Buscar

57 - Contribuições do Cerebelo e dos Núcleos da Base para o Controle Motor (Guyton - Word)

Prévia do material em texto

@felipelessaa
Capítulo 57 - Contribuições do Cerebelo e dos Núcleos da Base para o Controle Motor
Além das áreas do córtex cerebral que estimulam a contração muscular, duas outras estruturas cerebrais são essenciais para a função motora normal – o cerebelo e os núcleos da base. Nenhuma delas pode controlar a função muscular por si só. Em vez disso, sempre funcionam em associação com outros sistemas de controle motor. 
	O cerebelo desempenha um papel importante na sincronização das atividades motoras e na progressão rápida e suave de um movimento muscular para o seguinte. Também ajuda a regular a intensidade da contração do músculo quando a carga muscular se altera e controla a inter-relação instantânea necessária entre os grupos musculares agonistas e antagonistas. 
Os núcleos da base ajudam a planejar e a controlar padrões complexos de movimento muscular. Eles regulam intensidades relativas de movimentos distintos, direções de movimentos e sequenciamento de múltiplos movimentos sucessivos e paralelos para alcançar objetivos motores complexos específicos. Este capítulo explica as funções básicas do cerebelo e dos núcleos da base, além de discutir os mecanismos gerais do cérebro para conseguir a coordenação intrincada da atividade motora total. 
CEREBELO E SUAS FUNÇÕES MOTORAS
O cerebelo, ilustrado nas Figuras 57.1 e 57.2, há muito é chamado de área silenciosa do cérebro, principalmente porque sua excitação elétrica não causa nenhuma sensação consciente e por serem raras as vezes em que ele causa qualquer movimento motor. A remoção do cerebelo, entretanto, faz com que os movimentos do corpo se tornem muito anormais. O cerebelo é especialmente vital durante atividades musculares rápidas, como correr, digitar, tocar piano e até conversar. A perda dessa área do cérebro pode provocar a falta quase total de coordenação de tais atividades, embora sua perda não cause paralisia de nenhum músculo. 
	Como o cerebelo pode ser tão importante se não tem capacidade direta de causar contração muscular? A resposta é que ele ajuda a sequenciar e a monitorar as atividades motoras, além de fazer ajustes corretivos nelas enquanto estão sendo executadas para que fiquem de acordo com os sinais motores enviados pelo córtex motor cerebral e por outras partes do cérebro. 
	O cerebelo recebe continuamente não só informações atualizadas (provenientes das áreas de controle motor do cérebro acerca da sequência desejada de contrações musculares), mas também informações sensoriais das partes periféricas do corpo, atualizando sobre as mudanças sequenciais do estado de cada parte do corpo – sua posição, velocidade de movimento, as forças que atuam sobre ela, e assim por diante. O cerebelo, então, compara os movimentos reais (como foram retratados pela informação de retroalimentação sensorial periférica) com os movimentos pretendidos pelo sistema motor. Se houver discrepância entre as duas informações, os sinais corretivos subconscientes instantâneos são transmitidos de volta ao sistema motor para aumentar ou diminuir os níveis de ativação de músculos específicos. 
O cerebelo também auxilia o córtex cerebral a planejar o próximo movimento sequencial com uma fração de segundo de antecedência, enquanto o movimento atual ainda está sendo executado, ajudando, assim, a pessoa a progredir suavemente de um movimento para o outro. Além disso, aprende com seus erros. Se um movimento não ocorre exatamente como pretendido, o circuito cerebelar é capaz de fazer um movimento mais forte ou mais fraco na próxima vez. Para fazer esse ajuste, ocorrem alterações na excitabilidade dos neurônios cerebelares apropriados, possibilitando, assim, que as contrações musculares subsequentes correspondam melhor aos movimentos pretendidos. 
Áreas anatômicas e funcionais do cerebelo
Anatomicamente, o cerebelo é dividido em três lobos por duas fissuras profundas, como mostrado nas Figuras 57.1 e 57.2: (1) o lobo anterior; (2) o lobo posterior; e (3) o lobo floculonodular. Este último é a porção mais antiga do cerebelo, a qual se desenvolveu junto com o aparelho vestibular e com ele atua no controle do equilíbrio corporal, como discutido no Capítulo 56. 
Figura 57.1 Lobos anatômicos do cerebelo observados pela vista lateral. (esquerda) Figura 57.2 Partes funcionais do cerebelo observadas da vista posteroinferior, com a porção mais inferior do cerebelo rebatida para fora a fim de nivelar a superfície. (direita)q
Divisões funcionais dos lobos anterior e posterior. Do ponto de vista funcional, os lobos anterior e posterior são organizados não por lobos, mas ao longo do eixo longitudinal, conforme demonstrado na Figura 57.2, que apresenta uma vista posterior do cerebelo humano após a extremidade inferior do cerebelo posterior ter sido rebatida de sua posição normalmente oculta. Observe, abaixo do centro do cerebelo, uma faixa estreita chamada vermis, separada do restante do cerebelo por sulcos rasos. A maioria das funções de controle cerebelar para movimentos musculares do esqueleto axial, pescoço, ombros e quadris está localizada nessa área. Em cada lado do vermis, há um grande hemisfério cerebelar lateralmente protuberante; cada um desses hemisférios é dividido em uma zona intermediária e uma zona lateral. A zona intermediária do hemisfério está relacionada ao controle das contrações musculares nas porções distais dos membros superiores e inferiores, especialmente mãos, pés e seus respectivos dedos. A zona lateral do hemisfério opera em um nível muito mais remoto, porque essa área se une ao córtex cerebral no planejamento geral dos movimentos motores sequenciais. Sem ela, a maioria das atividades motoras discretas do corpo perde o ritmo e a sequência apropriados e, portanto, torna-se descoordenada, como será discutido mais detalhadamente adiante, ainda neste capítulo. 
Representação topográfica do corpo no vermis e nas zonas intermediárias. Da mesma maneira que o córtex sensorial cerebral, o córtex motor, os núcleos da base, os núcleos rubros e a formação reticular têm representações topográficas das diferentes partes do corpo, o vermis e as zonas intermediárias do cerebelo também dispõem desse tipo de representação. A Figura 57.3 mostra duas dessas representações. Observe que as porções axiais do corpo ficam na parte do vermis do cerebelo, enquanto os membros e as regiões faciais se situam nas zonas intermediárias. Essas representações topográficas recebem sinais nervosos aferentes de todas as respectivas partes do corpo, bem como de áreas motoras topograficamente correspondentes no córtex cerebral e no tronco encefálico. Por sua vez, essas áreas enviam sinais motores de volta às mesmas respectivas áreas topográficas do córtex motor cerebral, bem como às áreas topográficas do núcleo rubro e da formação reticular no tronco encefálico. 
	Observe que as grandes porções laterais dos hemisférios cerebelares não têm representações topográficas do corpo. Essas áreas do cerebelo recebem sinais aferentes quase exclusivamente do córtex cerebral, sobretudo das áreas pré-motoras do córtex frontal, da área somatossensorial e de outras áreas de associação sensorial do córtex parietal. Essa conectividade com o córtex cerebral possibilita às porções laterais dos hemisférios cerebelares desempenhar papéis importantes no planejamento e na coordenação das atividades musculares sequenciais rápidas do corpo, que ocorrem uma após a outra em frações de segundo. 
Circuitos neurais do cerebelo
O córtex cerebelar humano é, na verdade, uma grande folha dobrada, com cerca de 17 centímetros de largura por 120 centímetros de comprimento, com as dobras transversais, como mostrado nas Figuras 57.2 e 57.3. Cada dobra é chamada de fólio. Os núcleos cerebelares profundos ficam situados muito abaixo da massa dobrada do córtex cerebelar. Vias aferentes cerebelares.
Figura 57.3 Áreas de projeção somatossensorial no córtex cerebelar. 
Vias aferentes de outras partes do cérebro. As vias básicas de aferência para o cerebelo são mostradas na Figura 57.4. Uma extensa e importante via aferente é acorticopontocerebelar, que se origina nos córtices motor e pré-motor cerebrais e também no córtex somatossensorial cerebral. Ela passa pelos núcleos pontinos e pelos tratos pontocerebelares, principalmente para as divisões laterais dos hemisférios cerebelares contralaterais vindo das áreas cerebrais. 
Além disso, importantes tratos aferentes originam-se em cada lado do tronco encefálico. Esses tratos incluem: (1) um extenso trato olivocerebelar, que passa da oliva inferior para todas as partes do cerebelo e é excitado na oliva por fibras do córtex motor cerebral, núcleos da base, áreas extensas da formação reticular e pela medula espinhal; (2) fibras vestibulocerebelares, algumas das quais se formam no próprio aparelho vestibular e outras nos núcleos vestibulares do tronco encefálico, sendo que quase todas essas fibras terminam no lobo floculonodular e no núcleo fastigial do cerebelo; e (3) fibras reticulocerebelares, que se originam em diferentes porções da formação reticular do tronco encefálico e se encerram nas áreas cerebelares da linha média (principalmente no vermis). 
