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c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 199 Anestésicos mais Usados em Cirurgia Dermatológica – Farmacologia e Classificação segundo a Potência e o Modo de Ação Mônica Manela Azulay Olga Maria Rodrigues Ribeiro Leite Tiago Silveira Lima Capítulo 18.1 Introdução Anestésicos locais são substâncias que levam à perda da sensibilidade em uma área circunscrita do corpo pela inibição dos impulsos sensoriais ou por depressão da excitabilidade das terminações nervo- sas, sendo a ação destes reversível com completa recuperação da função nervosa e sem alteração da consciência. Os anestésicos locais são empregados para pre- venir o paciente da experiência dolorosa e viabilizar procedimentos cirúrgicos, promovendo transitória perda na sensibilidade com riscos e efeitos adversos minimizados. O aprendizado dos princípios básicos da aneste- sia local, inclusive no que se refere à farmacologia das substâncias utilizadas, é de suma importância para a formação do cirurgião dermatológico, uma vez que a cirurgia inicia-se pela anestesia. História A história dos anestésicos começa no período Inca, quando a planta Erythroxylum coca era usada pela monarquia durante rituais religiosos pelos seus efeitos. Ao longo do tempo, o hábito de mascar fo- lhas da “coca” se manteve na região do Peru, e em 1860, Niemann isolou o princípio ativo da planta, a cocaína. Em 1884, o cirurgião oftalmológico Karl Koller demonstrou que a anestesia geral poderia ser evitada com a aplicação da cocaína na conjuntiva. No século XX, foram criadas a procaína e a tetra- caína, responsáveis por vários dos efeitos colaterais conhecidos dos anestésicos, principalmente reações alérgicas. Já em 1943, Loefgren sintetizou a primei- ra amida anestésica, a lidocaína, revolucionando a história da anestesia tópica, por sua eficácia, versa- tilidade e menor índice de reações adversas. Mecanismo de ação A sensação dolorosa ocorre por meio da propa- gação neural do estímulo elétrico pela fibra nervosa. Tal propagação é possível graças a diferentes con- centrações elétricas entre o fluido extracelular com altos níveis de sódio e o fluido intracelular com altas concentrações de potássio. Dessa forma, em estado de repouso, a membrana externa da fibra nervosa é carregada positivamente, enquanto a membrana interna negativamente, ficando o potencial trans- membrana negativo e em torno de –60 a –70 mV. Esse potencial é mantido predominantemente pela ação da bomba de sódio e potássio, que transporta sódio para o meio extracelular e potássio para o intracelular contra um gradiente de concentração e, portanto, com gasto de energia. Quando ocorre estímulo doloroso, há uma insta- bilidade nos gradientes iônicos por meio da mem- brana, promovida pelo aumento da permeabilida- de da membrana ao sódio. A entrada desses íons Capítulo 18. Anestesia em Cirurgia Dermatológica n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 200 na célula nervosa pelos canais de sódio voltagem- dependentes, que são estruturas glicoproteicas lo- calizadas na membrana celular e funcionam como poros aquosos, promove uma despolarização mo- mentânea graças a uma inversão no potencial trans- membrana, podendo este chegar a +40 mV, desen- cadeando, assim, o potencial de ação. Os anestésicos locais agem interferindo na ativi- dade elétrica das fibras nervosas, inibindo a despo- larização mediante interferência no influxo de íons sódio. As substâncias anestésicas em contato com os tecidos promovem estabilização da membrana da fi- bra nervosa, aumentam o limiar de excitação elétri- ca e lentificam a propagação do impulso, reduzindo ou mesmo bloqueando o aumento do potencial de ação. Entretanto, o mecanismo pelo qual atuam as substâncias anestésicas ainda é controverso, exis- tindo diversas teorias que tentam explicar como os anestésicos locais agem por meio da membra- na neuronal e de alguma forma alteram a atividade dos canais de sódio. Atualmente, o mecanismo de ação mais acei- to consiste na ligação direta dos anestésicos locais sob a forma ionizada a receptores específicos dos canais de sódio da membrana axonal. A interação fármaco-receptor inativa o mecanismo que regula a entrada de íons sódios na célula nervosa, redu- zindo a despolarização e impedindo a propagação do estímulo. Contudo, o fato de que nem todos os anestésicos locais se apresentam na forma ionizada de atuação, como a benzocaína, por exemplo, sugere que haja outros mecanismos de ação, tais como a expansão da membrana e a distorção dos canais de sódio quando da presença de anestésico, inibindo o influ- xo de íons sódio para o interior celular. A anestesia local promove a interrupção primei- ramente de funções autonômicas, depois das sensiti- vo-motoras, pela inibição das sensibilidades térmica, dolorosa e tátil seguidas das sensibilidades à pressão e à vibração e, por último, das funções propriocepti- vas e motoras, ocorrendo a recuperação das funções na ordem inversa. Essa sequência é dependente do tipo de anestésico utilizado e do diâmetro e da mieli- nização das fibras condutoras, de forma que as mais finas e menos mielinizadas são as mais suscetíveis. As fibras que compõem os nervos são de diversos tamanhos, mas as principais na condução da dor são pequenas fibras C não mielinizadas e longas A mie- linizadas, que podem ser bloqueadas por pequenas e similares concentrações de anestésicos locais. Já as fibras que conduzem outras sensações como tato e pressão podem ser bloqueadas mais tardiamente. Portanto, durante o procedimento com a anestesia local o paciente poderá sentir o toque, a pressão, e deverá ser avisado para não ficar apreensivo. Estrutura química As substâncias utilizadas em anestesia local pos- suem estrutura química básica semelhante, com três porções: o anel aromático (lipofílico), uma cadeia intermediária e o grupo amina terminal (hidrofílico) (Figura 18.1.1). R2 Anel aromático N R1 Amina terminal Éster ou amida Cadeia Intermediária Figura 18.1.1 – Estrutura química geral dos anestésicos. (Fonte: Grekin RC, Auletta MJ. Local anesthesia in dermatologic surgery. J Am Acad Dermatol. 1988; 19(4):599-614.) A porção hidrofílica (ionizável) evita a precipita- ção do anestésico, facilitando sua dissolução desde o ponto de aplicação até o ponto de ação da subs- tância, além de interagir com o receptor celular. A porção lipofílica permite a passagem da molécula pela membrana lipídica da célula nervosa, que é o local de ação dos anestésicos. A cadeia intermediá- ria determina, além da classificação do anestésico (grupo éster ou amida), a alergenicidade, a potên- cia e o metabolismo associados a cada um desses grupos. Classificação Podemos classificar os anestésicos em dois gru- pos distintos, diferenciados por meio de sua cadeia intermediária, os ésteres e as amidas. Eles têm com- portamento bastante diferente quanto à farmaco- cinética e potencial alergênico. Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 201 Ésteres Os ésteres são metabolizados pela enzima coli- nesterase presente no plasma, e sua excreção é feita pelos rins. O ácido para-aminobenzoico (PABA) é um dos metabólitos desses anestésicos, e responsá- vel por grande parte das reações alérgicas nos pa- cientes. Pacientes com deficiência da colinesterase podem sofrer os efeitos do acúmulo sérico da subs- tância. Por todos esses motivos, são reservados prin- cipalmente para anestesia tópica, não injetável. Os anestésicos do grupo éster podem ainda apresentar reação alérgica cruzada com a benzocaína, a para- fenilediamina e as sulfonamidas, por seu metabólito ser o PABA. Entretanto, uma história prévia de rea- ção às substâncias do grupo éster não contraindica o uso das substâncias do grupo amida, podendo ser usadas com segurança,uma vez que não há reação cruzada entre os dois grupos. São eles: tetracaína, procaína, cloroprocaína, benzocaína, cocaína, dibucaína, proparacaína. Amidas As amidas são os anestésicos mais modernos, metabolizados pelas vias do citocromo P4503A4, no fígado. Os pacientes mais suscetíveis a efeitos cola- terais desses medicamentos são os que apresentam doença hepática (com redução de sua função meta- bólica), ou fazem uso de medicamentos que inibem a ação do citocromo P4503A4 (por aumentar a con- centração da substância no organismo), ou aqueles com fluxo sanguíneo reduzido para o fígado, como os portadores de insuficiência cardíaca ou usuários de anti-hipertensivos. Dentre as amidas destacamos: dibucaína, prilo- caína, bupivacaína, ropivacaína, etidocaína, mepi- vacaína, lidocaína. Anestesia infiltrativa Principais substâncias utilizadas (Tabelas 18.1.1 e 18.1.2) Procaína Possui início de ação moderada e duração da ação rápida, apresenta duração com vasoconstritor de 30-90 minutos e sem vasoconstritor de 15-30 mi- nutos. Pode ser usado clinicamente para infiltração na concentração de 0,5 e 1-2% para raquianestesia. Cloroprocaína Possui início de ação moderada e curta duração (30-60 minutos). Por sua baixa toxicidade sistêmica, é muito usada em obstetrícia e em cirurgias ambula- toriais rápidas como infiltração, com concentração de 0,5%, ou bloqueio de nervos periféricos com con- centração de 2%. Lidocaína É o anestésico local mais utilizado na atualidade por sua versatilidade, potência e segurança. Foi o primeiro agente anestésico do grupo amida a ser sintetizado, sendo até hoje um anestésico padrão que serve de comparação para os demais. Possui metabolismo hepático, com início de ação rápida (2-3 minutos) e duração de ação longa, atingindo com vasoconstritor de 1-6 horas e sem vasoconstri- tor de 30 minutos até 2 horas. Seu uso clínico pode ser tópico, por infiltração, bloqueio de nervos peri- féricos, raquianestesia e bloqueio epidural. As con- centrações mais