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100 Unidade III Unidade III A arte contemporânea parece ser o “bicho de sete cabeças” do nosso tempo, a esfinge sedenta de devorar-nos diante das diversas questões a que não sabemos responder. Reconhecemos o estranhamento diante de certas “obras de arte”, às vezes duvidamos serem “arte”, dado o seu caráter aparentemente banal, utilizando recursos, estruturas e objetos do cotidiano. A arte contemporânea tornou-se a tachação mais rápida que o espectador faz quando não consegue estabelecer relação com uma obra de arte: aquilo que não faz sentido vai para a “gaveta” da arte contemporânea. Começaremos por abordar a difícil tarefa de definir arte contemporânea, apresentando a complexidade da qual o termo deriva. São dois os contextos: a pós-modernidade e o regime de comunicação em contraposição à noção de modernidade e seu respectivo regime de consumo. Conheceremos mais a fundo o artista Marcel Duchamp, aqui apresentado como “embreante” da arte contemporânea no interior da arte moderna. A seguir, observaremos algumas das diversas tendências da arte contemporânea, apresentando suas características, ideias principais e os artistas mais representativos de cada um deles. Esperamos que o aluno obtenha com essa leitura uma ampliação de seu repertório sobre arte, artistas e movimentos contemporâneos. Que aborde cada um deles sem receios, tocando-os com unhas, mãos inteiras, braços e todo o seu corpo racional, sensorial e emocional. Que se deixe envolver, compreendendo termos e conceitos de forma alargada e contextualizada, de modo que realize ele próprio a antropofagia. A antropofagia é um termo oriundo do Manifesto Antropofágico, texto publicado em 1928 por Oswald de Andrade, e é definido pela capacidade canibalesca de deglutir formas culturais diversas e, a partir delas, produzir coisas novas. 7 A COMPLEXIDADE DO TERMO Complexus significa o que foi tecido junto; de fato, há complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico), e há um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si. Por isso, a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade. Edgar Morin “Contemporâneo” é uma palavra que possui como sinônimos “coetâneo” e “coevo”, com o sentido de ser do mesmo tempo ou da mesma época de algo ou alguém: por exemplo, pode-se dizer que Vincent Van Gogh era contemporâneo de Paul Gauguin. Entretanto, por “contemporâneo” também podemos compreender algo que seja do tempo atual, por exemplo, quando dizemos que uma peça de mobiliário é 101 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS de design contemporâneo. Já a palavra “arte”, vista sob a perspectiva de sua origem do latim ars, significa “técnica, habilidade, talento e saber fazer”. Contudo, o termo “arte” tem ganhado definições muito mais abrangentes do que sua origem latina, de acordo com as épocas e as culturas que o abordam. Arte contemporânea não abarca apenas uma justaposição dessas duas palavras. Em conjunto, estas formam um conceito que, quando utilizado, refere-se a uma abordagem específica da história da arte e à produção dos artistas. Para tentar dialogar com esse conceito e compreendê-lo ao menos em algumas de suas faces, resolvemos assumi-lo como um termo que se constrói a partir do pensamento complexo. Não nos referimos ao “pensamento complexo” como um pensamento “complicado”, mas trazemos para a discussão a ideia de “complexidade” do antropólogo, sociólogo e filósofo francês Edgar Morin. O pensamento complexo implica um modo de pensar em forma de rede, cujo conhecimento do mundo e das coisas se dá a partir da relação entre os diversos contextos e as diversas partes que compõem o objeto de estudo. Na complexidade, a lógica linear, ou seja, o pensamento etapista que pressupõe que se deva passar por certas fases para se obter a resposta ou solução de um problema, é compreendida como simplificadora e reducionista, pois elimina o objeto de seu contexto e aplica o mesmo método independentemente das características do objeto estudado. Esse tipo de pensamento, que Morin chama de “pensamento representacionista”, compreende o conhecimento como o processo da mente humana de absorver do mundo externo informações e representá-las em nossa mente. Nesta perspectiva de conhecimento, há verdades absolutas. Já o pensamento complexo de Morin propõe que o conhecimento seja construído a partir da relação dinâmica entre o sujeito que aprende, o objeto de estudo e seus diversos contextos, e esta relação, ao modificar-se, altera também a verdade ou conclusões alcançadas, não sendo estas, pois, reconhecidas como “absolutas”, mas passando a existir como pluriverdades, válidas para aquele determinado momento, diálogo e contexto. Pensar a arte contemporânea a partir do pensamento complexo é assumi-la como termo em constante mutação, que se altera na medida em que modificamos o contexto em que a enquadramos. Aceitar a sua complexidade permite-nos abordá-la conscientes da sua infinitude, sendo a leitura que travaremos a seguir, tal como os contextos que utilizaremos, apenas algumas das diversas relações possíveis a se fazer sobre a arte contemporânea. Sobre essa característica do pensamento complexo: Um pensamento complexo nunca é um pensamento completo. Não pode sê-lo, porque é um pensamento articulante e multidimensional. A ambiguidade do pensamento complexo é dar conta das articulações entre domínios disciplinares fraturados pelo pensamento desagregador (um dos principais aspectos do pensamento simplificador). O pensamento simplificador isola o que separa, oculta tudo o que religa. Para esse estilo de pensamento, compreender e entender é interferir e mutilar a dinâmica criadora da multiplicidade do real. Nesse sentido, o pensamento complexo aspira a um conhecimento multidimensional e poiético. Sabe, porém, desde o início, que o conhecimento completo é impossível: um dos axiomas da complexidade é a impossibilidade, inclusive teórica, de uma onisciência. Torna sua a frase de Adorno, “a totalidade é a não verdade”. Reconhece também o estado transitório e quase esquemático de todo conceito. Pressupõe o 102 Unidade III reconhecimento de um princípio de incompletude e de incerteza. Pressupõe, também, por princípio, o reconhecimento dos vínculos entre as entidades que nosso pensamento deve necessariamente diferenciar entre si, mas não isolar. O pensamento complexo está animado por uma tensão permanente entre a aspiração a um saber não parcelado, não dividido, não reducionista e o reconhecimento do inacabado e incompleto de todo conhecimento. Poderíamos dizer que o caminho do conhecimento é para o pensamento complexo o que para Paul Valéry era a elaboração de um poema, algo que nunca se termina (MORIN; CIURANA; MOTA, 2003, p. 54). Assim, adotamos aqui a arte contemporânea em seu estado transitório de formulação e reformulação constantes. Posicionamo-nos desta maneira para que o leitor seja capaz de perceber o caráter de incerteza e de incompletude que ronda o conceito de “arte contemporânea”, em que cada autor – os que aqui apresentaremos e outros que os leitores poderão vir a conhecer – irá abordá-lo de maneira diferenciada, cabendo ao leitor tecer a rede que conecta todos esses olhares. Um bom exemplo para iniciarmos nosso estudo sobre arte contemporânea é o trabalho do escultor Frans Krajcberg. Nascido na Polônia, adotou o Brasil como pátria e dele tornou-se cidadão. Naturalizado brasileiro, é uma presença forte no cenário da arte contemporânea nacional, principalmente por adotar elementos naturais em seus trabalhos. Sua arte representa a natureza brasileira utilizando diferentes técnicas e materiais, como pedra, cipós trançados, troncos de árvores e os relevos naturais deixados pelo mar na praia. No início, usou a pintura para se manifestar e procuravanas rochas e terras mineiras sua coloração para pintar suas telas. Mais tarde, buscou nos troncos das árvores devastadas pelas queimadas do Mato Grosso e nos cipós mortos por parasitas dos mangues da Bahia a inspiração para seus trabalhos como escultor. O objetivo de suas esculturas é dar vida a algo morto da natureza. Figura 91 – Esculturas de Troncos Queimados (2008), de Krajcberg, feita de árvores das queimadas do Mato Grosso Fonte: Proença (2009, p. 261). 103 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS 7.1 Modernidade e pós-modernidade Por que há de ser a arte contemporânea uma esfinge questionadora? O que dificulta ao público ler e relacionar-se com esse tipo de produção artística? Talvez a perda de referências estéticas, talvez a utilização de critérios válidos apenas para as obras do passado. Mudam-se os tempos e reconfigura-se a atuação do artista diante deste mundo mutável. Entretanto, sem compreendermos aspectos dessas alterações, não visualizaremos nem a transição, nem as novas proposições. Dois conceitos são basilares na transformação da arte mais recente: a modernidade e a pós-modernidade. As pesquisadoras em cultura visual estadunidenses Marita Sturken e Lisa Cartwright apresentam em seu livro Practices of Looking: An Introducting to a Visual Culture a modernidade e a pós-modernidade como formas de olhar distintas que promoveram transformações na esfera artística. Iremos nos dedicar agora a falar sobre esses dois tópicos específicos, de modo a tentar compreender a noção de pós-modernidade como intrínseca à arte contemporânea. Segundo Sturken e Cartwright (2001), a transição da modernidade para a pós-modernidade não se deu como um marco. Modernidade e pós-modernidade não são concepções separadas por períodos específicos, mas coexistem no mesmo contexto. Isto se evidencia no próprio “pós-“ do termo “pós-modernidade”, que ainda dialoga com valores presentes na modernidade, dando-lhes respostas e apresentando-lhes novos desenvolvimentos. Há outros autores que situam a pós-modernidade como pertencente ao contexto surgido após a Segunda Guerra Mundial (1945), outros após Maio de 1968, e outros ainda a partir da queda do Muro de Berlim (1989). Observação “Maio de 1968” foi a maior greve-geral da história, sendo iniciada por um movimento estudantil, na França. Esse acontecimento marcou uma série de conquistas sociais que persistem até os dias de hoje, como a igualdade de direitos civis, a liberação sexual e o reconhecimento das lutas dos estudantes e da diversidade cultural. 