Figura 57.4 Principais tratos aferentes para o cerebelo. 
Vias aferentes da periferia. O cerebelo também recebe sinais sensoriais importantes diretamente das partes periféricas do corpo, em especial, por meio de quatro tratos de cada lado, dois dos quais localizados dorsalmente na medula e dois na parte ventral. Desses, os dois mais importantes estão mostrados na Figura 57.5, o trato espinocerebelar dorsal e o trato espinocerebelar ventral. O trato dorsal entra no cerebelo através do pedúnculo cerebelar inferior e termina no vermis e nas zonas intermediárias do cerebelo no mesmo lado de sua origem. O trato ventral entra no cerebelo pelo pedúnculo cerebelar superior, mas encerra-se em ambos os lados do cerebelo. Os sinais transmitidos nos tratos espinocerebelares dorsais vêm principalmente dos fusos musculares e, em menor extensão, de outros receptores somáticos por todo o corpo, como órgãos tendinosos de Golgi, grandes receptores táteis da pele e receptores articulares. Todos esses sinais informam o cerebelo sobre o estado momentâneo (1) da contração muscular, (2) do grau de tensão nos tendões musculares, (3) das posições e velocidades de movimento das partes do corpo, e (4) das forças que estão agindo sobre as superfícies do corpo. 
Figura 57.5 Tratos espinocerebelares. 
Os tratos espinocerebelares ventrais recebem muito menos informações dos receptores periféricos. Em vez disso, eles são excitados principalmente por sinais motores que chegam nos cornos anteriores da medula espinhal provenientes (1) do cérebro através dos tratos corticoespinhal e rubroespinhal, bem como (2) dos geradores de padrão motor interno na própria medula. Assim, essa via ventral de fibras informa ao cerebelo quais sinais motores chegaram aos cornos anteriores; essa informação por retroalimentação é chamada de cópia eferente do comando motor do corno anterior. 
As vias espinocerebelares podem transmitir impulsos a velocidades de até 120 m/s, a condução mais rápida em qualquer via do sistema nervoso central. Essa velocidade é importante para o cerebelo avaliar instantaneamente as alterações nas ações dos músculos periféricos. Além dos sinais dos tratos espinocerebelares, os sinais são transmitidos para o cerebelo a partir da periferia do corpo através das colunas dorsais espinhais para os núcleos da coluna dorsal da medula, sendo, então, retransmitidos para o cerebelo. Da mesma maneira, os sinais são transmitidos pela medula espinhal através tanto da via espinorreticular (para a formação reticular do tronco encefálico) como da via espino-olivar (para o núcleo olivar inferior). Os sinais são, então, retransmitidos de ambas as áreas para o cerebelo. Desse modo, o cerebelo continuamente coleta informações sobre os movimentos e as posições de todas as partes do corpo, ainda que esteja operando em um nível subconsciente. 
Figura 57.6 Principais tratos eferentes cerebelares. 
Vias eferentes cerebelares
Núcleos cerebelares profundos e vias eferentes. Localizados profundamente na massa cerebelar, em cada lado, estão três núcleos cerebelares profundos – o denteado, o interpósito e o fastigial. (Os núcleos vestibulares na medula também funcionam, em alguns aspectos, como se fossem núcleos cerebelares profundos por causa de suas conexões diretas com o córtex do lobo oculonodular.) Todos os núcleos cerebelares profundos recebem sinais de duas fontes: (1) o córtex cerebelar; e (2) os tratos aferentes sensoriais profundos para o cerebelo. Cada vez que um sinal aferente chega ao cerebelo, ele se divide e segue em duas direções: (1) diretamente para um dos núcleos profundos do cerebelo; e (2) para uma área correspondente do córtex cerebelar que recobre o núcleo profundo. Então, uma fração de segundo depois, o córtex cerebelar retransmite um sinal eferente inibitório para o núcleo profundo. Assim, todos os sinais aferentes que entram no cerebelo terminam, por m, nos núcleos profundos como sinais excitatórios iniciais, seguidos, uma fração de segundo depois, por sinais inibitórios. Dos núcleos profundos, os sinais eferentes deixam o cerebelo e são distribuídos para outras partes do cérebro. 
Figura 57.7 Células nucleares profundas recebem estímulos excitatórios e inibitórios. O lado esquerdo desta figura mostra o circuito neuronal básico do cerebelo, com neurônios excitatórios, indicados em vermelho, e a célula de Purkinje (um neurônio inibitório), em preto. À direita, demonstra-se a relação física dos núcleos cerebelares profundos com o córtex cerebelar e suas três camadas. 
O plano geral das principais vias eferentes que saem do cerebelo é mostrado na Figura 57.6 e consiste nas seguintes vias: 
1. Uma via que se origina nas estruturas medianas do cerebelo (o vermis) e, em seguida, passa pelos núcleos fastigiais para as regiões medulares e pontina do tronco encefálico. Esse circuito funciona em estreita associação com o aparelho de equilíbrio e os núcleos vestibulares do tronco encefálico, a m de controlar o equilíbrio, bem como em associação com a formação reticular do tronco encefálico para controlar as atitudes posturais do corpo. O Capítulo 56 discute mais detalhadamente essa questão referente a equilíbrio. 
2. Uma via que se origina (1) na zona intermediária do hemisfério cerebelar, passa através (2) do núcleo interpósito para (3) os núcleos ventral lateral e ventral anterior do tálamo e, em seguida, para (4) o córtex cerebral, em direção a (5) várias estruturas da linha média do tálamo; depois, segue para (6) os núcleos da base e para (7) o núcleo rubro e a formação reticular da porção superior do tronco encefálico. Esse circuito complexo ajuda principalmente a coordenar as contrações recíprocas dos músculos agonistas e antagonistas nas porções periféricas das extremidades, em especial, mãos e dedos. 
3. Uma via que começa no córtex cerebelar da zona lateral do hemisfério cerebelar, passa para o núcleo denteado, seguindo para os núcleos ventral lateral e ventral anterior do tálamo e, por fim, para o córtex cerebral. Essa via desempenha um papel importante em ajudar a coordenar atividades motoras sequenciais iniciadas pelo córtex cerebral. 
UNIDADE FUNCIONAL DO CÓRTEX CEREBELAR: CÉLULAS DE PURKINJE E CÉLULAS NUCLEARES PROFUNDAS
O cerebelo tem cerca de 30 milhões de unidades funcionais quase idênticas, uma das quais é mostrada à esquerda na Figura 57.7. Essa unidade funcional está centrada em uma única célula de Purkinje muito grande e em uma célula nuclear profunda correspondente. 
	Na parte superior e à direita na Figura 57.7, são mostradas as três camadas principais do córtex cerebelar: a camada molecular, a camada de células de Purkinje e a camada de células granulosas. Sob essas camadas corticais, no centro da massa cerebelar, estão os núcleos cerebelares profundos que enviam sinais de saída para outras partes do sistema nervoso. 
Circuitaria da unidade funcional do córtex cerebelar. Também mostrado na metade esquerda da Figura 57.7 está o circuito neuronalda unidade funcional, que se repete com pouca variação 30 milhões de vezes no cerebelo. A saída da unidade funcional dá-se por uma célula nuclear profunda, a qual está continuamente sob influências tanto excitatórias quanto inibitórias. As influências excitatórias originam-se de conexões diretas com fibras aferentes que entram no cerebelo a partir do cérebro ou da periferia; a influência inibitória é constituída unicamente pelas células de Purkinje, no córtex do cerebelo. As entradas aferentes para o cerebelo são principalmente de dois tipos: fibra trepadeira e fibra musgosa. Todas as fibras trepadeiras se originam das olivas inferiores no bulbo. Existe uma fibra trepadeira para cerca de 5 a 10 células de Purkinje. Depois de enviar ramos para várias células nucleares profundas, a fibra trepadeira continua por todo o trajeto até as camadas externas do córtex cerebelar, onde faz cerca de 300 sinapses com o corpo celular e os dendritos de cada célula de Purkinje. Essa fibra trepadeira se distingue pelo fato de que, a partir de um único impulso, ela sempre causará um tipo único de potencial de ação, prolongado (até 1 segundo) e peculiar, em cada célula de Purkinje com a qual se conecta, começando com um intenso pico e seguido por uma série de picos secundários progressivamente mais fracos. Esse potencial de ação é chamado de potencial complexo em picos. 
