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Amicus Curiae - NPJ Const

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EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - DD. RELATORA DA ADI 3239 – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 
COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS, articulação de 250 organizações, coletivos e entidades do movimento negro e antirracista que atuam coletivamente na promoção de ações de incidência política à população negra brasileira, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por suas advogadas que esta subscreve, com fulcro no artigo 138 e 137, inciso IV da Código de Processo Civil, requerer manifestação como
AMICUS CURIAE
para defender a constitucionalidade do Decreto Federal nº 4887, de 20 de novembro de 2003, pelos fundamentos jurídicos a seguir aduzidos. 
I. RESUMO DA LIDE
Já se sabe que o entendimento dessa Egrégia Suprema Corte é no sentido de admitir a intervenção processual de terceiros, na condição de amicus curiae, o que torna dispensável tantas outras considerações. 
Trata-se de reconhecer como constitucional o critério de auto atribuição da identidade de quilombola previsto no Decreto n. 4887/2003 para a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação de suas terras prevista no artigo 68 do ADCT.
Pleiteia-se nos autos a declaração judicial de que a demarcação quilombola sobre posse e domínio de particulares que possui, com o fito de titulá-las de propriedade de comunidade quilombola, é ato eivado de ilegalidade da administração pública que viola matéria de ordem pública.
Em razão a controvérsia na ADI 3239, resume-se na obtenção da declaração de constitucionalidade do Decreto nº 4.887/2003, que regulamenta, dentre outros fins, a demarcação quilombola que titula as terras de posse e domínio de particulares, em terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 
Infere-se, dai, que a declaração de constitucionalidade do Decreto nº 4.887/2003, acaba por legitimar o interesse de agir e a legitimidade ad causam do INCRA no que diz respeito a poder transformar, como se tanto fosse possível, a posse e domínio particulares do postulante, em terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 
II. DA LEGITIMIDADE DA COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS
O artigo 7º, §2º, da Lei nº 9.868/1999, versa que: 
Art. 7º Não se admitirá intervenção de terceiros no processo de ação direta de inconstitucionalidade. 
(...) 
§ 2º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades. 
Tal figura processual é concebida pela doutrina pelo terceiro, o qual auxilia o tribunal a uma decisão mais exata. Não obstante, esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal: 
(...) PROCESSO OBJETIVO DE CONTROLE NORMATIVO ABSTRATO - POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO "AMICUS CURIAE": UM FATOR DE PLURALIZAÇÃO E DE LEGITIMAÇÃO DO DEBATE CONSTITUCIONAL. - O ordenamento positivo brasileiro processualizou, na regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99, a figura do "amicus curiae", permitindo, em consequência, que terceiros, desde que investidos de representatividade adequada, sejam admitidos na relação processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito subjacente à própria controvérsia constitucional. A intervenção do "amicus curiae", para legitimar-se, deve apoiar-se em razões que tornem desejável e útil a sua atuação processual na causa, em ordem a proporcionar meios que viabilizem uma adequada resolução do litígio constitucional. - A ideia nuclear que anima os propósitos teleológicos que motivaram a formulação da norma legal em causa, viabilizadora da intervenção do "amicus curiae" no processo de fiscalização normativa abstrata, tem por objetivo essencial pluralizar o debate constitucional, permitindo, desse modo, que o Supremo Tribunal Federal venha a dispor de todos os elementos informativos possíveis e necessários à resolução da controvérsia, visando-se, ainda, com tal abertura procedimental, superar a grave questão pertinente à legitimidade democrática das decisões emanadas desta Suprema Corte, quando no desempenho de seu extraordinário poder de efetuar, em abstrato, o controle concentrado de constitucionalidade. (...) (ADI 2321 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2000.
Com isso, podemos dizer que o amicus curiae é importantíssimo para os julgamentos deste Tribunal, principalmente para os de controle abstrato de constitucionalidade, pois tem a participação democrática de todos os envolvidos nas normas debatidas, dando-se efetividade à democracia deliberativa. 
A figura do amicus curiae, introduzida em nosso ordenamento pela Lei Federal nº 9869/99, abre a possibilidade democrática de participação, em processos de controle de constitucionalidade de leis e atos normativos, de entidades que, em razão dos direitos de natureza difusa e coletiva que visam tutelar, têm interesse jurídico em defender a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do ato normativo impugnado. 
