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61 ÉTICA E DEONTOLOGIA Unidade II Já verificamos conceitos fundamentais de ética, moral, direito e valor, bem como as atrocidades ocorridas na Segunda Guerra mundial e a necessidade de elaboração de documentos éticos que protegessem o participante durante as pesquisas. Agora vamos estudar como a bioética está inserida nas áreas da saúde, inclusive na Fisioterapia, discutiremos os conceitos de vida e morte e alguns temas polêmicos na área da saúde. Terminaremos nossos estudos entendendo o que é deontologia, a importância de um código profissional e sua relação com conceitos éticos e bioéticos. Para tal, serão estudados os impactos causados pela pandemia no código de ética e aprenderemos como calcular o valor de um atendimento fisioterapêutico baseado em um referencial de procedimentos fisioterapêuticos. Preparados? 5 BIOÉTICA NA ÁREA DA SAÚDE Para falarmos sobre a bioética na área da saúde, devemos relembrar dois conceitos essenciais: • Ética: conjunto de princípios universais que regem a conduta do ser humano; trata-se de uma crítica reflexiva, um ramo da filosofia. • Bioética: análise de situações problemáticas que envolvem a medicina, a biologia; envolve a ética da vida. Conforme estudado anteriormente, o principialismo está fundamentado na prática clínica na seara da medicina, já que esses princípios procuram orientar o profissional em ações médicas na relação médico-paciente. A bioética tem como objeto de estudo os valores que movem a sociedade. O ensino em bioética promove esses valores no indivíduo, que se encontra em permanente construção. A bioética não padroniza valores, mas exige uma reflexão que implica escolhas que devem ser tomadas sem preconceitos, coação ou coerção (WOLFF, 1993). Ainda podemos entender a bioética aplicada como um estudo sistemático da conduta humana na área das ciências da vida e dos cuidados de saúde através da análise do comportamento à luz dos valores e princípios morais. 62 Unidade II Observamos ao longo da história uma transformação rápida do mundo e da ciência; o que era novidade ontem hoje já pode não ser mais usual na área da saúde. Dessa forma, é normal observarmos conflitos éticos na área da saúde, afinal, o que é considerado como certo? Para respondermos a essa questão, precisamos recorrer às ferramentas da bioética, o que nos norteará na tomada de decisões diante de um conflito. Além dos princípios, não podemos nos esquecer da responsabilidade em um conflito e em uma tomada de decisão. Nos últimos anos, ocorreu aumento significativo do reconhecimento da importância da bioética como um conteúdo vital para a formação profissional no Brasil. As temáticas que envolvem fisioterapia e bioética estiveram fundamentadas, ao longo do tempo, em conceitos deontológicos, limitados ao código de ética profissional e, consequentemente, aos seus aspectos legais. Por meio de algumas situações vivenciadas no cotidiano, podemos entender que muitas vezes, na área da saúde, apenas os códigos de ética relacionados às profissões não são suficientes para a resolução de conflitos e dilemas muitas vezes. Por exemplo: Como agir perante um paciente agressivo, que se recusa a realizar a terapia? Como agir com um paciente em coma? Ou seja, precisamos ir além, temos de fazer uso do respeito ao outro pelo simples fato de ser uma pessoa e com isso respeitar sua dignidade. Assim, resgatamos a essência da bioética, que é a liberdade, ou seja, a liberdade com responsabilidade. Observação A bioética não está restrita apenas à área da saúde, desde o seu nascimento a bioética abrange outras áreas do conhecimento através de sua interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multidisciplinaridade. Um exemplo atual em que os princípios bioéticos e a ética médica foram feridos na área da saúde é o caso da estudante de medicina que estava de plantão em um hospital em Alagoas. Quando estava próximo de seu horário de “descanso”, um paciente grave precisava ser atendido, o que provavelmente “atrasaria” o horário de descanso da estudante. Inconformada com a situação, ela expôs o caso nas redes sociais, inclusive divulgando o nome da paciente, ferindo totalmente a dignidade dela. A paciente acabou indo a óbito. A atitude da estudante feriu o código de ética médica no que diz respeito ao sigilo de informações relacionadas ao paciente, feriou a dignidade da paciente quando expôs seu nome e sua condição de saúde em rede social, além de ferir os princípios e referenciais bioéticos de beneficência, justiça, vulnerabilidade e respeito. O respeito pela pessoa passa a humanizar os cuidados e elimina uma relação autoritária, paternalista, emergindo o respeito pela decisão do paciente e estabelecendo uma relação de confiança. Quando resgatamos o paternalismo de Hipócrates, relembramos a atitude paternalista que era prevalente na época, porém hoje muitas vezes nos deparamos com profissionais que ainda mantêm esta atitude, decidindo o que é melhor para o paciente de acordo com seus conceitos e “crenças”, sem levar em consideração a autonomia e os sentimentos do paciente e/ou familiares. Para saber o que é bom para 63 ÉTICA E DEONTOLOGIA o paciente, devemos entender seus anseios, suas angústias e respeitar suas escolhas e/ou dos familiares sempre que se fizer necessário. E na fisioterapia, onde a bioética se encaixa? A fisioterapia, assim como qualquer outra profissão da área da saúde, encontra diversos conflitos éticos além daqueles que envolvem terminalidade da vida ou prematuridade extrema, lida com questões que envolvem a autonomia do paciente, o sigilo e a confidencialidade de informações, entre outros. O fisioterapeuta deve possuir um conhecimento sobre a bioética, suas ferramentas e aplicações, pois, durante a prática clínica, vários dilemas podem estar presentes, e a utilização dos conceitos de ética e bioética será necessária para auxiliá-lo na resolução desses dilemas. O profissional não deve seguir o exemplo do paternalismo médico, deve dar voz ao seu paciente e respeitá-lo em todas as suas dimensões. A bioética oferece subsídios para decisões referentes à saúde, vida, morte, dignidade, vulnerabilidade, confidencialidade, entre outros referenciais, além de defender a humanização do atendimento na saúde. Falando em vulnerabilidade, você sabe o que esta palavra significa e qual a sua importância na área da saúde? Com origem do latim vulnus (ferida), a vulnerabilidade expressa a possibilidade de alguém ser ferido, assim, podemos entender que todos os seres vivos podem ser feridos intencionalmente ou não. A vulnerabilidade é considerada como uma condição essencial de todo ser humano e significa ser suscetível a sofrer algum tipo de dano; ou seja, o fato de estar vivo é uma possibilidade biológica de estar suscetível a danos psicológicos, físicos ou sociais (KOTOW, 2003). Por sermos todos mortais, somos todos vulneráveis, pois de alguma maneira estamos sujeitos a sermos feridos ou ofendidos por pessoas, situações e até por acidentes. E, por sabermos que somos vulneráveis, construímos leis, normas de condutas e até criamos meios próprios de defesa. O conceito de vulnerabilidade pode ser aplicado não só ao indivíduo, mas também ao ambiente onde esse indivíduo se encontra, pois a vulnerabilidade pode se fazer presente tanto no indivíduo, quanto no ambiente, nos gestores de saúde, nos profissionais e nos familiares. Observamos que o conceito de vulnerabilidade é antigo, e no Tribunal de Nuremberg podemos evidenciar claramente essa questão, pois o Código de Nuremberg nasceu após os abusos excessivos a grupos de vulneráveis, que eram os prisioneiros dos campos de concentração, por exemplo. O ser humano é sempre vulnerável, porém nem sempre se encontra em uma situação de vulnerabilidade. A vulnerabilidade deve ser entendida como um referencial bioético em toda e qualquer avaliação bioética, seja no campo da saúde, do meio ambiente ou das ciências da vida. Isso se explica porque a vulnerabilidade está sempre presentee acompanha o ser humano. 64 Unidade II Para uma aplicação prática, a vulnerabilidade, segundo Hossne (2009): • deve ser avaliada quanto a sua etiopatogenia, fisiopatologia, quadro sintomático, eventos colaterais, medidas profiláticas, prognósticos e eventuais sequelas; • no tocante às medidas de proteção, do ponto de vista ético, só deve ser considerada quando houver a avaliação sistemática da vulnerabilidade como síndrome; • embora não seja diretamente um referencial normativo, deve sempre ser levada em consideração quando do estabelecimento de normas com inspiração bioética. A vulnerabilidade como princípio bioético garante o respeito pela dignidade humana em situações em que a autonomia e o termo de consentimento são insuficientes. No âmbito da bioética, a vulnerabilidade é discutida a partir de três visões, segundo Pessini, Bertachini e Barchifontaine (2014): • Como visão humana universal: o ser humano, como todo ser vivo, é vulnerável. Além disso, o ser humano sabe que é vulnerável e compartilha isso com todos os viventes; diferentemente de outros animais, o ser humano é o único que reflete sobre seu próprio fim. • Como característica particular de pessoas e grupos: no âmbito de pesquisa envolvendo seres humanos, a qualificação dos sujeitos como vulneráveis impõe a obrigatoriedade ética de sua defesa e sua proteção. • Como princípio ético internacional: na recente Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos, o artigo 8º evidencia a obrigatoriedade do respeito pela vulnerabilidade humana e pela integridade pessoal, ou seja, os indivíduos e grupos de vulnerabilidade específica devem ser protegidos, e a integridade individual de cada um deve ser respeitada. Segundo Anjos (2006), a autonomia está ligada de forma intrínseca à vulnerabilidade e, para ser superada, necessita que as privações de cunho social, cultural, psíquico e físico sejam ultrapassadas. Dessa forma, ao se falar em vulnerabilidade, deve-se levar em consideração as condições sociais de desigualdade, pois tais condições favorecem o surgimento de vulnerabilidade. O reconhecimento da vulnerabilidade do sujeito resulta no reconhecimento da própria vulnerabilidade humana. O ato de cuidar é polissêmico. A vulnerabilidade deve ser compreendida em todos os seus elos, que compõem uma corrente que forma um sistema maior. Todas as partes que sustentem esse conjunto deverão ser analisadas, e não apenas o sujeito em si. A vulnerabilidade deverá ser avaliada independentemente da autonomia (HOSSNE, 2009). Quanto maior o grau de estresse enfrentado, mais vulnerável encontra-se o indivíduo, sendo essencial haver uma abertura para que se possa ouvir o lado de quem se encontra em sofrimento ou mais vulnerável no ambiente em que está inserido. 