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ELEMENTOS E 
FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Programa de Pós-Graduação EAD
UNIASSELVI-PÓS
Autoria: Maria Gisele Canário de Souza
 Welder Lancieri Marchini
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Reitor: Prof. Hermínio Kloch
Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol
Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Ivan Tesck
Equipe Multidisciplinar da 
Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz
 Prof.a Tathyane Lucas Simão
 Prof. Ivan Tesck
Revisão de Conteúdo: Neivor Schuck 
Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais
Diagramação e Capa: 
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Copyright © UNIASSELVI 2017
Ficha catalográfi ca elaborado pela editora do grupo
 UNIASSELVI – Indaial.
220.07
S719E Souza, Maria Gisele Canário de 
 Elementos e fundamentos bíblicos / Maria Gisele Canário de 
Souza; Welder Lancieri Marchini. Indaial: UNIASSELVI, 2017.
 153 p. : il.
 ISBN 978-85-69910-76-3
 
 1.Bíblia – Estudo e Ensino. I. Centro Universitário
 Leonardo Da Vinci. 
Maria Gisele Canário de Souza
Welder Lancieri Marchini
Mestre em Teologia com ênfase em exegese 
bíblica (Antigo Testamento) pela Pontifícia 
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). 
Especialista em Antigo e Novo Testamento pelo 
centro Bíblico Verbo. Possui graduação em Teologia 
pelo Instituto São Paulo de Estudos Superiores 
(ITESP). É graduanda em geografi a pela 
Universidade Cruzeiro do Sul - SP. Atualmente é 
assessora do Centro Bíblico Verbo e Tutora do 
curso de Bíblia online. É membra do grupo 
de pesquisa Tradução e Interpretação do 
Antigo Testamento (TIAT).
Doutorando em Ciência da Religião (PUC-SP) 
onde pesquisa a recepção do Concílio Vaticano II 
pela Igreja no Brasil, mestre pela mesma instituição, 
com pesquisa sobre os impactos da metrópole em 
ambiente urbano. Pós-graduado em teologia pastoral, 
com ênfase na teologia da missão (ITESP), bacharel em 
Filosofi a (PUC-Campinas) e em Teologia (ITESP).
É professor convidado na Graduação em Teologia 
do ITF (Petrópolis), na pós-graduação em Ciência da 
Religião da PUC (São Paulo) e na pós-graduação 
Religião e Cultura na UNIFAI (São Paulo). Trabalha 
como editor teológico na Editora Vozes.
É autor do livro “Paróquias urbanas: 
entender para participar” pela Editora 
santuário (2017) e do livro de catequese com 
adolescentes “Perseverando com Jesus” 
pela Editora Vozes (2015).
pela Igreja no Brasil, mestre pela mesma instituição, 
com pesquisa sobre os impactos da metrópole em 
ambiente urbano. Pós-graduado em teologia pastoral, 
com ênfase na teologia da missão (ITESP), bacharel em 
Sumário
APRESENTAÇÃO ....................................................................01
CAPÍTULO 1
Estudo da Bíblia .......................................................................9
CAPÍTULO 2
O Antigo Testamento e sua História ...................................21
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
O Exílio, e a Volta do Exílio Decretada pelo
Império Persa .........................................................................63
Segundo Testamento ..........................................................109
APRESENTAÇÃO
O estudo do livro mais vendido do mundo, cerca de seis bilhões de cópias, a 
Bíblia, passou por uma série de transformações e descobertas ao longo da história. 
Podemos imaginar que esse processo de leitura e conhecimento não é tão simples, 
pois existem inúmeras formas de interpretá-la. Com essa disciplina, Elementos 
e Fundamentos Bíblicos, almejamos que você seja introduzido nesse processo de 
leitura e aprendizado.
No primeiro capítulo apresentamos alguns conceitos que desmistificam formas 
de leituras usuais e muito conhecidas no universo religioso cristão. Com isso 
surgem algumas ferramentas que são utilizadas no estudo da exegese que poderão 
sistematicamente nos apresentar algumas técnicas para a leitura da Bíblia. 
Com os conceitos apresentados no primeiro capítulo, à guisa de introdução da 
disciplina, no segundo capítulo iremos conhecer brevemente o contexto histórico, 
político e ideológico, que nortearam as narrativas bíblicas, que foram escritas por 
muitos autores. Para isso é fundamental conhecermos um pouco mais sobre a história 
de Israel. Teremos uma breve apresentação que nos introduz à leitura dos principais 
livros do Primeiro Testamento. 
Nessa mesma perspectiva seguimos com o conhecimento da história de 
Israel, no terceiro capítulo, porém, iremos perceber com isso, que os relatos na 
Bíblia não são escritos de maneira cronológica, metaforicamente podemos dizer 
que se trata de uma colcha de retalhos, haja vista que não se trata de um livro só, 
mas de muitos livros. 
Feito o estudo do Primeiro Testamento chegamos a algumas ferramentas que 
nos ajudarão na leitura da coletânea de livros que compõe o Segundo Testamento. 
Essa parte dos estudos muito interessa aos cristãos, pois são livros que narram a 
história de Jesus e dos seus seguidores, sob a ótica da segunda geração dos 
seus discípulos. Nesse último capítulo teremos conhecimento dos evangelhos 
sinóticos, bem como suas similaridades e diferenças e o porquê de tantas possíveis 
arbitrariedades. Consequentemente a isso conheceremos um pouco mais sobre a 
vida do Apóstolo Paulo, o responsável pela propagação da vida de Jesus aos confins 
do Império Romano. Pessoas que não fizeram parte do convívio de Jesus escutaram 
falar sobre ele a partir dos relatos de Paulo, seja pessoalmente ou por meio de cartas. 
Esperamos que esse estudo ajude você a buscar outras ferramentas que 
possam ser úteis na leitura da Bíblia. Um livro em que suas narrativas jamais podem 
fundamentar ou legitimar realidades para a qual não foram escritas. Não podemos 
esquecer que os personagens das narrativas bíblicas não sabiam que esse livro seria 
lido por nós, hoje, após mais de dois mil anos e que, portanto, uma leitura fora de 
contexto pode ser um grande equívoco. 
Os autores.
CAPÍTULO 1
Estudo da Bíblia
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Compreender as diversas formas de leituras da Bíblia, 
bem como suas perspectivas teológicas. 
  Conhecer os principais métodos de estudos da 
Bíblia e saber utilizá-los na leitura bíblica.
  Analisar os livros bíblicos em perspectiva literária e narrativa, a partir 
da memória e da religiosidade, superando leituras fundamentalistas. 
10
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
11
ESTUDO DA BÍBLIA Capítulo 1 
Como Lemos a Bíblia?
Você sabia que existem muitas maneiras de ler a Bíblia? Pois é! Você pode 
se perguntar como isso é possível, se a Bíblia é uma só e se ela foi inspirada e 
escrita pelo próprio Deus. Comecemos nos atentando para alguns pontos impor-
tantes para compreendermos esses fundamentos, que podem nos ajudar na hora 
da leitura.
No entanto, há tantas formas de leituras e interpretações que 
chegam a confundir os cristãos leitores, que em muitas narrativas até 
param a leitura e se perguntam: Mas, então, como é que se lê a Bíblia? 
Qualquer interpretação da Bíblia que fi zermos trará consequências di-
retas na relação que temos com Deus e com todas as pessoas. 
Continuemos! Você já deve ter percebido que existem diferentes maneiras 
de ler a Bíblia e que, de acordo com essa leitura, conceberá diferentes imagens 
de Deus no seu pensamento. Algumas pessoas descobrem na Bíblia um Deus 
valente, ameaçador, bravo, justiceiro; outros acham um Deus que perdoa, amo-
roso, amigo e que propõe um projeto de vida a ser seguido; alguns se revoltam 
contra o Deus da Bíblia, outros se apaixonam e se comprometem com ele. 
Há, no entanto, pessoas que leem a Bíblia e se tornam rancorosas, juízes 
de todo mundo, usando a palavra de Deus como arma de acusação; outras fi cam 
esperando que Deus resolvatodos os seus problemas por meio de um milagre 
imediato; existem ainda aqueles que se desligam da vida concreta, achando que 
quanto mais distante do mundo, mais perto estarão de Deus. Dessa forma, todos 
eles usam a Bíblia para justifi car suas próprias opiniões, muitas vezes aplicando 
o texto da forma como o entendem. Às vezes, nem percebem que a sua forma de 
ler e interpretar a Bíblia está produzindo uma ideia de Deus muito esquisita ou até 
contrária à caridade.
A Bíblia – Palavra de Deus – chega até nós, nas nossas igrejas e/
ou comunidades, às pessoas de fé, em forma de literatura. É importante 
percebermos que na Bíblia Deus faz uso da linguagem humana para ser 
compreendido. Nesse sentido, os leitores da Bíblia se veem desafi ados a 
identifi car a Palavra de Deus, revestida com palavras humanas.
Qualquer 
interpretação da 
Bíblia que fi zermos 
trará consequências 
diretas na relação 
que temos com 
Deus e com todas 
as pessoas.
Os leitores da Bíblia 
se veem desafi ados 
a identifi car a 
Palavra de Deus, 
revestida com 
palavras humanas.
12
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Para aprofundar-se mais nos vários métodos de leitura bíblica, 
de cunho mais pastoral, deixamos algumas dicas de leitura:
1- Equipe nacional da dimensão bíblico-catequética.Como 
nossa Igreja lê a Bíblia. São Paulo: Paulinas, 1995. 
2- Serviço de animação bíblica. Iniciação à leitura da Bíblia. 
São Paulo: Paulinas, 2007.
3- PULGA, Rosana. Beabá da Bíblia. São Paulo: Paulinas,1998.
4- ANTONIZI, Alberto, et al. ABC da Bíblia. São Paulo: Paulus, 
1982.
Um dos grandes desafi os enfrentados pelas igrejas e/ou comunidades 
cristãs consiste em captar a mensagem da salvação nas entrelinhas de um 
texto. Essa tarefa é, ao mesmo tempo, fácil, mas complexa. Fácil porque, por 
meio de traduções confi áveis, podemos ter acesso aos textos bíblicos também 
confi áveis. Difícil e complexo, por se tratar de um texto escrito num horizonte 
cultural e linguístico muito distinto da nossa realidade atual. Para entendê-lo são 
necessárias ferramentas que possibilitem o acesso à mensagem veiculada. Em 
outras palavras, só é possível chegar ao sentido aproximado do texto num intenso 
processo de interpretação. As narrativas bíblicas foram escritas para serem lidas 
e, por conseguinte, interpretadas. 