A admissão de terceiros na qualidade de amicus curiae em Ações Diretas de Inconstitucionalidade vem sendo amplamente admitida por esse Egrégio Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2999/RJ, Relator Min. Gilmar Mendes; ADI nº2777/SP, Relator Min. Cezar Peluso), bastando para tanto justificar a legitimidade formal e material das entidades proponentes, o que é feito a seguir.
III. DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PELA COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS PARA REQUERER O AMICUS CURIAE 
A participação na causa é apenas àqueles que de fato tenham interesse na matéria, e existem dois requisitos, que são: a representatividade dos postulantes e a relevância da matéria. 
A Coalizão Negra por Direitos reúne grupos e coletivos do movimento negro brasileiro para promover ações conjuntas de incidência política nacional e internacional. As entidades definem estratégias para intensificar o diálogo com o Congresso Nacional e com instituições como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre a pauta racial, além de fortalecer ações nos estados e municípios brasileiros nesse sentido.
Em relação à representatividade, tem-se que a Coalizão Negra por Direitos é entidade social que auxilia a coletividade afro descendente, no que se refere às atividades desta entidade, tudo conforme assentado nos seguintes dispositivos de seus Princípios:
NA PROMOÇÃO DE AÇÕES CONJUNTAS DE INCIDÊNCIA POLÍTICA, SÃO PRINCÍPIOS DA COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS:
1. Lutar por um país justo, com igualdade de direitos e oportunidades que, para se concretizar, exige um longo e profundo processo de reparação histórica à população negra brasileira;
2. combater a discriminação racial, o racismo, a dominação patriarcal, a lesbofobia, a transfobia e o genocídio da população negra;
3. enfrentar as assimetrias e desigualdades raciais, bem como buscar efetivação da justiça social redistributiva e da justiça racial restaurativa;
(...) 
9. lutar pela preservação e proteção de comunidades quilombolas e outras comunidades tradicionais negras, dos rios, das florestas e dos terreiros;
Desse modo, a Coalizão Negra por Direitos tem obrigação de defender e proteger os seus membros, e também, representar, organizar e fortalece-los, buscando sempre defender seus direitos e interesses, garantindo seus direitos. Além de colaborar com as entidades congêneres no sentido de obter a paz social no País. 
Conseguinte, não há como deixar de reconhecer que a Coalizão Negra por Direitos é entidade representativa dos interesses em discussão na presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, além de deter plenas condições para, por meio de informações técnicas, oferecer substrato probatório suficiente para que esta Corte Constitucional embase sua decisão da melhor maneira possível. 
Tal vertente, objeto de discussão no presente processo, diz respeito à continuidade da identificação, reconhecimento, delimitação,demarcação e titulação de suas terras prevista no artigo 68 do ADCT, verdade seja dita, sob a determinação de inconstitucionalidade, atacou diretamente os direitos de terras, em virtude da desapropriação das comunidades quilombolas, que neste caso devem ao menos serem conferidos de outra maneira, como versa Procuradoria Geral da República:
“(...)conferir interpretação conforme ao art. 13 do Decreto 4.887/2003, que trata da desapropriação das comunidades quilombolas, a fim de explicitar que o direito de propriedade de tais comunidades independe de desapropriação, mas que seu procedimento pode ser usado para a quantificação e o pagamento de indenização aos proprietários eventualmente prejudicados pelo reconhecimento de tal direito, uma vez que competiria, diante do princípio da igualdade, dividir com toda a sociedade o ônus de se reconhecê-lo.”
Observa-se, pois, que as disposições impugnadas nesta ADI dizem respeito à impossibilidade de “proteger uma "cultura" sem ter em conta a percepção da própria cultura protegida a respeito de seu significado e extensão”, por suposta violação a direitos dos remanescentes das comunidades quilombolas. 
Muito se fala da ligação especial dos remanescentes das comunidades quilombolas com sua terra, mas se esquece da ligação especial que atual proprietário possui com sua propriedade, o que nos remete a problemática em torno desta vertente, pois há o direito de ambos, os quais devem ser respeitados. 