65 ÉTICA E DEONTOLOGIA Alguns temas polêmicos são encontrados na área da saúde e necessitam da bioética e seus princípios para a solução de dilemas e angústias. Como exemplo, podemos citar a distanásia, a eutanásia, a ortotanásia e a mistanásia (temas que serão discutidos adiante). Contudo, a bioética vai muito além desses temas polêmicos, ela está presente no dia a dia dos profissionais da saúde, no relacionamento com o paciente, familiares e equipe multiprofissional. Um dos exemplos mais atuais sobre conflitos existentes na área da saúde que encontramos no SUS é sobre a vacinação contra o coronavírus. Quando as vacinas foram disponibilizadas, surgiram conflitos como: devemos vacinar primeiro qual população? Os idosos, as crianças, os profissionais de saúde, os que possuem comorbidades ou doenças crônicas? Qual vacina devemos usar? Não temos respostas para essas perguntas, pois não sabemos o que é certo e o que é errado. Porém, utilizando conceitos da bioética, estudos, o respeito e a responsabilidade, conseguimos estabelecer uma “ordem” de vacinação da população. Será mesmo? Eis um dilema bioético para você tentar desvendar. 5.1 Bioética na fisioterapia No final do século XIX, a ética médica era ensinada na disciplina de medicina legal no curso de Medicina devido à relação entre ética, lei e o exercício profissional. Em 1960, com a divulgação dos direitos humanos juntamente com a divulgação dos abusos científicos ocorridos na época das Guerras Mundiais, ocorreu uma grande expansão do estudo da ética nas faculdades de medicina. Por causa disso, em 1983, em reunião na Faculdade de Dartmouth, foi proposta uma base curricular de ética nas faculdades (NEVES, 2008). Lembrete A bioética tem como objeto de estudo os valores que movem a sociedade. O ensino em bioética promove esses valores no indivíduo, que se encontra em permanente construção. A inserção da bioética como disciplina nos currículos da área da saúde vem acontecendo de forma lenta e fragmentada. É cada vez mais notória a importância do conhecimento sobre a bioética para a resolução de dilemas durante a prática profissional em um ambiente de saúde. Nos últimos anos ocorreu um aumento significativo do reconhecimento da importância da bioética como um conteúdo vital para a formação profissional no Brasil. As temáticas que envolvem fisioterapia e bioética estiveram fundamentadas, ao longo do tempo, em conceitos deontológicos, limitados ao código de ética profissional e, consequentemente, aos seus aspectos legais. Hoje sabemos que a bioética não está pautada apenas em aspectos legais relacionados ao código de ética profissional, pois ela faz parte das relações humanas, da necessidade do cuidar, do cuidado com o outro e em relação ao outro, das relações profissionais, de uma tomada de decisão consciente, equilibrada e prudente a partir de uma análise cognitiva e emotiva do cuidado. 66 Unidade II Como sabemos, a fisioterapia é essencial para promoção, prevenção e recuperação da saúde. Por meio do toque no corpo do outro, estabelecemos uma relação física com o paciente, e o tratamento constante e próximo exige do fisioterapeuta uma ótima comunicação com seu paciente/familiares e equipe multiprofissional. Dessa forma, a bioética e a fisioterapia se aproximam com o objetivo principal de garantir a autonomia do paciente, oferecendo melhores cuidados e respeitando sua dignidade até o momento de terminalidade de vida. As reflexões éticas e bioéticas convidam o fisioterapeuta a se colocar no lugar do outro sem julgamentos, entendendo as suas limitações e, assim, estabelecendo objetivos e condutas apropriados para cada paciente, levando-o a analisar o momento em que este paciente precisa ser encaminhado a outro profissional sem julgamentos, respeitando a sua autonomia. O contexto de vida dos pacientes também é motivo de reflexão para o fisioterapeuta, que deve associar esse contexto aos tipos de terapias propostos e seus benefícios ao paciente. Com o estudo e aprofundamento da bioética, os pacientes mais difíceis de lidar são atendidos pelo fisioterapeuta com respeito e a eles são proporcionados o melhor que o fisioterapeuta tem a oferecer: empatia, cuidado, compaixão, respeito. O fisioterapeuta atua orientado por diversos setores da medicina e da saúde, e essa complexa formação acadêmica tem como objetivo capacitá-lo para diagnosticar distúrbios cinéticos funcionais, distúrbios respiratórios e para prescrever sua conduta fisioterapêutica. É imprescindível que o fisioterapeuta também tenha conhecimento das realidades sociais e culturais da população alvo para uma correta avaliação. 6 VIDA VERSUS MORTE Para entendermos alguns conceitos importantes na área da saúde que estão diretamente associados a dilemas e discussões éticas e bioéticas, devemos primeiro entender o significado de dois termos importantes: vida e morte. Você saberia defini-los? Parece fácil, não é? De uma maneira bem informal, poderíamos definir a vida como sendo um momento único, em que estamos sujeitos a emoções, a sensações etc. Já a morte seria o fim de tudo, o cessar, o adeus, o nunca mais... Mas será mesmo que essas são as definições aceitas para esses termos? Observação Vida – dolatim vita.ae. Substantivo feminino: conjunto dos hábitos e costumes de alguém; maneira de viver; reunião daquilo que diferencia um corpo vivo do morto; o que define um organismo do seu nascimento até a morte (DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS). 67 ÉTICA E DEONTOLOGIA Figura 14 – Início da vida Disponível em: https://bit.ly/3yipcK0. Acesso em: 3 maio 2022. Na nossa cultura, o conceito de vida esteve sempre associado a um conceito cristão, no qual ela estaria relacionada ao divino e seria uma criação de Deus, portanto apenas Ele teria o direito de dar a vida a alguém ou até mesmo tirá-la. Entretanto, além de um dilema sobre seu significado, entramos em outro dilema quando o assunto é esse: • Quando a vida começa? • A vida começa apenas quando nascemos? • A vida começa já no momento da concepção? Para responder a esses questionamentos, vamos analisar o conceito de vida através de um cunho filosófico proposto por René Descartes no século XIX que relacionava a vida com o ato de raciocinar: “penso, logo existo”. De acordo com o cunho religioso, temos os seguintes aspectos: • Para os católicos e hinduístas, a vida começa no momento da concepção, quando o feto já adquire seu código genético. • Para os judeus, a vida começa a partir do momento que o feto adquire formato humano. • Para o islamismo, a vida começa assim que Alá sopra o embrião. Quando você acha que a comunidade científica entende que a vida tem início? Encontramos algumas correntes que defendem o seguinte: • A vida se inicia quando o óvulo se fixa à parede do útero, momento denominado nidação (geralmente ocorre 7 dias após a fecundação), pois, nesse momento, o embrião se encontra em condições de se desenvolver e, portanto, de ter vida. 68 Unidade II • A vida se inicia na terceira semana de gestação, quando o embrião não é mais capaz de se dividir e dar origem a um ou mais gêmeos. A partir da terceira semana, o embrião se torna único. • A vida se inicia na oitava semana de gestação, quando o feto passa a apresentar ondas cerebrais semelhantes às de um ser humano “pronto” (alguns pesquisadores ainda afirmam que essas ondas cerebrais são encontradas no feto a partir da vigésima semana). MorteNascimento Vida Figura 15 – Vida: o intervalo entre o nascimento e a morte Se para entender a vida nos basearmos que o fim da vida pode ser caracterizado quando não há mais atividade cerebral, a última teoria científica de início de vida faria mais sentido, já que entendemos a vida como o oposto da morte, ou seja, se há atividade cerebral, há vida; assim, em um óvulo recém-fecundado, não há atividades cerebrais, portanto, segundo essa teoria, ainda não há vida. O 2º artigo do Código Civil (BRASIL, 2002) afirma que a personalidade civil de uma pessoa começa com o nascimento, mas a lei resguarda os direitos do nascituro (aquele que foi fecundado, mas ainda não nasceu) desde a sua concepção, deixando implícito que, mesmo antes de nascer, o feto possui direitos, inclusive se ocorrer o óbito logo após o nascimento: ou seja, pelo simples fato de ter nascido, há a aquisição de direitos. Portanto, se a personalidade civil está também associada ao nascituro, ele não seria portador de uma dignidade a partir do momento da fecundação? Conforme a ciência preceitua, sabe-se que durante todo o período gestacional apresentamos uma memória que, na vida adulta, pode desencadear problemas relacionados a traumas como brigas entre os pais, acidentes etc., os quais foram vivenciados durante a gestação. O início da vida continua sendo um dilema atualmente. É difícil defini-la e explicar quando ela se inicia. Contudo, temos plena convicção com os avanços científicos e tecnológicos de que podemos originar uma vida através de uma fecundação in vitro; podemos manter uma vida por meio de