem o fato esportivo como um problema pedagógico desde as épocas primitivas. Nesta perspectiva, a questão da origem do esporte está ligada aos fins educacionais do homem nos tempos primitivos. Desse modo, essa origem pode ser buscada pelos aprofundamentos sociológicos e pela investigação etnológica nos povos primitivos, pois a des- coberta da consciência e da solidariedade de grupo serão sempre as orientações indicadas. Em todas as teorias e colocações observadas, é possível extrair-se alguns pontos comuns, que permanecem no es- porte moderno: a) que o componente psicossocial fundamental do es- porte é o caráter competitivo; b) que o esporte, desde o início colocado sempre na perspectiva do progresso do homem, necessita de uma visão interdisciplinar; c) que o esporte moderno, ao delimitar-se pelas regu- lamentações e codificações, supõe um autocontrole, que se constitui num dos princípios básicos da con- vivência humana. Concluindo, observa-se que na tentativa da aceitação de uma teoria para a explicação da origem do esporte moderno podem-se aceitar os posicionamentos de Ulmann e Poplow, nos quais a ruptura do esporte antigo ocorreu em 1928, com Thomas Arnold, e, sem absolutizá-los, 21 admite-se que as demais teorias, como propõe Ueberhorst, apresentam aspectos parciais válidos e relevantes para o entendimento da gênese do fenômeno esportivo contem- porâneo. Referências Bibliográficas 1. DIEM, C. — História de los Deportes. Barcelona: Luís de Coralt, 1966. 2. EPPENSTEINER, F. — El Origen dei Deporte, In Citius, Altius, Fortius. Madrid: Instituto Nacional de Educacion Fí- sica y Deportes, 1973, XV, 259 — 272. 3. GILLET, B. Histoire du Sport. Paris: Presses Universitaires de France, 1975. 22 II - A Evolução do Conceito de Esporte Os impactos da evolução social britânica do século XVIII e da estruturação pedagógico-esportiva inglesa do século XIX, segundo Cagigal (1979 ), contribuíram decisivamen- te para a conformação do chamado esporte moderno, com suas características, de organização por unidades sociais específicas denominadas clubes, de regulamentações e co- dificações que facilitaram a internacionalização das mo- 23 dalidades esportivas, e, ainda, a exaltação da conduta esportiva sintetizada na expressão "fair play", a qual compreende o cavalheirismo, o respeito ao adversário, a aceitação da derrota, a colaboração em equipe e muitas outras virtudes. Observa-se desse modo que o conceito de esporte na sociedade moderna recebeu dilatações notáveis, que vieram permitir o entendimento desse fenômeno em toda a sua renovada amplitude. O esporte, como entidade multifuncional que compreen- de tantas riquezas e aspectos da vida humana e da socie- dade, também tem evoluído conceitualmente no sentido de uma maior abrangência, para o cumprimento do seu papel de bem cultural, pois, como patrimônio herdado, a sociedade deve dele servir-se e depois transmiti-lo acres- cido das experiências desenvolvidas. Neste sentido, é importante iniciar a trajetória dessa evolução iniciando com Thomas Arnold (1928), quando propiciou meios para sua institucionalização. Este edu- cador histórico criou uma utilização educativa do esporte, na qual apresentava uma primeira divisão em elementos ou características, como ele chamou: a) o jogo; b) a competição; c) a formação. Por outro lado, o utilitarismo, de inspiração darwinista, e a busca prioritária da modalidade, constituíram-se em outras características fundamentais da concepção de es- porte de Arnold. Osucesso da experiência de Arnold 24 levou a sua concepção para outras nações, e até a inspira- ções importantes, como para Coubertin, que restaurou o ideal olímpico com a certeza de que o esporte serviria para as finalidades da paz que defendia. Para Coubertin, segundo Gillet (1975), o esporte era entendido como o culto voluntário e habitual do esforço muscular intensivo apoiado sobre o desejo de progresso e podendo chegar até o risco. Com o Barão Pierre de Coubertin, o esporte criou o seu organismo internacional mais importante, o Comitê Olímpico Internacional (COI), que ficou encarregado de desenvolver o olimpismo como movimento filosófico do esporte, e a promover as Olimpíadas de quatro em qua- tro aaos, sem dúvida a celebração máxima do esporte mundial, e consolidação do fenômeno esportivo na sua manifestação de maior nível técnico. Entre os conceitos de esporte elaborados por diferentes tendências, existem aqueles que se vinculam principal- mente ao conceito de jogo. Para esses, de um modo geral, o esporte, além de ser exercício físico, ter caráter com- petitivo, e cumprir funções relevantes como a higiênica, a educativa, a hedonística, a biológica, a de promoção social, constitui-se numa conduta lúdica de alcance psi- cossomático. A referência principal desse grupo é Caillois (1958), que caracterizou os jogos em: a) agon (jogos de competição); b) álea (jogos de azar); c) mimicry (jogos de mímica); d) ilintix (jogos de vertigem). 25 Para Caillois, o esporte é a forma socializada do agora. Nesta mesma tendência ainda se encontra outro conceito importante do esporte, que é o de Diem (1966). Para ele o esporte pertence ao domínio do jogo, e, como o jogo, é de uma índole especial, livremente adotado, pleno de valor, levado a sério, regulado com exatidão e, antes de tudo, buscando rendimento. Por outro lado, Bouet (1968), numa tendência con- trária a Caillois e Diem, ao reconhecer o esporte como intensivo e transcendente, em oposição ao jogo que é ex- tensivo e iminente, considerando ainda que o tempo es- portivo condiciona a preparação do esportista, o qual visa entre outros a máxima rentabilidade no tempo regulamen- tar de uma competição, campeonato, época esportiva ou sucessão de épocas esportivas, onde seus .praticantes nele penetram por intermédio da arbitragem e do espetáculo, afirma: "O esporte é efetivação, aplicação de princípios, nor- mas, superação, consciência do indivíduo, busca de ob- jetivos, especialização". Outra percepção das mais interessantes do fenômeno esportivo é a de Eppensteiner (1973), que compreende o esporte como um atributo originário da natureza huma- na, devendo sua origem a instintos profundamente liga- dos ao prazer, entre os quais o movimento, e a uma clara intenção de conjugar, com repercussões positivas biológi- cas e culturais, o instinto lúdico e o instinto de luta no instinto esportivo. 26 Uma das contribuições mais efetivas para o entendi- mento sobre o esporte foi a do italiano Antonelli (1963), que ao conceituar esse fenômeno identificou seus três elementos básicos: a) o jogo; b) o movimento; c) o agonismo (competição). Ainda distinguiu quatro aspectos característicos do esporte: a) o ético-social; b) o psicopedagógico; c) o psicoprofilático; d) o psicoterapêutico. Observa-se que os elementos distinguidos por Antonelli correspondem às características percebidas por Arnold com a substituição da formação pela competição. Uma outra posição e entendimento sobre o esporte mui- to considerada na literatura esportiva especializada é a de Magnane (1969), que ao examinar o esporte desde o ângulo individual, desprezando a sua perspectiva social, o qualifica como atividade de prazer, podendo deixar de exercer este papel com relativa facilidade, quando con- verte a prática esportiva em profissão. Para esse sociólogo francês o esporte é uma atividade de prazer em que o dominante é o esforço físico, que participa em vez do jogo e do trabalho, praticado de maneira esportiva, com- 27 portando regulamentos e instituições específicas, e é sus- cetível de transformar-se em atividade profissional. Entretanto, o grande marco numa revisão no conceito do esporte foi o Manifesto do Esporte, editado pelo "Con- seil Internationale d'Educatíon Physique et Sport", órgão ligado à UNESCO, no qual o fenômeno esportivo foi tra- tado na perspectiva do tempo livre e da escola, além da referência ao esporte de alta competição, que já estava exaustivamente abordado nas concepções anteriores do fato esportivo. Logo a seguir, a Carta Européia de Esporte Para Todos, publicada em 1966 sob a responsabilidade do Conselho da Europa, referendou toda a nova responsa- bilidade do esporte diante do fenômeno da participação. A partir desses documentos, as conceituações de esporte passaram a referenciar-se nessa nova abrangência, com as interseções necessárias nas práticas esportivas institucio- nalizadas e populares, e às vezes