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"clNEMA OE BORDAS", MANUAL 00 USUÁRl/): `1 " \1 " )^1)1` mw W I POSSÍVEIS CAMiNHOS PARA 0 ESTUDO D[ UM +1 Ní`w r\t / \i Ü m )Vi`l/^I fYW`l u \W ".V,W A vlslBILIDADE BRljrA Nt>` 1 H ^u .,1 n `1 \ 1 r,1^w u 1 /" n 1 '',.,",^.M ' v" A SAc,A ÉpicA D^ i'R( )i n i u Ji<í\ ( i{i`, i i t 1 H ^w `i: A pAlxÃ() RAL)lo(.lNr 111 ^ 1111 )^vH) l<^Nl ,1 | ' ,,1''\ nl'"'' \ RAMBÚ DA AM^/. )Ni;\ i i )^`i ) `/'+/ / / i// iw i A,M ,,,,,,,, ' ', ,' I \ W( '1 '1 ' (.hl„'"" o CINEMA DE BORDAS, A EST[rl(. J\ í^'Z\W Í t t ) i`^w^t iNw^ 'm"c.* HORROR À MiNEiRA: os FiiMFç ^`it iMiiw^" n w. l`rni`'`i V^ ' , Lú. ;11 i* FrúlN.iril liu. M.i` i"i*` '..,' /,,M„",,^N ,,,,,,, tr ,,,,, ", .` \ ' v""' :`\. uMOLHAWMPR#Sl("^çmHf^MtN`,l"M/;::'.''}`` •.ri.,"-,h." p^R^ AIÉM ltt ,` t,rNl l{tl`: Ul ,M W 1 ^hll ' M ' 1' ^11 `' ' '' ''í'N') N,,u'w 'h, ' ''" u, ' lM^,,'N`' \"r.J,.l'^( ''l' 1,,1..1^^ 'h. M'" 1''" Gelson Santana (org.) {`Ím`Hâb®fidãMS3 Gelson Santana (org.) cineffiâb®ffdas3 EDLTORA a iápis Sumário editor: Gelson Santana projeto gráfico: Livre Desing Studio diagramação e capa: Mauro Teles Revjsão: Gelson Santana l:oto página 159: iúcío De Franciscis dos Reis Piedade jmagemcapa..oat"JorgeTimmem0DoceAvançodaFaffi(2010),dePetter Baiestorf Dados lntemacionais de Calalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasjl) Cinema de bordas 3 / Gelson San(cma ( org ) --São Paulo Ed. a láp/s, 2014. 2" edtção 264p : 1121 Vários au(ores 1. Cine" -Brasil 2 Cinema -Brasil -His(ória Cul!ura - Aspectos Sociais 4 Cul(ura -Brasn 5 Culiura Midiãtica 6. Culiura Popular 7. Genero no Cinema.1. Tilulo lsBN . 978-85-6594J-66-6 CDD -7914365380981 lndices para catálogo sistemático: 1. Cinema ' Pesquisa 79143072 2,\ ed,ção São Paulo, 2014 EDiTORA a iápis alapis@ig.com br 4. lntrodução ``Cinema de bordas", manual do usuário: Sobre afinidades teóricas e possíveis caminhos 12. para o estudo de um fenômeno audiovisual popular Alfredo Suppia 38. A visibilidade bruta nos filmes de Seu Manoelzinho Bemadette Lyra 54. A saga épica da produtora Cristo Filmes: a paixão radiocinéfila de David Rangel Carlos Primati 74. Rambú da Amazônia como space-off do Rambo de Hollywood C\elson Santàna 90. 0 cinema de bordas, a estética rrash e o paracinema Laura Cánepa 108. Horror à mineira: os filmes assombrados de Pedralva Lúcio De Franciscis dos Re.is Piedade 134. Zumbificando o Réquiem Luiz Vad-m 160. Um olhar impressionista sobre Afonso Brazza Maria lgnês Carlos Magno 176. Para além dos gêneros: humor e amor em filmes de bordas RosÀna de Lima Soares 204. lmagens e Sons da CUICA Zule;ka de Paula Bueno 238. Referências bibliográficas 250. Filmes de bordas citados 260. Sobre os autores ciNEMA DE Bof fintrodução Gelson Santana Este livro não pergunta nem explica. Apenas se de- liiu`a sobre temas e filmes capazes de dar uma amostra- Hm do que consideramos cinema de bordas. Foi com •.`w palavras que encerramos a lntrodução de C-/.nerria t/t. Borc/as, publicado em 2006, que reuniu artigos de es- iutliosos, apaixonados por um tipo específico de cinema iii`iiférico, produzido em cidades interioranas ou lugares tli`l`intes dos grandes centros produtivos, quase invisi`vel i. t``palhado por todo o país. Pois hoje, seis anos depois •. iiiais a publicação, em 2008, da coletânea C/.nema de /Jti/.das 2, esse pensamento de mobilidade, fluidez e leve- /.` t'` o mesmo que serve de guia a este outro livro, C`/.nema tli. Bordas 3. Não se pode dizer, no entanto, que as questões aqui ii.`(ddas são as mesmas de antes ou que guardam as mes- nub características. Até porque, de lá para cá, não foram i)(iiicos os debates, as polêmicas, os livros, artigos, confe- ií.iicias, mostras e muitos outros modos de investigação e (`xi)cmsão que se articularam em torno do termo "cinema t lt` [)ordas'', ampliaram-no, desdobraram-no e o fizeram se ( l.\rificar. Em sua gênese, o termo cinema de bordas foi propos- iu i)or Bernadette Lyra, em 2005, na comunicação feita à nit`ba ``Juntando os cacos, reciclando o lixo: nas bordas do t ii`ema brasileiro'', no lx Encontro da Sociedade Brasileira tlt` Estudos de Cinema e Audiovisual (Socine)]. À época, `t`i.via para agrupar um conjunto de filmes deixados às iii.`rgens pela historiografia cinematográfica brasileira ofi- i i.`lizada e tradicional, quase sempre pautada no autoral e ' () lx Encontro da Socine ocorreu de 19 a 22 de outubro, de 2005, em São Leopoldo, li` A comunicação citada foi publicada com o ti`tulo de "Horror, humor e sexo no iliioma de bordas'', na revista //ha do Desterro, Florianópolis, n.51, iul-dez, 2006, pp.131-146. 0 > V' W €roEBORDAS3 Ê no artístico e em boa parte construi'da em torno das idéjas U de Alex Víany2 e do Gnema Novo, como o fez Glauber Rocha3. Naquela ocasião, a autora partia das considera- Ções sobre a existência de uma ``cultura das bordas'', ou seja, uma cultura exclui'da do centro.4 0 termo cinema de bordas foi desde logo acejto e ado- tado por um grupo de pesqujsadores independentes, se- diados nas mais diversas Universjdades do país e Ínteres- sados em examinar, catalogar, e tornar visível essa espécie de produção que opera e transjta ljvremente nas brechas de confluência e interfluência das formas legítimadas e institucionalizadas pela história, teoria e crítica do cinema no Brasi'. Como resultado do trabalho conjunto e particípativo desses pesqujsadores, o termo cinema de bordas ganhou vida própria e se intensificou, tomando sua atual concep- ção de alteridade e paralelismo, que vai muito além da- quela característica inicjal de margjnalidade ou exclusão. Aljás, desde o jnício, foi este o desafio do cjnema de bordas: constituir-se no terrjtório de uma historiografia ci- nematográfica paralela, sem passar pela tentação de con- ceituar esse território como "cínema marginal" ou "cinema de periferia'', nos sentidos que estes dojs termos adquiríam, respectívamente, dentro do campo, quando passavam a designar quer um movimento agregador de cineastas que se dedicavam ao cjnema de viés underground e poético, quer um conjunto de filmes fejto em centros comunitá- 2VerVIANY,Alex./ntrodt/çáoaoc/nemabras/./e/ro.RiodeJaneiro:lnstttutoNacíonal do Livro, 1959 W ROCHA, Glauber A rpv(J/ução dí) C/riema Novo Rio de Janeiro Alhambra/ Embrafi.Ime,1980 4 Tal como a caracterizou a pesquisadora Jerusa Pires Ferreira, em seu artigo "Heterônimo e cultura das bordas` Rul]ens luchetti'', na f?ev/.5ía U5P, n 4, dez jan. fev.1989/1990, pp.i69-174. CiNEMA DE Bop t'Im L` ONGs, por indivi'duos ou grupos sociais distintos em l)ii`ca de uma afirmação de identidades. Assim, ao longo do tempo, foram surgindo ramifica- (`(`}(`s, contornos, descobertas e links, verdadeiras //.nha5 t/r /'orça que, hoje, dão sustentação ao termo cinema de lttir(Jas e às investigações dos pesquisadores do grupo e tlr demais estudiosos centrados no universo dos estudos i iiiiimatográficos e audiovisuais. São essas linhas de força que ancoram os artigos que i tiiiipõem este livro. Aqui, elas se diversificam,se entre- l.w``im, se completam e nesse sentido continuam a tarefa tlt``envolvida ao longo de todos esses anos, juntando-se i it`ntos outros estudos que, por vias diversas, vêm inves- ii*.`ndo e propondo coordenadas mais equilibradas, não .ii)i`nas na história do cinema brasileiro, mas também na l`i`tória das formas cinematográficas em nosso país. Em plano geral, as investigações deste livro estão incli- i`,idas sobre os modelos, formatos e razões desse cinema i`{iriférico e paralelo, distante dos circuitos comerciais e ar- ii.