Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
RACISMO, PRECONCEITO E INTOLERÂNCIA 7ª. edição Conforme a nova ortografia Edson Borges Professor Adjunto da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB Carlos Alberto Medeiros Graduado em Comunicação e Mestre em Sociologia e Direito pela UFF Jacques d’Adesky Doutorado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP) Coordenação: Wanderley Loconte Miolo-Racismo preconceito-Mercado.indd 1 3/12/15 5:12 PM Todos os direitos reservados. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Índices para catálogo sistemático: 1. Brasil : Discriminação contra grupos sociais : Sociologia 305.0981 2. Brasil : Intolerância contra grupos sociais : Sociologia 305.0981 3. Brasil : Preconceitos contra grupos sociais : Sociologia 305.0981 4. Brasil : Racismo contra grupos sociais : Sociologia 305.0981 Projeto editorial: Wanderley Loconte Editor: Henrique Félix Assessora editorial: Jacqueline F. de Barros Coordenadora de preparação de texto: Maria Cecília F. Vannucchi Preparação de texto: Lúcia Leal Ferreira Revisão de texto: Pedro Cunha Jr. e Lilian Semenichin (coords.)/Elza Maria Gasparotto Célia R. do N. Camargo/Sandra R. de Souza/Renato A. Colombo Jr. Pesquisa iconográfica: Cristina Akisino Gerente de arte: Nair de Medeiros Barbosa Coordenação de arte: Mizue Jyo Diagramação: José Aparecido de Oliveira Produção gráfica: Rogério Strelciuc Impressão e acabamento: Colaboradores Projeto gráfico (miolo e capa): Andréa Vilela de Almeida Imagem de capa: David Falconer/Superstock Imagem de quarta capa: O democrático bonde, charge de Seth, © 1930 Imagem de página de rosto: Bonnie Timmons/The Image Bank Imagens de apresentação, sumário e das páginas 73, 77: Grupo de pessoas – Erlendur Berg/ Superstock e O democrático bonde, charge de Seth, © 1930 Imagem de abertura das partes: David McNew/Getty Images Borges, Edson Racismo, preconceito e intolerância / Edson Borges, Carlos Alberto Medeiros, Jacques d’Adesky ; coordenação Wanderley Loconte. — 7.ª ed. — São Paulo : Atual, 2009. Inclui roteiro de leitura. Bibliografia. ISBN 978-85-357-0248-4 ISBN 978-85-357-0684-0 (professor) 1. Discriminação — Brasil 2. Preconceitos — Brasil 3. Racismo — Brasil I. Medeiros, Carlos Alberto. II. d’Adesky, Jacques. III. Loconte, Wanderley. IV. Título. V. Série. CDD-305.0981 7ª edição / 7ª tiragem 2015 811178.007.007 Todas as citações de textos contidas neste livro estão de acordo com a legislação, tendo por fim único e exclusivo o ensino. Caso exista algum texto a respeito do qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à disposição para o contato pertinente. Do mesmo modo, fizemos todos os esforços para identificar e localizar os titulares dos direitos sobre as imagens publicadas e estamos à disposição para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições. SAC 0800-0117875 De 2ª a 6ª, das 8h30 às 19h30 www.editorasaraiva.com.br/contato Copyright © Edson Borges Carlos Alberto Medeiros Jacques d’Adesky, 2002. SARAIVA S.A. Livreiros Editores Rua Henrique Schaumann, 270 — Pinheiros 05413-010 — São Paulo — SP Miolo-Racismo preconceito-Mercado.indd 2 3/12/15 5:12 PM ApresentAção É fato que a sociedade brasileira encontra-se marcada pela exclusão social e pela discriminação racial. Por mo- tivos históricos e econômicos, os negros e os índios são os grupos que mais sofrem com a desigualdade social e com o preconceito. Os indicadores socioeconômicos revelam, por exemplo, que os afro-brasileiros estão nos níveis mais baixos de pobreza e de escolaridade, enfrentando maiores obstáculos para alcançar posições de prestígio e de coman- do na sociedade. Essa situação reflete a existência de um racismo difuso, porém efetivo, com repercussões negativas na vida coti diana da população negra, em particular das crianças e dos adolescentes, que ainda não desenvolveram mecanismos suficientes de análise crítica. Entretanto, há que observar que a discriminação não atinge somente os povos indígenas e as pessoas de as- cendência africana. Afeta também os descendentes de asiáticos, os portadores de deficiência, os homossexuais e outros grupos não plenamente reconhecidos como me- recedores de direitos iguais na sociedade brasileira. Em certas circunstâncias, jovens