7.2 A modernidade Sturken e Cartwright (2001) situam o surgimento da modernidade a partir do Iluminismo, alcançando seu auge no final do século XIX e início do século XX. Esse auge foi marcado por um grande êxodo rural observado nos países ocidentais, principalmente europeus, devido à crescente industrialização. A experiência da modernidade foi marcada pelo crescimento da urbanização, industrialização e transformação tecnológica, consequências do processo de industrialização capitalista e de sua fé ideológica no progresso. Nesse enquadramento, a modernidade fazia crer num sentido linear de progresso, em que as modificações tecnológicas e sociais eram imperativas e benéficas para toda a sociedade. 104 Unidade III Lembrete O Iluminismo, também conhecido como “Século das Luzes”, foi um movimento cultural do século XVIII que se caracterizou pela rejeição da tradição e por um grande desenvolvimento no campo científico, tendo como base o conceito da razão. A esperança no futuro teve como consequência o rompimento com as tradições, pois estas impediriam a concretização das mudanças. Diversos foram os movimentos artísticos – os “ismos” – criados de modo a romper com as convenções do passado, todos eles com seus manifestos publicados com a finalidade de garantir sua autenticidade e fixação. Havia a necessidade de se enxergar a realidade de novas maneiras. Assim, novos modos de representar o mundo, principalmente na pintura, foram criados, em que a materialidade da obra, a sua forma, sobrepunha-se ao seu conteúdo. A noção de sujeito na modernidade, segundo as autoras, pode ser definida a partir da ideia proposta pelo filósofo francês do século XVII, René Descartes: “Penso, logo existo”. Disso resulta uma noção de sujeito que adquirirá a sua presença individual a partir da ação do pensar, tornando-se portador de uma autoconsciência. O sujeito é uma entidade universal, portanto indiferente aos enquadramentos políticos, sociais, econômicos e culturais nos quais poderia ter se desenvolvido como pessoa. Para além disso, a obra artística na modernidade era tida como aurática, ou seja, portadora de uma autenticidade normalmente relacionada ao gênio criador do artista, algo que, na pós-modernidade, será posto em discussão. Para as autoras, a obra de arte moderna, pintura, escultura ou cinema, possui um discurso metalinguístico, cujas características principais ficam retidas nos aspectos plásticos do trabalho. Metalinguagem é quando se utiliza uma linguagem para falar dela mesma. Assim, a pintura deixa de fazer referência a um outro conteúdo – por exemplo, uma cena histórica – para passar a falar sobre o próprio ato de pintar. Sturken e Cartwright chamam essa característica de reflexivity, que aqui traduziremos como reflexividade, em que “a obra artística comenta em si o seu próprio processo de produção” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 248, tradução nossa), sem fazer referência ao contexto no qual foi elaborada. “Reflexividade é a prática de tornar os observadores conscientes do significado material e técnico da produção ao evidenciá-los na imagem ou ao utilizá-los como conteúdo da produção cultural” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 248, tradução nossa ). O modernismo introduziu a reflexividade na esfera da arte, principalmente com relação à forma e ao aspecto plástico da própria obra de arte. O pós-modernismo deu continuidade ao processo, porém de uma maneira diferente, como veremos a seguir. A reflexividade possibilitou que a obra de arte moderna se constituísse como autorreferencial, pois seu conteúdo e sua forma fazem referência a ela mesma, conferindo-lhe a característica da mobilidade e a autonomia para circular livremente. 105 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Saiba mais Um bom exemplo da reflexividade modernista é o filme Um Homem com uma Câmera, do cineasta russo Dziga Vertov. Vertov utiliza a linguagem cinematográfica para falar dela mesma e da vida cotidiana da cidade. UM HOMEM com uma câmera. Dir. Dziga Vertov. União Soviética, 1929. 68 min. Na arte moderna a percepção de uma obra de arte por um observador era tida como direta, sem considerar que existiria mediação entre obra e observador, ou seja, pouco interferindo nesse processo de comunicação os contextos nos quais obra e observador estavam imersos. Essa ideia de imediação entre a obra e seu fruidor reflete uma perspectiva que entende a existência de uma única verdade que pode ser alcançada quando acessados os canais certos de conhecimento, dando-nos uma perspectiva de que, naquele instante, as noções representacionistas da cognição eram dominantes – tal como falamos anteriormente sobre o pensamento representacionista. Outro fato que se desenvolveu junto com a autorreferencialidade da obra e o seu nomadismo foi que a arte moderna, segundo Crimp (2005), surgiu presa em um movimento capitalista, mas camuflada por um objetivo maior e global, tornando-se “mercadoria especializada de luxo”. A autonomia e o nomadismo da arte moderna eram, pois, também a sua condição de circulação, “do estúdio para a galeria comercial, dali para a residência do colecionador, desta para o museu ou para o saguão da sede de alguma grande empresa” (CRIMP, 2005, p. 137). 7.3 A pós-modernidade Na pós-modernidade, passa-se a desconfiar de diversas noções presentes na modernidade. Será o progresso mesmo bom para todos? Será que aquilo que dizem ser o certo e a verdade realmente pode ser aplicadopara toda a sociedade? Será que o sujeito pode ser definido em termos universais? Será que a experiência com a obra de arte é sempre pura e imediata? Diversas são as relações que se modificam. Descobertas na ciência questionaram a noção de verdade. A física quântica mostrou que o ponto de vista do observador altera o comportamento do objeto observado, colocando em pauta a ideia de incerteza e indeterminação. Essa nova perspectiva nos diz que verdades não são unânimes e que o contexto no qual o observador está inserido é também uma variável de considerável importância. O mundo Pós-moderno é percebido como complexo, tal como vimos em Morin, devido à ênfase nas relações que se dão em padrão de teia entre as diversas partes que compõem a sociedade. Tais relações podem ocorrer de maneiras diversas, permitindo conceber o sujeito como uma entidade plural e diversificada. Isso gera a ideia de subjetividades múltiplas, concebidas a partir de variadas categorias como raça, gênero, classe e idade, diferindo assim do sujeito moderno, universal e único. Da mesma 106 Unidade III forma, as ideias de autenticidade e gênio criador, tão presentes na arte moderna, são postas em discussão, tornando complexos o processo criativo e a esfera da arte. A arte pós-moderna acredita que nada de novo possa ser inventado e passa a utilizar a cópia com o mesmo valor que o original, colocando em questão as ideias de originalidade e autenticidade. Plurarismo, multiplicidade e diversidade, segundo as autoras, são termos que caracterizam a pós-modernidade e a noção de subjetividade. Reunidos, os sujeitos passam a lutar e a reivindicar por causas coletivas. A segunda metade do século XX acolhe diversas revoluções sociais, como o feminismo, as causas GLS, o ambientalismo e a contracultura. Busca-se questionar as estruturas da sociedade traçando relações de força e controle, revelando ideologias e valores que justificavam a dominação de um humano sobre outro. Essa nova compreensão sobre o sujeito se estendeu aos observadores-leitores, que passam agora a ser abordados em sua complexa e distinta teia cultural, fazendo com que emerja o entendimento de que as imagens são interpretadas de maneiras diferentes por sujeitos diferentes. A obra adquire um campo polissêmico, ou seja, de muitos significados. No pós-modernismo, os artistas “produzem obras que examinam reflexivamente sua própria posição em relação à arte ou ao contexto institucional da obra de arte” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 254, tradução nossa). A reflexividade ainda existe, mas não está centrada na linguagem e na plasticidade do próprio trabalho: dialoga diretamente com o próprio sistema da arte em si e seu contexto de produção. Por isso, “a arte pós-moderna não está preocupada em representar a realidade, mas sim em repensar a função da arte e enfatizar o papel que o contexto institucional tem na produção de significado” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 263, tradução nossa). Para além dessas características, Sturken e Cartwritght (2001) colocam que a reflexividade na arte pós-moderna passou a rever o papel do observador com relação à imagem ou à narrativa, por vezes fazendo o trabalho artístico criar a consciência, no observador, de estar a observar e, por consequência, a afirmar a existência e a recriação – por meio de sua compreensão – da própria obra. Podemos perceber mais claramente essa situação quando os artistas minimalistas passam a utilizar o espelho como material basilar do trabalho –abordaremos mais adiante o minimalismo. Na pós-modernidade, as imagens estabelecem outro nível de relação com as pessoas. As autoras trazem para o diálogo o pensamento do sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard, que nos apresenta o paradigma da representação – que faz referência ao real – como sendo substituído pelo paradigma da simulação – em que a imagem não busca mais representar o real, mas, sim, ser mais real do que o real, borrando os limites entre o real e o virtual. Cria-se aí um novo ponto de situação, o da hiper-realidade, em que “o hiper-real ultrapassa o real, e o simulacro cresce, em parte, através de novas formas de mídia, como as novas formas de existência pós-moderna� (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 237, tradução nossa). O simulacro cria superfícies de mediação que, como foi dito, apresentam-se mais reais do que o real. Na pós-modernidade, as experiências humanas são mediadas não somente pelas superfícies de contato e tecnologias, mas também pelas linguagens, imagens, pelos contextos sociais e históricos de vida que representam o lugar de imersão do observador. O modernismo não 107 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS tinha essa perspectiva, pois ainda considerava a experiência como pura, clara e direta, na qual a informação, ou conhecimento, chegava ao destinatário da forma que o emissor havia articulado, desconsiderando todo o contexto. Saiba mais O livro O que é Pós-moderno, de Jair Ferreira dos Santos, fala de maneira sucinta e clara sobre o pós-modernismo. Na parte intitulada “Bye, Bye, real”, o autor apresenta uma síntese sobre o tema que acabamos de abordar. SANTOS, J. F. O que é Pós-moderno. São Paulo: Brasiliense, 2004. Com a ajuda de Sturken e Cartwright (2001) apresentamos pistas e indícios, iniciando um caminho com alguns dos olhares possíveis para algumas das faces da modernidade e da pós-modernidade. Nossa intenção é possibilitar a compreensão das manifestações de arte contemporânea a partir da ótica da pós-modernidade, pois aquilo que é cunhado normalmente como “arte contemporânea” historicamente se associa com o modo Pós-moderno de estar no mundo e olhar para ele, sendo para isso necessário perceber também a modernidade que a antecede. Caberá ao aluno continuar a percorrer esse caminho caso se interesse em abordar a arte contemporânea a partir dessa perspectiva, conhecendo novos rostos da multifacetada pós-modernidade. 7.4 Regimes da arte Acabamos de ver como o enquadramento na pós-modernidade contextualiza e amplifica o território de atuação dos artistas no século XX, alterando, por consequência, os modos de produção e os produtos artísticos na arte contemporânea. Traremos agora uma perspectiva proposta pela filósofa e artista plástica francesa Anne Cauquelin. Temos como referência o livro Arte Contemporânea: Uma Introdução, no qual a autora aborda a arte contemporânea a partir do próprio sistema da arte ao definir regimes que determinam a distinção entre a arte moderna e a contemporânea, respectivamente denominadas “regime de consumo” e “regime de comunicação”. Cauquelin (2005) nos diz que há um “estado contemporâneo” para o sistema da arte e que “esse sistema não é mais o que prevaleceu até recentemente; ele é o produto de uma alteração de estrutura de tal ordem que não se podem mais julgar nem as obras, nem a produção delas de acordo com o antigo sistema” (CAUQUELIN, 2005, p. 15). Assim, faz-se necessário compreender primeiro o sistema “do passado”, ou seja, o sistema da arte moderna, para então perceber como o sistema atual da arte traz reverberações, respostas e novidades, distinguindo-se do anterior. 108 Unidade III 7.4.1 Regime de consumo ou arte moderna Segundo Cauquelin (2005), a sociedade moderna formula-se durante a transição de um regime industrial para um regime de consumo, em meados do século XIX. Essa sociedade ficou marcada pelo valor do progresso – científico, tecnológico e social –, pela ideia do trabalho que possibilita o acesso à propriedade e pelo aumento da importância da educação e das boas maneiras – que garantirá oportunidades num futuro próximo –, desenhando assim o esquema produção-distribuição-consumo, que passará a ser o esquema vigente de organização dessa sociedade. O seu culminar pode ser explícito no termo criado pelo escritor francês Guy Debord: “a sociedade do espetáculo”. O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediatizada por imagens […] O espetáculo, compreendidona sua totalidade, é simultaneamente o resultado e o projeto do modo de produção existente. Ele não é um complemento ao mundo real, um adereço decorativo. É o coração da irrealidade da sociedade real. Sob todas as suas formas particulares de informação ou propaganda, publicidade ou consumo direto do entretenimento, o espetáculo constitui o modelo presente da vida socialmente dominante. Ele é a afirmação onipresente da escolha já feita na produção, e no seu corolário — o consumo. A forma e o conteúdo do espetáculo são a justificação total das condições e dos fins do sistema existente. O espetáculo é também a presença permanente desta justificação, enquanto ocupação principal do tempo vivido fora da produção moderna. [...] A sociedade que repousa sobre a indústria moderna não é fortuitamente ou superficialmente espetacular, ela é fundamentalmente espetaculista. No espetáculo da imagem da economia reinante, o fim não é nada, o desenvolvimento é tudo. O espetáculo não quer chegar a outra coisa senão a si mesmo. [...] Na forma do indispensável adorno dos objetos hoje produzidos, na forma da exposição geral da racionalidade do sistema, e na forma de setor econômico avançado que modela diretamente uma multidão crescente de imagens-objetos, o espetáculo é a principal produção da sociedade atual (DEBORD, 2010, p. 38-42, grifo do autor). Há, portanto, uma grande máquina industrial, espetacular, que produz não apenas mercadorias, mas também novas formas de consumo e mercado. Até então, na História, não se havia desenvolvido uma sociedade estruturada no regime de consumo, por isso sua distinção gera também a sua nomeação. Saiba mais Guy Debord criou o filme A Sociedade do Espetáculo em 1967, feito a partir de excertos do livro que leva o mesmo nome. Nele, você poderá ter acesso às ideias-chave do autor, apresentadas de maneira resumida. A SOCIEDADE do espetáculo. Dir. Guy Debord. França, 1974. 90 min. 109 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Cauquelin (2005) situa o início da arte moderna por volta dos anos 1860, marcada pela recusa, por parte dos artistas, à hegemonia representada pela Academia e pelos salões anuais – o principal deles, o Salão de Paris. A Academia era a instituição que legitimava ou deixava de legitimar os artistas, concedendo prêmios e gerando encomendas. Essa situação surge a partir do desenvolvimento industrial, em que: O enriquecimento da classe burguesa provoca uma afluência de compradores potenciais, ao mesmo tempo que os pintores reivindicam um estatuto menos rigidamente centralizador, menos autoritário – liberando-os da imposição do Salão de Paris, com seu júri reconhecendo o mérito das obras, ou excluindo das paredes pintores que não agradam. Reinvindicação de um sistema mais livre, mais maleável, do direito à exposição (CAUQUELIN, 2005, p. 34) Em resposta, obteve-se a descentralização dos salões; porém, ainda assim, seria necessário que de alguma forma as produções artísticas fossem legitimadas diante de um público comprador, garantindo-lhes reputação e a venda das obras: criou-se o mercado independente, configurado na relação “marchand-crítico”. Portanto, a legitimação permanecia necessária, mas, com o crescente aumento da demanda de obras artísticas e com o aumento do número de artistas, fazia-se imperativo criar uma alternativa que desse uma resposta ao problema. Observação Marchand é a figura responsável por negociar e vender as obras de arte. A figura do “crítico” de arte surge com a tarefa de “acompanhar com seus comentários – apresentar, apoiar ou vituperar – determinado artista ou determinada exposição”, fabricando a opinião e contribuindo para “a construção de uma imagem da arte, do artista, da obra ‘em geral’ – e de determinado artista ou grupo de artistas ao qual se ligará especialmente” (CAUQUELIN, 2005, p. 37-38). Assim, o crítico fará a vez do júri dos salões, promovendo alguns artistas para renegar outros. Como fica o artista nesse cenário? “O artista se isola de um sistema que lhe garantia a segurança, tornando-se uma figura marginal. Submetido às flutuações do mercado – devidas em boa parte à concorrência, ao número crescente de artistas, ele se aflige por sua sobrevivência e se coloca na dependência de marchands e críticos” (CAUQUELIN, 2005, p. 46). À espera da legitimação e das novas encomendas vindas do mercado, o artista aparentemente autônomo em sua produção vê-se dependente do sistema de consumo. Posicionar-se em grupo permite que ele seja mais facilmente consumido do que se permanecer sozinho, uma vez que “um produto único atrai menos consumidores do que uma constelação de produtos da mesma marca” (CAUQUELIN, 2005, p. 47). Por conta disso, às vezes as singularidades dos artistas eram construídas por meio de biografias relatando extravagâncias e excentricidades, reafirmando a ideia do “espetáculo”. Contudo, o sistema de consumo quer manter o seu ritmo e garantir a continuidade de produção e possibilita que o artista 110 Unidade III permaneça intacto como produtor, afastado de uma ideia de comercialização, para que sua credibilidade com o público fique inabalável. Os consumidores desse sistema de arte distinguem-se entre colecionadores, diletantes e público. Os colecionadores são os grandes burgueses e aristocratas esclarecidos, agentes ativos do mercado que costumam consumir variedade e qualidade. Por vezes, suas obras – as coleções – acabam tornando-se tesouro público por meio de uma doação, fazendo a memória do colecionador permanecer para a posteridade. Os diletantes são aqueles que compram por prazer e na intenção de fazer um bom negócio. O público é formado pelos observadores passivos, que consomem as obras com o olhar e ajudam a disseminá-la por meio de boatos, transformando a imagem do artista e da obra. Porém, esse público se recusava a levar a sério as obras de vanguarda. Eles estranhavam a vanguarda – a arte moderna – tal como nós estranhamos hoje a arte contemporânea. Eles abordavam a vanguarda, julgando-a e olhando-a, com os mesmos critérios que utilizavam para a arte acadêmica. Vê-se que os problemas se repetem cem anos depois. Na intenção de levar o conhecimento da arte para o grande público, os governantes, juntamente com os artistas, se esforçam para que o espectador comece a ter contato com a arte contemporânea e, assim, tente entendê-la. Em São Paulo, na Praça da Sé, encontra-se uma escultura que, em uma primeira impressão, se parece com duas enormes lagartas. Com um movimento dançante, uma lagarta levanta a outra para um salto gigante em seu voo rumo ao céu. O autor dessa obra é Caciporé Torres, escultor paulistano, que usa em seus trabalhos o ferro fundido e o aço inox em estado de sucata. É com esses materiais que cria suas esculturas contemporâneas maciças, não figurativas, que, segundo o próprio artista, devem ser acessíveis a todas as pessoas. Por essa razão, as esculturas devem ser colocadas em grandes espaços públicos, como os parques e praças das cidades. Figura 92 – Voo (1979), escultura de Caciporé Torres Fonte: Proença (2009, p. 260). 