com abordagens especí- ficas das responsabilidades esportivas no meio escolar. Nesse sentido, são importantes as concepções de Noronha Feio (1978), Cazorla Prieto (1979), Cagigal (1979) e Clayes (1984). Para Noronha Feio (1978), o esporte é o lugar onde se desenvolve o comportamento do homem, o homem só, o homem em pequenos grupos ou em multidão, numa si- tuação agonístico-recreativa. Esse autor, para uma melhor compreensão do fenômeno esportivo na atualidade, tam- bém mostrou a necessidade de isolar-se um dos seus com- ponentes fundamentais: o jogo. Ao entender que o esporte é jogo e algo mais, justifica esta posição ao salientar que 28 o homem dele participa na sua totalidade, pois o mesmo é um fenômeno complexo universal, uno e indivisível, que mantém as características essenciais do jogo e acres- centa outros conteúdos. Como jogo, Feio entende o esporte através da definição de jogo de Huizinga (1951): "O jogo é uma ação livre, sentida como fictícia e situa- da fora da vida corrente, capaz de absorver totalmente o jogador, que se realiza num espaço e num tempo expressamente circunscrito e se desenvolve ordenada- mente segundo determinadas regras, suscitando na vida relações de grupos, os quais voluntariamente se envolvem de mistério ou acentuam por disfarce a sua estranheza face ao mundo habitual..." Nesta definição de jogo de Huizinga, Noronha Feio ainda acrescentou os dois elementos da atividade lúdica: a tensão e a alegria. Entretanto, o próprio Feio reconhece que o esporte não se identifica totalmente com o jogo, existindo diferenças, e até antagonismos, onde a Psicolo- gia, a Sociologia e a Política tornam-se ciências indispen- sáveis para estudar o homem e/ou agrupamentos huma- nos em situação esportiva. Cazorla Prieto (1979) por sua vez, ao conceituar o esporte, coloca-o inicialmente como problemática com duas hipóteses: se o esporte é por sua natureza uma ati- vidade finalística, isto é, com um fim em si mesmo, ou, pelo contrário, se é instrumental, ou seja, somente um meio para alcançar outras metas. A seguir, este autor listou vários pontos de' vista, pelos quais o fato esportivo 29 pode ser examinado: o esporte, meio de aperfeiçoamento pessoal e existencial; o esporte, acumulação de força e raiz criadora; o esporte como jogo; o esporte como fenômeno estético; o esporte como treinamento ético; o esporte, modelo de sociedade competitiva; o esporte, reação de compensação e adaptação frente às condições de vida e do trabalho industrial; o esporte, mundo dos signos; o esporte, válvula de escape da agressividade, reação de instinto de conservação da espécie; o esporte, meio para aumentar a produção, a serviço da luta de classes e para acabar com a alienação; o esporte, simbolização do con- flito e compensação narcisista. Pelas relações apresenta- das, que provocam um grande número de expectativas para a análise do fato esportivo, Prieto reconheceu as contradições. Ao continuar na busca de um conceito para o esporte, este autor formulou três pressupostos básicos: a) o esporte deve ser entendido como expressão indi- vidual e comofato social; b) o esporte tem um ingrediente de esforço físico no- tável; c) a natureza do esporte pode ser instrumental ou finalística, segundo a predisposição psicológica da- quele que o pratica e da manifestação esportiva de que se trata. Assim, para Cazorla Prieto, o esporte é entendido: a) do ponto de vista individual, como uma atividade humana predominantemente física, que se pratica isolada ou coletivamente e em cuja realização pode- 30 se encontrar a auto-satisfação ou um meio de alcan- çar outras aspirações; b) do prisma social, como um fenômeno de primeira magnitude na sociedade, mas também com conse- qüências econômicas e políticas. Cagigal (1979) compreendeu o esporte como uma conduta humana típica e específica e um sucesso antro- pológico, onde o protagonista, centro desse sucesso, é o esportista, que é um ser humano com uma característica especificada por um certo tipo de "praxis", .entendida como um exercício liberador da evidência lúdica, além de uma confrontação de capacidades pessoais, evoluciona- das até uma competitividade. Na verdade, o conceito de esporte de Cagigal reconheceu a sua veracidade multifun- cional diante da atualidade, mostrando que esta diversi- dade de realidades humanas e sociais pode ser resumida em duas grandes direções: a) o esporte-espetáculo; b) o esporte-práxis. O primeiro caracterizado pela sua condição de espe- tacularidade e organização progressiva, enquanto o segun- do, em outra direção, com características mais higiênicas, educativas, ociosas, lúdicas, è de espontânea relação social. Outro autor que tem acompanhado o avanço conceituai do esporte é Clayes (1984), quando considera que a am- pliação desse conceito ocorreu justamente pela sua rela- ção com o movimento "Esporte Para Todos", iniciada há 31 alguns anos, mas que em 1966 pela "Carta Européia de Esporte Para Todos" do Conselho da Europa recebeu sua efetiva formulação e passou a apresentar um novo refe- rencial teórico básico. Ao colocar-se diante desse fenôme- no social, porque desconhece que previamente o esporte é uma atitude pessoal, ele defende que o esporte precisa ser teorizado a partir do esportista que o pratica. Guima, ao defender que o esporte se define por uma prática, justifica que deve ser estudado pelas atividades e inte- resses, concluindo que o esporte é uma prática e uma atitude. Ao fixar-se de que a prática do esporte afeta o esportista, sem caracterizar suas relações sociais, ele situa que a natureza da atividade esportiva pode ser entendida pela liberdade pessoal, respeito e compreensão. O espor- tista, para melhorar seus movimentos, necessita conhecer- se e dominar-se, e assimilando seus defeitos e capacidades, comparando-os com os outros, aceitando-se como é e acei- tando os demais como são. Na perspectiva de valores trans- mitidos à sociedade, independentemente se o esporte seja um espetáculo, uma ocupação do ócio, uma prevenção sanitária, uma tentativa de melhorar a raça e espécie humana, ou propaganda de um regime político, ele tam- bém admite que o esporte, por sua generalização, chega a formar parte da cultura. Finalmente, Guima (1984) conclui como conceito de esporte: "Trata-se de uma atitude pessoal, uma forma de admi- tir a vida, que se consegue pela reiteração de exercícios físicos, que se concretiza em conhecer-se e aceitar-se 32 e aos demais sem que se produza outro benefício para a sociedade". Depois desta passagem por diferentes interpretações do fato esportivo nas suas relações com a sociedade, chega-se à certeza de que a maior amplitude do conceito de esporte, proposta pelo "Manifesto do Esporte", depois validada pela "Carta Européia de Esporte Para Todos" e por inú- meros pensadores da questão esportiva, passa a conside- rar praticamente todas as formas de movimento físico que se vinculam à recreação e condição física, como as corridas e outras atividades casuais, localizando-as nas manifestações do chamado esporte popular. Verifica-se que a abrangência do conceito de esporte absorveu tam- bém o sentido da participação, enriquecendo o entendi- mento do fenômeno esportivo. Na verdade, o conceito, no sentido estrito do esporte, que supunha um número limi- tado de atividades humanas realizadas sob o caráter com- petitivo, deu lugar a um conceito mais amplo, em que todas as formas possíveis de movimento físico podem ser interpretadas como atividades esportivas. Nesta nova pers- pectiva do esporte, até os processos de aprendizagem es- portiva passaram também por uma revisão, pois agora terão que ser compreendidos na estrutura social em que estão inseridos. Desse modo, as estruturas sociais nas quais as pessoas estão situadas são decisivas para os seus com- portamentos esportivos, e a cultura será determinante nesta participação. Enfim, o esporte nesta renovada interpretação, com o acréscimo do sentido participativo, deverá constituir-se 33 muito mais em fator de favorecimento ao bem-estar do que em atividade de utilidade econômica, recriando a pró- pria percepção do fenômeno esportivo, ao estabelecer as linhas para um novo estatuto, no qual a participação3 con- quista um papel predominante e passa a representar a nova característica do esporte contemporâneo, e o esporte de alta competição torna-se mais trabalho do que jogo. Referências Bibliográficas 1. ANTONELLI, F. — Psicologia e Psicopatologia dello Sport. Roma: Leonardo, 1963. 