Dito isso, evidenciado está o interesse da Coalizão Negra por Direitos no deslinde da presente demanda, detendo plenas condições para desempenhar a tarefa que lhe foi atribuída, e também, ante o temor de que, se mantido o processo de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação de suas terras prevista no artigo 68 do ADCT, os conflitos no País não se resolvam e venham a ser agravados. 
Cabe destacar que a demarcação de terras que não são mais ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas é uma estratégia sem dúvida ousada no atual cenário brasileiro, mas perfeitamente possível, que certamente garantirá a estrita observância dos mandamentos constitucionais e legais, promovendo o respeito aos direitos dos remanescentes das comunidades quilombolas do Brasil. 
Quanto à relevância da matéria, é evidente que as questões trazidas nesta ADI interessam a todos os produtores os membros da coalizão. 
Destarte, a Coalizão Negra por Direitos possui interesse em trazer, principalmente em sede de sustentação oral e manifestação final, argumentos e pontos a serem considerados no julgamento da presente demanda, notadamente quando se analisa que os representados da Coalizão Negra por Direitos, são grupos vulneráveis, pobres, de difícil acesso, que vivem sob as instituições de uma outra cultura, que pode ser pacífica, avessa a conflitos e sequer compreender o significado de uma ação judicial, necessitando de efetiva segurança jurídica no que se refere aos seus títulos dominiais. 
Exigir a presença de conflito de fato ou ação possessória ajuizada para caracterizar a vinculação das populações tradicionais às suas terras, além de poder atentar contra o seu instinto de sobrevivência, significa interpretar o comportamento de tais comunidades à luz dos nossos costumes e instituições, o que de forma alguma será adequado para captar seu sentimento, muito menos para preservar a sua cultura, que é o propósito da Constituição.
Presente a relevância da matéria, se mostra não só pertinente como necessária a atuação da Coalizão Negra por Direitos neste feito, para que as disposições impugnadas mereçam olhar mais apurado.
IV. DA PREVISÃO E APLICABILIDADE DO ART. 68 DOS ADCT
Afirma o Autor da presente ADIN que ao Decreto n 4887/03 não caberia regulamentar o art. 68 da ADCT. Defende o PFL que o decreto “pretende regulamentar direta e imediatamente preceito constitucional e não meramente dispor sobre organização intestina da administração”. Sendo, por isso, indevida sua promulgação. 
Como se observa da mera leitura do art. 68 do ADCT, pode-se concluir que a norma está apta a produzir todos os seus efeitos independentemente de lei infraconstitucional. Trata-se, pois, de norma de eficácia plena, uma vez que o constituinte conferiu a este dispositivo normatividade suficiente para sua incidência imediata. 
Nestes termos, o art. 68 dos ADCT consagra a proteção dos direitos culturais e sociais das comunidades remanescentes de quilombo. Trata-se, pois, de direito fundamental, e como tal, dotado de aplicabilidade imediata, conforme o determinado expressamente pelo art. 5º, § 1º, da Constituição Federal. 
Senhor Ministro Relator, a declaração judicial de constitucionalidade do Decreto nº 4.887/2003, em relação à posse e domínio de particulares, faz-se legitima a ilegalidade de permitir a demarcação quilombola sobre a posse e domínio particulares, pelo INCRA, que delas não é o proprietário. Faz-se legitima a ilegalidade de permitir que a demarcação quilombola regularize domínio de comunidade quilombola sobre a posse e domínio particulares. Faz-se legitima a ilegalidade de permitir que a demarcação quilombola cancele a matrícula imobiliária da posse e domínio particulares. Faz-se legitima a ilegalidade de permitir que na demarcação quilombola as terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias sejam identificadas pelo INCRA pela posse escrava pretérita. 