`iicos, capaz de driblar as precariedades do ofício, as difi- t uldades técnicas e as deficiências orçamentárias através de nit]dos alternativos de produção, realização e exibição. A iii[irca mais evidente do cinema de bordas, aqui examinada, i'` que dele resultam filmes concentrados de modo especí- iiio em narrativas ficcionais que vão e vem também pelas l)()rdas dos múltiplos imaginários de que se constituem. Ninguém ignora a transformação gradativa sofridas por ( (`rtas categorias ligadas à idéia de "agreste", "da terra", do "tudo vem da terra", do "plantando dá'', que costumavam i)()voar o imaginário popular brasileiro. Essas categorias •icabaram migrando para as formas de outro imaginário, (lecorrente de uma pretensa inserção do país no espaço iiidustrial, ou seja, no espaço que atualizou entre nós o 0 > U, W € LIJ Z u OE BORDAS 3 fenômeno que os teóricos costumam chamar de culturas de massa. Por sua vez, à força da intensa midiatização das sociedades, hoje as culturas de massa estão se mudando em alguma outra coisa que se para alguns pode agora ser classificada por cultura midiática, para outros já perdeu até mesmo os contornos dessa classificação. Como consequência desse movimento modular e transverso que percorre os imagjnários, as reflexões sobre os objetos culturais encontram possjbilídades variáveis de deslocamento. Sobretudo, se considerarmos que a aparên- cia passa a ser a face mais escancarada do fenômeno da mídiatização. Esse dado teóríco possibilita a expansão da rede de re- presentações e dos modos de investigar o mundo, pois, com ele, a superfície do mundo desliza ligejra, muda de posição com facjlidade, oferecendo múltjplos e variados horizontes. Ao vjrtualizar a aparente dinâmica do mundo em movimento, a presentificação da superfície atua sobre os jmaginários, apagando a idéia de uma cultura vjven- ciada como estátjca. Esta últjma, porém, permanece em algum lugar de tais rotações, emitindo sinajs que mesclam, desmantelam e reorganizam, a uma só vez, as imagens crjstalizadas pelo "popularesco'', perante a pressão da mi- djatjzação das culturas. Devido às características especiais do cinema - mescla de indústria de filmes com a arte de modelar o tempo, o espaço e o movjmento, em imagens e sons - jsso ocorre de tal modo que em países fracamente jndustrializados, como o Brasil e vários da Amérjca Latina, o fantasma do ``popu- Iar" sobrevive, rondando o campo cinematográfico, agj- tando-se contjnuamente sob a capa jlusória da industrja- Iização. Nesse cenário, certas produções culturais jamais se concretizam unilateralmente. Elas se movem e oscilam CINEMA DE i`i`ii.ti o popularesco e o midiatizado. É o que acontece nos liliut`s a que denominamos "de bordas''. Em plano médio, neste livro, os autores se lançam sobre m itiutações, contaminações, fragmentações e remixagens tlt i` gêneros cinematográficos, vistos como formas organi- /.itlt>ras de um pacto que se estabelece entre as produções r u público desse tipo de realização, com características r {`Íeitos específicos. lsso ocorre porque as adequações Hi`iiéricas nos filmes de bordas dependem de condições tiiit` tanto podem ser econômicas quanto estéticas. E, uma vw que contam com as precariedades decorrentes de bai- xt )` orçamentos, os filmes acabam por adequar os gêneros ii,itlicionais a uma estética que pode ser mais ou menos "iini)ura'', "mista", ``trash" ou '`tosca", dependendo da in- itii```ão ou da pretensão de cada realizador. Acrescenta-se a isso o fato de que a experiência do ci- t`i`iiia de bordas está diretamente ligada ao entretenimento itM``l. E, dentro desse espaço, de modo muito peculiar, as li)Hiias narrativas que organizam os gêneros nesses filmes i`\iiidados não fazem caso de estabelecer qualquer sepa- i,```{io entre a realidade e a ficção. 0 que torna possível (li/iy que os modos genéricos expressivos da produção (lr hordas são pautados pela experiência midiática que os t t ii`tamina e não pelo viés do artístico que determinaria de inijdo clássíco uma classificação. Ou seja, os gêneros nos lilii`es de bordas falam mais de uma vivência exercitada e i`xi)erimentada pelos seus realizadores no universo dos fe- i`i`iiiienos e produtos midiáticos do que de uma produção int>positalmente estruturada sobre as categorizações tradi- t i{inais da arte de organizar as narrativas modeladas como l,`i()estes, musicais, comédías românticas, comédias escra- t l`,`das, filmes de horror, de lutas marciais, entre outras iii)iíicações. Muito mais do que uma ação capaz de dar Bofo à W €roEBORDAS3 ± forma si.mbólica às experjêncjas crjadoras, no cinema de u bordas os gêneros se apresentam como uma reação direta e materialjzada ao tipo de espaço expressivo vjvenciado pelos contratos dos realjzadores e sua formação. Por jsso aparentam sempre estar repetindo e refletjndo outras re- presentações, já anteriormente vjstas e ouvídas. Na verda- de, os gêneros nos filmes de bordas estão mais no terreno da experiência performátjca do que naquele da constru- ção artística tradicional. Em prjmeiro plano, o qiie transparece nos textos aqui reunidos é o amoroso, respeitoso e mjnucjoso trabalho com que são jnvestigados os detalhes da maquinação, da combínação de imagens e sons que compõem o corpo desses filmes desgarrados, para que eles encontrem seu lugar de direjto nos estudos cinematográficos e não se percam de vez no desprezo, no pouco caso ou na jndi- ferença. Uma djstjnção flagrante entre esta coletânea de artjgos e as duas anteriores é o conforto e a desenvoltura com que, agora, os artigos trabalham em cima de um referen- cjal conceitual que se estabelece a partir do termo "cine- ma de bordas''. Isso signífica, em prjmejra jnstância, que antes de tudo os textos jã partem de um campo cjnema- tograficamente pré-estabelecido, ao jnvés de ainda busca- rem justificativas para sedimentá-lo. Em C/.nema de Borc/as J, a ativjdade construtora Ínjcjal, que movia os dojs volumes anteriores, estã reduzjda ao mínimo dejxando transparecer, em seus rumos explorató- rios, sinais evidentes de maturjdade, sem que jsso repre- sente acomodação. Mas é necessárjo djzer que antes que prometer um uni- verso fechado e cristalízado, os dez artjgos que jntegram este livro são os fragmentos de um puzzle Íncompleto, ou CiNEMA DE Bo¢ int`ll`t>r, são testemunhas de uma ação contra o oblívio e (i t``tiuecimento. 1 iiíim, publicando este C/.nema c/e Borc}as 3, esperamos (iu`` cle atue com a magia renovada de um encontro, ``.`i.viiido para despertar outras iniciativas que somem itintiscono resgate de toda essa produção periférica, ituiii.u vezes perdida, escondida e quase invisível, mas tão vli,il i` tão necessária aos estudos de cinema em nosso país. C) > V' W ciNEMA DE Boí} "Cinema de bordas'', manual do usuário: Sobre afinidades teóricas e possi'veis caminhos para o estudo de um fenômeno audiovisual popular Alfredo Suppia Em "An atlas of world cinema", Dudley Andrew (2006) i)ropõe uma abordagem diferenciada do cinema mundial t (>ntemporâneo. Como alternativa a uma análise linear ou tirbital, com referência a centros de atenção e zonas de iieriferia, Andrew sugere, abertamente inspirado no Af/as t)f the European novel 1800-1900 (1998), de Franco Mo- ietti, um novo modelo para os estudos de cinema, basea- tlo na lógica do atlas geográfico: uma coletânea de mapas voltados cada qual a um valor específico, mas variável. l)essa forma, um pesquisador de cinema poderia proce- (ler a um mapeamento do cinema mundial contemporâ- neo com enfoque político, demográfico, linguístico etc., 1` assim propor histórias/panoramas alternativas(os) do ci- iiema, mais inclusivas(os) e abrangentes. A cada exemplo, Andrew fornece um ensaio de pesquisa possível. Sugere iambém a metáfora das "ondas" em substituição às tradi- cionais "árvores genealógicas" constituídas a partir de ci- nematografias nacionais (Andrew, 2006:21 -2). Sob o signo das ``ondas" - e não das "árvores" -, as análises poderiam perder seu caráter tradicionalmente estanque, abraçando o hibridismo e o reconhecimento das múltiplas influên- cias que as cinematografias nacionais têm exercido, umas sobre as outras, ao longo de toda a história do cinema. Segundo Andrew, "para usar a analogia de Franco Mo- retti, estudos de cinemas nacionais têm sido geralmente árvores genealógicas, uma árvore por país (2000:67). Suas raízes e troncos elaborados são raramente apresentados como estruturas entrelaçadas. Uma abordagem mundial como `sistema', por outro lado, demanda uma analogia diferente, aquela das `ondas' que rolam através de culturas adjacentes cuja proximidade entre si promove uma propa- gação que nem mesmo a triangulação é capaz de medir adequadamente. 0 termo de Moretti atrai um dos melho- res exemplos de wor/c/ c/.nema: porque a Nouvelle Vague 0 ã W €roEBORDAS/3 Ê que flutuou no cinema francês em l959 propagou-se ao U redor do mundo, afetando de díferentes maneiras e sob circunstâncjas diferenciadas os cinemas da Grã-Bretanha, Japão, Cuba, Brasil, Argentína, Tcheco-Eslováquia, lugos- Iávia, Hungria e, posteriormente, Taiwan. Como sabemos, sua suposta ondulação original em Paris deveu muito aos filmes hollywoodianos que aportaram a reboque da inva- são da Normandia de 1944, Iiteralmente rejuvenescendo uma cansada cultura francesa" (Andrew, 2006:21-2)'. Em meio à proposta de atlas de Andrew, um tipo de mapa em especial chama nossa atenção: o mapa topográ- fico. Esse tipo de cartografja tem por objetivo mapear pro- duções audiovisuais invisi`veis aos olhos dos ``observado- res de superfície" - aqueles que se voltam essencialmente às duas "formações" mais proeminentes na paisagem cine- matográfíca: (1 ) o cjnema comercial de ampla penetração, facilmente visível porque super-exposto, ou (2) o cinema de autor, Iouvado no meio acadêmico ou da crítica espe- cialjzada. Segundo o autor, "mapas topográficos represen- tam a luta por representar a profundidade, aquilo que está escondido. As noções de 'espaço nomádico liso' de De- Ieuze naufragam quando se olha para culturas profunda- mente `enraizadas', jncluindo aquelas que têm escapado a nossa