Ler é interpretar! Interpretar é ler! Quem se aventura a ler a 
Bíblia sem interpretá-la não entenderá o que lê. Nesse sentido, quem 
interpreta produz um tipo de leitura que poderá assumir variadas 
roupagens, dependendo do intérprete e seus contextos. 
A cada leitura feita surgem diversas fontes de sentidos. É claro que sem 
leitores e leitoras intérpretes, pessoas, comunidades-igrejas, as narrativas bíblicas 
permaneceriam letra morta. São os leitores que dão vida ao texto e fazem com que 
a narrativa se torne Palavra de Deus. Textos lidos sem o esforço da interpretação 
tornam-se materialidade da letra, é a fragilidade das leituras fundamentalistas e 
historicistas.
Ler é interpretar! 
Interpretar é ler!
13
ESTUDO DA BÍBLIA Capítulo 1 
“A palavra de Deus é muito mais que o texto escrito. Ela é, antes 
de tudo, o texto vivenciado” (RODRIGUES, 2004, p. 13).
Entenda por fundamentalismo a “leitura ao pé da letra”, ou seja, 
a verdade corresponde ao conteúdo das palavras. Já historicista é a 
leitura que considera “histórico” tudo o que a Bíblia relata, como se 
tratasse de um livro de crônicas. Por exemplo, o relato da criação 
Gn 1-2 se tem na conta de descrição científi ca do que aconteceu no 
começo de tudo. Resulta nas inúteis discordâncias entre fé-ciência 
promovidas por certos defensores da Bíblia.
Uma das maneiras de desconstruir a leitura fundamentalista é 
perceber que os textos bíblicos são repletos de metáforas. A metáfora 
requer uma interpretação, pois vai além do sentido literal. 
Leia o texto de Mt 18,9 e busque perceber que Jesus não está 
falando de maneira literal, mas metafórica.
A leitura fundamentalista da Bíblia carrega uma pobreza, por ser incapaz 
de adentrar no mundo do texto. Antes, os leitores fundamentalistas dão-se 
satisfeitos por transitarem na superfície dos textos bíblicos. Os fundamentalistas 
e os historicistas se enganam ao se autodenominarem conhecedores fi éis da 
Palavra de Deus, quando, de fato, movem-se em um universo bíblico fruto de 
dogmatismos e fanatismos, sem qualquer relação com o que a literatura bíblica 
pretende ser, desde as mais remotas origens de sua redação.
Por causa desses motivos é que vamos aprender a ler a Bíblia de forma 
diferente. E para isso existem alguns métodos científi cos: sincrônico e diacrônico 
– bem como suas especifi cidades – e leituras que podem nos ajudar. Veja no 
próximo item, após a atividade proposta, os métodos mais utilizados pelos 
exegetas atuais.
14
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Métodos DiacrÔnicos e SincrÔnicos 
Entende-se por método um conjunto de procedimentos utilizados para 
examinar, com a maior objetividade possível, um dado. O método se distingue de 
abordagem, porque esta está mais inclinada ao ponto de vista a partir do qual é 
feita a leitura e interpretação de um texto. (LIMA, 2014). No fundo, as diferentes 
abordagens escolhem um método, sendo caracterizadas pela perspectiva e 
escopo que assumem. 
Os chamados métodos diacrônicos oferecem maior atenção ao crescimento 
dos textos e ao contexto em que o texto foi escrito, já os sincrônicos priorizam a 
forma fi nal do texto. Os métodos diacrônicos são reunidos no método histórico 
crítico, composto por diversas etapas, cada qual com princípio e procedimentos 
próprios. Integradas, estas etapas visam esclarecer o texto no momento de sua 
produção artística (LIMA, 2014).
Veja o que a exegeta Maria de Lourdes Lima fala a respeito do 
método histórico crítico:
A multiplicidade, por vezes contraditória, dos resultados 
das análises diacrônicas, o caráter hipotético de suas 
reconstruções, a aridez de sua argumentação e resultados, 
bem como a difi culdade de falar para a época contemporânea, 
que motivaram, em grande parte, o descrédito para com o 
método histórico crítico, conduziram a repensar a metodologia 
exegética. Estas se concretizaram, por parte de algumas 
correntes, no abandono completo da diacronia, com a 
consequente opção por uma leitura exclusivamente sincrônica 
(LIMA, 2014, p. 65).
No caso do método sincrônico, os mais divulgados são a análise retórica 
(valoriza a forma do texto), a análise narrativa (o papel do leitor na compreensão do 
signifi cado do texto), a análise semiótica (valorização das estruturas linguísticas) 
e, nas últimas décadas, a pragmático-linguística (o texto como elemento de 
comunicação). Cada qual dessas análises possui uma metodologia própria, que 
visa esclarecer o texto em sua visão canônica (ZAPELLA, 2014).
15
ESTUDO DA BÍBLIA Capítulo 1 
Em um ou outro método existem limitações, muitos dos exegetas atuais se 
utilizam dos dois métodos, reciprocamente, para fazer as suas análises. Dessa 
forma, os dois tipos de metodologias não se contrapõem, mas se complementam. 
A exegese não pode se limitar em falar do passado do texto, inclusive em 
suas possíveis etapas redacionais, mas deve chegar até sua forma canônica, 
valorizando-a como Palavra de Deus que quer comunicar, sem pretender que 
o mais antigo seja o melhor, ou o mais autêntico. Por outro lado, um estudo 
estritamente sincrônico perderia a dimensão temporal, histórica, e cairia no perigo 
do fundamentalismo. 
O que é exegese? De acordo com o autor Patrick 
Dondelinger (1998, p. 698), a exegese:
É um conjunto de procedimentos destinados a estabelecer 
o sentido de um texto. Têm-se necessidade dela cada vez 
que um texto suscita um interesse durável [...]. O texto não 
necessita dela no momento de sua composição: os autores ou 
redatores trabalham para serem perfeitamente compreendidos. 
Não é tampouco um assunto privado entre o texto e um leitor 
individual, permitindo uma interpretaçãosem limites. É o 
produto das necessidades de uma comunidade para a qual 
o texto é útil ou precioso. Tem particular importância numa 
comunidade religiosa que funda suas doutrinas, suas normas 
morais, sua espiritualidade em textos que crê inspirados. Essa 
comunidade terá ao mesmo tempo o cuidado de elaborar 
procedimentos que permitam descobrir no texto insuspeitados 
sentidos e aplicações, e controlar os tipos de exegese capazes 
de infl uenciar as crenças e a conduta de seus membros.
Estudos de história dos estilos literários têm mostrado (RODRIGUES, 2004) 
que muita coisa na Bíblia não é exatamente o que estávamos acostumados a 
pensar que fosse (mostram que muita coisa não aconteceu de fato daquele jeito 
como está escrito). Quando esses estudos começaram, muita gente se assustou, 
pensando que ia acabar com a sua fé. No entanto, as pesquisas históricas 
mostram que os fatos referentes à origem do povo de Deus foram escritos muitos 
séculos depois; descobriu-se que há textos formados com pedaços de outros 
textos, escritos por gente de ideias e épocas diferentes: isso explica por que o 
mesmo fato, às vezes, é contado duas vezes, com detalhes que divergem. 
16
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Para entender mais sobre a leitura bíblica a partir do universo 
metafórico, leia: MENDONÇA, José Tolentino. A leitura infi nita. A 
Bíblia e a sua interpretação. Universidade Católica de Pernambuco; 
Paulinas: Recife; São Paulo, 2015.
O estudo dos diversos estilos literários nos ajuda a entender que certos 
textos são poéticos e não podem ser interpretados como uma verdade científi ca. 
Isso, por exemplo, aparece no poema dos seis dias da criação (Gn 1,1-2,4), que 
é escrito, possivelmente, num contexto de forte sofrimento no período exílico, se 
trata de um convite para louvar a Deus, mas não obriga ninguém a crer que o 
mundo foi feito em seis dias. 
A Bíblia e o mundo humano não se separam, pois a Palavra de Deus veste 
as roupas do jeito humano de falar; é comunicada por intermédio do povo e 
dos sentimentos humanos de quem tinha a tinta nas mãos e escrevia o texto 
bíblico. O fato de o Espírito Santo inspirar a escrita, essa realidade não apaga 
a intencionalidade do autor, que vive os confl itos humanos, os quais podem 
infl uenciar diretamente os seus escritos, tanto positiva como negativamente. 
O povo sabia ler a presença de Deus nos fatos corriqueiros da sua história 
de vida. Por isso, a Bíblia, essa coleção de livros, não contém só orações, bons 
conselhos, frases edifi cantes. Nela estão presentes fatos da vida, com tudo que 
sabemos que tem a vida: heroísmo e violência, generosidade e pecado, sangue, 
guerra, casos de família, machismo, preconceitos, lealdade e traição, interesses 
econômicos e políticos e tantas outras situações. A Bíblia nos revela que Deus 
é a verdade! Mas ela também revela quem somos nós: humanos! Propensos ao 
amor, às dores, virtudes e fraquezas. 
A Bíblia pode ser entendida como um espelho, que refl ete a nós 
mesmos, com isso ela nos ajuda a discernir sobre nossas defi ciências 
e capacidades. E nos aponta para um mundo cheio de esperança, 
com possibilidades de transformações inimagináveis. Duas atitudes 
podem nos levar a uma falsa ideia de Deus e da encarnação: dar 
valor absoluto a tudo o que está escrito literariamente e ignorar os 
condicionamentos humanos e literários do texto. 
Duas atitudes podem 
nos levar a uma 
falsa ideia de Deus 
e da encarnação: 
dar valor absoluto 
a tudo o que está 
escrito literariamente 
e ignorar os 
condicionamentos 
humanos e literários 
do texto.
17
ESTUDO DA BÍBLIA Capítulo 1 
Você já deve ter se deparado com alguma situação em que pessoas se 
dirigem até você querendo provar ou impor alguma atitude com a citação de um 
versículo isolado. E se você questionar essa forma de leitura, imediatamente será 
acusado de não possuir fé, e não respeitar a Palavra de Deus. E afi rmam: “Não 
tem de interpretar nada! É Palavra de Deus! Tem que ser aceita como está! Em 
coisa sagrada não se mexe!” Infelizmente, existem pessoas que pensam que 
por se tratar da Palavra de Deus, cada parte da Bíblia tem que ser aceita como 
verdade absoluta, e não exige possibilidade nenhuma de argumentação. 