2. BOUET, M. — Signijication du Sport. Paris: Firmin, 1968. 3. CAGICAL, J. M. — Cultura intelectual y cultura física. Buenos Aires: Kapelusz, 1979. 4. CAILLOIS, R. — Lês Jeux et lês hommes — lê masque et lê vertige. Paris: Gallimard, 1958. 5. CAZORLA PRIETO, L. M. — Deporte y estado. Madrid: Editorial Labor, 1979. 6. CLAYES, V — A evolução do conceito do Desporto, e o fe- fameno da participação. Lisboa: Ministério da Educação e Cultura, Direção Geral dos Desportos, 1984. 7. Conseil Internationale d'Education Physique et Sport — Manifesto Mundial do Desporto: Autor, 1964. 8. Conselho da Europa — Carta Européia de Esporte Para To- dos: Autor: 1966. 9. DIEM, C. — História de los Deportes. Barcelona: Luís de Coralt, 1966. 10. EPPENSTEINER, F. — El origen dei Deporte, In Citius, Altius, Fortius. Madrid: Instituto Nacional de Educacion Física y Deportes, 1973, XV, 259-272. 34 11. FEIO, N. — Desporto e política — ensaios para sua com- preensão. Lisboa: Compendium, 1978. 12. GILLET, B. — Histoire du sport. Paris: Presses Universi- taires de France, 1975. 13. GUIMA, J-L., F. — Aproximación a Ia realidad social y deferenciación legal entre Deporte de elite — Deporte pó- •pular. In Deporte Popular — Deporte de Elite — Elemen- tos* para Ia Refléxion. Valencia: Ayuntamento de Valencia, 1984. 14. HUIZINGA, J. — Homo Ludens, essai sur Ia formation so- cial du jeu. Paris: Gallimard, 1951. 15. MAGNANE, G. — Sociologia do Esporte. São Paulo: Pers- pectiva, 1969. III - A Discussão Internacional do Termo Esporte No século XIV, lembra Cagigal (1979), os marinheiros mediterrâneos usavam as expressões fazer esporte, des- portar-se ou estar de portu para referir-se a diversões de confronto entre as suas habilidades físicas. Embora o ter- mo esporte tenha um largo emprego, também sobre a forma desporto, ele apresenta algumas diferenças de signi- ficados e conteúdos nos países que mais aprofundaram a interpretação do fenômeno esportivo. 37 Loy Jr. (1968), ao desenvolver a interpretação deste termo na língua inglesa, focaliza o esporte como um acon- tecimento de jogo, no qual é definido como "qualquer forma alegre de competição cujo resultado é determinado pela habilidade física, estratégica, ou oportunidade em- pregada individualmente ou em combinação". Nesta pers- pectiva, o esporte é considerado como a coletividade de esportes individuais que podem ser compreendidos como tipos de jogos especializados. Essa definição de jogo, e conseqüentemente de esporte, segundo Broekhoff (1986), é remetida principalmente das concepções de Huizinga (1938) e Caillois (1958). Também Rijsdorp (1966) respalda oconceito de esporte de Loy Jr. ao afirmar que o esporte é "o desenvolvimento da antítese do jogo na direção da competição". Mas é o próprio Loy Jr. quem concebe o esporte como um jogo institucionalizado, já que compreende uma organização, a constituição de equi- pes, responsabilidades, funções simbólicas e outras carac- terísticas, provocando uma relação com a educação, por considerar que o resultado e o seu conhecimento necessi- tam de mais processos de instrução formal do que informal e de aprendizagem casual. Broekhoff, ao identificar na literatura esportiva alemã diferenças terminológicas e de conteúdo no vocábulo esporte do alemão para o inglês, encontra uma explicação ,.na reforma educacional germânica de 1950, quando ocor- reu a substituição do termo Leibeseiziechung Korpererzie- chung1"1, que significava educação física, pelo termo "Spor- tunterricht", traduzido por esporte. Essa mudança não 38 foi somente semântica como à primeira vista parece, pois a evolução social e a importância política e promocional do esporte após a Segunda Guerra Mundial foram deter- minantes nessa alteração, que coincidiu com o apareci- mento de estímulos do governo alemão para a ciência do esporte, criando instituições científicas e mecanismos de financiamento à pesquisa esportiva nas universidades. Por sua vez, nos Estados Unidos, embora se registrem algumas tentativas de mudança de terminologia como na Alemanha Federal, segundo Broekhoff (1986), o termo educação física permaneceu nas escolas públicas e uni- versidades, e o termo esporte continuou com o sentido uti- lizado na Inglaterra. Na França, também ocorreu o mes- mo fenômeno, permanecendo no idioma francês os termos "Education Physique" e "Sport". A palavra esporte para Haag (1979) até agora não provocou problemas de interpretação internacional que possam prejudicar a chamada ciência do esporte, pois as suas subdisciplinas, a medicina esportiva, a biomecânica do esporte, a psicologia esportiva, a sociologia esportiva, a história do esporte e a filosofia do esporte, possuem organismos internacionais próprios, publicações específi- cas e têm realizado números congressos científicos inter- nacionais com seus temas e discussões peculiares. Não obstante, está surgindo um novo campo de discussão cien- tífica, já com muitas controvérsias, que é a chamada Pe- dagogia do Esporte ("Sport Pedagogy") que já mereceu uma sessão específica no Congresso Olímpico de Eugene/ Oregon (1984) e muitas publicações, consolidando uma 39 literatura especializada. Para Haag (1979), a Pedagogia do Esporte constitui a sétima subdisciplina da ciência do esporte. Registre-se que, segundo Broekhoff (1984), a Pedagogia do Esporte (Sport Pedagogik) se desenvolve na Alemanha, a partir da teoria da educação física, e em consonância com o movimento trocou-se o nome de edu- cação física para esporte. Por outro lado, Grupe e Kurtz (1966) no dicionário tfilíngüe da ciência do esporte, ao confirmar a tradução de Pedagogia do Esporte para Teoria da Educação Física, relacionaram o esporte com a educação, oferecendo a fundamentação para a prática esportiva educativa, e objetivando a valorização do de- senvolvimento humano e da qualidade de vida, esta colo- cação ultrapassou a definição de esporte de Loy Jr. no seu aspecto da institucionalização, colocando-o como meio para uma consecução ampliada de objetivos pedagógicos. Na União Soviética, os termos Fizcultura, traduzido por cultura física, e esporte são muito empregados, onde o esporte, segundo Adam (1979, Pavlov (1980) Riordan (1980) e Dmitroux (1980), está situado na abrangência da cultura física, constituindo-se a base de uma estrutura esportiva denominada Gotov k trudi i oborne ( GTO), sob a forma de uma pirâmide, que compreende toda a popu- lação esportiva soviética ativa. No Brasil, especificamente, outro aspecto importante do debate do esporte é a discussão semântica da utiliza- ção apropriada dos termos desporto, sport, ou esporte. Lyra Filho (1973) é quem oferece a melhor contribuição neste sentido. Ele explica que o vocábulo desport era 40 usado no francês antigo com o significado de (prazer, descanso, espairecimento, recreio, transformando-se pos- teriormente em sport para o próprio francês, e também chegando ao idioma inglês do mesmo modo. Por outro lado, os espanhóis passaram a utilizar deporte, os italianos Deporto, e os portugueses consagraram o uso do termo desporto. Lyra Filho, após consultar Antenor Nascentes, e explicar a utilização de Desporto na criação da antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), como um arcaísmo revivido por Coelho Neto, e ao mostrar que no país existe una uso indiscriminado das palavras desporto e esporte, nos textos legais e na linguagem popular, opta pelo vocábulo arcaico desporto. Ao reconhecer-se que no nosso país há apenas uma relativa relevância de relação entre o termo utilizado e o seu conteúdo, nas hipóteses do uso de esporte ou desporto, conclui-se que qualquer uma das opções atende para a percepção da abrangência conceituai do fato esportivo, acrescentando-se que por uma questão de hábito se achou por bem prosseguir no emprego do termo esporte. Referências Bibliográficas l. ADAM, Y. — Lê Sport dans Ia vie dês Sovietiques. Moscou: Editions du Progres, 1979. 2. BROEKHOFF, S. — Terminology in Sport and Physical Education: Sport Pedagogy and the Trilingual Dictionary of Sport Science. Trabalho apresentado no Congresso Nacio- nal AIESEP, Heidelberg, 1986. 41 3. CALLOIS, R. — Lês Jeux et lês hommes — lê masque et lê vertíge. Paris: Gallimard, 1958. 4. DMITROUK, V. DE — Lê sport et Ia Paix, Kiev: Politvi- dav Oukraini, 1980. 5. HAAG, H. — Development and structure of a theorical framework for sport science. Quest, 1979, 31 (1), 25 - 36. 