Assim, é evidente que um decreto pode regulamentar diretamente o texto constitucional: 
“Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade: tem-se objeto idôneo à ação direta de inconstitucionalidade quando o decreto impugnado não é de caráter regulamentar de lei, mas constitui ato normativo que pretende derivar seu conteúdo diretamente da Constituição. II. Ação direta de inconstitucionalidade: legitimação das entidades nacionais de classe que não depende de autorização específica de seus filiados. III. Ação direta de inconstitucionalidade: pertinência temática. 1. A pertinência temática, requisito implícito da legitimação das entidades de classe para ação direta de inconstitucionalidade, não depende de de que a categoria respectiva seja o único segmento social compreendido no âmbito normativo do diploma impugnado. 2. Há pertinência temática entre a finalidade institucional da Confederação Nacional das Profissões Liberais – que passou a a abranger a defesa dos profissionais liberais ainda empregados -, e a lei questionada, que fixa limite à remuneração dos servidores públicos. IV. Servidor público: teto de remuneração (CF, art. 37, XI): AUTO-APLICABILIDADE. DADA A EFICÁCIA PLENA E A APLICABILIDADE IMEDIATA, INCLUSIVE AOS ENTES EMPRESARIAIS DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA, DO ART. 37, XI, DA CONSTITUIÇÃO, E DO ART. 17 DO ADCT, A SUA IMPLEMENTAÇÃO – NÃO DEPENDENDO DE COMPLEMENTAÇÃO NORMATIVA – NÃO PARECE CONSTITUIR MATÉRIA DE RESERVA À LEI FORMAL E, NO ÂMBITO DO EXECUTIVO, À PRIMEIRA VISTA, PODIA SER DETERMINADA POR DECRETO, que encontra no poder hierárquico do Governador a sua fonte de legitimação.” (ADIN 1590 MC/SP).
Neste caso, trata-se de fonte secundária do direito, na qual deve-se agradar aos ditames da fonte primária, que no caso, por tratar-se de dispositivo autoaplicável, é a própria Constituição Federal. 
No Decreto nº 4.887/03 ora questionado, versa sobre o modo de agir de cada um dos órgãos administrativos, a maneira de proceder de cada um dos agentes da Administração no procedimento de outorga de títulos às comunidades remanescentes de quilombos. Não cria direitos e nem obrigações. Trata-se de dispositivo que busca inclusive dar concretude ao princípio da igualdade, uma vez que garante o tratamento uniforme a todos aqueles que requererem a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes de quilombos em todo Brasil. 
Geraldo Ataliba, afirma, em razão da função dos decretos: 
“Sua função é facilitar a execução da lei, especificá-la de modo praticável e, sobretudo, acomodar o aparelho administrativopara bem observa-la” (RDA 97/23) 
Em virtude desta vertente, Celso Antônio Bandeira de Mello também comenta:
(...) “se inexistissem tais disposições concernentes ao modus procedendi, a multiplicidade de maneiras pelas quais se poderiam efetuar ensejaria que órgãos e agentes públicos, por desfrutarem de certa discrição perante tais questões, adotassem soluções díspares entre si, incompatíveis com a boa ordem administrativa e com a igualdade de tratamento a que os administrados fazem jus”.
A Convenção 169 da OIT, o que equivale dizer que incorporou esse diploma legal, no mínimo, no mesmo nível que lei ordinária, como ocorre com qualquer tratado ratificado pelo Congresso Nacional, traz disposições claras e expressas no sentido de que, no âmbito nacinoal, “deverão ser instituídos procedimentos adequados no âmbito do sistema jurídico nacional para solucionar as reivindicações de terras formuladas pelos povos interessados”. 
A edição do Decreto Federal 4887/03 visa cumprir com essa determinação legal, absolutamente incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, pois não há como afirmar que o referido decreto inova no ordenamento jurídico pátrio, pois está ele firmemente calcado nas disposições expressas e inquestionáveis da Convenção 169 da OIT. 
Percebemos então que a impetração do ADI-3239 pela anulação do Decreto n° 4.887/2003 é totalmente infundada, visto que, o decreto se soma às normas internacionais consagradas pela Constituição Brasileira, o que demonstra que o trabalho do Estado não se limita ao artigo 68 ADCT.
V – DO CABIMENTO DA DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS REMANESCENTES 
Alega-se que o art. 68 da ADCT não autorizaria a desapropriação dos imóveis, pois acredita-se que um direito não pode infringir o outro, a cultura de um povo não pode ferir a nossa própria cultura, e também, versa que as terras poderiam até ser das comunidades quilombolas, mas não eram propriedade das mesmas no momento em que foi criada a constituição de 1988. 