atenção" (Andrew, 2006:26). Uma tentativa de mapeamento "topográfico'' (Andrew, 2006:25-6) da produção audiovisual brasileira, em espe- cial voltado para as ``grandes depressões", tem sido pro- cedida por um grupo de pesquisadores interessados em filmografias/videografias locajs ou regionais, circulantes à margem dos aparelhos de produção, distribuição e exibi- Ção legitimados ou institucionaljzados. Esse grupo deno- ' Todas as traduções do inglês são de responsabilidade do autor. ciNEMA DE Bo¢ mina ``cinema de bordas" seu objeto de estudo, essencial- mente heterogêneo e heteroglóssico. Na apresentação do livro C`/.nema c/e BorcJas (2006), primeira coletânea do grupo "Formas e lmagens na Co- municação Contemporânea" (sediado na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, e vulgarmente co- nhecido como ``o grupo das bordas''), Bernadette Lyra e Gelson Santana observam que "No campo do entreteni- mento cinematográfico, o envolvímento que ocorre entre os espectadores e um filme pode ser enquadrado em dois modos básjco5 de comportamento do lazer: o `sérjo' e o `trivial" (2006:9). No primeíro, o espectador exerceria do- mínio cognitívo sobre o objeto, um determinado "controle interpretativo'', enquanto no modo ``trivíal" a participação meramente passiva serviria aos propósitos mais rasos do espetáculo de diversão e passatempo (2006:9). Esse se- gundo modo, o ``trivial'', representaria o regime típico de jnserção do "cinema de bordas''. ``Não é à toa que de alguns filmes [de bordas] se diz que lançam mão de recursos expressivos excessivos. Ou seja, são `apelativos'. Esse apelo, certamente, diz respeito às formas filmicas e às percepções que provocam nos es- pectadores, muito próximas dos jogos `quentes' do corpo e distantes dos i.ogos intelectuais `frios'. Por essa razão, tais filmes são comumente assocjados ao comportamento tri- vial do entretenimento e se vêem destitui'dos, no esquema de valoração da experiência" (Lyra & Santana, 2006:12). No seio do modelo de oposição entre alta e baixa cul- tura, filmes de orientação "trivial" acabam subvalorizados em comparação àqueles de extração ``séria''. Nesse sen- tido, Lyra & Santana citam Hans Ulrich Gumbrecht para assinalar ainda que "esse duplo regime mascara as tensões que escapam pelas frestas de uma pretensa unidade do 0 > V) W €roEBORDAS3 Z espaço social, ao mesmo tempo em que remete às velhas C; questões provocadas pela djvisão corpo/espírito, acentua- da pelo sistema de representações com que se configuram as sociedades burguesas" (Lyra & Santana, 2006:9). Num esforço de definição maís precisa do fenômeno ``cinema de bordas'', Marcius Freire identifica um paralelo entre essa p,lodução audiovísual contemporânea e o Na).Í nas artes plásticas, levantando a questão de um possível "cinema ua).f': Nas artes plásticas uma tal postura estaria mais jpéntificada com a ``arte bruta", essa forma de ex- pressão definida pelo pintor Jean Dubuffet, criador do con- ceito, como "produções de qualquer espécie - desenhos, pinturas, bordados, figuras modeladas ou esculpidas - que apresentam um caráter espontâneo e fortemente inventi- vo, tão pouco devedoras quanto possível da arte habitual ou dos estereótipos culturais, e tendo por autores pessoas obscuras, estrangeiras aos meios artísticos profissionais''. "Para alguns críticos e historiadores da arte a distin- ção entre `arte bruta' e ar£ na}f não procede, sendo ambas pertencentes a um conjunto majs amploque poderia ser chamado de `arte popular'. Seja como for, fica claro que tanto os pintores na).Ís quanto nossos cineastas de bordas se enquadram com justeza na definição de Dubuffet. Como vimos, os primeiros e os segundos são autodidatas; des- conhecem muitas das técnicas do meio expressivo com o qual lidam e estas são substitui'das pelo élan intuitivo do artista" (Freire, 2008:12-3). Por sua vez, Lyra & Santana explicam que "o conceito de cinema de bordas não atua em função de uma simples oposíção, como ocorre com aquele de cinema marginal, ao qual, mujtas vezes, cabe o epíteto de exper/.menía/, no sentido que esse termo adquiríu ao contrapor um cinema voltado para uma expressão individual quase que pura- CINEMA DE Bc)¢ mente poética, a um cinema fortemente voltado para o mercado. E não se trata, ainda, do que comumente se qua- lifica como c/.nerna /.nocer}re, pois apresenta peculiarida- des em que se observa uma deliberada adesão ao regime trivial da experiência, muitas vezes de maneira explícita" (Lyra & Santana, 2006:14). 0 fato é que a heterogeneídade e heteroglossia do "ci- nema de bordas" acaba por reunir num mesmo peri'metro realizadores na}'f artistas populares e parodistas experien- tes. A própria diferenciação entre o ``cinema de bordas" e o Gnema Marginal de um Ozualdo Candeias (A Margem, 1967), F`ogér.io Ssanzerla (0 Bandido da Luz Vermelha, 1968) ou André Luiz Oliveira (Meíeorar)go K/.d.. 0 Heróí. /nferga/áf/.co,1970) talvez só tenha lugar sob determina- do perspectivismo histórico, no contexto da incorporação/ apropriação por parte de um aparelho legítimo/legitima- dor (a academia), e não em termos de comparação textual, da ordem dos atributos inerentes a cada filme. Adiante, Lyra & Santana observam que o objetivo principal do livro C/.nema c/e Bordas (2006) - e por extensão do grupo de pesquisa "Formas e lmagens na Comunicação Contempo- rânea" - é superar a "dicotomias valorativas que privile- giam os jogos do espírito em detrimento dos jogos do cor- po. Desnecessário dizer que esse foco na corporalidade vem movimentando, atualmente, uma boa parte da crítica de cinema e as pesquisas acadêmicas, sobretudo aquelas que se dão sob o influxo dos estudos culturais" (Lyra & Santana, 2006:15). A título de resumo de um esforço de definição, esclare- cemos que o conceito "cinema de bordas" não é um movi- mento ou escola, mas um fenômeno difuso, um "cinturão" para efeito de pesquisa estabelecido por pesquisadores, a partir de um método de observação. Tal ``cinturão" emer- 0 > u, 0 €roE Lu Z u BORDAS 3 ge, portanto, como conceito instrumentcil, abi.aiigendo uma produção heterogênea (diferenças de ft)rm[i, de tema e de formação/repertório dos realizadores). T[il produção heterogênea, no entanto, guarda algunicis c{ii.acterísticas partilhadas, como o fato de os filmes "de b()rdLis" serem sempre ficcionais, manifestação de um di's(}j() popular irrefreável de se contàr histórias. Até ag()r{i, iienlium do- cumentário genuíno foi reivindicado por i)i``Íiiiisadores "de bordas'', salvo ,rr}ockumeníar/.es (falsos dt]cunientários) como No Fundo do PoÇo: a Biografia não ALirt)i.i/..(h de Edir 4_a__cedo (2005), de Marcos Bertoní. Cineastti` "Ílc` hordas" valem-se sempre de recursos próprios ou ciii()i() t`xtrema- mente modesto, mobilizando sua familia ou i`t)iiiuiiidade da produção à exibição de seus filmes. Conftiriii(` vcremos em detalhes mais adiante, o ``cinema de b()rcl.is" sugere parentesco com os "filmes de familia" e s(? i)i.(`sta a um duplo objetivo: (1 ) relembra experiêncicis cl()s (`nvolvidos na produção e filmagem e (2) se abre para .i i`si)i`ctatoria- lidade alheia, com trânsito fluído entre a esfem (l()iiiéstíca e a esfera pública. Vale destacar que "cineiii.` clc` bordas" não é necessariamente sinônimo de cinc`ma Í/.<i.ih. Alguns filmes "de bordas" expõem precariedacle inírd-estrutural e mesmo artística ou estilística da parte dc` scus realiza- dores, outros exibem razoável domínio dd téciiica e até certo grau de profissionalismo, enquanio iima terceira via investe abertamente na sátira e na par(')dia, sem ne- gligenciar o apuro técnico. Alguns filmes "de bordas" fo- ram idealizados como obras "sérias" e realizados com os melhores recursos disponíveis, porém provocam o riso de espectadores atuais em virtude de precariedade técnica e/ou artística inconteste, ou simplesmente defasagem de costumes (mesmo produções hollywoodianas de 60 anos atrás podem parecer algo cômicas - equivocamente Írash - ao espectador contemporâneo). Por fim, problemas de CINEMA DE Bo¢ definição do filme "de bordas" são análogos aos que afe- tam demais definições de gêneros audiovisuais, tais como o próprio fra5h, a ficção científica, o cinema independente, o film noir etc. Gostaríamos de sugerir que, para além dos estudos cul- turais, uma rica variedade de molduras teóricas contempo- râneas tem oferecido instrumental promissor para a inves- tigação de fenômenos idênticos, similares ou equivalentes ao que o grupo ``Formas e lmagens" convencionou chamar "cinema de bordas". Pelo menos três grandes domínios teóricos dos estu- dos de cinema oferecem instrumental bastante apropria- do ao trabalho de pesquisa com o ``cinema de bordas'': os estudos culturais, a semiótica (revisitada) e o programa cognitivista - com destaque para derivações e combina- tórias desses mesmo domínios, como o semio-pragmatis- mo (Odin,1979,1984 e 2005) ou a semiótica cognitiva (Buckland, 2000)2. Robert Stam observa que "tanto o cog- nitivismo como a semiologia desvalorizam as questões relativas à avaliação e à classificação, em prol da inves- tigação das maneiras como são compreendidos os textos. Ambos os movimentos recusam uma abordagem normati- va e beletrista, compartilhando um impulso democratiza- dor desinteressado em celebrar cíneastas individuais como gênios ou filmes especi`ficos como obras-primas. Para Car- roll (1998), como para Metz, toda a arte de massa é arte" (Stam, 2003:272). A semiótica cognitiva, conforme proposta por Warren Buckland (2000), tem por obj'etivo reconciliar dois campos aparentemente rivais no território dos estudos de cinema, ' Segundo Warren Buckland (2000), o semio-pragmatismo de Roger Odin seria uma vertente da semiótica cognitiva, ladeado pelos trabalhos de Michel Colin e Dominique Chateau. 