6. HUIZINGA, J. — Homo Ludens. São Paulo: Perspectiva, 2.a edição, 1980. 7. LOY JR., J. W. — The nature of sport: A definitional effort. Quest, 1968, 10 (2), 1-16. 8. LYRA FILHO, J. — Introdução à Sociologia dos Desportos. Rio de Janeiro. Biblioteca do Exército, Bloch, 1973. 9. RIJSDORP, K. — Sport ais Songmenselijke Adiviter. Utre- cht: San Luiting Fonds, 1966. 10. RIORDAN, J. — Sport Sovietique. Paris: Vigot, 1980. 42 IV ~ O Esporte, a Educação Física e os Documentos Filosóficos Internacionais Á partir da década de 1960, surgiu uma série de do- cumentos emitidos pelos organismos internacionais que tratam das questões do esporte e da educação física, os quais evidenciaram a tendência internacional do pensa- mento ideológico na tentativa de uma proposta de resgate dos princípios desses campos de conhecimento e atividade 43 w humana. Segundo Costa Ferreira (1985), essas entida- des, ao formularem seus posicionamentos, mostraram uma consciência das crises atuais e uma preocupação com a vontade de anunciar o futuro, respeitando o passado da educação física e do esporte. Os documentos que serviram de reflexões para a comu- nidade educacional e esportiva foram: a) Manifesto Mundial do Esporte; pelo CIEPS (1964); b) Carta Européia de Esporte Para Todos, pelo Con- selho da Europa (1966); c) Manifesto da Educação Física, pela FIEP (1970); d) Carta Internacional de Educação Física e Esporte, pela UNESCO (1978). O primeiro documento, o Manifesto Mundial do Espor- te, editado pelo "Conseil Internacionale d'Education Phy- sique et Sport" (CIEPS) da UNESCO, em 1964, logo após os Jogos Olímpicos de Tóquio, representou uma primeira grande reflexão internacional sobre o esporte, seu conceito, sua abrangência, suas virtudes e seus peri- gos. Após uma introdução, na qual conceituou o esporte, tratou do grupo desportivo, da promoção do homem pelp esporte, do direito de todos em praticarem esporte, das obrigações do esporte e dos deveres dos dirigentes espor- tivos, desenvolvendo três capítulos: a) O esporte na escola; b) O esporte nos tempos livres; d) O esporte de alta competição. 44 No capítulo I, ao tratar do esporte :ua escola, o do- cumento dividiu-se em partes referentes a: „ a) esporte, parte integrante da educação;b) uma educação equilibrada; c) o esporte a serviço do homem; d) os problemas novos num mundo de transformação; e) a contribuição do esporte para a solução dos novos problemas; f) o desenvolvimento do talento esportivo; g) a qualificação dos ensinamentos. No Capítulo II do Manifesto do Esporte, tratou-se do esporte nos tempos livres e, para que esta perspectiva esportiva fosse abordada, foram apresentadas as seguintes partes: a) o esporte e os tempos livres; b) programas apropriados; c) o esporte, a oportunidade para atividades livres; d) a importância do "fair play"; e) o espírito esportivo; f) o equipamento necessário. No terceiro e último capítulo, este manifesto considera o esporte de alta competição, apresentando colocações sobre: a) o esporte e a promoção do campeão; b) o dilema atual; 45 c) os princípios de uma reforma; d) uma solução; e) conclusão. O Manifesto do Esporte, com a autoridade e a relevân- cia da assinatura principal, Philip Noel-Baker, prêmio Nobel da Paz de 1939, foi um grande impacto na própria aceitação do esporte naquela época, pois serviu de marco para uma nova abrangência do conceito do esporte, con- siderando o esporte na escola e o esporte no tempo livre, além do esporte de alta competição, que até então preen- chia perfeitamente o entendimento sobre o fato esportivo. O segundo documento de importância para o novo en- tendimento do esporte no mundo foi a Carta Européia do Esporte para Todos, do Conselho da Europa, em 1966, que teve a preocupação de promover o esporte na pers- pectiva da educação permanente e do desenvolvimento cultural. Registre-se que o movimento esporte para todos teve início na Noruega pela campanha denominada Trimm, sendo logo seguida pela Alemanha Federal, Sué- cia e Bélgica, para depois chegar aos Estados Unidos e Canadá. A Carta Européia para Todos foi estruturada em cinco textos: a) adoção e princípios do esporte para todos; b) o papel das autoridades públicas diante do Esporte para Todos; c) as formas de cooperação; 46 d) as estruturas de cooperação; e) a resolução geral. O primeiro texto, compreendendo oito artigos, coloca a sua ^premissa básica logo no primeiro artigo, quando estabelece que todos têm direito à prática do esporte. Os demais sete artigos desenvolvem os princípios fundamen- tais do movimento "Esporte para Todos", os quais, pode- se acrescentar, constituem a própria base do chamado esporte popular. O segundo texto, ao discutir o papel das autoridades públicas quanto ao desenvolvimento do esporte para todos, distingue o assunto em cinco itens: a) as responsabilidades das autoridades públicas; b) participação de distintos grupos sociais; c) as condições materiais da prática do esporte; d) o financiamento do esporte; e) proteção da integridade do esporte e dos esportistas. Os textos de número três e quatro, ao tratarem das formas de cooperação e das estruturas de cooperação, apresentam uma série de diretrizes nestas duas perspecti- vas sob a forma de ações e de recomendações. Finalmente, o texto número cinco encerra o documento com o anúncio e os agradecimentos das colaborações prestadas à elabo- ração dos textos, mas, fundamentalmente, esclarece que o documento é apenas uma referência e que o compro- misso permanece com todos. Para Clayes (1964) a Carta Européia de Esporte para Todos é o estímulo inicial para o novo conceito de esporte. Entretanto, com o conhecimento do Manifesto do Esporte 47 de 1964, verifica-se que aquele documento é realmente 0 marco para o alargamento do conceito de esporte. Por outro lado, esta carta serviu para uma consolidação teóri- ca do que já estava acontecendo na prática, inclusive no Brasil. O movimento esporte para todos é, sem dúvida, a manifestação maior do chamado esporte popular. O terceiro desses documentos, elaborado a partir de 1968 e divulgado pela "Féderation Internacionale d'Edu- cation Physique" (FIEP), é o Manifesto da Educação Fí- sica. Neste documento, de seis capítulos, o primeiro apre- senta o conceito de educação física, o segundo trata dos meios de educação física, o terceiro trata do lugar das atividades esportivas na educação física, o quarto aborda as técnicas e formas pedagógicas, o quinto dedica-se aos educadores, enquanto o último complementa o documento apresentando preceitos sobre as condições. No conceito de educação física formulado no Capítulo 1 do Manifesto, ela é entendida como o meio de educação que usa as atividades físicas na sua intenção educativa, utilizando-se dos meios naturais, ar, sol e água. Os objeti- vos da educação física são: a) corpo são e equilibrado; b) aptidão para a ação; c) valores morais. O objetivo corpo são e equilibrado trata da finalidade higiênica da Educação Física. No objetivo aptidão para a ação o documento sugere que o desenvolvimento das qualidades psicomotoras faci- litará a vida diária, subdividindo-se em: 48 a) qualidades perceptivas (percepções internas — co- nhecimento do próprio corpo, e percepções externas — apuramento dos sentidos); b) qualidades motoras (destreza, velocidade, força, habilidade, resistência e descontração); c) qualidade de autodomínio e raciocínio. Estes visam a reagir eficazmente pelo equilíbrio psico- fisiológico contra os efeitos nefastos da mecanização, da sedentarização, da poluição, da fadiga nervosa provocada pelo ritmo acelerado e tensões da vida civilizada. Quanto ao objetivo valores morais, este visa à morali- dade em ação, ressaltando o clima ético das sessões de educação física e o meio social ativo no qual os educado- res têm função de responsabilidade na formação da juven- tude tanto para o mundo de hoje quanto para o de ama- nhã. Torna-se evidente que tais valores estão diretamente dependentes do conceito de Educação e do quadro políti- co, econômico e humano de cada país. Observa-se que os objetivos propostos pelo Manifesto e o conceito formulado de educação física no mesmo rea- firmam uma posição humanista de educação na perspec- tiva da totalidade do ser, contrariando a perspectiva dua- lista de homem. A seguir, no capítulo III, o manifesto classifica as atividades esportivas utilizadas na educação física em: a) competição esportiva sistematicamente organizada; b) treino esportivo; c ) j ogo-esporte. 