meios artificiais; e ao mesmo tempo podemos ceifar uma vida com o uso de tecnologias, medicamentos etc. Se levarmos em consideração esse “poder” que a tecnologia nos conferiu sobre o início da vida, estaríamos descartando as teorias religiosas sobre ela. Essas questões geram dilemas bioéticos associados a temas polêmicos como: aborto, fetos anencéfalos, utilização de células-tronco, reprodução assistida, entre outros. Os problemas bioéticos associados ao início da vida se relacionam aos direitos inerentes aos seres humanos. A vida e seu início estão relacionados às etapas do desenvolvimento embrionário e fetal durante todo o período gestacional. No caso de ocorrer uma interrupção da gravidez, temos aí um dilema bioético, pois estaríamos ferindo a autonomia do feto/embrião, já que ele possui direitos pelo simples fato de ter vida. 69 ÉTICA E DEONTOLOGIA Pensando nos princípios da beneficência e não maleficência, a vida se inicia no momento da fecundação e nidação, já que o embrião possui terminações nervosas para realizar movimentos e já apresenta sensações, portanto, no caso da interrupção de uma gestação, será que esse feto não seria passível de um sentimento de dor? Independentemente da teoria aceita sobre o início da vida, devemos nos conscientizar sobre o bem maior que é a vida e que ela deve ser protegida desde seu início até sua finitude. E a morte? Seria apenas o oposto da vida? Seria realmente o fim de tudo ou o início de tudo? Observação Morte – do latim mors.mortis. Substantivo feminino: óbito ou falecimento; cessação completa da vida, da existência; extinção; falta de existência ou ausência definitiva de alguma coisa. Figura 16 – A temida morte Disponível em: https://bit.ly/3LPAIAx. Acesso em: 3 maio 2022. Ao mesmo tempo que fascina, a morte é um tema que aterroriza e traz incertezas às pessoas, pois envolve um “lugar” e uma situação desconhecidos, inacessíveis a todos que estamos vivos, gerando curiosidade em uns e medo em outros. Cada cultura tem sua forma particular de figurar a morte, assim como os rituais pós-morte são específicos para cada sociedade. Cada um de nós, de acordo com nossas crenças e valores, tem um conceito sobre a morte, e muitas vezes esse conceito não condiz com a situação que estamos vivenciando, principalmente quando nos tornamos profissionais da saúde, o que nos faz refletir ainda mais sobre o processo de morrer e o conceito de morte. 70 Unidade II Nos primórdios, a morte era retratada como uma figura serena, pois a morte era considerada como um processo natural inerente aos seres vivos, um processo indolor pelo qual os seres vivos passam. Todavia, com o passar dos anos, a figura da morte foi se tornando macabra, ocasionando medo em diversas sociedades. Com o cristianismo, por exemplo, ela passou a adotar a figura de um anjo negro, perdendo a sua serenidade. Nos dias atuais, associamos a morte a uma figura sombria, munida de uma foice que nos conduzirá ao fim da vida, gerando medo e pavor. Já em Atenas, o Senado tinha o poder absoluto de decidir sobre a eliminação dos velhos e incuráveis, dando-lhes o conium maculatum – bebida venenosa – em cerimônias especiais. Na Idade Média, oferecia-se aos guerreiros feridos um punhal muito afiado, conhecido por “misericórdia”, que lhes servia para evitar o sofrimento e a desonra. O polegar para baixo dos césares era uma indulgente autorização à morte, permitindo aos gladiadores feridos evitarem a agonia e o ultraje. No antigo Egito, a morte não era considerada o final ou uma circunstância de repouso, mas sim o início de uma nova vida em um mundo paralelo; a civilização egípcia realizava pintura nos sarcófagos com o objetivo de orientar a alma dos mortos em sua jornada para Osiris (o deus da morte), e posteriormente eles passaram a deixar escritas (papiros) com fórmulas e preces para auxiliar os mortos nessa jornada para uma nova dimensão existencial após a vida. Na mitologia grega, o deus do submundo e dos mortos era chamado de Hades, a divindade mais temida e abominada. O infanticídio na Grécia antiga ocorria devido à erradicação de recém-nascidos com defeitos físicos e idosos gravemente enfermos com o objetivo dealiviar o sofrimento (BRAGA; BRAGA; SOUZA, 2021). Platão, Sócrates e Epicuro defendiam que o sofrimento resultante de uma doença dolorosa justificava o suicídio; já Aristóteles, Pitágoras e Hipócrates, ao contrário, condenavam o suicídio em qualquer circunstância. Na antiga Índia, os incuráveis eram jogados no rio Ganges, depois de terem a boca e as narinas vedadas com a lama sagrada. No Império Romano, o deus da morte era Plutão, e era comum que crianças com malformações fossem exterminadas por seus familiares. Na Idade Média, os cristãos ocidentais pediam a Deus que não fossem acometidos de uma morte repentina, pois o sofrimento e a dor ocasionada por doenças beneficiavam a evolução dos doentes no plano espiritual. A aplicação de torturas e condenações à morte para indivíduos que não respeitavam as normas religiosas ou legais na Idade Média e na Idade Moderna foi considerada a melhor alternativa para reprimir práticas que tornassem o regime instável. Na Idade Contemporânea, o conceito de morte foi modificado, e a agonia e a doença foram consideradas irrelevantes para a salvação do espírito na fase terminal da vida. Então, as pessoas passaram a falecer em hospitais, e não mais em suas residências (BRAGA; BRAGA; SOUZA, 2021). A única certeza que temos na vida é a morte. Não sabemos como e quando ela vai acontecer, porém ela chegará para todos, portanto temos que conviver com essa certeza e lidar com o medo. O medo da morte está associado ao medo da solidão, da tristeza, da separação, do desconhecido e está presente em nós desde a infância, quando passamos por uma situação de perda de um bichinho de estimação, algum familiar ou até mesmo um brinquedo predileto. 71 ÉTICA E DEONTOLOGIA A morte é um processo natural, assim como nascer, apesar de nos causar medo, afinal, ninguém voltou para nos contar o que há depois da morte e se há alguma coisa “do outro lado”. Apesar de ser um processo natural inerente aos seres humanos, a morte se tornou um tabu, um mistério ou algo inaceitável mesmo sendo a única certeza de nossa existência. Podemos considerar a morte como justa, pois ela atinge a todos, do mais rico ao mais pobre, do justo ao injusto, sem distinção de cor, raça e credo. Como dito anteriormente, para o cristianismo, assim como a vida, a morte também está atribuída a Deus e, portanto, ninguém teria o poder de controlá-la e de decidir quando ela irá acontecer e de que forma. Mas atualmente não é bem assim. A morte deixou de ser considerada como um evento natural, pois os avanços tecnológicos na área da ciência permitiram ao homem manter um indivíduo vivo através de máquina que desempenha a função de órgãos essenciais, como o pulmão, por exemplo. Portanto, com o avanço tecnológico, desejamos que nossos pacientes e entes queridos adquiram a imortalidade, não conseguimos aceitar que a morte é um processo natural. A citação latina timor mortis contourbat (o temos da morte me perturba) deixa clara a negação da morte na atualidade. Para o profissional da saúde, a morte é uma grande adversária, pois leva o profissional a lutar contra ela a todo custo utilizando-se de todo arsenal tecnológico, terapêutico e medicamentoso. Contudo, essa luta incessante contra a morte pode acabar por ferir a dignidade do paciente em uma situação de terminalidade de vida ocasionada por uma doença em que não haja a possibilidade terapêutica de cura. Mesmo lidando com ela diariamente, muitas vezes o profissional de saúde não consegue aceitar que a morte é um fator essencial da existência humana. Com o avanço das tecnologias médicas e da ciência, um novo conceito de morte passou a ser demasiadamente discutido. Esse conceito polêmico somente foi esclarecido após o primeiro transplante cardíaco da história, em dezembro de 1967 na África do Sul. Para que isso fosse realizado, havia a necessidade de o doador estar vivo para a retirada de seu coração, o que gerou críticas ao procedimento. Em 1968, uma comissão da Faculdade de Medicina de Harvard estabeleceu critérios que passaram a caracterizar efetivamente o “como irreversível” é a morte cerebral (BRAGA; BRAGA; SOUZA, 2021). Temos atualmente dois conceitos relacionados ao tema morte: • A morte ocasionada pelo término das funções vitais – parada circulatória e respiratória irreversíveis. • A morte ocasionada pelo término das atividades do tronco e do córtex cerebral – a chamada morte encefálica. Perda definitiva e irreversível das funções do encéfalo, comprovada e capaz de provocar o quadro clínico (CFM, 2017). Quando tratamos da morte encefálica, nos deparamos com um grande dilema: “como meu paciente pode estar sem vida se ele ainda apresenta batimentos cardíacos?”. Essa é uma questão que ronda profissionais da saúde e familiares. Todavia, a detecção de uma morte encefálica não é tão simples assim. De acordo com a Resolução do Conselho Federal de Medicina n. 2.173 (CFM, 17), o protocolo para detecção de morte encefálica deve ser iniciado em todos os pacientes que estejam em coma não perceptivo, ausência de reatividade supraespinhal e apneia persistente e, para isso, é preciso realizar: 72 Unidade II • dois exames clínicos que confirmem coma não perceptivo e ausência de função do tronco encefálico; • teste de apneia que confirme ausência de movimentos respiratórios após estimulação máxima dos centros respiratórios; • exame complementar que comprove ausência de atividade encefálica. Saiba mais Para entender o protocolo de morte encefálica, leia: CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM). Resolução n. 2.173, de 23 de novembro de 2017. Brasília, 2017. Disponível em: https://bit.ly/3FccSwl. Acesso em: 3 maio 2022. Devemos lembrar que todo ser humano possui uma dignidade e que ela deve ser respeitada como sendo o seu maior valor. Assim, o respeito deve acontecer em vida e também no processo de morrer, em uma situação de terminalidade. Quando conseguimos interpretar o conceito da morte, estamos preparados para enfrentar os mais variados dilemas da vida. Porém sabemos que descontruir alguns conceitos aterrorizadores sobre ela não é um processo fácil, portanto, o diálogo e a comunicação irrestrita sobre o tema com pacientes, familiares e profissionais é fundamental para desconstruir essa mistificação relacionada à morte e aos avanços tecnológicos e científicos, que, de certa maneira, estão atrelados a essa mistificação. Nos próximos tópicos, abordaremos assuntos que são polêmicos na área da saúde relacionados a vida, morte, avanço tecnológico e ciência e que são vivenciados diariamente pelos profissionais de saúde, inclusive pelos fisioterapeutas. 