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autor MARCELO OLIVEIRA CÂMARA 1ª edição SESES rio de janeiro 2018 RESPONSABILIDADE CIVIL Conselho editorial roberto paes e gisele lima Autor do original marcelo oliveira câmara Projeto editorial roberto paes Coordenação de produção gisele lima, paula r. de a. machado e aline karina rabello Projeto gráfico paulo vitor bastos Diagramação bfs media Revisão linguística bfs media Revisão de conteúdo renata furtado de barros Imagem de capa edwardolive | shutterstock.com Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2018. Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063 Sumário Prefácio 7 1. Elementos basilares de Responsabilidade Civil 9 Conceitos de responsabilidade 11 Previsões normativas 12 A responsabilidade civil e suas ramificações 12 A responsabilidade penal e Civil 12 A responsabilidade contratual e extracontratual 14 A responsabilidade subjetiva e objetiva 15 A responsabilidade objetiva 16 Quadro-geral da responsabilidade civil 18 Elementos da responsabilidade civil 19 Ato ilícito 19 Do uso de entendimentos jurídicos sedimentados 22 Nexo causal (provas) 22 Dano 24 Fontes online de estudos – breves comentários 26 2. O alto ilícito 33 Conceito de ato ilícito 34 Previsões normativas 35 Tipos de atos ilícitos 35 Ato ilícito gênero 36 A responsabilidade objetiva 38 Ato ilícito puro 43 Ato ilícito pelo abuso do direito 45 Excludentes de ilicitude 49 Estrito cumprimento do dever legal 50 Estado de necessidade 50 Legítima defesa 51 O ato ilícito na prática jurídica 51 3. O nexo causal 57 Nexo causal 58 Teorias 59 Exclusão do nexo causal 61 A provas e seus aspectos práticos do Poder Judiciário 65 O empoderamento endonormativo sumular 65 Demandismo versus Processismo 70 Entendimentos 75 Enunciados administrativos do STJ 76 Enunciados da Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos da Justiça Federal 77 Enunciados do fórum permanente de processualistas civis 77 Enunciados da I Jornada de Direito Processual Civil do Centro de Estudos da Justiça Federal 79 O nexo causal na prática jurídica 79 4. O dano 85 O dano – conceito 86 Danos típicos 90 Do Dano material (ou patrimonial) 90 Dano emergente (ou dano eventual ou dano positivo) 92 Lucro cessante (ou dano negativo ou lucro cessante frustrado) 93 Do dano moral (ou não material ou imaterial ou extrapatrimonial) 94 Dano à imagem 103 Danos atípicos 104 Dano pela perda de uma chance 104 Dano estético (ou morfológico) 104 Dano reflexo ou em ricochete 105 Dano existencial 106 O dano na prática 106 5. A responsabilidade civil em espécies 113 Direitos dos usuários de serviços públicos 114 Fundamentação 115 Aspectos relevantes 115 Conexão com outras normas – “Diálogo das fontes” 118 Princípios aplicáveis 119 Considerações finais – Código de proteção e defesa do usuário de serviços públicos 128 Drones 129 Fundamentação 130 Aspectos relevantes 131 Considerações finais – drones 142 7 Prefácio Prezados(as) alunos(as), A sociedade atual é complexa, imediatista e mutável como nunca foi. Neste con- junto de relações tais interações acabam violando a integridade constitucionalmente prevista, criando um cenário em que a responsabilidade civil deve ser ao mesmo tempo firme em seus princípios e flexível quanto à aplicação. Sendo assim, ousamos transcrever algumas reflexões basilares dentro de um contexto principiológico consa- grado. E também, oxigenarmos os temas que envolvem os ilícitos atuais. Nosso primeiro capítulo estuda os institutos fundamentais da responsabilidade civil, ato ilícito, nexo causal e dano, em uma perspectiva geral. Contextualizando e refletindo a necessidade do preenchimento de todos os institutos com fins de gerar, tecnicamente, a responsabilidade civil, dentro de um olhar eminentemente positivista. O segundo capítulo busca uma reflexão do que vem a ser o ato ilícito. Seu con- ceito positivado, suas distinções entre ato ilícito gênero e puro, tipos e excludentes. Já no terceiro capítulo trataremos do nexo causal, que ao nosso sentir é o “co- ração” da responsabilidade civil. Uma vez que todo o direito depende (seja pelo autor ou pelo réu) da constituição de provas. Buscamos uma reflexão da situação do aceso ao Judiciário sob uma perspectiva precedentalista do CNJ e dos tribunais. No quarto capítulo refletiremos sobre o dano, sua positivação e múltiplas fa- ces, sejam os danos típicos (material, moral, imagem) e atípicos (perda de uma chance, estético, reflexo, existencial). O quinto e último capítulo apresenta dois temas de pouca doutrina e inexis- tente jurisprudência. O código de proteção e defesa do usuário de serviços públi- cos, positivada principalmente pela lei 13.460 de 2017 e a temática dos “drones”. Neste capítulo nosso grande objetivo é o de estabelecer reflexão crítica de temas que “nasceram em 2017”. Temas estes que certamente introduzirão na responsa- bilidade civil novos conceitos. Agradeço à Universidade Estácio de Sá pela oportunidade de publicar minhas reflexões acerca da responsabilidade civil. Em especial à Professora Renata Furtado de Barros pelas orientações de ordem técnica e redacional. E também, à gestora Aline Karina Tostes Rabello Teixeira, pela tramitação administrativa que possibi- litou a execução e publicação. Bons estudos! Elementos basilares da Responsabilidade Civil 1 capítulo 1 • 10 Elementos basilares da Responsabilidade Civil O direito civil é um dos ramos do direito privado. Sua função é a de regular as relações sociais entre pessoas privadas. A lei 10.406 de 2002 é a principal lei que fundamenta tais relações. Mas a vida em sociedade gera inevitáveis conflitos de in- teresses e condutas. Na eventual judicialização dessas relações, o seu principal me- canismo de pacificação é a responsabilidade civil. Prevista (positivada) no Código Civil no seu título IX, divididos entre dois capítulos: o I - “Da Obrigação de Indenizar” (arts. 927 a 943) e o II - “Da Indenização” (arts. 944 a 954). Contendo 27 artigos que se relacionam com outros da mesma lei e tantas outras como a lei 8.078 de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), lei 13.105 de 2015 (Código de Processo Civil), lei 8.987 de 1995 (Regula as Concessões), entre outras forman- do um vasto sistema ao qual deve ser incluído as demais fontes do direito, como os precedentes judiciais, a doutrina, os costumes. Por tais motivos, a responsabilidade civil é a disciplina que estuda as poten- ciais consequências jurídicas das condutas de todas as pessoas (naturais ou jurídi- cas) que por ação ou omissão, negligência ou imprudência venham a causar danos a outra pessoa. Para isso refletiremos sobre aspectos introdutórios do ato ilícito, do nexo cau- sal e do dano. Tais elementos formam a estrutura fundamental da responsabilida- de civil. Nosso estudo envolverá, também os aspectos processuais com vistas ao entrosamento do binômio teoria/prática. Seja bem-vindo à Responsabilidade Civil, vamos começar! OBJETIVOS • Conceituar a responsabilidade civil; • Estudar os aspectos que sedimentam a responsabilidade civil; • Refletir sobre a necessidade da associação com a prática; • Avaliar o quadro gráfico da responsabilidade civil. capítulo 1 • 11 Conceitos de responsabilidade O direito tem um ditame que atravessa eras e deve ser profundamente refletido: Juris praecepta sunt haec: honeste vivere,neminem laedere, suum quique tribuere. (Tais são os preceitos do direito: viver honestamente, não lesar a ninguém, dar a cada um o que é seu). Este texto é de lavra de Eneu Domicio Ulpiano[1], que pode ser analisado da seguinte forma: se uma pessoa (natural ou jurídica) vive honestamente, com uma conduta reta, proba e escorreita, significará que nada deve a outrem, pois não lesou ninguém. Entretanto, em uma interpretação inversa, lê-se que ao viver desonestamente causará dano a outrem e deverá dar a esta pessoa algo, a título de indenização (aqui em sentido amplo). A responsabilidade civil incorre justamente neste condão. Ao sofrer algum tipo de dano, oriundo de um ato ilícito deve o causador deste (dano) indenizar a pessoa que a sofreu. Neste contexto, iniciamos o estudo da responsabilidade civil com uma análise de seu conceito perpassando pelos entendimentos de renomados juristas. O doutrinador Pablo Stolze[2] cita José de Aguiar Dias, “Toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade”. Temos como um dos precursores da sua sistematização o Professor e Desembargador aposentado pelo PJERJ Sérgio Cavalieri Filho[4] em sua obra Programa de Responsabilidade Civil assim prenuncia: Em seu sentido etimológico, responsabilidade exprime a ideia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge dessa ideia. Designa o dever de alguém ter de reparar o prejuízo decorrente da violação de outro dever jurídico. Em apertada síntese, responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário. Sendo assim, a responsabilidade civil é um