Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ANESTESIA LOCAL COMO AGEM OS ANESTÉSICOS LOCAIS São fármacos que suprimem a condução do estímulo nervoso de forma reversível, promovendo a insensibilidade de uma determinada região. Os anestésicos locais, na sua forma não ionizada, atravessam a membrana do axônio e penetram na célula nervosa. No interior da célula nervosa, as moléculas ionizadas de anestésico local se ligam a receptores específicos nos canais de sódio, reduzindo ou impedindo a entrada do íon na célula. Isso resulta no bloqueio da condução nervosa e, consequentemente, na percepção da dor. Os anestésicos podem inibir a condução nervosa não só do sistema periférico como também do central e em outros tecidos excitáveis, como os músculos esqueléticos, cardíaco e liso, podendo explicar sua toxicidade em casos de sobredosagem. CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS ANESTÉSICOS LOCAIS São bases fracas, pouco solúveis em água e instáveis quando expostos ao ar. Para uso clínico se adiciona um sal, o cloridrato, que apresenta maior solubilidade e estabilidade na solução. Na forma de cloridrato apresentam PH ácido variando em 5,5 (anestésico sem vasoconstritor) a 3,3 (anestésico com vasoconstritor). CONFIGURAÇÃO QUÍMICA Porção hidrofóbica: permite injeção nos tecidos. Porção lipofílica: responsável pela difusão do anestésico através da bainha de mielina. Cadeia intermediária: une as duas porções e permite classificar o anestésico em ésteres e amidas. Ésteres: precursor (cocaína). Benzocaína (anestésico de superfície em mucosas, na forma de pomada ou géis). Amidas: Lidocaína, mepivacaína, prilocaína, articaína, bupivacaína, ropivacaína e etidocaína. LIDOCÁINA Padrão do grupo. Início de ação (tempo de latência) entre 2-4 min. Devido a sua ação vasodilatadora, o que promove sua rápida eliminação do local de injeção, a duração da anestesia pulpar é limitada em 5-10min. Por isso, praticamente não há indicação do uso da solução de lidocaína 2% sem vasoconstritor. Quando associada a um vasoconstritor sua ação sura entre 40-60min de anestesia pulpar. Em tecidos moles, sua ação anestésica pode permanecer em torno de 120-150min. (2hr-2:30hr) A lidocaína também é empregada na anestesia tópica, especialmente em pacientes com história de alergia aos ésteres. Metabolizado no fígado e eliminado pelos rins. Meia vida plasmática de 1,6h/5. Toxicidade: os níveis plasmáticos para o início de reações tóxicas são de 4,5 μg/mL no SNC e de 7,5 μg/mL no sistema cardiovascular. A sobredosagem promove a estimulação inicial do SNC, seguida de depressão, convulsão e coma. MEPIVACAÍNA Potência anestésica similar a lidocaína. Início de ação entre 1,5-2min. Possui discreta ação vasodilatadora. Quando empregada na forma pura sem vasoconstritor (na concentração de 3%) promove anestesia pulpar mais duradoura do que a lidocaína (por até 20 min na técnica infiltrativa e por 40 min na técnica de bloqueio regional). ANESTESIA LOCAL Metabolização hepática e eliminação pelos rins. Meia vida plasmática de 1,9h /5. Toxicidade semelhante a lidocaína. PRILOCAÍNA Potência anestésica similar à da lidocaína. Sua ação tem início entre 2-4 min. Por sua baixa atividade vasodilatadora (50% menor do que a da lidocaína), pode ser usada sem vasoconstritor, na concentração de 4%. No Brasil, não é comercializada na forma pura. É metabolizada mais rapidamente do que a lidocaína, no fígado e nos pulmões. Eliminação renal. Meia-vida plasmática de 1,6 h/5. Apesar de ser menos tóxica do que a lidocaína e a mepivacaína, em casos de sobredosagem produz o aumento dos níveis de metemoglobina no sangue. Portanto, é recomendado maior cuidado no uso deste anestésico em pacientes com deficiência de oxigenação (portadores de anemias, alterações respiratórias ou cardiovasculares). ARTICAÍNA Rápido início de ação, entre 1-2 min. Potência 1,5 vezes maior do que a da lidocaína. Possui baixa lipossolubilidade e alta taxa de ligação proteica. Metabolizado no fígado e no plasma sanguíneo. Como a biotransformação começa no plasma, sua meia-vida