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137 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Unidade III 7 O MUNDO PÓS‑CONTEMPORÂNEO E OS NOVOS DESAFIOS Finalmente, chegamos ao tema Transformações Históricas Contemporâneas. Essas transformações, que começaram a ser esboçadas por volta do século XII, vêm apresentando efeitos no mundo atual. Como diria Karl Marx (1980), a vida material determina a vida social e política do indivíduo, e as forças de produção de uma sociedade determinam a vida do indivíduo na sociedade. Por isso, concentramos esforços até aqui em nosso material para demonstrar como se desenvolveu o sistema capitalista, uma vez que ele criou condições fundamentais para a compreensão do mundo moderno. Analisamos as etapas do desenvolvimento capitalista iniciado com o chamado pré‑capitalismo, ou seja, a passagem do feudalismo para o capitalismo e a emergência da economia mercantil. Vimos o capitalismo comercial caracterizado pela acumulação de capital, que seria utilizado no capitalismo industrial, e por fim iremos analisar como o capitalismo financeiro ou monopolista se delineou em finais do século XX até nossos dias. Devido a esse sistema econômico, o mundo assistiu ao surgimento de outras bases sociais, representadas pela burguesia e pelo proletariado, e testemunhou guerras e conflitos, bem como o avanço tecnológico, a riqueza e a pobreza. O mundo continua o mesmo daquele que foi rascunhado no século XVIII, com ricos e pobres transformados hoje em dia em países ricos e países pobres. Anteriormente, vimos como a burguesia disputou o poder político a fim de diminuir o poder real (revoluções burguesas), como ela competiu por mercados externos (imperialismo), como os países europeus se hostilizaram (Primeira e Segunda Guerra Mundial) e como o mundo se tornou polarizado, obrigando os países mais dependentes a ficarem sujeitos às suas regras (Guerra Fria). O modo de vida das pessoas, seus hábitos e costumes foram influenciados pelos valores estabelecidos pela Nova Ordem Mundial, determinada, antes de tudo, pela economia industrializada. Os novos desafios do mundo contemporâneo estão situados nos resultados da política econômica empregada nos países: fome, desequilíbrios ambientais, falta de infraestrutura nas cidades, racismo e preconceito, epidemias, guerras, xenofobia etc., como será demonstrado adiante. 7.1 Internacionalização do capital: a passagem da sociedade nacional para a global Já no final da Segunda Guerra Mundial, a hegemonia americana veio acompanhada de uma mudança em seu padrão monetário, como forma de manter a fase do capitalismo financeiro ou monopolista. Os Estados Unidos, durante a Guerra Fria, tornaram o dólar uma moeda forte, por meio do Bretton Woods (1944), sistema monetário que convertia as moedas mundiais em dólar, que, por sua vez, era convertido 138 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III em ouro. Todas as moedas tinham o seu valor ligado ao dólar, e este representava determinada quantidade de ouro. Dessa forma, os americanos tomariam as rédeas da economia mundial, e seus aliados do bloco capitalista ficaram dependentes dessa variação da moeda. Outro fator importante foi a criação, pelos americanos, do Fundo Monetário Internacional (FMI), em 1944, e do Banco Mundial, que permitia aos países depositar determinadas quantias de dinheiro e retirar quando precisassem. O FMI passou a ajudar os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, tornando‑os dependentes dos empréstimos e endividados, pois deveriam pagar os juros do que foi emprestado. Muitos países que se originaram com a descolonização da Ásia e da África contaram com a ajuda norte‑americana, e com isso fortaleciam cada vez mais a hegemonia dos Estados Unidos. Com essa expansão do capital, cerca de 60% da riqueza mundial já se encontravam em poder dos Estados Unidos, o que provocou o desmoronamento do regime soviético e do bloco socialista. Os soviéticos tentaram, em vão, recuperar sua economia e manter sua influência entre seus aliados com algumas reformas políticas na década de 1970: a Perestroika e a Glasnost, efetivadas por Mikhail Gorbatchev. Os russos e aliados passavam por uma grave crise econômica, em parte causada pela falta de concorrência e produtos. Assim, Gorbatchev executou um plano de reestruturação econômica (Perestroika) e reformas e abertura políticas (Glasnost). Com o tempo, as repúblicas soviéticas tornaram‑se independentes. Muitos países do Leste Europeu, como a Hungria, a Polônia e a Tchecoslováquia, se emanciparam a partir da década de 1990. Em 9 de novembro de 1989, com a crise do sistema socialista, houve a queda do muro de Berlim, unificando a Alemanha, e a transformação da União Soviética. Russos e americanos fizeram acordos de desarmamento. Os Estados Unidos saíram vencedores da Guerra Fria e assumiram novamente sua hegemonia do ponto de vista econômico. A Era do Capital retorna com nova roupagem, agora de forma bastante internacionalizada. As relações econômicas e sociais se intensificaram em escala mundial. O mundo passou a se manter sob a lógica do sistema capitalista. O efeito global provocou o enfraquecimento do Estado‑nação, ou seja, aquela organização institucional, política e administrativa em que predominava soberania e autarquia do governante. Aqui, esse fenômeno se realiza de diversas formas, principalmente devido à transnacionalização da economia, que enfraquece o poder do Estado. É comum atribuirmos o surgimento do Estado‑nação a partir do século XV à formação do absolutismo na Europa e ao apoio da burguesia para garantir suas necessidades de comércio. O mercantilismo consolidou a aliança entre rei e burguesia, pois ela interessava a ambos e ocasionou muitas divergências entre o rei e a Igreja. Se antes, no século XIX, a experiência eurocêntrica do Estado‑nação se fortaleceu com o desenvolvimento do nacionalismo europeu no contexto linguístico, territorial, cultural, histórico e até religioso, agora, com a mundialização da economia, o Estado‑nação se debilitou. Curiosamente, os Estados nacionais se constituíram no âmbito da industrialização e da divisão do espaço geográfico para 139 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS protegerem seus mercados dos competidores, mas hoje em dia as fronteiras econômicas estão mais vulneráveis diante da soberania nacional. A ideologia dos Estados Nacionais se sustentou na identidade, no nacionalismo e no patriotismo como meio de solidificar o sentimento patriótico na população, muitas vezes para legitimar uma ideologia ou com a intenção de fortalecer a economia e a sociedade nacional. Isso ocorreu na monarquia de dom Pedro II, no Brasil. Com o final da Guerra Fria, as novas configurações territoriais e a descolonização desenvolveram um tipo de sociedade muitas vezes plurinacional, mas que em outras nem chegavam a se transformar em Estados. Em muitos casos, as categorias nacionais desenvolveram sociedades distintas umas das outras, em que se preservaram suas identidades culturais, embora estas estejam gradualmente desaparecendo com o processo de homogeneização mundial. Em termos de autoridade política, os Estados nacionais se caracterizavam pelo poder de coerção, que garantiria a soberania dos territórios nacionais. Porém, hoje em dia as relações internacionais transcendem o poder estatal, deixando‑o, muitas vezes, como atores coadjuvantes do sistema internacional, ou até mesmo vulneráveis a esse sistema, como ocorre nos países subdesenvolvidos. Dessa forma, os países desenvolvidos ditam as regras, e os subdesenvolvidos as seguem, devido à dependência econômica. Para cada Estado, existe uma sociedade, e hoje em dia ela fica subjugada às configurações do mundo global, isto é, à sociedade global. Preservadas as suas particularidades históricas, como bandeira,hino, língua e antepassados históricos, a sociedade nacional permanece, muitas vezes, com seus regionalismos e força original diante do mundo fragmentado e mundializado. Saiba mais Sobre o tema, leia a obra a seguir, especialmente o texto entre as páginas 53 e 72: IANNI, O. Teorias da globalização. 13. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. Leia também a seguinte publicação, com atenção maior ao trecho entre as páginas 11 e 22: SANTOS, M. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1997. 7.2 Globalização e mundialização O fenômeno da globalização iniciou‑se por volta da década de 1970 e intensificou‑se na década seguinte. Caracteriza‑se por um conjunto de transformações que ocorrem no âmbito econômico e no político. 