Contudo, é importante saber, você que é apaixonado pelos escritos bíblicos, 
que a Palavra de Deus é o refl exo daquilo que o povo sabia, sentia e vivia naquela 
época. Um exemplo: No livro de Levítico, o morcego – que é mamífero – é 
classifi cado como uma ave; na visão do povo da Bíblia, a Terra era o centro e 
o Sol é que girava em volta do planeta. Nesse sentido, ninguém é obrigado a 
discutir com os cientistas, só porque essas coisas estão escritas na Bíblia. Deus é 
tão magnífi co que permitiu que o povo se expressasse de acordo com as teorias 
do momento histórico em que viviam. Deus nunca permitiu que o seu povo desse 
um passo maior do que as próprias pernas. 
Em muitas situações, o povo atribui a Deus seus próprios sentimentos: que 
podem conter raiva, alegria, tristeza, indignação. Por exemplo, há vários textos 
que falam de violência, com muito sangue, e o povo dizendo que a morte dos 
inimigos é a vitória de Deus. Vivendo numa cultura violenta, o povo achava que 
Deus queria isso. Compreendiam Deus por meio dos sentimentos que estavam 
acostumados no dia a dia. Aliás, nós também vivemos numa sociedade violenta, 
não?! Sentimos que Deus queira a destruição dos seus fi lhos? Por outro lado, 
há situações que caberiam em determinadas épocas, mas que hoje não se 
aplicam mais. Por exemplo, no tempo da Bíblia (Ex 22, 18-26) não se contestava 
a escravidão, no máximo se recomendava um tratamento mais humano, existiam 
até leis que os protegessem; isso, é claro, não pode justifi car que um religioso 
cristão, nos dias atuais, fi que indiferente diante de situações de escravidão ou de 
falta de respeito ao direito de quem trabalha. 
O teólogo que se propõe a estudar a Bíblia deve ser fi el à Igreja, trabalhando 
com competência, para ajudar a própria Igreja a aprofundar sua compreensão da 
Palavra de Deus. É necessário também dar aos fi éis e às lideranças comunitárias 
ferramentas que os ajudem a ler a Bíblia com o olhar na realidade e no período 
bíblico, e não o contrário, o que poderia gerar equívocos desastrosos. A Palavra 
de Deus correria o risco de ser descaracterizada! E aquele desejo de fazer valer a 
vontade de Deus poderia surtir um efeito contrário. 
18
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
As Igrejas cristãs são gratas pelo trabalho dos especialistas que ajudaram e 
ajudam a entender o texto bíblico de uma forma diferente, ajudando a superar a 
leitura literal e adentrando a leitura que expresse o sentido que estava presente 
no período em que o texto foi escrito. Ser repetitivo, e querer que o texto fale à 
nossa vida, sem levar em conta o motivo pelo qual o texto foi escrito, pode incorrer 
numa infi delidade ao texto, e consequentemente, ao projeto de Deus. 
A Bíblia deve ser entendida dentro do seu contexto e só depois de estudada 
poderá iluminar a história de nosso tempo. Sabemos que o mundo em que foram 
escritos os livros bíblicos é muito diferente do nosso, afi nal já se passou um 
período de mais ou menos 4.000 anos e foram redigidos em etapas diferentes 
e distantes uma da outra. Um exemplo: se você olhar os costumes, a moral, a 
sociedade do tempo dos seus avós, verá que questões que eram fundamentais 
no tempo da juventude deles, hoje já não fazem mais tanta diferença, ou mesmo 
inexistem. E estamos falando de um mesmo país, estado e cidade. Imagine, você, 
essa realidade num país do Oriente Antigo, com uma religião, cultura totalmente 
diferente da nossa e um período de 4.000 anos nos separando. 
São muitos elementos a se considerar para a leitura da Bíblia, não acha? 
Refl ita sobre essa realidade e tire suas próprias conclusões. O texto bíblico deve 
nos permitir fazer um caminho diferente que nos leve ao aprendizado de forma 
autônoma e segurae não nos tornando repetidores de pregações ou homilias. O 
texto bíblico não muda, já foi escrito, mas certamente pode e deve mudar nossa 
maneira de entender o que lá está escrito. Isso não pode ser motivo de escândalo, 
mas de sabedoria! (MESTERS, 2012). 
A comunicação de Deus também se atualiza para que homens e mulheres 
possam crer sem ter de contrariar seus conhecimentos científi cos e sua 
compreensão do mundo e da história da humanidade. Contudo, espera-se, é 
claro, que os especialistas, para além do seu saber científi co, sejam capazes de 
perceber nos textos a Palavra de Deus e nela alimentem a sua fé. 
Nós, que somos aprendizes, temos de fazer progressos na nossa maneira 
de entender e ler a Bíblia, e não tendo medo de aproveitarmos os estudos mais 
sérios e modernos. E é justamente isso que iremos fazer a partir de agora! Bons 
estudos!
19
ESTUDO DA BÍBLIA Capítulo 1 
Atividade de Estudos: 
1) Leia o texto bíblico da Parábola do rico insensato em Lc 12, 16-
21, veja quais as difi culdades que surgem, se a leitura do texto for 
feita de forma literal. A vida do rico é pedida de volta, porque optou 
pelas riquezas, ou seja, juntou tesouros para si e não para Deus. Se 
a narrativa for lida ao pé da letra, poderá ser compreendida de forma 
trágica, aponte os caminhos de leitura para que isso não ocorra.
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Algumas ConsideraÇÕes
Nesse primeiro capítulo buscamos introduzi-lo, caro aluno, ligeiramente na 
leitura da Bíblia, de maneira mais acadêmica, mas também pastoral. Acreditamos 
que uma realidade contempla a outra. Para isso, fi zemos uso dos métodos 
propostos pela exegese bíblica, citamos apenas os mais utilizados, que são o 
método sincrônico e o anacrônico. Sabendo interpretá-los, seremos favorecidos 
por uma compreensão mais ampla da Bíblia. A Bíblia pode ser um local que inspira 
a rezar/orar, mas não de forma ingênua, não relativizando a fé, mas verifi cando as 
várias imagens de Deus construídas ao longo da história.
Ler a Bíblia é uma tarefa exigente, de acordo com o que vimos ao longo desse 
capítulo, no entanto, se soubermos utilizar as ferramentas de leituras propostas 
pelos mais variados métodos de leituras exegéticas, pode se tornar algo tranquilo. 
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Ao longo da nossa vida fomos acostumados a ler a Bíblia com muito medo, 
receio que acabou por gerar um bloqueio na hora da leitura. Tentando enxergar 
as narrativas como muito belas, “algo do céu”, mesmo aquelas que retratam 
situações de violência, tentávamos reinterpretá-las a ponto de se tornarem lindas 
aos nossos olhos.
Dessa forma, fi cou difícil vermos a Bíblia como uma biblioteca de livros 
literários, escritos em um período muito distante e diferente dos costumes que 
vivenciamos na sociedade hodierna. Optamos por ver a Bíblia como algo sagrado, 
muito sagrado, intocável e distante de nós! 
As ferramentas de leituras não podem ser vistas como algo que vai nos 
tirar a fé. Para quem é religioso, isso é muito importante, porém sabemos que a 
Bíblia não é lida apenas por religiosos, mas por cientistas, ateus e curiosos em 
geral. Isso signifi ca que os crentes possuem uma responsabilidade muito grande, 
faz-se necessário um diálogo de igual para igual, e não apenas repetir de forma 
fundamentalista o que pastores, padres, pregadores e lideranças em geral fazem. 
Não veja isso como algo intolerante, mas veja como um sinal de ressignifi car nos 
dias atuais a Palavra de Deus, que para nós se faz necessária! Se posicione e 
lembre que o conhecimento é um processo de aprofundamento da fé e da própria 
existência. Pense nisso e refl ita! 
ReFerÊncias
ANTONIZI, Alberto, et al. ABC da Bíblia. São Paulo: Paulus, 1982. 
EQUIPE NACIONAL DA DIMENSÃO BÍBLICO-CATEQUÉTICA. Como nossa 
Igreja lê a Bíblia. São Paulo: Paulinas, 1995. 
LIMA, Maria de Lourdes Corrêa. Exegese bíblica. São Paulo: Paulinas, 2014.
MENDONÇA, José Tolentino. A leitura infi nita. A Bíblia e a sua interpretação. 
Universidade Católica de Pernambuco; Paulinas: Recife; São Paulo, 2015.
MESTERS, Carlos. Por trás das palavras. Petrópolis: Vozes, 2012. 
PULGA, Rosana. Beabá da Bíblia. São Paulo: Paulinas,1998.
RODRIGUES, Maria Paula (Org.). Palavra de Deus, palavra de gente. As for-
mas literárias da Bíblia. São Paulo: Paulus, 2004.
SERVIÇO de animação bíblica. Iniciação à leitura da Bíblia. São Paulo: Paulinas, 2007.
ZAPELLA. L. Manuale de analisi narrativa bíblica. Torino: Claudiana, 2014.
CAPÍTULO 2
O Antigo Testamento e sua História
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Compreender a formação do Antigo Testamento e os principais profetas 
que contribuíram para formar a identidade do povo de Israel. 
  Analisar os principais momentos históricos que foram fundamentais 
para a construção dos livros do Antigo Testamento. 
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
ContextualiZaÇÃo
A Bíblia, como bem sabemos, é um livro diferente de todos os outros livros 
que conhecemos, pois não se trata de um livro, mas de uma coleção de pequenos 
livros (livretos, cartilhas). A palavra Bíblia se origina do grego, que signifi ca, 
literalmente, “livrinhos”, pois indica o plural da palavra biblion, que é o diminutivo 
de “biblos”. 
Os livros bíblicos foram escritos em três línguas diferentes, no entanto, a 
maior parte dela foi escrita em hebraico, outra parte em grego e a menor parte em 
aramaico. Os livros bíblicos, podemos chamar assim, foram escritos em muitos 
lugares diferentes, grande parte foi escrita na Palestina, mas outras partes foram 
escritas na Babilônia, no Egito, na Ásia Menor, em Roma, e em muitas outras 
localidades, difíceis de serem atestadas (KONINGS, 1998).