0 > U) W €,OEB0RDAS3 = por meio do resgate da dimensão lingui`sticci em análises C} ou teorizações de corte cognitivista. ``Pelo fato de se ig- norarem mutuamente, cognitivistas e semióticos têm de- senvolvido teorias do cinema desequilibradas. Em nossa busca por entender como os filmes são enteiididos, pre- cisamos manter um equilibrio entre fatores culturais, tais como a linguagem e outros sistemas semióticos da cultura humana, e fatores ecológicos mais amplos. Os semióticos cognitivos do cinema de certa maneira atingem algo desse equilibrio, em oposição ao determinismo luií3uista da se- miótica do cinema de Metz e o livre arbítrio e tiutonomia racional que os cognitivistas conferem aos c`si)c`ctadores de cinema" (Buckland,2000:15). Buckland denomina cogri/.Í/.ve Í/./m sem/.oÍ/.f/.,im. os pesqui- sadores que "combinam semiótica do cinema c` c.iência cog- nitiva com o objetivo de estabelecer modelos clci i()mpetência filmica" (2000:25). Seriam eles Francesco Casetti, o Christian MetzdeL'Enonciationlmpersonelle,ou,lesitedLiFilm(199l), Roger Odin, Michel Colin e Dominique Chateau. Dentre esses pesquisadores, o que talvez ofereça uma moldura teórica das mais adequadas e atraentes ao pes- quisador ``de bordas" seja mesmo Roger Odin. 0 modelo semio-pragmático de Odin, com seus conceitos de insti- tuições, modos e operações, fornece instrumental eficiente para a análise de um objeto tão "contexto-dependente" e significativamente deslizante como o "cinema de bordas''. 0 resgate do papel do espectador, bem como dos modos de leitura e institucionalização são aspectos fundamentais para uma investigação mais profunda desse fenômeno au- diovisual popular. Sabemos que a abordagem semio-pragmática proposta por Odin foi motivada em grande medida por seu interesse nos chamados filmes domésticos ou filmes de família (f/./ms ciNEMA 1)[ Br,p de fam/.//e). Marcius Freire, por sua vez, vê similaridades interessantes entre o ``cinema de bordas" e os filmes de família. Sobre os realizadores ``de bordas", Freire comen- ta: "Por se situarem à margem do sistema produtivo, de modo geral, não fazem apelo às leis de incentivo à pro- dução cinematográfica existentes no país e permanecem confortavelmente instalados na categoria de `produtores independentes'. Consequentemente, no maís das vezes, realizam trabalhos pouco custosos cujos ingredientes, de atores a cenários, são amealhados no ambiente familiar e/ ou no círculo de amigos. A grande maioria é autodidata e tem na espontanei- dade com que tratam os seus temas a chave mestra de sua criação. Dão as costas à crítica especializada, não se identificam com escolas ou movimentos e não estão preocupados em agradar o grande público. Tampouco estão de olho em grandes bilheterias, até mesmo porque seu sistema de exibição passa ao largo das salas tradi- cionais e dos circuitos comerciais estabelecidos. Seus es- pectadores são, primeiramente, seus familiares, vizinhos e amigos que assistem a seus filmes em sessões privadas e em espaços alternativos, como praças públicas, centros culturais, etc. É verdade que, já há alguns anos esse pú- blico se expandiu com a comercialização artesanal de fitas VHS e, em tempos mais recentes, de DVDs vendidos em camelôs ou diretamente das mãos do diretor ou dos membros de sua equipe. Deve ser observado, também, que, nos últimos anos, esses filmes têm sido acolhidos em mostras e festivais, (...). (...) [A]ssim como nos filmes de familia, o primeiro pú- blico a que esses filmes se destinam, os primeiros especta- dores dispostos a preencher algo de seu tempo disponível distraindo-se com o seu visionamento, são os familiares e 0 > U, u €roEBORDAS3 Z ocírculodeamigospróximosdodiretoredesua equípe" CJ (Freíre,2008:8-9). Não obstante, de certa maneira o ``ciiii`m[i de bordas" parece desafiar a categoria dos filmes de familia delineada por Odin. As oito características textuais ciuc` estimulam o espectador a ler um filme doméstico como tcil podem ser conferidas em "Rhétorique du film de famille" (1979): (1 ) ausência de c/osm? ("fechamento''), (2) temporalidade linear descontínua, (3) indeterminação especial, (4) narra- tiva dispersa, (5) saltos, (6) imagens borradas, iii()vjmentos bruscos de camera, panorâmicas hesitantes, e dssim por diante, (7) remissão à camera e, finalmente, (8) o som de um filme doméstico pode ser inaudível, irregulcir ou com- pletamente ausente (Buckland, 2000:102-3). Muitas dessas características podem ser constatadas em filmes "de bor- das'', como na série Rambú (produzida por Rubens Pereira da Silva e estrelada pelo amazonense Aldenyr Trindade Fortes), ou nos filmes de Manoel Loreno, o Seu Manoelzi- nho (cineasta popular de Mantenópolis, interior do Espírito Santo). Segundo Odin, "o filme doméstico tem, de fato, a particularidade de ser feito para ser visto por aqueles que vivenciaram (ou viram) o que é representado na tela" (Odin,1979:356). Dessa forma, os filmes domésticos não teriam a necessidade primária de estabelecer uma diegese coerente porque todos os eventos filmados são previamen- te conhecidos (vividos) pelos espectadores. Cabe ao filme doméstico apenas reviver as memórias do espectador so- bre sua própria experiência. Apenas ouÍ`ç/.c/ers (não-mem- bros da familia) percebem o filme doméstico como uma narrativa fragmentada. Para os membros da familia, o fil- me doméstico gera prazer justamente por meio da pobreza narrativa e diegética de suas imagens. "0 home mov/.e re- lembra uma série prévia de eventos; ele não necessita nar- rar esses eventos" (Buckland, 2000:103). Portanto, dentro clNEM^ 1)1 ',,J¢ da moldura teórica proposta por Odin, o filme doméstico é marcado pela ausência das operações de diegetização e narrativização. Exatamente por isso, Odin é crítico dos cineclubes que encorajam cjneastas domésticos a adotar as técnicas do modo ficcional, e i.ustamente nesse momen- to o ``cinema de bordas'', enquanto gênero ou fenômeno de produção audiovisual, oferece um desafio ao modelo semio-pragmático de Odin. Porque o "cinema de bordas" é um hilJrído ou, talvez, um gênero a meio caminho en- tre o modo doméstico (o do filme de familia) e o modo ficcionalizante, ou mesmo o modo dinâmico3. 0 filme "de bordas" é, assim como o filme de familia, essencial- mente voltado para o deleite espectatorial dos envolvidos em sua realização. Não raro os realizadores de um filme "de bordas" são, coincidentemente, uma familia ou uma pequena comunidade (filmes de Felipe Guerra e Seu Ma- noelzinho, por exemplo). Embora possa apresentar muitos (senão todos) os elementos textuais caracteri`sticos do filme de familia elencados por Odin, o esforço ficcionalizante na maioria (senão na totalidade) do "cinema de bordas" é também bastante marcado. Nesse sentido, o filme ``de bordas" presta-se a um duplo objetivo: não só relembra as experiências dos envolvidos na filmagem, como também se abre para a espectatorialidade alheia à da comunídade que o realizou. Cumpre a função de filme de familia e fil- me ficcional (e eventualmente dinâmico) ao mesmo tem- po. Talvez a abordagem semio-pragmática do "cinema de 3 Em "Du spectateur fictionalisant" (ig88), odin trata o modo dinâmico como uma derívação da instituição do cinema comercial. Embora exíbidos em salas comerciais, os filmes associáveis ao modo dinâmico não criam o efeito ficcional porque não incorporam todas as operações necessárias para tal. Odin menciona filmes como SÍc7r Wcir5, 77on, Cobrcí, as séríes Mod Mox e Rocky, mas destaca a versão Moroder do Meíropo//s de Fritz Lang. A principal diferença entre os modos dinâmico e ficcional é que, neste último, o espectador "ressoa" ou ``vibra" (resonotes) aos eventos narrados e, no modo dinâmico, o espectador vibra com os sons e imagens (Buckland, 2000: 104). 