140 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III Podemos conceber o significado de globalização de várias maneiras. Grosso modo, podemos defini‑la como uma etapa da internacionalização do capital. Isso ocorre de diversas formas: o produtor pode escolher onde comprar sua matéria‑prima, em geral onde ela é mais barata; pode instalar sua fábrica fora de seu país de origem (empresas multinacionais e transnacionais); e pode também vender sua mercadoria onde desejar. Segundo Octavio Ianni (2006, p. 15‑6), a globalização pode ser dividida em três estágios, que se iniciariam com a acumulação de capital (mercantilismo), com o processo industrial (capitalismo) e, atualmente, com o capitalismo planetário (comandado pelos Estados Unidos), caracterizado pela revolução tecnológica, pela expansão da comunicação de massa e pela ocidentalização do Oriente. A fábrica global, como muitos autores, inclusive Ianni, denominam um dos aspectos da globalização, refere‑se à integração entre capital, mercado e forças produtivas, dando uma dimensão diferenciada à divisão internacional do trabalho de acordo com a reprodução do capital. Já a aldeia global relaciona‑se com a integração dos mercados pelas grandes corporações internacionais. A revolução tecnológica facilita a integração, isto é, países mais avançados tecnologicamente têm mais chances de produzir mais e distribuir sua mercadoria com maior rapidez do que os países menos desenvolvidos (IANNI, 2006, p. 53‑72). Há que se diferenciar as empresas multinacionais das transacionais. A primeira caracteriza‑se por empresas que mantêm filiais em todo o mundo, sendo dirigidas por uma matriz com sede no seu país de origem. Já as empresas transnacionais seguem um modelo independente da matriz, isto é, as filiais situadas em outros países, apesar de se originarem da marca matriz, não seguem os ditames desta, de onde se originaram. Hoje em dia, as transnacionais caracterizam o mundo globalizado por terem certa autonomia nas decisões que envolvem a mobilidade do capital industrial. Para Manuel Castells (2000), a informatização, a automação e o desenvolvimento das telecomunicações são fatores primordiais para explicar a globalização. De acordo com o autor, a revolução tecnológica transformou radicalmente a configuração dos processos produtivos, assim como as novas formas de se conceber e integrar a sociedade em rede. Para ele (CASTELLS, 2000, p. 19‑21), a realidade social da “sociedade em rede” é configurada pelas fontes de informações que dessa forma transformam as relações pessoais e de trabalho. O acesso aos meios de comunicação de massa possibilitou ao indivíduo receber a informação em tempo real, com mais rapidez, massificando atitudes e hábitos. Os meios de comunicação de massa desempenham o papel de estimular o indivíduo ao consumo, já que a produção de mercadorias se desenvolve rapidamente. Na sociedade antiga e medieval, predominavam hábitos mais simples e comunitários. Já a sociedade moderna é citadina, e o aumento populacional nas cidades (onde se localizavam as fábricas) as transformou em um meio massificado. Com isso, as relações sociais também se massificaram: surgiram os partidos, os clubes, as associações, os sindicatos, dentre outros. No aspecto econômico, uma das características da sociedade moderna está no fato de que as pessoas são cada vez mais especializadas e aperfeiçoadas. A técnica domina, resultando em uma produção em larga escala. Na sociedade moderna, surge também a especialização nos papéis sociais, bem como as relações contratuais; já no campo político, surge a democracia. 141 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Como característica essencial, a sociedade de massa dispõe de grandes organizações sociais que dominam e alienam o indivíduo. A conversão da cultura em mercadoria, a chamada indústria cultural, também atua como sistema de subordinação do indivíduo: ela se utiliza das tecnologias comunicacionais e de informação, tais como a televisão, a internet etc. como meio para orientar o consumo dos bens culturais – por exemplo, a moda e o lazer. Como resultado, os meios de comunicação de massa se transformam em uma estratégia para difundir ideologias, principalmente a do consumo, ficando à mercê da indústria cultural, das organizações comunicacionais, bem como das novas tecnologias. Novos registros linguísticos surgiram com a comunicação mediada da internet, bem como um novo tipo de escrita falada e um modo de escrever oralizado. Novas maneiras de se expressar com o “outro”, através de diálogos e multidiálogos, caracterizam o mundo na sua globalidade. Características gerais do mundo globalizado: • Hegemonia do capital financeiro. • Desterritorialização e redimensionamento dos espaços e do tempo. • Universalidade. • Multinacional x transnacional. • Comunidades transnacionais de consumidores. • Fábrica global: expansão das relações capitalistas, reprodução do capital em escala mundial, relações interpessoais. • A economia nacional torna‑se província da economia global. • Pluralismo descentralizado, diversidade. • Centralidade x descentralização. • Padronização x segmentação. • Na economia: grandes fusões. • Fragmentação. • Homogeneização. • Tecnificação das relações sociais. 142 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III • Cidadãos do mundo. • Tecnologias da inteligência: conhecimento por simulação. • Difusão dos meios de comunicação de massa. • Predominância de simulacro, falsidade e imaginário. • Convivência entre cultura erudita, cultura popular e massificação. • Cultura internacional popular: memória coletiva feita com fragmentos de diferentes nações. • Aldeia global: a globalização invade espaços, integração do planeta a partir dos meios de comunicação. • Comunidade localizada espacialmente. • Máxima: pensar global, agir local. • Identidade cultural regional mais tradicional. • Manutenção das identidades regionais em um mercado global. • Interligação das regiões do mundo realizada por satélite e telefonia. O termo mundialização se relaciona com as atividades econômicas vinculadas à extensão geográfica, bem como globalização, que está mais relacionada com as estratégias de mercado. Porém, a universalidade garantida pelo poder econômico também se reflete na cultura, como mencionado anteriormente. A mundialização promove interações das culturas, consolidadas por meio da sociedade‑mundo. A identidade cultural na pós‑modernidade é caracterizada por uma identidade híbrida que vive sob o signo da mundialização, principalmente da cultura. Na sociedade pós‑moderna, sobrevive o indivíduo que tende a assumir várias identidades em ambientes distintos e culturalmente diversos. Segundo Renato Ortiz (1994b, p. 165), a mundialização diz respeito às identidades sociais que estão vinculadas à cultura nacional e regional, “moldadas pelas indústrias culturais globalizadas”. Observação A indústria cultural, ao difundir símbolos a todo o momento, transforma‑os em mercadoria, que é absorvida pelas identidades, transformando‑asem híbridas. 143 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS O ser humano que vive nas grandes cidades é absorvido pela grande quantidade de símbolos reforçados pelas culturas nacionais, que constroem sentidos a fim de serem enfatizados na memória, no patrimônio cultural e no passado histórico de uma nação, reforçando assim a nacionalidade. Influenciado pelos símbolos da indústria cultural, o homem da pós‑modernidade também busca a valorização da identidade regional, tentando conciliá‑la com os valores da globalização. O problema está no fato de ele não ter isso muito nítido: sente‑se um cidadão global com necessidades locais. Envolvido nos símbolos culturais veiculados pelas mídias e nas referências do passado, esse ser fica dividido em relação à sua identidade cultural e vive um conflito devido à sua identidade fragmentada, buscando valores do passado e vivendo em um mundo global. A identidade cultural de um povo caracteriza‑se por um contínuo ininterrupto de símbolos e significados comuns ao grupo social, absorvidos no passado histórico, mas que são constantemente afetados pelos novos modelos adquiridos no mundo globalizado. Além disso, há uma verdadeira gama de identidades culturais na pós‑modernidade, tornando conflituosos o global e o local, uma vez que não é possível absorver todas as influências externas e a variedade de elementos culturais, o que torna as identidades menos fixas. Entretanto, é possível que, na contemporaneidade, o ser humano seja o verdadeiro agente das mudanças que propõe, não se fixando a paradigmas nem vivenciando realidades que coloquem sua identidade cultural em situação de risco, como sugerem alguns teóricos. Renato Ortiz observa que, na concepção do mapa cultural de uma sociedade, ou seja, do espaço ocupado por unidades distintas, dinamizadas pelo movimento de cada uma dessas partes, ocorrem adaptações, já que elas apresentam certa dinamização. A mundialização promove a desterritorialização dos personagens ícones dos seus lugares de origem, como o autor cita. A Madonna não é mais americana, é cidadã do mundo, ela está em todas as partes do globo. Com o processo de mundialização, no início do século XX, e o desenvolvimento da produção em escala industrial, aspectos da cultura local se adaptaram aos produtos importados e desenvolveram traços culturais próprios, como podemos observar na culinária, por exemplo: não podemos encontrar a “italianidade” nas pizzas Hut ou a “americanização” nos alimentos do McDonald’s (ORTIZ, 1994b) A comida representa simbolicamente os modos dominantes de uma sociedade: os hábitos alimentares se moldam no espaço e podem ser incorporados de outras regiões ou desenvolvidos no seio da tradição local, já que, segundo Ortiz, a cultura é forjada a partir do choque ou da assimilação cultural de outras localidades, do território, da nação, da cidade ou do bairro. No mundo atual, a cultura em consonância com o capitalismo mundial e com a globalização passeia pelas contradições e complexidades regionais particularizadas segundo o território e a sua história. Do ponto de vista dos mercados mundiais mais hegemônicos, podemos perceber que, no mundo global, alguns países têm uma predominância cultural sobre os outros, isto é, uma cultura que é exportada e deve ser admirada ou adotada por todos. 144 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III Nos Estados Unidos, por exemplo, a exclusividade linguística e os valores culturais são valorizados como algo muitas vezes excepcional. A indústria cultural americana é representada pelo cinema, pela música, pela americanização dos alimentos – como o McDonald’s –, dentre outras manifestações cujos símbolos são disseminados e consumidos pelo mundo, colocando o indivíduo em um status social. A mundialização nos trouxe a percepção de que não somos apenas cidadãos locais, mas também pertencemos ao mundo. Nós consumimos e temos hábitos mundiais, e muitas informações nos chegam em tempo real. Ao mesmo tempo, a globalização auxiliou, por meio dos mecanismos informacionais, o contato com pessoas do mundo inteiro, e como consequência há o contato cultural com nações e nacionalidades, antes não ocorrido. As redes sociais são um exemplo disso: por meio delas, podemos nos conectar com os cidadãos do mundo. Saiba mais Leia a obra a seguir: CASTELLS, M. A galáxia da internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Zahar 2003. 