A literatura bíblica foi redigida, provavelmente, a partir do ano 1.000 a.C. e 
só foi fi nalizada por volta do ano 200 d.C., ou seja, mais ou menos 1.200 anos 
foram necessários até alcançar a forma que temos hoje. Foram muitos os autores 
responsáveis pela escrita dessa coleção, não se tem uma quantidade exata, mas 
foram mais de uma centena (KONINGS, 1998).
De acordo com o que afi rmamos no início desse item, a Bíblia é um livro 
diferente, porque se trata de uma obra considerada pelos sagrada cristãos. A 
parte que chamamos de Antigo Testamento contém livros sagrados dos judeus. 
O conjunto do Antigo e do Novo Testamento é o que é considerado sagrado para 
os cristãos. Partes do Antigo Testamento também são considerados para os 
islâmicos.
Contudo, se faz necessário entender que, por se tratar de livros sagrados, 
não estão fora da história, e nem caíram diretamente do céu. Pelo contrário, a 
Bíblia tem esse caráter sagrado porque revela o rosto de Deus da vida, que se 
manifesta na história, nas lutas em favor da vida com dignidade e justiça para 
todos, principalmente para as pessoas empobrecidas e marginalizadas. É na 
defesa e promoção da vida que a Bíblia ganha caráter sagrado e se torna Palavra 
de Deus. 
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
A história da Bíblia pode ser comparada à história de uma casa, que começou 
pequenina e pobre, com poucos cômodos, mas ao longo dos anos foi passando 
por reformas, recebendo acréscimos, novos cômodos, até tornar-se um enorme 
casarão. Conforme dito anteriormente, a Bíblia levou mais de mil anos para 
ser compilada. Ao ser iniciada, foi a partir de pequenas histórias de libertação 
queforam contadas a partir da oralidade, posteriormente sendo registradas por 
escrito, celebradas, recontadas, atualizadas em novos acontecimentos e sofrendo 
acréscimos com novas histórias, memórias, cânticos, provérbios, leis e orações, 
tudo passando por inúmeras revisões, até formar o livro que temos hoje em mãos. 
Leia “A Parábola da porta”, do autor Carlos Mesters (2012, 
p.13-19), na tentativa de ilustrar a porta de entrada no mundo da 
Bíblia. Disponível em: <https://nfl emos.wordpress.com/2005/01/22/a-
parabola-da-porta/>.
Esta parábola descreve a história da explicação da Bíblia 
ao povo, faz ver como nasceu e onde estão as suas fontes de 
informação. Nasceu de noite, no meio da alegria do povo. Nasceu de 
dia, no meio da rua deserta e triste. Nasceu de dia e de noite, junto 
aos livros e às máquinas complicadas, num canto escuro da Casa do 
Povo. 
Dando continuidade na comparação da casinha que se tornou 
casarão, o que se percebe ao fi nal é um enorme casarão pronto, 
isto é o resultado da última revisão. O que pode complicar aos seus 
leitores é que essas reformas não são identifi cadas nos escritos, 
isso é a Bíblia. O seu todo apresenta hoje o resultado das últimas 
grandes reformas pelas quais passou: o Antigo Testamento revela 
predominantemente as formas que recebeu no período do pós-exílio 
(cerca de 400 a.C. até 200 d.C.) ao longo do processo em que se 
constituía o judaísmo.
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Situando o Antigo Testamento
Para compreendermos o nascimento da Bíblia, devemos voltar ao ano 
1.300 a.C., na terra de Canãa. Nessa época, grande parte da população vivia 
nas planícies férteis em torno de centros urbanos – pequenas cidades-estados, 
cercadas por muralhas –, e estava submetida ao domínio dos reis cananeus e do 
Faraó do Egito. Entretanto, havia um contingente menor de pessoas habitando 
nas regiões montanhosas de Canaã (Hebron, Betel e Siquém) e no deserto ao 
Sul (Bersabeia). Eram pequenas aldeias camponesas que possivelmente tiveram 
suas origens em assentamentos de famílias de pastores que se fi xavam nessas 
regiões, fora do controle dos centros urbanos. Em cada uma delas havia o costume 
de se venerar a memória do seu patriarca fundador, por exemplo: se venerava 
Sara e Abraão em Hebron; Isac e Rebeca em Bersabeia; Israel e Raquel em Betel 
e Jacó em Siquem. É nessas pequenas aldeias que se dá início à história de 
Israel. Tente visualizar as cidades acima citadas, no mapa:
Figura 1 - Mapa do mundo antigo
Fonte: Disponível em: <http://www.biblesociety.org/>. Acesso em: 6 out. 2017.
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
“Já os grupos urbanos e as aldeias camponesas das montanhas do Sul 
de Judá possuíam mais ou menos a mesma cultura: eram cananeus, e os 
seus deuses e deusas eram as divindades do panteão cananeu: El, Elohim, 
Aserá, Baal, Astarte, Anat, entre outros” (GERSTENBERGER, 2007, p. 169). 
Contudo, a vertente urbana da religião estava associada ao sistema de poder, e 
funcionava como religião ofi cial. Ensinava que as deusas e os deuses apoiavam 
e abençoavam o Faraó e os reis, se comunicando diretamente com eles. Estas 
divindades não estavam interessadas na vida das pessoas que trabalhavam, das 
pessoas pobres, marginalizadas ou escravizadas. Somente os reis e faraós eram 
considerados fi lhos de Deus (Sl 82,6-7). 
As outras pessoas deviam reverenciar e obedecer ao faraó e aos reis como 
se eles fossem os representes ofi ciais dos deuses na Terra, ou os próprios deuses 
em pessoa. Eram cultuados em grandes celebrações nos templos ofi ciais, e todas 
as pessoas deviam trazer-lhes oferendas, tributos, e submeter-se a trabalhar nas 
construções dos seus palácios e templos. Dentro das muralhas, na religião ofi cial, 
as divindades do panteão cananeu eram postas a serviço da legitimação do poder, 
da coleta de tributos e do acúmulo de riquezas e poder. 
Entre as aldeias camponesas nas montanhas, o culto aos deuses e às 
deusas estava vinculado aos diversos aspectos fundamentais da vida, como ter 
fi lhos, fertilidade dos campos e dos animais, saúde, amor, proteção, veneração 
aos antepassados etc. Eram os anciãos, pais, mães, quem realizavam o culto, e 
as oferendas eram praticamente simbólicas e raramente alguém fi cava mais rico 
ou mais pobre na vertente da religião camponesa. Era uma religião geralmente 
centrada na defesa e na promoção da vida, da identidade e das instituições que 
possibilitavam a vida nas condições ambientais das aldeias. 
Toda essa realidade se dava num contexto de uma sociedade patriarcal. Na 
política e na religião as mulheres tinham alguns espaços importantes, tanto nas 
cidades como nas vilas camponesas. No entanto, esses espaços e as próprias 
mulheres estavam subordinados ao controle dos homens. 
A crise dos grandes centros urbanos a partir de 1.200 a.C., causada por vários 
fatores, entre os quais a chamada “invasão dos povos do mar”, e o processo de 
resistência ao sistema de dominação das cidades-estado, fazem com que grupos 
de pastores, camponeses e gente marginalizada (hapirus) de Canaã, e pessoas 
escravizadas no Egito, encontrem nessas aldeias a possibilidade de viver longe 
da dura opressão imposta a eles pelos reis cananeus e pelo faraó. Essas pessoas 
vão aumentar as populações de Hebron, Bersabeia, Betel e Siquém. 
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Conheça um pouco mais sobre os hapirus: 
Entre os camponeses havia também os chamados hapirus, 
fugitivos que, para escapar aos tributos – impostos – e à corveia 
– trabalho forçado -, exigidos pelos reis e pelos faraós, iam para 
as montanhas, onde viviam da pilhagem – saque – ou então 
alugavam-se como soldados mercenários dos exércitos dos 
reis. Encontravam-se, sobretudo, no sul da Mesopotâmia. Eles 
apareciam como bandos inimigos, que ameaçavam as cidades 
por suas invasões. Em outros lugares, eram gente que se 
vendia voluntariamente para ser escrava. Sua situação no Egito 
apresentava muita semelhança com a dos hebreus, que deles 
herdaram até o nome (VILLAC; SCARDELAI, 2007, p. 14).
Os hapirus eram originários de Canãa e pessoas escravizadas no Egito. 
Buscavam encontrar nas aldeias a possibilidade de viver longe da dura opressão 
imposta a eles pelos reis cananeus e pelo faraó. Essas pessoas são fundamentais 
para o aumento da população de Hebron, Bersabeia, Betel e Siquém. 
Provavelmente, a partir de Betel e Siquém formam-se as tribos de Benjamim, 
Efraim e Manassés, e a partir de Hebron origina-se a tribo de Judá, que mais 
tarde englobará a Bersabeia. Este é o núcleo inicial de Israel, que se forma nas 
montanhas centrais da Palestina. 
Nesse processo, algum povo pode ter trazido o culto a Javé para dentro das 
aldeias e tribos de Israel. Javé parece ser uma divindade que veio de fora de Canaã 
(Ex 2,16;3,1-2; Dt 33,2; Jz 5,4; Hab 3,3). Javé é integrado ao panteão das tribos e 
aldeias camponesas, possivelmente como o Deus dos guerreiros e da guerra (cf. 
Ex 15,2-3; 14,14.24-25.27; Jz 4,14-15; 1Sm 17,47). Contudo, nas tribos e aldeias, 
estes guerreiros travam apenas guerras defensivas contra saqueadores. Seu culto 
acontecia no momento em que os camponeses necessitavam transformar seus 
instrumentos de trabalho em armas (1Sm 17,40-43) e formar linhas de guerreiros 
para defender a vida de suas famílias, suas colheitas, suas terras e sua liberdade.
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
O Sistema Tribal
O longo período pré-histórico da humanidade foi, possivelmente, uma época 
marcada por grupos menores e por bandos. Eram caçadores e coletores. Somente 
a partir do 10º milênio a.C. se conhecem, no antigo Oriente, processos de transição 
para a agricultura. Segundo Gerstenberger (2007, p. 29), “o tamanho ideal de 
grupos errantes na busca por alimentos era em torno de dez e trinta pessoas. 
Se considerar um grupo consanguíneo, logo se chega a um número desses, em 
analogia a grupos de primatas”. 