0 > Jr W €roE LL' Z u B0RDAS 3 bordas" possa contrjbuirpara a formulação de ainda outro modo a ser acoplado ao modelo de Odin: o dos filmes "comunitários'', um gênero híbrido ou transicional, a meio caminho entre a esfera doméstica e a esfera pública. Parece óbvio que tal caráter (ou potencial) público dos filmes "de bordas" venha se beneficiando do aporte de tecnologias digitais mais acessíveis, maleáveis e eficien- tes para a divulgação de conteúdo. Henry |enkins sugere que "o cinema digital é um novo capítulo da complexa história das interações entre cineastas amcidtjres e mi'dia comercial" (2000:200), e suas observações a respeito da produção audiovisual amadora nos EUA também são úteis para uma análise mais detida do caso brasileiro. Segundo jenkins, ``a produção digital de filmes alterou muitas das condições que levaram à marginalização as ini- ciativas anteriores - a web fornece um ponto de exibição, levando o cineasta amador do espaço provado ao espaço público; a edição digital é muito mais siniples que a edi- ção do Super-8 ou do vi'deo e, portanto, abre c`spaço para artistas amadores remodelarem seu material de forma mais direta; o computador pessoal possibilitou cio cíneasta ama- dor até imítar os efeitos especiais associados a sucessos de Hollywood, como Guerra nas Esrre/as. (...) Esses filmes continuam amadores, no sentido de que são feitos com orçamento baixo, produzidos e distribui'dos em contextos não comerciais e criados por cineastas não profissionais (embora muitas vezes sejam pessoas que desejam entrar na esfera comercial). Contudo, muitos dos criadores clás- sicos de filmes amadores desapareceram. Esses filmes não são mais caseiros, e sim públicos - públicos porque, desde o início, são destinados a espectadores que vão além do círculo imediato de amigos e conhecidos; públicos em seu conteúdo, que envolve a recriação de mitologias popula- clNI=M^ " ",,í` res; e públicos em seu diálogo com o cinema comei.cidl" (Jenkins, 2009:200). Aplicado a uma análise conj.untural do ``cinema de bor- das" no Brasil, o trecho citado acima não só sugere alguma explicação sobre o fenômeno da crescente publicidade da produção audiovisual considerada caseira, como também indica onde os filmes "de bordas" devem ser procurados: na zona "(...) que envolve a recriação de mitologias popu- lares", de ``(...) diálogo com o cinema comercial" (Jenkins, 2000:200). É nesse sentido que o `'cinema de bordas'' mais genuíno não se dilui completamente na grande massa do "cinema amador" ou "cinema caseiro'', nem tampouco se confunde com um cinema autoral de vanguarda. Por exemplo, um filme como Toy So/d/.ers (1996), de Kyle Cas- sidy4, citado por jenkins (2000:208-9) como representativo do movimento Pixelvision5, dificilmente seria reivindica- do como exemplo confortável de um "cinema de bordas'', uma vez que "os melhores filmes em Pixelvision foram aceitos no mundo da arte, e a câmera tem fãs até entre cineastas comerciais" Oenkins, 2000:211 ). Mas não é exa- tamente pelo fato de ser reconhecido como arte que um filme como Toy So/c//.ers não se encaixa confortavelmente ao mosaico dos filmes ``de bordas" (e vice-versa), mas em virtude de, no filme de Cassidy, a "recriação de mitologias 4Jenkins observa que "roy So/d/.ers possui a intimidade de um f`lme caseiro, embora tenha sido refeito décadas depois das lembranças do próprio diretor. Cassidy fez o filme, aclamado pela crítica, com sua câmera Pixelvision 2000, que tem estojo e lentes de plástico, funciona com pilhas AA e grava imagens numa fita de áudio normal. A câmera Pixelvision, da Fisherprice, vendida entre ig87 e 1989 por US$ 100, é a filmadora mais barata iá fabricada" (2000:208). roy So/d/.ers está disponível no YouTube em http ://www.youtu be com/watch?v=RUcwi4pq-9U. 5Jenkins assinala que "0 movimento Pixelvision é o equivalente artist`co do Culto à Carga: uma tecnologia descartada e abandonada por seu fabricante chega, de foi.ma imprevista, a mãos dedicadas, e hoje podemos ver o resultado de duas décadas de elaboração, já que os adoradores conseguiram transformar os `defeitos' dessa tecnologia em características desejáveís e desenvolveram um novo modo de expressão em torno de suas propriedades singulares" (2000;209). 0 J, UI W €u Z u OE BORDAS 3 populares" e o "(...) diálogo com o cinema comercjal'' se- rem mujto ausentes. mais sutis e depurados, senão completamente Vale destacar que o fenômeno aqui entendjdo por "ci- nema de bordas" não é exclusividade nacíonal, encontra paralelos em djversas regiões do mundo e pode receber ou- tras denomjnações. Um fenômeno de certa maneira sjmi- lar ao "cinema de bordas" no Brasil é o mercado de vi'deo nígerjano, conhecido por "Nollywood". Para ilustrar sua argumentação a favor do ``mapa topográfico", Dudley An- drewrefere-sejustamenteaofenômenodovídeonaNigéria (Andrew, 2006:26). Segundo ele, "desde 1990 centenas de roteiros nigerianos (mais de 500 o ano passado) têm sido rodados em vídeo em Yoruba e lbo; fitas VHS (seu único modo de existêncía) são comercjalizadas na cidade, depojs levadas de bjcicleta por velhas rotas de comércio para vi- Ias ao redor do país. Nenhum festival exibe esses filmes,. nenhum crítjco os resenha. Sua reputação víaja de boca em boca, dentro dos limjtes nacionais, geralniente trjbajs. Este, o mais bem sucedido mercado de imagens de todo o contjnente afrícano, tem sído jnvisível para nós... ausente de nossas telas e, até poucos anos atrás, ausente de nossa literatura acadêmica. Uma das únicas jiidústrjas audiovisu- ais não-subsidiadas víáveis no mundo, os fjlmes em vi'deo nigerjanos estão fora do mapa" (Aiidrew, 2006:26). Françojse Balogun, por sua vez, observa que ``a Njgé- ria foí um dos primejros países a desenvolver uma produ- ção sjgnifícativa de filmes em vi'deo" (Balogun, 2007:193). 0 fenômeno da produção em vi'deo na Nigéria tem algu- mas cojncidêncías com o paralelo brasileiro - o "cinema de bordas" também esteve, até poucos anos atrás, total- mente exclui'do do mapa do audiovisual brasjleiro, igno- rado sobretudo pela crítica acadêmica. Por ser um país de CiN[MA DE Bc)¢ dimensões continentais, várias regiões brasileiras apresen- tam cenário infra-estrutural e demanda por imagens locais equivalentes ao caso nigeriano. A maior diferença é que, ao contrário da Nigéria, no Brasil essa produção em vídeo não assumiu o ``centro" do mercado audiovisual - perma- nece "de bordas'', embora fenômenos como o YouTube e similares introduzam peculiaridades mais recentes ao panorama. Uma razão para a ``permanência bordeira" da produção brasileira de vi'deo poderia ser buscada, talvez, na eficiência comercial da televisão brasileira. Coincidências de mercado e modo de produção avan- Çam para a temática dos produtos. Assim como boa parte dos vi'deos nigerianos versam sobre temas religiosos, fol- clóricos ou simplesmente fantásticos, no Brasil o "cinema de bordas" é terreno fértil para filmes de zumbi, delírios paranormais e aventuras extraordinárias, muitas delas pon- tuadas por elementos do sincretismo religioso, permitindo incursões curiosas no campodas ``deglutições" e ``regurgi- tações" ("deglurregurgitações'') de gênero. Por sua vez, coincidências do objeto extrapolam para o âmbito dos analistas. 0 próprio trabalho de estudiosos como Françoise Balogun coincide com o dos pesquisado- res "de bordas'': equivalências de fundo teóríco e similitu- des no trato com seu objeto. Senão vejamos. Segundo Ba- logun, ``a produção de filmes em vi'deo na Nigéria, embora severamente criticada, é a expressão autêntica das iden- tidades do país. As deficiências técnicas não conseguem ofuscar a inventividade dos roteiros. Trata-se também de produções totalmente independentes, uma vez que a Ni- géria - diferentemente da África francófona, onde a indús- tria do cinema foi subsidiada pela França, sobretudo por meio do Ministério da Cooperação - nunca recebeu ai.uda alguma dos antigos mandatários dos tempos de colônia 0 > UP 0 B0RDAS 3 ou de qualquer fonte estrangeira, pelo menos no que djz respeito à produção de filmes. Na verdade, a produção de filmes em vi'deo foi encabeçada, no início, principalmente por pessoas sem experiência, que viam nesse formato um atalho para driblar os problemas de distiibuição'' (Balo- gun, 2007:197). As considerações de Balogun revelcim certo despoja- mento no que se refere a doutrinas celebi.cidas, as quais demandam razoável hierarquização dos fenômeiios artís- ticos entre as esferas da "alta" e da "baixa" cultura. Em sua análise do fenômeno da produção videográíicci nigeriana, Balogun contribui a seu modo para a demolição de bina- rismos preconizada por autores como Ella Shtihcit e Robert Stam (2006) ou Lúcia Nagíb (2007), conforme se verjfica na seguinte passagem: ``a produção de filmes em vi'deo na Nigéria é mais uma prova da capacid.ide dos africa- nos responderem a situações especi`ficas produzindo algo totalmente original e adaptado às condições locais, con- forme já foram capazes de demonstrar em ()utros campos da produção. Hoje em dia, por exemplo, é fato inconteste que a metalurgja praticada na África subsa[iriana foi inven- tada pela população autóctone da região em 3.000 a. C., e que seu desenvolvimento seguiu trajett`]rias originais que hoje despertam o interesse de antropólogos, arqueólogos e cientistas" (Balogun, 2007:202). Nesse sentido, o trabalho de pesquiscidores como Ba- logun (2007), Lyra (2006), Santana (2006 e 2008) e outros vaj ao encontro de certa orientação verifjcável no âmbito do cognitivismo aplicado aos estudos de cinema, o inte- resse por fenômenos particulares e menos (ou nenhuma) preocupação com formulações teóricas totalizantes. Méto- dos como o da "pesquisa nível-médio" (David Bordwell), ``teoria a conta-gotas" ou "teoria do prato avulso'' (p/.ece- clNEM^ ',1 ",,í. mea/ rheory, segundo Noél Carroll), conforme j.