	As fibras musgosas são todas as outras fibras que entram no cerebelo, tendo origem em múltiplas fontes – o prosencéfalo, o tronco encefálico e a medula espinhal. Essas fibras também enviam colaterais para excitar as células nucleares profundas. Elas, então, prosseguem para a camada de células granulosas do córtex, onde também fazem sinapses com centenas a milhares de células granulosas. Por sua vez, as células granulosas enviam axônios extremamente delgados, com menos de 1 micrômetro de diâmetro, até a camada molecular, na superfície externa do córtex cerebelar. Nesse ponto, os axônios dividem-se em dois ramos que se estendem por 1 a 2 milímetros em cada direção, paralelamente aos fólios. Existem muitos milhões dessas fibras nervosas paralelas, porque há cerca de 500 a 1.000 células granulosas para cada célula de Purkinje. É para essa camada molecular que se projetam os dendritos das células de Purkinje, e com cada uma destas fazem sinapse 80.000 a 200.000 fibras paralelas. A aferência da fibra musgosa para a célula de Purkinje é bastante diferente da aferência da fibra trepadeira, pois as conexões sinápticas são fracas, de modo que um grande número de fibras musgosas precisa ser estimulado simultaneamente para que se excite a célula de Purkinje. Além disso, a ativação costuma assumir a forma de um potencial de ação da célula de Purkinje muito mais fraco e de curta duração, chamado de potencial simples em pico, em vez de um potencial de ação complexo e prolongado causado pela aferência da fibra trepadeira. 
As células de Purkinje e as células nucleares profundas disparam continuamente em condições normais de repouso. Uma característica das células de Purkinje e das células nucleares profundas é que ambas costumam disparar de maneira contínua; a célula de Purkinje dispara cerca de 50 a 100 potenciais de ação por segundo, e as células nucleares profundas o fazem em taxas muito mais altas. Além disso, a atividade eferente de ambas as células pode ser modulada positiva e negativamente. 
Balanço entre excitação e inibição nos núcleos cerebelares profundos. Ainda sobre o circuito da Figura 57.7, observe que a estimulação direta das células nucleares profundas, tanto pelas fibras trepadeiras quanto pelas musgosas, ocasiona sua excitação. Em contrapartida, os sinais que chegam das células de Purkinje as inibem. Em geral, o balanço entre esses dois efeitos é ligeiramente favorável à excitação, de modo que, em condições de repouso, a eferência da célula nuclear profunda permanece relativamente constante em um nível moderado de estimulação contínua. 
	Na execução de um movimento motor rápido, o sinal inicial do córtex motor cerebral ou do tronco encefálico aumenta muito, a princípio, a excitação das células nucleares profundas. Então, alguns milissegundos depois, chegam sinais inibitórios de retroalimentação provenientes do circuito da célula de Purkinje. Dessa maneira, primeiro ocorre um sinal excitatório rápido, enviado pelas células nucleares profundas para a via eferente motora, a fim de aumentar o movimento motor, seguido de um sinal inibitório, após outra pequena fração de segundo. Esse sinal inibitório se assemelha a um sinal de retroalimentação negativa de “circuito de retardo” do tipo eficaz em produzir amortecimento. Isso significa que, quando o sistema motor está excitado, ocorre um sinal de retroalimentação negativa após um curto retardo para impedir que o movimento do músculo ultrapasse sua dimensão pretendida. Caso contrário, ocorreria oscilação do movimento. 
Células em cesto e células estreladas causam inibição lateral das células de Purkinje no cerebelo. Além das células nucleares profundas, das células granulosas e das células de Purkinje, dois outros tipos de neurônios estão localizados no cerebelo – as células em cesto e as células estreladas, que são células inibitórias com axônios curtos. Ambos os tipos estão localizados na camada molecular do córtex cerebelar, situados entre pequenas fibras paralelas que os estimulam. Essas células, por sua vez, enviam seus axônios em ângulos retos através das fibras paralelas e causam inibição lateral das células de Purkinje adjacentes, focalizando, assim, o sinal, da mesma maneira que a inibição lateral aumenta o contraste dos sinais em muitos outros circuitos neuronais do sistema nervoso. 
Sinais eferentes do tipo liga/desliga e desliga/liga do cerebelo 
A função típica do cerebelo é ajudar a fornecer sinais de ativação rápidos para os músculos agonistas e sinais de desativação recíprocos e simultâneos para os músculos antagonistas no início de um movimento. Então, quando um movimento se aproxima de seu término, o cerebelo é o principal responsável pelo ritmo e pela execução dos sinais de desligar para os agonistas e os sinais de ligar para os antagonistas. Embora os detalhes exatos não sejam totalmente conhecidos, pode-se especular a partir do circuito cerebelar básico da Figura 57.7 como é possível esse processo funcionar, conforme descrito a seguir. 
	Suponhamos que o padrão liga/desliga da contração agonista/antagonista, no início do movimento, comece com sinais do córtex cerebral. Esses sinais passam por vias não cerebelares do tronco encefálico e da medula espinhal diretamente para o músculo agonista a fim de começar a contração inicial. 
	Ao mesmo tempo, sinais paralelos são enviados por meio das fibras musgosas, da ponte para o cerebelo. Um ramo de cada fibra musgosa vai direto para as células nucleares profundas (no núcleo denteado ou em outros núcleos cerebelares profundos), que, instantaneamente, enviam um sinal excitatório de volta ao sistema motor corticoespinhal cerebral, seja por meio de sinais de retorno através do tálamo para o córtex cerebral, seja por meio de circuito neuronal no tronco encefálico, a fim de sustentar o sinal de contração muscular que já havia sido iniciado pelo córtex cerebral. Como consequência, o sinal de ativação, após alguns milissegundos, fica ainda mais potente do que no início, porque se torna a soma dos sinais corticais e cerebelares. O cerebelo normalmente causa esse efeito quando está intacto, mas, quando está ausente, falta o sinal de suporte secundário extra. Esse suporte cerebelar torna a contração muscular muito mais forte do que se o cerebelo não existisse. 
	Agora, o que ocasiona o sinal de desligamento para os músculos agonistas ao término do movimento? Lembre-se de que todas as fibras musgosas têm um segundo ramo que transmite sinais ao córtex cerebelar por meio das células granulosas e, por fim, para as células de Purkinje pelas fibras paralelas. As células de Purkinje, por sua vez, inibem as células nucleares profundas. Essa via passa poralgumas das menores fibras nervosas de condução mais lenta do sistema nervoso – isto é, as fibras paralelas da camada molecular cortical cerebelar, que têm diâmetros de apenas uma fração de milímetro. Além disso, os sinais dessas fibras são fracos e, desse modo, requerem um período finito para acumular excitação suficiente nos dendritos da célula de Purkinje a fim de estimulá-la. No entanto, a célula de Purkinje, uma vez excitada, envia um forte sinal inibitório para a mesma célula nuclear profunda que originalmente ativou o movimento. Portanto, esse sinal ajuda a desligar o movimento após um curto intervalo de tempo. 
	Assim, é possível ver como o circuito cerebelar completo pode causar tanto uma rápida contração do músculo agonista no início de um movimento quanto um desligamento no momento preciso da contração do mesmo agonista, após determinado período. 
	Agora, vamos especular sobre o circuito dos músculos antagonistas. Mais importante, lembre-se de que existem circuitos agonista-antagonista recíprocos em toda a medula espinhal para virtualmente todos os movimentos que a medula pode iniciar. Portanto, esses circuitos são parte da base para o desligamento do antagonista no início do movimento e, em seguida, para ligar ao término do movimento, refletindo o que quer que ocorra nos músculos agonistas. No entanto, vale ressaltar, também, que o cerebelo contém vários outros tipos de células inibitórias além das células de Purkinje. As funções de algumas dessas células ainda não foram determinadas; elas também poderiam desempenhar papéis na inibição inicial dos músculos antagonistas, no início de um movimento, e na excitação subsequente, no final de um movimento. Esses mecanismos ainda são, em parte, especulativos. Eles são aqui apresentados para ilustrar as maneiras pelas quais o cerebelo pode causar sinais exagerados de liga e desliga, controlando, assim, os músculos agonistas e antagonistas, bem como a sincronização destes. 
As células de Purkinje “aprendem” a corrigir erros motores | Papel das fibras trepadeiras
O grau em que o cerebelo sustenta o início e o término das contrações musculares, bem como a sincronização das contrações, precisa ser aprendido pelo cerebelo. Normalmente, quando uma pessoa realiza um novo ato motor pela primeira vez, o grau de estímulo motor pelo cerebelo no início da contração, o grau de inibição no final da contração e a sincronização desses dois eventos são quase sempre incorretos para movimentos precisos. Porém, após o ato ter sido realizado muitas vezes, os eventos individuais tornam-se progressivamente mais precisos, às vezes exigindo apenas alguns movimentos antes que o resultado desejado seja obtido, mas outras vezes requerendo centenas de movimentos. 
	Como esses ajustes acontecem? A resposta exata não é conhecida, embora se saiba que os níveis de sensibilidade dos circuitos cerebelares se adaptam progressivamente durante o processo de treinamento, em especial, a sensibilidade das células de Purkinje em responder à excitação das células granulosas. Além disso, essa mudança de sensibilidade é ocasionada por sinais das fibras trepadeiras que entram no cerebelo, provenientes do complexo olivar inferior. 