6.1 Eutanásia Você já ouviu falar sobre esse termo? Quem possui algum bichinho de estimação, provavelmente sim. O termo eutanásia (do grego eu, que significa bom, e thanatos, que significa morte) surgiu pela primeira vez em 1623, na época do Renascimento, sendo idealizado por Francis Bacon. De acordo com Bacon, o termo estava relacionado com o tratamento adequado para doenças incuráveis, portanto o médico deveria utilizar os seus conhecimentos não apenas como método curativo, mas também como uma forma de minimizar o sofrimento e as dores de uma enfermidade. Podemos entender a eutanásia como um tratamento? O termo eutanásia passou por algumas modificações semânticas e hoje pode ser definido como uma ação médica que tem por finalidade a abreviação da vida por atos misericordiosos, morte antecipada e sem dor. O tema está sempre presente quando se pensa em pessoas que possuem dores incuráveis, 73 ÉTICA E DEONTOLOGIA que passam por um grande sofrimento, que não possuem uma perspectiva futura de uma vida sem sofrimento e, apesar de milenar, continua presente no mundo contemporâneo, gerando dilemas e discussões, principalmente na comunidade médica (PESSINI, 2004). [...] só se pode falar em eutanásia quando ocorre a morte movida por piedade, por compaixão em relação ao doente. A eutanásia verdadeira é a morte provocada em paciente vítima de forte sofrimentoe doença incurável, motivada por compaixão. Se a doença não for incurável, afasta-se a eutanásia (BORGES, 2005). Atualmente, a palavra eutanásia possui vários significados, conferindo a ela uma conotação polissêmica, porém temos um consenso de que a prática depende de uma solicitação voluntária e expressa autonomamente do indivíduo que deseja antecipar sua morte, não estando relacionada necessariamente à doença em fase de terminalidade, pois um paciente com doença degenerativa em alguns países pode solicitar a eutanásia em qualquer fase da doença. Podemos classificar a eutanásia em: Quadro 4 – Classificação de eutanásia Tipo de eutanásia Característica Eutanásia ativa Profissional de saúde, por fins misericordiosos, administra um medicamento para findar a vida do paciente e exterminar o seu sofrimento Eutanásia passiva Ocorre dentro de uma situação de terminalidade, ou com a interrupção de tratamentos médicos ou uso de aparelhos por fins misericordiosos Eutanásia voluntária Quando o paciente decide morrer e pede ao médico que isso seja concretizado Eutanásia involuntária Realizada contra a vontade do paciente Lembrete Eutanásia: minimizar o sofrimento e as dores de uma enfermidade. Eugenia: eliminação racial, busca pela raça pura. Em 1931, o Dr. Millard propôs uma lei para legalização da eutanásia voluntária na Inglaterra, que foi discutida até 1936, quando a Câmara dos Lordes a rejeitou. Em 1934, o Uruguai incluiu a possibilidade da eutanásia em seu Código Penal, por meio da possibilidade do “homicídio piedoso”, e esta legislação continua vigente ainda nos dias de hoje. Em outubro de 1939, foi iniciado o programa nazista de eutanásia, sob o código “Aktion T 4”. O objetivo inicial era eliminar as pessoas que tinham uma “vida que não merecesse ser vivida”. Em 1956, a Igreja Católica posicionou-se de forma contrária à eutanásia por ser um ato que vai contra a “lei de Deus”, porém em 1957 o papa Pio XII aceitou a possibilidade de que a vida pudesse ser encurtada como efeito secundário ao uso de drogas administradas pelos médicos, para 74 Unidade II diminuir o sofrimento de pacientes com dores insuportáveis ou doenças incuráveis, utilizando o princípio do duplo efeito. Em 1980, o Vaticano divulgou uma declaração sobre eutanásia, e em tal documento existia a proposta do duplo efeito e da descontinuação de tratamento considerado fútil (FRANCISCONI; GOLDIM, 2003). Observação O princípio do duplo efeito é um termo técnico utilizado em ética que se refere a dois tipos de consequências distintas relacionadas a um ato. Por exemplo, a administração de altas doses de analgésicos com o objetivo de reduzir a dor de um paciente pode ter a morte como um efeito indesejável. A prática da eutanásia não se assemelha em nada às práticas eugênicas, pois na eugenia havia a busca por uma “raça pura”, eliminando as pessoas com algum tipo de deficiência física e/ou intelectual, por exemplo. Na eutanásia não há uma “eliminação” do menos favorecido ou de alguma população, mas a eliminação de uma dor física ou psicológica ocasionada por alguma enfermidade fora da possibilidade de cura. No Brasil, a eutanásia em humanos é considerada crime de acordo com o Código Penal, porém na medicina veterinária ela é permitida e muito utilizada pelos profissionais, com o objetivo de cessar o sofrimento dos animais que possuem uma doença que não tenha possibilidade de cura e/ou terapêutica. Todavia, não é um procedimento tão simples. Lembra-se do termo de consentimento que usamos nas pesquisas com seres humanos? Para que ele seja realizado na área da veterinária, o tutor deve assinar um termo de consentimento sobre o procedimento, e o profissional deve explicar ao tutor como tudo será realizado, explicitando os benefícios, as reações etc. Antes da assinatura do consentimento, o procedimento deverá ser explicado ao tutor do animal por meio de uma linguagem simples, respeitando a dignidade do animal e de seu tutor, bem como suas crenças e cultura. Observação Juro [...] aplicar os tratamentos para ajudar os doentes conforme minha habilidade e minha capacidade, e jamais usá-los para causar dano ou malefício. Não dar veneno a ninguém, embora solicitado a assim fazer, nem aconselhar tal procedimento (Juramento de Hipócrates) Entretanto, em países como Bélgica, Holanda e em alguns estados dos EUA, pacientes com doenças sem possibilidade de cura e terapêutica podem solicitar a eutanásia para a equipe médica como forma de cessar o seu sofrimento. Mesmo a eutanásia indo contra o Juramento de Hipócrates e contra os direitos humanos, os quais garantem o direito à vida a todos os seres humanos, por fins misericordiosos para acabar com o sofrimento alheio, o médico pode realizar o procedimento em alguns países. 75 ÉTICA E DEONTOLOGIA No novo Código Penal brasileiro está sendo analisada a possibilidade de incluir o termo eutanásia, deixando de ser tipificada como homicídio a morte quando realizada por compaixão, para se findar a dor de uma pessoa com doença fora de possibilidade de cura, atendendo a sua vontade, desde que ela seja expressa por pessoas maiores de 18 anos, plena de suas faculdades mentais e quando a doença de caráter incurável for compreendida. O Projeto de Lei n. 236, também chamado de Projeto de Novo Código Penal, preceitua o seguinte: Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença grave: Pena de prisão de dois a quatro anos. § 1º O juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima. § 2º Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão (BRASIL, 2012b). O crescente avanço técnico-científico na área da saúde pode culminar com o prolongamento da vida de um indivíduo, travando uma batalha entre a vida e a morte como se a morte fosse uma doença, e não um processo natural, tornando doloroso e penoso o processo de morte. Contudo, até que ponto o ser humano tem o direito de manter um paciente vivo contra sua vontade? Conforme Lepargneur (apud PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2000, p. 293), [...] no século XX a eutanásia passou a ter conotação pejorativa e, pouco a pouco, a representar mero eufemismo para significar a supressão indolor de vida voluntariamente provocada de quem sofre ou poderia vir a sofrer de modo insuportável. Qual a garantia de que esse paciente não foi coagido, até mesmo por pessoas próximas, a pedir a eutanásia e a misericórdia? Como dissemos anteriormente, é um tema bastante polêmico. 76 Unidade II Saiba mais Para entender mais sobre o assunto eutanásia, seguem filmes que abordam o assunto: MENINA de ouro. Direção: Clint Eastwood. EUA: Warner Bros. Pictures, 2004. 132 min. COMO EU era antes de você. Direção: Thea Sharrock. EUA: Warner Bros., 2016. 110 min. MAR adentro. Direção: Alejandro Amenabar. Espanha: Sogepaq, 2004. 