utilizadas são 0,5, 1 e 2% e a dose máxima recomendada é de 7,0 mg/kg de peso com vasoconstritor (não devendo exceder 500 mg ou 13 tubetes anestésicos) e de 4,5 mg/kg de peso sem vasoconstritor (300 mg ou 8 tubetes). Mepivacaína Possui início de ação rápida (1,5 a 2 minutos) e duração longa (com vasoconstritor 1-6 horas e sem vasoconstritor 30 minutos-2 horas). Apresenta pa- drão anestésico similar à lidocaína e pode ser usado em infiltração, bloqueios periféricos, anestesia epi- dural e raquianestesia, porém é ineficaz como anes- tésico tópico. As concentrações mais usadas são 1% e 2%. As doses máximas recomendadas são seme- lhantes às da lidocaína com e sem vasoconstritor. Contudo, consegue produzir menos vasodilatação, podendo ser utilizada sem vasoconstritor em proce- dimentos curtos. Prilocaína Apresenta ação similar à da lidocaína, mas pro- voca menos vasodilatação e, portanto, pode ser usada sem associação com vasoconstritor, o que é muito interessante nas situações em que o vasocons- tritor está contraindicado. Seu início de ação é rápi- do, apresenta duração longa e, geralmente, é usado n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 202 na concentração de 3% e possui a felipressina como vasoconstritor. Essa substância é descrita como a menos tóxica dos anestésicos locais, porém, em al- tas doses, pode surgir meta-hemoglobinemia. Seu uso clínico pode ser feito em infiltrações, bloqueios periféricos, anestesia e epidural. Etidocaína Possui início de ação rápido (2-3 minutos) e du- ração de ação longa (2-6 horas). Está disponível nas concentrações 0,5, 1 e 1,5%, e a dose máxima reco- mendada é de 8,0 mg/kg (300 mg). Ropivacaína É um dos mais novos anestésicos locais do gru- po amida, pertencente ao mesmo grupo da mepi- vacaína e da bupivacaína. Apresenta longa dura- ção de ação anestésica com reduzida cardiotoxici- dade em relação a equivalentes doses de bupiva- caína. Por possuir início de ação mais rápido que a bupivacaína e duração do efeito anestésico mais longo que a lidocaína (2-6 horas), vem sendo consi- derada um anestésico local potencialmente útil em cirurgias dermatológicas, além de promover vaso- constrição isoladamente, o que é importante em Tabela 18.1.1 CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DOS ANESTÉSICOS LOCAIS Anestésicos Locais Concentrações Disponíveis (%) Vasoconstritor Início de Ação Duração de Ação Com Vaso Sem Vaso Éster • Procaína 0,5; 1; 2 Epinefrina 1:50.000 1:100.000 Moderado 6-10 min Curta 30-90 min Curta 15-30 min • Cloroprocaína 0,5; 2 Epinefrina 1:200.000 Moderado 6-12 min Curta 45-60 min Curta 30-45 min • Tetracaína 0,1; 0,25 Fenilefrina Lento Longa 4-8 h Longa 2-4 h Amida • Lidocaína 0,5; 1; 2 Epinefrina 1:50.000 1:200.000 Fenilefrina 1:2.500 Rápido 2-3 min Longa 1-6 h Moderada 30 min-2 h • Mepivacaína 1; 2; 3 Epinefrina 1:100.000 Levonordefrina 1:200.000 Rápido 1,5-2 min Longa 1-6 h Moderada 30 min-2 h • Prilocaína 0,5; 1; 2; 3 Epinefrina 1:200.000 Felipressina 0,03 UI/mL Rápido 2-4 min Longa 1-6 h Moderada 30 min-2 h • Bupivacaína 0,25; 0,5; 0,75 Epinefrina 1:200.000 Lento 15 min Longa 4-8 h Longa 2-4 h • Etidocaína 0,5; 1; 1,5 Epinefrina 1:200.000 Rápido 2-3 min Longa 2-6 h Longa 3 h • Ropivacaína 0,2; 0,75; 1 – Moderado 1-15 min – Longa 2-6 h Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 203 pacientes de risco. Está disponível nas concentra- ções de 0,2, 0,75 e 1%. A dose máxima recomen- dada é de 3 mg/kg (200 mg). Bupivacaína Possui início de ação lento e duração muito len- ta (com vasoconstritor 4-7 horas, podendo chegar a 10 horas, e sem vasoconstritor 2-4 horas). Pode ser usada para bloqueios periféricos, infiltração, ra- quianestesia e anestesia epidural. As concentrações mais habituais são: 0,25, 0,5 e 0,75%. É um anes- tésico muito útil em cirurgias mais longas e quando se deseja prolongar a analgesia no pós-operatório. A desvantagem do início de ação lento pode ser su- perada pela associação com quantidades iguais de lidocaína a 2%. Tabela 18.1.2 ANESTÉSICOS LOCAIS E RESPECTIVAS DOSES MÁXIMAS RECOMENDADAS EM ADULTOS Anestésicos Locais Dose Máxima Recomendada (adultos) Com Vaso Sem Vaso Éster • Procaína 1.000 mg 15 mg/kg 500 mg 7 mg/kg • Cloroprocaína 1.000 mg 15 mg/kg 800 mg 8,8 mg/kg • Tetracaína – 175 mg 2,5-3 mg/kg Amida • Lidocaína 500 mg 7 mg/kg 300 mg 4,5 mg/kg • Mepivacaína 500 mg 7 mg/kg 300 mg 4,5 mg/kg • Prilocaína 400 mg 8 mg/kg 400 mg 8 mg/kg • Bupivacaína 200 mg 2,5-3 mg/kg 200 mg 2,5-3 mg/kg • Etidocaína 400 mg 8 mg/kg 300 mg 4 mg/kg • Ropivacaína – 200 mg 3 mg/kg Tetracaína Apresenta início de ação lento e duração da ação longa. Quando associada a vasoconstritor, apresenta duração longa de 3-6 h e sem vasocons- tritor, de 2-3 h. Está presente nas concentrações de 0,1 e 0,25%. Seu principal uso é na raquianestesia e raramente é usada para infiltração ou bloqueios periféricos. Anestesia tópica A aplicação manual do anestésico sobre a super- fície de pele e mucosas, em veículo gel ou creme, já é prática usual e importante no dia a dia do der- matologista. Sua utilidade é indiscutível nos proce- dimentos de cosmiatria como laser, aplicação de to- xina botulínica e preenchedores cutâneos, peelings, microagulhamento, subcisão etc. Em cirurgia der- matológica, destacamos seu uso em eletrocirurgia, shaving de pequenas lesões, extração de molusco contagioso, entre outros. Pode também ser muito útil antes da aplicação de anestésicos injetáveis, re- duzindo a dor local, principalmente nos pacientes com fobia de agulha. Antes da aplicação, a área da pele deve ser bem lavada a fim de retirar qualquer resíduo (maquia- gens, cosméticos, filtros solares) que possa atra- palhar a absorção do medicamento. É importante lembrar que essa lavagemnão deve ser feita com produtos que contenham peróxido de benzoíla, que reduz a absorção da substância. O anestésico ideal- mente será espalhado sobre a pele com espátula ou abaixador de língua. São necessários uma cama- da grossa do produto e um tempo de permanên- cia adequado (entre 30-60 minutos a depender das substâncias) para eficácia ideal. Para potencializar a ação anestésica, pode-se lançar mão da massagem e/ou oclusão do produto. Este deve ser removido com gaze seca e, em seguida, a pele deve ser limpa com gaze úmida. Vale ressaltar que como os anestésicos injetá- veis, eles também podem causar os mesmos graves efeitos adversos se houver grande absorção sistê- mica, com destaque para os efeitos neurológicos. Por isso, devemos respeitar o limite de área e tempo de cada preparação disponível no mercado, princi- palmente nas crianças. Em 2007, o Food and Drug Administration (FDA) colocou o assunto em alerta, quando anunciou a morte de duas mulheres após oclusão de anestésico tópico nas pernas antes de n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 204 epilação a laser. Em 2006, o mesmo órgão descon- tinuou a comercialização de cinco marcas de anes- tésicos tópicos por motivo de segurança. É muito comum a manipulação farmacológica de fórmulas diversas com concentrações variáveis desses produ- tos, prática que pode ser perigosa. No Brasil, os produtos mais utilizados por der- matologistas são o EMLA® (lidocaína 2,5% + prilo- caína 2,5% em creme), o Dermomax® (lidocaína 4% em creme) e, mais recentemente, o Pliaglis® (lidocaí- na 7% + tetracaína 7%). Principais substâncias utilizadas Lidocaína A pomada de lidocaína a 5% (Xilocaína®) é co- nhecido e versátil anestésico de mucosas e pele não íntegra. Pode ser indicada nas situações inflama- tórias dolorosas da mucosa oral, como a aftose e a mucosite, e antes de pequenos procedimentos e aplicação de anestesia injetável da cavidade oral. Todos os anestésicos tópicos de pele íntegra também possuem lidocaína. Prilocaína Encontrada em anestesia tópica de pele íntegra associada à lidocaína. Proparacaína Usada em colírios oftalmológicos na concen- tração 0,5%, na dermatologia é útil na retirada de corpos estranhos dos olhos, nas pequenas cirurgias envolvendo a pálpebra e até na cirurgia micrográ- fica de Mohs. A dose é de 1-2 gotas em cada olho, tem efeito em 30 segundos, persistindo mais de 15 minutos. Pode ser reaplicada a cada 5-10 minutos se necessário, por no máximo sete vezes. É necessá- rio, após o procedimento, cobrir a pálpebra fechada com curativo, já que a anestesia inibe o reflexo de “piscar”. Dibucaína Também chamada de cinchocaína, apresenta po- tentes ação e toxicidade, por isso seu uso é mais limitado nas formulações tópicas, na concentração de 0,5-1% (Nupercainal®), para anestesia e alívio de prurido anorretal (hemorroidas, fissuras, inflama- ção), de queimaduras e de picadas de inseto, além de pequeno procedimentos da mucosa anal. Tetracaína Excelente anestésico tópico, hoje em dia é prati- camente seu único uso. São disponíveis no merca- do preparações oftalmológicas e cutâneas com essa substância. Os cuidados devem ser os mesmos já descritos anteriormente. Uso de vasoconstritor Considerações e vantagens Os anestésicos locais produzem vasodilatação pelo relaxamento do músculo liso, aumentando a absorção sistêmica do produto e diminuindo a quantidade da substância ativa no local da inje- ção. Portanto, quando substãncias vasoconstrito- ras, como a epinefrina, são adicionadas a uma so- lução anestésica, a absorção do anestésico para a circulação se faz mais lentamente, a quantidade de anestésico requerida é menor e o risco de toxicida- de sistêmica é consequentemente diminuído. Além disso, o uso de vasoconstritor aumenta a potência da anestesia, prolonga a duração do efeito da subs- tância e reduz o sangramento no local. As substâncias vasoconstritoras utilizadas em as- sociação com anestésicos locais classificam-se em dois grupos farmacológicos: aminas simpaticomimé- ticas (epinefrina, norepinefrina, fenilefrina