	Em condições de repouso, as fibras trepadeiras disparam cerca de uma vez por segundo, mas causam despolarização extrema de toda a árvore dendrítica da célula de Purkinje, durando até 1 segundo, cada vez que disparam. Durante esse tempo, a célula de Purkinje dispara com um forte pico de produção inicial, seguido por uma série de picos decrescentes. Quando uma pessoa realiza um novo movimento pela primeira vez, os sinais de retroalimentação dos músculos e dos proprioceptores articulares geralmente sinalizam para o cerebelo o quanto o movimento real deixou de ser correspondente ao movimento pretendido, e, de algum modo, os sinais das fibras trepadeiras alteram a longo prazo a sensibilidade das células de Purkinje. Acredita-se que, durante um período, essa mudança na sensibilidade (junto com outras possíveis funções de “aprendizagem” do cerebelo) faça com que a sincronização e outros aspectos do controle cerebelar dos movimentos se aproximem da perfeição. Quando esse estado é alcançado, as fibras trepadeiras não precisam mais enviar sinais de “erro” para o cerebelo para causar mudanças adicionais. 
FUNÇÃO DO CEREBELO NO CONTROLE MOTOR GLOBAL
O sistema nervoso usa o cerebelo para coordenar as funções de controle motor em três níveis:
1. O vestibulocerebelo. Esse nível consiste principalmente nos pequenos lobos cerebelares floculonodulares que se encontram sob o cerebelo posterior e porções adjacentes do vermis. Ele fornece circuitos neurais para a maioria dos movimentos associados ao equilíbrio do corpo. 
2. O espinocerebelo. Esse nível consiste na maior parte do vermis do cerebelo anterior e posterior mais as zonas intermediárias adjacentes em ambos os lados do vermis. Ele fornece os circuitos para a coordenação, principalmente, dos movimentos das porções distais dos membros, em especial, mãos e dedos. 
3. O cerebrocerebelo. Esse nível é formado pelas grandes zonas laterais dos hemisférios cerebelares, situadas lateralmente às zonas intermediárias. Ele recebe virtualmente toda a sua aferência do córtex motor cerebral e dos córtices pré-motor adjacente e somatossensorial do cérebro. Ele transmite sua informação eferente na direção ascendente de volta para o cérebro, funcionando de maneira retroativa com o sistema sensorimotor corticocerebral para planejar movimentos voluntários sequenciais do corpo e dos membros. Esses movimentos são planejados até décimos de segundo antes dos movimentos reais. Tal processo é denominado desenvolvimento de “imagens motoras” dos movimentos a serem realizados. 
Funções do vestibulocerebelo em associação com o tronco encefálico e a medula espinhal para controlar o equilíbrio e os movimentos posturais
O vestibulocerebelo originou-se, filogeneticamente, mais ou menos na mesma época em que o aparelho vestibular o ouvido interno se desenvolveu. Além disso, conforme discutido no Capítulo 56, a perda dos lobos floculonodulares e de porções adjacentes do vermis do cerebelo, que constituem o vestibulocerebelo, causa extrema perturbação do equilíbrio e dos movimentos posturais. 
	Em pessoas com disfunção vestibulocerebelar, o equilíbrio é muito mais perturbado durante a execução de movimentos rápidos do que durante a inatividade, especialmente quando envolvem mudanças na direção do movimento e estimulam os canais semicirculares. Esse fenômeno sugere que o vestibulocerebelo seja importante no controle do equilíbrio entre as contrações musculares agonistas e antagonistas da coluna, dos quadris e dos ombros durante mudanças rápidas nas posições corporais exigidas pelo aparelho vestibular. 
	Um dos maiores problemas no controle do equilíbrio é a quantidade de tempo necessária para transmitir os sinais de posição e velocidade dos sinais de movimento das diferentes partes do corpo para o cérebro. Mesmo quando as vias sensoriais de condução mais rápida são usadas, até 120 m/s nos tratos aferentes espinocerebelares, o retardo da transmissão dos pés para o cérebro ainda é de 15 a 20 milissegundos. Os pés de uma pessoa que corre rapidamente podem movimentar-se por até 25 centímetros durante esse tempo. Portanto, nunca é possível que os sinais de retorno das partes periféricas do corpo cheguem ao cérebro ao mesmo tempo que os movimentos realmente ocorrem. Como, então, o cérebro sabe quando parar um movimento e realizar o próximo ato sequencial quando os movimentos são executados rapidamente? A resposta é que os sinais da periferia dizem ao cérebro com que rapidez e em quais direções as partes do corpo estão movimentando-se. É, portanto, função do vestibulocerebelo “calcular antecipadamente”, a partir dessas velocidades e direções, onde as diferentes partes estarão durante os próximos milissegundos. Os resultados desses cálculos são a chave para a progressão do cérebro para o movimento sequencial seguinte. 
	Assim, durante o controle de equilíbrio,presume-se que as informações, tanto da periferia do corpo quanto do aparelho vestibular, sejam usadas em um circuito de controle por retroalimentação típica. Isso ocorre a fim de fornecer correção antecipada de sinais motores posturais necessários para manter o equilíbrio, mesmo durante o movimento extremamente rápido, incluindo alterações rápidas da direção do movimento. 
Espinocerebelo | Controle dos movimentos distais dos membros por retroalimentação através do córtex cerebelar intermediário e do núcleo interpósito
Como mostrado na Figura 57.8, a zona intermediária de cada hemisfério cerebelar recebe dois tipos de informações quando um movimento é realizado: (1) informações do córtex motor cerebral e do núcleo rubro do mesencéfalo, comunicando ao cerebelo o plano sequencial pretendido de movimento pelas próximas frações de segundo; e (2) informações de retroalimentação das partes periféricas do corpo, sobretudo dos proprioceptores distais dos membros, comunicando ao cerebelo quais movimentos reais resultam. Depois de a zona intermediária do cerebelo ter comparado os movimentos pretendidos com os movimentos reais, as células nucleares profundas do núcleo interpósito enviam sinais de saída corretiva (1) de volta para o córtex motor cerebral através de núcleos de retransmissão no tálamo e (2) para a porção magnocelular (a porção inferior) do núcleo rubro que dá origem ao trato rubroespinhal. O trato rubroespinhal, por sua vez, une-se ao trato corticoespinhal inervando os neurônios motores mais laterais nos cornos anteriores da substância cinzenta da medula espinhal, os neurônios que controlam as partes distais dos membros, particularmente as mãos e os dedos. 
Figura 57.8 Controle cerebral e cerebelar dos movimentos voluntários, envolvendo especialmente a zona intermediária do cerebelo. 
Essa parte do sistema de controle motor cerebelar proporciona movimentos suaves e coordenados dos músculos agonistas e antagonistas dos membros distais para a execução de movimentos padronizados intencionais agudos. O cerebelo parece comparar as “intenções” dos níveis superiores do sistema de controle motor, transmitidas à zona cerebelar intermediária através do trato corticopontocerebelar, com o “desempenho” das respectivas partes do corpo, como transmitido de volta ao cerebelo a partir da periferia. De fato, o trato espinocerebelar ventral até transmite de volta ao cerebelo uma cópia eferente dos sinais reais de controle motor que chegam aos neurônios motores anteriores, e essa informação também é integrada aos sinais que chegam dos fusos musculares e de outros órgãos sensoriais proprioceptores, transmitidos principalmente no trato espinocerebelar dorsal. Sinais comparadores semelhantes também vão para o complexo olivar inferior; se os sinais não se compararem de maneira favorável, o sistema oliva-Purkinje, junto com, possivelmente, outros mecanismos de aprendizagem cerebelar, corrigirão, por fim, os movimentos até que eles desempenhem a função desejada. 
Função do cerebelo para impedir movimentos que ultrapassem o alvo e para amortecer os movimentos. Quase todos os movimentos do corpo são pendulares. Por exemplo, quando um braço é movido, desenvolve-se um ímpeto que deve ser superado antes que o movimento possa ser interrompido. Por causa do ímpeto, todos os movimentos pendulares tendem a passar do alvo. Se isso ocorrer em uma pessoa cujo cerebelo foi destruído, os centros conscientes do cérebro reconhecem, em algum momento, esse erro e iniciam um movimento na direção reversa para tentar trazer o braço à posição pretendida. No entanto, o braço, em virtude de seu impulso, ultrapassa mais uma vez na direção oposta, e os sinais corretivos apropriados devem ser instituídos outra vez. Assim, o braço oscila para frente e para trás além de seu ponto pretendido por vários ciclos antes de, finalmente, fixar-se em sua marca. Esse efeito é denominado tremor de ação ou tremor intencional. 
	Se o cerebelo estiver intacto, os sinais subconscientes apropriados que foram aprendidos interrompem o movimento precisamente no ponto pretendido, evitando, assim, a ultrapassagem e o tremor. Essa atividade é a característica básica de um sistema de amortecimento. Todos os sistemas de controle reguladores dos elementos pendulares que possuem inércia precisam ter circuitos de amortecimento embutidos nos mecanismos. Para o controle motor pelo sistema nervoso, o cerebelo fornece a maior parte dessa função de amortecimento. 