125 min. Entre os casos históricos de eutanásia, podemos citar um ocorrido em 1973 na Holanda. Na época, a médica Geertruida Postma foi julgada e condenada por homicídio. O motivo? Ela realizou a eutanásia em sua mãe, que havia feito vários pedidos para morrer, através de uma dose letal de morfina. Outro caso foi o da americana Karen Ann Quinlan, jovem de 21 anos que ingeriu álcool e drogas e foi internada na UTI do Hospital Saint Clare’s Denville, em Nova Jersey; ela foi traqueostomizada e conectada a um ventilador mecânico. Exames feitos por vários neurologistas detectaram que ela permaneceria em estado de coma vegetativo permanente. Então, seus pais adotivos pediram que os médicos desligassemos aparelhos, mas não com a intenção de matá-la, mas com o propósito de devolvê-la ao seu estado natural, aceitando os desígnios de Deus. Depois de muita luta, mesmo com a retirada do respirador, Karen continuou viva por mais dez anos. Sempre ocorrem casos de grandes repercussões na mídia associadas ao tema eutanásia. Em 1990, a americana Theresa Marie Schindler Schiavo, após uma parada cardiorrespiratória decorrente do uso de laxantes e práticas de bulimia, mesmo sendo ressuscitada, teve lesões neurológicas irreversíveis devido a um grande período em hipóxia, o que a levou a um estado vegetativo persistente por 15 anos. Terry Schiavo tinha todos os cuidados necessários para lhe garantir uma qualidade de vida, porém seu marido entrou na justiça dos EUA solicitando a eutanásia da esposa mesmo contra a vontade dos pais, alegando que ela não queria ser mantida viva artificialmente sem nenhuma perspectiva de melhora. Em 2005, o marido ganhou na justiça o direito de retirar a sonda de alimentação de Terry. O procedimento ocorreu em 18 de março e Terry veio a falecer em 31 de março. O caso Terry Schiavo levantou muitas questões éticas: será que Terry morreu de fato sem sofrimento, já que ficou sem alimentação e sem hidratação por 13 dias? No estado vegetativo persistente, a pessoa ainda pode se manter consciente, porém sem capacidade de comunicação. Será que Terry realmente não sofreu, já que possuía consciência? O caso Terry Schiavo é apenas um dentre vários outros que ganharam destaques notórios na mídia ao longo dos anos. 77 ÉTICA E DEONTOLOGIA No Brasil também tivemos um caso de eutanásia que se transformou em um livro escrito por Vitor Hugo Brandalise – O último abraço. Trata-se da história de um casal que estava junto há 54 anos e a esposa, após dois episódios de AVC, foi internada em uma clínica. O marido não suportava mais ver a companheira de tantos anos em estado quase vegetativo, com um olhar de súplica pedindo para que aquele sofrimento terminasse. O marido então resolveu atender à súplica da esposa e, em 28 de setembro de 2014, um domingo ensolarado, ao visitá-la na clínica, levou uma bomba caseira junto ao peito e, ao abraçar sua esposa, a bomba explodiu; a esposa morreu, mas o marido não. Figura 17 – Eutanásia; a imagem destaca que há suporte para a vida Disponível em: https://bit.ly/3Ma25pa. Acesso em: 10 maio 2022. Associado ao tema eutanásia, não podemos deixar de falar sobre o suicídio assistido, no qual o próprio paciente recebe das mãos de um profissional o fármaco que lhe causará a morte e o ingere de forma espontânea e autônoma. Ele é diferente da eutanásia. Esse procedimento também é proibido no Brasil, sendo considerado crime. Porém, em países como a Suíça ele é permitido; entretanto, a eutanásia é proibida nesse país. Atualmente, tivemos um caso de repercussão na mídia, o do cientista inglês David Goodall. Com 104 anos, ele não possuía nenhuma doença terminal, mas já não estava feliz e queria morrer. Ele viajou da Austrália, onde não é permitido o procedimento, para a Suíça, e em 10 de maio de 2018 realizou o procedimento. Muitos casos de suicídio assistido são televisionados no país. 6.2 Distanásia A distanásia é o oposto da eutanásia, pois a eutanásia tem como objetivo acelerar a morte, e a distanásia, o contrário, ela visa retardar o processo de morte com auxílio da tecnologia. Os profissionais da saúde que trabalham em UTI se deparam com essa situação diariamente. No neologismo grego distanásia, o prefixo dys significa ato defeituoso. Assim, etimologicamente, distanásia pode ser definida como prolongamento exagerado da agonia, do sofrimento e da morte de um paciente, podendo também ser utilizado como sinônimo de tratamento fútil e inútil que traz como consequência uma morte lenta, prolongada e muitas vezes dolorosa para os pacientes e familiares, cercada de sofrimento (PESSINI, 2001). 78 Unidade II O avanço da medicina, da tecnologia e da indústria farmacêutica trouxe inúmeros benefícios à vida do ser humano; por outro lado, gerou sofrimento e alguns dilemas éticos e bioéticos. Diante de uma situação de terminalidade de vida, por exemplo, a tecnologia pode ferir a dignidade da pessoa humana ao prolongar o processo natural de morrer através de meios artificiais, culminando em maior sofrimento dos familiares e do próprio paciente, que, muitas vezes, frente a uma situação de terminalidade, pode não ser capaz de exercer sua autonomia, ficando a cargo da família e da equipe médica fazê-lo. O prolongamento do processo de morrer de pacientes com doenças fora da possibilidade terapêutica e de cura é realizado através do uso de tecnologias cada vez mais avançadas, o que é associado a uma obstinação terapêutica – excesso de medidas terapêuticas –, as quais não são capazes de alterar o quadro de morbidade, causando dor e sofrimento de pacientes, familiares e profissionais de saúde. A obstinação terapêutica designa a atitude dos médicos que utilizam sistematicamente todos os meios médicos para manter uma pessoa viva. [...] O emprego de meios terapêuticos intensivos tendo como objetivo o prolongamento da vida de um doente no estágio terminal, sem real esperança de melhorar seu estado (HOTTOIS, 1998, introdução). Podemos considerar a distanásia como um procedimento que não visa à humanização, mas sim à desumanização da medicina, pois ela desconsidera o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e de sua autonomia, já que na distanásia muitas vezes o paciente não tem a liberdade de agir conforme sua própria consciência. Conforme acentuado anteriormente, a morte é um tema que gera desconforto, medo, inquietação, sentimento de perda e insegurança. Assim, acaba gerando o desconforto nos profissionais da saúde, pois muitas vezes eles entendem a morte como um fracasso profissional; mesmo lidando com o processo de morrer quase que diariamente, os profissionais de saúde têm muita dificuldade em aceitar a morte. Essa não aceitação leva os profissionais de saúde a praticar a obstinação terapêutica, independentemente do prognóstico da patologia e, consequentemente, acabam por desrespeitar a dignidade do paciente. Houve um tempo em que nosso poder perante a morte era muito pequeno. E, por isso, os homens e as mulheres dedicavam-se a ouvir a sua voz e podiam tornar-se sábios na arte de viver. Hoje, nosso poder aumentou, a morte foi definida como inimiga a ser derrotada, fomos possuídos pela fantasia onipotente de nos livrarmos de seu toque. Com isso, nós nos tornamos surdos às lições que ela pode nos ensinar. E nos encontramos diante do perigo de que, quanto mais poderosos formos perante ela (inutilmente, porque só podemos adiar...), mais tolos nos tornaremos na arte de viver (ALVES apud DREHER, 2009, p. 85). A dor e o sofrimento andam lado a lado, porém não possuem o mesmo significado: a dor está relacionada a um desconforto físico e pode estar presente de diversas maneiras, já o sofrimento é um estado psicológico caracterizado por medo ou ansiedade. Nem sempre um sofrimento desencadeia uma dor, mas uma dor pode desencadear um sofrimento. Dessa forma, o alívio da dor e do sofrimento 79 ÉTICA E DEONTOLOGIA é um dos objetivos da medicina, e é considerado como um dos mais antigos deveres do médico. Isso não significa, por exemplo, que manter um paciente vivo a todo custo com o auxílio das melhores tecnologias esteja relacionado ao alívio do sofrimento e da dor do paciente e das pessoas envolvidas no processo, sejam os familiares, sejam os profissionais da equipe de saúde. A dor no processo de morrer não está figurada apenas no sentido físico, mas também no sentido subjetivo, psíquico, ético, cultural e social, tornando o manejo da dor difícil em um doente em fase de terminalidade. Observe a seguir a classificação de dor: • Dor física: ocasionada por um ferimento, uma doença. Funciona como um alarme de que algo não está funcionando corretamente. • Dor psíquica: perda de esperança, dossonhos; ela aparece quando o doente se depara com a aproximação da morte. • Dor social: ocasionada por um isolamento durante um período de internação, por exemplo. • Dor espiritual: surge quando se perde o significado de esperança, do sentido da vida. As dores que foram caracterizadas neste livro-texto muitas vezes são difíceis de serem distinguidas, pois surgem praticamente em conjunto. É importante que o profissional de saúde permita que seu paciente se expresse e exerça sua autonomia para que a melhor terapêutica seja realizada, sem a necessidade de uma medicina autoritária, visando apenas à doença, e não ao doente; o paciente não deve ser tratado em partes, mas em sua totalidade. Há pacientes que expressam o desejo de que sejam utilizadas todas as tecnologias e todos os tratamentos possíveis para que possam continuar vivos, mesmo diante de uma doença fora de possibilidade de cura em fase terminal; outros pacientes já encaram essa situação naturalmente e exprimem a vontade de que, em sua fase terminal, não sejam utilizados tratamentos fúteis, que não alterarão o curso da doença nem culminarão com a cura. Observação Na área da saúde a comunicação é de suma importância para a condução do tratamento de uma maneira humanizada e respeitosa. 