A partir dessas hordas humanasé que surgem no antigo Oriente famílias 
ampliadas, com uma estrutura de cunho patriarcal rigidamente genealógica. 
De acordo com o que sabemos, essas famílias se caracterizavam por serem 
econômica, jurídica e religiosamente autônomas. Suas casas, segundo os 
arqueólogos, nas cidades de Israel, não eram muito grandes. Havia um espaço 
para umas cincos até dez pessoas, não sendo possível abrigar uma família 
ampliada de até 30 ou 50 pessoas, como talvez fosse mais comum no interior.
 
Por se tratar de um grupo limitado, preocupado em conseguir alimentos 
comunitariamente, um grupo que partilhava todos os bens adquiridos, a comunidade 
clâmica desenvolveu ideias teológicas específi cas, relacionadas ao respeito, à 
sobrevivência do grupo e de seus integrantes, à sua saúde, sorte e procriação. 
Expressão típica da religiosidade desses grupos menores eram, por exemplo, os 
lamentos individuais no Antigo Testamento hebraico e no entorno de Israel. 
O sistema tribal marca a sociedade das montanhas nos séculos XII e XI a.C. 
Durante este período, as planícies ainda continuavam sob o controle dos reis 
cananeus e sob o jugo das cidades-estado. Foi um período antimonárquico. 
Dessa forma, no decorrer dos séculos XII e XI a.C. coexistiam na Palestina 
dois modelos sociais: na planície, as cidades-estado e suas monarquias; nas 
montanhas, o tribalismo camponês. Este último carregava a experiência dolorosa de 
séculos de espoliação por reis e faraós, que, por meio de suas expedições, muitas 
vezes anuais, arrasavam aldeias e plantações. Levavam o senso e a prática da 
contestação contra as cidades-estado da planície (VILLAC; SCARDELAI, 2007). 
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
O vídeo indicado nos ajuda a adentrarmos na caminhada do 
povo de Israel, de uma maneira popular, relacionando a história de 
hoje com a do povo antigo. 
Primeira parte: 
<https://www.youtube.com/watch?v=sdEm2K5Ue4E& feature
=youtu.be>.
Segunda parte:
<https://www.youtube.com/ watch?v=Z9Uux51qDes&feature
=youtu.be>.
O PoVo Que CaminHa: de Moisés a 
Josué
O projeto exodal expõe tensões vividas pelo povo de Israel durante a 
travessia do deserto. Além da realidade humana, o deserto na Bíblia simboliza 
o começo de um longo e penoso processo de libertação, que terá seu desfecho 
na entrada do povo na Terra Prometida. O caminho do Êxodo tem um sentido 
profundamente pedagógico (VILLAC; SCARDELAI, 2007), ou seja, sua história 
quer ensinar e manter viva na memória do povo uma grande lição de vida.
No projeto do êxodo está implícita uma busca contínua por libertação, que 
após ser contada oralmente é redigida por escritores que tinham interesse em 
preservar sua memória no meio popular da sociedade de Israel. É um projeto que 
vai se realizando aos poucos, mediante gestos concretos assumidos pelo povo, 
quando decidem não mais ser escravos. Recusam servir ao faraó e ao Egito, e 
daí um grupo de escravos (hebreus) decide traçar seu próprio destino. Esse povo 
vive uma experiência profunda ao caminhar pelo deserto com o seu Deus. O Deus 
que caminha com o seu povo é peregrino, habita em cabanas junto aos seus, e 
faz aliança com eles. 
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Do ponto de vista histórico, a saída do Egito e a entrada em Canaã estão 
notoriamente entre as narrativas mais complexas de todo o corpus de tradições 
que confl uíram no Antigo Testamento (MCDONALD, 2013). Há muito existe um 
substancial acordo em considerar que o percurso do êxodo e a ambientação 
topográfi ca da entrega da Lei sejam elementos muito tardios (do período pós-
exílico) inseridos na narrativa com o fi m de realizar uma ligação lógica entre 
os dois elementos da promessa: saída do Egito e tomada de posse da terra. 
(LIVERANI, 2008).
A imagem do deserto, no conjunto Êxodo-Números, não é de tipo pastoril, 
em que as tribos vivem à vontade; é, porém, do tipo “zona de refúgio” ou “terra de 
exílio”, numa perspectiva citadina de profundo mal-estar.
O caminho é muito complicado e perigoso, conforme Dt 8,15: “Deserto grande 
e terrível, povoado de serpentes abrasadoras e de escorpiões, terra de sede, onde 
não se encontra água”. Essa passagem é semelhante às preocupações logísticas 
para a travessia do deserto por parte dos exércitos assírios, como na expedição 
de Esarhaddon em Baza: um distrito remoto, uma extensão desértica e de terra 
salina, uma região de sede, com serpentes e escorpiões que cobrem a terra como 
formigas (LIVERANI, 2008). 
Também os exércitos da monarquia de Judá tinham atravessado o deserto, 
por exemplo, na expedição contra Mo’ab e à procura de água por parte de Moisés, 
que a faz brotar da rocha (Ex 17,1-6), corresponde à procura da água por parte 
dos “profetas” juntados ao exército naquela ocasião: “Cavai um grande número 
de fossos neste vale! Assim fala o Senhor: Não vereis vento nem chuva, todavia 
este vale se encherá de água e bebereis vós, vossos rebanhos e vossos animais 
de carga!” (2Rs 3,16-17). O milagre de Moisés, que purifi ca a água salobra (Ex 
15,22-25), corresponde ao análogo milagre de Eliseu (2Rs 2,19-22). 
As enormes difi culdades encontradas na travessia do deserto centram-se no 
motivo das murmurações sediciosas do povo contra Moisés (Ex 15,24;16,2;17,3; 
Nm 11,4-5;14,2-3;20,2-3). E de modo semelhante, as dúvidas sobre a possibilidade 
de ocupar Canaã concentram-se no motivo dos exploradores que em geral (salvo 
Josué e Caleb) dão informações não muito animadoras (Nm 13). Em ambas as 
situações, o povo se pergunta se não teria sido um grande erro dar ouvidos a 
Moisés (igual aos sacerdotes), abandonar o Egito (igual a Babilônia), para 
procurar por uma terra mais difícil, habitada por populações hostis e violentas. 
Os dois motivos, da sedição e dos exploradores, refl etem debates que devem ter 
acontecido entre quem propugnava o retorno e quem manifestava perplexidade 
ou sem dúvida preferia fi car numa terra de exílio que se mostrava habitável e 
próspera (LIVERANI, 2008). 
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Quando se descreve a travessia como uma realidade estranha e 
substancialmente desconhecida, foram utilizadas rotas de itinerários que deviam 
ser de uso de rotas militares ou comerciais, ou, em parte, talvez de percursos 
de peregrinação a lugares santos do deserto. Esses percursos não podiam 
deixar de utilizar velhas direções de transumância pastoril, levando em conta 
o condicionamento viário que no deserto é ditado pela presença de poços, de 
passagens montanhosas, de vaus (local raso no mar ou no rio, em que seja 
possível fazer a passagem a pé).
Contudo, os estudos dos itinerários do êxodo são difíceis de serem atestados, 
pois a maior parte dos topônimos – designação de um lugar, de uma região 
geográfi ca –, não aparece em outro lugar, e até a localização do Sinai é debatida. 
Alguns traçados fundamentais parecem reconhecíveis: a via sul-norte, do golfo 
de Aqaba à planície de Moab, através do deserto de Edom e o deserto de Moab, 
estão localizadas nas margens do deserto não tanto porque moabitas e edomitas 
neguem a passagem quanto porque ali passava a grande via das caravanas, 
onde o planalto não é mais cortado (como acontece mais a oeste) por profundos 
vales de difícil travessia (LIVERANI, 2008).
O livro de Josué retrata com intensa vivacidade a realização de uma primeira 
etapa da promessa de Deus: entrar na terra prometida. Além de ser o sexto livro 
da Bíblia, Josué é o primeiro dos livros que a Bíblia hebraica identifi ca como 
profetas anteriores. A Josué se juntam Jz, 1-2Sm e 1-2Rs, para formar o conjunto 
da historiografi a deuteronômica. 
A narrativa de Josué fala de acontecimentos ocorridos entre os séculos 
XIII e XI a.C. Provavelmente essa conquista ocorreu de forma lenta e gradual, 
compreendendo um processo que incluía guerras violentas, porém intercaladas 
por momentos de relativa paz e estabilidade. Essa fase chegou ao fi m durante 
um período de transição política, quecorresponde às primeiras tentativas de 
instalação da monarquia, com Saul. A história das tribos forma o conteúdo básico 
do livro de Josué, o qual pode ser dividido em três partes:
a) Js 1-12, que corresponde às narrativas sobre os acontecimentos da 
conquista propriamente dita, e traz como pano de fundo religioso o 
santuário de Guilgal;
b) Js 13-21, fala da distribuição, partilha e ocupação da terra entre as tribos;
c) Js 22-24, é dedicada ao personagem Josué até sua morte.
32
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
A ideia de sincronizar a história das 12 tribos faz parte de um programa do 
escritor, visando preparar um esquema que irá desaguar na confederação político-
nacional de Israel. Por isso, a história das tribos antecipa uma nova ordem social, 
um novo modelo baseado na partilha igualitária das propriedades. Dessa forma, 
o sistema tribal procura mostrar o estágio político que antecipa a monarquia, 
planejando um entrelaçamento entre as tribos e monarquia, ambos envolvem o 
contexto social, político e religioso da Aliança (VILLAC; SCARDELAI, 2007). 
A narrativa bíblica da conquista fundante é notoriamente, de acordo com 
Liverani (2008, p. 347):
Uma construção artifi cial, com a intenção de enfatizar a unidade 
de ação de todas as doze tribos. São evidentes numerosas 
contradições internas, devidas à inábil utilização de diferentes 
tradições estratifi cadas no tempo. Algumas tradições de raio 
nitidamente local (por exemplo, a tradição sobre os calebitas 
em Js 15,13-19) tinham por trás uma respeitabilidade que 
tornava impossível eliminá-las. Essas tradições relacionadas 
com percursos de transumância entre Negev e planaltos 
centrais podiam confi gurar muito melhor um ingresso na 
Palestina pelo sul (segundo a via “normal” para quem vem do 
Egito), o qual, porém, foi eliminado em favor de um ingresso de 
todo o povo pelo leste.