plasmática é mais curta do que a dos demais anestésicos (~ 40 min), propiciando a eliminação mais rápida pelos rins. Por essas características farmacocinéticas, a articaína reúne as condições ideais de ser o anestésico de escolha para uso rotineiro em adultos, idosos e pacientes portadores de disfunção hepática. Toxicidade é semelhante à da lidocaína. A presença de um anel tiofeno em sua estrutura química parece ser responsável pela maior difusão tecidual da articaína, permitindo seu uso em técnica infiltrativa, mesmo na mandíbula, dispensando assim o uso de técnicas anestésicas de bloqueio. Já foram documentados alguns casos em que foi possível realizar exodontias na maxila apenas com a infiltração de articaína na região vestibular. Seu uso em técnicas de bloqueio regional tem sido associado a um aumento na incidência de parestesia, provavelmente devido à concentração de 4%, maior do que a dos demais anestésicos disponíveis no Brasil. BUPIVACAÍNA Sua potência anestésica é 4 vezes maior do que a da lidocaína. Por ser mais potente, sua cardiotoxicidade também é 4 vezes maior em relação à lidocaína. Por isso, é utilizada na concentração de 0,5%. Ação vasodilatadora maior em relação à lidocaína, mepivacaína e prilocaína. Quando associada à epinefrina, apresenta, em técnica de bloqueio do nervo alveolar inferior, tempo de latência variando de 10- 16 min na região de molares e pré-molares. Possui longa duração de ação. No bloqueio dos nervos alveolar inferior e lingual, produz anestesia pulpar por 4 h e em tecidos moles, por até 12 h. Meia-vida plasmática de 2,7 h. Metabolizado no fígado e eliminado pelos rins. Não é recomendada para pacientes < 12 anos, pelo maior risco de lesões por mordedura do lábio, em razão da longa duração da anestesia dos tecidos moles. BENZOCAÍNA Único anestésico éster disponível no Brasil. É empregado apenas como anestésico tópico ou de superfície. Na concentração de 20%, a benzocaína, após aplicação por 2 min, promove anestesia da mucosa superficial (previamente seca), diminuindo ou eliminando a dor à punção da agulha, especialmente na região vestibular. Na região palatina essa ação é menos eficaz, da ANESTESIA LOCAL mesma forma que no local de punção para o bloqueio dos nervos alveolar inferior e lingual. VASOCONSTRITOR Todos os sais anestésicos possuem ação vasodilatadora. Portanto, quando são depositados próximos das fibras ou dos troncos nervosos que se pretende anestesiar, a dilatação dos capilares sanguíneos da região promove sua rápida absorção para a corrente circulatória, limitando em muito o tempo de duração da anestesia. Além disso, o risco de toxicidade é aumentado quando se empregam grandes volumes da solução ou quando ocorre uma injeção intravascular acidental, especialmente em relação ao SNC. Por esse motivo, a associação de vasoconstritores aos sais anestésicos produz uma interação farmacológica desejável, pois essa ação vasoconstritora faz com que o sal anestésico fique por mais tempo em contato com as fibras nervosas, prolongando a duração da anestesia e reduzindo o risco de toxicidade sistêmica. Ainda por meio da ação vasoconstritora, não apenas a vasodilatação exercida pelos anestésicos é revertida, como também a diminuição afetiva do calibre do vaso, podendo ser observado uma isquemia no local de injeção. Assim, outro importante efeito observado é a hemostasia, ou seja, redução da perda de sangue nos procedimentos que envolvem sangramento. CLASSIFICAÇÃO No Brasil, o cirurgião-dentista dispõe de soluções anestésicas locais que contêm vasoconstritores de dois tipos: aminas simpatomiméticas ou felipressina. As aminas simpatomimética: em sua estrutura pode apresentar ou não um núcleo catecol, daí serem chamadas, respectivamente, de catecolaminas ou não catecolaminas. Catecolaminas: Epinefrina, norepinefrina e corbadrina. São sinônimos de adrenalina, noradrenalina e levonordefrina, respectivamente. Não catecolaminas: Fenilefrina. As aminas simpatomiméticas agem sobre os receptores adrenérgicos, encontrados na maioria dos tecidos do organismo. Esses receptores são