Controle cerebelar de movimentos balísticos. Os movimentos mais rápidos do corpo, como os dos dedos na digitação, ocorrem tão rapidamente que não é possível receber informações de retroalimentação da periferia para o cerebelo ou do cerebelo de volta para o córtex motor antes que eles terminem. Esses movimentos são chamados de balísticos, o que significa que todo o movimento é pré-planejado e colocado em execução para percorrer uma distância específica e depois parar. Outro exemplo importante são os movimentos sacádicos dos olhos, nos quais os olhos saltam de uma posição para outra ao ler ou ao olhar para pontos sucessivos ao longo de uma estrada enquanto uma pessoa se move em um carro. 
	Três mudanças principais ocorrem nesses movimentos balísticos quando o cerebelo é removido: (1) os movimentos são lentos para desenvolverem-se e não têm a explosão extra de início que o cerebelo geralmente produz; (2) a força desenvolvida é fraca; e (3) os movimentos demoram para desligar, geralmente possibilitando que o movimento vá muito além da marca pretendida. Portanto, na ausência do circuito cerebelar, o córtex motor tem de trabalhar muito para ligar e desligar os movimentos balísticos. Assim, perde-se o automatismo dos movimentos balísticos. 
	Considerando, mais uma vez, o circuito do cerebelo, vê-se que ele está muito bem-organizado para desempenhar essa função bifásica (primeiro excitatória e, então, inibitória com atraso) requerida para movimentos balísticos rápidos pré-planejados. Além disso, os circuitos de sincronização do córtex cerebelar são fundamentais para essa capacidade específica do cerebelo. 
Cerebrocerebelo | Função da grande zona lateral do hemisfério cerebelar para planejar, sequenciar e sincronizar movimentos complexos
Em seres humanos, as zonas laterais dos dois hemisférios cerebelares são altamente desenvolvidas e muito aumentadas. Essa característica acompanha as habilidades humanas de planejar e executar padrões sequenciais intrincados de movimento (especialmente com as mãos e os dedos) e de fala. Ainda assim, as grandes zonas laterais dos hemisférios cerebelares não recebem aferência direta de informações das partes periféricas do corpo. Além disso, quase toda a comunicação entre essas áreas cerebelares laterais e o córtex cerebral não é com o córtex motor cerebral primário, mas com a área pré-motora e as áreas somatossensoriais primárias e de associação. 
	Mesmo assim, a destruição das zonas laterais dos hemisférios cerebelares, junto com seus núcleos profundos, os núcleos denteados, pode levar à descoordenação extrema de movimentos intencionais complexos das mãos, dos dedos, dos pés e do aparelho da fala. Essa condição tem sido difícil de compreender, uma vez que não há comunicação direta entre essa parte do cerebelo e o córtex motor primário. No entanto, estudos experimentais sugerem que tais porções do cerebelo estejam relacionadas a dois outros aspectos importantes, mas indiretos, do controle motor: (1) planejamento de movimentos sequenciais; e (2) sincronização dos movimentos sequenciais. 
Planejamento de movimentos sequenciais. O planejamento de movimentos sequenciais requer tanto comunicação entre as zonas laterais dos hemisférios com as porções pré-motoras e sensoriais do córtex cerebral quanto comunicação bidirecional entre essas áreas do córtex cerebral com áreas correspondentes dos núcleos da base. Parece que o “planejamento” dos movimentos sequenciais realmente começa nas áreas sensoriais e pré- motoras do córtex cerebral e, a partir daí, o plano é transmitido às zonas lateraisdos hemisférios cerebelares. Então, em meio a grande parte do tráfego bilateral entre o cerebelo e o córtex cerebral, os sinais motores apropriados fornecem a transição de uma sequência de movimentos para a seguinte. 
	Uma observação interessante que apoia esse ponto de vista é que muitos neurônios nos núcleos denteados cerebelares exibem o padrão de atividade para o movimento sequencial que ainda está por vir enquanto o movimento atual está ocorrendo. Assim, as zonas cerebelares laterais parecem envolvidas não com o movimento que está acontecendo em determinado momento, mas com o que vai acontecer durante o próximo movimento sequencial uma fração de segundo ou talvez até segundos depois. 
	Para resumir, uma das características mais importantes da função motora normal é a capacidade de progredir suavemente de um movimento para o seguinte em uma sucessão ordenada. Na ausência das grandes zonas laterais dos hemisférios cerebelares, essa capacidade é seriamente prejudicada para movimentos rápidos. 
Função de sincronização dos movimentos sequenciais. Outra função importante das zonas laterais dos hemisférios cerebelares é fornecer o tempo apropriado para cada movimento subsequente. Na ausência dessas zonas cerebelares, perde-se a capacidade subconsciente de predizer a que distância as diferentes partes do corpo irão movimentar-se em determinado momento. Sem essa capacidade de sincronização, a pessoa torna-se incapaz de determinar quando o próximo movimento sequencial precisa começar. Como resultado, o movimento seguinte pode iniciar-se bem cedo ou, mais provavelmente, muito tarde. Portanto, as lesões nas zonas laterais do cerebelo fazem com que movimentos complexos (p. ex., aqueles necessários para escrever, correr ou mesmo falar) sejam descoordenados e não possam progredir em sequência ordenada de um movimento para o próximo. Diz-se que essas lesões cerebelares causam falha na progressão suave dos movimentos. 
Funções preditivas extramotoras do cerebrocerebelo. O cerebrocerebelo (os grandes lobos laterais) também ajuda a “temporizar” eventos para além dos movimentos do corpo. Por exemplo, as velocidades de progressão dos fenômenos auditivos e visuais podem ser “inferidas” pelo cérebro, mas ambas requerem a participação cerebelar. Portanto, uma pessoa pode predizer, a partir da alteração no cenário visual, com que rapidez ela se aproxima de um objeto. Um experimento impressionante que demonstra a importância do cerebelo nessa capacidade são os efeitos da remoção das grandes porções laterais do cerebelo em macacos. Esse animal ocasionalmente se arremete contra a parede de um corredor porque é incapaz de prever quando chegará à parede. 
	É bem possível que o cerebelo forneça uma “base de tempo”, talvez usando circuitos de retardo de tempo, com os quais os sinais de outras partes do sistema nervoso central possam ser comparados. Afirma-se, com frequência, que o cerebelo é particularmente útil na interpretação das relações espaço-temporais que mudam rápido nas informações sensoriais. 
Anormalidades clínicas do cerebelo
A destruição de pequenas porções do córtex cerebelar lateral raramente causa anormalidades detectáveis na função motora. De fato, vários meses após a remoção da metade do córtex cerebelar lateral de um lado do cérebro, se os núcleos cerebelares profundos não forem removidos junto com o córtex, as funções motoras do animal parecem ser quase normais, desde que o animal execute todos os movimentos lentamente. Assim, as porções restantes do sistema de controle motor são capazes de compensar bastante a perda de partes do cerebelo. Para causar disfunção grave e contínua do cerebelo, a lesão cerebelar geralmente precisa acometer um ou mais dos núcleos cerebelares profundos – o núcleo denteado, o núcleo interpósito ou o núcleo fastigial. 
Dismetria e ataxia
Dois dos sintomas mais importantes da doença cerebelar são a dismetria e a ataxia. Na ausência do cerebelo, o sistema de controle motor subconsciente não consegue predizer até que distância os movimentos irão. Portanto, os movimentos normalmente ultrapassam sua marca pretendida; então, a porção consciente do cérebro faz uma compensação excessiva na direção oposta para o movimento compensatório subsequente. Esse efeito é denominado dismetria e resulta em movimentos descoordenados denominados ataxia. A dismetria e a ataxia também podem resultar de lesões nos tratos espinocerebelares porque a informação de retroalimentação das partes móveis do corpo para o cerebelo é essencial para a programação do término do movimento pelo cerebelo. 
Passar do ponto 
Passar do ponto significa que, na ausência do cerebelo, uma pessoa geralmente mexe a mão ou alguma outra parte do corpo em um movimento consideravelmente além do ponto de intenção. Isso porque é o cerebelo que costuma inicializar a maior parte do sinal motor que desliga um movimento depois de iniciado; portanto, se ele não estiver disponível para ativar esse sinal motor, o movimento normalmente vai além da marca pretendida. Portanto, passar do ponto é, na verdade, manifestação de dismetria. 
Deficiências de progressão
Disdiadococinesia | Incapacidade de realizar movimentos rápidos alternadamente. Quando o sistema de controle motor falha em predizer onde as diferentes partes do corpo estarão em determinado momento, perde-se a percepção das partes durante os movimentos motores rápidos. Como resultado, o movimento seguinte pode começar muito cedo ou muito tarde; portanto, não ocorre nenhuma progressão do movimento de maneira organizada. É possível demonstrar prontamente esse efeito fazendo com que um paciente com lesão cerebelar vire uma das mãos para cima e para baixo rapidamente. O paciente logo perde toda a percepção da posição instantânea da mão durante qualquer parte do movimento. Como resultado, ocorre uma série de movimentos fracionados e confusos, em vez dos movimentos coordenados normais para cima e para baixo. Essa condição é chamada de disdiadococinesia. 