7.3 Neoliberalismo: o velho no novo, Estados liberais, empresas transnacionais O neoliberalismo, tal como conhecemos hoje, é um fenômeno que surgiu por volta de 1970, através da Escola Monetarista de Chicago, de Milton Friedman, como estratégia para solucionar a crise capitalista causada pelo aumento do petróleo. Antes, já havia ocorrido uma manifestação do inglês Friedrich Hayek, que havia escrito em seu livro O Caminho da Servidão, de 1944, sobre o quanto o Estado, previdenciário, paternalista e dedicado ao bem‑estar social, atrapalhava a concorrência e o desenvolvimento econômico. O escopo do pensamento neoliberal nos remete às ideias do pensamento liberal e do conservador do século XIX, em que os pensadores franceses e ingleses defendiam o “laissez‑faire, laissez aller, laissez passer”, ou “deixe fazer, deixe ir, deixe passar”, máxima que representava o livre‑comércio ou livre‑mercado sem interferência estatal. Posteriormente, a doutrina neoliberal ressurgiu fortalecida pelas ideias de Hayek para solucionar as altas taxas de inflação e o baixo nível de crescimento econômico. Assim, formou‑se um ideário que fortalecia as grandes potências econômicas, minimizando o poder e a interferência do Estado na economia (Estado Mínimo). A doutrina neoliberal era contrária às ideias do programa do New Deal, propostas pelo presidente norte‑americano Roosevelt, inspirado em John Keynes. Devido à crise capitalista de 1929, o Estado interferiu enfaticamente na economia a fim de solucionar a crise. Aqui, o liberalismo clássico perdeu seu valor (HOLANDA, 2001). 145 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS O neoliberalismo é uma releitura do liberalismo econômico, surgido no século XVIII com o fim do mercantilismo. A autonomia dos negócios da burguesia foi defendida pelos teóricos François Quesnay e Adam Smith, que em seu livro A Riqueza das Nações defendia que as atividades industriais e comerciais deveriam desfrutar de liberdade para crescer, sem a intervenção do Estado, além da livre‑concorrência. Assim, toda a sociedade se beneficiaria. As características neoliberais são efeitos da globalização e estão relacionadas à intervenção mínima do Estado nos assuntos econômicos, que deverá atuar na manutenção da lei e da ordem, executando políticas de desburocratização que facilitem o funcionamento das atividades econômicas. Sem a intervenção estatal, o mercado se reorganiza por si só. Sem o poder estatal, o indivíduo adquire maior poder para desenvolver seus negócios. Dessa forma, pode‑se atribuir ao neoliberalismo certa característica individualista, e a ação do Estado na ajuda aos mais necessitados e os gastos sociais ficam em segundo plano para privilegiar méritos individuais. Os neoliberais acreditam que a desigualdade social seja benéfica para regular o mercado. Segundo essa doutrina, o Estado deve ser forte apenas para controlar as privatizações das empresas estatais, já que a base da economia deve ser formada por empresas privadas. O Estado deve, ainda, diminuir sua função social, controlando os sindicatos, bem como minimizando a assistência social e investimentos nos setores de saúde, que geram muitos gastos. Estes deveriam ser utilizados para socorrer empresas com desequilíbrios financeiros (SANTOS, 2000). Como ênfase na globalização, o neoliberalismo tornou‑seum meio de os países mais ricos se imporem aos mais pobres, pois estes últimos continuavam a ser dependentes e tornavam‑se facilmente endividados. Muitos dos países subdesenvolvidos abriram suas portas para a entrada de empresas multinacionais, que, para gerar emprego, não pagavam impostos ao Estado. Além disso, as políticas sociais ficaram em segundo plano, provando que os modelos neoliberais não são compatíveis com muitos dos países latino‑americanos, africanos e asiáticos. Os defensores do neoliberalismo creem que esse modelo promova o desenvolvimento econômico e, por conseguinte, o social, tornando a sociedade mais competitiva e proporcionando o desenvolvimento tecnológico. Os críticos do neoliberalismo argumentam que esse modelo econômico privilegia apenas empresas multinacionais, aumenta o desemprego, diminui salários e agrava a desigualdade social. Os grandes governos neoliberais foram os de Margaret Thatcher (Reino Unido), Helmut Kohl (Alemanha) e Ronald Reagan, George Bush e George W. Bush (Estados Unidos). No Chile, o ditador Augusto Pinochet desenvolveu o neoliberalismo depois que Milton Friedman foi para o pais, em 1970, e alguns de seus alunos chilenos da Universidade de Chicago ganharam cargos de poder no governo do ditador. No Brasil, os governos neoliberais foram de Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso. As empresas transnacionais que desenvolvem atividades em mais de dois países são favorecidas com o aparato neoliberal, pois funcionam com maior autonomia. Em geral, elas são instaladas em países que estão se desenvolvendo e estabelecem critérios para isso, como empregar mão de obra barata e com determinado grau de escolaridade em locais onde exista infraestrutura adequada, principalmente em 146 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III terrenos que são ofertados com baixos impostos ou isenção deles. Uma parte dos lucros é destinada para novas instalações ou até mesmo para projetos sociais e ambientais, e a outra parte vai para suas matrizes. O lucro dessas empresas é enorme, pois estão protegidas pelo aparato tecnológico e pelo volume não só das vendas globais, mas também das regionais. Elas subsistem devido aos custos operacionais serem mais baixos, assim como os salários. Entretanto, um dos benefícios dessas empresas relaciona‑se com a exploração dos recursos naturais autorizada pelo Estado. Com tecnologia de ponta, as empresas transnacionais impedem que empresas menores entrem no mercado no qual estão situadas. Recentemente, no Brasil, presenciamos uma grande destruição ambiental ocasionada pelo rompimento de uma barragem de rejeitos de mineração da multinacional Samarco, empresa mineradora controlada pela anglo‑australiana BHP Billiton, fundada em 1977 em uma joint venture com a Companhia Vale do Rio Doce, anteriormente estatal. Uma vez instaladas em outro território, essas empresas têm proteção do Estado, que disponibiliza recursos e regulamentação para que maximizem seus lucros. Muitas dessas empresas não têm transparência e atuam de forma ilícita, fazendo que o Estado lhes dê concessões para exercer o controle dos bens de produção. Lembrete O capitalismo neoliberal danificou as bases da democracia liberal representativa, pois nesse sistema o Estado e a sociedade civil se submetem à economia de mercado. O século XX, quando o neoliberalismo se formou, minou as conquistas democráticas do século XIX. 7.4 O capitalismo liberal: Consenso de Washington De perfil neoliberal, o encontro que aconteceu em 1989 nos Estados Unidos, chamado de Consenso de Washington pelo economista John Williamson, teve como finalidade a ampliação do neoliberalismo na América Latina. Convocado pelo Institute for International Economics, o encontro, notadamente neoliberal e aceito por todos os países, com exceção de Peru e Brasil, tinha como premissa o desenvolvimento dos países latino‑americanos, com apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, para realizar empréstimos. O FMI e o Banco Mundial, criados em 1944 na Conferência de Bretton Woods, tinham a intenção de tutelar o sistema monetário internacional, auxiliando os governos na reconstrução pós‑guerra. As duas instituições se tornaram fundamentais nas décadas de 1970 e 1980 para fazer o neoliberalismo avançar pelo mundo. A ajuda a esses países viria se o Estado cortasse gastos públicos, reduzindo custos com funcionários, eliminasse suas dívidas e principalmente realizasse uma reforma fiscal e tributária, com a intenção de desonerar as empresas privadas dos impostos. Para reduzir custos, o Estado deveria privatizar empresas 147 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS estatais, que gastavam muito com a folha de pagamento. Isso daria uma brecha para as empresas privadas diminuírem salários como bem conviesse. A parte fundamental para o sucesso do desenvolvimento dos países latino‑americanos, de acordo com o Consenso, seria a abertura econômica desses países para investimentos estrangeiros, liberando o comércio exterior e a diminuição do protecionismo alfandegário. A maioria dos países latinos estava endividada e acatou as normas do acordo. Outros não tiveram opção, pois desejavam incrementar sua economia. A maior parte sofreu pressão do governo americano, que oferecia saídas através do Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bird). O Brasil não aceitou de imediato as medidas, mas aplicou‑as em grande escala na década de 1990. O Consenso de Washington foi amplamente defendido no governo Reagan, por meio da ajuda das agências internacionais, e vigorosamente apoiado pelas elites políticas e intelectuais, que viam o acordo como sinal de modernidade. Porém, no Brasil: Os princípios neoliberais consolidados no Consenso de Washington batem de frente com alguns dos pressupostos do modelo de desenvolvimento brasileiro e da política econômica externa que lhe dava apoio, em particular com a liberdade de ação que o Brasil desejava manter