111 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS 7.4.2 Regime de comunicação ou arte contemporânea Cauquelin (2005) afirma que o sistema da arte contemporânea não pode ser considerado apenas como o aumento do regime de consumo, pois houve mudanças estruturais que o regime não justifica. Assim, a autora apresenta uma constatação: “nós passamos do consumo à comunicação” (CAUQUELIN, 2005, p. 56). Algo que talvez todos nós já soubéssemos, mas como isso repercute no sistema da arte? A sociedade da comunicação realiza-se a partir de cinco elementos “efetuadores”, ou seja, elementos possibilitadores de sua concretização: a noção de rede, o bloqueio ou autonomia, a redundância ou saturação, a nominação ou prevalência do continente sobre o conteúdo e a construção da realidade em segundo grau ou simulação (CAUQUELIN, 2005). A noção de rede implica “um sistema de ligações multipolar no qual podeser conectado um número não definido de entradas, cada ponto da rede geral podendo servir de partida para outras microrredes” (CAUQUELIN, 2005, p. 59). Estamos todos conectados feito um sistema neuronal, e pouco importa a origem da informação, contanto que ela esteja circulando na rede. Logo, a noção do sujeito comunicante desaparece, dando lugar a uma produção global – pela ação da rede inteira – de comunicação. A autoria na rede representa dúvida, incerteza, chegando até a não existir. Bloqueio ou autonomia quer dizer que a rede é um sistema de memória e repetição, pois a mensagem circula pelos diversos pontos e nós da rede, indo, voltando e reproduzindo a mesma mensagem. Cada ponto, nó ou interseção na rede representa a rede total, não sendo possível definir um começo nem um fim. A redundância e a saturação são elementos que, ao mesmo tempo que garantem a circulação dos conteúdos pelos diversos pontos da rede de forma instantânea, anulam o grau de diferença entre as novidades que penetram na rede, pois todas se encontram no mesmo plano de circularidade. Este grau de indiferenciação cria a necessidade de se nominar objetos dentro da rede de modo a diferi-los. Segundo a autora, “uma sociedade nominativa se instaura, onde o nome funciona como identidade, classifica e designa uma particularidade” (CAUQUELIN, 2005, p. 62). O quinto elemento efetivador, a construção da realidade, está estritamente relacionado à linguagem: É por intermédio da linguagem que se estruturam não somente os grupos humanos, mas ainda a apreensão das realidades exteriores, a visão do mundo, sua percepção e sua ordenação. Assim, apaga-se pouco a pouco a presença positivada de uma realidade dada pelos sentidos, os sense data, em favor de uma construção de realidade de segundo grau, até mesmo de realidades no plural, da qual a verdade ou a falsidade não são mais marcas distintas. […] Significa que as intenções dos sujeitos, a intencionalidade – no sentido de vontades ou desejos próprios a um sujeito – cede a vez à intenção única de utilizar a linguagem para comunicar, pois a sintaxe, o léxico – em uma palavra, as regras da linguagem – se encarregam do restante. […] o desenvolvimento de linguagens artificiais e o uso cada vez mais generalizado delas alteram nossa visão da realidade. Constroem, pouco a pouco, outro mundo (CAUQUELIN, 2005, p. 63-64). 112 Unidade III Na sociedade de comunicação, a linguagem passa a ser o elemento indispensável para o seu funcionamento. Fica difícil dissociar os conceitos de simulacro e hiper-real de Jean Baudrillard, que vimos anteriormente, da proposição da autora de estabelecer novas realidades a partir da existência e emergência de diferentes linguagens. Enquando Baudrillard se refere à utilização da imagem na criação do simulacro, Cauquelin propõe o mesmo, porém com a linguagem. Os efeitos da comunicação no registro do mercado da arte constroem-se em relação aos efetuadores que acabamos de abordar. A rede do mercado da arte contemporânea possui a característica complexa – complexidade que vimos anteriormente em Edgar Morin –, na qual surgem diversos atores que introduzem informação. Dentre eles, destacam-se as redes internacionais de galerias e instituições culturais que criam, elas mesmas, os preços e a avaliação estética das obras e dos artistas, resultando no seu reconhecimento social. Será ressaltado o ator que, dentro da rede, possuir o maior número de conexões diretas com outros atores; portanto, aquele que tiver mais informações, oriundas da própria rede, o mais rápido possível. Esses atores que lidam com a passagem e fabricação da informação – dentre elas a cotação e o valor estético das obras – são considerados os produtores do regime de comunicação da arte contemporânea. Eles são capazes de fazer aquilo que Cauquelin chamou “antecipação do signo sobre a coisa” (CAUQUELIN, 2005, p. 68): antes mesmo de ter sido exposta, fazem a obra do artista, na forma de signo, circular na rede. Isso acaba por legitimar o que será exposto, uma vez que já estará em circulação. Os produtores, portanto, são aqueles que alimentam e produzem a rede e, por consequência, as obras. Serão considerados tanto mais ativos quanto maior o número e a diversidade de suas conexões. Assim, uma grande instituição só terá força se estiver posicionada dentro e em toda parte da rede. Entretanto, essas instituições são também as que encomendam as obras aos artistas e apresentam ao público o que é arte contemporânea, mas fazem-no a partir de um juízo de valor sedimentado pelos críticos e marchands já inseridos e a laborar no interior da rede, legitimando-se como se estivessem também dentro do circuito. Nessa situação, Cauquelin nos apresenta com clareza a formação de uma circularidade: Nós vemos, portanto, com relação a esses que chamamos produtores, estabelecer-se uma circularidade (um percurso em forma de anel): os grandes colecionadores-marchands que intervêm nas cotações, reconduzindo-as aos conservadores, que são exatamente os colecionadores do Estado e que são tidos como aqueles que intervêm no valor estético. Se uns estão interessados no benefício propriamente econômico, os outros trabalham em benefício da imagem cultural que valoriza a instituição que dirigem e, por isso, o Estado que a subvenciona (CAUQUELIN, 2005, p. 71). 113 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS A esses produtores juntam-se a impressa especializada – com assessores de imprensa, agências, jornalistas-críticos de arte –, experts e produtores e viajantes-comerciantes – estes últimos sempre atentos ao que acontece ao redor do mundo, importando e exportando informação. Assim, a crítica, que na arte moderna incorporava o juiz legitimador do circuito, sendo figura única e insubstituível, passa a ficar dispersa com o início da atuação dos profissionais da publicidade. O crítico começa a desempenhar diversos papéis, como curador, escritor ou expert. Na verdade, todas as funções ficam diluídas entre todos os atores, e poderíamos dizer que quase todos nesse sistema podem exercer a função de todos. Mais uma vez, como fica o papel dos artistas nesse regime? Bem, diversos são os produtores que têm os artistas e suas obras como seus objetos. Por isso, Cauquelin (2005) afirma que artistas e obras são elementos constitutivos das redes de comunicação, ao mesmo tempo que são os seus produtos. Ao vermos uma obra de arte contemporânea, estamos vendo a arte contemporânea no seu conjunto, pois ela carrega consigo todo o sistema que a legitima como tal. Por vezes, o artista é valorizado de acordo com o reconhecimento que obteve dentro da rede, contabilizando o número de exposições, se pertence ao acervo de museus e coleções, se há artigos e catálogos produzidos com sua obra, por fim, medindo o seu grau de visibilidade. O artista deve estar ao mesmo tempo em toda parte. Esse é o princípio da saturação e nominação que o faz ser absorvido pela rede, estar em circulação ao mesmo tempo que se diferencia. O artista passa a desempenhar um papel complexo e contraditório, em que: O artista que entra ou “é posto” na rede é obrigado a aceitar suas regras se quiser permanecer nela. Ou seja, renovar-se e individualizar-se permanentemente, sob pena de desaparecer dentro do movimento perpétuo de nominação que mantém a rede em ondas. Mas essa exigência de renovação e de individualização contradiz constantemente outra exigência: a da repetição, da redundância. Com efeito, para que sua obra sature a rede e seja mostrada em toda parte ao mesmo tempo, é preciso que seja reconhecida por um signo de identidade. É preciso, então, que se repita. Que faça eco de si mesma. Entre inovação e repetição obrigatória instala-se então uma espécie de desgaste, não de seu talento – estamos supondo que o artista o tenha –, mas de sua exposição cegante, exaustiva, sobre a qual nenhuma exibição ou operação de descoberta pode mais ser feita. […] Estratagemas de toda sorte entram então em ação […].De artista ele pode passar a curador de “exposição”, ou seja, produtor dessa vez, agente de sua própria publicidade, assegurando assim um bloqueio completo (CAUQUELIN, 2005, p. 77-78). Os consumidores da rede, os destinatários de todas essas informações, são os próprios gestores da rede, aqueles produtores do artista e da obra, pois consomem a arte depois de tê-la fabricado. 