49 No primeiro caso, o esporte tratado é aquele institucio- nalizado, com as características da eliminação, seleção, codificação e outras. Na segunda abordagem o treino.es- portivo, embora desenvolva as mesmas qualidades físicas que a educação física, tem uma utilização para a compe- tição esportiva. E, finalmente, o jogo-desporto é sugerido no documento como aquele que melhor atende às necessi- dades da sociedade moderna, por constituir-se numa per- cepção humanista do esporte, onde o prazer e a satisfação estão presentes no lúdico, ao contrário do que ocorre nas competições do esporte federado. No quarto capítulo, as técnicas e as formas pedagó- gicas, ao serem abordadas, provocam a evidência da neces- sidade da investigação científica, ressaltando que a educa- ção física deve constituir-se numa ciência aplicada e autônoma, tendo o seu domínio próprio e os seus métodos específicos. Além disso, neste capítulo foram apresentados os princípios fundamentais que devem orientar a ação dos educadores: a) grau biológico do esforço; b) dosagem do esforço como adaptação às possibilida- des individuais; c) primado da preparação geral; d) importância das atividades ao ar livre; e) motivação do exercício; f) ação educativa do grupo e influência do meio social. O capítulo cinco fala da importância da formação do- cente e da valorização dos educadores, enaltecendo a ne- cessidade do desenvolvimento das qualidades essenciais 50 do pedagogo, da dedicação e do respeito aos valores humanos. Finalmente, aborda os meios, isto é, as condi- ções administrativas e materiais que devem envolver um processo de ensino de educação física. O Manifesto da Educação Física, além do aprofunda- mento conceituai nas questões da educaçãofísica, reconhe- ceu as relações deste campo educacional com o esporte, colocando três perspectivas nas quais abordou os aspectos positivos e negativos, contribuindo também para a elucida- ção da percepção do esporte na sociedade moderna, quando esse fenômeno já era entendido numa concepção mais alargada. O quinto documento de referência, emitido por orga- nismos internacionais, e de importância fundamental para o esporte e a educação física foi a Carta Internacional da Educação Física e do Esporte da UNESCO, editada em 1978. Essa Carta apresenta-se com dez artigos, e já no seu preâmbulo evidencia que foi formulada para favore- cer o desenvolvimento da educação física e do esporte a serviço do progresso humano e estimular os governos, as organizações não-governamentais, os educadores, as famí- lias e os próprios 'ndivíduos, a utilizá-la, difundindo-a e colocando-a em prática. No seu artigo primeiro, o direito à prática da educação física e dos esportes é reforçado. No seu artigo segundo, o documento reafirma que a edu- cação física e o esporte são elementos essenciais da edu- cação permanente. No artigo três é colocado que o progra- ma de educação física e esportes devem corresponder às necessidades dos indivídoos e da sociedade. O quarto artigo 51 aborda a questão da necessidade de qualificação dos recur- sos humanos para atuar no ensino e na administração dos assuntos da educação física e esportes. Os artigos quinto, sexto, sétimo e oitavo tratam respectivamente das ques- tões dos equipamentos e materiais, da pesquisa e avaliação, da informação e documentação e dos meios de comunica- ção de massa, quando nas suas relações com o processo de educação física e esportes. Depois, os artigos nono e dé- cimo valorizam a atuação das instituições nacionais e dos programas de cooperação internacional, como condições para o desenvolvimento universal e equilibrado da educa- ção física e do esporte. A carta da UNESCO para a Educação Física e Esporte foi resultante das recomendações da conferência de minis- tros e responsáveis de esporte, promovida pela UNESCO em 1976. Pode-se dizer que esta carta, além de constituir uma posição oficial da UNESCO, tem o mérito de rela- cionar a educação com os processos de educação física e esporte, através de uma referência com a educação per- manente. Acrescente-se que este documento consolidou a tendência internacional da ampliação do conceito de esporte, antes visto sornente sob a perspectiva da alta com- petição e agora refletindo também o fenômeno da parti- cipação. Referências Bibliográficas l. CLAYES, V. — A evolução do conceito do Desporto e o fe- nômeno da participação. Lisboa: Ministério da Educação e Cultura, Direção Geral dos Desportos, 1984. 52 2. Conseil Internationale d'Education Physwjue et Sport — Manifesto mundial do desporto: Autor, 1964. 3. Conselho da Europa — Carta Européia de Esporte para To- dos: Autor 1966. 4. COSTA FERREIRA, V. L. — Prática de Educação Física no 1." Grau. São Paulo: IBRASA, 1984. 5. Fédération Internationale d'Education Physique — Manifes- to Mundial de Educação Física: Autor, 1970. 6. UNESCO — Recomendações sobre Educação Física/Despor- tos aos Estados Membros da UNESCO: Autor, 1976. 7. UNESCO — Carta Internacional de Educação Física: Autor, 1978. 53 V - A Função Social do Esporte O homem é um ser delimitado por suas próprias dimensões e incapacidades físicas, por sua curva biológica, por sua capacidade psicológica e por suas limitações culturais e sociais. Quando tenta assumir sua realidade, ele na verda- de busca uma primeira garantia de liberdade humana. Mas eis que surge a sociedade na qual está envolvido, com sua problemática e historicidade, delimitando esse homem ainda mais. 55 A sociedade de hoje, ao receber várias demonstrações diferentes, como sociedade tecnológica, sociedade de mas- sa, sociedade pós-industrial, sociedade de rendimento, so- ciedade de consumo, sociedade cibernética, e outras adje- tivações, deixa na verdade algumas marcas, que podem ser aceitas em quaisquer dessas interpretações de socie- dade: a competitividade, a especialização, o rendimento, o consumo, a desumani/ação, a desescolarização, o tecnicis- mo, o mecanicismo, o sedentarismo, a internacionalização, e outras. O sedentarismo tem levado à chamada doença do sécu- lo: a hipocinestesia. Esse sintonia da sociedade moderna, ao levar os homens a uma perda da qualidade de vida, fez com que esse homem percebesse a valorização da vida. E foi na busca dessa valorização da vida que surgiu a necessidade de um aproveitamento mais adequado do ócio e do tempo livre de trabalho, surgindo, então, o esporte popular, que também recebe várias denominações, tais co- mo esporte-participação, esporte de tempo livre, esporte- lazer, esporte comunitário, esporte para todos, etc., o que, sem dúvida, aumentou consideravelmente a dimensão so- cial do esporte ao introduzir-se na abrangência do novo conceito de esporte. Nesse novo conceito, além do esporte institucionalizado, antes já assumido conceitualmente, incorpora-se agora o sentido da participação, relacionando a perspectiva de bem comum da população. O bem comum, que consiste no conjunto de meios de aperfeiçoamento que a sociedade politicamente organizada tem por fim oferecer aos homens, e que constitui patrimônio comum e reserva 56 da comunidade, passou a representar a finalidade maior desse renovado esporte de alcance social. E foi justamente este esporte, considerado como um dos maiores fenômenos sociais deste final de século XX, que provocou a impor- tante colocação de Cagigal (1979), segundo a qual, em- bora não se viva numa sociedade desportiva, pode-se afir- mar que se trata de uma sociedade esportivizada. Por sua vez, Cazorla Prieto (1979), ao afirmar a notável relevância social do esporte, mostra seis referên- cias para a localização dessa importância: a) a dupla perspectiva: como fenômeno social universal e como instrumento de equilíbrio pessoal; b) o consumismo esportivo; c) os espetáculos esportivos; d) os valores que o esporte leva à sociedade; e) o impacto social do associacionismo esportivo; f ) a difusão do esporte através dos meios de comuni- cação. Para Prieto, o esporte tem uma dupla perspectiva na análise de sua importância social: a) como fenômeno social universal; b) como instrumento de equilíbrio pessoal. Como fenômeno social universal, o esporte constitui-se de relações entre grupos sociais urbanos e até nacionais, contribuindo para a existência biológica, para as combina- ções de trabalho e vida e para enriquecer a cultura huma- na. O esporte tornou-se um