6.3 Ortotanásia O neologismo grego orthós (direito, reto, normal, em linha reta) e thánatos (morte) nos remete à ideia de que a morte não é uma doença a ser curada, mas algo que não se pode dissociar da vida. A ortotanásia, em seu sentido etimológico, significa morte no tempo certo, sem abreviações ou 80 Unidade II prolongamentos desnecessários do processo de morrer. Ela é sensível ao alívio das dores, mas não se utiliza de procedimentos abusivos que prolongam o processo de sofrimento nem está associada à antecipação da morte, pois ela entende a morte como algo natural que acontecerá no tempo certo. A morte ortotanásica não é resultado de uma prática médica, mas do curso natural de uma doença ou uma situação de terminalidade. Ou seja, trata-se de permitir que a vida siga seu curso natural suavemente. A ortotanásia deve ser almejada em situações em que a morte é iminente, inevitável, quando não podemos falar em cura. A morte, como já mencionado anteriormente, é um processo natural que deve acontecer sem sofrimentos e respeitando a dignidade do paciente. Dessa forma, o código de ética médica autoriza o ato de suspender tratamentos fúteis, porém mantendo o conforto e minimizando sintomas como a dor, permitindo que a morte siga seu caminho natural. Por meio desse ato, o médico está fornecendo ao paciente os cuidados paliativos necessários para que ele possa ter uma morte digna, muitas vezes sem prolongamento do sofrimento. “Cuidar dignamente de uma pessoa que está morrendo num contexto clínico significa respeitar a integridade da pessoa” (AZEREDO; ROCHA; CARVALHO, 2011, p. 41). O cuidado oferecido pelo profissional de saúde deve ser no sentido de amparar, proteger e acolher o paciente, aliviando a dor, o sofrimento e as angústias tanto dele quanto dos familiares. A comunicação se torna essencial, pois familiares e pacientes devem estar cientes de todo processo da doença, que culminará no processo de morrer. Quando estes entendem a morte como um processo natural, o paciente terá uma humanização de sua morte, que ocorrerá de forma digna por meio da ortotanásia. O médico vivencia um enfrentamento entre a doença e a cura. Em algumas situações em que a morte é iminente, as tentativas para evitar com que ela ocorra podem resultar em uma permanência prolongada do paciente no ambiente hospitalar, longe dos familiares e acoplado a aparelhos que o mantenha vivo a todo custo. Entretanto, até que ponto o ser humano e a tecnologia podem interferir na vida e na morte? Até quando vale a pena viver acoplado a aparelhos em um ambiente frio, longe da família? 6.4 Introdução aos cuidados paliativos O termo paliativo vem do verbo paliar, do latim palliare (cobrir com um manto) e de palliatus (aliviar sem chegar a curar), cujo significado seria aliviar. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS, 1990): Os cuidados paliativos são cuidados que melhoram a qualidade de vida dos doentes e suas famílias, abordando os problemas associados às doenças que ameaçam a vida, prevenindo e aliviando o sofrimento através da identificação precoce e avaliação minuciosa da dor e outros problemas físicos, psicológicos, sociais e espirituais. 81 ÉTICA E DEONTOLOGIA Ainda podemos definir cuidados paliativos conforme a definição do International Association for Hospice and Palliative Care (IAHCP – Associação Internacional de Hospice e Cuidados Paliativos): [...] os cuidados paliativos são cuidados holísticos ativos, ofertados a pessoas de todas as idades que se encontram em intenso sofrimento relacionados a sua saúde, proveniente de doença grave, especialmente aquelas que estão no final de vida. O objetivo dos cuidados paliativos é, portanto, melhorar a qualidade de vida dos pacientes, de suas famílias e de seus cuidadores (SILVA; PACHECO; DADALTO, 2021). Ao contrário do que se pensa a respeito dos cuidados paliativos, eles não atrasam ou antecipam a morte, não se utilizam de futilidades terapêuticas, eles proporcionam ao paciente um suporte para auxiliar, fazendo com que os pacientes vivam o mais ativamente possível até o momento da morte. Os cuidados paliativos devem ser implementados o mais precocemente possível, proporcionando alívio da dor e de outros sintomas que interferem na qualidade de vida do paciente. A bioética, pautada em seus quatro princípios e em seus inúmeros referenciais, possibilita inúmeras reflexões sobre a autonomia do ser humano, por meio de sua manifestação a respeito de uma conduta terapêutica que só poderá ser exercida quando as condições de saúde do paciente forem compartilhadas com ele pela equipe de saúde, e o paciente tem o direito de aceitar ou rejeitar as condutas durante o seu processo de doença; assim, o paciente está exercendo a autonomia de decidir o que será feito em seu corpo protegendo a sua dignidade. Mesmo que as vontades do paciente sejam contrárias às decisões médicas, deve-se estabelecer um diálogo para expor os benefícios e os malefícios do tratamento, sempre considerando que o paciente é único e que deve ser respeitado em todas as suas dimensões. Mas quem são os pacientes elegíveis para os cuidados paliativos? Apenas aqueles que estão em uma fase terminal de uma doença fora de possibilidade de cura e terapêutica? A resposta é não. Os cuidados paliativos devem ser iniciados o mais precocemente possível, a partir do momento em que se recebe o diagnóstico de uma doença ameaçadora da continuidade da vida, pois o maior objetivo dos cuidados paliativos é garantir qualidade de vida e qualidade de morte, evitando a distanásia e o sofrimento desnecessário do paciente e dos familiares. Os cuidados paliativos afirmam a vida e o seu processo natural de morte, integrando os aspectos psicológicos e espirituais ao cuidado do paciente, oferecendo um suporte para a manutenção da funcionalidade até o momento da morte, além de prover suporte para auxiliar os familiares no decorrer da doença do paciente e a enfrentar o luto. A abordagem dos cuidados paliativos é multiprofissional, focada nas necessidades de pacientes e familiares, incluindo o luto. Você sabia que o fisioterapeuta participa da equipe multidisciplinar de cuidados paliativos e exerce papel essencial na manutenção da funcionalidade e do alívio da dor? A extubação paliativa (EP) ou extubação compassiva (EC) também faz parte da rotina de um fisioterapeuta que trabalha em um setor de cuidados paliativos. A EP é realizada quando é necessário limitar o investimento terapêutico, quando todas as possibilidades de desmame falharam ou quando o paciente se encontra em estado grave e 82 Unidade II irreversível, mesmo diante do tratamento e da terapêutica instituída. Nessas situações, prolongar a vida e manter aobstinação terapêutica associada ao suporte ventilatório é injustificável. Para a realização da EP, alguns critérios são elegíveis: idade avançada; maior comprometimento da qualidade de vida pós-procedimento; escore baixo em Karnofsky Performance Status (Escala de Desempenho de Karnofsky) e escore alto em Simplified Acute Physiology State 3 (Estado 3 de Fisiologia Aguda Simplificada), escalas validadas e amplamente utilizadas. Portanto nesses casos o suporte ventilatório não é indicado, pois seu uso apenas prolongará a vida do paciente. A decisão deve ser tomada por toda a equipe multiprofissional e em concordância com os familiares, que devem estar cientes de todo o procedimento, suas consequências e possíveis desfechos após a realização. Destacam-se a seguir algumas metas a serem alcançadas nos cuidados paliativos: • controle da dor; • melhora da ansiedade; • menor tempo de internação hospitalar; • alívio do sofrimento; • qualidade de vida para pacientes e familiares; • manutenção da funcionalidade. Pode-se considerar os cuidados paliativos como um tipo de eutanásia? Mais uma vez, a resposta é não. Os cuidados paliativos não têm o objetivo de acelerar o processo de morte por atos misericordiosos, mas sim de respeitar o curso natural da doença, aguardando o momento de uma morte natural, respeitando a dignidade do paciente e proporcionando qualidade de vida até o ultimo segundo; o intuito é atender aos últimos desejos do paciente, transformando o processo de morte em algo natural. Um exemplo atual de cuidados paliativos é o caso de Izabel, 48 anos, portadora de leucemia mieloide aguda e que não respondia mais ao tratamento. Desde o início do tratamento, ela falou sobre seu amor pela praia. Ao longo das consultas, seu hematologista disse que no final iria com ela à praia. Como não houve responsividade ao tratamento, o médico realizou transfusões de sangue e plaquetas horas antes para que Izabel conseguisse aguentar o trajeto de 30 minutos de ambulância e realizar seu desejo de ir à praia com segurança. Ela foi acompanhada de sua família e de alguns amigos que vieram de outras cidades. “Fomos até o mar para eu molhar os pés. Não pude entrar mais fundo porque não tenho imunidade. Mas ali mesmo o pastor me batizou com a água do mar. Foi revigorante” (CAVALVANTI, 2022). 83 ÉTICA E DEONTOLOGIA Saiba mais Para saber mais sobre o caso de Izabel, leia: CAVALVANTI, T. Médicos fazem transfusão em Izabel, 48, para permitir que se despeça do mar: veja vídeo. Folha de S.Paulo, 9 fev. 2022. Disponível em: https://cutt.ly/5HWtoy4. Acesso em: 3 maio 2022. O que destrói o homem não é o sofrimento, é o sofrimento sem sentido (Viktor Frankl). Exemplo de aplicação Durante um atendimento fisioterapêutico em uma UTI, você atende o sr. Antônio, de 80 anos, consciente. Ele é portador de um câncer de próstata em estágio avançado. Mantém a funcionalidade preservada, porém a dor torna suas atividades diárias incapacitantes. A esposa dele não aceita a condição do marido e solicita que tudo seja feito para que ele permaneça vivo a qualquer custo, alegando que ela não saberá viver sem a presença do marido. Antônio, ao contrário, deixa explícita sua vontade de não ser submetido a procedimentos invasivos que possam mantê-lo vivo de forma artificial. Após comunicar ao médico e à equipe sobre a decisão de Antônio, em uma decisão multiprofissional, o paciente recebe alta com medidas paliativas para redução da dor para que os seus últimos dias sejam em sua casa ao lado de sua esposa. Você acredita que essa tenha sido a melhor decisão levando em consideração os conceitos bioéticos estudados? 