de dois tipos: alfa (α), com os subtipos α1 e α2, ou beta (β), com os subtipos β1, β2 e β3. A ação vasoconstritora é exercida pela interação com os receptores a. EPINEFRINA É o vasoconstritor mais utilizado em todo o mundo, devendo ser o agente de escolha para a quase totalidade dos procedimentos odontológicos em pacientes saudáveis, incluindo crianças, gestantes e idosos. Após a infiltração na maxila ou o bloqueio mandibular, a epinefrina promove a constrição dos vasos das redes arteriolar e venosa da área injetada por meio da estimulação dos receptores α1. Ao ser absorvida pela corrente sanguínea e dependendo do volume injetado, interage bom receptor B1 no coração. Aumentando a frequência cardíaca, força de contração e o consumo de oxigênio do miocárdio. Por outro lado, produz dilatação das artérias coronárias, levando a um aumento do fluxo sanguíneo coronariano. Além disso, liga-se ainda aos receptores β2, promovendo a dilatação dos vasos sanguíneos da musculatura esquelética. Por essas ações, a dosagem de epinefrina deve ser minimizada para os pacientes com doença cardiovascular, particularmente as doenças cardíacas isquêmicas, como a angina do peito ou história de infarto do miocárdio. O bom senso fala a favor de se empregar soluções anestésicas com epinefrina na concentração de 1:100.000, que também produz um bom grau de hemostasia. CONTRAINDICAÇÕES Hipertensos (PA sistólica > 160 mmHg ou diastólica > 100 mmHg). História de infarto agudo do miocárdio, com capacidade metabólica < 6 MET (equivalentes metabólicos), sem liberação ANESTESIA LOCAL para atendimento odontológico por parte do cardiologista. Período < 6 meses após acidente vascular encefálico. Angina do peito instável. Arritmias cardíacas. Insuficiência cardíaca congestiva. Hipertireoidismo não controlado. Alergia a sulfitos. Usuário de drogas ilícitas. NOREPINEFRINA Atua nos receptores α e β, com predomínio acentuado sobre os receptores α (90%), β1 (10%). Não apresenta vantagens sobre a epinefrina, tendo 25% da potência vasoconstritora desta. Seu uso em odontologia está sendo cada vez mais restrito devido as reações adversas decorrentes de hipertensão arterial. CORBADRINA (LEVONORDEFRINA) Atua por meio da estimulação direta dos receptores α (75%), com alguma atividade em β (25%). Tem somente 15% da ação vasopressora da epinefrina, sem nenhuma vantagem em relação a esta. FENILEFRINA É um α-estimulador por excelência (95%), exerce pequena ou nenhuma ação nos receptores β1. Apesar de apresentar apenas 5% da potência vasoconstritora da epinefrina, na concentração empregada (1:2.500), pode promover vasoconstrição com duração mais prolongada.4,18 Em contrapartida, nos casos de sobredosagem de fenilefrina (relativa ou absoluta), os efeitos adversos também são mais duradouros, como o aumento da pressão arterial e cefaleia na região occipital. Não apresenta qualquer vantagem em relação à epinefrina. FELIPRESSINA Análogo sintético da vasopressina (hormônio antidiurético), está contida em soluções cujo sal anestésico é a prilocaína. A vasoconstrição promovida pela felipressina é decorrente de sua ação sobre os receptores V1 da vasopressina, presentes no músculo liso da parede dos vasos sanguíneos, com ação muito mais acentuada na microcirculação venosa do que na arteriolar com ativação da fosfolipase C e liberação de cálcio. Por esse motivo, tem valor mínimo no controle da hemostasia, o que explica o maior sangramento observado durante os procedimentos cirúrgicos, quando se empregam soluções que contêm esse vasoconstritor, em relação às que contêm epinefrina ou outros agentes simpatomiméticos. OUTROS COMPONENTES DAS SOLUÇÕES ANESTÉSICAS Os anestésicos locais não são usados isoladamente, mas sob a forma de soluções, que podem conter, além do sal anestésico, um vasoconstritor, um veículo (geralmente água bidestilada) e um antioxidante. Nas soluções anestésicas locais que contêm vasoconstritores adrenérgicos (epinefrina, norepinefrina, corbadrina e fenilefrina), é incorporada uma substância antioxidante, o bissulfito de sódio, que impede a biodegradação