e levonor- defrina) e análogos da vasopressina (felipressina). Contraindicações O uso de vasoconstritores está contraindicado nos dedos e na região peniana, embora muitos arti- gos tenham sido publicados atualmente descreven- do o sucesso de cirurgias realizadas com bloqueios digitais utilizando-se anestésicos contendo epinefri- na, desde que utilizados em concentrações aceitá- veis e seguras. Substâncias vasoconstritoras devem ser evita- das ou usadas com cautela nos pacientes com feo- cromocitoma, hipertireoidismo, hipertensão grave, glaucoma agudo e doença cardiovascular grave. Nos pacientes diabéticos não compensados e que recebem insulina, o risco do uso de vasoconstritores também é aumentado pelo efeito hiperglicemiante Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 205 da epinefrina. O uso de vasoconstritores no primeiro trimestre da gestação pode afetar a organogênese e, em altas doses, causar espasmo da artéria uterina, ocasionando a diminuição da perfusão placentária. No final da gravidez, pode retardar o trabalho de parto. É improvável, todavia, que pequenas quanti- dades utilizadas em cirurgias dermatológicas sejam danosas às pacientes. Contudo, qualquer indicação de não utilização de vasoconstritores deve ser previamente avaliada quanto às melhores propriedades anestésicas e ao menor risco de toxicidade advindos do seu emprego. Quando a contraindicação do uso de vasoconstrito- res adrenérgicos estiver estabelecida, pode-se optar pela felipressina (vasoconstritor análogo à vasopres- sina, hormônio liberado pela hipófise). A felipressina produz vasoconstrição apenas local, sendo eficaz na redução do fluxo sanguíneo, no prolongamento do efeito e na redução dos níveis plasmáticos do anes- tésico, embora sua eficácia constritora seja inferior à das aminas simpaticomiméticas. Como alternativa adicional nos casos de restri- ção aos vasoconstritores, anestésicos locais de longa duração de ação e que não apresentam efeito vaso- dilatador significativo, tais como a mepivacaína e a ropivacaína, podem ser utilizados. Efeitos adversos sistêmicos Relacionados com os anestésicos Toxicidade A toxicidade ocorre pela dosagem excessiva da substância na corrente sanguínea. A quantidade ne- cessária da substância para produzir uma overdose pode estar relacionada com o tipo de substância, a predisposição do indivíduo, a rápida absorção, a injeção intravascular acidental e biotransformação e eliminação lentas. Os sintomas são decorrentes da ação da substância em nível inicialmente de siste- ma nervoso central e, em seguida, cardiovascular e respiratório, e são diretamente proporcionais à do- sagem da substância no sangue. O quadro clínico de toxicidade pode ser leve e o paciente irá apresentar euforia e fala rápida, formi- gamento dos lábios, gosto metálico na boca e tremo- res. Esse quadro pode ir se intensificando ou já se apresentar moderado, em que o paciente apresenta fala mais lenta, desorientação e convulsão. Podem ocorrer casos mais graves, com colapso vascular e apneia. Os casos de toxicidade, em sua maioria, são transitórios e leves e não é necessário nenhum tratamento, porém o reconhecimento precoce é essencial e algumas medidas devem ser tomadas de acordo com as manifestações clínicas. Nos ca- sos leves, apenas colocar o paciente na posição de Trendelemburg; já nos moderados, são necessários oxigenoterapia e benzodiazepínicos endovenosos (EV). Nos quadros com diminuição da pressão arte- rial é importante uma expansão com soro fisiológico endovenoso e também pode-se usar efedrina (50 mg, por via intramuscular [IM], ou 10-20 mg EV). Havendo convulsões, além dos benzodiazepínicos endovenosos (Valium®10-20 mg), podem-se usar barbitúricos (Gardenal®) ou fenitoína (Hidantal®). Nos casos mais graves, nos quais ocorrem apneia e colapso circulatório, medidas intensivas devem ser instituídas como: intubação e assistência ventilató- ria, oxigenoterapia, uso de vasopressores, adminis- tração de fluidos endovenosos e até as manobras de ressuscitação cardiopulmonar. A toxicidade pode ser prevenida com algumas medidas, como pré-operatório adequado, evitar in- jeção endovenosa, observação do paciente durante a injeção do anestésico, injeção que deve ser feita lentamente. Nos casos de injeção mais profunda, como os bloqueios, a aspiração antes da injeção pre- vine as injeções intravasculares acidentais. Sempre que possível, deve-se optar pelo bloqueio nervoso, uma vez que se diminui a quantidade de anestésico a ser usada. Adicionalmente, menores volumes de anestésico, em concentrações mais baixas, devem ser utilizados, assim como substâncias apropriadas para cada ato, porém compatíveis com uma anes- tesia eficiente. Quando for necessário um maior vo- lume anestésico, deve-se registrar a quantidade que está sendo utilizada e usar parceladamente. Uma boa monitorização pode ser feita com o uso de um oxímetro de pulso durante o ato cirúrgico. Embora atualmente existam anestésicos locais de longa duração mais seguros quanto à cardiotoxici- dade, tais como a ropivacaína e a levobupivacaína (bupivacaína apenas com isômeros levógiros), o de- bate sobre a toxicidade dos anestésicos locais ainda permanece, uma vez que continuam a ser relatados casos de colapso cardiovascular e convulsões após bloqueios periféricos com essas substâncias. A es- colha de um anestésico ideal é de suma importân- cia, porém o mecanismo de bloqueio da condução nervosa em técnicas regionais (bloqueio reversível n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 206 dos canais de sódio) é o mesmo que desencadeia cardiotoxicidade e convulsões, portanto importân- cia adicional deve ser dada a técnicas anestésicas mais seguras e eficazes. Meta-hemoglobinemia Principalmente a prilocaína, mas também ben- zocaína, lidocaína e ainda tetracaína e cocaína são capazes de converter a hemoglobina em meta- hemoglobina. Esta, por sua vez, apresenta me- nor capacidade de transportar oxigênio e remover dióxido de carbono dos tecidos periféricos, o que pode gerar quadros gravíssimos. Os sinais e sinto- mas percebidos, em ordem crescente com relação aos níveis de meta-hemoglobinemia são: cianose, cefaleia, tontura, intolerância ao exercício, síncope, taquicardia, fadiga, confusão mental, taquipneia, taquicardia, convulsões, coma, sinais de acidose e morte. Esse quadro é muito mais comum nas crianças, particularmente nos menores de 6 meses dada a proporção de sua área corporal. Alergia Reações alérgicas aos anestésicos locais são ex- tremamente raras, representando menos de 1% das adversidades. Correspondem a reações anafiláticas (tipo I, mediadas por IgE) e de hipersensibilidade (tipo IV, relacionadas com a imunidade celular). Alergia aos anestésicos do grupo éster é muito mais frequente que a aos anestésicos do grupo ami- da, uma vez que reações anafiláticas são causadas principalmente pelo PABA, que se forma da meta- bolização do radical éster. Raramente os pacientes apresentam alergia aos anestésicos do grupo das amidas. Todavia, pode haver reação cruzada entre o radical éster com metilparabeno, usado como pre- servativo no veículo de vários anestésicos amida. Muitos pacientes que acreditam ser alérgicos aos anestésicos locais, na verdade sofreram em algum momento uma reação vasovagal ou uma resposta adversa pela injeção intravascular de lidocaína ou epinefrina. Não obstante, a suspeita de alergia ob- viamente deve ser sempre descartada. Apenas 20% das reações alérgicas são do tipo I, sendo 80% consequentes às reações do tipo IV. As primeiras resultam em: urticária, angioedema, disp- neia, tosse, cólicas abdominais, diarreia, náuseas, vômito, hipotensão e colapso cardiovascular. E as do tipo IV em dermatite de contato. O tratamento da reação de hipersensibilidade imediata consiste na injeção subcutânea de 0,5 mL (0,1-0,3 mL em crianças) de epinefrina 1:1.000, que pode ser repetida em intervalos de 5 a 15 minu- tos enquanto durarem os sintomas. Ventilação com máscara de oxigênio deve ser mantida. A hipoten- são é tratada com hidratação e vasopressores (meto- xamina, fenilefrina) endovenosos e broncoespasmo persistente com 250-500 mg de aminofilina endo- venosos. Os anti-histamínicos e corticosteroides não são antianafiláticos, porém são úteis na prevenção e na recorrência dos sintomas, evitando o uso de epinefrina adicional. Os anti-histamínicos devem ser mantidos por vários dias. Idiossincrasia Alguns pacientes desenvolvem reações adver- sas a quantidades normais de anestésicos apropria- damente administrados. O quadro assemelha-se a uma reação tóxica aos anestésicos. Parece que alguns indivíduos apresentam um limiar baixo aos efeitos tóxicos dos anestésicos, e o mais interessante é que quase sempre esses indivíduos não reagem quando da administração desses anestésicos asso- ciados à epinefrina. Entretanto, quando o anestésico puro é aplicado, mesmo em pequenas doses, ocor- re toxicidade. Basicamente nesses casos devem-se manter boa ventilação, suporte respiratório e cir- culatório adequados. Reações vagais A reação sistêmica mais comum com a adminis- tração de anestésicos locais é a “fobia de agulha” com uma resposta vasovagal em pacientes ansio- sos e com temor de agulha. Os sintomas geralmente são palidez, pele fria e úmida, taquipneia, diaforese, náuseas, bradicardia, hipotensão e até síncope; esse quadro pode ser revertido apenas com a posição de Trendelemburg e nos casos mais graves podem-se usar oxigenoterapia e inalação de aromáticos. O diagnóstico diferencial de uma reação vaso- vagal deve ser feito com o de toxicidade, reação anafilática e overdose de vasoconstritores. Esta últi- ma não oferece muita dificuldade, uma vez que na reação vagal observa-se hipotensão ao invés de hi- pertensão com o uso excessivo de vasoconstritores. Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 207 Já na reação anafilática serão observadas complica- ções respiratórias e, quanto à toxicidade, é fácil de ser descartada, uma vez que os episódios vasovagais ocorrem logo ao se iniciar a administração do anes- tésico, enquanto na toxicidade é necessária antes a absorção da substância, e na reação vasovagal não há sinais premonitórios de excitabilidade do sistema nervoso central. Os episódios vasovagais podem ser evitados adotando-se posição supina no pré e no pós-operatório imediato, bem como sedação. Relacionados com o vasoconstritor Idealmente, a dose máxima de concentração na mistura de epinefrina/lidocaína é de 1:100.000, sendo encontradas concentrações mais baixas no mercado. Diluições menores aumentam o risco de isquemia. A substãncia tem efeito vasoconstritor até na diluição de 1:1.000.000, como na solução tumes- cente de Klein. O efeito colateral menos grave da substância é aumentar a dor local, já que, pela instabilidade da epinefrina, são acrescentados conservantes e o pH é reduzido, o que gera acidose local e dor. Uma dica para minimizar a sensação dolorosa do paciente se- ria a mistura do vasoconstritor ao anestésico no mo- mento da cirurgia, poupando a solução dos conser- vantes, ou rediluindo a solução comercializada com lidocaína pura e/ou bicarbonato de sódio a 8,4%, aumentando o pH. A reação adversa mais comum da epinefrina é a taquicardia transitória, acompanhada por estado de excitação do paciente. Em casos mais graves, principalmente com injeções intravasculares ou em quantidades excessivas, podem surgir palpitações, sudorese,palidez, dor torácica, tremores, nervosis- mo, cefaleia e aumento na pressão arterial. A dose total de epinefrina não deve exceder cerca de 100 mL da solução na concentração de 1:100.000, quan- tidade exorbitante para cirurgias dermatológicas. Em associação com anestésicos locais, o efeito vasoconstritor das aminas simpaticomiméticas ocor- re por meio da estimulação de receptores α-adrenér- gicos localizados nas paredes das artérias menores. A epinefrina também é uma substância endóge- na produzida pelas suprarrenais quando o sistema nervoso central é ativado, atuando em receptores α-adrenérgicos (vasoconstrição periférica), β2-adre- nérgicos (broncodilatação e vasodilatação nos mús- culos esqueléticos) e β1-adrenérgicos (aumento da frequência cardíaca) dos órgãos inervados pelo sis- tema nervoso autônomo simpático. Portanto, todos os seus efeitos adversos podem ser, da mesma ma- neira, precipitados pela epinefrina endógena exces- siva, resultante de fatores psicológicos relacionados com a injeção ou a própria cirurgia. A ocorrência de efeitos graves com o uso de epinefrina é incomum, mesmo em pacientes de risco, desde que as doses máximas sejam respeitadas. A norepinefrina, também liberada endogena- mente, atua como neurotransmissor de fibras ner- vosas adrenérgicas. Primariamente determina a es- timulação α-adrenérgica, assim como a fenilefrina e a levonordefrina. Quando associada a anestésicos locais, produz mais arritmias cardíacas e maior au- mento da pressão arterial em relação à epinefrina, além de induzir vasoconstrição mais acentuada, tor- nando maior o risco de ocorrer lesão tecidual. A levonordefrina produz ação cardíaca menos acentuada que a epinefrina, entretanto, por estar presente em maiores concentrações nas soluções comerciais, seus efeitos cardíacos podem ser con- siderados similares. Ainda em relação à epinefrina, apresenta maior aumento na pressão arterial. Deve-se considerar o fato de que várias das ma- nifestações adversas induzidas por vasoconstrito- res podem também ser produzidas com uma dose excessiva de anestésico ou uma reação anafiláti- ca. A diferença é que tanto na toxicidade anesté- sica quanto na anafilaxia a pressão sanguínea cai abruptamente, enquanto o excesso de vasocons- tritores a eleva. Interações medicamentosas Substâncias anestésicas Pacientes usuários de medicamentos que inibem a ação do citocromo P450 apresentam risco de ma- nifestarem os efeitos colaterais do acúmulo sérico de anestésicos do grupo amida (os mais utilizados), por redução no seu metabolismo. Seu manejo merece atenção especial (Tabela 18.1.3). Como os anestésicos são vasodilatadores, nos pacientes em uso de anticoagulantes orais ou fár- macos com ação anticoagulante, pode haver inten- sificação do sangramento durante a cirurgia, porém já existe um consenso para suspensão das substân- cias anticoagulantes 15 dias antes do procedimento cirúrgico. n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 208 Vasoconstritores Quando os anestésicos são associados a vaso- constritores, deve-se ter cautela com as seguintes substâncias: antidepressivos tricíclicos, inibidores da MAO, fenotiazinas, bloqueadores β-adrenérgi- cos, anfetaminas e digitálicos. ¡ Antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, nortriptilina, imipramina, desipramina, clomipramina, doxepina, maprotilina): po- dem desencadear hipertensão marcada e arrit- mias cardíacas. Devem ser utilizadas doses inferio- res a 0,05 mg de epinefrina em injeção lenta. Tal contraindicação não se aplica aos antidepressivos atípicos (mianserina, bupropiona e fluoxetina). ¡ Inibidores da monoamina oxidase (MAO) (tranilcipromina, moclobemida): podem desencadear crise hipertensiva. Entretanto, essa interação aplica-se apenas à fenilefrina, metabo- lizada pela MAO, uma vez que vasoconstritores exógenos, como epinefrina, norepinefrina e le- vonordefrina, são degradados por outras vias metabólicas. ¡ Fenotiazinas (clorpromazina, levomepro mazina, flufenazina): uma injeção intravascu- lar acidental de epinefrina pode agravar o efeito hipotensivo do medicamento, que se liga aos re- ceptores α-adrenérgicos, restando para a epine- frina apenas os β-adrenérgicos (vasodilatadores da musculatura esquelética). Adicionalmente, ar- ritmias cardíacas graves têm sido relatadas pela interação desses medicamentos com anestésicos locais contendo vasoconstritores adrenérgicos. ¡ Bloqueadores badrenérgicos não seletivos (propanolol, nadolol, timolol, pindolol, al prenolol, labetalol, ocprenolol, sotalol): por atuarem indiscriminadamente nos recepto- res β1 cardíacos e β2 periféricos, essas substân- cias impedem a dilatação arteriolar por agentes simpaticomiméticos, prevalecendo os efeitos va- soconstritores α-adrenérgicos. Portanto, a intera- ção medicamentosa entre vasoconstritores adre- nérgicos e bloqueadores β-adrenérgicos não se- letivos pode acarretar hipertensão arterial grave, bradicardia reflexa, parada cardíaca e acidente vascular cerebral. Devem ser excluídos dessa in- teração os bloqueadores β-adrenérgicos seletivos β1 (atenolol e metoprolol). ¡ Cocaína: é de grande importância a identifica- ção de pacientes consumidores de cocaína, uma vez que essa substância é um anestésico local de potente ação simpaticomimética, com o uso da qual, dependendo da dose administrada, po- dem ser verificadas hipertensão e taquicardia graves, além de complicações mais graves tais como arritmias, isquemia miocárdica, infarto e morte. Dependendo da via de administração, a cocaína pode estar presente no sangue de 2 até 6 horas após o uso e a utilização de anestésicos locais em associação a vasoconstritores. Nessas condições, pode ocasionar complicações cardio- vasculares graves. O ideal é que o procedimento cirúrgico seja adiado por pelo menos 24 horas após o uso da substância. Gravidez e lactação A lidocaína, nas doses convencionais, é consi- derada segura para a gestante e o feto, apesar de Tabela 18.1.3 MEDICAMENTOS DE USO COMUM QUE INIBEM O CITOCROMO P450 Ciprofloxacina Cetoconazol Eritromicina Ofloxacino Itraconazol Claritromicina Amiodarona Fluconazol Tetraciclina Fluoxetina Voriconazol Metronidazol Isoniazida Miconazol Citalopram Paroxetina Ritonavir Fluoxetina Nifedipina Nelfinavir Paroxetina Nicardipina Amprenavir Sertralina Diltiazem Indinavir Carbamazepina Verapamil Ciclosporina Ácido valproico Cimetidina Midazolam Triazolam Dexametasona Metilpredinisolona Fonte: Cayot A, Laroche D, Disson-Dautriche A, Arbault A, Maillefert JF, Ornetti P. Cytochrome P450 interactions and clinical implication in rheumatology. Clin Rheumatol. 2014; 33(9):1231-8. Klein JA (ed.). Tumescent technique: tumescent anesthesia and microcannular liposuction. St Louis: Mosby, 2000. Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 209 cruzar a barreira placentária. É categoria B. A epi- nefrina pode estar associada ao anestésico desde que haja extremo cuidado para não haver injeção intravascular, pois essa substância pode causar va- soconstrição da artéria umbilical. A lidocaína tam- bém é excretada no leite materno, mas também é considerada segura na lactante uma vez que o bebê metabolizaria a substância sem maiores com- plicações. Já a bupivacaína e a mepivacaína são contrain- dicadas na gestação (categoria C), pois podem gerar bradicardia fetal. Quanto à anestesia tópica, é recomendado o uso de produtos que contenham apenas lidocaína. A prilocaína tópica pode causar meta-hemoglobine - mia fetal. Anestesia em dermatopediatria Muitas vezes é possível realizar pequenos pro- cedimentos e cirurgias em crianças a nível ambu- latorial, sem necessidade de anestesia geral ou se- dação em centro cirúrgico, a depender da idade do paciente, do entendimento e da cooperação da criança e dos responsáveis.Os anestésicos tópi- cos podem ser utilizados respeitando-se os limites de área tratada e o tempo de aplicação de cada anestésico, como EMLA® e Dermomax®, confor- me orientação de bula segundo idade e peso do paciente. A anestesia injetável também é utilizada, com pequenos volumes (dose máxima de lidocaí- na: 4,5 mg/kg sem vasoconstritor e 2 mg/kg com vasoconstritor). Por vezes, é interessante rediluir a solução pronta (p. ex., lidocaína a 2%, para lido- caína 0,5-1%). É útil também a associação das duas modalidades de anestesia. Como mencionado, merece destaque nesses ti- pos de paciente a meta-hemoglobinemia como efei- to colateral dos anestésicos, em particular nos lac- tentes. Conclusão Em cirurgia dermatológica, a escolha do anes- tésico é muito importante. Antes do procedimento devem ser decididas a substância, a via de adminis- tração e a quantidade de produto, baseando-se em alguns critérios como tempo e tipo de procedimento, região anatômica que será submetida à anestesia, custos das medicações e as variáveis inerentes ao paciente como comorbidades, idade, medicamen- tos em uso, alergias, “tolerância a agulhas” e perfil psicológico. De modo geral, a lidocaína supre com êxito todas as necessidades do cirurgião dermatoló- gico, tanto na anestesia infiltrativa quanto na tópica (sendo encontrada em quase todas as preparações). Há substâncias mais modernas, que acrescentam algumas outras vantagens, como a vasoconstri- ção, porém vêm também acrescidas de maior ônus. Profissionais experientes podem lançar mão da mis- tura de duas ou mais substâncias, somando suas vantagens; no entanto, esse método acompanha maior risco no manejo. Podem também associar anestesia tópica e infiltrativa, minimizando o incô- modo da injeção. Como métodos substitutivos às substâncias anes- tésicas (nos pacientes com contraindicação) ou adju- vantes para maior eficácia, o dermatologista tem a possibilidade de utilizar métodos físicos (gelo, apa- relhos resfriadores), anti-inflamatórios não hormo- nais (como cetorolaco de trometamina), analgésicos comuns e opioides, gabapentina ou pregabalina, dexametasona, além de sedativos, como cetamina e α2-agonistas (clonidina e dexmedetomidina). Em sua maioria, são também capazes de prevenir a dor no pós-operatório. As substâncias e os métodos anestésicos úteis na cirurgia dermatológica são seguros e relativamente de simples aplicação, desde que sejam respeitadas as peculiaridades de cada substância e cada pacien- te. O conhecimento na área é imprescindível para o dermatologista. O dermatologista deve estar familiarizado com as modalidades e os tipos de anestésicos tópicos que, usados da maneira correta, oferecem excelente per- fil de segurança e eficácia. Os anestésicos do grupo éster são metabolizados por uma enzima do sangue e são os maiores res- ponsáveis pelas reações alérgicas pelo PABA, seu metabólico. No grupo amida encontramos as substâncias mais utilizadas, como a lidocaína, com menores efei- tos colaterais; porém, por serem metabolizadas pelo fígado, apresentam maior chance de gerar reações adversas em hepatopatas e usuários de medicamen- tos que inibem o citocromo P450. A anestesia tópica é muito útil, mas também exi- ge controle rigoroso do tempo e da área máxima de aplicação do anestésico. n Anestésicos mAis UsAdos em cirUrgiA dermAtológicA – FArmAcologiA e clAssiFicAção segUndo A PotênciA e o modo de Ação 210 A anestesia infiltrativa impõe o conhecimento de doses máximas, início de ação e tempo de duração do anestésico. Comumente a epinefrina é associada ao anesté- sico, gerando menor toxicidade deste, aumentando a potência da anestesia, prolongando a duração do efeito da substância e reduzindo o sangramento no local; deve-se tomar cuidado com risco de necro- se de tecidos, injeção intravascular, comorbidades e uso de medicações passíveis de interação pelo paciente. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 1. Azulay MM, Leite OMRR. Anestesia em consultório. Farmacologia dos anestésicos e interações medicamento- sas. In: Gadelha AR, Costa IMC. Cirurgia dermatológica em consultório. São Paulo: Atheneu, 2009. 2. Cayot A, Laroche D, Disson-Dautriche A, Arbault A, Maillefert JF, Ornetti P. Cytochrome P450 interactions and clinical implication in rheumatology. Clin Rheumatol. 2014; 33(9):1231-8. 3. Goldberg D, Maloney M. Dermatologic surgery and cos- metic procedures during pregnancy and the post-partum period. Dermatol Ther. 2013; 26(4):321-30. 4. Grekin RC, Auletta MJ. Local anesthesia in dermatologic surgery. J Am Acad Dermatol. 1988; 19(4):599-614. 5. Huang W, Vidimos A. Topical anesthetics in dermatology. J Am Acad Dermatol. 2000; 43(2 Pt 1):286-98. 6. Jakobsson JG. Pain management in ambulatory surgery – a review. Pharmaceuticals (Basel). 2014; 7(8):850-65. 7. Klein JA (Ed.). Tumescent technique: tumescent anesthesia and microcannular liposuction. St Louis: Mosby, 2000. 8. Sobanko JF, Miller CJ, Alster TS. Topical anesthetics for dermatologic procedures: a review. Dermatol Surg. 2012; 38(5):709-21. 9. Trapp L, Will J. Acquired methemoglobinemia revisited. Dent Clin North Am. 2010; 54(4):665-75. c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 211 Anestesia Tópica Alcidarta dos Reis Gadelha Pontos de destaque Atualmente, a anestesia tópica, isolada ou associada a outros métodos, é muito útil na realização de vários procedimentos em cirurgia dermatológica, em pacientes com fobia de agulha ou para amenizar a dor de uma injeção posterior como a da anestesia infiltrativa. Em algumas situações a anestesia tópica pode ser utilizada, isoladamente, com eficácia, antes da execução de procedimentos como a aplicação de toxina botulínica, a realização de preenchimentos, curetagem ou shaving. Em outros casos, a anestesia tópica pode ser complementada e potencializa- da pela associação com a anestesia infiltrativa, com o uso de analgésicos sistêmicos e, até mesmo, com a conversa tranquilizadora com o paciente. A redução e mesmo a eliminação da dor podem ser alcançadas por métodos físicos como a vibração ou o resfriamento da pele ou químicos como a aplicação de anestésicos locais. O uso mais efetivo e seguro dos anestésicos locais é facilitado pelo melhor conhecimento sobre os mecanismos de absorção e ação das substâncias, bem como de seus efeitos colaterais. Assim, a hidratação, o calor, a oclusão, a redução da camada córnea, a iontoforese, a eletropora- ção e a associação de métodos ou de substâncias anestésicas em maiores concentrações podem aumentar a rapidez de ação, a eficácia e a durabilidade da anestesia, entretanto podem, também, elevar o risco de aparecimento de reações sistêmicas pela absorção transdérmica. É importante que o médico esteja preparado para tentar evitar ou tratar possíveis, embora impro- váveis, efeitos colaterais sistêmicos do uso tópico de anestésicos como a urticária, a meta-hemo- globinemia e a anafilaxia e os mais comuns, os efeitos locais, como o eritema, a palidez, o edema, a dermatite de contato e as parestesias. O uso racional dos anestésicos tópicos permitirá ao profissional selecionar o método anestésico mais apropriado ao procedimento, evitando, por exemplo, o uso de mistura eutética de prilocaína e lidocaína a 2,5% ou de lidocaína a 4% antes do tratamento de telangiectasias ou de mancha em vinho do Porto, pois o branqueamento ocasionado por esses anestésicos diminuirá a absorção da energia do laser pelos vasos e, consequentemente, a sua eficácia. Por outro lado, quando usar elevadas concentrações de anestésicos como a lidocaína a 6-20% e a tetracaína 6-10%, evitar a oclusão e limitar a aplicação a áreas menores da pele como os hot spots ou áreas mais sensíveis. Capítulo 18.2 ¡¡ n AnestesiA tópicA 212 Atualmente os anestésicos tópicos comercializados e mais utilizados em cirurgia dermatológica são: a mistura eutética de prilocaína a 2,5% e lidocaína a 2,5% (EMLA® creme), a lidocaína a 4% (Dermomax®creme), a mistura eutética de lidocaína + tetracaína a 7% cada (Pliaglis®) e a proxi- metacaína a 0,5% (Anestalcon®). A mistura eutética de tetracaína + lidocaína a 7% (Pliaglis®, Galderma), recentemente lançada no Brasil (2014), é um creme que, em contato com a pele, resseca rapidamente, formando uma pe- lícula pronta e facilmente destacável após a obtenção da anestesia desejada, o que normalmente ocorre em 30-60 minutos. Além da facilidade de aplicação e remoção e do rápido início de ação, essa mistura apresenta a vantagem de proporcionar anestesia de moderada a elevada qualidade, propiciando a execução de procedimentos mais agressivos como o microagulhamento e o laser de CO2. Ademais e, principalmente, tem perfil de segurança muito elevado pela baixa absorção transcutânea. Todavia, nunca é exagerado lembrar que as altas concentrações anestésicas (7%) e um anestésico éster (tetracaína) presentes na composição do Pliaglis®, podem, embora excepcio- nalmente, ocasionar reações tóxicas sistêmicas ou anafilaxia. Mais recente ainda é a comercialização no Brasil do Toperma®, da Grunhenthal, um anestésico tó- pico em forma de emplastro de 10 × 14 cm, contendo 700 mg de lidocaína ou seja a 5%. Embora indicado, primordialmente, para tratamento de neurite pós-herpética é possível que venha a ser, também, empregado em anestesia tópica para a realização de procedimentos dermatológicos. Conceito A anestesia tópica consiste na aplicação, sobre a pele, de substâncias, de agentes mecânicos ou fí- sicos para eliminar ou diminuir a dor. Em derma- tologia é muito empregada antes da introdução da agulha da injeção de anestésico local, da aplicação de toxina botulínica e de preenchedores ou na infil- tração de medicamentos, como corticoides, bleomi- cina, 5-fluoracil ou N-metil-glucamina. A anestesia tópica é também utilizada para amenizar a dor de procedimentos como curetagem de molusco conta- gioso, shavings, eletrocoagulação superficial, der- moabrasão, escleroterapia e de tratamentos com lasers. A anestesia tópica é importante, principal- mente em crianças, pacientes ansiosos ou sensíveis, que são frequentes na prática diária, já que, segundo Lener, 14 a 20% das pessoas têm fobia de agulha. Os métodos de anestesia tópica