114 Unidade III Mais uma vez existe o bloqueio da rede, em que aquele que insere o elemento, criando conexões e repercussão, legitima-o e atribui-lhe valor – monetário e artístico –, fazendo-o porque será ele mesmo a consumi-lo, comprando e revendendo obras e artistas numa circularidade infinita. Já o público, que Cauquelin chama de “cidadãos comuns”, “é convidado ao espetáculo e não tem como não aquiescer” (CAUQUELIN, 2005, p. 79). O público não consegue julgar esteticamente as obras, mas deve entender que aquilo é arte contemporânea, fato comprovado pelo valor da obra e da cotação. O lugar de exposição, museu ou galeria, reafirma a dúvida de que o que está exposto é arte. Assim, o continente prevalece sobre o conteúdo: são a exposição e o lugar que afirmam “isto é arte”, e não as obras. A rede legitima-se, protegendo-se contra qualquer intempérie. E sobre a realidade de segundo grau e simulação? A arte contemporânea é a sua imagem, corresponde ao sistema de comunicação, e não a um dado objetivo. Cauquelin (2005, p. 81) pergunta-nos: “a arte continua sendo o que era ‘antes’, ligada a critérios estéticos, ou cedeu lugar a uma realidade que não tem mais nada a ver com o gosto, o belo, o gênio, o único, ou o conteúdo crítico?”. Responde: “a realidade da arte contemporânea se constrói fora das qualidades da própria obra, na imagem que ela suscita dentro dos circuitos de comunicação”. Assim, aqueles que tentam julgar a arte contemporânea a partir de critérios anteriores, fora do sistema de comunicação, veem-se deslocados e sem saber como agir diante dos novos valores. Os critérios do passado são “estéticos”, mas a arte contemporânea caracteriza-se pelo “artístico”. A autora difere os dois termos, “estético” e “artístico”, em que “estética é o termo que convém ao domínio de atividade onde são julgadas as obras, os artistas e os comentários que suscitam” (CAUQUELIN, 2005, p. 82). Em sua preocupação com o artístico, alguns artistas deixam para o espectador decifrar a mensagem contida na obra, tornando-a estética perante os olhos alheios. A obra, na medida que vai sendo decifrada, torna-se bonita ou feia pelo julgamento dos espectadores. Sem uma forma definida, o abstrato entra como elemento principal das esculturas contemporâneas. A obra de Felícia Leiner, por exemplo, polonesa radicada no Brasil desde 1927, caracterizou-se no início pela representação de figuras. Mais tarde, a escultora aderiu à tendência abstrata em suas obras, criando projetos destinados a grandes espaços externos, como a Praça da Sé, na capital paulistana. Há uma grande quantidade de esculturas da artista espalhadas nos arredores dos jardins externos do auditório de Campos do Jordão, convivendo harmoniosamente com o paisagismo realizado ali. 115 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Figura 93 – Pássaros (1976), monumento de Felícia Leiner. Praça da Sé, São Paulo Fonte: Proença (2009, p. 259). A estética insiste em valores ditos “reais”, substanciais ou, ainda, essenciais da arte. Podemos comparar essa definição ao estado da arte moderna como imediata, tal como discutimos anteriormente. Já “artístico” delimita o campo das atividades da arte contemporânea. Será considerada artística qualquer obra que for exibida no campo definido como domínio da “arte”. Portanto, será sempre o próprio sistema da arte, por meio do regime de comunicação, a reconhecer aquilo que colocará em circulação, nomeando-o ou não de arte. 7.4.3 Marcel Duchamp: um artista no regime de comunicação Para exemplificar os desencadeamentos da arte contemporânea a partir do regime de comunicação, Cauquelin nos apresenta três personalidades da arte como “embreantes”. São “figuras singulares, de práticas, de ‘fazeres’, que primeiramente desarmonizam, mas que anunciam, de longe, uma nova realidade” (CAUQUELIN, 2005, p. 87). São pessoas que anteveem uma nova realidade, um novo estado das coisas. A autora aponta Marcel Duchamp, Andy Warhol e Leo Castelli como embreantes do regime de comunicação. Partilharemos, por meio da transcrição de alguns trechos, a análise que Cauquelin tece à figura de Marcel Duchamp, por considerarmos que representa uma boa síntese daquilo que acabamos de ver. 116 Unidade III O embreante Marcel Duchamp (1887-1968) O fenômeno Duchamp tem de interessante o fato de sua influência sobre a arte contemporânea crescer à medida que passam os anos. De um lado, o número de trabalhos que lhe são dedicados é cada vez mais importante; de outro, ele é a referência, explícita ou não, de numerosos artistas atuais. Por quê? Porque esse artista – que declarava não sê-lo – parece expressar o modelo de comportamento singular que corresponde às expectativas contemporâneas [...]. Para fazer justiça à novidade delas, devemos, pois, proceder não à análise termo a termo das obras, o que seria apropriado a uma história da arte, mas ao posicionamento global da atitude de Duchamp. 1. Primeira proposição: a distinção estética/arte a) A ruptura Duchamp rompe com a prática estética da pintura: ele se declara “antiartista”. E aí começa a aventura. Essa ruptura não é uma oposição, que estaria ligada à sua antítese seguindo uma cadeia casual, mas, sim, um deslocamento de domínio. A arte não é mais para ele uma questão de conteúdos (formas, cores, visões, interpretações da realidade, maneira ou estilo), mas de continente. É assim que Marshall McLuhan dirá, cinquenta anos mais tarde: “O meio é a mensagem”, apagando a distinção clássica entre mensagem (conteúdo intencional) e canal de transmissão (neutro e objetivo) para estabelecer a unicidade da comunicação através do meio. É o mesmo apagamento feito por Duchamp do conteúdo intencional da obra diante do continente, bastando este último para afirmar que se trata de arte. b) Os ready-mades Em 1913, Duchamp apresenta os primeiros ready-mades, Roda de Bicicleta; anos depois, em 1917, Fonte, no Salão dos Independentes de Nova York. Ele deixou o terreno estético propriamente dito, o “feito à mão”. Não mais a habilidade, não mais o estilo – apenas “signos”, ou seja, um sistema de indicadores que delimitam os locais. Expondo objetos “prontos”, já existentes e em geral utilizados na vida cotidiana, como a bicicleta ou o mictório batizado de fontaine [fonte], ele faz notar que apenas o lugar de exposição torna esses objetos obras de arte. É ele que dá o valor estético de um objeto, por menos estético que seja. É justamente o continente que concede o peso artístico: galeria, salão, museu etc. Em relação à obra, ela pode então ser “qualquer coisa, mas numa hora determinada”. O valor mudou de lugar: está agora relacionado ao lugar e ao tempo, desertou o próprio objeto. A divisão entre estética e arte se faz em benefício de uma esfera delimitada como palco, onde o que está sendo mostrado é arte. Nesse caso, o autor desaparece como artista-pintor, ele é apenas aquele que mostra. Basta-lhe apontar, assinalar. 117 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS c) O acaso e a escolha Se o fazer é impossível, resta a escolha, à qual está reduzida a parte do artista. Com efeito, já que o continente espacial é importante, o continente temporal, o momento, o é da mesma maneira, pois a escolha do objeto pertence ao acaso, ao encontro, à ocasião. Duchamp chamará esse exercício temporal de “acaso em conserva”. O ready-made, encontrado por acaso, escolhido e reservado, indica o estado da arte em um momento determinado. Ele está em uma relação de fragmento com a totalidade dos acontecimentos da arte. Em nenhum caso é uma obra à parte, uma obra em si dotada de valor estético; é umindicador, um signo dentro de um sistema sintático. Ele manifesta essa sintaxe apenas por seu posicionamento. 2. Segunda proposição: a indistinção dos papéis Se a estética, o savoir-faire manual foram, assim, deixados de lado, se o artista é aquele que mostra, se produz signos, toda a distribuição de papéis dentro do domínio da arte deve ser reconsiderada. Duchamp dedica-se a isso. a) O artista como produtor O artista é, nesse novo jogo, aquele que produz, ou seja, que coloca à frente, que exibe um objeto. Ele arranja o objeto e dispõe dele. Assim fazendo, identifica-se com o galerista-marchand, que também “produz” artistas no palco da arte. Ele os ordena e também dispõe deles de alguma maneira. Identifica-se, além disso, com o fabricante do objeto em questão. Num objeto fabricado, a intervenção do artista é, em resumo, mínima. Ele “acrescenta” algumas vezes ao ready-made ou ao signo, mas a materialidade do objeto continua fora dele. A atividade daquele que mostra, organizador da representação, é exercida por meio do deslocamento do objeto: muda-o de lugar, de temporalidade. Assim, está rejeitada ou afastada qualquer pretensão à criação de formas e cores. O artista não cria mais, ele utiliza material. O primeiro produtor da obra é o industrial; o segundo é o artista que escolheu utilizar um objeto fabricado. O artista identifica-se com uma etapa da produção industrial, contribui com um simples “coeficiente de arte”. Ele faz um aporte ao ready-made mas também ao fabricante. b) O produtor como observador Segundo deslocamento de papéis. A famosa proposição de Duchamp “É o observador que faz o quadro” é para ser tomada ao pé da letra. Ela não se refere – como se crê com muita frequência – a alguma metafísica do olhar, a um idealismo do sujeito que enxerga, mas corresponde a uma lei bem conhecida da cibernética, retomada pelas teorias da comunicação: o observador faz parte do sistema que observa; ao observar, ele produz as condições de sua observação e transforma o objeto observado. Vê-se que não se trata mais 118 Unidade III de separar o artista de seu consumidor virtual, mas de uni-los em uma mesma produção. O lugar do artista se encontra então identificado, de um lado com o fabricante, de outro com o observador. c) O artista como conservador Aqui, uma vez mais os papéis estão embaralhados: o intermediário – conservador, galerista ou marchand – é o próprio artista. Não somente Duchamp “conserva” o acaso posto em conserva, como preserva notas, textos e objetos fotocopiados nessas valises, nessas caixas em valises. Ele as acumula e transporta consigo. Por outro lado, para perfazer o ciclo, torna-se conservador do departamento do museu da Filadélfia, que apresenta 45 obras da coleção Arensberg – suas próprias obras. É também membro de um júri, interpretando dois papéis ao mesmo tempo: o de artista que apresenta seu trabalho e o de membro do júri que recusa sua “fonte”. A demonstração é perfeita: o artista não é um elemento à parte, separado do sistema global; não há autor, não há receptor, há apenas uma cadeia de “comunicação” encerrada em si mesma. 