do vasoconstritor pelo oxigênio, que pode penetrar no interior do tubete quando este for envasado ou difundir-se através do diafragma semipermeável durante o armazenamento. O bissulfito de sódio reage com o oxigênio, antes que ele possa agir sobre o vasoconstritor. A reação gera o bissulfato de sódio, que possui pH mais ácido do que o primeiro. A importância clínica disso é que o paciente pode sentir maior ardência ou queimação durante a injeção, um tubete mais “antigo” de anestésico com epinefrina ou similares, se comparado com um tubete novo. EFEITOS ADVERSOS DOS ANESTÉSICOS LOCAIS Alguns desses efeitos adversos tem como causa comum a sobredosagem absoluta ou ANESTESIA LOCAL relativa. Isso ocorre devido o profissional não haver o conhecimento das doses máximas dos sais anestésicos. Todos os anestésicos locais atravessam facilmente a barreira hematocefálica. Por isso, a toxicidade sistêmica dos anestésicos locais, após sua absorção para a corrente sanguínea, ocorre primariamente pela depressão do SNC, mais sensível à ação desses fármacos. Sobredosagem absoluta: injeção de um volume excessivo do anestésico (grande número de tubetes); Ex: injeções repetidas. Sobredosagem relativa: quando o anestésico é administrado em doses adequadas, mas no interior de um vaso sanguíneo, atingindo rapidamente concentrações muito superiores às habituais. Portanto, a injeção de uma solução anestésica local deve feita somente após a aspiração negativa e de forma lenta, na razão de 1 mL/ min, ou seja, para cada tubete anestésico (1,8 mL) o tempo de administração deve ser de ~ 90 s. DOSE MÁXIMA DE SAL ANESTÉSICO E VASOCONSTRITOR 1) Não há justificativa para o emprego de uma solução de lidocaína 3%, uma vez que isso não irá trazer benefícios adicionais à qualidade da anestesia e só aumentará o risco de toxicidade do anestésico; 2) A solução de mepivacaína 3% é empregada quase que exclusivamente em procedimentos de curta duração, com previsão de pouco sangramento; 3) Em pacientes que apresentam patologias que podem potencialmente diminuir a oxigenação (como insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal, alterações respiratórias e sanguíneas), recomenda-se a diminuição da dose máxima de prilocaína para 2,5 mg/kg;27 4) Apesar de a bupivacaína apresentar maior margem de segurança clínica, na prática não há necessidade de se ultrapassar o volume equivalente ao contido em 2-3 tubetes anestésicos; 5) Nessas doses conservadoras, e considerando pacientes saudáveis (ASA I), o fator limitante para a dose máxima é o sal anestésico e não o vasoconstritor. Como exceções a essa regra tem-se soluções que contêm epinefrina 1:50.000 e fenilefrina 1:2.500, cujo máximo total é de 5,5 tubetes. CÁLCULO DO VOLUME MÁXIMO DE SOLUÇÃO ANESTÉSICACRITÉRIO DE ESCOLHA DA SOLUÇÃO ANESTÉSICA LOCAL Além das condições sistêmicas do paciente, a solução deve ser escolhida em função do tempo de duração da anestesia pulpar e do grau de hemostasia exigido para um determinado procedimento. 1. Procedimento de curta a média duração, demandem anestesia pulpar >30min Lidocaína 2% com epinefrina 1:100.000 ou 1:200.000. ANESTESIA LOCAL Mepivacaína 2% com epinefrina 1:100.000. Articaína 4% com epinefrina 1:100.000 ou 1:200.000. Prilocaína 3% com felipressina 0,03 UI/mL Em procedimentos que haja necessidade de controle do sangramento, a escolha deve recair nas soluções que contenham epinefrina 1:100.000. 2. PROCEDIMENTOS MUITO INVASIVOS OU DE MAIOR TEMPO DE DURAÇÃO Tratamentos endodônticos complexos, exodontias de inclusos, cirurgias plásticas periodontais, colocação de implantes múltiplos, enxertias ósseas). Intervenções na maxila Bloqueio regional: Lidocaína 2% ou mepivacaína 2% com epinefrina 1:100.000. Técnica infiltrativa: Articaína 4% com epinefrina 1:100.000 ou 1:200.000. Intervenções da mandíbula Bloqueio regional: Lidocaína 2% ou mepivacaína 2% com epinefrina 1:100.000. Bupivacaína 0,5% com epinefrina 1:200.000. Os bloqueios regionais na mandíbula podem ser complementados pela infiltração de articaína 4% com epinefrina 1:200.00.
Compartilhar