para prosseguir em seu processo de industrialização, mediante reserva de mercado para indústrias de capital nacional no campo da informática, assim como pela exclusão do patenteamento na área químico‑farmacêutica. O Brasil tampouco se dispunha a aceitar restrições ao pleno desenvolvimento tecnológico no setor nuclear e aeroespacial. Golpeado pela crise da dívida externa e pela forma como esta foi tratada, o Brasil, graças a sua base industrial e ao esforço feito pela Petrobras para aumentar substancialmente a produção nacional de petróleo, conseguiria acumular substanciais saldos de balanço comercial, criando condições para honrar o serviço daquela dívida. Em consequência, só lograria fazê‑lo à custa do equilíbrio das contas públicas. Sucessivas cartas de intenção ao FMI foram assinadas sem que o país pudesse cumprir as metas acordadas em matéria fiscal e monetária. Para dominar a inflação resultante desse descontrole, gerado em sua maior parte pelo serviço da dívida externa e interna, sucessivos planos, heterodoxos e ortodoxos, foram tentados sem êxito, produzindo um sentimento generalizado de frustração que abalaria a confiança na ação do Estado (BATISTA, 1994, p. 27). O acordo demonstrava uma nítida visão economicista dos problemas sociais que impreterivelmente levariam não só a problemas nessa área, mas também à miséria, já que as massas populares ficariam desprotegidas pelo Estado e pelas políticas públicas: O Consenso de Washington não tratou tampouco de questões sociais como educação, saúde, distribuição da renda e eliminação da pobreza. Não porque as veja como questões a serem objeto de ação numa segunda etapa. 148 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III As reformas sociais, tal qual as políticas, seriam vistas como decorrência natural da liberalização econômica, isto é, deverãoemergir exclusivamente do livre jogo das forças da oferta e da procura num mercado inteiramente autorregulável, sem qualquer rigidez no que se refere tanto a bens quanto ao trabalho. Um mercado, enfim, cuja plena instituição constituiria o objetivo único das reformas (BATISTA, 1994, p. 11). A proposta de abertura econômica não considerava as diferenças econômicas e do desenvolvimento existentes em cada país: as medidas eram homogêneas para países heterogêneos. Além disso, o Estado poderia entrar em falência a qualquer instante em decorrência da gestão dos organismos internacionais. Podemos observar com o Consenso de Washington a nítida imposição da hegemonia norte‑americana, novamente, diante da América Latina. Saiba mais Leia o documento na íntegra: BATISTA, P. N. Consenso de Washington: a visão neoliberal dos problemas latino‑americanos. São Paulo: FAU‑USP, 1994. Disponível em: <http://www. usp.br/fau/cursos/graduacao/arq_urbanismo/disciplinas/aup0270/4dossie/ nogueira94/nog94‑cons‑washn.pdf>. Acesso em: 5 maio 2016. 7.4.1 Wall Street A história de Wall Street – rua da região de Manhattan, em Nova York, lugar onde estão concentrados os maiores bancos e bolsas de valores dos Estados Unidos – remonta ao processo de colonização daquela região, disputada por holandeses (Nova York foi a antiga Nova Amsterdã), indígenas e britânicos. Esse famoso distrito financeiro norte‑americano foi palco de grandes disputas desde 1640, quando os holandeses, que fundaram Nova Amsterdã, construíram uma muralha a fim de barrar os ataques das populações indígenas. A partir de 1664, os ingleses invadiram Nova Amsterdã e expulsaram os holandeses, fundando Nova York. Já naquela época, a região era encontro de vários comerciantes e pessoas que negociavam mercadorias. A partir de 1792, 24 acionistas negociaram regras e taxas com a Bolsa de Nova York, o chamado Tratado de Buttonwood (árvore local), transformando a rua em um local de extrema especulação. A muralha foi destruída em 1699. Nessa rua, os americanos experimentaram, em 1929, a ruína, com a quebra da Bolsa de Nova York e a desestruturação da bolsa americana. Após a Segunda Guerra, Wall Street recuperou seu status nos negócios. É fato que o especulador é rotulado como o indivíduo que “compra na baixa e vende na alta” e que ele sempre é bem‑sucedido nos negócios, porém os mercados capitalistas são oscilantes e dependem das flutuações, dos acontecimentos mundiais e da dinâmica social que envolve guerras, governos depostos, políticas governamentais e também os riscos existentes no mercado. 149 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS O especulador depende do aumento dos preços; estes atraem investidores e intensificam a especulação. Os mercados reagem, e uma bolha especulativa é criada, isto é, o valor real de um produto é diferente do preço que o investidor deseja pagar por ele. Isso forma uma bolha. Esse comportamento está ligado à dinâmica do sistema financeiro e relaciona‑se aos ativos supervalorizados. Na década de 1990, a crise dos países periféricos provocou uma fuga de capitais para os Estados Unidos, provocando uma explosão acionária em Wall Street com um ciclo de fusões entre os grandes bancos, que se tornaram megainstituições. Isso favorecia a especulação e os recém‑enriquecidos yuppies, os novos hippies, que ganhavam dinheiro jogando na Bolsa de Valores. Como parte constitutiva do sistema capitalista, a especulação imobiliária e financeira é criada a partir de uma euforia financeira: o lucro do especulador advém do prejuízo de alguém. Muitas fraudes foram cometidas em Wall Street. Algumas foram devidamente retratadas pelo cinema americano, como é o caso do especulador Jordan Belfort, considerado gênio do mercado financeiro, que dirigiu a empresa Stratton Oakmont e praticava fraudes de seguro e, principalmente, corrupção. Essa história foi contada no filme de Martin Scorsese O Lobo de Wall Street. Cinco filmes inspirados em Wall Street A Grande Aposta (2015). Título original: The Big Short. Diretor: Adam McKay. O filme conta a história de quatro personagens que decidiram apostar para ganhar com a bolha no mercado imobiliário. Antecipavam que os títulos de dívida garantidos por estas hipotecas de alto risco iriam afundar. E acertaram. O sub‑prime provocou a maior crise financeira desde a Grande Depressão. O Lobo de Wall Street (2013). Título original: The Wolf of Wall Street. Diretor: Martin Scorsese. O conhecido filme de Martin Scorsese é inspirado na história de Jordan Belford. Leonardo Di Caprio interpreta o papel do ambicioso corretor, relatando a sua ascensão, os seus excessos, esquemas e a queda no mundo louco de Wall Street. Grande Demais para Quebrar (2011). Título original: Too Big to Fail. Diretor: Curtis Hanson. Do pedido de ajuda do Lehman Brothers, a Warren Buffett, até à intervenção de Washington, o filme Too Big To Fail conta a história do colapso do banco que era “demasiado grande para cair” e da crise financeira de 2008, centrado no ponto de vista do secretário do Tesouro norte‑americano Henry Paulson. Wall Street: o Dinheiro Nunca Dorme (2010). Título original: Wall Street: Money Never Sleeps. Diretor: Oliver Stone. A sequência do filme Wall Street conta a história de Gordon Geeko, já reformado, depois de ter cumprido pena de prisão, por fraude e abuso de informação privilegiada. Geeko procura reconciliar‑se com a filha, com o apoio do genro. Passaram‑se 20 anos depois do primeiro filme, com a crise de 2008 como cenário. Wall Street (1987). Título original: Wall Street. Diretor: Oliver Stone. No clássico Wall Street, Oliver Stone procurou retratar o setor financeiro na década de 1980. Buddy Fox, 150 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III interpretado por Charlie Sheen, é um ambicioso jovem corretor na bolsa, que se envolve com o especulador milionário Gordon Gekko (protagonizado por Michael Douglas), aproveitando informações privilegiadas para alcançar o sucesso e estilo de vida que desejava. Fonte: Cinco... (2016). 7.4.2 A Inglaterra de Margaret Thatcher Margaret Thatcher foi o ícone do neoliberalismo inglês. Em 1950, especializou‑se em direito tributário; em 1959, foi eleita para a Câmara dos Comuns; posteriormente, tornou‑se secretária de Estado para Assuntos Sociais. Nas eleições de 1979, tornou‑se a única mulher a ser eleita primeira‑ministra no Reino Unido e na Europa. Ela foi reeleita por três mandatos seguidos. Thatcher era chamada de “A Dama de Ferro”, pois governou o Reino Unido com bastante autoridade, rigidez e personalidade. As características de seu governo estavam em consonância com a doutrina neoliberal que predominava no mundo na década de 1970. Ela conseguiu bons indicadores econômicos, valorizando a libra e controlando a inflação. Porém, isso aumentou o desemprego, o que causou grande descontentamento e reação da população. Externamente, Thatcher se envolveu, em 1982, na Guerra das Malvinas, o que favoreceu a sua popularidade. Apoiou o apartheid na África do Sul e o regime do ditador chileno Augusto Pinochet. A Guerra das Malvinas foi um conflito militar entre Reino Unido e Argentina que se deu em 1982, no qual os argentinos invadiram as Ilhas Malvinas, situadas a 464 km da costa argentina. Ocorre que os britânicos colonizaram o arquipélago em 1982, chamado pelos ingleses de Ilhas Falklands. A invasão argentina se deveu ao fato de os argentinos reivindicarem para si o direito sobre as ilhas, que anteriormente pertenciam à Espanha. A questão política por trás da invasão situava‑se no fato de que o ditador argentino Galtieri teve a intenção de aumentar sua popularidade provocando o patriotismo nos argentinos. Thatcher, que também apresentava baixa popularidade, investiu pesadamente no combate, provando a superioridade militar inglesa sobre os argentinos. Com a vitória dos ingleses,os argentinos suspenderam as relações diplomáticas com o governo inglês, reatando apenas em 1990. Outra questão enfrentada por Thatcher foi a questão do apartheid praticado na África do Sul. Em 1910, a África do Sul tornou‑se possessão britânica como parte do neocolonialismo europeu. Em 1912, foi formado o Congresso Nacional Africano (CNA), liderado por Nelson Mandela, em oposição ao domínio inglês. Nelson Mandela, chefe da tribo Thembu, da etnia xhosa, foi preparado para assumir a liderança contra o regime do apartheid, oficializado em 1948, que era um regime de segregação racial no qual os negros nativos tinham pouquíssimos benefícios em relação aos brancos colonizadores, vivendo em zonas residenciais determinadas, e que não permitia que houvesse casamentos inter‑raciais. O Banco da Inglaterra custeava esse regime de segregação. Por desobedecer às leis do apartheid, Mandela foi preso em 1952. 