ramo do direito que impõe a parti- cipação de uma pessoa em um processo instrumentalizado por meio de uma peti- ção inicial distribuída por outrem, que sofreu um dano, oriundo de um ato ilícito devidamente provado. E que após o devido processo legal (com ampla defesa e contraditório), pode gerar a obrigação de indenizar. capítulo 1 • 12 Previsões normativas Temos, in casu, as seguintes previsões normativas mínimas pertinentes à res- ponsabilidade civil de uma forma geral: a) Constituição Federal de 19884 – artigos: 1, III; 5, V, VI, VIII, IX, X, XI, XII, XXI, XXII, XXXII, XXXV, XLVII, XLIX, LXVII, §2o, 3o; 37 e seu parágrafo 6o; 220 entre outros; b) Lei 10.406 de 2002[5] – artigos: 186; 187; 188; 927 ao 954 e outros. c) Lei 8.078 de 1990[6] – artigos: 12 ao 20 e outros A responsabilidade civil e suas ramificações As ramificações da responsabilidade civil são a consequência da liberdade de ação do ser humano (como pessoa natural ou jurídica) e a consequente apuração da responsabilidade de seus atos. A responsabilidade penal e Civil De início, há um divisor de águas entre a responsabilidade civil e a penal. A ilicitude pode ser civil ou penal. Vamos estudá-las: A responsabilidade penal A responsabilidade diz respeito as normas jurídicas protetivas dos interesses sociais que objetivam o resguardo da integridade de bens de valores elevados e indisponíveis, dentre os quais, os direitos da personalidade do homem: a vida, a liberdade, a honra, a saúde física e mental, entre outros. A sanção à violação das regras de conduta de não lesar a integridade física e a propriedade de outrem são “pesadas”, justamente por serem infrações considera- das pela sociedade como de maior potencial ofensivo, por exemplo, no crime de homicídio do art. 121 do CP – Pena: reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. Como a descrição da conduta penal é sempre uma tipificação restrita, em princípio a responsabilidade penal ocasiona o dever de indenizar. Por essa razão, a sentença penal condenatória faz coisa julgada no cível quanto ao dever de indenizar o dano decorrente da conduta criminal, na forma dos arti- gos: 91, I do Código Penal; 63 do CPP e 515, VI do NCPC, a seguir transcritos: capítulo 1 • 13 Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal[7]. Art. 91 – São efeitos da condenação: I. Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; Decreto-lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal[8]. Art. 63 – Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a exe- cução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Lei 13.105 de 2015 – Código de Processo Civil[9]: Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: VI. A sentença penal condenatória transitada em julgado; Sendo assim, as jurisdições penal e civil em nosso país são independentes, mas há reflexos no juízo cível, não só sob o mencionado aspecto da sentença penal condenatória como também porque não podemos discutir no cível a existência do fato e da autoria do ato ilícito, se essas questões foram decididas no juízo criminal e encontram-se sob o manto da coisa julgada, art. 64 do CPP e 935 do CC: Decreto-lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal[10]: Art. 64 – Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil. Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil[11]. Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo ques- tionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. De outro modo, a sentença penal absolutória, por falta de provas quanto ao fato, quanto à autoria ou a que reconhece uma dirimente ou justificativa, sem es- tabelecer a culpa, por exemplo, não tem influência na ação indenizatória que pode resolver autonomamente toda a matéria em seu bojo. A responsabilidade civil A responsabilidade civil é uma conduta ilícita de repercussão menos gravosa. Sendo certo que nem toda conduta gera um ilícito civil é punível, descrita pela lei penal, já a recíproca é verdadeira, embora em ambas haja a responsabilidade. capítulo 1 • 14 A responsabilidade civil é assim considerada de menor gravidade e o interesse de reparação é privado, embora com interesse social, não afetando, a princípio, a segurança pública. Para o ilícito civil, embora se possam equacionar modalidades de reparação em espécie, o denominador comum será sempre, ao final a reparação em dinheiro como o lenitivo mais aproximado que existe no direito para reparar ou minorar um mal causado, seja ele de índole patrimonial ou exclusivamente moral, como atualmente permite expressamente a Constituição. A responsabilidade civil leva em conta, primordialmente, o dano, o prejuízo, o desequilíbrio patrimonial, embora em sede de dano exclusivamente moral o que se tem em mira é a dor psíquica ou o desconforto comportamental da vítima. No entanto, é básico que, se não houver dano ou prejuízo a ser ressarcido, não temos por que falar em responsabilidade civil: simplesmente não há por que responder. A responsabilidade contratual e extracontratual Existe uma distinção tradicional entre a responsabilidade contratual, que de- corre do inadimplemento de obrigação assumida no contrato, e a responsabilidade extracontratual (delitual ou aquiliana) que deflui da violação de obrigação ema- nada da lei. Na realidade, os fundamentos são os mesmos em ambas as hipóteses, como veremos a seguir. A responsabilidade contratual (ou negocial) Esta responsabilidade tem desempenhado importante papel para facilitar a prova da culpa do inadimplente. Entende a doutrina e a jurisprudência que, no caso da obrigação de resultado, assumida poruma das partes, o simples fato de ter ocorrido o inadimplemento importa em presunção de culpa, cabendo ao devedor que não cumpriu a sua obri- gação fazer a prova da ocorrência de força maior, caso fortuito, culpa do outro contratante ou outro fato que possa excluir a responsabilidade. capítulo 1 • 15 Para tanto, vejamos o arts. 389 e 390 da Lei 10.406 de 2002[12]: Título IV – Do Inadimplemento das Obrigações. Capítulo I – Disposições Gerais Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e hono- rários de advogado. Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se devia abster. A responsabilidade extracontratual (ou extranegocial) As cláusulas gerais na responsabilidade extracontratual são extraídas do siste- ma jurídico civil para a responsabilidade extracontratual. Há o direito de o prejudicado ser indenizado e o dever de o ofensor indenizar quando: a) a ofensa se der a qualquer direito (patrimonial, material ou imaterial – como o moral, à imagem, da personalidade etc.); b) a ofensa ocorrer em desrespeito à norma de ordem pública imperativa (v.g. abuso de direito – CC, 187); direito protegido por norma imperativa constitucio- nal (penal, administrativa etc.); c) o dano causado for apenas moral; d) por expressa especificação legal, ou quando a atividade normalmente desen- volvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem, independentemente de dolo ou culpa (responsabilidade objetiva – CC, 927 parágrafo único); e) a ofensa se der por desatendimento não especificado da boa-fé e dos bons costumes. Logo, a responsabilidade extracontratual deflui de um imperativo genérico de não causar dano. capítulo 1 • 16 A responsabilidade subjetiva e objetiva Examinando-se a atuação do causador do dano, a responsabilidade pode ser: A responsabilidade subjetiva Com base na culpa em sentido lato, culpa ou dolo. É a análise integral do art. 186 da lei 10.406 de 2002[13] que define o ato ilícito: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Tema este que foi analisado de maneira pormenorizada no capítulo 2 (ato ilícito). Destacamos que nesta modalidade temos a explícita utilização, para fins da apuração da responsabilidade, do art. 373 do NCPC[14], vejamos: Art. 373. O ônus da prova incumbe: I. Ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II. Ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. A análise deve ser sob a óptica de que o ônus da prova incumbe em que polo da ação se encontra, há o dever, sempre, de provar (estabelecendo o nexo de causalidade). Logo, por fim, na responsabilidade subjetiva o ônus da prova é, para a consti- tuição do direito, da parte Autora. A responsabilidade objetiva Independe de qualquer falha humana (culpa) ou desejo de causar dano (dolo) e decorre de uma simples relação de causalidade (nexo causal). Tal modalidade não necessita da prova efetiva para a constituição dos direitos do autor, flexibilizando assim o descrito no artigo 373 do NCPC anteriormen- te descrito. capítulo 1 • 17 Entretanto, tal modalidade de apuração não desonera de forma absoluta o dever do autor de constituir a prova, minimamente, do alegado. Conforme o art. 319, VI do NCPC[15]: Lei 13.105 de 2015 – NCPC Art. 319. A petição inicial indicará: (...) VI – as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; (...) Obs.: Provas – indicação, relevância, qualificação, eventual produção (Ex: perícia): Sedimenta o tema, por amostragem, o enunciado de súmula 330 do PJERJ[16]: Enunciado TJRJ no 330 – "Os princípios facilitadores da defesa do consumidor em juízo, notadamente o da inversão do ônus da prova, não exoneram o autor do ônus de fazer, a seu encargo, prova mínima do fato constitutivo do alegado direito: No tocante à responsabilidade civil objetiva no CC, temos como principal expoente o art. 927[17], parágrafo único do CC. Pois tal dispositivo é uma cláu- sula geral, ou seja, a responsabilidade civil será objetiva por determinação legal ou quando a atividade normalmente desenvolvida implicar risco. Desta resultando as demais previsões legais. Art. 927: Aquele que por ato ilícito causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo. Agora vamos ler o parágrafo único do artigo 927 CC[18]: Art. 927 Parágrafo único – haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano, implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem. Então há casos em que a responsabilidade civil será objetiva porque a natureza da atividade envolve risco. A lei não diz que a responsabilidade civil é objetiva, mas ela permite que o juiz examinando o caso concreto conclua que determinada natureza da atividade é de risco e passe a responsabilidade civil a ser objetiva. capítulo 1 • 18 Sendo assim, há responsabilidade civil objetiva quando a lei disser e quando no caso concreto você concluir que a natureza da atividade desenvolvida envol- ve risco. Como, por exemplo, quando quem causa o dano o exerce em ativida- de profissional. Tudo gira em torno da palavra atividade. Se a ação causar um dano, só isso é sufi ciente, a pessoa sabe que a ação dela é uma ação de risco. Se a ação dela é uma ação de risco, se a ação dela causar um dano, ela vai responder. Logo, apesar da responsabilidade objetiva desonerar o autor do ônus da prova, pois não se discute a culpa, isso não o desobriga de provar, minimamente o alegado. Quadro-geral da responsabilidade civil Pela fi gura a seguir, temos uma visão geral da responsabilidade civil em con- junto com os seus elementos: Responsabilidade Civil – art. 927 da Lei 10.406 de 2002: ATO ILÍCITO Lei 10.406/2002 Arts.: 186 e 187 DANO Lei 10.406/2002 Arts.: 944 NEXO CAUSAL Lei 13.105/2015 ARTIGOS: -319 -320 -373 A responsabilidade civil nesta imagem deve ser interpretada à luz do raciocí- nio de que o ato ilícito é a mola propulsora da responsabilidade civil. O primeiro passo a ser dado é a caracterização de sua existência e consequente enquadramento e que tal ato ilícito deve ter uma consequência, nominada de dano, seja este típi- co (previsto em norma) ou atípico (criação doutrinária). E, por fi m, não menos importante, ou o mais importante (como consequência de que o direito depende de provas para a sua constituição e desconstituição) o nexo causal, que como já citado, é efetivado por meio das provas. Sendo assim, o ato ilícito e o dano somente serão considerados como uteis à caracterização da responsabilidade civil diante da existência dos meios de prova necessários à sua existência ( nexo causal). capítulo 1 • 19 Elementos da responsabilidade civil Considerando o estudado, iremos pormenorizar os elementos da responsabi- lidade civil, destacando que será realizado o estudo pormenorizado destes temas nos capítulos seguintes assim divididos: Capítulo 2 – Ato ilícito Capítulo 3 – Nexo causal Capítulo 4 – Dano A principal fundamentação que esteia a ideia da responsabilidade civil é o art. 927 da lei 10.406 de 2002[19]: Título IX – Da responsabilidade civil Capítulo I – Da obrigação de indenizar Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obri- gado a repará-lo. (grifo nosso) O estudo aprofundado das expressões ato ilícito e dano são dois dos três prin- cipais objetos de estudo deste trabalho, em que incluímos o nexo causal, previsto na lei13.105 de 2015, previsto, em especial, no art. 373[20]: Capítulo XII – Das provas Seção I – Disposições gerais Art. 373. O ônus da prova incumbe: I. Ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II. Ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. A que passamos a apresentar, a título introdutório, nos itens a seguir. Ato ilícito É a conduta necessária para termos o início da possibilidade da responsabili- zação jurídica de alguém que comete ato que violente o direito de outrem de não ter violado o direito à sua própria incolumidade. capítulo 1 • 20 Sua expressa previsão está nos artigos 186 e 187 da Lei 10.406 de 2002[21]: Título III – Dos Atos Ilícitos: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. O ato ilícito na petição inicial Na confecção de uma petição inicial em sede de responsabilidade civil, deve- se adotar uma postura de análise de uma conjugação de leis. Em especial, mas não exclusivamente, a Lei 13.105 de 2015 – Código de Processo Civil (também chamado de Novo Código de Processo Civil ou NCPC ou ainda CPC/2015). Citamos os artigos 319, 320, 321 entre outros. Temos no art. 319[22], considerando o objetivo de nosso trabalho: Art. 319. A petição inicial indicará: (...) III. O fato e os fundamentos jurídicos do pedido; No tocante ao inciso III, temos que o fato é a situação jurídica que é tec- nicamente denominada de ato ilícito. Ao passo que os fundamentos jurídicos do pedido são uma complementação dos fatos, só que “convertida nas normas ofendidas” que têm uma variação beirando à infinitude, que pode variar desde a própria lei 10.406/2002 (principal objeto de nosso estudo), passando pela outra principal lei das relações privadas, lei 8.078/1990 (Código de Proteção e Defesa do Consumidor), “dialogando com outras fontes” (Claudia Lima Marques) em que, por mera amostragem, exemplificamos: • Lei 8.987 de 1995 – Dispõe sobre o regime de concessão e permissão de serviços públicos[23]. • Lei 9.503 de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro[24]. • Lei 9.656 de 1998 – Plano de Saúde[25]. • Lei 12.965 de 2014 – Marco Civil na internet[26]. capítulo 1 • 21 • Lei 13.460 – Código de proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públi- cos da administração pública[27]. • Normativo ABECS 006 – Envio de Cartão de Crédito[28]. • Circular BACEN 3.115 de 2002 – Regula a TED e a TEA[29]. • Circular BACEN 3.335 de 2006 – Regula o tempo de crédito da TED[30]. • CFM - Resolução 1.931 de 2009 – Código de Ética Médica[31]. • CFM - Resolução 1.621 de 2001 – Regula a cirurgia plástica[32]. • Código de Autorregulação Bancária[33]. • Circular SUSEP 215 de 2002 – Seguro stop loss[34]. Acrescentamos ao tema as regras estabelecidas na lei 10.406 de 2002 que tam- bém tem influência processual, destacando o prazo prescricional da responsabilidade civil, o art. 206, §3o, inciso V, que prevê o prazo de três anos para a reparação civil. Destacando o enunciado 419 do CJF (Conselho da Justiça Federal)[35], que atribui o prazo citado à responsabilidade contratual e extracontratual: Enunciado do CJF no 419 Art. 206, § 3o, V: O prazo prescricional de três anos para a pretensão de reparação civil aplica-se tanto à responsabilidade contratual quanto à responsabilidade extracontratual. Em detrimento do princípio da especialidade (ou especificidade), a lei 8.078 de 1990[36] aplica-se, apenas, às relações de consumo. E considerando o art. 27 desta lei, temos o prazo de cinco anos: Seção IV – Da Decadência e da Prescrição Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a conta- gem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. É interessante observar um entendimento do PJERJ acerca do prazo deca- dencial/prescricional, quando o ilícito decorrente de um vício do serviço (logo prazo decadencial previsto no art. 26 e incisos) é contabilizado em quinquenal em decorrência da súmula 207 do TJRJ[37]: Súmula TJRJ no 207 – Indenização por danos morais relação de consumo vício do ser- viço prescrição quinquenal. "A pretensão indenizatória decorrente de dano moral, deduzida com base em relação de consumo, ainda que fundada no vício do serviço, se sujeita ao prazo de prescrição quinquenal." capítulo 1 • 22 Referência: Processo Administrativo no 0013685-89.2011.8.19.0000 – Julgamento em 22/11//2010 - Relator: Desembargadora Leila Mariano. Votação unânime. Do uso de entendimentos jurídicos sedimentados Desde a confecção da petição inicial, considerando a atual determinação pro- cessual (lei 13.105/201538), é imprescindível que façamos uma análise do evento para seu enquadramento junto às proposições de entendimentos jurídicos sedi- mentados. A sua não tipificação fatalmente acarretará a sua improcedência liminar (art. 332) ou entendimento obstativo do recurso (art. 932). Capítulo III – Da improcedência liminar do pedido Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar: I. enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; II. acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justi- ça em