Nem poderia ser diferente. Aceitar a tese esposada pelo autor de que a propriedade decorreria diretamente da Constituição significaria dizer que os direitos dos quilombolas sobre as terras que ocupam são direitos territoriais originários, tal como ocorre no caso do direito dos povos indígenas sobre as terras tradicionalmente ocupadas, no artigo 231 da Constituição Ferederal. Ocorre que os direitos territoriais indígenas têm uma origem absolutamente distinta dos direitos territoriais dos quilombos. 
É de suma importância ressaltar que o Decreto 4887/03 aborda e propõe claras soluções para as diferentes situações de conflitos fundiários os quais têm bloqueado a titulação da propriedade para as comunidades de quilombos, e causa de sua marginalização e pobreza. O Decreto atacado tenta solucionar as hipóteses de conflitos territoriais, sobreposição com terrenos da marinha, marginais de rios, ilhas e lagos, sobreposição com unidades de conservação legalmente constituídas, áreas declaradas de segurança nacional, faixas de fronteira e terras indígenas, incidentes em áreas de propriedade estadual ou municipal, e ainda a incidência de título de domínio particular não invalidado por nulidade, prescrição ou comisso, e nem tornado ineficaz por outros fundamentos. 
Ainda sobre a desapropriação de áreas quilombolas, referindo-a com a previsão constitucional do art. 216, § 1º da CF/88, é digna de registro a conclusão a que chegou a Equipe da Sociedade Brasileira de Direito Público, em trabalho coordenado pelo Prof. Dr. Carlos Ari Sundfeld, denominado “Comunidades Quilombolas Direito à Terra”: 
“É inequívoco que a proteção constitucional das comunidades de remanescentes dos quilombos não se restringe ao art. 68 do ADCT, mas também decorre dos arts. 215 e 216 da Constituição Federal. O art. 216 da Constituição Federal declarou como patrimônio cultural brasileiro os bens materiais e imateriais, tomados de forma individual ou coletiva, que reportem de alguma forma aos grupos formadores da sociedade brasileira. E, como grupos formadores da sociedade brasileira (art. 215), as comunidades remanescentes de quilombos recebem a proteção jurídico-constitucional do dispositivo que, no seu § 1º prevê a desapropriação como uma das formas de acautelamento e preservação de que o Poder Público dispõe. 
Nossa conclusão, portanto, é que o Poder Público, para garantir às comunidades quilombolas a propriedade definitiva das terras que estejam ocupando, no caso delas pertencerem a particulares, deve lançar mão do processo de desapropriação, com fundamento no art. 216, § 1.° da Constituição Federal. O referido processo de desapropriação é de nítido interesse social, com fundamento constitucional no art. 216, §1.º, e será feito em benefício de comunidades quilombolas. Tais desapropriações, quando for o caso, devem ser feitas pelos Estados e também pela União, pois ambos têm o dever constitucional de dar cumprimento aos arts. 215 e 216 da CF e ao 68 do ADCT, não demandando, por isso, a edição de lei específica. 
O Poder Público já dispõe de instrumentos jurídicos e materiais necessários para iniciar e conduzir os processos de desapropriação, possível na esfera federal, a coordenação de tarefas entre a FCP e o INCRA, cabendo ao primeiro a coordenação do programa de regularização e, ao segundo, a efetivação do processo de desapropriação da propriedade privada.”
As hipóteses de cabimento da desapropriação estão previstas expressamente na Constituição. Há as hipóteses abstratas que estão previstas no art. 5º, XXIV da CF/88, e as hipóteses concretas, que estão previstas no art. 182 e no art. 184 da CF/88. Como regra geral, as hipóteses abstratas foram monopolizadas na Carta, ficando outorgadas ao legislador ordinário dar-lhes concretude, mediante criação de hipóteses materiais. No entanto, prevendo algumas hipóteses concretas na Própria Constituinte, o constituinte auferiu-lhes essa concretude diretamente a partir do texto constitucional. 