151 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Segundo consta, a premiê britânica não aplicaria sanções econômicas à África do Sul e ao governo de Pieter Botha, que atuou de forma sangrenta na contenção dos protestos, desde que libertasse Mandela, pois os ingleses tinham interesses financeiros naquele país, assim como outras nações. Depois de muitos protestos, Mandela foi solto em 1989 após a queda de Botha. O governo chileno de Augusto Pinochet teve Thatcher como uma das suas principais aliadas, juntamente com Ronald Reagan (presidente dos Estados Unidos), Henry Kissinger (secretário de Estado norte‑americano) e Milton Friedman (pensador neoliberal). Em 1982, Pinochet apoiou a Inglaterra na Guerra das Malvinas em detrimento de seus vizinhos latino‑americanos. Em troca, obteria apoio no processo de execução do neoliberalismo em seu país, o que provaria o antagonismo de seu governo, que perseguia e torturava opositores. A desregulamentação da economia, as privatizações, o corte dos benefícios sociais, a contração do poder dos sindicatos e a diminuição do papel do Estado foram amplamente praticados no governo Thatcher na década de 1980. Juntamente com Ronald Reagan, presidente norte‑americano, Thatcher foi opositora do regime soviético, apoiando as reformas políticas de Mikhail Gorbatchev, o que culminou na queda do regime comunista. Com sua liderança forte, ela não conseguiu impedir as greves dos trabalhadores, uma vez que o Reino Unido passava nos finais da década de 1970 por uma crise inflacionária, alta taxa de desemprego e aumento dos impostos. Além disso, o mundo passava por um forte aumento do preço do petróleo. Para isso, Thatcher privatizou empresas, estabilizou a economia e controlou os sindicatos, aumentando sua popularidade, principalmente no segundo mandato. Como os sindicatos ingleses eram muito fortes, Thatcher se desgastou com a tentativa de minar o poder deles. A greve dos mineiros da região de Yorkshire, em 1984, provocou um grande impacto no governo da primeira‑ministra, já que se havia cogitado o fechamento daquelas minas de carvão. A greve durou um ano. Margaret Thatcher se recusou a aceitar a inclusão do Reino Unido à Zona do Euro, provocando uma racha com o Partido Conservador. Em 1990, ela renunciou ao cargo e se retirou da vida pública em 2002. Saiba mais Assista ao filme: A DAMA de Ferro. Dir. Phyllida Lloyd. Reino Unido: Pathé, 2012. 104 minutos. 7.4.3 Os Tigres Asiáticos Os países do Leste Asiático – Taiwan (Formosa), Coreia do Sul, Cingapura e Hong Kong – utilizaram, na década de 1980, o modelo neoliberal em seus países. Embora esses países não formassem um bloco econômico institucionalizado, eles mantinham a dinâmica grupal para facilitar o livre‑comércio. São os chamados Tigres Asiáticos, nome inspirado no tigre ou dragão lendário. 152 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III Com a queda do comunismo e a abertura comercial dos países socialistas, esses países tiveram um grande crescimento econômico ao aplicar estratégias para atrair multinacionais através de isenções de impostos e incentivos fiscais, permitindo que elas investissem em seus países. Para isso, eles disponibilizavam mão de obra barata, o que interessava às grandes empresas que buscavam baratear custos. O Japão foi um país que também se valeu da captação dos recursos externos para incentivar sua produção interna, que ficou muito debilitada com o Pós‑Guerra. Esse país se utilizou justamente do capital americano para incrementar sua economia, investindo massivamente na educação e na infraestrutura, principalmente a de transportes, para impulsionar a economia local. A economia neoliberal trouxe tanto benefícios quanto problemas. O aspecto negativo encontrado nesse modelo de desenvolvimento é que os países ficam dependentes dos mercados externos. Para isso, muitas dessas nações elevaram suas tarifas das mercadorias internas, com a intenção de aumentar o excedente para exportação. Esses países consomem menos de seus produtos para que eles possam ser exportados em grande quantidade. O modelo adotado pelos Tigres Asiáticos foi o modelo industrial voltado para o mercado externo, aproveitando o capital recebido dos Estados Unidos para criarem uma poupança que foi investida nos setores de ponta, a fim de desenvolverem infraestrutura básica, como transporte, educação, energia e qualificação em mão de obra. Eles estão entre os maiores exportadores de bicicletas, relógios, eletrônicos, tênis, brinquedos, cosméticos, máquinas industriais etc. (VIZENTINI; RODRIGUES, 2000). Atualmente, podemos perceber que as empresas capitalistas que migraram para esses países asiáticos se transformaram em conglomerados controlados por grandes famílias, como as empresas sul‑coreanas Hyundai, LG, Daewoo e Samsung. Em 1997, após o colapso da Daewoo, foram reveladas algumas fragilidades da economia sul‑coreana, que passou por reformas governamentais, incluindo auxílio às pessoas que estavam endividadas no comércio interno, o que demonstra alguns paradoxos do modelo neoliberal. No caso de Hong Kong, a 30ª economia mundial e o 11º maior centro bancário do mundo, o país possui uma economia menos restrita, com uma política mais voltada para a estabilidade da moeda e para o mercado externo. Taiwan é outro país que tem um crescimento do PIB, a 4% ao ano, demonstrando que, apesar da crise internacional, ainda tem um bom desempenho nesse modelo. Saiba mais Leia as obras a seguir: FERREIRA, E. A. C. O mundo contemporâneo: as grandes mudanças geopolíticas e econômicas ocorridas após a Segunda Guerra Mundial. São Paulo: Núcleo, 1993. VIZENTINI, P. F.; RODRIGUES, G. O Dragão Chinês e os Tigres Asiáticos. Porto Alegre: Novo Século, 2000. 153 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS 8 RELAÇÕES INTERNACIONAIS E GEOPOLÍTICAS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo passou por grandes transformações sociais, políticas e econômicas que configuraram um novo cenário político internacional de acordo com as características geográficas em que se encontravam. A Geopolítica é uma ciência humana que estuda as relações entre Estado e Geografia. Ela considera que o Estado exerce poder de acordo com as suas características geográficas, como recursos naturais, contingente populacional e território. Após a guerra, houve fragmentações territoriais de acordo com os interesses políticos das potências vencedoras, como estratégias nacionais e político‑ideológicas. Conforme foi mencionado anteriormente, a Guerra Fria dividiu o mundo entre a Otan (Estados Unidos) e o Pacto de Varsóvia (União Soviética), cada qual obtendo uma zona de influência. Após a descolonização da África e da Ásia e o final da Guerra Fria, surgiram novas fronteiras políticas e centros de decisões. Hoje, assistimos a uma nova divisão internacional do trabalho,com a industrialização dos países chamados de Terceiro Mundo, como é o caso de Brasil, México, Argentina e países dos Tigres Asiáticos, como Coreia do Sul (FERREIRA, 1993, p. 10). A industrialização desses países causou um intenso processo de urbanização e aumento populacional que resultou na reorganização dos espaços locais, regionais e nacionais, na explosão demográfica e na procura por novas oportunidades, o que fez surgir os grandes centros metropolitanos, como São Paulo, Cidade do México, Buenos Aires, Calcutá etc. Outro resultado dessa nova configuração geopolítica mundial encontra‑se no processo de terceirização, ou seja, o aumento da população vinculado ao setor terciário ou setor de serviços da economia, como comércio, bancos, transportes etc. O novo espaço global de inter‑relações (FERREIRA, 1993, p. 10) deu continuidade à interdependência das nações, e esses espaços continuaram subordinados à lógica da acumulação mundial, da produção e do consumo. Como consequência, o fruto dessa sujeição pode ser percebido na estagnação, na especulação financeira, na carestia, nos déficits públicos, na desigualdade social, dentre outros problemas. Novas concentrações industriais, como Sudeste do Brasil, Pretória e Johanesburgo (África do Sul), Ásia (China e Coreia do Sul), região de Buenos Aires (Argentina), sudeste da Austrália e Oceania se transformaram de acordo com o sucesso das suas políticas internacionais e de diplomacia. As novas configurações do pós‑guerra: • Os países do Primeiro Mundo, ou seja, nações capitalistas desenvolvidas do hemisfério Norte – Estados Unidos, Canadá, países da Europa Ocidental (Inglaterra e Alemanha), Noruega, Suécia, Dinamarca, Japão e Austrália – representam por volta de 20 das 160 nações do mundo, sendo 154 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III responsáveis por dois terços da produção industrial mundial e por aproximadamente 60% da produção econômica. Apresentam alto índice de desenvolvimento social. Destaca‑se o Grupo dos Sete: Estados Unidos, Alemanha, Japão, Canadá, França, Inglaterra e Itália. A China, anteriormente considerada