julgamento de recursos repetitivos; III. entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; IV. enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local. Capítulo II - Da ordem dos processos no tribunal Art. 932. Incumbe ao relator: IV. Negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do pró- prio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; A que se pode concluir que todos os envolvidos na gestão do processo (advo- gados, defensores, ministério público e magistrados) deverão implementar junto aos documentos jurídicos de sua responsabilidade (petição inicial, contestação, denúncias, despachos, sentenças, acórdãos) em pleno alinhamento com os já cita- dos entendimentos. Tema este que será mais bem estudado no capítulo 3. capítulo 1 • 23 Nexo causal (provas) Temos no nexo causal um dos pontos mais importantes da responsabilidade civil. Pois é justamente o ponto que irá convergir o ato ilícito e o dano. Sem os quais inexistirá a responsabilidade civil, cuja exteriorização é a petição inicial. Na confecção de uma petição inicial em sede de responsabilidade civil, deve- se adotar uma postura de análise de uma conjugação de leis. Em especial, mas não exclusivamente, a lei 13.105 de 2015 – Código de Processo Civil (também chamado de Novo Código de Processo Civil ou NCPC ou ainda CPC/2015[39]). Citamos os artigos 319, 320, 321 entre outros. Temos no art. 319, considerando o objetivo de nosso trabalho: Art. 319. A petição inicial indicará: (...) VI. As provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; O nexo causal na petição inicial Tanto que prepondera na confecção de uma petição inicial, aliás, prepondera para a existência do próprio direito materializado na petição inicial são as provas. A sua inserção, existência, qualidade e origem direcionarãoo rumo do deslinde do processo. “Sem provas, sem direito.”. Para tanto seguimos a determinação no mandamento da “lei de ritos” que determina às partes que integram o processo o ônus de constituição e desconsti- tuição dos seus direitos. Na sequência temos a constituição do direito pelo autor e pela desconstituição do direito do autor que incumbe ao réu. Tudo devidamente fundamentado no art. 373 da Lei 13.105/2015[40]: Art. 373. O ônus da prova incumbe: I. Ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II. O réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. § 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. Em que teremos uma reflexão mais aprofundada por conta do capítulo 3 (Nexo Causal). capítulo 1 • 24 Dano É a consequência do ato ilícito, configurado de forma típica o dano pode ser, por exemplo moral material, imagem etc. ou de forma atípica, dano pela perda de uma chance, dano reflexo etc. Danos típicos: Como já dito, estão previstos em lei. São eles: a) Do Dano material ou patrimonial (dano emergente, lucro cessante); b) Do Dano moral; c) Dano à imagem. a) Do Dano material (ou patrimonial): É a lesão ao patrimônio material da pessoa. Facilmente configurável por meio do dano à “coisa”. Modifica a qualidade e a realidade e, por consectário, a valora- ção do patrimônio material e extramaterial da pessoa. b) Do Dano moral (ou imaterial ou extrapatrimonial): Consiste na lesão ao bem jurídico da pessoa em detrimento (por singela amos- tragem), em detrimento da liberdade, honra, família, profissão, sociedade, tristeza, do abalo psicológico etc. c) Dano à imagem: A imagem é o conjunto de traços e caracteres de uma pessoa que a individua- liza no meio social – logomarca, rosto, por meio da qual projeta-se, identifica-se e individualiza-se no meio social. Facilmente confundível com o dano estético ou morfológico. São completa- mente diversos. Neste dano, a consequência são amputações, marcas, cicatrizes ou correlacionados. Enquanto que no dano à imagem a pessoa é constrangida pelo ato ilícito da exposição danosa ao público/sociedade de cunho vexatório. Danos atípicos: Apresentamos alguns de tipo de danos cuja construção é de origem não positivada. a) Dano pela perda de uma chance; b) Dano estético (ou morfológico); c) Dano reflexo ou em ricochete; d) Dano existencial. capítulo 1 • 25 Vamos estudá-los brevemente: a) Dano pela perda de uma chance: Originário da doutrina francesa que costumeiramente vem sendo aplicada em nossos tribunais (perte d’une chance) se dá nos casos em que o ato ilícito praticado pelo agente retira do lesado a real possibilidade de o mesmo obter uma situação futura melhor, isto é, uma possibilidade, uma chance de obter alguma vantagem ou ainda a chance de evitar algum prejuízo. b) Dano estético (ou morfológico): Construção jurisprudencial. Decorre de restrições nas relações sociais. São as deformidades físicas no corpo humano que provocam repulsa de ordem externa (perante a sociedade) e interna (perante a si). Podendo acarretar redução em sua capacidade laborativa (amputações e restrições). São as lesões perpetradas à vítima em função do ato ilícito que evidenciam inquestionáveis dores e sofrimentos que afetam sua esfera jurídica interna, carac- terizando-se como causa dos danos morais. c) Dano reflexo ou em ricochete: Criação doutrinária. Surge com o dano imposto à pessoa do lesado di- reto de tamanha gravidade que “reflete” nas pessoas de seu íntimo convívio sociofamiliar/relacional. d) Dano existencial: Criação doutrinária. Lesão à impossibilidade de viver o vínculo afetivo com a existência de pessoa natural. Acidente provocado que gera a morte de filhos, cau- sando aos seus familiares a impossibilidade de viver a sua existência. A principal fundamentação do dano é o art. 944 da lei 10.406 de 2002[41]: Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Indagamos, desde já (embora será aprofundado no capítulo 4) qual seria a in- terpretação da expressão “mede-se pela extensão do dano”. Para tanto, nos valemos de uma das principais fones de consulta quanto à lei 10.406 de 2002, os enuncia- dos do Centro de Estudos do Conselho da Justiça Federal, que, entre vários temos o seguinte: Enunciado do CJF no 379[42]: O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil. capítulo 1 • 26 Podemos refletir e concluir que a função punitiva e pedagógica tenha o escopo de punir o evento dano de tal forma que, pedagogicamente, desestimule o autor do dano a reincidir sobre a sua própria conduta. Em que teremos uma aproximação maior no capítulo 4 (O Dano). Fontes online de estudos – breves comentários a) Supremo Tribunal Federal– STF[43]: Navegação obrigatória de todo profissional do direito. Destacamos os estudos das súmulas vinculantes e sua interpretação pelo STF. b) Conselho Nacional de Justiça – CNJ[44]: Apesar de recente criação (14/06/2005) o CNJ assume uma posição de con- trole da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, entre outros. Destacamos suas resoluções, v.g., a Resolução CNJ 175 de 2013 – Normatiza a união estável entre Pessoas do mesmo Sexo45. c) Superior Tribunal de Justiça – STJ[46]: Com um repertório que atende diretamente às necessidades do profissional do direito que atua na seara da responsabilidade civil. É difícil destacar um único ponto, pois todo o site é relevante, mas a pesquisa de jurisprudência, bem como capítulo 1 • 27 suas súmulas são de navegação obrigatória para o entendimento da “última instân- cia” prática das demandas que versam sobre normas de cunho federal. d) Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – TJRJ[47]: Neste excelente site, sugerimos uma navegação em especial na página que permite uma pesquisa das jurisprudências, súmulas etc. e) TV Justiça[48]: Um dos melhores e confiáveis sites relacionados a temas jurídicos. Aulas, pro- gramas, notícias entre tantas outras possibilidades. Destacamos que pode ser apre- ciado em diversas plataformas. Como emissora pública, transmite pelo sistema a cabo, satélite (DHT), antenas parabólicas e internet, foi a primeira a transmitir ao vivo os julgamentos do Plenário da Suprema Corte brasileira. f ) Câmara dos Deputados[49]: Excelente navegabilidade para a busca de normas de cunho federal. g) Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos Judiciários – CEJ[50] : A I Jornada de Direito Civil que o Conselho da Justiça Federal promovida em Brasília, nos dias 12 e 13 de setembro de 2002, deu início a uma das mais capítulo 1 • 28 relevantes fontes de estudo do direito civil. Seu principal objetivo é o debate da principal lei que regula as relações entre pessoas privadas, a lei 10.406 de 2002 – Código Civil. A leitura de seus 612 enunciados (VII Jornada) é matéria obri- gatória para o civilista em geral e o que atua na responsabilidade civil de uma forma específica. Disponível em: <www.cjf.jus.br/cjf/CEJ-Coedi/jornadas-cej>. Acesso em: out. 2017. h) INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia[51]: É uma autarquia federal, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que tem como umas das missões prover confi ança à sociedade brasileira nas medições e nos produtos, por meio da metrologiae da avaliação da conformidade, promovendo a harmonização das relações de consu- mo, a inovação e a competitividade do País. O conhecimento de suas normas são obrigatórias por conta da ilicitude na desobediência às suas normatizações. i) BACEN – Banco Central do Brasil52: Certamente um dos sites correlacionados à responsabilidade civil das institui- ções fi nanceiras de maior relevância. Destacamos a sua farta normatização atinen- te a sua atividade fim. capítulo 1 • 29 ATIVIDADES Considerando nosso estudo, vamos aplicá-los sob a forma de um caso concreto: Salvador Moretti propôs ação de responsabilidade civil em face de Irmãos Marconi & Cia Ltda, argumentando que fez o seguro de seu veículo e este sofreu danos em decorrên- cia de sinistro envolvendo o desmoronamento de caixas enquanto aguardava para carregar produtos em determinado local no dia 27/6/2009. Destaca-se que a ação foi ajuizada em 10/10/2012. Considerando o texto, reflita sobre as seguintes proposições: 1. Início da contagem da vigência do prazo prescricional; 2. Existência de relação de consumo; 3. Norma adequada a ser aplicada e sua correspondente fundamentação; 4. Posicionamento do STJ. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] Disponível em: <http://direitopucpr.blogspot.com.br/2008/08/ulpiano-e-suas-trs-premissas.html>. Acesso em 17 de agosto de 2017. [2] GAGLIANO, Pablo Stolze, Novo Curso de Direito Civil - Responsabilidade Civil - v. III – 9. ed., Editora Saraiva, 2011, p. 43. [3] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil – 8. ed., Editora Atlas, 2008, p. 2. [4] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 17 de agosto de 2017. [5] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em: 17 de agosto de 2017. [6] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acesso em 18 de agosto de 2017. [7] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848.htm>. Acesso em 18 de agosto de 2017. [8] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm>. Acesso em: 18 de agosto de 2017. [9] Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [10] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. capítulo 1 • 30 [11] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [12] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [13] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [14] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [15] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 19 de agosto de 2017. [16] Disponível em: <http://portaltj.tjrj.jus.br/documents/10136/18187/sumulas.pdf?=10>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [17] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [18] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [19] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [20] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [21] Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 20 de agosto de 2017. [22] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [23] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8987cons.htm. Acesso em 20: de agosto de 2017. [24] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [25] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9656.htm>. Acesso em: 20 de agosto de 2017. [26] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm>. Acesso em: 21 de agosto de 2017. [27] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13460.htm>. Acesso em: 21 de agosto de 2017. [28] Disponível em: <http://www.abecs.org.br/app/webroot/files/ media/4/1/8/0951498cb462a07c370f8fcc45ca7.pdf>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. capítulo 1 • 31 [29] Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/circ/2002/pdf/circ_3115_v3_L.pdf>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [30] Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadNormativo. asp?arquivo=/Lists/Normativos/Attachments/48167/Circ_3335_v1_O.pdf>. Acesso em 22 de agosto de 2017. [31] Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2009/1931_2009.htm>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [32] Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2001/1621_2001.htm>. Acesso em 22 de agosto de 2017. [33] Disponível em: <http://cms.autorregulacaobancaria.com.br/Arquivos/documentos/PDF/ Codigo%20de%20AR%20vigente.pdf>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [34] Disponível em: <http://www2.susep.gov.br/bibliotecaweb/docOriginal. aspx?tipo=1&codigo=12272>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [35] Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos- judiciarios-1/publicacoes-1/jornadas-cej/vii-jornada-direito-civil-2015.pdf>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [36] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [37] Disponível em: <http://portaltj.tjrj.jus.br/documents/10136/18187/sumulas.pdf?=10>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [38] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [39] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [40] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 22 de agosto de 2017. [41] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 22 de agosto de 2017. [42] Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos- judiciarios-1/publicacoes-1/jornadas-cej/vii-jornada-direito-civil-2015.pdf>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [43] Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarSumula.asp>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [44] Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [45] Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-normativos>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [46] Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. capítulo 1 • 32 [47] Disponível em: <http://www4.tjrj.jus.br/ejuris/ConsultarJurisprudencia.aspx>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [48] Disponível em: <www.tvjustica.jus.br>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [49] Disponível em: <http://www2.camara.leg.br>/. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [50] Disponível em: <www.cjf.jus.br/cjf/CEJ-Coedi/jornadas-cej>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [51] Disponível em: <http://inmetro.gov.br/>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [52] Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/buscaNormativo.asp>. Acesso em: 23 de agosto de 2017. [53] Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/ mediado/?componente=MON&sequencial=73909002&num_registro=201701266733&data=20170801&tipo=0&formato=PDF>. Acesso em: 24 de agosto de 2017. O alto ilícito 2 capítulo 2 • 34 O ato ilícito O ato ilícito é o primeiro dos três pressupostos necessários para a caracte- rização da responsabilidade civil. Neste capítulo estudaremos o seu conceito e previsões normativas. Em um segundo momento, avaliaremos os tipos de atos ilícitos e suas divisões em “gênero, puro e por abuso do direito” e seus desdobramentos. Também refle- tiremos sobre as excludentes de ilicitude como item descaracterizador da própria ilicitude. Ainda que o evento danoso exista factualmente. Por fim, teremos uma breve análise sob a óptica da prática jurídica e proces- sual e uma atividade que visa identificar os temas estudados. OBJETIVOS • Conceituar o ato ilícito; • Distinguir os seus tipos; • Estudar as excludentes de ilicitude; • Correlacionar o ato ilícito à prática jurídica. Conceito de ato ilícito É a conduta necessária para termos o início da possibilidade da responsabili- zação jurídica de alguém que comete ato que violente o direito de outrem de não ter violado o direito à incolumidade, por meio de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência. Para que o ato ilícito não seja configurado, visto que é o primeiro requisito da responsabilidade civil a ser preenchido, temos a chamada excludente de ilicitude, que não deve ser confundida com excludente de responsabilidade, eis que são institutos diversos e serão aprofundados ao longo deste capítulo. capítulo 2 • 35 Previsões normativas Considerando o tema, temos nos artigos 927; 186; 187 e 188 da lei 10.406 de 2002[1], as mais relevantes previsões legais pertinentes ao tema. Título IX – Da responsabilidade civil Capítulo I – Da obrigação de indenizar Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obri- gado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Título III – dos atos ilícitos Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I. os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II. a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstân- cias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo. Pelos quais passamos a estudar. Tipos de atos ilícitos A responsabilidade civil tem o seu início no cometimento do ato ilícito, que ao ser identificado nos artigos 186 e 187, exceto se houver uma excludente de