á sugei.i- do por Lúcia Nagib em '`Rumo a uma definição positiva de wor/d c/.nema" (2007), parecem particularmente úteis. Nesse ensaio que pretende lançar as bases para uma con- cepção mais inclusiva e policêntrica de wor/d c/.nema, Na- gib revisa a tese do atlas de Dudley Andrew e defende o desmonte do binarismo na crítica de cinema e ativídade teórica. Sobre o texto "An atlas of world cinema" (Andrew, 2006), a autora comenta que ``o método de Andrew tem o mérito imediato de relativizar a importância de Hollywood como cinema ma/.nsíream e mostrar como picos de produ- ção, popularidade e qualidade artísticas são atingidos em épocas e lugares diversos do mundo. Porém, a distinção entre Hollywood e o resto do mundo ainda se reflete na sua exposição, quando ele qualifica wor/d c/.nema de `es- trangeiro' e `não familiar' - algo que parece em desacordo com as platéias etnicamente mistas das salas e cursos de cinema tanto na Europa como nos EUA atualmente" (Na- gib, 2007:37). Na esteira do pensamento de Ella Shohat e Robert Stam em Unfhi.nk/.ng Eurocen[r/.sm ( 1994) - para os quais velhas dicotomias como "nós" e o "outro'', "centro e pe- riferia'', "o ocidente e o resto", são equivocadas e desne- cessárias - Nagib assinala que teorías cinematográficas tradicionais, baseadas na oposição Hollywood x cinema mundial, não dão conta das complexidades da produção contemporânea. ``Por isso, proponho um método segundo o qual Hollywood e o ocidente deixariam de ser o centro da his- tória do cinema, que seria vista como um processo scm um começo único. A vantagem de tal abordagem é Íiu(`, uma vez elíminada a idéia de um centro único, nc)da i)i.c`- cisa ser exclui'do do mapa do cinema mundial, nem iiies- 0 J, u €roEBORDAS3 = mo Hollywood, que, em vez de uma ameaça, torna-se um u elemento ou um cinema entre outros, podendo receber mujta, pouca ou nenhuma atenção, dependendo do ob- jeto em questão. Contra o método exclusivo baseado em Hollywood, eu proponho, seguindo a sugestão de Shohat e Stam, o método inclusivo de um mundo feito de cinemas interconectados" (Nagib, 2007:39). Finalmente, Nagib resgata a utilidade do conceito de "ondas" sugerido por Andrew (Nagib, 2007:39) e propõe a seguinte definição para wor/c/ c/r)ema, como um "primeiro passo para discussão'': • \^/Ór/c/c/.nema é simplesmente o cinema do mundo. Não tem centro. Não é o outro, mas nós. Não tem começo nem fim, sendo um processo global. Wor/d c/nema, como o próprio mundo, é circulação. • Wor/c}c/.nema não é uma disciplina, mas um méto- do, uma maneira de visualjzar a história do cinema como ondas de filmes e movimentos relevantes, que criam geografias flexíveis. • Como um conceíto positivo, inclusivo e democráti- co, wor/d c/.riema permite todos os tipos de aborda- gem teórica, desde que não se baseie em perspecti- vas binárias (Nagib, 2007:40). Nagib não menciona a crítica que Andrew faz a um certo "elitismo" nas seleções filmográficas de Shohat e Stam (Andrew, 2006:23). De fato, o ideal talvez fosse uma fusão das propostas desses autores. Afinal, uma vez váljdo "o método inclusivo de um mundo fejto de cinemas in- terconectados", em que "Hollywood, (...) em vez de uma ameaça, torna-se um elemento ou um cinema entre outros (...)" (Nagib, 2007:39), nada mais justo que começarmos a demolição dos binarismos dentro de nosso próprio ``terrei- CINEM^ DF /i,,p iti''. É justamente nesse aspecto, na ressalva que Andrew l.`z a Shohat e Stam (Andrew, 2006:23), que o autor de "^n Atlas of World Gnema" sugere abordagens de fato ii`[iis inclusivas, a começar do âmbito doméstico, infra-na- ( i()nal. Fica claro, portanto, o papel de pesquisas voltadas i)" formas genuinamente populares de audiovisual, no l}rasil e no exterior. Vencida essa primeira etapa de inclu- `ão, de ``democratização" dos enfoques de pesquisa, com .`bordagens menos elitistas, o próprio termo "cinema de hordas" passa a merecer uma revisão, pois se baseia numa relação discutível entre centro e periferia. Não é propósito deste artigo investigar as causas ou origens dessa relação de oposição, recorrente e generalizada mas, ultimamente, revista e apontada como falsa, artificial ou fabricada. De toda forma, resta como desafio ao próprio pesquisador "de l)ordas" a superação desse binarismo,mais cedo ou mais tarde. Como fazê-lo também foge ao escopo deste traba- lho, ao menos por ora. Com efeito, vale a pena destacar que o "cinema de bordas" em sentido /aío não se restringe a contextos para- institucionais, de precariedade infra-estrutural ou simples- mente substituição de produtos na situação de carência de uma indústria audiovisual local formalizada, de qualquer ni`vel. Convém destacar que a produção contemporânea independente, alternativa ou "de bordas'', como se quei- ra, tem de fato contribuído para revigorar as indústrias do audiovisual, até mesmo a mais famosa delas no ociden- te, Hollywood, que por meio de algumas subsidiárias de grandes estúdios não tem ignorado as ``bordas" mundiais. E bons exemplos desse fenômeno podem ser buscados em filmes como 5/eep Dea/er (2008), de Alex Rivera, e D/.s- fr/to 9 (District 9, 2009), de Neill Blomkamp. Ambos são derivados de curtas-metragens independentes. D9 deriva 0 > 0 €roE BORDAS 3 de A//.ve i.n /oburg (2005), sobre a co-exjstêncja nada pací- fica entre alienígenas e seres humanos em Johannesburg, parábola do aparfhew vestida de fjcção científica. S/eep F:enanl=: por s,ua vez, é uma expansão áe why cyó;ràii::sr? (1997), mockumenfary ("documentário fictício") em curta- metragem também realizado por Rivera.'' A propósito, au almente esse artjfícjo parece ter se jniensjíicado no cínema de ficção cienti`fica, e o recurso à retóric[i documentárja, vja mockumenfari.es inspirados, tem sei.vido eficientemen- te para a reconcjlíação da FC com a longa tradição da sátira literária.7 6mce°nn`fa°Ted,%P::Cí=,a?=:ócP:`'v°..=Í.re.t?r^(`e,Tpefo_retheMakingofsleepDeaier,"mini_ mentary" disponi'vel nos extras do DVD de 5/eep Oea/er), a ideia de 5/eep Oeo/e/ remonta a 1997, quando o próprio Rivera lera um artigo dô revista W/red sobre Íe/ecommuring, ou o impacto da internet nas relações de trabalho. No arti'go era debati'da a hipótese de um futuro em que trabalhadores cumprissem suas funções profissionaís sem sam de casa. Rwera cruzou essa hipótese com a realidade dos imigranteseimaginouumfuturoemquetrabalhadoresestrangeirosnãoprecisassem maBdeíxarseuspai'ses0diretorcontaquenãosoubecomoexpressarvisualmente essa idén até se deparar corn o documentário Wfiy Bracercis? (1959), encontrado nos Prelinger Arch" (Why B/oc€ros? encontra-se disponível para visionamento e down/oodemhttp//wwwarchive.org/details/WhyBracel959)0programaBraceros foiestimuladopelogovernoamericanoduranteaSegundaGuerraMundial,econsistia no oferecimento de postos temporários de trabalho para mexicanos nas lavouras dos EUA A idéia era qiie o trabalhôdor mexícano viesse para os EUA, trabalhasse na colheita e depoE retornasse a seu país de origem, enquanto os americanos de dedicavam ao esforço de guerra Wtiy Cybroceros? (http //wwwdb.org/smackn. acgístapedetail?WHYCYBRACE),sátirôdoprogramaBracerosrealizadaporRwerade formaindependenteeexperimentaLutilizaimagensdodocumentáriooriginal(Why sraceros?), cenas especialmente gravadas em vídeo e animações digitôu bastante simples e esquemáticas. Rivera disponibilizou seu mockumenfow na internet e teve uma resposta de público e crítica surpreendente. 