um país emergente, está entre as nações com alto índice industrial hoje em dia. • O Segundo Mundo era formado pelos países que anteriormente eram socialistas, como Rússia (ex‑União Soviética) e aqueles do Leste Europeu, como República Tcheca, que representavam 20% da produção industrial. São as consideradas economias de transição. • Terceiro Mundo ou Emergentes são as nações industrializadas que apresentam problemas sociais e econômicos. Localizam‑se na América, Ásia e África e representam 10% da produção industrial do mundo. Brasil, Índia, China e Rússia – esta última, hoje considerada emergente – são os países que têm notáveis índices industriais. Nações como Afeganistão, Serra Leoa, Albânia e Haiti, países pobres com baixo índice de desenvolvimento humano, são considerados subdesenvolvidos. A China, país comandado pelo Partido Comunista chinês, confrontou‑se com a matriz soviética desde a sua transformação em República Popular da China, em 1949. Quando houve a revolução em seu país, a maior parte da população se encontrava no campo. O socialismo chinês tem características próprias baseadas nas tradições de seu país e no desenvolvimento de suas forças produtivas. A partir da década de 1970, a China passou a modificar suas estruturas, transformando a economia em uma economia socialista de mercado a partir da década de 1990, tendo a intenção de articular antes de tudo a produção de excedentes no campo e a produção industrial. Atualmente, a China é um país em desenvolvimento, com poder de países de Primeiro Mundo, devido ao fato de seu PIB ser alto, cerca de 7,5% ao ano. É a segunda maior economia do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, e é o maior produtor de alimentos como o arroz e o milho. A entrada da China no mundo globalizado se deu com a mecanização agrícola, os investimentos na educação, em infraestrutura e nas áreas de petróleo e carvão mineral, o controle governamental de salários e as regras trabalhistas. Muitas transnacionais estão situadas nesse país devido aos baixos salários, que são controlados pelo governo e se constituem em uma das mais baixas remunerações do mundo. Esse país participa de blocos econômicos como a Asian Pacific Economic Cooperation (Apec), do qual fazem parte Estados Unidos e Japão, e o Brics, bloco formado por Brasil, Rússia, Índia e África do Sul. Apesar desse grande avanço industrial, a China atravessa alguns problemas, como uma grande poluição do ar, devido à utilização em massa de combustíveis fósseis. O mundo não desenvolvido não é homogêneo. Existem discrepâncias entre os Estados componentes. Em geral, o crescimento econômico desses países não auxiliou na superação dos seus problemas estruturais, muitas vezes ocasionados por diferenças históricas e culturais. Os maiores problemas encontrados são alta taxa de natalidade e mortalidade infantil, analfabetismo e baixa expectativa de vida, assim como problemas de infraestrutura, como saneamento, energia, 155 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS moradia, atendimento médico e educação. Outros fatores de subdesenvolvimento apresentam‑se na concentração da propriedade de terra, nos desequilíbrios inter‑regionais, nas guerras tribais, na grande dependência econômica do exterior e na defasagem tecnológica. Hoje em dia, estruturaram‑se uma maior interdependência das nações e a nova divisão internacional do trabalho, demandando maior desigualdade socioeconômica entre as nações. Entende‑se economia mundial como aquela que é caracterizada pela internacionalização das relações de produção capitalistas que obedecem à hierarquia das grandes potências mais ricas do planeta. Esse processo se acirrou com a crise do petróleo, em 1973, quando o preço do barril do petróleo subiu bruscamente. Essa crise foi provocada quando os países do Oriente Médio produtores de petróleo diminuíram a produção a fim de economizar essa fonte não renovável. Tal controle provocou grande preocupação dos países capitalistas, principalmente daqueles que utilizavam muito desse combustível, como os Estados Unidos. Com a Guerra do Yom Kippur, em território palestino, onde hoje se situa Israel, marcada pelo confronto entre judeus e muçulmanos, os países árabes organizaram um boicote contra as nações que apoiavam os israelenses, resultando na saída de países que estavam ao lado de Israel no conflito. Outra crise de grandes proporções ocorreu em 1979, quando os iranianos pretendiam depor o xá Reza Pahlevi, que acabou saindo do poder. O Irã foi então dominado pelos xiitas e pelo seu chefe supremo, o aiatolá Khomeini (Revolução Islâmica), que acabaram por elevar absurdamente os preços do petróleo extraído de seu território. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) foi formada a partir do convênio de Bagdá entre os países produtores e os exportadores de petróleo: Irã, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita, Venezuela e, posteriormente, Líbia, Argélia, Gabão, Nigéria, Catar, Emirados Árabes Unidos, Indonésia e Equador, com a intenção de coordenar e unificar políticas petroleiras. Eles correspondem a 27% da produção mundial. Esse grupo foi formado para diminuir o poder do cartel norte‑americano das Sete Irmãs, oligopólio gerado após a fragmentação da transnacional que dominava o mercado petrolífero mundial, Standard Oil Company, formada por: • Royal Dutch Shell. Atualmente chamada simplesmente de Shell. • Anglo‑Persian Oil Company (Apoc). Mais tarde, British Petroleum Amoco, ou BP Amoco. Atualmente é conhecida pelas iniciais BP. • Standard Oil of New Jersey (Esso). Exxon, que se fundiu com a Mobil, atualmente, ExxonMobil. • Standard Oil of New York (Socony). Mais tarde, Mobil, que se fundiu com a Exxon, formando a ExxonMobil. 156Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III • Texaco. Posteriormente, fundiu‑se com a Chevron, formando a Chevron Texaco de 2001 até 2005, quando o nome da companhia voltou a ser apenas Texaco. • Standard Oil of California (Socal). Posteriormente, formou a Chevron, que incorporou a Gulf Oil e posteriormente se fundiu com a Texaco. • Gulf Oil. Absorvida pela Chevron, posteriormente, Chevron Texaco. Posteriormente, o grupo foi formado por Esso, Texaco, Socony e Socal (americanas) e Shell (anglo‑britânica). Porém, a Opep e as grandes companhias petrolíferas representadas pelas Sete Irmãs não chegaram a um acordo sobre o controle das reservas mundiais, já que o cartel impunha baixos preços ao petróleo dos países produtores enquanto tinha lucros exorbitantes. Hoje em dia, o cartel petrolífero americano, formado apenas por ExxonMobil, Chevron Texaco, Shell e BP, ainda controla o refino e a distribuição do produto em seu país, mas não tem domínio sobre as maiores reservas petrolíferas mundiais, que foram nacionalizadas pelos países que dispõem do produto. Antes, esses países não tinham direitos sobre seus recursos naturais. Em 1991, iniciou‑se a Guerra do Golfo, quando o Kuwait foi invadido pelo Iraque e os Estados Unidos intervieram no conflito, expulsando os iraquianos do Kuwait. Ao saírem do país, os iraquianos incendiaram os poços de petróleo, derramando o óleo no Golfo Pérsico, o que causou um grande desastre ambiental. Saddam Hussein, o ditador iraquiano, alegou que o Kuwait estava prejudicando o seu país por estar vendendo o petróleo a um preço mais baixo, além de afirmar que perdeu terras para o Kuwait. Uma indenização sugerida pelo Iraque não foi aceita pelo Kuwait. A ONU interveio, condenando a ocupação, e autorizou uma invasão ao Iraque coordenada por um grupo de países composto por França, Inglaterra, Síria, Egito e Arábia Saudita. Os Estados Unidos, sob o governo de George Bush (pai), deslocaram tropas e aviões para a região. A guerra foi rápida, terminando com a derrota do Iraque. O Iraque sofreu sanções econômicas e, posteriormente, Saddam Hussein foi capturado pelos norte‑americanos sob o governo George Bush (filho), sendo julgado e enforcado em 2003 por um tribunal internacional. A utilização sustentada de combustíveis fósseis (não renováveis) e biocombustíveis, bem como de energia renovável, eólica (vento), solar (sol), geotérmica (calor interno da terra) e nuclear (utiliza‑se de materiais radioativos), tem atuado para fortalecer as tentativas de substituição do petróleo. Um novo paradigma surge em relação à energia renovável: ela é originária de fontes naturais e não se esgota, como o petróleo. 157 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Apesar de as energias renováveis serem mais utilizadas como fontes de energia, e não para transportes, elas se constituem em boas oportunidades de não se poluir o ambiente. Entretanto, esse tipo de energia ainda apresenta alto custo, onerando o país sem recursos. Algumas dessas fontes, como a eólica, já são utilizadas nos Estados Unidos (1%) e no Brasil (PIMENTEL, 2011, p. 70‑9). A energia hidrelétrica é utilizada por cerca de 16% dos países do mundo. No Brasil, a hidroeletricidade é bastante utilizada devido ao potencial hídrico existente e à natureza limpa. Porém, alguns danos são encontrados na construção das usinas, que causa impactos ambientais. O biocombustível se constitui na única energia renovável capaz de substituir o petróleo como combustível (PIMENTEL, 2011, p. 84‑90). O etanol e o biodiesel constituem alternativas comprovadas para o mercado de veículos automotivos. Em 1975, desenvolveu‑se no Brasil o Proálcool, isto é, o incremento para produção de álcool através da cana‑de‑açúcar. O Brasil avançou muito em tecnologia e aperfeiçoamento nesse setor, o que facilitou o desenvolvimento da tecnologia de carros flex, isto é, o carro que utiliza dois tipos de combustível: gasolina e álcool. Os americanos fabricam o etanol a partir do cultivo do milho. Porém, ele não é tão competitivo quanto o álcool de cana, pois o país depende da viabilidade da produção do milho, e, além disso, o etanol é mais eficiente energeticamente. Há também o biodiesel, biocombustível para motores a diesel, aproveitado a partir de gorduras animais e óleos vegetais, mais utilizado pelos europeus (cerca de 75%) e pelos norte americanos. Na atual configuração, o mundo também está dividido em blocos econômicos com interesse em comum e com o objetivo de fortalecer as relações internacionais entre eles. Dos blocos econômicos existentes, podemos destacar o Acordo de Livre‑Comércio das Américas (Alca), o Acordo de Livre‑Comércio da América do Norte (Nafta), a União Europeia, a Comunidade dos Estados Independentes (CEI), o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (Apec). Observação As sete maiores companhias petrolíferas do mundo, apontadas por executivos do setor que foram consultados pelo jornal Financial Times, são (NAKAGAWA, 2014): 1) Aramco (Arábia Saudita); 2) Gazprom (Rússia); 3) CNPC (China); 4) Nioc (Irã); 5) PDVSA (Venezuela); 6) Petrobras (Brasil); e 7) Petronas (Malásia). 