Buscar

A ADOLESCÊNCIA NA PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA SOCIAL CRÍTICA (resumo)

Prévia do material em texto

FACULDADE ANHANGUERA DE JOINVILLE
CURSO DE PSICOLOGIA
RITA MARGARETE ALEXANDRE DA SILVA (5ª FASE)
A ADOLESCÊNCIA NA PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA SOCIAL CRÍTICA
JOINVILLE-SC
2020
A ADOLESCÊNCIA NA PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA SOCIAL CRÍTICA
A Psicologia Social Crítica busca pensar sobre muitas questões que remetem a adolescência. Como: Por que é difícil falar em adolescência sem citar que esta é uma fase difícil? As informações que são veiculadas, faladas, são realmente o que os adolescentes sentem e pensam? E por aí aparecem muitas outras questões que surgem.
A Psicologia Social Crítica entende o ser humano como um agente histórico-social, ou seja, que não se desenvolve, no sentido evolucionista, mas, que está em contínua construção. Para Roso (2007), sugere a construção de um espaço de intersecção onde o indivíduo e a sociedade são interdependentes e relacionais, afastando-se da perspectiva cartesiana.
Podemos compreender a realidade dos fenômenos a partir da Psicologia Social Crítica, pois, diante do que está aí, lembra-me também do que não está aí, o lado silenciado, oculto, mas, que também é parte da realidade, do fenômeno. É retornando ao passado, à história, não os fatos em si, mas a qualidade dos fatos, que podemos compreender como foi construída a visão de adolescência (Guareschi, 2005).
MÉTODO
A reflexão sobre a adolescência foi feita através de uma pesquisa qualitativa, pretendendo questionar as suposições do senso comum ou ideias tidas como corretas. Foram lançadas questões acerca da adolescência, a partir da interlocução entre os dados da pesquisa e as abordagens teóricas.
A discussão, compreensão e interpretação do objeto de estudo se dá com base na Psicologia Social Crítica com alguns elementos da Teoria das Representações Sociais de Moscovici (2003), para entender como novos saberes são acomodados no tecido social e como estes são produzidos (Jovchelovitch, 2008, p.86).
Apresentamos os resultados obtidos em três partes. Na primeira – fazemos uma análise sócio-histórica sobre a adolescência e suas representações (retomando o passado: o que não está aí); na segunda – apresentamos o movimento dos profissionais, onde incluímos os psicólogos, que criam suas teorias e pressupostos baseados em um saber-poder, produzindo modos de ser e fazer sujeito (o que está aí); na terceira – uma alternativa de compreensão sobre a adolescência (o que virá). Nesta última parte serão incluídos os discursos de seis adolescentes (de 11 a 14 anos) vivendo com HIV/aids, com a pesquisa “Corpos Positivos: um estudo sobre identidade e representações de adolescentes em tempos de aids”, iniciada em 2010. 
Essa pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria, sob o CAEE 0139.0.243.000-10.
Os adolescentes foram contatados no Serviço de Doenças Infecciosas Pediátricas de um hospital da região sul do país, no período de fevereiro a julho de 2012, no tratamento antirretroviral, enquanto aguardavam suas consultas.
A pesquisadora fez buscas por prontuários, a fim de conferir diagnóstico para HIV e idade; contatou familiares/cuidadores acompanhantes, para conhecer qual a visão de transmissão do vírus, interessando-se apenas a transmissão vertical, e buscou saber se os adolescentes tinham conhecimento do diagnóstico; a pesquisadora explicou os objetivos da pesquisa e no final questionou se poderia convidar o adolescente para participar da pesquisa, a conversa era somente após o consentimento do responsável pelo adolescente; para finalizar foram lidos termos de consentimento e de assentimento, realizando com os adolescentes que assinaram o termo de assentimento, uma entrevista semiestruturada, com temas relacionados ao que é ser/estar adolescente, como acontecem seus relacionamentos sociais/afetivos e o entendimento que têm sobre a doença.
Percebemos durante a análise crítica que muitos dos discursos dos adolescentes divergem das produções científicas sobre adolescência, motivo pelo qual trouxemos os depoimentos mais marcantes dos mesmos.
RETOMANDO O PASSADO: “O QUE NÃO ESTÁ AÍ”
“O que não está aí”, vem a ser o pouco ou nada, que se mostra ou se fala, período que antecede o século XVII, no qual não se faz referência à experiência/vivência da adolescência e ao sentimento moderno de infância.