Disartria | Falha de articulação da fala. Outro exemplo em que ocorre falha de progressão é na fala, porque a formação de palavras depende da sucessão rápida e ordenada de movimentos musculares individuais na laringe, na boca e no sistema respiratório. A falta de coordenação entre essas estruturas e a incapacidade de ajustar antecipadamente a intensidade do som ou a duração de cada som sucessivo causam vocalização confusa, com algumas sílabas com alta intensidade, outras fracas, algumas mantidas por longos intervalos e outras, por intervalos curtos, resultando, muitas vezes, em um discurso ininteligível. Essa condição é chamada de disartria. 
Nistagmo cerebelar | Tremor dos globos oculares. O nistagmo cerebelar é o tremor do globo ocular que geralmente ocorre quando se tenta fixar os olhos em uma cena em um lado da cabeça. Esse tipo de fixação fora do centro resulta em movimentos rápidos e trêmulos dos olhos, em vez de fixação constante, sendo, portanto, outra manifestação da falha de amortecimento pelo cerebelo. Ocorre sobretudo quando os lobos oculonodulares do cerebelo estão danificados; nesse caso, também está associado à perda de equilíbrio devido à disfunção das vias provenientes dos canais semicirculares que passam pelo cerebelo oculonodular. 
Hipotonia | Diminuição do tônus da musculatura
A perda dos núcleos cerebelares profundos, particularmente dos núcleos denteado e interpósito, diminui o tônus da musculatura corporal periférica do mesmo lado da lesão cerebelar. A hipotonia resulta da perda da facilitação cerebelar do córtex motor e dos núcleos motores do tronco encefálico por sinais tônicos provenientes dos núcleos cerebelares profundos. 
NÚCLEOS DA BASE E SUAS FUNÇÕES MOTORAS
Os núcleos da base, como o cerebelo, constituem outro sistema motor acessório que funciona geralmente não por si mesmo, mas em estreita associação com o córtex cerebral e com o sistema de controle motor corticoespinhal. De fato, os núcleos da base recebem a maior parte dos sinais aferentes do córtex cerebral e também retornam quase todos ossinais eferentes para o córtex. 
	A Figura 57.9 mostra as relações anatômicas dos núcleos da base com outras estruturas do cérebro. Em cada lado do cérebro, esses núcleos consistem no núcleo caudado, no putame, no globo pálido, na substância negra e no núcleo subtalâmico. Eles estão localizados sobretudo lateralmente e ao redor do tálamo, ocupando grande parte das regiões interiores de ambos os hemisférios cerebrais. Quase todas as fibras nervosas motoras e sensoriais que conectam o córtex cerebral e a medula espinhal passam pelo espaço que fica entre as principais massas dos núcleos da base, o núcleo caudado e o putame. Esse espaço é denominado cápsula interna do cérebro, sendo importante em nossa discussão atual por causa da íntima associação entre os núcleos da base e o sistema corticoespinhal para o controle motor. 
CIRCUITOS NEURAIS DOS NÚCLEOS DA BASE
As conexões anatômicas entre os núcleos da base e os outros elementos cerebrais que fornecem controle motor são complexas, como mostrado na Figura 57.10. À esquerda, observam-se o córtex motor, o tálamo e os circuitos associados do tronco encefálico e do cerebelo. À direita está o circuito principal do sistema de núcleos da base, evidenciando as tremendas interconexões entre os núcleos da base, além de extensas vias aferentes e eferentes entre as outras regiões motoras do cérebro e os núcleos da base. Nas próximas seções, iremos concentrar-nos especialmente em dois circuitos principais: o circuito do putame e o circuito do caudado. 
FUNÇÃO DOS NÚCLEOS DA BASE NA EXECUÇÃO DE PADRÕES DE ATIVIDADE MOTORA | CIRCUITOS DO PUTAME
Uma das principais funções dos núcleos da base no controle motor é funcionar em associação com o sistema corticoespinhal para controlar padrões complexos de atividade motora. Um exemplo é a escrita de letras do alfabeto. Quando os núcleos da base sofrem grave lesão, o sistema cortical de controle motor não pode mais executar esses padrões. Em vez disso, a escrita torna-se grosseira, como se a pessoa estivesse aprendendo a escrever pela primeira vez. 
Figura 57.9 Relações anatômicas dos núcleos da base com o córtex cerebral e o tálamo, mostradas em vista tridimensional. 
Figura 57.10 Relação dos circuitos dos núcleos da base com o sistema corticoespinocerebelar para o controle dos movimentos. 
Outros padrões que requerem os núcleos da base são cortar papel com tesoura, martelar pregos, arremessar uma bola de basquete através de um aro, passar uma bola de futebol e jogar uma bola de beisebol, bem como movimentos de escavar terra, a maioria dos aspectos da vocalização, os movimentos controlados dos olhos e virtualmente qualquer outro de nossos movimentos que demonstrem destreza, a maioria deles executados subconscientemente. 
Vias neurais dos circuitos do putame. A Figura 57.11 mostra as principais vias através dos núcleos da base para a execução de padrões de movimento aprendidos. Elas começam, em sua maioria, nas áreas pré-motoras e suplementares do córtex motor e nas áreas somatossensoriais do córtex sensorial. Em seguida, passam para o putame (principalmente contornando o núcleo caudado) e, depois, para a porção interna do globo pálido, seguindo para os núcleos de retransmissão ventral anterior e ventral lateral do tálamo e, por fim, retornando para o córtex motor cerebral primário e as porções das áreas cerebrais pré-motoras e suplementares estreitamente associadas ao córtex motor primário. Desse modo, os circuitos do putame têm seus aferentes, principalmente, das partes do cérebro adjacentes ao córtex motor primário, mas não muito do próprio córtex motor primário. Então, suas eferências retornam, em especial, para o córtex motor primário ou para os córtices pré-motor e suplementar estreitamente associados. Funcionando em estreita associação com esse circuito de putame primário estão os circuitos auxiliares que passam do putame através do globo pálido externo, do subtálamo e da substância negra, retornando, por fim, ao córtex motor por meio do tálamo. 
Figura 57.11 Circuito do putame através dos núcleos da base para a execução subconsciente dos padrões aprendidos de movimento. 
Função anormal no circuito de putame: atetose, hemibalismo e coreia. Como o circuito do putame funciona para ajudar a executar padrões de movimento? Pouco se sabe sobre essa função. No entanto, quando uma parte do circuito é danificada ou bloqueada, certos padrões de movimento tornam-se gravemente anormais. Por exemplo, é frequente as lesões no globo pálido levarem a movimentos de contorção espontâneos e, muitas vezes, contínuos de uma das mãos, um braço, o pescoço ou o rosto. Esses movimentos são chamados de atetose. Uma lesão no subtálamo tende a levar a movimentos em bloco e repentinos de um membro inteiro, uma condição chamada hemibalismo. Múltiplas lesões pequenas no putame levam a movimentos de sacudidela (chamados de coreia) nas mãos, no rosto e em outras partes o corpo. As lesões da substância negra levam à doença comum e extremamente grave de rigidez, acinesia e tremores conhecida como doença de Parkinson, que discutiremos com mais detalhes ainda neste capítulo. 
PAPEL DOS NÚCLEOS DA BASE NO CONTROLE COGNITIVO DA MOTRICIDADE | CIRCUITO DO CAUDADO
O termo cognição significa os processos mentais de pensamento, integrando a aferência sensorial para o cérebro com as informações já armazenadas na memória. A maior parte de nossas ações motoras ocorre como consequência de pensamentos originados na mente, um processo denominado controle cognitivo da atividade motora. O núcleo caudado desempenha um papel importante nesse controle cognitivo da atividade motora. 
	As conexões neurais entre o núcleo caudado e o sistema de controle motor corticoespinhal, mostradas na Figura 57.12, são um pouco diferentes daquelas do circuito do putame. Parte da razão para essa diferença é que o núcleo caudado, como observado na Figura 57.9, estende-se por todos os lobos do cérebro, começando anteriormente nos lobos frontais, passando posteriormente pelos lobos parietal e occipital e, por fim, curvando-se para frente outra vez como a letra “C” nos lobos temporais. Além disso, o núcleo caudado recebe grandes quantidades de aferentes das áreas de associação do córtex cerebral que recobrem o núcleo caudado, em especial, aquelas que também integram os diferentes tipos de informações sensoriais e motoras em padrões de pensamento utilizáveis. 
	Os sinais, após passarem do córtex cerebral para o núcleo caudado, são transmitidos para o globo pálido interno, depois para os núcleos de retransmissão do tálamo ventral anterior e ventral lateral e, por fim, finalmente, de volta às áreas motoras pré-frontais, pré-motoras e suplementar do córtex cerebral, mas com quase nenhum dos sinais de retorno passando diretamente para o córtex motor primário. Em lugar disso, os sinais de retorno vão para as regiões motoras acessórias nas áreas motoras pré-motoras e suplementares que estão relacionadas com a construção de padrões sequenciais de movimento com duração de 5 segundos ou mais, em vez de estimular movimentos musculares individuais. 