8.1 O mundo pós‑contemporâneo: anos dourados e anos difíceis no Brasil, da década de 1950 à de 1980 Após o suicídio de Vargas, subiu ao poder o vice, Café Filho. O país estava comovido devido à morte de Vargas, e seus adversários políticos estavam em desvantagem, principalmente Carlos Lacerda e os 158 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III militares, que desejavam um golpe. As eleições presidenciais continuavam marcadas para o ano de 1955 e foram vencidas pelo mineiro Juscelino Kubitschek, do Partido Social‑Democrata (PSD). Juscelino governou de 1956 a 1961. Apesar de enfrentar uma ameaça de golpe militar, ele conseguiu implantar um modelo de desenvolvimento amparado pelas indústrias de base já instaladas no governo Vargas. Foi implantado o Plano de Metas, com a intenção de substituir as importações e fortalecer a produção nacional, como Vargas já havia iniciado. Os grandes objetivos do plano eram energia, transporte, educação, alimentação e indústria de base. Juscelino mandou construir uma nova capital no Centro‑Oeste, Brasília, um projeto ambicionado, mas considerado utópico desde a época de Jose Bonifácio de Andrada e Silva, que já o havia cogitado. A mão de obra empregada foi a dos imigrantes nordestinos, os chamados candangos, que após a construção ficaram habitando, desempregados, o entorno de Brasília. As metas econômicas de Juscelino foram cumpridas, com a elevação da produção de aço e das indústrias mecânicas, elétricas e de comunicações, o equipamento de transportes etc. A produção cresceu 100% e a renda per capita aumentou 4% ao ano. Apesar disso, os empréstimos externos concedidos para a implementação industrial favoreceram o aumento da inflação (CALDEIRA, 1997). O governo JK foi marcado pelo nacional‑desenvolvimentismo e pela política econômica que combinava o Estado, a empresa privada nacional e o capital externo para promover o desenvolvimento. Ele abriu as portas para a implantação de indústrias automobilísticas, como Volkswagen, GM e Ford, que foram concentradas no novo parque industrial, no ABC Paulista. As consequências dessa política foram benéficas, pois elevou‑se a geração de empregos ligados à área da metalúrgica. Entretanto, um aspecto não favorável foi a criação da civilização do automóvel, que dependeria do petróleo e de políticas de transportes rodoviários e de rodovias, cuja conservação e extensão eram mais caras do que a ferroviária (FAUSTO, 2002, p. 427‑9). No final do governo JK, houve muitos problemas ligados à inflação e ao déficit orçamentário devido a dissonâncias com o mercado externo: o governo pagava muito pelo que importavae ganhava pouco pelo que exportava. Apesar do otimismo industrial da Era JK, havia muitos pontos negativos, e isso favoreceu a eleição de Jânio Quadros, da União Democrática Nacional (UDN). Jânio, eleito com com 48% dos votos, assumiu o poder com um quadro inflacionário grande. A vice‑presidência foi para João Goulart (Jango), que era o oposto de Jânio. Houve até manifestos contra Jango comandados pelo líder udenista Carlos Lacerda, inimigo contumaz de Vargas. Jânio realizou uma política distinta da de JK, acabando com os subsídios para alguns produtos e desvalorizando a moeda. Proibiu coisas desnecessárias para o cargo que ocupava, como a briga de galo, o biquíni e o lança‑perfume. Ele esteve em Cuba em 1960, o que desagradou os americanos, pois o Brasil era alinhado aos Estados Unidos e dependia de empréstimos norte‑americanos. O não alinhamento e a política externa independente foram a marca registrada de seu governo. 159 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS A base política de apoio a Jânio se tornou oposição, e o presidente renunciou em 25 de agosto de 1961, depois de oito meses de governo. O vice, Jango, do PTB, deveria assumir, mas no momento da renúncia ele estava na China. Ele só assumiu em 7 de setembro. Antes, o Congresso Nacional articulou uma fórmula para diminuir os poderes do novo presidente, aprovando o parlamentarismo através de uma emenda constitucional. O governo Jango trouxe reação dos conservadores e da oposição, que desejava colocar um freio no crescimento, melhorar o desempenho da arrecadação e diminuir os gastos com o governo. Essas medidas eram impopulares e não agradavam a Jango. Além disso, os empresários estrangeiros preocupados com a queda da remessa de lucros deixaram de apoiar o governo. O Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, proposto por Jango e elaborado por Celso Furtado, que era desenvolvimentista, pretendia reduzir as desigualdades sociais através de reformas na educação e das reformas agrária, eleitoral e tributária. Apesar de ter adotado uma política econômica bastante conservadora em relação ao capital estrangeiro e de seguir as orientações do FMI, Jango era suscetível aos movimentos sociais, o que provocou reação das elites. Em 1963, o presidencialismo voltou após um plebiscito, retornando os poderes presidenciais a Jango. Surgiram novos atores no interior dos movimentos sociais, como as Ligas Camponesas e os estudantes da UNE, que pressionavam por ações governamentais. Em um grande comício realizado em 1964 na Central do Brasil, no Rio de Janeiro, apoiado pelos trabalhadores, Jango anunciou as reformas políticas e econômicas. Uma semana depois, setores conservadores da Igreja Católica, juntamente com a burguesia industrial, a imprensa e as elites rurais, realizaram A Marcha da Família com Deus para a Liberdade, uma manifestação contra o governo. Em março de 1964, um golpe militar depôs Jango, que partiu para Porto Alegre e posteriormente se exilou no Uruguai. Ranieri Mazilli, do PSD, assumiu interinamente, e em 9 de abril o marechal Castelo Branco, através do Ato Institucional nº 1, tomou o poder, inaugurando um longo regime militar. 8.1.1 A Ditadura Militar no Brasil Desde a época de Vargas, as Forças Armadas estavam adquirindo fundamental importância no quadro político brasileiro. Uma nova doutrina já vinha sido delineada pelos militares com a Guerra Fria, e houve alinhamento com os Estados Unidos. Quando Fidel Castro assumiu o poder em Cuba, os militares temiam que o comunismo fosse implantado no Brasil (FAUSTO, 2002, p. 452) Em 1949, foi criada a Escola Superior de Guerra (ESG), que teve assistência de americanos e franceses, bem como treinamento dos primeiros, que permaneceram no Brasil até 1960. Esse treinamento consistia em fortalecer a segurança nacional, embora os americanos desejassem manter uma estratégia para problemas no âmbito político. Com isso, o grupo militar, desde o final da Segunda Guerra, vinha sedimentando uma aliança com os militares americanos. Os militares que participaram do golpe de 1964, como os generais Golbery do Couto e Silva e Humberto de Alencar Castelo Branco, tinham a intenção de intervir no processo político nacional, a 160 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III fim de defender o país contra os inimigos externos, que desejavam a implantação do comunismo no Brasil. Essa estratégia de defesa nacional era acobertada pelo pensamento de direita que predominou no cenário político da época, ou seja, dependência externa, principalmente americana. É fato que a década de 1960 foi marcada pelo surgimento de vários movimentos sociais, camponeses, operários e estudantis, que caminhariam até a luta armada para defender seus interesses. Isso era fortemente combatido pelas elites agrárias e industriais que tinham apoio das Forças Armadas. Castelo Branco foi o general escolhido pela Escola Superior de Guerra (ESG) para governar o Brasil. Como foi um golpe, uma nova emenda, o Ato Institucional nº 1, foi outorgado pelos militares para que o general pudesse assumir o poder. Para vice de Castelo foi escolhido José Maria Alkmin, do PSD, que, embora apoiasse as manobras militares, foi cassado alguns dias depois. Uma nova estrutura legislativa foi desenvolvida para sustentar a repressão e a supressão das liberdades individuais. Para isso, o Congresso aboliu o voto secreto, instituiu eleições indiretas para presidente e definiu a duração do mandato presidencial de 6 anos. Depois disso, cassações de mandatos dos deputados das três instâncias, suspensões de direitos políticos e intervenções federais nos estados foram as primeiras medidas dos militares. Durante o período, foram outorgados 17 atos institucionais. Todos apresentavam perseguições ao cidadão, como o fim das liberdades individuais, investigação sumária, suspensão dos direitos políticos, cassações, estado de sítio e suspensão do direito de ir e vir. O AI‑5, editado em 1968, decretava o fim do habeas corpus, ou seja, o fim do direito do indivíduo de