adolescentes da periferia das grandes cidades, por exemplo, podem ser vítimas da Erlendur Berg/Superstock Racismo preconceito_Daniel.indd 3 24/06/13 14:42 intolerância simplesmente por se vestir de modo peculiar, por usar gírias ou por manifestar determinadas preferên- cias musicais. O anonimato oferecido pela Internet favorece a propa- gação pelo ciberespaço de novas formas de expressão de racismo, preconceito e intolerância. No Brasil, este fenô- meno extremamente negativo tem aumentado nas redes sociais, suscitando um número crescente de episódios de racismo e intolerância, voltados, sobretudo, contra nor- destinos e nortistas. Essas evidências mostram que o Brasil está longe de ser o país da tolerância e da democracia racial. A ideia de um país igualitário, formado pela miscigenação de três raças — o índio, o branco e o negro —, na prática não tem se mostrado verdadeira. Mesmo o carnaval e outros momentos festivos, como a Copa do Mundo, não têm sido suficientes para de fato aproximar as pessoas: propiciam alegrias e contatos fugazes, mas não chegam a proporcionar relações de solidariedade mais profundas. A intolerância, o racismo e o preconceito são, portanto, problemas do nosso tempo que desafiam a sociedade e co- locam em questão a nossa capacidade de tratá-los racional- mente. Na urgência de resolvê-los, duas perguntas surgem fundamentais: Por que as pessoas manifestam intolerância e preconceito diante daqueles que julgam diferentes? Por que uma vítima do preconceito, até mesmo do racismo, pode também discriminar? Neste livro, procuramos explicar as diversas formas de discriminação, tendo em vista o menosprezo do outro. Procuramos também contribuir para o desenvolvimen- to de uma cultura da tolerância, baseada no respeito ao outro e na aceitação das suas características e diferenças. Procuramos enfim mostrar que a tolerância pode ser vista como uma importante ferramenta de luta contra todas as formas de discriminação. Miolo-Racismo preconceito-Mercado.indd 4 3/12/15 5:12 PM Isso não significa que se deva aderir aos valores do outro, mas, sim, respeitá-los como uma expressão da diversidade. Infelizmente, a prática da tolerância depende bastante de fatores como educação e acesso à informação, ainda muito precários em países como o Brasil. Este livro parte, pois, do princípio de que o preconceito e o racismo são práticas persistentes do mundo contem- porâneo, e busca fornecer subsídios para uma discussão aprofundada desses temas, pois visa alcançar um público formado por professores, educadores, animadores cultu- rais e alunos do ensino médio e dos cursos de graduação das universidades brasileiras. Entretanto, como esses são temas que permeiam toda a sociedade brasileira, o livro destina-se também às pessoas que lidam com a promoção dos Direitos Humanos. Porém, antes de tudo, este livro destina-se a todas as pessoas interessadas em contribuir para que se desenvolva um mundo de paz, onde as diferenças culturais sejam vistas como riquezas, e não mais como elementos ameaçadores. Edson Borges Carlos Alberto Medeiros Jacques d’ Adesky Miolo-Racismo preconceito-Mercado.indd 5 3/11/15 4:22 PM s u m á r i o os caminhos do preconceito, do racismo e da intolerância Nenhuma cultura é uma ilha 9 Conhecimento e método de oposição binária 11 A História antiga e as diferenças culturais 13 Viagens, civilizações e racismo 18 Escravidão no Brasil 24 Mestiçagem e discriminação 29 Índios: escravização, racismo e reivindicações 35 Judeus: imigração, preconceito e integração 36 Racismo e intolerância:da Suécia ao Brasil 37 Discussões atuais 39 racismo e discriminação “Raças humanas” 43 O uso do termo raça 44 Racismo 49 Intolerância 51 Xenofobia 52 Preconceito 54 Estereótipos 54 Etnocentrismo 55 Racismo preconceito_Daniel.indd 6 24/06/13 14:42 Antissemitismo 55 O Projeto Genoma Humano diante do racismo e da discriminação 59 Justiça e “ação afirmativa” O racismo no banco dos réus 65 A “homenagem” do cantor 65 Antissemita é condenado 66 “Cinderela negra”, humilhada e agredida 67 Ação afirmativa e promoção da igualdade 68 Bibliografia comentada 74 Filmografia comentada 78 A primeira parte, intitulada Os caminhos do preconceito, do racismo e da intolerância, é da autoria de Edson Borges; a segunda parte, Racismo