3. Terceira proposição: o sistema da arte é organizado em rede As duas primeiras proposições conduzem diretamente à terceira. Com efeito, a relação da arte com o sistema geral (social, político, econômico) é uma relação de integração e não de conflito. Atuando em partições simultâneas, Duchamp desmonta a antiga ideologia do artista exilado, recusado, contestador: o estético não é um domínio que tem leis diferentes do sistema geral. É uma simples peça dentro de um jogo de comunicação, cuja entrada, assim como a saída, não pode ser encontrada. Não há origem nem fim, é um círculo. As operações que se desenrolam no interior de uma rede têm a ver com propriedades da rede, não com a vontade do artista. Cada ponto da rede está ligado aos outros, cada interveniente pode estar em toda parte ao mesmo tempo. A singularidade de Duchamp – com a incompreensão que ele frequentemente suscita – é ter “posto a nu” um funcionamento, ter esvaziado do artista e da obra seu conteúdo intencional, emocional. O Grande Vidro ou A Noiva Despida por Seus Celibatários, Mesmo, é a própria arte, desembaraçada de seus falsos brilhos estéticos. Por meio de O Grande Vidro, frio, e de seus mecanismos trituradores, é o regime novo da arte contemporânea, sua lógica impecável, que se delineia. 4. Quarta proposição: a arte pensa com palavras Último efeito dentro da ordem axiomática: a importância da linguagem. Em um jogo de designação e demonstração, que consiste em escolher um objeto já existente no uso comum e conceder-lhe um coeficiente de arte, o “aporte” (ou “acréscimo”) pode vir de uma nova montagem, mas também, e mais necessariamente, dos títulos que o acompanham. 119 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Expor um objeto é intitulá-lo. O mictório é fonte, o porta-casaco colocado no chão é alçapão; quando o objeto é reconhecível como objeto estético (como a Monalisa), o título “acrescentado” desloca o valor estético: LHOOQ o dessacraliza. Como o conteúdo físico da pintura – cores e formas – é rejeitado, e a arte não é mais retiniana, é não óptica, então deve utilizar outro suporte. Mas as palavras são signos impalpáveis, pouco pesados, que a cadeia de comunicação pode fazer circular dentro dessa leveza. Elas servem simultaneamente de lugar e de tempo aos objetos aos quais são título, e substituem a matéria: o título é uma cor. 5. O transformador Duchamp Duchamp como obra contém em germe os desenvolvimentos que os artistas que virão depois dele impulsionarão, em um sentido ou em outro: a arte conceitual, o minimalismo, a Pop Art, as instalações, até mesmo os happenings, que ele tanto apreciava. Mas não é nessa sequência histórica, nessa continuidade de desenvolvimento de um conteúdo estético que se deve procurar a transformação de Duchamp. Seria um contrassenso fundamental. É nas proposições axiomáticas que anunciam e fundam o regime da arte contemporânea que seu trabalho é verdadeiramente transformador. É nesse ponto que a esfera da arte se articula com a era da comunicação todo-poderosa. Vejamos um resumo breve dessas articulações: • passagem da mensagem intencional, com emissor e receptor, ao signo produzido pela rede e dentro da rede e suscetível de nela circular (anonimato ou disfarce de assinatura, banalidade do objeto, inexistência de qualquer emoção de origem retinida). • paralelamente, desaparecimento do autor como sujeito livre e voluntário. A descoberta ao acaso, a escolha, substituem o fazer. • importância da linguagem, não como expressão de um pensamento, mas como fundo radical dele próprio. A língua pensa sobre si, como a arte o faz por meio dela. • desaparecimento das vanguardas e da mensagem sociopolítica. […] Se nos situamos com Duchamp fora da história da arte estética, não há mais tomada de posição que tenha valor por sua novidade formal, e, consequentemente, não há mais vanguarda (nem, aliás, “retaguarda”). Outro fenômeno é a recuperação quase instantânea do que poderia ter passado por vanguarda. Como tudo é admitido, recebido e reconhecido como atual, a vanguarda não pode mais se destacar do pelotão. • busca das condições mínimas de transmissão de um signo: a assinatura se torna a garantia da arte, seu coeficiente de valor artístico: a obra pertence ao gênero do cheque. 120 Unidade III • apresentação do continente espacial que coloca o objeto em situação de obra. • esboço de um desnudamento da rede formada pelos profissionais da arte. O modelo Duchamp, tão discreto que só alguns iniciados tomaram conhecimento dele, oferece não tanto “novas imagens”, mas a única imagem possível de um exercício da Arte em um sistema que já começa a ser instaurado, o da comunicação, à qual sua obra serve de analisador. A partir desse momento, o domínio da arte não é mais o da retirada e do desentendimento, do conflito com a sociedade, mas de um aclaramento, circunstanciado,dos mecanismos que a animam. Fonte: Cauquelin (2005, p. 89-105). Figura 94 – A Roda da Bicicleta (1913), de Marcel Duchamp Fonte: Proença (2009, p. 148). 121 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Figura 95 – A Fonte (1917), de Marcel Duchamp Fonte: Strickland (2004, p. 148). Cauquelin (2005) nos possibilita compreender a arte contemporânea a partir do interior do próprio sistema da arte, seguindo o regime de comunicação que envolve toda a sociedade. Assim, a arte contemporânea não começa a existir a partir de determinado momento da história, nem substitui a chamada arte moderna, mas vai coexistindo com ela, consolidando-se conforme as tecnologias de comunicação e a economia reestruturam o próprio sistema da arte. Assim, abordamos a arte contemporânea a partir de duas perspectivas que se pretendem complementares. Por um lado, o pós-modernismo como contexto sociocultural que possibilita, sobretudo, compreender os conteúdos e a subjetividade dos artistas com seus processos criativos, num enquadramento muito distinto do da arte moderna. Por outro lado, vimos o regime da comunicação que possibilita olhar a arte contemporânea a partir da sua estrutura organizacional, observando e analisando o próprio sistema da arte. Esperamos que o aluno apreenda essas perspectivas como primeiras abordagens à arte contemporânea e possa, autonomamente, num futuro próximo, conhecer novos ângulos dessa esfinge que agora só nos observa a querer devorar-nos. 7.5 Pós-modernismo: a Segunda Guerra Mundial como o divisor de águas da Arte Moderna Com o término da Segunda Guerra Mundial, novas tendências foram surgindo no interior das lutas sociais, buscando melhorar as condições de vida destruídas no período de conflito. As economias europeia e norte-americana fortaleceram-se, pois os meios de produção estavam a todo vapor. 122 Unidade III Nesse contexto histórico surge a Op Art (optical art), ou arte óptica. Sua principal função é explorar as sensações de movimento com o uso de formas geométricas e cores monocromáticas. Os principais artistas dessa tendência são o húngaro Victor Vasarely (1908-1997), que estudou em Budapeste e teve contato com o movimento Bauhaus, e a inglesa Bridget Riley (1931), com um estilo considerado semi-impressionista. O artista Alexander Calder (1898-1976) mantinha estritas relações com o Brasil e era conhecido por fazer festas de samba em seu estúdio nos Estados Unidos. Calder trabalhou com a ideia de movimento da Op Art, com móbiles manipulados pelos próprios observadores que interagiam com sua obra. Posteriormente, utilizou a suspensão para deixar que o ar tivesse a função de manipular os objetos. Nos Estados Unidos, em 1960, um movimento se propôs a transformar a vida cotidiana em arte e fazer que não houvesse distinção entre ambas. Esse movimento vem da expressão inglesa Pop Art, ou Arte Popular. A produção da época foi importante para o movimento, pois os artistas utilizavam muito os recursos da televisão, do cinema e das propagandas, comuns nos meios de comunicação em massa. Esse retorno aos temas pictóricos figurativos estava longe de ser um retorno à tradição. A arte pop elevou a ícones os mais crassos objetos de consumo, como hambúrgueres, louça sanitária, cortadores de grama, estojos de batom, pilha de espaguete e celebridades como Elvis Presley. “Não há motivo para não considerar o mundo um grande quadro”, disse Rauschemberg. Os artistas pop também faziam arte impessoal, reproduzindo garrafas de Coca-Cola ou caixas de sabão em pó num estilo anônimo, lustroso como em um impresso. Com espírito bem-humorado, a nova arte apagava a pretensão da pintura de ação (STRICKLAND, 2004, p. 174). O grande símbolo que está no inconsciente coletivo, quando se fala dessa tendência artística, é a obra que utiliza o rosto da atriz americana Marilyn Monroe, atriz de muito sucesso em Hollywood na época. Marilyn Monroe, de Andy Warhol (1928-1987), com certeza representa a mensagem dos artistas da Pop Art: o ser humano, que se transforma em uma celebridade, torna-se um produto a ser consumido pela massa. Nos dias atuais, a atriz é considerada um ícone pop e é reconhecida como uma estrela mesmo anos após a sua morte, em 1962. 