responder em liberdade pelos seus atos até que fique comprovada a sua culpa, assim como a disseminação da tortura, da prisão e da violência física contra os indivíduos. O indivíduo que fosse pego realizando algum ato subversivo era imediatamente incluído na Lei de Segurança Nacional e ficaria subjugado ao Estado, sem direitos. Nesse período, ocorreram muitas perseguições e prisões, principalmente em universidades, mídias e órgãos públicos. Os partidos foram extintos através da outorga do bipartidarismo, sendo autorizados apenas dois partidos: Aliança Renovadora Nacional (Arena) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Eles eram controlados pelo governo e não representavam oposição. Os outros partidos, como PSB e PCB, atuaram na clandestinidade. Em 1967, foi aprovada a nova Constituição, que institucionalizava o Governo Militar. Nesse ano, assumiu a presidência Artur da Costa e Silva, com forte oposição da população. Ocorreram greves, principalmente da União Nacional dos Estudantes (UNE), greve operária em Osasco (SP) e Contagem (MG) e a Passeata dos Cem Mil, na Cinelândia (RJ), contra o regime. Nesse período, formou‑se uma guerrilha urbana e rural formada por jovens da esquerda que atuavam na clandestinidade. Quando pegos, os suspeitos sofriam torturas, que muitas vezes os levavam à morte, pelos órgãos de repressão, como os Destacamentos de Operações e Informações e os Centros de Operações de Defesa Interna (DOI‑CODIs), no Rio e em São Paulo, os Dops, existentes em todos os 161 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS estados, e o Serviço Nacional de Investigação (SNI). Muitos desses mortos pelo regime militar eram enterrados como indigentes em covas rasas. O aparato repressivo incluía as trêsarmas – Exército, Marinha e Aeronáutica –, a Polícia Civil e a Militar e a Guarda Civil. Costa e Silva (1967‑1969) se afastou em 1969 por problemas de saúde, e uma junta militar formada pelos ministros Aurélio de Lira Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha) e Márcio Souza Melo (Aeronáutica) assumiu o poder. Esse período foi marcado pelo sequestro do embaixador americano Charles Elbrick pelos grupos de esquerda Movimento Revolucionário‑8 (MR‑8) e Aliança Libertadora Nacional (ALN), que exigiam a libertação de 15 presos políticos em troca da soltura do embaixador. Nesse mesmo ano, o líder da ALN, Carlos Marighella, foi morto pelo Exército. Em 1969, assumiu o general Emílio Garrastazu Médici (1969‑1974). Nesse período, conhecido como Anos de Chumbo, a repressão se radicalizou. Muitos artistas, intelectuais, músicos e escritores foram perseguidos e presos. A maioria deles se exilou do país rumo à Europa: Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Ferreira Gullar, Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Oscar Niemeyer, Glauber Rocha, Augusto Boal, Fernando Gabeira, Leonel Brizola, dentre outros. O governo militar era altamente censor. Os artistas tiveram suas músicas censuradas, e muitos jornais foram fechados, pois não seguiam a cartilha do governo. Os programas televisivos e de rádio eram censurados. Os jornais foram censurados, e seus editores, perseguidos. Nesse período, a Guerrilha do Araguaia, um grupo rural de guerrilha, surgiu, mas foi duramente reprimida. O governo Médici caracterizou‑se pelo milagre econômico, isto é, pelo período de crescimento econômico alcançado com empréstimos externos e investimentos internos, principalmente na área de infraestrutura. Com a construção de obras faraônicas, isto é, construções que lembrassem magistralmente os feitos dos militares, como a Ponte Rio‑Niterói e a Rodovia Transamazônica, o governo empregou muita mão de obra. O custo dessas obras foi alto e gerou uma grande dívida externa, que foi paga nos próximos governos. Nesse período, a industrialização criou um ritmo próprio, no qual aumentavam cada vez mais os bens duráveis, como geladeiras e automóveis, e diminuíam os produtos não duráveis, como roupas e alimentos. São Paulo e Rio de Janeiro tornaram‑se polos industriais, atraindo milhares de imigrantes. O custo social pela substituição de importações gerou uma crise com a falta de modernização no campo e a elevação dos preços internos dos produtos industrializados. Durante o regime militar, as altas taxas de crescimento (10%) eram fruto de uma reorganização no sistema financeiro, beneficiando, sobretudo, o crescimento do comércio mundial e a abertura comercial e financeira ao exterior. Contudo, com o agravamento das questões sociais, isto é, a desigualdade social criada pelo aumento da concentração de renda nas mãos da classe média, acirraram‑se as contradições políticas e econômicas do governo, que dependia do capital externo. O governo de Ernesto Geisel (1974‑1979) foi marcado pela transição militar em direção à democracia, sendo agravado pelo fim do milagre econômico e pela crise mundial do petróleo. Apesar disso, Geisel sofreu oposição dos militares “linha‑dura”, que passaram a promover ataques contra os grupos de 162 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 Unidade III esquerda. Foi no seu governo que em 1975 ocorreram a prisão e o assassinato do jornalista da TV Cultura Vladimir Herzog. O jornalista foi morto nas dependências do DOI‑Codi, em São Paulo, e seu corpo foi encontrado como se ele tivesse cometido suícidio com uma teresa, corda feita de lençóis. A farsa simulada provocou surpresa na população. Nesse mesmo ano, o operário Manuel Fiel Filho foi encontrado morto na mesma situação. O próximo governo, de João Baptista Figueiredo (1979‑1985), foi marcado pelo aceleramento do processo de redemocratização. Em 1978, o MDB ganha as eleições para o Congresso. Artistas e intelectuais voltam do exílio. Cartas‑bombas foram colocadas na OAB e em órgãos da imprensa. Em 1981, uma bomba explodiu no Centro de Convenções do Riocentro, matando um oficial do Exército. Em 1979, ocorre o retorno do pluripartidarismo; assim, os partidos, antes na clandestinidade, voltaram a participar da cena política do país. Também foram criados outros partidos, como o Partido Democrático Trabalhista (PDT), em 1979, e o Partido dos Trabalhadores (PT), em 1980. Em 1984, vários opositores do governo participaram do movimento Diretas Já, reunindo milhares de pessoas no Brasil inteiro; só em São Paulo, o movimento reuniu 1,3 milhão de pessoas. Esse movimento baseou‑se na Emenda Dante de Oliveira, que era favorável às eleições diretas para o próximo presidente, mas que não fora aprovada pelo Congresso; assim, as eleições continuavam indiretas. Os militares apoiaram Paulo Maluf, do PDS; já o PMDB lançou a candidatura de Tancredo Neves, que foi o ministro da Justiça de Getúlio Vargas. Um racha interno no PDS apoiou Tancredo, que acabou vencendo as eleições. Porém, Tancredo faleceu antes de tomar posse, e seu vice, José Sarney, assumiu a presidência, apoiado pelo PDS. Saiba mais Na página a seguir, você pode ver uma lista de filmes sobre a Ditadura Militar no Brasil: FILMES sobre a Ditadura Militar. [s.d.]. Disponível em: <http://www. suapesquisa.com/ditadura/filmes.htm>. Acesso em: 10 maio 2016. 8.1.2 Da década de 1980 à de 1990: quadro recessivo O primeiro presidente civil a governar pelo voto indireto foi o maranhense José Sarney (1985‑1990). Sarney lançou o Plano Cruzado a fim de controlar a qualquer custo a inflação, que vinha ocorrendo desde o final do governo militar e chegava a 235% ao ano. O Plano Cruzado, proposto por Denílson Funaro, atuou no congelamento dos preços e salários e teve como características a explosão do consumo e o desestímulo à poupança, bem como ao abastecimento. A falta de produtos passou a ocorrer, e os comerciantes começaram a cobrar o ágio, isto é, um valor a mais sobre determinada mercadoria, principalmente sobre a carne. Nesse período, trocou‑se o Cruzeiro pelo Cruzado. Apesar dos problemas decorrentes desse plano, o governo o manteve até as eleições de 1986, a fim de manter a sua popularidade. Com os problemas causados pelo Plano Cruzado, surgiram o 163 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 1 0/ 05 /1 6 TRANSFORMAÇÕES HISTÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Plano Cruzado II (1986) e o Plano Bresser (1987), que tiveram como objetivo controlar os gastos públicos e a inflação. No governo Sarney, em 1988, foi promulgada a nova Constituição brasileira, que previa a cidadania participativa e defendia os direitos dos trabalhadores. Depois da última constituição ditatorial, essa nova carta provava ser a mais social e democrática de todas as constituições brasileiras. Houve um plebiscito entre a população para decidir entre parlamentarismo e presidencialismo, vencendo este último. A Constituição de 1988 determinou carga horária máxima de 44 horas semanais, licença‑maternidade, liberdade sindical, direito a greve etc. Foram aprovadas várias leis que se referiam a vários segmentos da sociedade, como adolescente, criança, família, idoso, indígena, assim como meio ambiente, tecnologia, ciência, desporto, previdência, assistência e seguridade social, educação e cultura. A população ficou frustrada com esses problemas e elegeu Fernando Collor de Mello, do PTB das Alagoas. A década de 1980 foi marcada pela pobreza, criminalidade e desilusão do povo brasileiro, com aumento significativo das favelas, carestia e desemprego. O governo Collor (1990‑1992) elegeu‑se com 50% dos votos, contra 42% de Luiz Inácio Lula da Silva, com um discurso anticorrupção e de modernização do Brasil. Foi o primeiro governo a ser eleito por voto popular após mais de vinte e cinco anos de regime militar. Sua campanha eleitoral apresentava um candidato extremamente moderno e honesto. Ele empossou a economista Zélia Cardoso
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