6.5 Mistanásia A mistanásia (morte infeliz) é considerada como uma morte social devido a questões como pobreza, violência e falta de infraestrutura básica, como saneamento básico, educação e moradia. É encarada como uma morte excludente, uma morte infeliz em nível coletivo (PESSINI, 2004). Pode ser considerada uma eutanásia social. Três fatores contribuem para a mistanásia: • discriminação: atuar de forma a fazer uma distinção de certas pessoas, podendo levá-las à exclusão ou à marginalização; • segregação social: isolamento espacial de determinado grupo de indivíduos; • exclusão social: separação de pessoas por meio de fatores socioeconômicos. Em nosso país, observamos no SUS que os pacientes ficam horas em longas filas de espera e, quando são atendidos, muitas vezes se deparam com a barreira de falta de materiais, de profissionais capacitados 84 Unidade II e falta de local para acomodação, e os pacientes acabam ficando em cadeiras, macas e até em colchões espalhados pelo chão e pelos corredores. Em algumas situações, as pessoas são tratadas com desrespeito, sem empatia, sem cuidado e sem acolhimento pelos profissionais de saúde, que estão despreparados para acolher um paciente nessa situação. Muitos desses pacientes retornam para suas residências sem terem recebido o atendimento de que necessitavam, sem ter recebido o remédio para aliviar dores e sofrimentos e muitos acabam por perder a vida. Em tempos de pandemia, podemos observar nitidamente várias situações em que a mistanásia esteve presente, como no caso da falta de oxigênio em Manaus, na superlotação dos hospitais e na falta de insumos e medicamentos como sedativos, que levaram muitos pacientes ao óbito por falta de algum ponto importante em seu tratamento. A pandemia de covid-19 trouxe à tona a necessidade de revisão de vários aspectos dos direitos humanos, a necessidade de ressignificar valores inerentes aos seres humanos, valores éticos e bioéticos no setor da saúde. No Brasil e em países subdesenvolvidos, acompanhamos o crescimento dessa “eutanásia social” ou simplesmente mistanásia. As diferenças econômicas, com o crescente aumento de uma população de baixa renda sem acesso a serviços básicos como a saúde, fizeram com que a mistanásia aumentasse diariamente. 7 DEONTOLOGIA E CÓDIGO DE ÉTICA DA FISIOTERAPIA Agora vamos tratar de outro assunto importante, mas não tão polêmico como o anterior. O termo deontologia, também conhecido como teoria do dever, derivado do grego deonta (dever) e logos (razão), foi estabelecido em 1834 após os estudos do inglês Jeremy Bentham (1748-1832). Hoje esse termo está associado à ética profissional. A deontologia está relacionada a um conjunto de normas, direitos e deveres que norteiam uma atividade profissional (BAPTISTA, 2011). Imanuel Kant também deu sua contribuição para a deontologia ao dividir dois conceitos: razão prática e liberdade, pois para ele agir por dever é uma maneira de dar à ação o seu valor moral; por sua vez, a perfeição moral só pode ser atingida por uma livre vontade. Vimos anteriormente que a ética está presente na sociedade desde os primórdios, e sabemos que a cultura, através de seus valores morais, exerce uma grande influência sobre a ética. E o mesmo ocorre com o direito, que, por meio das leis impostas a uma sociedade, contribui para a construção do campo da ética. Ela é considerada como um estudo, uma reflexão científica, filosófica, política e social sobre os costumes e as ações humanas. É um ramo da filosofia que procura compreender os princípios que sustentam as bases da moral individual e de uma sociedade. A ética ainda pode ser dividida em alguns ramos, como a ética normativa (referente ao comportamento), a ética descritiva (costumes), a ética especulativa (esperanças do ser humano). Ter 85 ÉTICA E DEONTOLOGIA um pensamento ético é sempre avaliar se as nossas ações estão certas ou erradas e então procurar agir de tal forma que não haja prejuízo ao outro. No trabalho, por exemplo, ser ético pode ser um fator determinante para o sucesso profissional; uma conduta que não esteja de acordo com os preceitos éticos pode ser prejudicial tanto para os profissionais quanto para as instituições, sem falar nos pacientes, obviamente. No campo profissional, as leis auxiliam os profissionais em suas decisões, pois acabam limitando-osa direitos e deveres, pois uma conduta profissional que esteja fora da lei compromete sua ética profissional, social e sua moralidade. Os indivíduos devem ser éticos consigo mesmo e perante a sociedade, tanto em seu campo pessoal como no profissional. A ética profissional está relacionada a princípios e valores que comandam os comportamentos do profissional em seu ambiente de trabalho. Todos os funcionários de uma empresa “vestem a mesma camisa” e compõem o mesmo time, e mesmo que cada um possua seus próprios valores, todos irão partilhar dos mesmos princípios éticos profissionais. Esses princípios éticos relacionados à profissão estão reunidos em um código de ética profissional, porém há alguns princípios que são comuns a todas as profissões, como o respeito e a honestidade. Quando o profissional demonstra atitudes éticas em seu ambiente de trabalho, a confiança entre o empregador e o profissional aumenta, pois tal conduta evidencia o seu profissionalismo, independentemente de constarem como normas éticas em seu código de ética profissional. A responsabilidade, o gerenciamento de tempo, o sigilo, a disciplina e a forma como o profissional deve se comportar no trabalho em equipe são outros princípios que devem ser demonstrados e praticados diariamente em seu ambiente de trabalho. O código de leis escrito mais antigo que se tem conhecimento foi o Código de Hamurabi, baseado na lei de talião – “olho por olho, dente por dente” –, que consistia em um conjunto de normas e leis criadas na Mesopotâmia pelo rei Hamurabi por volta do século XVIII a.C. Esse código de conduta social elaborado por Hamurabi teve origem mística, pois naquela época o poder dos governantes estava associado à divindade. O primeiro código de deontologia foi elaborado na área médica, no início do século XIX, pelo inglês Thomas Percival (1740-1804), na tentativa de superar conflitos profissionais, moralizar a profissão e a formação de novos profissionais. O intuito era amenizar o clima no ambiente hospitalar. Elaborado em 1803, tinha um caráter de guia comportamental e era composto de princípios básicos da moral (NEVES, 2008). O código de ética profissional é considerado como um documento específico de cada profissão, o qual contém normas e diretrizes que guiam a execução ética da profissão. Ele possui direitos e deveres relacionados ao profissional e à profissão que são moralmente aceitos por uma sociedade e que garantem o bom relacionamento entre os profissionais, clientes e ou pacientes e seus respectivos locais e instituições de trabalho. 86 Unidade II Saiba mais Para saber mais a respeito das normas que regem a fisioterapia, consulte: CREFITO. Código de Ética: fisioterapia e terapia ocupacional. Recife, 2016. Disponível em: https://bit.ly/3KOS8Mh. Acesso em: 3 maio 2022. Relembrando um pouco da história da fisioterapia, sabemos que ela só foi reconhecida como curso superior e devidamente regulamentada no dia 13 de outubro de 1969, por meio do Decreto Lei n. 938. Apenas em 1978, por meio da Resolução n. 424 (COFFITO, 2013), o primeiro código de ética da fisioterapia e da terapia ocupacional foi elaborado. Ele era composto de 11 capítulos e 57 artigos, que estabeleciam os deveres do fisioterapeuta no exercício de cada profissão. Após a Resolução n. 424 (COFFITO, 2013), o código de ética passou por revisões e adequações em seus capítulos e artigos, e a fisioterapia passou a ter um código de ética exclusivo de sua profissão, ou seja, o Coffito separou as duas profissões e, diferentemente do que ocorreu em sua primeira versão, cada profissão passou a ter o seu código de ética profissional. Como todo código de ética profissional, ele retrata os direitos e deveres do fisioterapeuta. Quando falamos em direito, devemos lembrar que este está relacionado a normas, regras, e a infração de alguma delas pode desencadear uma punição que será estabelecida pelo Coffito. Ele auxilia na definição de regulamentos que contribuem para o relacionamento entre colegas de trabalho e pacientes, tendo como referência valores como honestidade, respeito e responsabilidade, e abrange valores universais, tais como fazer o bem, evitar o mal e agir com justiça e equidade. Lembrete O primeiro código de ética da fisioterapia foi elaborado em 1978 e somente em 2013 sofreu revisões e adaptações pertinentes, bem como sua separação do código de ética da terapia ocupacional. A seguir, será apresentado o código de ética da fisioterapia. À medida que forem destacados alguns capítulos e parágrafos, serão feitas algumas observações a respeito de informações atualizadas sobre novas resoluções que interferem de alguma forma no código de ética. Todavia, para se aprofundar nos direitos e deveres do fisioterapeuta, você deve acessar o código de ética na íntegra através do site do Crefito da sua região ou do Coffito. Capítulo I – Disposições preliminares Estabelece os deveres do fisioterapeuta no que concerne ao controle ético do exercício de sua profissão, sem prejuízo de todos os direitos e prerrogativas assegurados pelo ordenamento jurídico. 87 ÉTICA E DEONTOLOGIA Cabe ao Coffito zelar pela observância dos princípios do código, funcionando como Conselho Superior de Ética e Deontologia Profissional Profissionais: observar as normas do código e comunicar as possíveis infrações Crefito funciona como órgão julgador em primeira instância A infração deste código é passível de pena disciplinar Figura 18 – Funções do Coffito e do Crefito Capítulo II – Responsabilidades fundamentais Obrigatória inscrição no Crefito de sua região Portar a identificação profissional Oferecer e divulgar serviços respeitando a dignidade da profissão Manter segredo sobre fato sigiloso Somente assumir cargo quando for capaz de executá-lo com zelo e segurança Figura 19 – Obrigatoriedade do fisioterapeuta Após a conclusão do curso de graduação, cabe ao profissional realizar o registro no conselho regional da comarca onde irá exercer a profissão, além de manter os seus dados cadastrais sempre atualizados. O profissional deverá estar sempre em posse de sua identificação profissional e apenas aceitar cargos profissionais que esteja apto a realizar com zelo e segurança, evitando prejuízos ao paciente. Sobre os valores a serem cobrados pelo atendimento, estes devem ser dignos e estarem baseados no referencial de honorários fisioterapêuticos, que será abordado mais adiante. 