O art. 68 dos ADCT, determina ao Estado a obrigação de titulação dos territórios quilombolas. Diriam alguns, numa leitura apressada, que o legislador constituinte, ao prever a consolidação de um direito subjetivo preexistente em favor dos remanescentes de comunidades quilombolas, não teria cogitado da utilização do instituto jurídico da desapropriação, por parte do Estado, para fazer valer o comando constitucional previsto no art. 68 da ADCT, argumentado, para tanto, que sobre os imóveis já transferidos ao patrimônio particular em 1988, não poderiam subsistir direitos decorrentes da posse centenária, pacífica e transmitida ininterruptamente de geração a geração quilombola. 
Ocorre, no entanto, que essas comunidades historicamente foram sujeitas a todos os tipos de esbulho na posse sobre seus territórios e, por não terem acesso aos meios necessários à defesa judicial de seus interesses, viram terceiros se apropriarem das terras por elas ocupadas e utilizadas há gerações sem nada poderem fazer, pois muitas vezes elas nem cientes eram de que a titularidade da área havia sido outorgada a um terceiro. 
Quando não houver havido usucapião, comisso ou outra forma de aquisição originária da propriedade, para cumprir o disposto na Convenção 169 da OIT e no art. 68 dos ADCT, deve-se prover a desapropriação. Para o Estado emitir os títulos de domínio, far-se-á necessária a desapropriação de imóveis de particulares.
VII – DA TERRITORIALIDADE QUILOMBOLA
Os parágrafos 2º e 3º do artigo 2º do Decreto 4.887/2003, estabelecem: 
Art. 2º Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida. 
§ 1º (...) 
§ 2º São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural. 
§ 3º Para a medição e demarcaçãodas terras, serão levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo facultado à comunidade interessada apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental. 
Cabe ressaltar que a constitucionalidade destes dispositivos legais é patente, posto que estão em total harmonia com outros dispositivos constitucionais, bem como com tratados internacionais ratificados pelo Brasil. A Convenção 169 da OIT explica que:
“ a utilização do termo "terras" deverá incluir o conceito de territórios, o que abrange a totalidade habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma”. 
Deve-se reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam, além disso, deverão ser adotadas medidas para salvaguardar o direito dos povos interessados de utilizar terras que não estejam exclusivamente ocupadas por eles, as quais tenham tido acesso para suas atividades tradicionais e de subsistência. Estas terras são também essenciais como instrumento de identidade cultural das comunidades que nelas se estabeleceram preservando práticas culturais próprias, constituindo o que se define como “território étnico”. 
Os territórios quilombolas abrangem muito mais do que as áreas destinadas à moradia ou à abertura de roças, pois abrangem também as áreas de caça, pesca, extrativismos e aquelas destinadas às manifestações culturais, aos ritos religiosos, à reverência aos mortos, enfim, a outras atividades que lhes conformam cultural e socialmente, e que por essa razão são fundamentais para garantir sua reprodução física, social, econômica e cultural, tal como determinado pela Constituição Federal e pela Convenção 169 da OIT. 
Dentre os diversos costumes e condições de vida das comunidades negras quilombolas um traço que lhes é característico e fundamental é o uso comum da terra. Essa posse coletiva, também denominada por alguns autores como posse agroecológica, é distinta da posse tradicionalmente reconhecida pelo Direito Civil e prevista em nossa legislação ordinária, pois não pressupõe o uso exclusivo de uma pessoa ou família sobre um determinado território, mas o uso alternado e promíscuo de um mesmo território por diversas pessoas e famílias, de forma mais ou menos intensa, sem divisar exclusividade a ninguém. 
Este território étnico, indivisível e não passível de exploração meramente econômica, é também causa da intensificação dos conflitos fundiários e das tentativas de expropriação. Os fortes laços de parentesco e o uso comum da terra e de seus recursos, que despontam como fatores da resistência quilombola, representam um contraponto à ordem capitalista de expansão no campo e, por não estarem passíveis para a apropriação para fins de exploração privada. A CF/88 inovou ao conferir proteção jurídica especial aos remanescentes de quilombo, no sentido de proteger os direitos fundamentais de um grupo étnico específico, dentre os quais destacamos o direito à vida, à moradia digna e à igualdade. 