7 A relação entre sáti.m e FC remontô às origens deste gênero, em obras como As ViogensdeGÜ//wer(1726),deJonõthanSwiftConsideradaporalgunsumanarrativa precursora da FC e, por outros, uma das primeiras mônifestações do gênero, A5 V/ag" de Gu/Wer é exemplo mais apropriado da sát.ra menipéia, subgênero que remete à obrô do satirista Luciano (séc. H d C.), que tería se inspirado em Menípeu `oBb°s°e#=m&:Àh<°à=:.S`í?339_9^8.):=_i_r±e-sátw-::'h`Ç*;`c'iae:5::=:'#oao°keermeMTehn==aus observam'`Asátíraéummodoliterárioantigoedistintoqueempregaohumorpara exporecriticarváriaspráticaspolítTcasesociôisoucertoshábitosdocomportamento humano(.)Emresumo,asátiradependedofenômenodoestranhamentocognitivo paraatingmseusefeitosNesseaspecto,temmuitoemcomumcomaficçãocientífica, portanto não surpreende que alguns dos mais importantes romances de ficção cienti.ficaapresentemorientaçãoabertamentesat]rica"(200998) CiNEMA DE so¢ Retomando o eixo de nossa argumentação, vale des- tacar que a estratégia satírica, a lógica da paródia e até mesmo o "estranhamento cognitivo''8 são aspectos obser- váveis em boa parte da produção audiovisual ``de bor- das" de qualquer nacionalidade. Via de regra, o '`cinema de bordas" se constitui no terreno da relação com um Outro institucionalizado, e nessa medida é naturalmen- ie paródico, dado seu poder de comentário tanto no ní- vel de sua fábula como no de suas próprias estratégias de apresentação (inserção em seu ``mercado''). Voltado i)ara o ``cinema de bordas" enquanto fenômeno brasilei- ro, Marcius Freire observa que "(...) a paródia de gêneros ionsagrados é uma das marcas registradas dessas produ- Ções" (Freire, 2008:9). (|,aT,#cs,odneas,seds.f:':::,e::se:sttaanbt:,,enc:doofsaz:aTau:oan:tarru:: 5ua trama, seus diretores lançam mão de uma plataforma, tlL` uma base que é constitui'da pelos principais códigos de um determinado gênero. Não obstante, esses códigos são (1istorcidos e a forma como são usados provoca uma revi- r.`volta semântica na estrutura narrativa que vai interferir (lii maneira determinante na sua recepção pelo especta- (]()r. Este último, conhecedor das convenções do gênero, `t` imbui de uma espera, de uma expectativa em relação •` elas. Mas, quando seus sentidos se deparam com um .irremedo dessas convenções ou com a sua deformação i`xplícita, sua fruição da obra não passa mais pelo prazer t`stético decorrente do simples reconhecimento dessas (()nvenções, como quer Buscombe, mas por um desliza- iiiL'nto involuntário das emoções que suscitariam os códi- n Categorla descrlta por Darko Suv.in err\ Metamorphoses of Scjence Fiction. On the poerJ.c5 ond h/.stow o/ o //temq/ genre (Vale University Press, 1979), considerada crucial pelo autor na definição da literatura de ficção cient`'fica. 0 > Ul' W € LU Z u OE BORDAS 3 dente, como no caso da obra recente de Michel Gondry, com seu Rebob/.ne por favor (Be Kind Rewínd, 2008), mos- tras e oficinas relacionadas a esse filme. Rebob/.ne por Fa- vor traduz sob perspectjva primeiro-mundísta o fenômeno observável nas mais diversas regiões do planeta: o desejo popular da expressão audjovjsual, favorecida por tecno- logias mais acessíveis de vi'deo, e a relação desse desejo com os cânones comerciais e a indústria dos b/oc*busíer5. Enquanto isso, no Brasil a produção audiovisual popular jnspira realizadores hoje ``centrais" na filmografia nacio- nal (mas com raízes "bordeiras''), como o jorge Furtado de saneamento Básico, o Fi|me (2oo7). San-eajentà ii:s;_ co sugere uma crítica afiada ao contexto contemporâneo da produção audjovjsual brasjleira, expondo com Íronia desvios e retrocessos de políticas nacionais de fomento às artes. Ao mesmo tempo, o filme de Furtado comenta a vjva produção audíovjsual popular no país, favorecida pela tecnologia mais acessível do vi'deo digital." Concluindo, o mapa do cinema e audjovisual contem- porâneo, suficientemente heterogêneo, heteroglóssico, pluricasual e rizomático, instjga o trabalho de pesquisado- res interessadosnas zonas menos salientes da produção, vastas regiões menos vjsíveis ou mesmo invisíveis a olho nu, mas que convidam à investigação -a abordagem topo- gráfica sugerida por Dudley Andrew em seu ``Atlas do CÍ- nema Mundial" (2006). Para tal, o pesquisador pode se va- Ier de determjnadas metodologias já disponíveis há algum tempo, conforme procuramos exemplificar neste trabalho. Mujto em virtude das tecnologjas djgitais contemporâneas e do rearranjo que elas promovem nas cadeias de produ- " 0 curta sa//or/'no, de Carlos Canela (Be!o Horizonte, 2001, cor, 23 min ), enceta crítica semelhante Com ares de ficção científica, a fábulô de Bo//or/na apresenta uma sociedade ficti'cia, onde toda produção arti`stica deve passar pela aprovação "democrátTca" de um Comitê de Avaliação Arti`stica C|NEMA DE Bo¢ \.`ti e realização, mas sobretudo distribuição e recepção, {)` uhjetos de interesse têm proliferado nas mais diversas e li`ii`itadas regiões do Brasil e do mundo. Mesmo nas mais ii,i(lícionais estruturas institucionalizadas de produção au- (li()visual, uma certa reorganização de centros tem se pro- ( t``sado, com ``sangue novo" circulando por entre ``frestas" t. ``Íissuras''. Muito provavelmente esses centros legitima- (lti` estejam sofrendo deslocamentos, ainda que sutís, de i)i`das cujo epicentro escapa aos "radares de superfície". (`tim as ferramentas à mão, cabe ao pesquisador "de bor- (l.v," adaptar e aperfeiçoar métodos analíticos na tarefa de {`xirair a maior riqueza possível de veios promissores, al- Í!uns ainda mesmo inexplorados nesse vasto garimpo do `udiovisual mundial. 0 > W W Quem é Seu Manoelzinho? ciNEMADE8°¢o > U, W A visibilidade bruta nos filmes de Seu Manoelzinho Bernadette Lyra N(j universo do cinema de bordas coexistem muitos iiiiti` de realizadores. Alguns deles são autodidatas e tive- i.ii`` sua formação cinéfila ancorada em filmes de velhas iu.iiinês, nas salas de exibição de cidadezinhas do interior uii `ubúrbios, tendo começado a filmar quando aparece- i,wii as câmeras ligeiras, domésticas e economicamente inm accessíveis, em Super s ou VHS. A esses denomino "(lin()ssauros sagrados''. Não só porque são verdadeiros i)Ítineiros de um cinema periférico e esquecido pela histo- H()í;rafia cinematográfica oficial, mas também porque não `l)rigam pretensões intelectuais ao realizarem seus filmes t` nem pensam conscientemente o cinema como uma ex- iirc`ssão artística: contentam-se em criá-lo. Entre esses realizadores intuitivos, está Manoel Loreno, i``.`is conhecido como Seu Manoelzinho. Embora sem formação alguma acadêmica, a carreira (lL` Seu Manoelzinho não se separa de sua paixão pelo iiiundo da cinematografia. Paixão que teve origem quando i`le foi faxineiro no antigo Cine lmpério, em Mantenópolis, iidade situada a noroeste do Espírito Santo, onde mora o ri`alizador ainda hoje. Em recente entrevista, Seu Manoelzinho revela que na- quela época da vida assistia a filmes de ação e mistério, <`o lado de faroestes, aproveitando as frestas de horas, em i]leno trabalho, ou através de ingressos trocados pelo cargo de anunciador, carregando cartazes de filmes pelas ruas e i`squinas, para anunciar a programação. Mas eram as co- niédias que faziam, sobretudo, suas delícias de espectador.' \ Entrevista de Seu Manoelzinho a curadora Bernadette Lyra, em 19 de abrll de 2011, gravada no palco da sala do evento, por ocasião da 111 Mostra ltau Cultural de Cinema de Bordas, em São Paulo. oE BORDAS 3 € LL' Z u A assiduidade e constância dessa inusitada e furtiva tarefa espectatorial fez de Seu Manoelzinho um ávido co- lecionador de cenas e imagens que ele guardava em sua mente e que, tão logo pode ter acesso a uma velha câmera VHS, começou a reproduzir em seus filmes.2 E impossibilitado de escrever os próprios roteiros por conta de não ter sido alfabetizado, desde o início ele ad- quiriu o hábito de desenhá-los na areia, com marcações de cenas e posição de atores.` Como não dispusesse também de recursos para as filmagens, o realizador recrutava amigos, conhecidos e familiares, formando uma rede solidária de contribuições, atuações e participações que se manteve até que a inserção de seus trabalhos e de sua pessoa na mi'dia -via entrevistas a jornais e redes de televisão -deu início a uma outra postura por parte membros de sua comunidade interiorana.4 Mas, apesar dessa mudança, que expôs midiaticamen- te a figura de Seu Manoelzinho, o seu cinema, a sua atu- ação e a sua condição de trabalho não se modificaram. Os filmes mais atuais de Seu Manoelzinho continuam a manter as mesmas características rudimentares daqueles primeiros, atendendo a um público especi'fico e fiel que 2 No final dos anos 80, o realizador aproveitou uma câmera de vídeo e fez seu primeiro filme, A V/.nganço de Loreno (1989). Desde então, segundo ele próprio relata, não mais parou de filmar e já tem quase 50 títulos de sua autoria, o que não pode ser comprovado, uma vez que, dada as condições precárias de realização e armazenamer`to, muitos desses filmes se perderam. 3 Entre as lendas pessoais criadas pela comunidade em tomo do realizador, existe uma que diz que ele desenha seus roteiros sempre ao pé da mesma árvore e invariavelmente os apaga depois. 