Somente a partir dos séculos XVII e XVIII, que surge no seio familiar, advindo da família burguesa, o sentimento da infância, a chamada “paparicacão”, onde o contexto social da vida pública passa para a esfera privada, gerando uma preparação da criança e do jovem para os desafios do mundo adulto e um modelo de socialização com base na educação.
A família torna-se responsável pelo surgimento dos “primeiros vestígios de diferenciação entre o mundo da criança e do jovem e o mundo do adulto, papel este, tomado como modelo de socialização até por volta do início do século XIX” (Schwetter, 2006, p.18).
O crescimento das indústrias nos séculos XIX e XX exigiu tempo para se capacitar para a qualificação dos trabalhadores, postergando o início da vida reprodutiva, demarcando um período de aprendizagem e preparação para o futuro, abrindo uma lacuna entre infância e vida adulta, e, logo ocupada pelas ideias de juventude e adolescência.
A partir do século XIX se instaura uma concepção moderna de adolescência e a partir do século XX, a ideia de adolescência passa ser vista como um problema para os pesquisadores, assumindo uma concepção retentora de um estatuto legal e social.
A criação da adolescência serviu aos propósitos de um novo mercado econômico, suas características foram inicialmente produzidas para atender a um interesse social e político da época, novas representações sociais foram criadas para dar conta daquele “fenômeno” desconhecido.
Pensar a adolescência como um mito é uma forma de compreendê-la. Os mitos são uma forma arcaica e primitiva de pensar e se situar no mundo, compartilhada de modo igual, são partes dos elementos que compõem as representações sociais (Moscovici, 2003).
“O que está aí”
Para Stanley Hall (1904), a adolescência dura dez anos ou mais, onde todo tipo de desenvolvimento é constante e muito rápido. Antes à adolescência, existiria a pré- adolescência, por volta dos oito a doze anos. Ele foi o primeiro psicólogo a descrever a adolescência com um estágio especial do desenvolvimento humano, marcado por conturbações vinculadas à emergência da sexualidade e tormentos.
Algumas abordagens psicanalistas caracterizam como etapa de estresse e luto causados pelos impulsos sexuais dessa fase, e, como uma etapa de confusões (Ozella, 2002).
Erikson (1976) identifica o período como sendo quase que “um modo de vida entre a infância e a idade adulta” (p.128) difícil de administrar; introduz o conceito de “moratória”, acompanhado do termo crise de identidade ou crise da adolescência.
Aberastury (1983), psicanalista, fala da adolescência como “o momento mais difícil da vida do homem” (p.29), envolvendo perdas e instabilidades, a transformação do corpo sendo um processo lento e doloroso, exigindo do adolescente o “luto pelo corpo da criança, pela identidade infantil e pela relação dos pais da infância” (Aberastury, 1983, p.24).
A fim de trazer à tona a questão cultural de ser/estar adolescente, Outeiral (1994), frisa o fato de ser a adolescência um fenômeno psicossocial, dividindo-a em três fases: a primeira a puberdade, caracterizada pelas transformações do corpo; a segunda, busca da definição sexual; e a terceira, seria marcada pela aquisição da maturidade e da responsabilidade social, marcando o fim da adolescência.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (World Health Organization – WHO, 2013), a adolescência compreende a faixa etária entre dez e dezenove anos. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8069, 1990), considera adolescente pessoa entre doze e dezoito anos de idade. O Ministério da Saúde compreende a adolescência no período dos quinze aos vinte e quatro anos de idade. Logo, a categoria adolescência não é universal.
Para Ciampa (1985), “identidadeé metamorfose”, não firmar “ser adolescente”, “mas, estar metamorfoseando”. Cada faixa etária da vida, podemos proferir “ser aquela metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo” (Seixas, 1973).
“O QUE VIRÁ” uma alternativa de compreensão sobre a adolescência
Gonzales (2007) expõe a necessidade de uma postura crítica frente às práticas psicológicas, que tentam instituir e legitimar modos de ser juvenil, ancoradas em técnicas e procedimentos “dados” como científicos.
Segundo Guareschi (2012), para visualizarmos “o que virá”, apresentar uma alternativa para compreender a adolescência, é precisa questionar verdades apresentadas sobre a adolescência, descaracterizando as instituições de poder que se apropriam desse conhecimento.
Ao pararmos para pensar que as concepções naturalistas e universais sobre a adolescência podem ser capturadas por agentes sociais, sem interesse de reconhecer o adolescente como um sujeito capaz de viver a “experiência de um grupo sujeito”, que ele capte os elementos da situação em que vive, saindo da posição de dependência e construindo suas próprias referências, surge a crítica “ao que está aí” (Guattari; Rolnik, 2007).