fenômeno cultural e social 57 universal, que reflete objetivos econômicos, ideológicos, políticos, culturais, científicos e sociais. Por outro lado, numa sociedade que cada vez mais sub- traiu os direitos do homem, estabelecendo um processo de desumanização no mundo, a preocupação com o corpo e o lazer tornaram-se imperativos para enfrentar o dese- quilíbrio presente. O esporte, como instrumento de saúde e lazer, oferece ao homem reações importantes aos sinto- mas negativos da sociedade atual, levando-o inclusive a uma busca de reencontro com a natureza. Outro aspecto localizado por Cazorla Prieto é o fato de que uma das coisas que numa sociedade de consumo leva as pessoas a consumir é o esporte. Este consumismo é também impulsionado e influenciado pela sociedade desportivizada de hoje. O homem, ao envolver-se num consumismo, transmite-o a outras necessidades que em quadros circunstanciais diferentes talvez fossem prescin- díveis, mas que atualmente compõem inclusive o próprio estudo de vida daqueles que pertencem da classe média para cima. O esporte é, sem dúvida, uma das variáveis mais ponderáveis no estilo de vida atual. Quanto aos espetáculos esportivos, pode-se dizer que, segundo Prieto, eles manifestam a própria importância do esporte, tornando-se verdadeiros retratos da sociedade de massas, ao mesmo tempo que tambémservem de escapismo do homem moderno. O espetáculo esportivo, para este autor espanhol, exerce uma grande atração sobre a massa de cidadãos, suplantando de forma nítida a maioria dos outros tipos de espetáculo, inclusive, levando os especta- 58 dores a processos de identificação com os ídolos dos está- dios, conduzindo-os a emoções fortíssimas de sofrimento, síress, alegria, prazer, convivência, etc., podendo chegar até à violência. A imprensa, na sua atuação permanente de busca da notícia sensacionalista, contribui em muito para a conexão das pessoas com o fato esportivo, a qual propicia muitas vezes formas de liberação momentânea dos indivíduos. Quanto aos valores com que o esporte pode contribuir para a sociedade, Cazorla Prieto reconhece que o fenô- meno esportivo conduz os homens a inúmeras virtudes sociais, levando-os à convivência, à coesão e identifica- ção social, além de valorizar o tempo do ócio como tempo eminentemente pessoal. O esporte também é considerado uma atividade idônea, por Prieto, para esta ocupação do tempo livre de trabalho e ainda como meio de promoção social e comercial. Neste último aspecto, ele justifica este posicionamento pelos precedentes de mobilidade social de atletas profissionais pertencentes a estratos sociais mais modestos, pelo prestígio que os protagonistas esportivos alcançam, gerando novas oportunidades comerciais, em- bora reconheça a transitoriedade da situação, o estrelato esportivo efêmero e o fato de que somente alguns poucos têm mais chance nessa mobilidade social. Outro aspecto importante citado por Prieto (1979) é o impacto que o associacionismo esportivo provocou, re- cordando-se que Thomas Arnold, ao conduzir o esporte para uma modernização, concluiu que o mundo do es- porte é um microcosmo, uma miniatura da sociedade hu- 59 mana. Na verdade, o desenvolvimento e o ordenamento do desenvolvimento esportivo cabem às associações espor- tivas, sem prejuízos das competências dos poderes públi- cos a esse respeito. Finalmente, o último aspecto foi a difusão do esporte através dos meios de comunicação social. Para Cazorla Prieto, o esporte constitui o grande entretenimento do ócio passivo contemporâneo, pois, além da sua repercussão social, constitui um meio idôneo para inocular na socie- dade valores extra-esportivos. Referências Bibliográficas 1. CAGIGAL, J. M. — Cultura intelectual y cultura física. Buenos Aires: Kapelusz, 1979. 2. CAZORLA PRIETO, L. M. — Los poderes públicos ante ei deporte popular y ei deporte espetáculo. In Deporte Popular — Deporte de Elite — Elementos para Ia reflexión. Valencia: Ayuntamento de Valencia, 1984. 60 VI - Esporte, Estado e Sociedade A sociedade já era entendida desde o século passado como uma coletividade de indivíduos reunidos e organizados para alcançar uma finalidade comum (Giddings/1897). A partir dessa concepção de sociedade, para Azambuja (1984), o Estado constitui o próprio prolongamento dessa sociedade, tornando-se sociedade política, ordenada de forma política, acrescentada de modo necessário por um dinamismo movido através de uma relação legítima go- vernante-governado, tudo isso promovido e aceito em 61 nome do bem comum dessa sociedade. Assim sendo, o Estado (Azambuja/1984), como organização político-ju- rídica de uma sociedade constituída para realizar o bem público, com governo próprio e território determinado, aparece aos indivíduos e sociedades como um poder de mando, evidenciando um governo onde o aspecto coativo e a generalidade é o que o distingue nas normas por ele editadas. Os objetivos do Estado estarão permanentemen- te sintetizados no conceito de bem público e serão inva- riavelmente de ordem e defesa social, diferindo em con- teúdo de qualquer tipo de organização. E importante res- saltar que a oportunidade e o direito ao esporte consti- tuem-se efetivamente em bens públicos. Para propiciar à sociedade os bens públicos, o Estado emprega diversos me/ios, que variam conforme as >épocas, os povos, os cos- tumes e as culturas. O Estado interátua com a sociedade através de fatos políticos. As diversas correntes da teoria geral do Estado estudam os fenômenos ou fatos políticos como fatos so- ciais e não como fatos históricos. Para entender-se o sen- tido dos fatos políticos, é Azambuja quem ainda acres- centa que a utilização do termo político relaciona o fato ao Estado e ao Governo, fazendo parte dele através de uma relação numa justa medida. Desse modo, os fatos, mesmo mantendo a sua natureza, tornam-se políticos, toda vez que apresentarem interseções diretas com o Estado,, na abrangência do seu domínio e responsabilidade. Outro aspecto fundamental para o entendimento das relações entre Estado, Sociedade e Esporte é a necessária 62 interdependência entre Estado e Nação, a qual se torna essencial no aprofundamento da questão do esporte, prin- cipalmente quando é colocada na perspectiva de um Es- tado liberal desejável. A nação, entendida conceptualmen- te por Azambuja (1984) como distinta do Povo, é ex- plicada como um grupo de indivíduos unidos pela mesma origem, pelos interesses comuns e principalmente por ideais e aspirações comuns. Garcia-Pelayo (1977) justifica a ação do Estado na sociedade pela incapacidade das leis naturais para condu- zir a um equilíbrio social desejável, ao contrário levando sempre à irracionalidade. Para ele, somente o aprimora- mento de técnicas administrativas, econômicas, de pro- gramação de decisões, etc., pode neutralizar os efeitos disfuncionais de um desenvolvimento econômico e social não controlado. Garcia-Pelayo acrescenta que o Estado não pode limitar-se a assegurar as condições ambientais de uma suposta ordem parcial iminente, nem a vigiar os distúrbios de um mecanismo auto-regulado, devendo tor- nar-se o regulador decisivo do sistema social e apresentar disposições para o exercício de trabalho de estruturar a sociedade através de medidas diretas ou indiretas. Fors- thoff (1975) reforça as posições de Garcia-Pelayo ao mostrar que as funções do Estado estão confundidas com os processos sociais, não permitindo uma separação de Estado e sociedade. Por sua vez Cazorla Prieto (1984), ao fundamentar a relação Estado, Sociedade e Esporte parte das chama- das necessidades individuais. Entre essas necessidades en- 63 contram-se as atividades esportivas, que devem receber pelo menos condições mínimas, o que explica a presença do Estado como protagonista e o crescente papel dos po- deres públicos nas questões do esporte. Prieto propõe: a) os poderes públicos têm que apoiar tanto econômica como política e socialmente o esporte popular, como valor que deve ser colocado à disposição e com fa- cilidade a todos os cidadãos; b) a educação física, como instrumento a serviço da formação do homem e do desenvolvimento inte- gral da personalidade humana, é outra das mani- festações que integram com as atividades esporti- vas, e que devem ser protegidas por todos os pon- tos de vista, pelo Estado Contemporâneo; c) o esporte de alta competição, por não apresentar, em princípio, as mesmas virtudes que o esporte popular, deve ser considerado um instrumento in- direto de popularização do esporte, e por isto os poderes públicos devem protegê-lo. Ao mesmo tem- po, esse esporte de rendimento promove com fre- qüência as representações esportivas nacionais, o que impede que o Estado se desinteresse pelo seu desenvolvimento e aperfeiçoamento; d) o Estado deve abster-se da formulação de progra- mas de fomento do esporte-espetáculo, pela pers- pectiva inteiramente comercial do mesmo, devendo apenas acompanhá-lo nos seus aspectos éticos, mo- rais e políticos. 