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AVALIAÇÃO FINAL INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA REFLEXÕES SOCIOLÓGICAS CONCERNENTES AO ESTADO PANDÊMICO Em março de 2020 o mundo entra em crise com a declaração da OMS: a disseminação do novo Coronavírus SARS–CoV-2 se tornava uma pandemia. A COVID 19 - doença causada pelo vírus - não se tratava mais de uma questão local, mas atingia uma escala global. O vírus se espalhava por mais de 200 países, com transmissão sustentada de pessoa para pessoa. Para impedir o avanço da doença uma nova realidade se cria: isolamento social acompanhado de medidas sanitárias protetivas. Esse estado de emergência que por algum tempo gerou terror na vida de muitas pessoas, hoje se torna o “novo normal” e pode ser avaliada sob a perspectiva de dois importantes sociólogos: Ulrich Beck e Emile Durkheim. Beck, sociólogo alemão, considerado como um “anunciador de catástrofes”, pode ser considerado por sua principal teoria - A Sociedade de Risco - um dos grandes analistas da transição da era Moderna para a Pós-Moderna. A grande promessa trazida pela Modernidade era de que os homens esclarecidos estariam no controle da natureza - pela confiança extrema na ciência e tecnologia. Havia, por meio da cientificidade, uma esperança de controle e previsibilidade, porém, a forma como o ser humano se utilizou disso na verdade gerou retrocesso. Assim, o autor afirma a ideia de que a tecnologia traz avanços, mas com esses avanços também se multiplicam os riscos. Para Beck, os riscos não são uma invenção moderna. Desde sempre convivemos com riscos, mesmo que no passado a sociedade tradicional - a qual era marcada pela normalidade e estabilidade - esses riscos fossem ligados a questões naturais como desastres e pragas. A questão é que com o desenvolvimento da ciência não só fracassamos em controlar a natureza como criamos novos riscos trazidos pela ciência antes inimagináveis (poluição, desastres nucleares, armas de destruição em massa, entre outros). Assim, um novo tecido social se desenvolve: a Sociedade do Risco - uma organização em relação aos riscos, que são constantes e muitas vezes imperceptíveis. Logo, precisamos estar em constante vigilância, e a ciência precisa se reinventar. Um fato importante para o sociólogo que reforça essa ideia é a questão do individualismo - sujeito como elemento central das ações do mundo -, mas que ignora o coletivo. Antigamente os riscos assumidos eram somente individuais, hoje, perde-se a lógica dos riscos de Estado/Nação para uma influência global, como cita o próprio autor: “A palavra risco, tinha naquela época, um tom de ousadia e aventura, e não o da possível autodestruição da vida na Terra” (Sociedade de risco: rumo a outra modernidade. Pág. 25). Desse modo, fica evidentemente clara uma relação dos riscos com a pandemia. O que foi amplamente visto - pelo menos em território brasileiro - foi, por parte de muitos cidadãos, a aquisição de uma postura individualista em negação aos cuidados sanitários necessários, como o distanciamento social. Poucos meses após o ápice da pandemia já era possível encontrar bailes, bares e festas - mesmo que clandestinos - lotados de pessoas que afirmavam a sua “escolha individual”, sem considerar que os riscos assumidos jamais foram individuais, mas sim coletivos. Nesse sentido, é importante frisar que nessa sociedade a dispersão de riscos se daria de forma igualitária. Por essa análise, vimos que o Coronavírus não fez distinção entre pessoas, todos foram “igualmente” afetados. Entretanto, é de muitíssima importância salientar que os impactos da pandemia não foram iguais para todos. A condição socioeconômica dos indivíduos ainda continua sendo um fator determinante - talvez não para impedir a morte -, mas para enfrentar os impactos da doença. A economia estagnou, milhares de pessoas se recolheram às suas casas, mas obviamente nem todos puderam se submeter a essa situação por um único motivo: vulnerabilidade econômica. Por isso, é necessário não ignorar o fato de que, lamentavelmente, muitas pessoas, forçadas por sua condição, tiveram que colocar em risco suas vidas e de suas famílias para se sustentarem. O sociólogo também aponta que apesar da evolução dos métodos técnicos e científicos, que prometeriam certa segurança, existe a falta de previsibilidade dos riscos. Assim, situações inimagináveis como a pandemia se encontram nessa caracterização. Seria possível imaginar que de locais remotos, como uma vila tradicional, poderia se originar um vírus que começaria uma tragédia de proporção global e que pararia a economia? Outra característica a se analisar é o prosseguimento da vida pós-crise. No caso da pandemia, é de conhecimento geral que em algum momento ela vai cessar, porém a forma de vida muito dificilmente retornará ao que era antes. A sociedade teve que se reinventar, o que antes jamais seria imaginado, agora se torna parte de um “novo normal”. É por isso que Beck anuncia: “A sociedade de risco é uma sociedade catastrófica. Nela, o estado de exceção ameaça converter-se em normalidade” (Sociedade do Risco: rumo a outra modernidade. Pág.28). Para compreender melhor toda essa situação recorreremos ao clássico pensamento de Émile Durkheim. Para o sociólogo francês, a sociedade funcionaria com base no conceito de solidariedade - quase como uma espécie de “consciência coletiva”. Essa solidariedade orgânica, a qual tem suas bases na Divisão do Trabalho, é a “cola” que mantém a coesão da sociedade, onde os indivíduos estão em situação de dependência mútua. No entanto, perturbações nessa solidariedade, como a pandemia, influenciam diretamente a sociedade causando um estado Anômico - onde haveria a ausência de regras sociais e morais que serviriam de guia. Esse estado de anomia, é um período de profundas transformações no modo como a sociedade se organiza. Se a solidariedade tradicional é abalada, a sociedade procuraria por outras “formas de coesão” - o que não aconteceu de forma efetiva no Brasil, visto que esse período ao invés de gerar no corpo social proteção e amparo mútuo só serviu para acentuar uma velha questão presente em nosso país: a polarização política. De forma angustiante, vemos os cidadãos se atracarem por defenderem diferentes ideologias, ao invés de procurarem um ponto comum: prestarem auxílio aos necessitados. Durkheim também afirma outro ponto importante: a questão do suicídio. O ser humano é um ser relacional, que não depende só de si, mas essencialmente dos outros indivíduos para sobreviver. O ser, então, estaria submetido a um freio social/moral, um mecanismo regulador da vida, e quando a sociedade não o pode exercer a propensão ao suicídio aumenta. Na perspectiva da pandemia, a coesão social diminuiu e o isolamento social reforçou uma tendência há muito prevista por Zygmunt Bauman: uma modernidade líquida. A era da informação, a qual prometia encurtar distâncias e promover encontros, na verdade enfatiza cada vez mais o contrário: as pessoas se afastaram e se tornaram por demasiado ansiosas, a urgência pela velocidade rouba cada vez mais a atenção, fazendo com que não tenhamos paciência para uma conversa olho a olho ou tolerância para ouvir opiniões contrárias às nossas. A pós- modernidade tem roubado dos indivíduos uma característica fundamental para a manutenção da vida: a sensibilidade ao próximo. Assim, as pessoas vão se perdendo em si mesmas e se desligando da realidade. Para concluir, vale enfatizar que Ulrich Beck nos deixou o grande aviso de que mesmo com o desenvolvimento da ciência não estamos no controle, que devemos estar alertas preparados para enfrentar os riscos tradicionais e os novos - jamais imaginados, proporcionados pela tecnologia, mas com uma causa muito bem conhecida: o homem.
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