ilicitude (art. 188) gerando a obrigação de reparar o dano. Para o tema, necessitamos da conjugação de todas as suas fundamentações. Iniciando pelo art. 927 que é complementado pelos arts. 186 e 187. capítulo 2 • 36 Ato ilícito gênero Sua tipificação está prevista no art. 927. Entretanto temos uma divisão dou- trinária envolvendo o seu caput e o parágrafo único. Vamos identificar e tratar de forma diferenciada. Considerando a sua natureza completamente diversa quanto ao tipo de responsabilidade subjetiva e objetiva. O art. 927 caput, e exclusivamente a este, nos traz a percepção da responsa- bilidade na modalidade subjetiva (estudada no capítulo 1, item 3.3.1), eis que o seu entendimento depende da conjugação com o art. 186 para a configuração da ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência (e que serão estudados no item 3.2). Como dito o art. 927 é a ponta de lança da responsabilidade civil. Vamos fazer sua pormenorização: a) “Aquele que (...)” Qualquer pessoa natural ou jurídica. Atentando ao fato de a pessoa natural ser incapaz e sua alteração nos arts. 3o e 4o por meio da lei 13.146/2015 que fez mudanças substanciais. A pessoa natural é o melhor vocábulo para a seara jurídica do direito civil. Eis que a expressão “pessoa física” apesar de ser usada comumente é mais bem posta no direito tributário em especial quanto às normas de declaração de imposto de renda. A lei 10.406 de 2002[2] consagrou a denominação pessoa natural quando assim determinou o legislador no seu particionamento. Parte geral – Livro I – Das pessoas – Título I – Das pessoas naturais. Corrobora esta assertiva o fato de que a doutrina reconhece e diz preponderar a teoria natalista, por força do art. 2o do CC[3]: “Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Por outro lado a pessoa jurídica tem a sua previsão legal à partir do art. 40 do Código Civil, especialmente no art. 44[4]: Título II – Das pessoas jurídicas Capítulo I – Disposições gerais Art. 40. As pessoas jurídicas são de direito público, interno ou externo, e de direito privado. capítulo 2 • 37 (...) Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I. as associações; II. as sociedades; III. as fundações. IV. as organizações religiosas; V. os partidos políticos; VI. as empresas individuais de responsabilidade limitada. b) “... por ato ilícito...”: Sua caracterização será estudada nos itens 3.2 e 3.3 c) “... causar dano a outrem...” O dano é a consequência do ato ilícito imposto (de forma típica ou atípica) que será estudado no capítulo 4. A expressão outrem envolve a necessidade, até por óbvio, de que o dano deve ser imposto à pessoa diversa da do seu causador. O “autodano” não é punível. Ao contrário, é causa de excludente de responsabilidade, nos termos do art. 945 do CC[5]; Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indeni- zação será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano. Considerando que a conduta da vítima foi a única capaz de impor a si mes- ma o seu dano, não há que se atribuir o dever de indenizar a quem quer que seja. É o caso, por exemplo, do automedicamento adicionado à superdosagem. Contrariando, in casu, não apenas a necessidade da devida prescrição médica, como o estipulado na bula oriunda do laboratório. d) “... fica obrigado a repará-lo.” Esta singela expressão alterou substancialmente o curso da responsabilidade ci- vil. Eis que, ainda que passados mais de 15 anos na lei 3.071 de 1916[6] – Código Civil estipulava à época (antes de sua revogação pela atual lei, a 10.406/2002), tínhamos uma única fundamentação que expressava toda a ideia não direta- mente da responsabilidade civil, mas do ato ilícito. E apenas a título ilustrati- vo colacionamos: capítulo 2 • 38 Título II – Dos atos ilícitos Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. O atual códex inseriu no contexto dos direitos das obrigações, além da obri- gação de dar (coisa certa/incerta), fazer e não fazer a obrigação de reparar (por consequência do ato ilícito), assim figurado: - Positivas - de fazer (arts. 247 a 249 e outros) - dar - coisa certa (arts. 233 a 242 e outros) - coisa incerta (arts. 243 a 246 e outros) - Negativa - não fazer (arts. 250 a 251 e outros) - Reparativa - ato ilícito (art. 927 e outros) A lei 10.406 de 2002 inseriu todo um título (IX) para referir-se à responsabili-dade civil, tendo como seu marco principal, inicial e positivado o art. 927. Tendo a “reparação” integrada ao rol das obrigações. Vamos refletir sobre a expressão reparação. Esta palavra significa “ato ou efeito de reparar, retratação de palavras injustas ou ofensivas”1. Podemos interpretar esta expressão no sentido amplo, mas que pode se desdobrar em espécies nas expressões indenizar, ressarcir e compensar, mas significará, sempre a consequência de ato ilícito. Em sede de sentença judicial, com a procedência da ação de responsabili- dade civil, condenará o réu em “reparar” (gênero) a, dependente do pedido, em uma obrigação de indenizar, ressarcir ou ainda compensar. Embora, na prática, as sentenças empregam, em vez da expressão “julgo procedente ação e condeno o réu a reparar” o usual é “julgo procedente ação e condeno o réu a indenizar.” A responsabilidade objetiva O art. 927 é uma fundamentação contraditória. Enquanto no seu caput temos a apuração da responsabilidade na modalidade subjetiva, temos no seu parágrafo único a responsabilidade objetiva. Basta algumas linhas para termos essa crucial capítulo 2 • 39 diferença. Em que devemos tomar muito cuidado ao “escrever/digitar” com base neste. Ao invocarmos a responsabilidade subjetiva, melhor escrever “caput do art. 927”. Ao que passo que ao nos referirmos à responsabilidade objetiva devemos nos expressar com “parágrafo único do art. 927”. Assim não há possibilidade de haver erros no uso deste artigo ambíguo. Passemos à análise da responsabilidade objetiva. Como já dito, está funda- mentado no parágrafo único do art. 927[8]: Art. 927. (...) Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente de- senvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Façamos uma análise minuciosa de suas palavras: a) “Haverá obrigação de reparar o dano...”: Nesta parte do texto temos uma absoluta congruência com caput. Haverá a “obrigação” quando identificado, demandado (com todo o devido processo legal) e sentenciado de forma procedente temos a reparação do dano. b) “... independentemente de culpa, ...”: Temos nesta expressão o “núcleo do tipo”, que justifica a responsabilidade objetiva. Em que na análise do dano não haverá ponderação sob a culpa. Inexistirá análise da ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência. Não deve haver preocupação com estes elementos subjetivos da culpa, mas deve haver ob- servância cuidadosa com o nexo de causalidade. O autor do dano (réu na ação/integrante do polo passivo da demanda) é que deverá desconstituir o direito do autor, art. 373, II do CPC (analisaremos no item 5). Bastando ao autor da ação (vítima do dano/integrante do polo ativo da demanda) estabelecer o nexo de causalidade a correlação entre o ato ilícito e o dano, como dita o caput do art. 927. Devendo provar de forma mínima, como preceitua, por analogia, ao enunciado 330 do PJERJ[9]: Súmula TJRJ no 330 – "Os princípios facilitadores da defesa do consumidor em juízo, notadamente o da inversão do ônus da prova, não exoneram o autor do ônus de fazer, a seu encargo, prova mínima do fato constitutivo do alegado direito." capítulo 2 • 40 c) “... nos casos especificados em lei, ...”: Aponta a principal lei que regula a relação entre particulares que, por óbvio, é impossível prever de todas as hipóteses da interação relacional da sociedade. Para tanto permite um verdadeiro “diálogo entre a fontes” (Claudia Lima Marques). Abrangendo, precipuamente a lei 10.406/2002, mas tantas outras. Nas palavras de Fabrício Zamprogna Matiello[10] temos: Quando a responsabilidade civil não estiver fundada na culpa, diz-se que é objetiva, ou seja, decorrente da simples verificação existência do evento e da lesão a direito alheio. Como fonte principal da responsabilidade objetiva tem-se a lei, pois dela é que emana o comando destinado a eliminar a culpa como fator necessário de vinculação entre a conduta e o resultado lesivo. É o que acontece em se tratan- do de responsabilidade civil do Estado, prevista como objetiva na Constituição da República (art. 37, §6o). Além do parágrafo único do artigo civilista em questão, temos: FUNDAMENTAÇÃO MOTIVAÇÃO 187 Abuso do direito 928 Fato da coisa 932/933 Fato de outrem 936 Animal 937 Ruína de coisa 938 Queda/lançamento de coisa Podemos pretensamente exemplificar hipóteses de responsabilidade objetiva em outras normas: FUNDAMENTAÇÃO MOTIVAÇÃO Lei 8.078/90, art. 12 Fato do produto Lei 8.078/90, art.14 Fato do serviço Lei 6.938/81, art. 14, §1o Dano ao meio ambiente capítulo 2 • 41 Ressaltamos que qualquer atividade não