	Um bom exemplo desse fenômeno seria uma pessoa ver um leão aproximando-se e, então, responder instantânea e automaticamente (1) afastando-se do leão, (2) começando a correr e (3) até mesmo tentando subir em uma árvore. Sem as funções cognitivas, a pessoa pode não ter o conhecimento instintivo, sem pensar por muito tempo, para responder de maneira rápida e adequada. Assim, o controle cognitivo da atividade motora determina subconscientemente, e em segundos, quais padrões de movimento serão usados em conjunto para alcançar um objetivo complexo capaz de durar vários segundos. 
Figura 57.12 Circuito do caudado através dos núcleos da base para planejamento cognitivo de padrões motores sequenciais e paralelos a fim de se obterem objetivos conscientes específicos. 
FUNÇÃO DOS NÚCLEOS DA BASE PARA ALTERAR A SINCRONIZAÇÃO E DIMENSIONAR A INTENSIDADE DE MOVIMENTOS
Duas importantes capacidades do cérebro em controlar o movimento são: (1) determinar a rapidezcom que o movimento deve ser executado; e (2) controlar o quão amplo será o movimento. Por exemplo, uma pessoa pode escrever a letra “a” lenta ou rapidamente. Além disso, é possível que ela escreva um “a” pequeno em um pedaço de papel ou um “A” grande em um quadro-negro. Independentemente da escolha, as características proporcionais da letra permanecem quase as mesmas. 
	Em pacientes com lesões graves nos núcleos da base, essas funções de sincronização e dimensionamento são deficientes e, algumas vezes, inexistentes. Aqui, mais uma vez, os núcleos da base não funcionam de maneira isolada, mas em estreita associação com o córtex cerebral. Uma área cortical especialmente importante é o córtex parietal posterior – o local das coordenadas espaciais para o controle motor de todas as partes do corpo, bem como para a relação do corpo e de suas partes com tudo o que está à sua volta. Danos nessa área não produzem simples déficits de percepção sensorial, como perda da sensação tátil, cegueira ou surdez. Em vez disso, as lesões do córtex parietal posterior produzem uma incapacidade de perceber objetos de modo acurado por meio de mecanismos sensoriais que funcionam normalmente, uma condição chamada agnosia. A Figura 57.13 mostra como uma pessoa com uma lesão no córtex parietal posterior direito pode tentar copiar desenhos. Nesses casos, a capacidade do paciente em copiar o lado esquerdo dos desenhos está gravemente prejudicada. Além disso, ele sempre tentará evitar usar o braço esquerdo, a mão esquerda ou outras partes do corpo de seu lado esquerdo para a execução de tarefas; ele pode nem lavar esse lado do corpo (síndrome da negligência), quase desconhecendo que essas partes existam. 
Figura 57.13 Ilustração de desenho que poderia ser feito por uma pessoa com a síndrome da negligência, causada por lesão grave de seu córtex parietal posterior, comparado com o desenho real, cuja cópia foi solicitada. Observe que a capacidade da pessoa em reproduzir o lado esquerdo do desenho está gravemente prejudicada. 
	Uma vez que o circuito do caudado do sistema de núcleos da base funciona principalmente com áreas de associação do córtex cerebral, como o córtex parietal posterior, presume-se que a sincronização e o dimensionamento dos movimentos sejam funções desse circuito de controle motor cognitivo do caudado. No entanto, nosso entendimento da função dos núcleos da base ainda é tão impreciso que muito do que é discutido nas últimas seções é dedução analítica, e não fato comprovado. 
FUNÇÕES DE SUBSTÂNCIAS NEUROTRANSMISSORAS ESPECÍFICAS NOS NÚCLEOS DA BASE
A Figura 57.14 demonstra a inter-relação de vários neurotransmissores específicos que sabidamente funcionam nos núcleos da base, mostrando: (1) as vias de dopamina da substância negra para o núcleo caudado e o putame; (2) as vias do ácido gama-aminobutírico (GABA) do núcleo caudado e putame para o globo pálido e a substância negra; (3) vias de acetilcolina do córtex para o núcleo caudado e putame; e (4) múltiplas vias gerais do tronco encefálico que secretam noradrenalina, serotonina, encefalina e vários outros neurotransmissores nos núcleos da base, bem como em outras partes do cérebro. Além de tudo isso, há múltiplas vias do glutamato, responsáveis pela maioria dos sinais excitatórios (não mostrados na figura) que equilibram o grande número de sinais inibitórios transmitidos, especialmente pelos transmissores inibitórios dopamina, GABA e serotonina. Teremos mais a dizer sobre alguns desses sistemas neurotransmissores e hormonais nas seções subsequentes, quando discutiremos as doenças dos núcleos da base, bem como nos capítulos subsequentes, quando serão abordados o comportamento, o sono, a vigília e as funções do sistema nervoso autônomo. 
Figura 57.14 Vias neuronais que secretam diferentes tipos de substâncias neurotransmissoras nos núcleos da base. Ach, Acetilcolina; GABA, ácido gama-aminobutírico. 
Por enquanto, deve-se lembrar que o GABA funciona como um neurotransmissor inibitório. Portanto, os neurônios GABA nas alças de retroalimentação do córtex através dos núcleos da base e de volta ao córtex fazem com que virtualmente todas essas alças sejam de alças retroalimentação negativa, e não de retroalimentação (feedback) positiva, emprestando estabilidade aos sistemas de controle motor. A dopamina também funciona como um neurotransmissor inibitório na maior parte do cérebro e, por isso, age igualmente como um estabilizador em algumas condições. 
Síndromes clínicas resultantes de lesão dos núcleos da base
Além da atetose e do hemibalismo, já mencionados em relação às lesões no globo pálido e no subtálamo, outras duas doenças importantes decorrem de lesões nos núcleos da base. São elas a doença de Parkinson e a doença de Huntington. 
Doença de Parkinson
Também conhecida como paralisia agitante, a doença de Parkinson resulta da degeneração generalizada da porção da substância negra (a pars compacta) que envia fibras nervosas secretoras de dopamina para o núcleo caudado e para o putame. A doença é caracterizada por: (1) rigidez de grande parte da musculatura do corpo; (2) tremor involuntário das áreas envolvidas, mesmo quando a pessoa está em repouso, a uma frequência fixa de 3 a 6 ciclos por segundo; (3) dificuldade intensa em iniciar o movimento, chamada acinesia; (4) instabilidade postural causada por reflexos posturais prejudicados, levando a um equilíbrio inadequado e quedas; e (5) outros sintomas motores, incluindo disfagia (diminuição da capacidade de engolir), distúrbios da fala, distúrbios da marcha e fadiga. 
	As causas desses efeitos motores anormais não são totalmente compreendidas. No entanto, a dopamina secretada no núcleo caudado e no putame é um transmissor inibitório; logo, a destruição dos neurônios dopaminérgicos na substância negra teoricamente possibilitaria que o núcleo caudado e o putame se tornassem ativos ao extremo e possivelmente causaria a saída contínua de sinais excitatórios para o sistema de controle motor corticoespinhal. Esses sinais poderiam excitar excessivamente muitos ou todos os músculos do corpo, levando à rigidez em pacientes com doença de Parkinson. 
	Alguns dos circuitos de retroalimentação podem oscilar com facilidade em razão dos altos ganhos de retroalimentação após a perda de sua inibição, levando ao tremor da doença de Parkinson. Esse tremor é bastante diferente daquele da doença cerebelar porque ocorre durante todas as horas de vigília, sendo, portanto, um tremor involuntário, distinguindo-se do tremor cerebelar, que acontece apenas quando a pessoa realiza movimentos intencionalmente iniciados. 
	A acinesia que ocorre na doença de Parkinson costuma ser muito mais angustiante para o paciente do que os sintomas de rigidez muscular e tremor, porque uma pessoa com doença de Parkinson grave deve exercer o mais alto grau de concentração para realizar até mesmo o movimento mais simples. O esforço mental (até mesmo angústia mental) que é necessário para fazer os movimentos desejados está, muitas vezes, no limite da força de vontade do paciente. Então, quando os movimentos ocorrem, tendem a ser rígidos, lentos e decompostos em partes (movimento em catraca), em vez de suaves. A causa dessa acinesia ainda é especulativa. No entanto, a secreção de dopamina no sistema límbico – em especial, no núcleo acumbente – está frequentemente reduzida, junto com sua diminuição nos núcleos da base. Foi sugerido que essa diminuição possa reduzir o impulso psíquico para a atividade motora de tal modo que resulte em acinesia. 
	As características não motoras da doença de Parkinson incluem transtornos do sono, depressão e ansiedade, disfunção autonômica e comprometimento cognitivo em estágios avançados. 