podem ser agru- pados em: ¡ Químicos: com substâncias anestésicas, como a lidocaína, prilocaína ou tetracaína. ¡ Métodos mecânicos: massagem como habi- tualmente utilizam os dentistas antes da introdu- ção da agulha. Há, ainda, pequenos vibradores, utilizados para “confundir” os impulsos doloro- sos. Como os coolers, os vibradores apresentam baixa eficácia e condições de limpeza limitadas. O VAD (de vibration anesthesia device), um pe- queno dispositivo vibratório (Figura 18.2.1), pro- move diminuição mais significativa da dor pelo mecanismo de bloqueio de Wall e Melzack ou seja, a sensação da vibração diminui a percepção pelo cérebro da dor em pequenos procedimentos como a injeção de toxina botulínica ou de ativos intralesionais. ¡ Físicos: � Resfriamento da pele com aplicação de gelo, geralmente, em bolsas de plástico congeladas. Bechelli e Corrêa, em 1983, destacaram a utilidade do uso de gelo como anestésico em procedimentos ambulatoriais: antes da intro- dução de agulhas, em drenagem de absces- sos, retirada de corpo estranho, eletrocoagu- lação, excisão de pequenos tumores de pele, preenchimento, dermoabrasão, peelings e ex- tração de comedões. A técnica recomendada pelos autores brasileiros consiste em usar um ou mais cubos de gelo, provenientes de gela- deira comum, contidos em plástico ou dentro da própria forma individual de plástico, para evitar que a água escorra, fazendo suave com- pressão no local a ser tratado por 5 a 10 minu- tos. Como o efeito anestésico é efêmero, reco- menda-se repetir o processo logo que a ação comece a desaparecer. Destacam os autores a simplicidade e o baixo custo do método. AnestesiA tópicA n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 213 � Resfriamento da pele com gel de ultrassom ge- lado. Apresenta efeito muito discreto. � Resfriamento da pele com ponteiras. Vários lasers e equipamentos afins proporcionam um resfriamento das ponteiras, como as de safira, baixando a temperatura da pele a 1 a 4 °C. A ponteira resfriada é colocada em contato com a área de pele a ser tratada, como a re- gião malar, em casos de telangiectasias, antes do disparo do laser, durante e logo a seguir, diminuindo um pouco a dor do procedimento. � Resfriamento da pele com rolos ou skin coo- ler. Rolo deixado no congelador antes da aplicação na área em que será realizado o procedimento. É muito pouco efetivo, de lim- peza e esterilização com álcool, no mínimo, du vidosas. � Resfriamento com dispositivo de ponteira ge- lada como o Coolsense. Abrir e colocar ál- cool a 70%; deixar o Coolsense no frigobar ou freezer da geladeira, com a tampa para baixo por, no mínimo, 40 minutos (pode ser mantido no freezer além do limite mínimo). O termômetro muda de cor quando chega à temperatura ideal (entre 0 e –4 °C). Manter esse intervalo de temperatura no Coolsense é muito importante para evitar lesão à pele e obter resultados mais satisfatórios. Após re- mover a tampa com movimento circular, apli- ca-se a ponta gelada na pele por 5 segundos para reduzir a dor de alguns procedimentos como a injeção de toxina botulínica. O efeito antálgico é discreto mas útil. � Resfriamento da pele com spray de gases como o Pain Ease, que contém uma mistura de pentafluoretano e tetrafluoretano, gases não inflamáveis e que não agridem a camada de ozônio. Segurando o recipiente em posi- ção vertical, pressiona-se o botão de aciona- mento, direcionando o spray diretamente so- bre a área desejada. Pulveriza-se a mistura, continuamente, por 3 a 4 segundos a uma distância de 8 a 18 cm até que pele fique es- branquiçada, realizando-se rapidamente o procedimento. A diminuição brusca da tem- peratura da pele pela evaporação dos gases reduz, momentaneamente, a velocidade de condução dos impulsos dolorosos, o que per- mite a realização de pequenos procedimentos como a curetagem e a criocirurgia de cerato- ses ou diminui a dor da infiltração de anesté- sicos ou de outros produtos. � Diminuição da temperatura da pele com ar res- friado. Com aparelho, como o Cryo 6, Freedo ou Syberian, estes dois últimos nacionais, o ar ambiente é captado, resfriado a –30 °C e apli- cado em jatos na área a ser trabalhada, an- tes, durante e logo após o procedimento, di- minuindo consideravelmente a dor, como nos casos de depilação a laser, tratamento com o laser fracionado e remoção de tatuagem. � Métodos combinados, como a aplicação de anestésicos tópicos e resfriamento do local com ar gelado, muito útil na realização de procedimentos com o laser fracionado. Métodos físico-químicos utilizados para aumentar a permeabilidade da pele a fármacos, incluindo os anestésicos tópicos Incorporação da substância ativa em microemulsão lipossomal Os fosfolipídios são muito utilizados na formu- lação dessas emulsões porque são biocompatíveis, já que são componentes naturais da membrana ce- lular, são biodegradáveis e possuem mínimo efeito tóxico ou imunogênico. Iontoforese Consiste na aplicação de uma corrente elétrica, habitualmente menor que 1 mA, a uma solução con- tendo o agente ativo. Trata-se de um método não Figura 18.2.1 – Dispositivos comumente usados em der- matologia para induzir a uma discreta anestesia: da esquerda para direita: Cooler; mistura de pentafluoretano e o tetrafluo- retano (Pain Ease),o Coolsense com álcool a 70 e o minivibrador. Poderia ser incluído nesse grupo o ar gelado. (Fonte: Alcidarta dos Reis Gadelha.) n AnestesiA tópicA 214 invasivo que pode ser utilizado na introdução em áreas localizadas da pele de substâncias hidrossolú- veis, de baixo peso molecular, carregadas positiva ou negativamente. A aplicação de uma solução de lidocaína a 4% utilizada com a iontoforesetem mos- trado uma ação mais rápida do que a mistura euté- tica de prilocaína e lidocaína (cerca de 10 minutos), podendo ser útil na realização de procedimentos como eletrocoagulação de lesões superficiais, tra- tamento de angioma plano com dye laser, shaving e dermoabrasão, segundo Kassan. Como desvanta- gens, citam-se a duração curta do efeito anestésico, a dificuldade de colocação dos eletrodos nos dedos e na face e a possibilidade de aparecimento de efei- tos colaterais, como parestesias (queimação, frio, ar- dor) e queimaduras, como destaca Russo. Fonoforese Nesse método, ondas sonoras ultrassônicas são utilizadas para facilitar a transposição da pele por substâncias anestésicas, como, por exemplo, a lido- caína a 2% em meio aquoso. Segundo Lener, são necessárias pesquisas para uma avaliação mais aba- lizada sobre a eficácia desse método, já que os tra- balhos a respeito são escassos e contraditórios. Eletroporação Nesse método, ondas eletromagnéticas pulsa- das, moduladas e atérmicas são empregadas para aumentar em até 400 vezes a permeabilidade da pele à passagem de substâncias independentemente de sua polaridade. O método seria indolor, rápido, eficaz, mesmo sem ionização das moléculas e sem risco de queimadura. Todavia, ainda não conhece- mos trabalhos científicos reconhecendo a eficácia e a segurança de maneira irrefutável desse método, especialmente na introdução de anestésicos tópicos, ainda que o seu princípio pareça lógico. Anestésicos tópicos – mecanismos de ação dos anestésicos local e tópico A composição química dos anestésicos tópicos e locais e da membrana celular do axônio (axolema) e o modo de preparo, de conservação e de introdução dessas substâncias na pele são extremamente im- portantes na compreensão do mecanismo de ação, da duração e da intensidade do efeito anestésico. A sede de ação do anestésico é a membrana ce- lular do axônio, que tem uma estrutura lipoprotei- ca contendo uma zona fosfolipídica, que, por sua vez, possui um polo externo hidrofílico e um inter- no lipofílico. É rodeada e intercalada por proteínas complexas. No estado de repouso, a concentração intracelu- lar (na célula nervosa) de potássio é muito maior do que a extracelular, enquanto, ao contrário, a con- centração intracelular de sódio é inferior a da ex- tracelular. No axolema, uma membrana de dupla camada fosfolipídica, um gradiente iônico é manti- do pela bomba de sódio/potássio com a participa- ção da ATPase, que utiliza como fonte de energia o trifosfato de adenosina (ATP). A ATPase aumenta em 10 vezes a concentração intracelular de potássio e sódio, porém, como o axolema é seletivamente permeável ao potássio, mais íons potássio saem da célula do que íons sódio entram e, assim, é gerado um potencial de membrana em repouso em torno de –70 mV, conforme destacam Skidmore e cols. Todavia, diante de um estímulo, é criado um im- pulso nervoso ou potencial de ação que provoca a saída de potássio e a entrada de sódio, fluxo inter- rompido por mecanismo regulatório com a elevação do potencial de ação. A membrana nervosa começa a repolarizar-se com o auxílio de energia provenien- te da bomba de sódio (transporte ativo) obtida da fosforilação oxidativa. Enquanto dura o processo de reporalização e de desporalização, a membrana do axônio permanece inativa a estímulos adicionais. O impulso nervoso gerado por esse mecanismo é, en- tão, conduzido, em saltos, de um nódulo de Ranvier a outro, como enfatiza Sanchez-Conejo. A ação do anestésico local ou tópico consiste, então, em bloquear a abertura do canal de sódio, impedindo o sódio de entrar na célula nervosa, evi- tando a despolarização e, portanto, a criação do impulso nervoso (potencial de ação) por ligação da porção catiônica (hidrossolúvel) com receptores no canal de sódio. Segundo Sanchez-Conejo e Hruza, a ação dos anestésicos locais depende de fatores como os lis- tados a seguir. Lipossolubilidade É importante lembrar que 90% da composição da membrana celular nervosa são lipídios, por isso um anestésico local lipofílico entra mais rapida- AnestesiA tópicA n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 