A narrativa que forma Js 6-8 se refere à conquista somente do território de 
Benjamim e de Efraim, depois de passado o Jordão. As narrativas da vitória sobre 
os reis dos amorreus do Sul são nitidamente separadas (Js 10) da vitória sobre 
Hasor no norte (Js 11). Essa justaposição de três vagas diferentes serve para 
conferir um sentido de conquista total. A distribuição dos territórios que é feita 
por sorteio (Nm 33,50-34,15) é totalmente artifi cial e não pode corresponder a 
nenhum processo de assentamento que seja historicamente plausível (pode, 
quando muito, servir de modelo operativo para os sobreviventes do período 
persa). A própria descrição dos territórios tribais (Js 13-19), diferente entre sul e 
norte, não pode ser compreendida senão à luz de eventos posteriores à época à 
qual pretende se referir. 
São tantas as incongruências e as estilizações que a narrativa do livro de 
Josué não pode, senão, ser lida em relação às intenções de um redator (de 
tradição deuteronomista) que tinha em mente os problemas de sua época e 
substancialmente o problema de retomada de posse da terra de Canaã por parte 
dos sobreviventes do exílio babilônio. Esse redator decidiu narrar a conquista-
modelo segundo os caracteres da unidade de ação e do forte confl ito em relação 
aos residentes. 
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Essas escolhas de fundo não eram nada esperadas: os sobreviventes da 
Babilônia eram (Esd 1,5) e não podiam deixar de ser de Judá e de Benjamim, 
ou seja, do núcleo fi nal do ex-reino de Judá conquistado por Nabucodonosor, 
portanto, duas tribos em doze. E o país hospedava uma pluralidade de povos 
nem todos igualmente estranhos, pois havia inclusive israelitas (javistas) não 
deportados, seja no Sul, seja no Norte, com os quais uma política de compromisso 
podia ser razoavelmente perseguida. O fato é que a narrativa parece refl etir uma 
política extremista, que era uma das opções (mas não a única possível) para os 
grupos dirigentes que pretendiam reconstruir um novo Israel. 
Para entender o que é a obra deuteronomista:
Para o Deuteronômio, mais que para qualquer outro livro bíblico, 
a interpretação depende do contexto hermenêutico que se supõe. De 
fato, esse escrito pode ser lido quer no contexto do pentateuco (os 
primeiros cinco livros da Bíblia), como o último livro da Torá, quer 
como a abertura programática da historiografi a deuteronomista.
Figura 2 - Os livros que fazem parte da historiografi a deuteronomista
Fonte: Adaptado de Römer (2010, p. 260).
O paradigma adotado no livro de Josué é o da guerra santa, de clara matriz 
deuteronomista, mas dotada de profundas raízes na ideologia siro-palestina 
desde os séculos da pressão assíria. A historiografi a deuteronomista o aplicou 
retrospectivamente a toda a história das relações entre Israel e os outros povos, 
não apenas na época da conquista, mas também na época dos juízes e depois no 
primeiro período monárquico. 
Os princípios fundamentais da guerra santa: Deus está conosco, combate 
ao nosso lado e garante a vitória; os inimigos, embora aparentemente mais 
fortes, não podem contar com igual apoio e estão destinados à derrota; as ações 
bélicas, porém, devem ser procedidas por adequada preparação votivo-cultural; 
todo erro ou falta nesse sentido seria punido com o insucesso; o fruto da vitória 
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
deve ser atribuído a Deus (que é seu artífi ce) e, portanto, deve ser ritualmente 
destruído sem dele tirar vantagem material. Como conclusão, se o povo for fi el a 
Deus, seguramente vencerá. E, ao contrário, se for derrotado, deverá procurar as 
causas do insucesso numa infi delidade sua (LIVERANI, 2008, p. 349).
Os povos estranhos serão substituídos pelo povo eleito, que pode tomar 
posse de um território já preparado – com cidades, casas e campos – desde que 
elimine sem piedade os habitantes anteriores e garanta a total devoção a Yahweh 
de todos os membros da nova comunidade que se pretende construir:
Depois, vocês atravessaram o Jordão e chegaram a Jericó, 
mas a classe poderosa de Jericó fez guerra contra vocês: os 
amorreus, os fereseus, os cananeus, os heteus, os gergeseus, 
os heveus e os jebuseus, mas eu os entreguei em suas mãos. 
Eu enviei grandes vespas diante de vocês, o que tirou de sua 
frente os dois reis amorreus; não foi com a espada de vocês, 
nem com seu arco. Dei para vocês uma terra pela qual vocês 
não se esforçaram, cidades que vocês não construíram, e nas 
quais vocês habitam; vinhas e olivais que vocês não plantaram, 
e dos quais vocês comem. (Js 24,11-13).
Na versão sacerdotal, a ideia de uma terra já preparada na qual se implanta 
prévia eliminação dos habitantes anteriores está analogamente presente, embora 
a ênfase seja posta na purifi cação cultual: 
Quando vocês atravessarem o rio Jordão e entrarem na terra de 
Canaã, expulsem todos os habitantes da terra da presença de 
vocês. Façam desaparecer todas as suas imagens esculpidas. 
Façam desaparecer todas as suas imagens fundidas, e 
eliminem todos os seus lugares altos. Tomem posse da terra 
e habitem nela, pois eu lhes dei essa terra, para que vocês a 
possuam (Nm 33,51-53).
No fundo, a ideia da conquista como total substituição de uma população 
anterior – exterminada – por uma que fosse importada, com o intuito de substituí-
la, não pode ter sido concebida antes que difundissem as deportações imperiais. 
Mas nos termos em que essa ideia foi formulada, ela se torna uma visão 
totalmente utópica, em sua implacável rigidez, e nem pode pertencer nem à época 
da primeira etnogenia, nem à do regresso do exílio: põe-se no plano do projeto 
ideal mais que da prática realização, fornece informações sobre a ideologia de 
quem o tinha formulado, mais que sobre os acontecimentos que se produziram. 
35
O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
A Fim de Compreender (Gn 1-11)
De acordo com a formação do Antigo Testamento, a história de Israel não 
começa com a criação ou com o chamado de Abraão. Dessa forma, embora o livro 
de Gênesis apareça no início da Bíblia,suas narrativas foram elaboradas muito 
tempo depois, já na terra de Israel. E provavelmente só por volta do ano 400 a.C. 
é que o Gênesis alcançará a forma como encontramos na Bíblia atualmente. Da 
mesma maneira como nós contamos a história do nosso país de forma diferente 
da que era contada 20 ou 30 anos atrás, também o povo de Israel, a cada nova 
etapa da vida, alterava a forma de contar a própria história. 
Muitas narrativas presentes no livro de Gênesis apresentam histórias de 
famílias, clãs, santuários ou instituições. Ora, as tribos se organizavam de forma 
autônoma e independente entre si, consequentemente, suas histórias também. 
Lentamente, no conjunto de Israel, essas “historietas” particulares iam sendo 
reelaboradas e agrupadas tanto em tradições orais como escritas. Dessa forma, 
após três ou quatro séculos de monarquia, após muitas releituras na separação 
dos reinos (cerca de 930 a.C.) e nas tentativas de reunifi cação de Ezequias (por 
700 a.C.) e de Josias (mais ou menos 620 a.C.), essas tradições serão integradas 
em escritos maiores como a história de um só povo. E tudo indica que o processo 
terá fi m com ampliações e releituras, somente quando o povo de Judá for levado 
para o exílio (598-530 a.C.), e quando os descendentes dos exilados retornarem 
e reconstituírem Judá (cerca de 400 a.C.). As duplicações e contradições são 
testemunhas do que encontramos no livro de Gênesis: 
- Duas narrativas da criação (1,1-2,4a e 2,4b-24);
- Duas genealogias de Caim (4,17-26 e 5,12-31);
- Duas genealogias de Sem (10,21-25 e 11,1-17);
- Duas narrativas do dilúvio combinadas (6,5-9,17);
- Duas narrativas da aliança entre Deus e Abraão (15-17);
- Duas expulsões de Agar (16-21);
- Três narrativas sobre os patriarcas e suas mulheres no estrangeiro (12,10-
20; 20; 26,1-11);
- Duas histórias combinadas de José (37-50).
36
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
As duplicações de uma mesma narrativa demonstram que foram 
escritas e/ou contadas em lugares e contextos diferentes. Por isso 
o estilo e o gênero literário não são os mesmos. Cada povo, no seu 
lugar de origem, possui um estilo próprio de contar e narrar as suas 
histórias. Por este motivo, não podemos analisar os textos duplicados 
de forma fundamentalista, pois perderiam a sua originalidade, e até 
incorreria em duvidarmos de sua autenticidade literária. 
Fonte: Rodrigues (2004, p. 45).
O livro de Gênesis é dividido em duas grandes partes: Na primeira, Gn 1-11, 
onde estão as narrativas sobre a origem do mundo, da vida e dos diversos povos; 
na segunda, Gn 12-50, onde encontramos as narrativas sobre os patriarcas e 
matriarcas das tribos de Israel; Abraão, Sara e Agar (12, 1-25,18); Isaac e Rebeca; 
e principalmente Jacó, com a fi lha e os 12 fi lhos de Lia, Zaquel, Bala e Zelfa 
(25,19-36,43); por fi m, a história de José (37,1-50,26). 
Ao abrirmos o livro do Gênesis encontramos os famosos relatos da Criação, 
a história de Adão e Eva, da serpente, de Caim e Abel, do Dilúvio e da Torre de 
Babel. Essas histórias nasceram ao longo da história do próprio povo de Israel 
infl uenciadas pela cultura dos povos do Antigo Oriente Próximo, especialmente da 
Mesopotâmia, do Egito e de Canaã, com os quais Israel conviveu.
De acordo com a concepção de mundo dos povos do Antigo Oriente Próximo, 
a terra tinha a forma de um disco plano, rodeada por águas e sustentada por 
colunas. As águas de baixo eram chamadas de águas inferiores, onde fi cavam o 
abismo e o xeol, a morada dos mortos. Sobre a terra se estendia o fi rmamento, 
numa espécie de arco ou uma tigela virada para baixo. Nesse fi rmamento estavam 
pendurados o Sol, a Lua e as estrelas. Acima do fi rmamento fi cavam as águas 
superiores, que saíam através das comportas, e mais acima estava a morada de 
Deus. Veja a fi gura a seguir:
37
O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Figura 3 – A concepção de mundo dos povos do antigo oriente próximo
Fonte: Disponível em: <http://leituraorante.comunidades.net/65279-2-aula-o-povo-de-isra-
el-e-a-criacao-do-mundo3>. Acesso em: 6 out. 2017.