4 o assédio da mídia se dá a partir da proieção de filmes de Seu Manoelzinho em pequenas mostras regionais, logo estendidas para outras de caráter mais amplo, e sua consequente "descoberta" por programas de entrevistas como Ana Maria Braga e Jô Soares, ambos da Rede Globo de Televisão, além de matérias em iomais do Espi`rito Santo e outros do país. isso provocou uma reação naqueles seus atores e companheiros na produção de filmes, que passaram a fazer exigências de pagamento de serviços que, antes, eram realizados de modo colaboracional e gratuito. clNEM^ " „,,`` ni`ln vê os reflexos de seu habitat, de seu espaço regioncil r (lt` `eu próprio imaginário, filtrados por narrativas de en- ''t.'(.'limento. rtii dentro desse pacto com seu público que Seu Ma- oo{`17_inho se dedicou a refazer as histórias e as cenas que " dia ele próprio havia absorvido de filmes de gênero, itl.`i)tando-as aos costumes, hábitos e lendas de sua região. Assim, ele passou a filmar faroestes nas paisagens ru- i,`i` de Mantenópolis, tendo a si próprio como herói e i`i`ii` parentes e amigos como atores, imitando tudo que in iiiiha visto na tela e aproveitando, inclusive, os temas `t]iioros recheados de galopes de cavalo, assovios e gai- i,``, que reproduzia em fitas de um velho gravador. 0 i).``sado do noroeste do Espírito Santo, lugar envolvido tliiiitamente na disputa por fronteiras desse Estado com Minas Gerais, também favorecia os chamados "crimes de iii.`iido", as emboscadas e o uso de espingardas e outras .`Hnas de fogo, situações bastante propícias ao tema. É (Iesse jeito, á maneira das vivências de seu círculo co- iTium e das narrativas que circulam em sua cidade, que Seu Manoelzinho reproduz a atmosfera dos filmes de oeste americanos e italianos, em um arco temporal que va.i cle AVinsança de Loreno (1989) até 0 Homem sem Le'' (2006). Mas nem só de faroestes vive o cinema de Seu Manoel- zinho que realiza também incursões pelo cinema fantástico, como A Gr/.pe do Frar}go (2009), e que faz filmes de assom- braçõesreü\or\als,cornoLorenocontraoEspantalhoAssaçsi- no (1989). São filmes que tratam de fatos interioranos, c()iii() a repercussão de notícias que chegam do mundo atravc`s dos meios de comunicação ou a busca de pedras prL`cit]- sas e riquezas, em locas e cavernas precárias, cavcidas por garimpeiros improvisados, tendo muitas vezes, por coiise- 0 ZZ W €roEBORDAS3 Ê animada pelo movimento mecânico do aparelho, é já o U produto de um espetáculo que os homens se dão cotidía- namente a eles próprios" (Giraud, 2001 :147).6 De modo inconsciente, e por força da precariedade téc- nica e tecnológíca com que se configuram, os filmes de Seu Manoelzinho estão todos filiados a essa vertente da visibi- lidade. Neles, tudo se passa sem truques e sem outra me- diação que aquela da câmera mesma confrontada com os percalços da realidade do tempo/espaço e das necessidades alternatjvas em que as filmagens se produzem e se realjzam. Como nos primeiros filmes burlescos, diante da câ- mera que impassível e impjedosamente registra tudo que acede ao visível, o relato narrativo segue seu curso de en- cadeamentos de atos e ações necessários para contar uma história. Porém, de repente, esse encadeamento fictício e fabrjcado, que é o fator ilusório que permíte a lisibilidade de um filme, se vê confrontado com um ou outro detalhe de movimento que quebra a pretensa da trajetória de uma ação ou de um objeto qualquer. Acontece, então, o fenômeno que Hans Ulrich Gum- brecht chama de "produção de presença''. "Para nós, os fenômenos de presença surgem sempre como `efeitos de presença', porque estão necessariamente rodeados de, embrulhados em, e talvez até mediados por nuvens e almofadas de sentido. É muito difícil não `ler'..." (Gumbrecht, 2004:135). No entanto, a presença salta exatamente naquele mo- mento em que a tensão e a oscilação aparecem para equi- Iibrar a percepção absoluta e materialízada de algo e o sentido desse algo. 6 Todas as traduções são de responsabilidade da aiitora. C`'NI M^ ' '1 ,,', ' Na composição dos filmes de Seu Manoelzinho, cts`<` i)(`rcepção presencial se instala como um elemento ines- iit`rado, inequívoco e imprevisível que perturba o relato. A reação dos espectadores a tal perturbação é ime- (li[`ta, corporal e participativa. 0 público ri. Ri diante do tliismascaramento daquele artifício com que o cinema de tirigem realista costuma fazer passar a ficção pela realida- (li`. Ainda que o fenômeno seja involuntário por parte de um realizador como Seu Manoelzinho. É isso que ocorria com os filmes burlescos. É e o que tiiorre, ainda hoje, com os filmes periféricos de bordas de Seu Manoelzinho, em especial as comédias, como 0 R/.co /Jt)bre (2002 e 2009). A produção de presença, na comédia 0 Ri.co Pobre Seu Manoelzinho não esconde que é fã de Mazzaropi i` que se inspirou no cineasta paulista para fazer os filmes em que se sente mais á vontade, como diretor e ator. ``Me deu vontade de fazer as pessoas rirem" - diz ele.7 Nesse i`spírito é que em 2002, de posse de uma velha câmera VHS e contando com atores improvisados, ele filma 0 R/.co Pobre que descreve na sinopse como`` a história de um homem que ganha 10 milhões de reais na loteria, mas resolve queimar todos os seus pertences e esquece de tirar, do bolso do paletó, o bilhete premiado". Anos depois, em 2008, o filme ganha uma segunda versão, em digítal.B Em 0 R/.co Pobre, em especial na versão original, Seu Manoelzinho trabalha o tempo todo com a imprevisibili- ' Na entrevista já anteriormente citada. H A segunda versão de 0 R/co Pobre, em digital conta com assistência do realizador Ricardo Sá. 0 filme mantém a essência original da história, mas apresenta um avanço considerável em termos de organização da narr@ va e escolhas de sons e imagens. C) J, (,, LL' €roE LLl B0RDAS 3 dade daquilo que aparece djante da câmera. Desse jeíto, os personagens se movem para lá e para cá, dentro do quadro quase sempre jmperturbável e fixo da tela, sem que qualquer camuflagem de continuidade faça vínculo de suas ações. Por ser tão instintiva, precárja e diretamente colhida na realidade da paisagem humana e local, a construção ima- gética e sonora da narrativa, em 0 R/.co Pobre, dentro de sua vertente do registro mecânjco do movjmento, acaba por se transformar em lembrete e testemunha de que no cinema tudo não passa de um grande artifício, mesmo quando um filme quer se fazer passar por documentário fiel da realidade. Como tantos outros realizadores de bordas que filmam dentro de leis próprjas e rudimentares, Seu Manoelzinho opera dentro das linhas de força e de relacionamentos que conduzem a existência das criaturas, de seus feitos e dos fatos na própria Mantenópolis, sua cidade interiorana. Assim, em 0 R/.co Pobre, é em ritmo de vaivém de diá- logos que se repetem sem ter por quê, de sjtuações narra- tivas que não respeitam a ordem temporal e de nenhuma coerência filmica que o próprio realjzador encarna o antj- -herói atrapalhado que sintetiza o personagem-título. Este, na fita em VHS, é chamado ora de Manoel, ora de Bastião, resultando em uma mistura do Carlitos, de Chaplin, com o jeca, de Mazzaropi. Daí que munido de seu insepará- vel chapéu, aparentando trabalhar de sol a sol, como denun- cia a enxada que carrega no ombro, e mesmo lastimando a pobreza e a dureza da vida, Manoel (ou Bastião) não deixa de deitar-se para dormir em pleno serviço que lhe arranjam e nem de louvar as delícias de repousar sob a sombra. Na versão digital de 0 R/.co Pobre, novos detalhes, mais midiatizados e adaptados ao modelo caipira usual clN"^ 1 „ ",,í' `,\u iiitroduzidos nesta mesma cena: o personagem deit.`- `i. {iiii ' Tia rede e deixa o trabalho duro da capinagem do it`iit`iio para a mulher e a sogra enquanto ele ouve uma ii,w iida de futebol em um velho aparelho de rádio. () mesmo acontece com a sua residência que, no filme (1(' 2()()8, toma a forma de uma casa modesta do interior, in,`` que na primeira versão é mostrada como sendo uma li.wrt`ca coberta de palha, sem paredes, sustentada por pe- l,,\(,s de pau. Esse tipo de décor que esfarela o cenário realista é mui- 1() usual em filmes de Seu Manoelzinho, que se utiliza de t'.`iiÁrios descarnados e por vezes apenas sugeridos por al- wiiiis elementos, construi'dos em meio às tomadas da reali- (l,`(li` da paisagem em redor. É o que ocorre, por exemplo, em 0 Homem Serr} [ei., (iuhiido o realizador faz levantar em meio a um descampa- (li i .`t. fachadas referentes a uma cidade do velho oeste ame- rlt\.ino, que não passa de pranchas erguidas verticalmente ( t im letreiros alusivos ao bar, à delegacia, ao hotel etc.9 l.ambém a trilha sonora no filme de 2002 é construí- (1.` i)()r trechos de musicas usualmente escutadas antes das ht`Ss(-)es de cinema e tiradas de modo rudimentar de um wr`w.idor. Na verdade, são pedaços de um texto sonoro es- it.riit)tipadamente melodioso, tido como fundo ideal
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