215 mente na membrana. Portanto, quanto mais lipos- solúvel é o anestésico, maior é a sua potência e mais rápido é o início de sua ação. Ligação do anestésico a proteínas Dez por cento da composição da membrana ce- lular do axônio são proteínas. Assim, a duração do efeito anestésico é proporcional à sua capacidade de ligação com as proteínas na membrana celular e, de modo geral, ao tamanho de sua porção inter- mediária. A bupivacaína, por exemplo, tendo uma elevada capacidade de ligação a proteínas, é mais eficiente na ligação ao canal de íon sódio e, por con- seguinte, possui longa duração anestésica (6 horas sem epinefrina). Difusibilidade nos tecidos não nervosos e pKa Os anestésicos locais são bases fracas que, para se tornarem hidrossolúveis e injetáveis, requerem a adição de sais de hidrocloreto. Em solução aquosa, o sal mantém o equilíbrio entre a forma não ionizada, lipossolúvel, que possi- bilita a difusão do anestésico por meio da mielina, e é responsável pela potência anestésica e a molécula ionizada, hidrossolúvel, que permite a injeção do anestésico no tecido e, no neurônio, a interrupção da condução nervosa. Os anestésicos do tipo amida e éster contêm um grupo amina terminal, uma base fraca que aceita hidrogênio convertendo o anestésico em sua for- ma catiônica ativa. O pH do ambiente e o pKa dos anestésicos regulam a proporção entre a forma ca- tiônica e a base inalterada, segundo a equação de Henderson-Hasselbalch. pKa = pH – log (NHR3) base (NHR3 +) cátion Geralmente, o pKa dos anestésicos locais é maior do que o pH fisiológico, e muitos anestésicos locais com pH 7,4% têm cerca de 80% ou mais de suas bases em forma ionizada ou catiônica. Como a lipossolubilidade é mais elevada se o anestésico está sob a forma de base não carregada, anestési- cos com baixo pKa e soluções anestésicas com pH ajustado a um nível menos ácido têm maior capa- cidade de difusão e, consequentemente, início de ação mais rápido. Anestésicos, como a lidocaína e a mepivacina, que possuem baixo pKa, têm mais rápido início de ação. A alcalinização da solução anestésica, pela adi- ção de bicarbonato de sódio, por exemplo, pode au- mentar ainda mais a rapidez de ação do anestésico. Por outro lado, elevando-se muito o pH, o anestésico pode precipitar, prejudicando a sua ação. Já a difi- culdade de anestesiar áreas infectadas e inflamadas é explicada pela baixa acentuada do pH no tecido em decorrência da produção de ácido lático, o que reduz a proporção de anestésico em sua forma ca- tiônica, essencial para o bloqueio do canal de sódio. As funções dos componentes dos anestésicos po- dem ser resumidas assim: � Fração lipossolúvel (não ionizada): rapidez de ação e potência. Junto com o maior tamanho da porção intermediária, é também responsá- vel pela duração do efeito anestésico. � Fração hidrossolúvel (ionizada): interrupção do estímulo nervoso no canal de sódio. Ação vasodilatadora É uma característica intrínseca à maioria dos anestésicos. De modo geral, os anestésicos tópicos, exceto a cocaína, são vasodilatadores, o que de- termina absorção mais rápida. Por isso, há neces- sidade de associar a eles a epinefrina para, provo- cando vasoconstrição, retardar a absorção do anes- tésico, aumentar a sua duração, diminuir o risco de efeito tóxico e evitar sangramento. Tipo de fibra nervosa e de noniceptor A tendência agora é diferenciar dor de nonicep- ção. A dor seria, segundo os fisiologistas, uma ex- periência emocional desagradável que geralmente acompanha a nonicepção. Esta, por sua vez, refere- se aos sinais que chegam ao sistema nervoso central resultantes da ativação de receptores especializados, os noniceptores, que fornecem informações sobre a lesão tecidual ocasionada por estímulos nocivos. Agora,há também, uma modificação na classifi- cação antiga das fibras nervosas e uma interpreta- ção diferente no transporte dos estímulos dolorosos. Assim, existiriam as fibras nervosas: � Tipo C: amielínicas e mais lentas condutoras. � Tipo A: Ad, Aβ e Aα, mielínicas e mais rápidas condutoras. n AnestesiA tópicA 216 Acredita-se, agora, que somente as fibras de me- nores diâmetros e mais lentas, como as dos tipos C e Ad sejam noniceptores, isto é, capazes de transmitir os estímulos que serão percebidos como dor, embo- ra também possam carrear estímulos inócuos como os da sensação de calor, frio ou mecânico. Graças à diferença de velocidade, os estímulos captados pelas fibras Ad chegam primeiro à medula do que os transmitidos pelas fibras C, mais delgadas e, por isso, mais lentas. Isso sugere que a dor, bifási- ca, teria duas sensações sucessivas e, possivelmente, diferentes. Embora essa dualidade nem sempre seja perceptível pelo ser humano, a dor ocasionada pela fibra tipo Ad seria mais acentuada e em picada, e mais curta, enquanto a da fibra C seria mais amena, tipo ardor, de maior duração e menos suportável. Noniceptores são, na verdade, neurônios com si- napses químicas nas quais o estímulo nocivo é “tra- duzido” em liberação de transmissores. Eles podem ser classificados em quatro grandes grupos: � Mecânicos: respondem à pressão intensa. � Térmicos: respondem à temperaturas extre- mas: muito quentes (> 45 °C) ou muito frias (< 5 °C), possuem fibras fibras Ad-β. Em con- junto são denominados de mecanotérmicos. Os térmicos podem ser unimodais, ativados por um estímulo térmico exclusivo; e os poli- modais, que detectam estímulos nocivos quí- micos, mecânicos e térmicos, o que torna a percepção e a transmissão dos impulsos im- bricadas e complexas. � Polimodais: respondem aos estímulos nocivos mecânicos, térmicos ou químicos; possuem pequenas fibras C amielinizadas. Convém destacar que as pequenas fibras Ad-β mieli- nizadas carregam informação de nocicepção responsável pela sensação de dor acentuada em picada e as pequenas fibras C amielini- zadas carregam informação responsável pela sensação fraca em queimação. � Silenciosos: são ativados por estímulos quími- cos, mediadores inflamatórios, e respondem a estímulos mecânicos e térmicos somente depois de serem ativados. Esses nociceptores também possuem pequenas fibras C amielini- zadas que conduzem impulsos em velocidade inferior a 3 m/s. Portanto, a ação dos anestésicos como os locais, consiste em uma série complexa de reações, como o bloqueio da bomba de sódio, que impede a ativação dos noniceptores e, consequentemente, a condução do estímulo, traduzido por mediadores químicos, ao sistema nervoso central, impedindo, assim, a noni- cepção e o aparecimento da sensação desagradável, traduzida por dor. Todavia, há autores como Sobanko, Miller e Alster que ainda se guiam pela classificação das fi- bras nervosas em: � Tipo A ou fibras nervosas somáticas e mieli- nizadas. � Tipo B ou fibras autônomas, pré-ganglionares e mielinizadas. � Tipo C ou fibras não mielinizadas. Nessa classificação os anestésicos tópicos im- pediriam, primeiro, a condução nervosa nas fibras autônomas mielinizadas ou tipo B, que seriam as responsáveis pelo tônus do músculo liso vascular; em seguida, bloqueariam as fibras tipo C, não mie- linizadas e, por fim, as fibras nervosas mielinizadas tipo A que regulariam a dor e a temperatura. Absorção dos anestésicos tópicos Para Lener e cols., o anestésico tópico ideal, ine- xistente até o momento, deveria ter as seguintes ca- racterísticas: � Impedir totalmente o aparecimento da dor (100% de eficácia). � Agir em curto período de tempo. � Ser efetivo em pele intacta. � Ter mínima ou nenhuma absorção sistêmica e, por isso, não provocar efeitos tóxicos. � Não provocar desconforto ou dor inicial quan- do colocado na pele. As substâncias aplicadas na pele íntegra devem ultrapassar a principal barreira da epiderme, que é a camada córnea, formada, principalmente, por lipídios e água. A transposição da epiderme, de 0,2-1 mm de espessura, ocorre por via intracelular, extracelular ou, menos, por via anexial. O estrato córneo é praticamente impermeável às moléculas ionizadas e, quanto mais espessa é a ca- mada córnea, como na região palmoplantar, maior é a dificuldade de penetração do anestésico, por- tanto menor a sua ação. Por outro lado, o efeito do anestésico tópico é muito rápido (5 minutos) quando colocado nas mucosas (que não possuem camada AnestesiA tópicA n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 217 córnea) e, obviamente, a absorção sistêmica consti- tui um risco também maior. A instilação, por exem- plo, de uma a duas gotas de solução oftálmica de tetracaína a 1% ou de proximetacaína a 0,5% no olho provoca anestesia em 30 segundos, e a ação se prolonga por, pelo menos, 15 minutos. Como o pH da mucosa oral é mais baixo do que o da pele, há necessidade de concentrações maio- res dos anestésicos do que as utilizadas na pele para se obter o mesmo efeito, o que aumenta o potencial tóxico. Por outro lado, a benzocaína a 20%, muito usada por odontólogos, apresenta bom efeito anes- tésico na mucosa oral, já que possui um pKa de 3,5 e pH baixo. Por outro lado, nos tecidos infectados, a produção de ácido lático diminui acentuadamen- te o pH do tecido e, obviamente, reduz, também, o efeito do anestésico. A adição da epinefrina ao anestésico, com obje- tivo de provocar vasoconstrição, retardando a velo- cidade de absorção, diminui os picos plasmáticos e, portanto, os riscos de intoxicação, além de aumen- tar a duração do efeito do anestésico. Entretanto, isso diminui o pH da solução anestésica, aumen- tando a dor na injeção e reduzindo a duração de seu período de armazenamento. A absorção do anestésico tópico é incrementada com a remoção da camada córnea como nas peles dermoabrasadas ou submetidas a peelings prévios ou com soluções de continuidade, como em áreas escoriadas. Fato interessante e de aplicação prática é que o anestésico tópico tem