Essa visão de mundo infl uenciou os autores de Gênesis 1 a 11. Além da 
cultura daquela época, é importante lembrar os principais acontecimentos da 
história de Israel, nos quais surgiram as páginas iniciais do livro do Gênesis. 
Vamos fazer esse percurso juntos? 
 
a) Os principais acontecimentos históricos
A partir das diferentes redações apresentadas, fi ca claro que o relato de 
Gênesis 1-11 é fruto de um longo processo histórico e recolhe histórias de várias 
gerações. A redação fi nal do livro de Gênesis aconteceu por volta dos anos 400 
a.C. As histórias narradas nesse livro passaram por um longo processo, foram 
contadas, escritas, reescritas e relidas durante as diferentes etapas da história de 
Israel. Vamos recordar os vários períodos dessa história?
• O período tribal: O período entre os anos 1250 e 1030 a.C. é conhecido 
como o período das aldeias comunitárias. O período das tribos. Nesse 
tempo em que não havia rei, o poder era descentralizado e as decisões 
eram tomadas em assembleias. A maioria da terra era propriedade coletiva. 
Nos primeiros tempos, o trabalho e seu fruto eram partilhados entre todos. 
38
 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Um tempo marcado pela igualdade e solidariedade. Algumas memórias 
desse período, por exemplo, a integração com a terra, foram preservadas 
em Gênesis 2.
• A monarquia: A monarquia em Israel ocorreu entre os anos 1030 a 586 
a.C. Apesar dos protestos de vários grupos do interior, surge a monarquia 
em Israel. O povo é governado por um rei, existe uma corte, e um templo. 
Aumentam a opressão, o endividamento e a escravidão, essa realidade 
está refl etida em Gênesis 3. Em 586 a.C. os babilônios dão fi m à 
monarquia de Israel e algumas lideranças são exiladas para a Babilônia 
(VASCONCELOS; SILVA, 2003).
• O exílio da Babilônia: O exílio da Babilônia ocorreu provavelmente entre 
os anos 586 a 539 a.C. O povo de Israel vivia um momento de profunda 
crise de identidade. Nesse período, a história de Israel e suas tradições, 
que já haviam sido escritas, são revistas e reelaboradas. Tanto em 
Jerusalém, como nos arredores da cidade e na Babilônia surgiram muitos 
escritos que hoje fazem parte da Bíblia. Por exemplo, na Babilônia surge o 
conhecido poema da Criação (1,1–2,4a) e a tradição da torre de Babel (Gn 
11,1-9). (VASCONCELOS; SILVA, 2003).
• O período persa: O domínio persa ocorreu entre os anos de 539 a 333 
a.C. O império persa favorece a reorganização dos povos dominados a 
partir da religião, exigindo em troca submissão política e pesados tributos. 
Alguns grupos de judeus exilados voltam para Jerusalém e reorganizam 
o povo a partir do Templo e da Lei, sob o governo de sacerdotes ofi ciais. 
Nesse período, conhecido como teocracia, multiplicam-se os sacrifícios 
e as exigências da Lei, especialmente das leis referentes à pureza e ao 
sábado (8,20-21) (KONINGS, 1997).
A redação fi nal dos livros de Gn, Ex, Lv, Nm e Dt, e a reunião dos livros que 
formam a Torah, conforme a tradição judaica, e Pentateuco, conforme a tradição 
cristã, são concluídas por volta do ano 400 a.C.
A partir de sua história e de sua cultura, os autores de Gênesis 1 a 11 deram 
suas respostas às necessidades de sua época, em contextos e lugares diferentes, 
porém essa história é tecida com a sabedoria acumulada de geração em geração. 
É preciso ler, deixar se envolver por essas narrativas e descobrir a riqueza dessa 
história.
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
 b) Em busca da mensagem de Gênesis 1-11
 Os relatos de Gênesis 1 a 11 procuram nos ajudar a entender mais 
sobre as origens da vida, a partir da religiosidade do povo de Israel, da sua 
crença no Deus único e criador de todas as coisas. Na tentativa de auxiliar o 
seu aprendizado, apresentamos algumas chaves para você ler as páginas iniciais 
desse livro: 
• Você deve saber que os relatos sobre a criaçãodo mundo e da 
humanidade não são exclusividades de Israel, do Egito e do Oriente 
Próximo. Também povos mais distantes, como Índia, China e África, 
produziram suas histórias sobre a origem do universo. Todas as culturas 
antigas produziram relatos da criação, inclusive no Brasil há vários contos 
indígenas da criação (MARQUES; NAKANOSE, 2007). 
• As narrativas de Gênesis 1-11 afi rmam que o Deus de Israel é o criador. 
Na região da Mesopotâmia, Canaã e Egito havia a crença na existência de 
divindades criadoras. Os relatos de Gênesis 1 a 11, mesmo de épocas 
diferentes e utilizando diversos nomes para Deus, atestam que o Deus de 
Israel é o criador do céu e da terra (Gn 1; Sl 121,2; 124,8; 134,3).
• Um Deus humano e próximo. Algumas narrativas do livro do Gênesis 
apresentam a imagem de um Deus presente na vida do ser humano. Um 
Deus oleiro: ele modela o 'adam e os animais a partir do solo; exerce 
também a função de construtor: da costela de Adão, ele constrói a mulher 
(Gn 2,21-22). Ele é agricultor: planta um jardim (2,7-8.19). Deus faz justiça 
aos oprimidos e não abandona o pecador à sua própria sorte (4,10.15). 
Um Deus libertador que não compactua com o projeto opressor (11,1-9).
• A petulância do ser humano. No jardim, mulher e o homem possuem 
liberdade e se relacionam com Deus e com todos os seres criados. A única 
proibição é não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. A 
serpente não convida à desobediência, mas sua argumentação atinge o ponto 
central do ser humano: "vós sereis como deuses, versados no bem e no mal" 
(3,5). A petulância do ser humano, especialmente dos reis e dos governantes 
que se colocam no lugar de Deus, provoca a destruição do paraíso. 
• A agressividade interrompe a fraternidade. A história de Caim e Abel 
é a primeira de uma série de histórias que apresentam confl itos entre 
irmãos. Caim é apresentado como agricultor e Abel como pastor. Essa 
história retrata os confl itos existentes entre agricultores e pastores. E 
nesse confl ito, Deus opta pelo mais fraco. A história exemplifi ca a ruptura 
da fraternidade como a raiz da violência.
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
• A realidade de injustiça provoca a aniquilação da natureza. A crescente 
realidade de injustiça e a concentração de poder provocam a destruição 
de toda a natureza: o Dilúvio. Na Babilônia, os judeus exilados entram 
em contato com histórias de inundações próprias da região. Os autores 
de Gênesis 6-7 fazem uma releitura dessas histórias, apresentando uma 
explicação para a sua realidade de destruição, com a intenção de provocar 
mudanças de comportamento na sociedade.
• Graciosidade de Deus. À medida que aumentam a violência e a maldade 
do ser humano, cresce a graça de Deus. A pessoa se distancia, mas Deus 
continua se aproximando e cuidando amorosamente de sua criação. A 
opção do Senhor é pela vida. Ele faz uma aliança com Noé e, por meio 
dele, com toda a humanidade: "Não haverá mais dilúvio para devastar a 
terra". (9,11). 
• A identidade do clã e a compaixão/misericórdia entre todos os povos. 
As histórias que estão em Gênesis 1-11 nasceram em lugares e épocas 
diferentes, mas foram unidas umas às outras por meio das genealogias. 
A intenção teológica dessas listas genealógicas é garantir a identidade 
do povo de Israel e a importância de desenvolver relações solidárias com 
todos os povos, uma vez que todos descendem de um único tronco.
• Dissipação e heterogeneidade: No episódio da Torre de Babel (Gn 
11,1-9), a dispersão e a diversidade de línguas impedem o projeto dos 
dominadores. Portanto, é castigo de Deus para os opressores, mas para 
os pobres e exilados é libertação. É a realização da bênção recebida em 
Gênesis 1,28 e renovada em Gn 9,1: "Sede fecundos, multiplicai-vos, 
enchei a terra".
• Prefácio à história de Israel. A lista dos descendentes de Sem nos faz 
chegar até Taré e seus fi lhos, entre os quais está Abraão. Dessa forma, a 
lista faz a passagem da história das origens para o tempo dos patriarcas. 
A bênção, renovada com Noé (9,1), terá continuidade com Abraão (12,1-
3). Deus lhe faz a promessa de que, por meio dele, todas as nações serão 
abençoadas. 
• Transgressão, admoestação e Nova Aliança. Nos relatos de Gênesis 1-11 
é possível perceber o esquema teológico de pecado, castigo e salvação. A 
situação de pecado provoca o castigo: o dilúvio e a morte, mas a partir de 
um resto, representado por Noé e seus descendentes, Deus renova a sua 
aliança e recria nova humanidade (9,9-10). Essa aliança será renovada com 
o povo de Israel e, a partir de Jesus, chegará a todos os povos. 
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Atividade de Estudos:
1) A harmonia acaba e aparecem as ambiguidades da vida. A narrativa 
de Gn 3, 1-24 está ligada a 2,4b-25, esta é uma das narrativas 
criadas na história de Israel para tentar explicar a origem do mal, da 
morte e do sofrimento. Apresenta comportamentos e instituições que 
auxiliam os povos a se organizarem, a fi m de viverem, superando o 
mal e a morte. 
 Leia Gn 3, 1-24 a partir da compreensão das características de Gn 
1-11 acima mencionadas, e procure identifi car as instituições que 
perpassam a narrativa e o possível contexto e simbologia em que 
essa narrativa foi escrita.
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c) Localizando o texto: Na tribulação nasce outra vez a esperança
O exílio da Babilônia é um marco na história de Israel. Os exilados fi caram 
sem terra, sem rei e sem templo. Eles perdem suas principais referências. A partir 
dessa situação de crise e perda de identidade, nasce a preocupação de explicar 
as razões da derrota e do exílio. Os sacerdotes, profetas e sábios procuravam dar 
uma resposta para aquele momento de profunda intranquilidade. As lideranças 
religiosas retomaram a história do povo, fazendo uma releitura e apontando novas 
possibilidades. Vamos relembrar outros fatos da história de Israel ocorridos um 
pouco antes do exílio.