123 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Figura 96 – Marilyn Monroe (1967), serigrafia de Andy Warhol Fonte: Strickland (2004, p. 175). O universo de propagandas, quadrinhos e anúncios se mistura na obra de Roy Lichtenstein (1923-1997). O artista se inspirou nas formas de impressão do século XIX, utilizando os pontilhados, que foram sumindo conforme aprimoraram-se as técnicas de impressão. As figuras preenchidas por pontos tornaram-se sua marca registrada. Como podemos observar na obra The Melody Hunts My Reverie, o artista não só utiliza o recurso dos pontos para preencher a face da personagem, como também o balão com a frase transcrita, típico dos quadrinhos. Figura 97 – A Melodia Persegue minha Fantasia (1965), tela de seda de Roy Lichtenstein Fonte: Strickland (2004, p. 174). 124 Unidade III Outro quadro com base em uma propaganda feito pelo artista chama-se Moça com Bola, inspirado num anúncio real, em que alguns detalhes originais foram mantidos, como a cor escura do maiô da personagem e a posição dos braços ao segurar a bola. Contudo, quando se observa a obra, a primeira ideia que se tem é a de um desenho de história em quadrinhos. Assim, diante de tanta atividade artística rompendo com os padrões tradicionais de se produzir arte, o movimento passou a ser questionado. Joseph Beuys, artista plástico alemão, produziu vários tipos de sentimentos em sua obra controversa e provocativa chamada Como se Explicam Quadros a uma Lebre Morta, de 1965. Trata-se de uma fotografia em que o artista questiona sobre como é inútil explicar quadros a qualquer pessoa. Figura 98 – Como se Explicam Quadros a uma Lebre Morta (1965), fotografia de Joseph Beuys Fonte: Strickland (2004, p. 184). Com artistas como Beuys se inicia o questionamento sobre o que é arte e sobre a necessidade de conservá-la em local propício, como um museu ou uma galeria. Passa-se a questionar onde a arte de fato acontece e se somente as peças que estão nesses locais podem ser consideradas como tal. Duchamp (1887-1968) comprou um típico vaso sanitário de banheiro masculino, colocou a data 1917, assinou como R. Mutt e enviou para uma exposição. Com isso, ele influenciou outros artistas, que começaram a utilizar objetos industrializados em suas composições. A exposição de um objeto industrializado fora de seu local comum, para ser observado de forma diferente e até mesmo sob aspectos variados, passou a constituir uma tendência a que se deu o nome de ready-made. 125 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Outro artista que buscou elementos industrializados para suas composições foi David Schmidt (1906-1965). Metalúrgico de profissão, ele desenvolveu a ideia de movimento e equilíbrio a partir de objetos conectados. Com o avanço do capitalismo industrial e das novas tecnologias de produção em massa, ficou claro que os objetos produzidos em larga escala não seriam considerados obras de arte, mesmo que um ou outro fosse utilizado isoladamente numa composição artística. A multiplicidade de cópias produzidas pelas máquinas de um mesmo objeto é que o caracteriza como não sendo uma obra de arte. Joseph Beuys, com sua obra Terno de Feltro, pendura um terno comum em um cabide e o leva para a exposição. O tecido de feltro provoca sensações táteis no observador, com a ideia de tranquilidade e segurança. Explorar esses conceitos foi além dos objetos industriais e passou também pela pintura. Observação Joseph Beuys foi um dos precursores de uma tendência de vanguarda intitulada Work in Progress. Seus adeptos utilizavam o recurso da performance para apresentar seus trabalhos, com a mescla de diferentes formas de representação, como teatro, artes plásticas, música e videoarte, entre outros. Os nomes mais significativos dessegênero são Beuys, Robert Wilson e Gerald Thomas. O tema Solidão foi retratado por diversas vezes pelo artista Edward Hopper (1882-1967). A sua obra mais emblemática é uma pintura de diversos personagens sentados em cadeiras de sol: fica nítido que eles compartilham o mesmo espaço, mas sem nenhuma interação entre si. O artista Frank Stella (1936) propõe uma forma diferente de sustentar um quadro que não seja por cavalete. A ausência da superfície foi substituída por uma grade que dá a sustentação, e os vãos entre a pintura nos permitem visualizar a parede onde a obra está apoiada. A partir do século XX, vivemos num contexto histórico ímpar, com avanços científicos e tecnológicos impressionantes, que rapidamente influenciam o ambiente humano. Nesse contexto, os grandes movimentos artísticos que duram anos e são seguidos pelos artistas contemporâneos passam a ser substituídos por uma série de movimentos convivendo entre si e mostrando a aceitação da diversidade. Com isso, percebemos o rompimento concreto do que pode ser considerado arte, e as diferentes tendências passam a coexistir e dialogar umas com as outras. O Pós-Modernismo surge depois dos anos 1960. As tendências pós-modernas perpassam pelos conceitos de questionamento da arte pela própria arte, e a definição dos movimentos se torna cada vez mais complexa. Podemos citar a Arte Conceitual, o Happening, a Arte de Computador, a Minimal Art e a Body Art, que surgiram tanto na Europa como nos Estados Unidos no final da década de 1960 e início de 1970. 126 Unidade III Esses movimentos vão além das artes plásticas, incorporando outras formas de expressão artísticas, como cinema, teatro, literatura, música e até as questões políticas. As obras não são um objeto único a ser apreciado, mas um conjunto de elementos e atividades interagindo entre si, permitindo até que os artistas improvisem nos espaços de exposição. Com os avanços tecnológicos dos sistemas de computação, a própria arte vai incorporar as possibilidades e os potenciais artísticos que a informática pode proporcionar: desde a substituição de pincéis e tintas por dispositivos de luz e sons até a reprodução visual de elementos nos espaços onde esculturas, ou até mesmo pinturas, estejam expostas e interagindo. Essas novas linguagens se tornam verdadeiros espetáculos, proporcionando vários tipos de sensações e formas de comunicação com os observadores, que, em alguns casos, deixam de ser meros observadores e interagem com as obras. Tais linguagens revelam que a arte incorpora as formas de vida, relacionando-se com a tecnologia nos tempos atuais. A obra Caveira, do pintor Jean Michel Basquiat (1960-1988), apresenta a aparência de um grafite que poderia ter sido feito nas ruas de qualquer cidade. Tem a proposta de trazer a diversidade artística, reconhecendo que as obras de arte podem representar o espírito das ruas sem necessariamente estarem em um museu. Esse artista expressa bem em seu traço a arte das ruas da cidade cosmopolita de Nova Iorque. Anselm Kiefer (1945), artista alemão, explora diferentes materiais em sua obra, como fotografia, chumbo e até mesmo palha. Sua obra Canção de Wayland, de 1982, expressa a preocupação com os efeitos da Segunda Guerra Mundial. A contextualização histórica e política se torna necessária para compreender a obra. A Alemanha sofreu grandes transformações com os impactos da guerra e a compreensão da realidade da fragilidade humana diante dos conflitos se torna tema das peças do artista. Outra obra relativa às questões políticas permeando o tema e a compreensão da mensagem do autor é do japonês Hiroshi Sugito, cuja forma de representação se aproxima do abstracionismo e tem um clima de sonho. O pintor belga Luc Tuymans (1958) recriou em suas pinturas efeitos do cinema, que se torna uma influência latente em suas obras. Exemplo disso é a obra Diagnostische Blick, de 1992, na qual vemos um close-up de um rosto pintado a óleo. A utilização das técnicas de serigrafia e de diferentes materiais está presente na obra de Steven Sorman (1948). As cores são passadas para tela através da pressão empregada pelo artista. Para que as cores não se misturem, ele precisa criar máscaras e aplicá-las individualmente. A técnica pode ser empregada em tecido, madeira ou papel e surgiu inicialmente no século XX para estampar tecidos. O sul-africano Willian Kentridge (1955) também trabalhou com diversas técnicas de gravura. Em sua região é o mais importante no gênero. Teve obras expostas na 24ª Bienal de São Paulo e um 127 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS vídeo produzido pela Associação Videobrasil, com o título Certas Dúvidas de Willian, dirigido por Alex Gabassi, em 2000. Os museus não serão descartados pelos artistas Pós-modernos, embora conseguissem ampliar o espaço expositivo para além das galerias. O museu precisa ser valorizado e reconhecido como um espaço importante para preservação das obras de arte no mundo; com programações e atividades culturais constantes, ele não pode ser considerado um local onde se depositam artefatos do passado. Suas peças estão em constante diálogo com passado e presente, pois obras de arte revelam um tempo histórico e não perdem seu significado. Podemos citar como principais museus do mundo: Museu do Vaticano, em Roma; Prado, em Madri; Louvre, na França; Museu Britânico, na Inglaterra; Galeria Nacional, em Washington; Museu Egípcio, no Cairo; Museu de Arte Moderna e Metropolitan Museum, em Nova Iorque; Museu Hermitage, em São Petersburgo; e o Museu Nacional de Antropologia, no México. Estes, entre tantos outros museus em diversos países, preservam as preciosidades produzidas pelo homem ao longo da história da humanidade. Na modernidade, levantou-se a seguinte questão: as obras de arte contidas nos museus pertencem a quem? Pergunta pertinente, já que muitas delas foram trazidas aos museus por motivos de colonização, furto ou até mesmo vendas e negociatas. As obras pertenceriam ao país de origem? Alguns profissionais defendem que o fato de as obras estarem espalhadas pelo mundo pode facilitar o acesso a elas. Do contrário, se estivessem todas reunidas no país de origem, isso não permitiria que diversas culturas pudessem apreciá-las. Longe de ter um fim, esse debate persistirá, já que todos os países detêm alguma obra de outro, o que pode ser considerado riqueza cultural. 