88 Unidade II O sigilo é um fator essencial a todo profissional, apenas deverá ser divulgado a outros profissionais caso haja um perigo à saúde pública. Negar assistência em caso de urgência Proibido Corromper morais e costumes Praticar ato que não seja regulamentado Não atender à convocação do Conselho Figura 20 – O que é proibido ao fisioterapeuta Quando o fisioterapeuta utiliza em seu tratamento uma técnica que não seja regulamentada pelo conselho, além de infringir o código de ética, submete o paciente a um tratamento que pode ocasionar danos, e essa atitude pode gerar sanções severas ao profissional. O profissional pertence a um órgão público que, assim como o Tribunal Regional Eleitoral, por exemplo, pode a qualquer momento convocá-lo para atuar em eleições, e o não comparecimento pode gerar sansões administrativas ao indivíduo. Neste mesmo capítulo, o código fixa o que é proibido ao profissional: • Prescrever, executar ou colaborar com tratamentos desnecessários, que atentem contra a saúde e a moral do paciente, ou que sejam executados sem o consentimento do paciente ou do responsável legal, no caso de crianças. 89 ÉTICA E DEONTOLOGIA • Autorizar o uso do seu nome ou da sociedade em atos que impliquem a mercantilização da saúde. • Como forma de autopromoção, divulgar declaração, atestado, imagem ou carta de agradecimento ao tratamento realizado. • Induzir convicções políticas filosóficas, morais, ideológicas e religiosas durante o atendimento a determinado paciente. • Deixar de comunicarao conselho regional recusa, demissão ou exoneração de cargo, função ou emprego, pela necessidade de preservar os legítimos interesses de sua profissão (COFFITO, 2013). Capítulo III – Relacionamento com paciente/cliente/usuário O relacionamentodeve ser pautado nos princípios éticos e bioéticos e, acima de tudo, no respeito à dignidade do ser humano e a sua autonomia. Zelar pela manutenção adequada de assistência baseada em métodos reconhecidos ou regulamentados Zelar pelo sigilo do prontuário do paciente para que ele não fique ao alcance de "estranhos" Elaborar diagnóstico fisioterapêutico, instituir plano de tratamento, atribuir alta ou encaminhar paciente a outro profissional quando necessário Figura 21 – Deveres com o paciente Nesse capítulo, mais uma vez o código reafirma a importância do sigilo de informações, mesmo que elas estejam contidas em prontuários. Os dados referentes ao estado de saúde do paciente, diagnóstico, tratamento e prognóstico são sigilosos e de propriedade do paciente ou de seu familiar próximo em caso de perda de autonomia ou de capacidade mental. O profissional é capacitado a elaborar o diagnóstico fisioterapêutico, bem como o objetivo e o plano de tratamento. Assim, até a alta do paciente, o fisioterapeuta tem autonomia profissional. Devemos apenas lembrar que as técnicas utilizadas devem ser regulamentadas pelos conselhos e em consonância com a prática baseada em evidências. 90 Unidade II Respeitar a vida humana Respeitar a dignidade e os direitos humanos Respeitar a intimidade e o pudor Respeitar a autonomia, a beneficência e a não maleficência Informar diagnóstico, prognóstico, objetivo e condutas Respeitar os princípios da bioética ao prestar assistência ao paciente Figura 22 – A bioética e a deontologia Como podemos perceber, nesse capítulo, ao se referir aos direitos fundamentais do profissional, o código nos leva a uma reflexão sobre os princípios da bioética e a importância do uso desses princípios durante a atuação profissional. Além desses aspectos, observamos claramente a necessidade de respeitar os direitos humanos. Abandonar o paciente no meio do tratamento Divulgar ou prometer terapia infalível Prescrever tratamento fisioterapêutico de forma não presencial, salvo em casos regulamentados Prescrever tratamento sem consulta Inserir em anúncio ou divulgação profissional qualquer dado (nome, foto etc.) que possa identificar o paciente Proibido ao fisioterapeuta Figura 23 – Proibições ao fisioterapeuta Nota-se que é proibido ao fisioterapeuta prescrever tratamento de forma não presencial e sem consulta. Todavia, conforme a Resolução n. 516, de 20 de março de 2020 (COFFITO, 2020), devido ao cenário de pandemia, o Coffito autorizou o atendimento não presencial por meio de: • Teleconsulta: consulta clínica a distância. • Teleconsultoria: comunicação entre profissionais, gestores e outros interessados na área da saúde com o objetivo de esclarecer dúvidas sobre procedimentos clínicos, ações de saúde e questões relativas ao processo de trabalho. 91 ÉTICA E DEONTOLOGIA • Telemonitoramento: acompanhamento do paciente a distância atendido previamente em formato presencial, podendo utilizar métodos síncronos (comunicação a distância em tempo real) e assíncronos (comunicação a distância não realizada em tempo real). Essa resolução ainda estabelece que o fisioterapeuta tem autonomia e independência (baseada em evidências científicas, na beneficência e na segurança do paciente) para determinar quais pacientes ou casos podem ser atendidos ou acompanhados a distância. Apesar da realização dos atendimentos não presenciais, o fisioterapeuta deve estar atento às normas dispostas no código de ética, a fim de não cometer nenhuma infração, sobretudo, no que concerne ao sigilo profissional. O sigilo profissional é um dos pilares do relacionamento profissional/paciente. O uso de uma plataforma virtual para a realização de uma teleconsulta deve ter um armazenamento de dados eficiente, e o paciente deve ser informado sobre o risco da aplicação de plataformas virtuais que estão fora da competência do profissional, mas que os dados serão protegidos com esforço máximo possível e que os dados obtidos não serão usados ou revelados para outros fins que não aqueles para os quais foram consentidos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos e Bioética (DUDHB) aborda as questões éticas relacionadas ao uso de tecnologias aplicadas a seres humanos e afirma que essas tecnologias devem ser usadas com o objetivo de salvaguardar a dignidade humana, além de proteger os direitos individuais. No artigo 4º, a DUDHB ainda define que os benefícios aos pacientes diretos e indiretos decorrentes do uso da tecnologia devem ser maximizados em relação aos riscos. Capítulo IV – Do relacionamento com a equipe Colaborar com seus conhecimentos na assitência ao ser humano quando participar de equipes multiprofissionais e interdisciplinares Incentivar o pessoal sob sua coordenação ou supervisão para a busca de qualificação continuada e permanente em benefício do paciente e no desenvolvimento da profissão Tratar colegas e outros profissionais com respeito A responsabilidade do fisioterapeuta por erro cometido não é diminuida, mesmo quando cometido em uma instituição ou equipe Figura 24 – Dever do fisioterapeuta com a equipe 92 Unidade II Além do conteúdo ilustrado na figura anterior, é dever do fisioterapeuta: • Reprovar quem infringir a ética ou o dispositivo legal e comunicar ao conselho regional e federal. • Ser respeitoso e cordial com colegas ou outros profissionais quando participar de eventos culturais, científicos ou políticos. • Quando for solicitado para cooperar em um diagnóstico ou orientar em tratamento, o paciente ficará sob os cuidados do solicitante. • Caso seja necessário solicitar ao paciente que está sob seus cuidados a assistência de outro colega, o profissional deve estar ciente de que o colega tem autonomia para efetuar o diagnóstico fisioterapêutico e elaborar os objetivos e condutas do tratamento, não devendo o profissional que solicitou a assistência indicar a conduta profissional, que deverá ser elegível ao paciente. • Quando um colega encaminha um paciente a você devido a algum impedimento eventual, após o restabelecimento deste colega, você deverá reencaminhar o paciente de volta a ele. Mais uma vez observamos nesse capítulo a presença dos princípios da bioética e dos direitos humanos no relacionamento entre profissional/paciente/profissional. Agora observe com atenção a figura a seguir: Proibido pleitear cargo ou função exercida por colega Colaborar para que outra pessoa exerça ilegalmente atividade própria do fisioterapeuta Captar paciente ou serviço utilizando recurso incompatível com a dignidade da profissão Utilizar posição hierárquica para induzir colegas que realizem condutas que infrinjam a ética Permitir que seu nome conste no quadro de funcionários de instituições públicas ou privadas sem que você exerça seu cargo Desviar de forma antiética paciente para outra instituição Utilizar posição hierárquica para impedir que colegas realizem seu trabalho ou atuem dentro dos preceitos éticos Permitir que seu trabalho seja assinado por outro profissional bem como assinar pelo trabalho de outro profisisonal Atender paciente que está em tratamento com outro colega Figura 25 – Proibições perante a equipe e pacientes 93 ÉTICA E DEONTOLOGIA Capítulo V – Das responsabilidades no exercício da fisioterapia Promover remuneração digna e condições de trabalho compatíveis com o exercício ético profissional Ser solidário aos movimentos em defesa da dignidade profissional Atuar em consonância à Política Nacional de Saúde O fisioterapeuta deve: Melhorar as condições de assistência respeitando os padrões de qualidade dos serviços Promover os preceitos da saúde coletiva, independentemente de exercer seu trabalho em setor
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