a maior ação entre 15 e 30 minutos após a sua remoção, indicando que a camada córnea funciona como um reservatório, armazenando e liberando, gradualmente, a subs- tância anestésica. A remoção de gordura com acetona ou álcool e a hidratação da pele antes da aplicação do anestésico facilitam a sua difusão. A maior absorção também pode ocorrer incorporando o anestésico em veículos que contenham maior concentração de bases neu- tras, ou seja, quando o pKa está próximo ao pH do produto e ao pH da pele vizinha. A eficácia e a durabilidade dos anestésicos de- pendem muito da composição química das subs- tâncias utilizadas. Assim, anestésicos do grupo és- ter, como a procaína, são hidrolizados na pele e no sangue, por ação de enzimas colinesterases ines- pecíficas, degradando-os a ácido para-aminoben- zoico (PABA), diminuindo o efeito e a duração da anestesia, bem como incrementando o risco de rea- ções alérgicas. Substâncias com maior lipofilia, como as molé- culas contendo anéis ou longas cadeias de carbono, mais facilmente transpõem a epiderme e alcançam as terminações nervosas da derme. Anestésicos com maior afinidade de ligação a proteínas, sen- do mais estáveis, têm maior tempo de ação. Maior duração do efeito pode ocorrer incorporando na formulação do anestésico substâncias como a epi- nefrina que, provocando vasoconstrição, retardam a absorção e diminuem também o risco de efeitos tóxicos sistêmicos. Os lipossomas, além de facilitarem a transposi- ção da epiderme, evitam a degradação do anestési- co, aumentando a duração do seu efeito. A oclusão, elevando a hidratação, a concentra- ção e a solubilidade da substância, acelera o início da ação e prolonga a duração do efeito anestésico. O efeito da oclusão do anestésico aparentemente benéfico, pode também ocasionar complicações e até mesmo a morte quando a substância é passada em elevadas concentraçõese em áreas extensas. As formas de absorção do anestésico podem, en- tão, ser classificadas em: � Somente cutânea: a penetração da substância limita-se à pele. � Transcutânea: a substância é impregnada na pele e alcança a corrente sanguínea. Composição química e ação dos anestésicos tópicos Os anestésicos locais ou tópicos pertencem a dois grandes grupos: ¡ Grupo éster: representado, principalmente, pela procaína, cloroprocaína, tetracaína e ben- zocaína, além da cocaína. Este grupo contém um final benzênico ou aromático, que é hidrofóbico e lipossolúvel, e um final amino, que é hidrofílico. Ligando os dois, há uma porção intermediária tipo éster. De modo geral, esses anestésicos são rapi- damente metabolizados no plasma por enzimas pseudocolinesterases e eliminados pelo rim. Um dos seus subprodutos é o PABA, responsável pelo potencial alergênico dessas substâncias. n AnestesiA tópicA 218 ¡ Grupo amida: as substâncias deste grupo, como lidocaína, prilocaína, mepivacaína, bupi- vacaína, levobupivacaína e a rupivacaína, pos- suem também, como os ésters, dois finais: um aromático e outro amina, diferindo deles pela porção intermediária, do tipo amida. Esses anes- tésicos (amida) são metabolizados no fígado por enzimas citocromiais, como as do grupo P450, e não dão origem ao PABA em sua degradação, o Tabela 18.2.1 ANESTÉSICOS TÓPICOS DO GRUPO ÉSTER MAIS EMPREGADOS EM PROCEDIMENTOS DERMATOLÓGICOS, PRINCIPAIS CONCENTRAÇÕES, APRESENTAÇÕES E INDICAÇÕES Substâncias Concentrações Indicações Benzocaína 20%, creme (Benzotop®) Anestesia de mucosas, como a oral e a genital Endoscopia, intubação, broncoscopia, colutórios Tetracaína 0,5 a 1,0%, colírio 4% (manipulação) Anestesia ocular Procedimentos dermatológicos Ametocaína ou cloridrato de tetracaína 4%, gel (Ametop®) Anestesia de procedimentos dermatológicos Antes de injeções Anestesia ocular Proximetacaína 0,5%, colírio (Anestalcon®) Anestesia ocular Fonte: Gadelha, 2016. Tabela 18.2.2 ANESTÉSICOS TÓPICOS DO GRUPO AMIDA MAIS EMPREGADOS EM CIRURGIA DERMATOLÓGICA, PRINCIPAIS CONCENTRAÇÕES, APRESENTAÇÕES E INDICAÇÕES Substâncias Concentrações Indicações Lidocaína 2 e 3% geleia; 5% (pomada) e 10% spray (Xylocaína®) Anestesia de mucosas, como a oral, a nasal e a genital e da membrana timpânica 5% emplastro (Toperma®) Empregado em neurite pós-herpética, mas com potencial uso em procedimentos dermatológicos 4% creme (Dermomax®). Anestesia cutânea antes de pequenos procedimentos dermatológicos 6, 10 e 20% creme, gel ou pomada manipulada Procedimento dermatológico como o CO2 fracionado Procedimentos dermatológicos Lidocaína + prilocaína 2,5 e 2,5% (EMLA®) em creme e disco Anestesia cutânea para pequenos procedimentos dermatológicos, como curetagem, shaving Aplicação de toxina botulínica Fonte: Gadelha, 2016. que, portanto, diminui significativamente o po- tencial alergênico dessas substâncias Anestésicos mais utilizados em dermatologia Nas Tabelas 18.2.1 a 18.2.3 estão listados os anestésicos tópicos do grupo éster ou amida e as- sociados mais comumente empregados em cirurgia dermatológica. AnestesiA tópicA n c ir u r g ia d e r m a to ló g ic a b á s ic a 219 Substâncias anestésicas mais empregadas (Figura 18.2.2) ¡ Capsaicina (HercapAtivus®): substância en- contrada na pimenta-malagueta, comercializada em creme a 0,5%; pode ser útil na redução da dor da neurite pós-herpética, mas não há conhe- cimento do seu uso em procedimentos dermato- lógicos, embora já venha sendo empregada para aliviar a dor que se segue a procedimentos odon- tológicos, como extração dentária. ¡ Fenol saturado (88%): é útil antes de der- moabrasão localizada, pois, além de enrijecer a pele, facilitando a realização do procedimen- to com menos sangramento, proporciona efeito anestésico razoável por destruição das termina- ções nervosas. Segundo Ruiz-Maldonado, não há risco de intoxicação renal ou cardíaca porque somente um volume de 0,5 mL é aplicado e, se- gundos após, o fenol é retirado pela dermoabra- são junto com a pele coagulada, evitando a pe- netração mais profunda e dor mais intensa no pós-operatório, como ocorre no peeling com a fórmula de Baker. ¡ Mistura eutética de prilocaína a 2,5% e li docaína a 2,5% (EMLA®, da AstraZeneca): ou seja, um creme contendo 25 mg/g de cada anestésico (EMLA®), liberado nos EUA desde 1993. No Brasil, há caixas com cinco bisnagas de 5 g cada, mais 10 bandagens oclusivas, ou caixa com uma bisnaga de 5 g com duas banda- gens. Havia, ainda (no momento indisponível), o Tabela 18.2.3 ANESTÉSICOS TÓPICOS COMBINADOS (GRUPOS ÉSTER + AMIDA) MAIS UTILIZADOS EM PROCEDIMENTOS DERMATOLÓGICOS, PRINCIPAIS CONCENTRAÇÕES, APRESENTAÇÕES E INDICAÇÕES Substâncias Concentrações Indicações Lidocaína + tetracaína 7% de cada (Pliaglis®) Procedimentos dermatológicos como laser fracionado, depilação, toxina botulínica e preenchimento Formulações perigosas a 6-10% em forma oclusiva Antes de depilação a laser Perigoso o uso em áreas extensas e com oclusão Lidocaína e ametocaína Creme (Ane Stop®) Antes de procedimentos dermatológicos e injeções Não indicada a concentração Muito difundido entre tatuadores das substâncias na bula Fonte: Gadelha, 2016. Figura 18.2.2 – Anestésicos muito usados em dermatolo- gia. De cima para baixo: prilocaína + lidocaína a 2,5% (EMLA®); proximetacaína 0,5% (Anestalcon®); lidocaína a 7% e tetracaína a 7% (Pliaglis®), e lidocaína 4% (Dermomax®). (Fonte: Alcidarta dos Reis Gadelha.) EMLA® disco – caixa com dois discos oclusivos contendo lidocaína e prilocaína a 2,5% cada, à semelhança do creme. � O termo eutético significa que o ponto de li- quefação da mistura é menor do que o da pri- locaína ou o da lidocaína isolada. n AnestesiA tópicA 220 � O método consiste em aplicar sob oclusão no local a ser trabalhado, 60 a 120 minutos antes do procedimento. Com 2 horas, a profundi- dade da anestesia chega a 4,5 mm, enquanto com 60 minutos, somente 2,9 mm, segundo Amim. Em mucosas, a anestesia é mais rá- pida (5 a 30 minutos). Na pele, a anestesia, habitualmente discreta, tem seu efeito máxi- mo entre 15 e 30 minutos após a remoção da mistura, como enfatiza Friedman. Por isso, recomenda-se aguardar 15 a 20 minutos após a retirada do anestésico antes de iniciar o pro- cedimento. � Os resultados anestésicos são obviamente in- feriores em locais onde a camada córnea é muito espessa, como nas regiões palmoplan- tares. � Moraes e cols, já em 1990, relatavam a expe- riência brasileira em cirurgia dermatológica com o emprego da mistura eutética de lido- caína e prilocaína a 2,5% cada, concluindo que a mistura era efetiva para alívio da dor em procedimentos como curetagem, seguida ou não de eletrocoagulação, shaving (barbi- rese), eletrocoagulação e drenagem de lesões císticas. As desvantagens da prilocaína + lidocaína a 2,5% seriam: � Necessidade de oclusão. � Nem sempre proporciona anestesia satisfató- ria, principalmente em procedimentos mais agressivos como a aplicação de laser CO2 fra- cionado ou a remoção de tatuagem com os lasers Q-Switched. � Dificulta, pela vasoconstrição e, consequente- mente, o branqueamento local que ocasiona, o tratamento de algumas lesões vasculares como as telangiectasias ou a mancha em vi- nho do Porto, diminuindo a absorção da ener- gia de lasers como o Nd:YAG de longo pulso ou do laser de corante pulsado. � Risco de causar meta-hemoglobinemia pela ação, sobretudo, da prilocaína, na oxidação do ferro nas hemácias, dificultando o trans- porte de oxigênio pela hemoglobina e cau- sando cianose e dispneia. Deve-se ter maior atenção ainda com a possibilidade dessa com- plicação sistêmica quando o paciente estiver em uso de medicamentos que também podem causar a meta-hemoglobinemia como o co- mum paracetamol, as sulfas, os nitratos e os nitritos e também o fenobarbital. O risco de meta-hemoglobinemia aumenta também com a aplicação em mucosas
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