64 Para Noronha Feio (1978), à medida que os países se desenvolvem e as grandes massas alcançam progressi- vamente mais rendimento econômico per capita, humani- zam-se os horários de trabalho, dando aos cidadãos mais tempo livre, surgindo o esporte como um dos meios mais importantes de ocupação útil. Esse novo estilo de vida impõe, segundo aquele autor, a realizaçãode complexas estruturas materiais e a existência de quadros humanos preparados, justificando assim a intensificação da inter- venção do Estado neste novo âmbito do esporte, inclusive formulando uma política adequada para essa nova situa- ção. Feio ainda reconhece a importância dos educadores e suas preparações para que possam atuar com eficácia neste novo contexto. Outro aspecto ponderável é que o Estado cada vez mais se utiliza de seus recursos públicos para o investi- mento no esporte, facilitando o seu desenvolvimento. Este investimento estatal, sob diversas formas, desde o repasse direto até o estabelecimento de incentivos fiscais, torna a comunidade esportiva dependente da ideologia política ou do tipo de governo, condicionando a ação governamental. Cazorla Prieto (1979) colocou que o esporte não é exclusivamente um problema da sociedade, em que o Es- tado permaneça alheio. Ao contrário, cada vez é mais uma prestação que os poderes públicos facilitam a seus cidadãos. O Estado tem assumido uma cota crescente no financiamento do esporte, em consonância com o alto valor atribuído ao esporte na sociedade moderna. Nesta 65 perspectiva, este autor analisou a atuação do Estado em relação aos seguintes itens: a) o esporte como instrumento de saúde física e men- tal; b) o esporte-entretenimento, o esporte popular; c) o esporte-espetáculo e profissional; d) o esporte de alta competição; e) o esporte-educação ou educação física. No seu posicionamento quanto ao esporte como ins- trumento de saúde física e mental, após compreender que o sedentarismo e a inatividade física conduzidos pelo progresso urbano levam a uma sociedade hipocinética em que a proteção da saúde é a base essencial de todas as atividades do homem, que tem direito à garantia social de proteção da sua saúde, defende o esporte como a forma mais econômica da medicina social, o que já é inequivo^ çamente reconhecido. Assim, o esporte, como meio im- portante profilático e terapêutico para enfrentar o dese- quilíbrio físico do homem moderno, mesmo àqueles que ocupam na escala social um lugar modesto, passa a exigir do Estado uma proteção constante na sua adoção como um elemento a mais na sua política sanitária. Quanto ao esporte popular, chamado por Prieto tam- bém de esporte-entretenimento, foi considerado como uma das realidades sociais e humanas mais importantes da sociedade moderna. Mesmo considerado como diversão, o esporte tem a possibilidade de causar o reencontro com valores negados e prejudicados pelos obstáculos sociais 66 contemporâneos. Para esses incômodos do homem, o es- porte popular, na sua perspectiva de entretenimento e diversão, é um instrumento eficaz. Embora saindo das estruturas clássicas da organização esportiva, o esporte popular teve uma grande proliferação neste final de sé- culo, tornando-se uma nova possibilidade para as grandes multidões de pessoas desatendidas pelo elitismo do espor- te-performance. O papel do Estado na promoção social do esporte popular, segundo Cazorla Prieto, seria a cons- trução de instalações mínimas para a prática esportiva, deixando uma infraestrutura necessária que facilita, como disse Cagigal (1979), a nível popular e espontâneo. Desse modo, para esse autor, o Estado propiciaria meios para atender o povo, na sua grave necessidade de movimento^ jogo e canalização de frustrações em que se encontra o homem contemporâneo e de que o esporte espontâneo pode servir de meio de erradicação. No que diz respeito ao chamado esporte-espetáculo, profissional e/ou de alta competição, embora compreenda a necessidade de autofinanciamento, reconhecem-se as in* terseções de responsabilidade do Estado com as equipes nacionais. O campeão ou o recordista sempre pertencem a um país, e é justamente o nacionalismo que conduz o apelo popular até o Estado, no sentido do oferecimento de subvenções ao esporte de alto rendimento, para pre- miar o prestígio atingido com o esporte, ou propiciar meios de busca desse prestígio nacional através dos seus campeões e recordistas. A verdade é que os Estados, de um modo geral, têm sido sensíveis ao apelo popular do 67 esporte de alto nível. A justificativa do efeito-imitação do esporte de alto nível, repercutindo imediatamente na po- pularidade do esporte com a multiplicação do número de participantes, tem explicado a colocação, de um interesse nacional na ação do Estado em responsabilizar-se pelas deficiências do esporte de alto rendimento. Concluindo, a primeira Conferência Internacional de Ministros e Altos Funcionários responsáveis pela Educa- ção Física e Desportos, promovida pela UNESCO em 1976, considerou consenso entre a maioria dos Estados membros que a cultura física e particularmente os es- portes são elementos fundamentais para a Educação per- manente dos povos, transferindo para os governos toda a responsabilidade das estratégias políticas e das coorde- nações intragovernamentais. Referências Bibliográficas 1. AZAMBUJA, D. — Teoria Geral do Estado. Porto Alegre, 23." edição, 1984. 2. CAGIGAL, J. M. — Cultura intelectual y cultura física. Buenos Aires: Kapelusz, 1979. 3. CAZORLA PRIETO, L. M. — Deporte y estado. Madrid: Editorial Labor, 1979. 4. Los poderes públicos ante ei deporte popular y ei deporte espetáculo. In Deporte Popular — Deporte de Elite — Ele- mentos para Ia reflexión. Valencia: Ajuntamento de Valen- tia, 1984. 5. FEIO, N. — Desporto e política —- ensaios para sua com- preensão. Lisboa: Compendium, 1978. 68 6. FORSTHOFF, E. — Estado de Ia Sociedad industrial. Ma- drid: Instituto de Estudos Políticos, 1975. 7. GARCIA PELAYO, M. — Lãs transformaciones dei Estado contemporâneo. Madrid: Alianza Universidad, 1977. 8. GIDDINGS, F. H. — Principies de SocioZogie. Paris: Giard et Biére, 1897. 9. UNESCO. Carta Internacional de Educação Física: Autor, 1978. 69 VI - O Esporte Moderno e os Estados Contemporâneos Os registros, segundo Cazorla Prieto (1979), da primeira interferência efetiva do Estado com o fato esportivo foi no século XVIII, quando Maria Tereza, durante o cha- mado despotismo ilustrado, com o Ratio Educations, em 1790, introduziu na Hungria e Bohemia um controle pú- blico sobre a cultura física. Prieto também mostra que o esporte moderno, assim entendido após a concepção de Thomas Arnold no século 71 XIX, foi desde o início considerado como um valor social e privado, justamente por ter surgido num período histó- rico em que a sociedade recebia forte influência da na- turalidade, onde o naturalismo era uma das manifesta- ções nítidas do liberalismo. Então, o esporte, envolvido por uma naturalidade privada e regido por suas próprias regras, não admitia as interferências públicas. Desse modo, o esporte moderno, pode-se afirmar, surgiu na Inglaterra, com princípios de autogoverno, autodisciplinado, e com características de autonomia, sendo que muitos destes as- pectos permanecem até os dias atuais. Este quadro cir- cunstancial do esporte moderno nos seus primórdios jus- tifica-se também pela sua pouca solicitação econômica nesta primeira etapa liberal, podendo-se dizer que o es- porte constituía uma atividade social privada autofinan- ciada. Para Cazorla Prieto, nas regras da conjuntura li- beral da época, a coordenação econômica do esporte, prin- cipalmente pela reduzida dimensão financeira, permane- cia sob a responsabilidade das organizações sociais, na perspectiva liberalizante do equilíbrio natural. Até as construções dos estádios, nesse período, eram de respon- sabilidade da iniciativa