tipificada como crime (princípio da reserva legal ou da legalidade da pena) é lícita. Se eventualmente o negócio jurídico se enquadrar em alguma cláusula de nulidade jurídica, nos termos do art. 166 do CC, será passivo de responsabilização. Mas fora isso, como já ventila- do, a atividade é lícita. Tanto que a lei 8.078 de 1990[11] prevê, em seu art. 3, §2o, com bastante diversidade quem é o fornecedor e, também, a não especificidade da qualificação como serviço: Art. 3o Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou es- trangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produ- ção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribui- ção ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 2o Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remu- neração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. O raciocínio de James Eduardo Oliveira[12] nos ensina que: O exercício de uma atividade de risco não é ato ilícito. A elaboração de medicamentos, o transporte aéreo, as atividades nucleares, o fornecimento em massa de produtos e serviços, a administração pública, a relação de emprego, a criação de filhos, dentre ou- tras são consideradas pelo nosso legislador como atividades de risco, mas não ilícitas. Pelo contrário, a sociedade é conivente com tais atividades porque delas se beneficia de alguma forma. d) “... ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. As expressões “atividade e risco” são palavras centrais na interpretação des- ta fundamentação, tanto que gerou a chamada “teoria do risco pela atividade”. Consistindo que a atividade deve ser avaliada sobre o prisma do profissionalismo. Enquanto o risco tem sua origem no entendimento de que quanto maior o risco, maior o retorno financeiro. Por consectário, no desenvolvimento de uma atividade com intuito profissional quanto maior o risco, maior o lucro. Considerando que toda e qualquer atividade profissional envolve riscos, temos apenas que aferir qual o risco envolvido. Exemplificamos com o motorista profissional, o médico, o piloto de aeronave, entre outros. Cada uma detém certo nível de risco. Em ocorrendo o dano deve- se avaliar se o profissional nesta atividade está devidamente habilitado (licença, capítulo 2 • 42 diploma, curso, especialização) e qual o grau de zelo com fins de se evitar o evento dano, pois, de uma forma ou de outra, este é o responsável. E considerando a mo- dalidade da responsabilidade (objetiva), como já citado, deverá este profissional (no devido processo legal) se desincumbir ônus seu dos argumentos apresentados e minimamente provados pelo autor da ação (vítima do dano). Nas palavras de James Eduardo Oliveira[13], temos: Muito embora a redação se mostre, a rigor, um tanto quanto imprecisa, deve-se entender que o legislador desejou referir-se àquelas atividades que impliquemalto risco, ou um risco maior que o normal, e que geralmente correspondem a uma taxa maior de lucro, justificando um sistema mais severo de responsabilização. Façamos uma análise do mesmo entendimento oriundo dos enunciados do Conselho da Justiça Federal: Enunciado do CJF nº 448[14]: Art. 927. A regra do art. 927, parágrafo único, segunda parte, do CC aplica-se sempre que a atividade normalmente desenvolvida, mesmo sem defeito e não essencialmente perigosa, induza, por sua natureza, risco especial e diferenciado aos direitos de outrem. São critérios de avaliação desse risco, entre outros, a estatística, a prova técnica e as máximas de experiência. Convém apresentar que no caráter da função social do contrato, em que não apenas as partes contratantes detêm legitimidade para exigir o cumprimento do negócio jurídico realizado, mas a própria sociedade (de forma individual, coletiva ou difusa), pode e deve intervir quando há um ato ilícito que lhe tenha imposto um dano, como prevê o art. 421 do CC[15] interpretado em conjunto com o enunciado 446 do CJF[16]. Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Enunciado do CJF no 446: Art. 927. A responsabilidade civil prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do Código Civil deve levar em consideração não apenas a proteção da vítima e a atividade do ofensor, mas também a prevenção e o interesse da sociedade. Dado, em especial ao caráter da socialidade como princípio da lei 10.406 de 2002. capítulo 2 • 43 Por fim, neste item temos que a responsabilidade objetiva inscrita nesta fun- damentação abrange a reparação em diversos planos, seja de ordem material ou imaterial, como aponta o enunciado 555 do CJF[17]. Enunciado do CJF no 555: Os “direitos de outrem” mencionados no parágrafo único do art. 927 do Código Civil devem abranger não apenas a vida e a integridade física, mas tam- bém outros direitos, de caráter patrimonial ou extrapatrimonial. Ato ilícito puro Estudaremos o primeiro artigo que fundamenta a responsabilidade civil, con- ceituando o que vem a ser o próprio ato ilícito, assim prevê o art. 186 da lei 10.406 de 2002[18]: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou impru- dência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Tal fundamento gera a responsabilidade civil, visto na leitura do art. 927 a configuração do ato ilícito é pressuposto para a sua própria existência. Sem o ato ilícito sequer teríamos a responsabilidade civil e por óbvio o dano. O art. 186 é, em regra, o elencado para qualificar o ato ilícito. Decorre de uma conduta humana (comitiva ou omissiva), eivada de culpa (lato sensu), a qual se faz contrária ao ordenamento jurídico (ilicitude), e que causou dano a outrem. Destaca-se que a conduta humana não exime a pessoa não humana (pessoa ju- rídica). Ocorre que a pessoa jurídica é uma ficção que resulta da volição humana. De fato a situação concreta de reparação civil, tem como ponto comum o cenário criado com o preenchimento de sua tipificação. Vamos ao nosso estudo pormenorizado nesta importante fundamentação: a) Comete ato ilícito aquele (...): O legislador, pela redação dada ao dispositivo em análise, impede maiores e di- versas discussões em torno da definição de ato ilícito para fins civis. Considerando como tal todas as condutas que, ferindo o direito subjetivo alheio de não sofrer dano, foram praticadas com culpa pelo agente que contaria a lei, do que resulta o dever de indenizar. b) (...) que por ação (...): Ato comissivo, vontade deliberada de causar dano. capítulo 2 • 44 c) (...) omissão voluntária (...): Ato omissivo, ausência pessoal do dever de cuidar para evitar o dano. d) (...) negligência (...): Falta de atenção no momento em que lhe era exigida. e) (...) imprudência (...): Atitude irrefletida, intempestiva. f ) (...) e causar dano a outrem (...): Considerando a expressão “outrem” qualquer pessoa diferente da do próprio causador do dano. Pois se assim ocorresse haveria a ingerência da excludente de responsabilidade culpa exclusiva da vítima, nos termos do art. 945 do CC (estu- dado no item 3.1 “c”) g) (...) ainda que exclusivamente moral (...): Dano extrapatrimonial. CRFB/1988, art. 5, X c/c capitulo II do CC, Direitos da Personalidade. Orientamos-nos pelos enunciados do Conselho da Justiça Federal[19]: Enunciado do CJF no 159 Art. 186. O dano moral, assim compreendido todo dano extrapatrimonial, não se caracteriza quando há mero aborrecimento inerente a prejuízo material. Enunciado do CJF no 411 Art. 186. O descumprimento de contrato pode gerar dano moral quando en- volver valor fundamental protegido pela Constituição Federal de 1988. h) (...) Comete ato ilícito: Temos então o conceito de ato ilícito. Como consequência da articulação en- tre todos os demais itens. A imperícia no cenário do ato ilícito Questão que merece uma indagação é a que diz respeito à ausência da expres- são “imperícia” como tipificador do ato ilícito no art. 186 da lei 10.406. A imperícia então seria causa de não tipificação do ato ilícito? Cremos que não, pois o legislador assim não o desejou. E o profissional do di- reito não pode criar texto no lugar em que este inexiste. E o Estado Juiz não pode interpretar aquilo que o legislador não escreveu, pois estaria julgando extra petita. Entretanto isso não significa que a imperícia não gere responsabilidade civil. Tanto que no art. 951 da lei 10.406 de 2002[20] temos: capítulo 2 • 45 Lei 10.406 de 2002: Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho. O CJF assim se pronuncia sob a forma do enunciado 460[21]: Enunciado do CJF no 460 Art. 951. A responsabilidade subjetiva do profissional da área da saúde, nos termos do art. 951 do Código Civil e do art. 14, § 4o, do Código de Defesa do Consumidor, não afasta a sua responsabilidade objetiva pelo fato da coisa da qual tem a guarda, em caso de uso de aparelhos ou instrumentos que, por eventual disfunção, venham a causar danos a pacientes, sem prejuízo do direito regressivo do profissional em relação ao fornecedor do aparelho e sem prejuízo da ação direta do