e discriminação, e a seção Para debater o tema são da autoria de Jacques d’ Adesky; a terceira parte, Justiça e “ação afirmativa”, é da autoria de Carlos Alberto Medeiros. Racismo preconceito_Daniel.indd 7 01/07/13 11:24 O s c a m i n h O s d O p r e c O n c e i t O, dO racismO e da intOlerância Racismo preconceito_Daniel.indd 8 24/06/13 14:42 9 Os caminhos do preconceito, do racismo e da intolerância NenhumA culturA é umA ilhA T odas as tradições culturais são tributárias de outras culturas; os povos estão constantemente estabe- lecendo conexões uns com os outros, num processo complexo e dinâmico de troca de experiências históricas. Con- sequentemente, não há culturas puras ou totalmente isoladas, pois nenhuma cultura é inerte e autônoma. Ao longo de suas experiências his- tóricas, as culturas adotam e excluem elementos “estranhos”, isto é, vindos de outras experiências ou mundos culturais. Assim, todas as sociedades e grupos humanos estabelecem relações de se- melhança e diferença com outros povos. Segundo o antropólogo francês Jean Copans (COPANS, Jean; TORNAY, Serge et all. Antropologia: ciência das sociedades primitivas? Lisboa: Edições 70, 1974), há muito tempo os europeus constroem um grande “mapa cultural” sobre os Outros. Já na Antiguidade, o grego Heródoto (século V a.C.) escreveu textos sobre os não gregos, chamando- os de “bárbaros”. Essa classificação baseava-se em dois pilares: a exclusão ideológica (a “positividade” dos gre gos e a “negatividade” dos estrangeiros) e a inclu- são científica (“eles” não são como “nós”, mas são objeto de nossas descrições e do nosso conhecimento). E Aristóteles (384-322 a.C.) tam- bém tornou clássica a sua teoria sobre a escravidão natural. A partir do bi- nômio senhor-escravo, afirmou que a escravidão era uma instituição natural e, portanto, ‘boa e justa’. Para o historia- dor Moses I. Finley (Escravidão Antiga e Ideologia Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1991) mesmo na Antiguidade, onde havia ausência de um estigma de cor e a despeito da variedade de povos que compunham as antigas populações escravas (havia escravos gregos na Grécia e escravos italianos em Roma), a escravidão se associa à insegurança e ao racismo, porque este segundo elemento é fruto da equação escravo-estrangeiro (“bárbaros”). E o senso comum acreditava que os escravos eram seres, por natureza, psi- cologicamente inferiores. Nos discursos da Roma republicana afirmava-se que judeus, sírios, lídios, medas e, na verdade, todos os asiáticos “nasceram para ser escravos”. Aristóteles e a sua teoria da escravidão natural foram referências importantes na Idade Média europeia, quando tam- bém as Cruzadas, a Inquisição e outras formas de perseguição religiosa apon- taram as suas espadas contra as “terras selvagens”, então consideradas como o lugar de todas as coisas tenebrosas e desprotegidas por Deus. O cristianismo, com a sua ânsia de busca, conquista e conversão assumiu uma posição agres- siva distinguindo radicalmente os de “dentro” (cristãos) dos de “fora” (todos aqueles considerados “inimigos de Cristo”: muçulmanos, judeus, turcos, persas, seitas heréticas, milagreiros e bruxas). Muçulmanos e judeus, e depois os protestantes, foram considerados casos mais graves, pois acreditava-se que já haviam escutado a Palavra do Deus Racismo preconceito_Daniel.indd 9 24/06/13 14:42 10 Racismo, preconceito e intolerância cristão (o Evangelho) e não o aceitaram, sendo considerados hereges. Logo seriam considerados “bárbaros”, “pagãos” e “sel- vagens” (e, escravos por natureza) todos os povos que estavam fora do círculo da cristandade: africanos, asiáticos e sociedades indígenas do “Novo Mundo”. Antes e após a expansão europeia, muitas regiões da Terra eram ocupa- das por povos que não dominavam a arte da escrita e que tinham modos de vida tecnologicamente simples. Esses foram alguns motivos que levaram os europeus, ao aportar em suas terras, a considerar-nos “inferiores” e decidiram “civilizá-los”. Prova disso, são os termos usados pelos colonizadores para se re- ferir aos habitantes das “terras novas”. Na América, por causa de um erro de Cristóvão Colombo, que pensava ter chegado às Índias, os habitantes locais foram chamados de índios. Já na África e na Oceania, os