7.5.1 A fotografia, o cinema e a arquitetura pós-moderna Com o progresso tecnológico, duas formas de expressar arte ganham força, alterando seu conceito e o modo de se relacionar com ela. O cinema teve sua primeira exibição pelos irmãos Lumière, em 1895. A fotografia teve seus primórdios em 1826, com Niépce, e a invenção dos daguerreótipos em 1839. Daguerreótipo, do francês daguerréotype, foi o primeiro processo fotográfico da história. A fragilidade do material e os custos para mantê-lo sem oxidação fez que fosse rapidamente substituído. Na fotografia, o artista não precisa utilizar as mesmas técnicas de um pintor para capturar uma imagem. Ela não é feita artesanalmente, mas ele precisará de inúmeras outras habilidades para capturar o momento, absorvendo seus conhecimentos de propagação de luz e sombras, assim como o pintor. Henri Cartier-Bresson (1908-2004) acredita que um fotógrafo tenha de estar atento ao momento único. Suas fotografias mais emblemáticas são a de um homem saltando de uma poça d’água e de um casal se beijando em um café. Momentos que são tão rápidos quanto o piscar de olhos e que, se o fotógrafo não estiver atento ao mundo que o rodeia e ao potencial de cada instante, poderá perder 128 Unidade III uma grande imagem. A imagem se torna imutável ao ser traduzida na fotografia, como um momento único, muito difícil de se recompor novamente. Bresson chamará esse momento de “momento decisivo”. Estar atento permite que o artista saiba reconhecê-lo e, dependendo do caso, até prever quando esse momento se dará. Barbara Kruger expressou sua arte por meio da fotografia,expandindo-a para as instalações, para a escultura e também para os vídeos. Seu conteúdo questiona os modos de vida da modernidade e o consumismo desenfreado. Suas fotografias, na maioria em preto e branco, intercalam uma mescla de frases com as imagens para provocar os observadores. Dorothea Lange (1895-1965), com a crise de 1929, dedicou seu trabalho a registrar os estragos causados pelo período da Grande Depressão. Sua obra resultou em fotografias muito fortes, com alto apelo social, revelando a fragilidade humana diante de um mundo que enfrentava grandes conflitos e que estava imerso na incerteza de um futuro melhor. Exemplo dessas características é a obra Mãe Migrante, uma das mais emblemáticas da artista. Figura 99 – Mãe Migrante (1936), fotografia de Dorothea Lange Fonte: Strickland (2004, p. 185). Com suas fotografias, Lange obrigou o povo americano a olhar para as pessoas mais pobres atingidas pela crise. O impacto dessas imagens provocou a reflexão sobre a situação do país naquele momento. Poucos artistas se dedicaram a obras de cunho social em forma de protesto, pois os possíveis compradores dificilmente teriam interesse por esse tema. Temos aqui uma lista com os nomes de alguns dos artistas que propuseram reflexões sociais através de suas obras: Francisco de Goya, com a pintura Três de Maio de 1808; Honoré Daumier, com Rue Transnonain, 15 de abril de 1834; Pablo Picasso, com Guernica; e Anselm Kiefer, que denunciou os horrores do holocausto. 129 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS No cinema, com a produção de filmes em larga escala, não é possível prever qual público terá contato com a obra e quais as reações que ela provocará. O avanço das tecnologias de captura de imagens em vídeo também foi moldando ao longo dos anos os tipos de cena que podem ser reproduzidos e os diferentes estilos para capturá-las. O cinema, sem dúvida, representa a principal arte moldada pela vida moderna, pois sua produção em larga escala tem altos custos. Contudo, ao ser vendida para o grande público, seus custos devem ser acessíveis para atingir o maior número de pessoas possível. Esse caráter faz do cinema a arte que mais se aproxima do processo de industrialização. Saiba mais Como exemplo latente do quanto as tecnologias interferem na forma de capturar as cenas, podemos citar o filme 300 de Esparta, de 2006. O ator brasileiro Rodrigo Santoro, além de estar com uma maquiagem que modificou completamente sua aparência real, a maior parte do tempo, contracenou com um estúdio vazio. Ele seguia apenas as orientações do diretor. Todos os cenários e cenas que compõem o filme nas aparições desse personagem foram feitos por computação gráfica. 300. Dir. Zack Snyder. EUA: Warner Bros. Pictures, 2006. 117 min. Desde a primeira sessão aberta de cinema, em 1895, ficou claro que esta seria uma arte burguesa. Na ocasião, os espectadores viram a cena clássica do trem que foi filmado num ângulo que o fez parecer invadir a tela, assustando o público. Não era esse o resultado esperado, já que os presentes já haviam andado de trem e a imagem não tinha som e era em preto e branco. Contudo, o que causou espanto nos expectadores foi o fator ilusão. Esse conceito tem sido fundamental para o sucesso dessa arte que perdura até os dias atuais, mesmo quando produzida em escala industrial. A videoarte é uma linguagem originária do cinema e guarda com ele suas semelhanças, mas não pode ser confundida com programas de televisão nem com cinema experimental. Nascida no ano 1960, suas técnicas foram se desenvolvendo, ficaram em alta e depois foram abandonadas. Com os Happennings, a videoarte tem sido muito utilizada nas instalações de artes plásticas, com vídeos que visam complementar ou até mesmo contestar a própria arte ou a política. O fato é que, com o acesso mais facilitado aos equipamentos de vídeo, tornou-se possível o surgimento cada vez mais frequente de vídeos independentes. Esses elementos permitiram uma maior integração dos observadores com a instalação, e, muitas vezes, o movimento das pessoas permeando o espaço faz do observador parte da obra. Os principais nomes do videoarte são: Joseph Beuys, Vito Acconci, Wolf Vostell e o coreano Nam June Paik, entre outros, precursores ao utilizarem esse recurso nos trabalhos artísticos. 130 Unidade III Outro movimento que passa a se desenvolver é o das histórias em quadrinhos. Apesar de já haver durante muitos anos a literatura com ilustrações, a utilização do formato de quadrinhos remonta ao ano de 1930. O primeiro personagem no formato de quadrinhos é Yellow Kid, criado por Richard F. Outcault (1863-1928) nos Estados Unidos. Após seu surgimento, tornaram-se comuns as tirinhas de jornal que mostravam histórias curtas do referido personagem. Flash Gordon foi o primeiro personagem reconhecido como ícone das histórias em quadrinhos e criado por Alex Raymond em 1934. Tarzan, que já foi adaptado para filmes e desenho animado de longa metragem, foi criado por Edgar Rice Burroughs (1937). Em ambos vemos formas bem diferentes de estética para o traço do desenho: no caso de Tarzan, exige-se muito mais vigor para dar ideia de movimento; em Flash Gordon, as linhas tracejadas dão ideia de preenchimento de sombreado. Ambas influenciaram os criadores de história em quadrinhos no mundo todo. Além desses, outros personagens se tornaram muito famosos: Batman, Superman, Fantasma e, no segmento infantojuvenil, Tintin, Gato Felix e Pato Donald, que foram para as telas de cinema ou para a televisão e hoje fazem parte da cultura de crianças, jovens e adultos. Art Spiegelman (1948), criador de quadrinhos, ganhou uma exposição no Museu de Arte Moderna com a série Maus, que conta a história de seus genitores presos nos campos de concentração e sobreviventes da Segunda Guerra Mundial. Frank Miller (1957) tem dois trabalhos em destaque: Batman – O Cavaleiro das Trevas e Sin City, cuja adaptação para o cinema foi feita por Robert Rodriguez e trouxe elementos dos quadrinhos em efeitos especiais no filme. O japonês Katsuhiro Otomo (1954) se tornou conhecido pela personagem Akira e por produzir filmes de animação e mangás, nos quais suas histórias retratam o Japão do pós-guerra já muito modernizado. Nos mangás, em geral, as histórias são longas, e os quadrinhos não são lineares como os quadrinhos do Ocidente, que geralmente têm o mesmo número de quadros por página. De acordo com o destaque da cena, os quadrinhos variam e podem até chegar a ocupar uma página inteira. O nascimento da arquitetura contemporânea Nos anos de 1970 e 1980, vários movimentos tentavam mostrar que os estilos modernistas do Bauhaus estavam ultrapassados. Assim, começaram a se multiplicar na Espanha os prédios com modelos internacionais e suas folhas de vidro e grades. Espalharam-se de tal forma que, nos anos 1990, já eram sinônimos de vanguarda dos quartéis-generais das empresas e corporações do mundo todo. Cai o Modernismo, e, dentro do Pós-Modernismo, nasce a arquitetura contemporânea. A arquitetura contemporânea é marcada por prédios cada vez mais arrojados, cumprindo mais que a simples função de destacar uma beleza, mas também de possuir uma funcionalidade que permita o acesso por todas as pessoas e a preservação dos objetos ali contidos. 131 ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS Para melhor ilustrar, vamos passear por várias joias arquitetônicas conhecidas não só por sua beleza, mas também pela estrutura funcional que facilita os acessos. Exemplo de prédio que se tornou o símbolo de uma cidade é o Teatro de Ópera de Sidney. Esse prédio, que nos lembra o formato de um barco à vela, foi projetado por Jörn Utzon (1918-2008) e construído entre 1957 e 1973, com várias salas de espetáculo. Suas estruturas em vidro permitem que a luz externa seja projetada no ambiente para deixá-lo mais agradável. O Centro Pompidou tem a função plena de um prédio projetado para abrigar eventos culturais, como apresentações de teatro, instalações e exposições
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