paciente, na condição de consumidor, contra tal fornecedor. Destacando que a imperícia é falta de conhecimento, ignorância, inabilidade. Entretanto, temos importantes vozes que afiançam que a imperícia integra o rol do art. 186 por via transversa. É o caso, por exemplo, de Sergio Branco[22] que cita outros autores: Para GUILHERME CALMON, deve ser registrado que, já que o Código cita expressa- mente as modalidades culposas da negligência e da imprudência, melhor seria deixar claro também a hipótese da imperícia. Tal lacuna, contudo, não permite que se considere também a imperícia no âmbito do ato ilícito do art. 186, já referido. Por outro lado, no entendimento de CARLOS ROBERTO GONÇALVES, o termo negli- gência, usado no art. 186, é amplo e abrange a ideia da imperícia, pois possui um sentido lato de omissão ao cumprimento de um dever. Apesar de tamanha celeuma, considero no tema que a imperícia é causa de res- ponsabilidade civil do profissional da saúde. Apenas. Quando causa dano ao seu paciente, nos termos do artigo já citado. Fora isso nos termos da Lei 10.406/2002 do art. 186 não pode ser tipificado como ato ilícito puro. Tanto que em exaustiva. Ato ilícito pelo abuso do direito Diferentemente do ato ilícito gênero (ou puro), em que a conduta por si é qualificada como ilícita, no ato ilícito espécie (ou equiparado) o agente que causa o danoé parte legítima para o exercício do direito que poderia ser exercido sem capítulo 2 • 46 nenhum tipo de impedimento. Entretanto ao exercê-lo ultrapassa os limites táci- tos impostos pela lei, no que tange ao seu exercício. A licitude do exercício do direito não deve servir como pretexto para que o cerne do próprio direito sirva ao seu despropósito de tal forma que implique ato ilícito. Posto que empregado de forma anormal. Vamos à leitura de sua fundamentação, o art. 187 da lei 10.406 de 2002[23]: Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Como se pode ler, não há impedimento legal para o exercício do direito. Mas quando o seu exercício ultrapassa as amarras da boa relação social, muitas vezes com o claro intuito de causar prejuízo a outrem. O uso desnecessário do sistema ao qual o direito se apoia em que se busca a retidão, a clareza, tudo objetivando à justiça, fica maculado quando empregado de forma contrária. Nas palavras de Sergio Cavalieri Filho[24] temos: “... não é necessária a consciência de se excederem, com o seu exercício, os limites im- postos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo seu fim social ou econômico do direito; basta que se excedam esses limites. Filiou-se o nosso Código à doutrina de Saliciles, a quem coube definir o abuso do direito como exercício anormal do direito, contrário à destinação econômica ou social do direito subjetivo, que, reprovado pela consciência pública ou social, excede, por consequência, o conteúdo do direito...” Tal assertiva doutrinária nos conduz ao entendimento de igual conclusão pelo enunciado 139 do CJJF[25]: Enunciado do CJF no 139 Art. 11. Os direitos da personalidade podem sofrer limitações, ainda que não especifica- mente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes. Convém afiançar que tal instituto é fruto de fundamento constitucional pre- visto na cláusula geral de inviolabilidade (a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas) inserta o art. 5, X, que assegura a indenização no plano moral ou material quando existente. Adiciona-se a esta ideia o caráter de artigo de aplicabilidade supra legal. Eis que aplicável em todos os ramos do direito. Por isso, muito acertado os enunciados 414 e 539 do CJF[26]: capítulo 2 • 47 Enunciado do CJF no 414: Art. 187. A cláusula geral do art. 187 do Código Civil tem fundamento constitucional nos princípios da solidariedade, devido processo legal e proteção da confiança, e aplica-se a todos os ramos do direito. Enunciado do CJF no 539 O abuso de direito é uma categoria jurídica autônoma em relação à responsabilidade civil. Por isso, o exercício abusivo de posições jurídicas desafia controle independente- mente de dano. Artigo 187 do Código Civil. Outro ponto de extrema relevância é o fato de que há construção jurispruden- cial e doutrinária sedimentada quanto à apuração do abuso do direito sob a forma da responsabilidade objetiva. A 1a Jornada de Direito Civil, datada de 12 a 13 de setembro de 2002, resultou no enunciado 37[27]. E o PJERJ em 2006 editou a súmula 127[28]. Estes com entendimentos idênticos: Desatacamos a exposição de motivos da súmula 127 do TJRJ[29]: Enunciado do CJF no 37: Art. 187. A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico. Súmula TJRJ no 127 – Abuso do direito configuração prova da culpa dispensabilidade. “Para a configuração do abuso do direito é dispensável a prova da culpa”. Referência: Súmula da Jurisprudência Predominante no 2006.146.00007 – Julgamen- to em 21/12/2006 – Relator: Desembargador Antonio José Azevedo Pinto. Votação unânime. Sobre o tema que constitui o cerne do enunciado em referência, vale lembrar a afirmação de Heloisa Carpena, quando afirma que “de acordo com a noção de abuso introduzida pelo Código de 2002, o exercício de cada direito deve respeitar seu espírito próprio, buscando assim a realização do ideal de justiça além da letra da lei. O critério do abuso não está apenas na intenção de causar danos, mas no desvio do direito de sua finalidade ou função social” Tal qual como no ato ilícito gênero, passemos a sua análise: a) Também comete ato ilícito (...): É considerado como ato ilícito, nos termos do próprio art. 186. b) (...) o titular de um direito que, ao exercê–lo, (...): Legitimidade ativa e passiva para o pleno exercício de algo que lhe seja garan- tido pelo direito. capítulo 2 • 48 c) (...) excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico (...): Ultrapassa os limites da razoabilidade econômica (cobrança vexatória) ou so- cial (uso desmesurado do conhecimento técnico sobre algo). O interesse para ser legítimo deve ser efetivado pelas vias apropriadas. Como uma execução (de con- trato, de cheque, de nota promissória, de aluguel, etc.). d) ou social (...): A socialidade é um dos pilares principiológicos da lei 10.406/2002 (junto com a eticidade e operabilidade). Ultrapassar os fins sociais significa que no exer- cício do direito o seu titular deve considerar o quanto custaria à pessoa ao qual se exige considerando os critérios da paz, ordem, solidariedade e harmonia na coletividade. e) (...) pela boa-fé (...): Confiança na realização contratual ausência de desconfiança na relação extra- contratual. Deve ser entendida sob o prisma da boa-fé objetiva (e não da subjetiva – de ordem psicológica), logo reta, proba, esperável, leal e correta. Eis que em todas as manifestações de vontade a conduta esperada é a mesma daquela que se oferta. Considerando o caráter de subjetividade deste instituto, é prudente que fa- çamos uma ponderação diferenciada. Para tanto colacionamos com o enunciado 412do CJF[30]: Enunciado do CJF no 412: Art. 187. As diversas hipóteses de exercício inadmissível de uma situação jurídica sub- jetiva, tais como supressio , tu quoque , surrectio e venire contra factum proprium, são concreções da boa-fé objetiva. Tais institutos serão utilizados para suprir lacunas dos deveres implícitos nos contratos, para tanto ampliamos seu texto sob a forma de análise dos textos lati- nos empregados. • Supressio: é a extinção de um direito pelo seu não exercício. • Surrectio: ao contrário da supressio é o direito que nasce pela prática reiterada de um ato. • Tu quoque: é um termo latim equivalente em português a “você também”. Quem des- cumpriu uma normal legal/contratual, não pode exigir que o outro a cumpra. • Venire contra factum proprium: significa “vir contra um fato próprio”. Ou seja, não é razoável que uma pessoa pratique determinado ato ou conjunto de atos e, em seguida, adote uma conduta diametralmente oposta. capítulo 2 • 49 f ) (...) pelos bons costumes: Aquilo que a sociedade entende como moralmente correto, com fins de boa convivência. Aplicável ao tempo, lugar, hábitos e pessoa. Da mesma forma que a boa-fé, este instituto é de possível interpretação dúbia. Analisemos sob a óptica do enunciado 413 do CJF[31]: Enunciado do CJF no 413: Art. 187. Os bons costumes previstos no art. 187 do CC têm natureza subjetiva, desti- nada ao controle da moralidade social de determinada época, e objetiva, para permitir a sindicância da violação dos negócios jurídicos em questões não abrangidas pela função social e pela boa-fé objetiva. Um costume de nossa sociedade que busca nas “redes sociais” uma exposição de seus hábitos, não pode considerar como ilícita a utilização de uma imagem obtida em um meio público e sem nenhuma intenção a não ser a sua mera “socialização”. Excludentes de ilicitude A excludente de ilicitude (diversa de excludente
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