Entendemos a adolescência enquanto processo, ou enquanto “devir” (vir-a-ser), tornar-se metamorfosear-se, transforma-se, a partir da Psicologia Social Crítica. Para Bove (2010), “o tempo da adolescência, ou a adolescência como tempo, é o ser-tempo produtor do ser humano social-histórico. A adolescência não poderia, portanto, se reduzir a um momento limitado e transitório da vida humana” (p.44).
A Psicologia Social Crítica entende o adolescente como um ser que se constitui a partir da cultura, um ser social e histórico.
O adolescente com HIV/aids, diante das representações sociais, pode ser visto como irresponsável e julgado por ter “comportamento de risco”. Porém, se pensarmos em um adolescente infectado pelo HIV por transmissão vertical ou por transfusão sanguínea, essa representação certamente mudaria.
Diante dos questionamentos sobre o que representaria ser/estar na adolescência, a fala é como se aquilo do que falam não os afetasse, como se falasse de outras pessoas; sobre o brincar: eles não abandonam essa prática totalmente na medida em que crescem, por mais que o brincar seja mais pertencente à infância; por mais tênue que seja a fronteira entre a adolescência e a infância, os interlocutores da pesquisa não a representam essa fronteira como uma ruptura, talvez por não haver uma delimitação de idade, o que explica o processo como metamorfose ambulante, relacionadas principalmente à estética e referindo-se as transformações corporais.
Finalmente podemos reforçar que a adolescência é um processo, ligado diretamente a determinantes socioculturais e não uma etapa/categoria/fase com características predefinidas para nossos interlocutores.
REFERÊNCIAS
Aberastury, A. (Org.). (1983). Adolescência (2ª ed.). Porto Alegre: Artes Médicas.
Bove, L. (2010). Espinosa e a Psicologia Social: ensaios de ontologia política e antropogênese. Belo Horizonte: Autêntica Editora.
Ciampa, A. C. (1985). Identidade. In S. T. M. Lane & W. Codo (Orgs.), Psicologia Social: o homem em movimento (3ª ed., pp.58-75). São Paulo: Brasiliense.
Erikson, E. (1976). Identidade, juventude e crise. Rio de Janeiro: Zahar.
Gonzales, Z. (2007). Protagonismo: formas de governo da população juvenil. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Guareschi, N. (2012). Infância, adolescência e a família: práticas psi, sociedade contemporânea e produção de subjetividade. In A. M. Jacó-Vilela & L. 
Sato (Orgs.), Diálogos em Psicologia Social (pp. 249-263). Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais.
Guareschi, P. A. (2005). Psicologia Social Crítica: como prática de libertação (3ª ed.). Porto Alegre: EDIPUCRS.
Guattari, F. & Rolnik, S. (2007). Micropolítica. Cartografias do desejo. Petrópolis, RJ: Vozes.
Jovchelovitch, S. (2008). Os contextos do saber: representações, comunidade e cultura. Petrópolis, RJ: Vozes.
Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Área de Saúde do Adolescente e do Jovem. (2005). Marco legal: saúde, um direito de adolescentes. Brasília, DF: Autor.
Moscovici, S. (2003). Representações sociais: investigações em Psicologia Social. Petrópolis, RJ: Vozes.
Outeiral, J. O. (1994). Adolescer: estudos sobre adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas.
Ozella, S. (2002). Adolescência: uma perspectiva crítica. In M. L. J. Contini (Coord.) & S. H. Koller (Org.), Adolescência e psicologia: concepções, práticas e reflexões críticas (pp.1624). Rio de Janeiro: Conselho Federal de Psicologia.
Roso, A. (2007). O cotidiano no campo da saúde – Ética e responsabilidade social. In M. V. Veronese & P. A. Guareschi (Orgs.), Psicologia do cotidiano: representações sociais em ação (pp. 119-146). Petrópolis, RJ: Vozes.
Schwetter, T. (2006). As representações sociais de namoro e casamento em adolescentes. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Psicologia, Universidade Católica de Goiás, Goiânia.
Seixas, R. (1973). Metamorfose Ambulante. In Krig-ha, Bandolo [LP]. Rio de Janeiro: Philips.
World Health Organization - WHO. (2013). Adolescent health. Acesso em 08 de dezembro, 2013, em http://www.who.int/ topics/adolescent_health/en/.

Continue navegando