Tratamento com L-dopa. A administração do fármaco L- dopa a pacientes com doença de Parkinson costuma melhorar muitos dos distúrbios motores, especialmente a rigidez e a acinesia, mas tem pouco efeito benéfico sobre os sintomas não motores. Acredita-se que a razão para a melhora dos distúrbios motores seja que a L-dopa é convertida no cérebroem dopamina e a dopamina, então, restaura o equilíbrio normal entre a inibição e a excitação no núcleo caudado e no putame. A dopamina, ao ser administrada, não tem o mesmo efeito em razão de sua estrutura química, que a impossibilita de atravessar a barreira hematencefálica; já a estrutura ligeiramente diferente da L-dopa torna possível sua passagem por essa barreira. 
Tratamento com inibidores da monoaminoxidase. Outro tratamento para a doença de Parkinson inclui fármacos inibidores da monoaminoxidase (IMAO), responsável pela destruição da maior parte da dopamina após sua secreção. Portanto, qualquer dopamina que seja liberada permanece por mais tempo nos tecidos dos núcleos da base. Além disso, por motivos não compreendidos, esse tratamento ajuda a retardar a destruição dos neurônios secretores de dopamina na substância negra. Portanto, as combinações apropriadas de terapia com L-dopa junto com a terapia com inibidor da monoaminoxidase geralmente propiciam um tratamento muito melhor do que o uso de apenas um desses fármacos. 
Tratamento com células dopaminérgicas fetais transplantadas. O transplante de células fetais cerebrais secretoras de dopamina para os núcleos caudados e putame tem sido usado com algum sucesso a curto prazo para tratar a doença de Parkinson. Se fosse possível obter a persistência, talvez esse se tornasse o tratamento do futuro. 
Doença de Huntington (coreia de Huntington)
A doença de Huntington é um distúrbio hereditário autossômico dominante, que geralmente começa a causar sintomas na idade de 30 a 40 anos. É caracterizada inicialmente por movimentos de sacudidela em músculos individuais e, a seguir, por movimentos de distorção grave e progressiva de todo o corpo. Além disso, a demência grave desenvolve-se junto com as disfunções motoras. 
	Acredita-se que os movimentos anormais da doença de Huntington sejam causados pela perda da maioria dos corpos celulares dos neurônios secretores de GABA no núcleo caudado e no putame, bem como pela perda de neurônios secretores de acetilcolina em muitas partes do cérebro. Os terminais dos axônios dos neurônios GABA normalmente inibem porções do globo pálido e da substância negra. Acredita-se que essa perda de inibição possibilite explosões espontâneas de atividade do globo pálido e da substância negra, o que ocasiona os movimentos de distorção. 
	É provável que a demência em pessoas com doença de Huntington não resulte da perda de neurônios GABA, mas da perda de neurônios secretores de acetilcolina, talvez especialmente nas áreas de pensamento do córtex cerebral. 
	O gene anormal que causa a doença de Huntington foi encontrado; ele tem um códon (CAG) que se repete muitas vezes e codifica para múltiplos aminoácidos extras de glutamina na estrutura molecular de uma proteína celular neuronal anormal, chamada huntingtina, que ocasiona os sintomas. Essa proteína, por causar os efeitos da doença, é, no momento, uma questão para pesquisa mais intensa. 
INTEGRAÇÃO DAS DIFERENTES PARTES DO SISTEMA DE CONTROLE GLOBAL DO MOVIMENTO
Por fim, resumiremos da melhor maneira possível o que sabemos sobre o controle global do movimento. Para isso, vamos primeiro fazer uma sinopse dos diferentes níveis de controle. 
NÍVEL ESPINHAL
Há padrões locais de movimento para todas as áreas musculares do corpo programados na medula espinhal – por exemplo, reflexos de retirada programados que afastam qualquer parte do corpo para longe de uma fonte de dor. A medula também é o local de padrões complexos de movimentos rítmicos, como o movimento alternado de vaivém dos membros para caminhar, mais movimentos recíprocos em lados opostos do corpo ou dos membros posteriores versus membros anteriores em animais de quatro patas. Todos esses programas da medula podem ou ser acionados por níveis superiores de controle motor ou inibidos enquanto os níveis superiores assumem o controle. 
NÍVEL ROMBENCEFÁLICO
O rombencéfalo é responsável por duas funções principais para o controle motor geral do corpo: (1) manutenção do tônus axial do corpo para o propósito de ficar em pé; e (2) modificação contínua dos graus de tônus nos diferentes músculos em resposta às informações do aparelho vestibular, com a finalidade de manter o equilíbrio corporal. 
NÍVEL DO CÓRTEX MOTOR
O sistema do córtex motor fornece a maioria dos sinais motores de ativação para a medula espinhal. Ele funciona, em parte, emitindo comandos sequenciais e paralelos que colocam em movimento vários padrões medulares de ação motora. É também capaz de alterar as intensidades dos diferentes padrões ou modificar o seu tempo ou outras características. Quando necessário, o sistema corticoespinhal pode contornar os padrões da medula, substituindo-os por padrões de nível superior do tronco encefálico ou do córtex cerebral. Os padrões corticais tendem a ser complexos; eles podem ser, também, “aprendidos”, ao passo que os padrões medulares são determinados sobretudo pela hereditariedade e são considerados fisicamente conectados. 
Funções associadas do cerebelo. O cerebelo funciona com todos os níveis de controle muscular. Com a medula espinhal, ele age de maneira especial para aumentar o reflexo de estiramento; portanto, quando um músculo em contração encontra uma carga inesperadamente pesada, um sinal reflexo de estiramento longo, transmitido por todo o cerebelo e de volta para a medula, aumenta de maneira muito intensa o efeito de resistência à carga do reflexo de estiramento básico. 
	Na área do tronco encefálico, o cerebelo funciona para realizar os movimentos posturais do corpo, especialmente os movimentos rápidos exigidos pelo sistema de equilíbrio, suaves e contínuos e sem oscilações anormais. 
	No córtex cerebral, o cerebelo opera em associação com ele a fim de proporcionar muitas funções motoras acessórias, sobretudo para fornecer força motora extra para ativar a contração muscular rapidamente no início de um movimento. Perto do final de cada movimento, o cerebelo ativa os músculos antagonistas exatamente no momento certo e com a força adequada para interromper o movimento no ponto pretendido. Além disso, quase todos os aspectos desse padrão de liga/desliga, realizado pelo cerebelo, podem ser aprendidos com a experiência. 
	O cerebelo funciona com o córtex cerebral ainda em outro nível de controle motor; ele ajuda a programar com antecedência as contrações musculares necessárias para a progressão suave de um movimento rápido atual em uma direção para o próximo movimento rápido em outra direção, com tudo isso ocorrendo em uma fração de segundo. Para isso, o circuito neural passa do córtex cerebral para as grandes zonas laterais dos hemisférios cerebelares e, depois, volta para o córtex cerebral. 
	O cerebelo funciona principalmente quando movimentos musculares precisam ser rápidos. Sem ele, movimentos lentos e calculados ainda podem ocorrer, mas é difícil o sistema corticoespinhal realizar movimentos intencionais rápidos e variáveis para executar um objetivo particular ou, especialmente, para progredir de modo suave de um movimento rápido para o seguinte. 
Funções associadas dos núcleos da base. Os núcleos da base são essenciais para o controle motor de maneiras totalmente diferentes daquelas do cerebelo. Suas funções mais importantes são: (1) ajudar o córtex a executar padrões de movimento aprendidos, mas subconscientes; e (2) ajudar a planejar múltiplos padrões paralelos e sequenciais de movimento que a mente reúne para realizar uma tarefa pretendida. 
	Os tipos de padrões motores que requerem os núcleos da base incluem aqueles para escrever todas as diferentes letras do alfabeto, para lançar uma bola e para digitar. Além disso, os núcleos da base são necessários à modificação desses padrões para escrever de forma pequena ou muito grande, controlando, assim, as dimensões dos padrões. 
	Em um nível ainda mais alto de controle está outra circuitaria formada pelo cerebelo e pelos núcleos da base. Ela começa nos processos de pensamento para fornecer etapas sequenciais globais de ação a fim de responder a cada novasituação – como o planejamento de uma resposta motora imediata a um agressor ou a resposta sequencial de alguém a um abraço inesperadamente afetuoso. 
O QUE NOS LEVA À AÇÃO? 
O que nos desperta da inatividade e põe em ação nossas sequências de movimento? Estamos começando a aprender sobre os sistemas motivacionais do cérebro. Explicando de maneira resumida, ele tem um núcleo mais antigo localizado abaixo, anterior e lateralmente ao tálamo – incluindo o hipotálamo, a amígdala, o hipocampo, a região septal anterior ao hipotálamo e ao tálamo e até mesmo regiões mais antigas do tálamo e do córtex cerebral. Todas essas áreas – que funcionam em conjunto para iniciar a maioria das atividades motoras e outras atividades funcionais do cérebro – são chamadas coletivamente de sistema límbico do cérebro, o qual será discutido mais detalhadamente no Capítulo 59.

Continue navegando