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
Em 609 a.C. o faraó do Egito colocou Joaquim no trono de Judá e em troca 
exigiu pesados tributos. Em 605 a.C. o exército de Nabucodonosor, da Babilônia, 
derrotou o Egito, se apoderou da Síria e da Palestina. O rei Joaquim, em 602 a.C., 
deixou de pagar tributos para a Babilônia, e por causa disso provocou um grave 
confl ito (2Rs 24,1). O exército babilônico marchou contra Judá e cercou a cidade 
de Jerusalém (VASCONCELOS; SILVA, 2003).
Em 597 a.C. Jerusalém é invadida e a elite foi deportada para a Babilônia. 
O rei, a nobreza e os sacerdotes ofi ciais, entre eles o profeta Ezequiel, foram 
exilados. No lugar do rei Joaquim, os babilônios colocaram Sedecias. Alguns 
anos depois, o novo rei, movido por sua ambição, deixou de pagar tributos 
para a Babilônia. Desta vez a repressão é muito pior. Em 587 a.C. a cidade de 
Jerusalém foi invadida e destruída. A família do rei foi executada, sendo que o rei 
foi preso, torturado e levado para a Babilônia (2Rs 25,6-7; Jr 52,9-11). O templo 
foi saqueado e incendiado (Lm 2). 
A tomada de uma cidade e a deportação são realidades acompanhadas de 
gestos brutais. Em geral, as mulheres foram violentadas, muitas crianças atiradas 
contra as pedras, os guerreiros tiveram suas cabeças cortadas ou esfolados vivos 
(Lm 5). São cenas que não se apagam da memória daqueles que as vivenciaram. 
A segundadeportação atingiu pessoas ligadas à corte, grupos de cantores do 
templo, artesãos, comerciantes, agricultores e viticultores (2Rs 25,11-12). 
Na Babilônia, esse grupo é tratado como escravo, utilizado como mão de obra 
nas construções públicas, nas lavouras, na reconstrução de cidades destruídas e 
em outros trabalhos forçados: "Este povo foi despojado e saqueado, todos eles 
estão presos em cavernas, estão retidos em calabouços. Foram submetidos ao 
saque e não há quem os liberte; foram levados como despojo, e não há quem 
reclame a sua devolução" (Is 42,22). Muitos não enxergavam mais sentido na vida 
nem perspectivas quanto ao futuro. 
Em terra estrangeira, sem provisões ou condições de sustento, o povo entra 
em contato com a religião do império e se sentiu confuso em sua crença. Na 
Babilônia havia muitas divindades, Marduk, representado pelo Sol, era a mais 
importante, pois ele era considerado o criador do mundo e do ser humano. 
Segundo a crença ofi cial, essa divindade garantiria a vitória aos exércitos de 
Nabucodonosor. Entre as práticas religiosas mais populares na Babilônia, 
se destacava o culto à deusa Sin, representada pela Lua, e à deusa-planeta 
Ishtar. Muitas pessoas exiladas assumiram as divindades do império invasor. 
(VASCONCELOS; SILVA, 2003).
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O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
Por conta de todo o sofrimento experienciado, o povo exilado na Babilônia 
começa a questionar: Onde está o nosso Deus, Javé? Por que ele está nos 
castigando? A crise de fé e de identidade exige uma resposta. Nesse momento de 
muita dor e sofrimento, surgiram salmos, poesias, narrativas e outros escritos que 
recordavam as maravilhas que Deus realizou na vida do povo de Israel, desde as 
suas origens. As orações renovam a fé em Javé como o único criador de todas 
as coisas. Assim reza o povo: "Quão numerosas são tuas obras, Javé, e todas 
fi zeste com sabedoria! A terra está repleta das suas criaturas" (Sl 104,24). 
Um dos textos mais conhecidos no exílio da Babilônia é o poema litúrgico 
de Gênesis 1,1–2,4a, provavelmente escrito por sacerdotes exilados. Eles 
estruturaram o poema da criação com o refrão: "E Deus viu que era bom" (Gn 1,4; 
10.12.18.20.24). E depois de ter criado o ser humano, numa visão panorâmica de 
sua obra, dizem: "Deus viu tudo o que tinha feito: e era muito bom" (1,31). 
Numa realidade desordenada e devastada pela violência, os autores 
recordavam que o mundo criado por Deus é belo, ordenado, perfeito e bom. Os 
autores recordavam ao povo exilado que a sua condição não era a de escravo, 
mas de pessoas criadas à imagem e semelhança de Deus. Gênesis 1,1-2,4a 
é um convite aos exilados, de ontem e hoje, para rezar e renovar sua fé e sua 
esperança em Deus criador.
d) Interpretando o texto: Gn 1,1 a 2,4a
Atividade de Estudos:
1) Leia Gn 1,1 a 2,4a e escreva o que é criado em cada dia. Essa 
atividade será importante para você ter uma ideia de como cada 
elemento da criação se estrutura dentro da narrativa, bem como a 
descoberta do estilo literário. Boa sorte!
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 ELEMENTOS E FUNDAMENTOS BÍBLICOS
No início do poema da criação há um título: "No princípio, 
Deus criou o céu e a terra". Esta frase é uma síntese de todo o 
bloco e apresenta o tema principal: Deus cria o mundo. No Primeiro 
Testamento, tradicionalmente chamado de Antigo Testamento, o verbo 
criar, bara' em hebraico, é usado somente para a ação criativa de 
Deus. O nome de Deus aparece por 35 vezes apenas nesse poema, a 
terra e o fi rmamento aparecem por 21 vezes. Os autores insistem que 
o verdadeiro Deus não é Marduk, nem a deusa Sin, mas o Deus de 
Israel. Ele é o criador da terra e do céu, que signifi ca a totalidade do 
universo (Sl 89,11). 
O versículo 2 informa o que existia antes da criação: terra 
vazia e vaga, trevas, abismo e águas. No princípio era o caos. É a 
partir do caos que Deus fará surgir a criação. A desordem e o caos 
representam a situação do povo no exílio da Babilônia. De acordo 
com o poema babilônico, no princípio da criação só existiam as águas 
primordiais: o caos. O povo de Israel assimila a visão de mundo dos babilônios, 
porém, adaptando-a à sua realidade, declara a sua fé em Deus: o caos não surge 
de Deus, mas ele coloca ordem. Em Gênesis 1, o sopro de Deus paira sobre 
as águas. Não se trata de um vento destruidor, mas de um sopro que prepara e 
anuncia a palavra criadora de Deus: a vida (Sl 33,6).
"Deus disse: 'Haja luz', e houve luz" (Gn 1, 14). No primeiro dia, Deus cria a 
luz e a separa das trevas. O tema da separação dos elementos opostos aparece 
em várias narrativas de povos vizinhos. No Gênesis, os três primeiros dias são 
dias de separação. No relato bíblico, a separação não acontece por meio de um 
combate entre as divindades, conforme o relato da Babilônia, mas é um gesto de 
Deus. Após esse gesto, Deus dá nome à sua criação, confi rmando sua relação e 
responsabilidade com ela. 
À luz ele chama dia, e à treva, noite (Gn 1,3-5). No relato babilônico, a luz 
vem em primeiro lugar e pertence à divindade. Para os autores de Gênesis, a luz 
não é mais propriedade dos deuses. O abismo e a luz não são sagrados, são 
apenas criaturas de Deus. 
No segundo dia, Deus faz o fi rmamento (Gn 1,6-8). A ideia de que o céu 
separa as águas de cima e as de baixo está presente em outras culturas. O céu 
é pensado como uma placa de metal, que Deus pode abrir e fazer cair a chuva: 
"abriram-se as comportas do céu" (Gn 7,11; Jó 37,18). Dizer que Deus faz não se 
trata simplesmente de um chamado à existência, mas de uma fabricação. Ele não 
avalia esta obra. 
Os autores insistem 
que o verdadeiro 
Deus não é Marduk, 
nem a deusa Sin, 
mas o Deus de Israel. 
Ele é o criador da 
terra e do céu, que 
signifi ca a totalidade 
do universo (Sl 
89,11). 
A desordem e o 
caos representam a 
situação do povo no 
exílio da Babilônia.
45
O ANTIGO TESTAMENTO E SUA HISTÓRIA Capítulo 2 
No terceiro dia, cria a terra fi rme (Gn 1,9-13). As águas são recolhidas e 
aparece a terra fi rme. Está no coração e na boca do povo: "O céu foi feito com a 
palavra de Javé, e seu exército com o sopro de sua boca. Ele represa num dique 
as águas do mar, coloca os oceanos em reservatórios" (Sl 33,6-7). Os babilônios 
acreditam que Marduk mora no meio do oceano. No poema bíblico, o mar e a terra 
são criados pela palavra de Deus e pertencem a ele. Esta é a segunda criação 
avaliada como boa: "E Deus viu que era bom" (Gn 1,10).
A obra do terceiro dia ainda não está completa. É necessário que a terra 
produza vegetação e árvores. A origem está na palavra de Deus. Ele ordena que a 
terra produza seus frutos. Para Israel, a terra é criatura de Deus. A sua fertilidade 
não depende de uma divindade, mas ela produz naturalmente, segundo o que 
Deus ordena. E no fi nal, pela segunda vez nesse dia, temos a avaliação: "Deus 
viu que isso era bom" (Gn 1,12). 
No quarto dia, ocorre a criação de luzeiros no céu para separar o dia e a noite 
(Gn 1,14-19). A palavra de Deus chama à existência o Sol, a Lua, as estrelas. 
Os nomes sol e Lua não aparecem. Esses astros são divinizados pelos povos 
vizinhos de Israel, porém, no relato bíblico, eles são simplesmente luzeiros, cuja 
função é iluminar a terra e comandar o dia e a noite, os meses e as estações. Na 
Babilônia, acredita-se que o Sol, a Lua e as estrelas possuem o poder de controlar 
o destino das pessoas. Essa crença é desacreditada pelos autores de Gênesis 1, 
que evidenciam que os astros são criaturas de Deus.
No quinto dia, são criados animais pequenos e grandes (Gn 1,20-23).

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