privada, embora em períodos pos- teriores, quando passaram á exigir mais investimentos, ocorresse a colaboração financeira pública. Outra obser- vação importante que explica a ausência do Estado nos primeiros tempos do esporte institucionalizado era a pouca significação que apresentava. A partir dos anos trinta do século XX, quando surgi- ram os grandes agrupamentos esportivos, o autogoverno 72 que preponderava no esporte começou a ceder para uma maior participação do Estado. Foi neste períodoque o Estado sentiu necessidade de uma ordenação geral do es- porte, pelas implicações sociais, econômicas e políticas que começava a apresentar. Daí em diante, a atenção do Es- tado ao esporte passou a ser crescente, chegando em alguns casos até à incorporação estatal de todos os assuntos do esporte. O exemplo mais doloroso de incorporação do es- porte pelo Estado, contrariando as bases do associacionis- mo esportivo lançado na Inglaterra, foi o do regime nazi- fascista da Alemanha e Itália na década de trinta, quando fizeram do esporte um meio estratégico para as suas am- bições políticas, totalitárias e também para a tentativa de evidenciar uma suposta supremacia da raça ariana, através dos resultados dos Jogos Olímpicos de Berlim em 1936. Felizmente, o resultado da Segunda Guerra Mun- dial surgiu também para apagar esse mau uso do esporte pelos ditadores Hitler e Mussolini. No mundo atual, faz-se necessária uma análise dos Es- tados socialistas e capitalistas em relação ao esporte, para o entendimento desta relação Estado-Esporte na contem- poraneidade. Quanto aos Estados socialistas, é curioso, como disse Cazorla Prieto (1979), o fato de que logo após a revo- lução de 1917 os dirigentes soviéticos consideravam o esporte um passatempo eminentemente burguês, tentando, inclusive, erradicá-lo da prática na União Soviética. Mas, alguns anos depois, conforme explica Diem (1966), o esporte começou a reintegrar-se aos hábitos soviéticos 73 graças a seus valores educativos. Semaschko, o primeiro comissário soviético para a saúde pública, criou o termo Fizkultura, traduzido por Cultura Física, que não era utilizado pelos países capitalistas, passando as atividades esportivas a fazer parte dos objetivos e diretrizes do par- tido comunista. A seguir, a educação física esportiva so- viética teve um grande impulso, embora o esporte de alta competição permanecesse rejeitado. Assim, segundo Adam (1979), o esporte começou a incorporar-se no ideal revolucionário-marxista, através dos preceitos educacio- nais soviéticos. Na etapa seguinte, o esporte, na perspec- tiva socialista, foi todo revisto e, por uma formulação motivada pelo sentido agonístico contra o bloco ocidental, resultou no ingresso nas disputas esportivas internacio- nais, inclusive Olimpíadas, pelos países socialistas lide- rados pela União Soviética, com um suporte estatal vi- goroso. Verifica-se que o esporte dirigido pelo Estado nos países socialistas passou por um inevitável processo de politização, chegando a uma supremacia esportiva em resultados nas principais competições internacionais, con- vertendo-se este fato num instrumental de propaganda ideológica considerável. Quanto aos países capitalistas, o Estado tem presença efetiva principalmente nos vultosos investimentos, além das interferências eventuais no processo esportivo. Cazorla Prieto (1979) mostra que o investimento do Estado no esporte dos países capitalistas foi sempre crescente na Bélgica, Holanda, Alemanha Ocidental, Espanha e outros. Segundo Noronha Feio (1978), a progressiva expansão 74 da luta de interesses subjacentes ao fenômeno esportivo criou bases para um intervencionismo neutralizador de vocação estatal. Essa postura intervencionista nos países capitalistas tem-se exacerbado quando as questões políti- cas e ideológicas se fazem presentes, como foi o caso das Olimpíadas de Moscou, onde as nações do Ocidente boico- taram a competição por determinação dos seus governos, desertando da mesma. Recorde-se que os países socialistas, nos Jogos Olímpicos de Los Angeles em 1984 retribuíram esse boicote com uma nova ausência, também decidida pelos seus poderes estatais. Numa comparação entre a posição do Estado diante do esporte nos países socialistas e capitalistas, pode-se dizer que nos primeiros foi assumido como um instrumento re- volucionário com implicações internas e externas, enquan- to nos Estados ocidentais o esporte foi apoiado em alguns países mais e outros menos, na perspectiva do consumo para o chamado esporte de rendimento, e como questão de Estado, para o esporte popular, ou do tempo livre de tra- balho. No esporte de alto nível, um sintoma nítido desta diferença ocorre quando os Estados socialistas convertem seus atletas em funcionários, como servidores públicos diretos, enquanto os Estados capitalistas resolvem os problemas dos seus grandes atletas profissionalizando-os. Ao relacionar-se o esporte moderno com os Estados con- temporâneos, é relevante colocar-se que o homem da atua- lidade, ao ser alijado de seu contato com a natureza e outras necessidades de sua existência e, além disso, cons- ciente de que o esporte pode constituir um dos meios de 75 resgate dessa situação perdida, cada vez mais tem exigido dos governos uma ação neste sentido. Assim, o esporte como condução pessoal e atividade esportiva espontânea somente tem obtido as condições necessárias para a sua prática quando os Estados têm apresentado uma postura de respeito, apoio, intervenção e absorção ao esforço co- munitário. Por sua vez, Garcia Pelayo (1977) explica a atuação do Estado contemporâneo no esporte como conseqüência do complexo processo em que intervém fatores políticos, econômicos, sociais, técnicos, onde somente a ação estatal por muitas vezes consegue a possibilidade de desenvolvi- mento e de decisões que neutralizem os efeitos disfuncio- nais de um crescimento sócio-econômico incontrolável. A presença do Estado na sociedade atual está expressa através dos financiamentos, legislações ordinárias especí- ficas, existência de órgãos responsáveis pela formulação e execução de uma política esportiva e da normalização das questões relativas ao esporte e até com a introdução nas constituições das aspirações esportivas das sociedades, como foram os casos da República Democrática Alemã (1968), Bulgária (1971), Grécia (1975), China (1975), Cuba (1976), Portugal (1976), Albânia (1976), União Soviética (1977) e outros. Como conclusão dessa revisão sobre a relação entre os Estados contemporâneos e o esporte, chega-se à convicção de que o esporte deve ser uma questão de Estado, respei- tadas as circunstâncias políticas, as distinções culturais e demais fatores que diferenciam as diversas sociedades 76 atuais. No caso das sociedades ocidentais, baseadas em princípios liberais, o associacionismo tem preponderado sobre um papel de apoio e normativo do Estado no esporte de alta competição e, ao contrário, uma ação efetiva no chamado esporte popular. Entretanto, no chamado Ter- ceiro Mundo, inclusive no Brasil, mesmo o esporte de rendimento nasceu equivocadamente sob a égide da res- ponsabilidade e tutela do Estado. Referências Bibliográficas 1. ADAM, Y. — Lê Sport dans Ia vie dês Sovietiques. Moscou: Editions du Progrés, 1979. 2. CAZORLA PRIETO, L. M. — Deporte y Estado. Madrid: Editorial Labor, 1979. 3. DIEM, C. — História de los Deportes. Barcelona: Luís de Coralt, 1966. 4. GARCIA-PELAYO, M. — Lãs transformacion.es dei Estado contemporâneo. Madrid: Alianza Universidad, 1977. 77 BIBLIOTECA "DIDÁTICA" Volumes Publicados: 1. Contabilidade de Custos 2. Curso de Secretariado Moderno: (Datilografia, Taquigrafia, Caligrafia) 3. Curso de Secretariado Moderno: (Comunicação e Correspondência) 4. Física — 2.° Grau — dos Experimentos à Teoria 5. Aulas de Educação Física — L? Grau 6. Matemática 1." Grau — 5." Série 1. Matemática 1." Grau — 6." Série 8. Matemática 1.° Grau — 7." Série 9. Matemática 1." Grau — 8.a Série 10. Test Your English 11. A Arte de Estudar 12. Saúde na Escola — 1." Grau (Livro do Professor) 13. Saúde na Escola — 1." Grau . (Manual do Professor) 14. Metodologia Científica no Treinamento Desportivo 15. As Qualidades Físicas na Educação Física e Desportos 16. Teoria Organizacional da Educação Física e Desportos Lawrensce e Ruswinckel Luiza Chaibub Luiza Chaibub Darcio P. Santos Hudson V. Teixeira e M. C. 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