O quilombola, tal qual o índio, não sobrevive fora da territorialidade que integra a sua identidade cultural. Desta forma, o Decreto 4887/03 garante a implementação do direito à terra dos remanescentes das comunidades de quilombo ao conferir segurança jurídica da posse, a titulação coletiva e a gratuidade do registro. O que demanda a Constituição Federal e a Convenção 169 da OIT, não é uma simples regularização fundiária, mas a garantia da integridade física e ambiental do território. 
Por meio disso, o território quilombola não pode ser entendido como mera exteriorização do direito de propriedade, vez que adquire sentido a partir do reconhecimento do direito à sobrevivência cultural de um determinado grupo étnico, com isso, o Decreto dá cumprimento ao princípio da função social da propriedade rural, ao preservar o patrimônio histórico, cultural e ambiental.
Outro ponto questionado, é a caracterização dos remanescentes de quilombos será atestada mediante autodefinição, segundo a ADI-3239, o Decreto n° 4.887/2003 sugere que a identificação dos remanescentes a que se refere o artigo 2°, §1°, a autodefinição, deriva de mera manifestação de vontade. 
A ADI argumenta ainda que, segundo letra constitucional, seria necessário e indispensável comprovar a remanescência das comunidades dos quilombos, pois o atual critério, frustra o real objetivo da norma constitucional. Afora o fato de que a discussão trazida a esta Corte deve restringir-se à seara constitucional, e em nenhum momento o autor demonstrou qual o dispositivo constitucional violado, o que de per se já afastaria suas alegações, o critério adotado está lastreado na melhor doutrina e no direito internacional. 
A Convenção 169 define que a autodeterminação e a consciência da identidade é que deve ser considerada como critério fundamental para determinar os grupos aos quais se aplicam as disposições ali previstas. Inclusive, o artigo 5º do Decreto, versa que o Ministério da Cultura, por meio da Fundação Cultural Palmares, assistirá e acompanhará o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o INCRA nas ações de regularização fundiária, para subsidiar os trabalhos técnicos quando houver contestação ao procedimento de identificação e reconhecimento previsto neste Decreto. Então, além de não afrontar qualquer dispositivo constitucional, está o critério da autodefinição lastreado em regras jurídicas expressas. 
Neste caso, por envolver vários órgãos no processo de identificação e demarcação, e por envolver uma fase de contraditório, não há o alegado perigo de abuso do direito, pois não caberá pura e simplesmente à comunidade se autodenominar como quilombola para que automaticamente faça jus ao direito à terra, como simploriamente acredita o autor.
VIII - CONCLUSÃO 
O Decreto nº 4.887/2003 é parte do sistema que o Brasil escolheu para cumprir a suas obrigações internacionais relativas ao direito à não-discriminação e à identidade cultural dos quilombolas, ora impugnado é derivado de um processo de convergência entre o governo federal e a sociedade civil organizada para substituir a normativa anterior, gozando, portanto, de legitimidade política e lastro social, além de plena validade e eficácia jurídica. Uma declaração de inconstitucionalidade nos remeteria a situação de discriminação contra comunidades quilombolas, contrariando as normas contidas no Direito Internacional. 
O art.68 dos ADCT é uma norma constitucional de eficácia plena, razão pela qual pode ser diretamente regulamentada por decreto administrativo, como é o caso do Decreto 4887/03, além da possibilidade de regulamentação direta do art.68 dos ADCT, este decreto retira sua fundamentação jurídica dos diversos dispositivos estabelecidos na Convenção 169 da OIT, que foi ratificada pelo Brasil e tem status de norma jurídica interna, de nível constitucional, por tratar da proteção de direitos fundamentais. 
Não há inconstitucionalidade ao se prever a necessidade de desapropriação, pois ela já está prevista na legislação ordinária e, de acordo com a teoria dos poderes implícitos, prevista no próprio art.68 dos ADCT. Não consegue o autor demonstrar qual a inconstitucionalidade presente nos critérios de identificação da comunidade e do território quilombola, e todos eles estão fundamentados em dispositivos internacionais e na melhor doutrina antropológica ante essas conclusões e a todo o anteriormente exposto, requeremos seja julgada improcedente a ADI 3239, para que se reconheça a constitucionalidade e validade jurídica do Decreto Federal 4887/03.
Termos em que,
Pede deferimento.
Distrito Federal, xx/xx/2018.
Nome do Advogado
OAB/XX nº xxxxxx

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