termos usados foram nativos e aborígines, palavras de conteú- do genérico e sentido depreciativo. Evidentemente, os europeus se autoin- titularam “civilizados” e, adotando essa perspectiva etnocêntrica, passaram a descrever os “selvagens”. O etnocentrismo é a tendência que todas as culturas têm de considerar superiores seus próprios valores e cren- ças. Presente nas impressões e nos dis- cursos sobre outros mundos culturais, baseia-se em relações de dominação política, militar, econômica e cultural. América (1589), gravura em metal de Theodore Galle a partir de desenho de Jan van der Straet. A imponência dos trajes e o ar de superioridade de Américo Vespúcio contrastam com a nudez e a “selvageria” dos primeiros habitantes da América na ocasião do descobrimento, evidenciando a visão eurocêntrica que prevalecia na época. Desse ponto de vista, pode-se dizer que o etnocentrismo não é primazia dos europeus. É possível encontrá-lo, por exemplo, nas palavras do antigo geógrafo Ibn el Farith, que assim definia os povos não árabes: “Aos turcos [falta] a fidelidade, aos bizantinos, a generosi- dade, aos casares, o pudor, aos negros, a unidade, aos eslavos, a coragem, aos indianos, a castidade”. Evidentemente, na opinião do geógrafo, os árabes reu- niam todas essas virtudes. Te o d o re G a lle ( s c u lp t. ) e J a n v a n d e r S tr a e t (d e l.) / B ib lio te c a M a za ri n e , P a ri s , F ra n ç a Racismo preconceito_Daniel.indd 10 24/06/13 14:42 11 Os caminhos do preconceito, do racismo e da intolerância conhecimento e método de oposição bináriA C onhecer significa atribuir lugar, função e significado a tudo que existe. Quando olhamos ao nosso redor, procurando conhecer o mundo em que vivemos, nomeamos e identificamos objetos, lugares, pessoas, atitudes, cul- turas e comportamentos, usando como parâmetro os valores da época histórica em que vivemos. É por isso que, ao longo da História, registram-se diversas visões e classificações étnicas e culturais. En- tretanto, muitas vezes, nos esquecemos disso e consideramos nossa maneira de viver “melhor” ou “mais correta” do que a dos outros, o que acaba empobrecendo nosso conhecimento das outras culturas e grupos étnicos e muitas vezes dificultando ou mesmo impossibilitando a boa convi- vência e a aceitação das diferenças entre as pessoas. Afinal, ser diferente é normal. Após o Renascimento e as Grandes Navegações (séculos XV e XVI em diante), os europeus não param mais de produzir descrições, imagens e histórias etnocêntricas sobre os ou- tros povos, divulgando determinadas “verdades” políticas, econômicas, morais, ideológicas, científicas e cul- turais próprias da Europa como se elas fossem universalmente válidas. Utili- zavam para isso o chamado Método de Oposição Binária. Um dos pilares da tradição intelectual ocidental,esse método, introduzido pelos gregos no século V a.C., reduz toda a comple- xidade e plura lidade humanas a pares opostos, tais como negro-branco, eu-outro, civilizado-bárbaro/selva- gem, Oriente-Ocidente, crente-ateu, “nós” (ocidentais, brancos, europeus, católicos, protestantes, etc.)- “eles” (orientais, asiáticos, africanos, latino- americanos, índios, nativos, islâmicos, Colonialismo o colonialismo é um fenômeno antigo. Desde a época dos gregos, a história mundial registra a constituição de muitas colônias e impérios. Trata-se de uma prática de conquista e ocupação de terras estrangeiras, que consiste em nelas instalar colonos a fim de explorar as riquezas agrícolas e minerais do local, assim como o trabalho dos colonizados. Historicamente entre as razões que levam ao impulso de colonização, destacamos as guerras de conquista, as discordâncias dinásticas, a ambição territorial para o domínio de recursos estratégicos, a expansão comercial, a evangelização, a escravização de povos e a reconquista. Nos dias de hoje, alguns recursos estratégicos, como o petróleo, a água e as florestas tropicais, podem levar determinados países à guerra contra outros povos e à ocupação de seus territórios. Por exemplo, além das questões de religião e da Palestina, o petróleo e a água também estão entre os motivos da constante instabilidade no Oriente Médio. Racismo preconceito_Daniel.indd 11 24/06/13 14:42 Blank Page Blank Page
Compartilhar