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Dicionário de Mitologia Nórdica

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Prévia do material em texto

Alvaro Bragança Júnior
Pós-Doutor em História pela Ruhr-Universität Bochum,
professor da UFRJ
André de Oliveira
Mestrando em História pela UFMA
André Szczawlinska Muceniecks
Doutor em História pela USP, professor do STBNET
Carlos Manoel de Hollanda Cavalcanti
Doutor em Artes Visuais pela UFRJ, professor no IED, UCAM e
PUC-RJ
Carlos Osvaldo Rocha
Mestre pela Universidade da Islândia (Háskóli Íslands)
Eduardo Fabbro
Doutorando em Estudos Medievais pela Universidade de Toronto
Flávio Guadagnucci Palamin
Mestre em História pela UEM
Isabela Albuquerque
Doutoranda em História Comparada pela UFRJ
João Bittencourt de Oliveira
Mestre em Letras pela UFF, professor da UERJ
João Eduardo Lupi
Pós-Doutor em Filosofia pelo Boston College, professor da UFSC
Johnni Langer (Organizador)
Pós-Doutor em História Medieval pela USP, professor da UFPB
Luciana de Campos
Doutoranda em Letras pela UFPB
Marion Poilvez
Doutoranda na Universidade da Islândia (Háskóli Íslands)
Marlon Maltauro
Especialista em História pela FAFI, professor da UNC
Munir Lutfe Ayoub
Mestre em História pela PUC-SP
Pablo Gomes Miranda
Mestre em História pela UFRN
Reinaldo José Lopes
Doutor em Estudos Linguísticos e Literários pela USP, Editor de
Ciência da Folha de São Paulo
Rodrigo Mourão Marttie
Doutorando em História pela Universidade de Bielefeld
Santiago Barreiro
Doutor no IMHICIHU-CONICET
Sara Carvalho Divino
Graduada em História pela UFMA
Suênia de Souza Amorim
Mestre em Ciências das Religiões pela UFPB
Yuri Fabri Venâncio
Graduado em Letras pela USP
Prefácio
RUY DE OLIVEIRA ANDRADE FILHO
Desde longa data, a civilização escandinava vem despertando os
olhares da civilização europeia. Do temor gerado inicialmente pelas
incursões “vikings” (aliás, um dos verbetes do dicionário), passou-se a
sua inclusão, como atesta a região francesa conhecida como
Normandia, a criação de principados como o de Kiev na atual Rússia, a
dominação normanda do sul da Itália, apenas para citarmos exemplos
e, mesmo através de sua gradativa cristianização (outro tema
oportunamente examinado) que a incorpora ao mundo medieval. Nos
dias atuais, essa civilização, ainda envolta em muitos estigmas, densos
simbolismos, muitas colorações imaginativas e mesmo
cinematográficas, tem granjeado um grande número de estudiosos
especialistas que começam a demonstrar, de uma forma mais precisa e
rigorosa, os diversos mitos, ritos e símbolos que a envolveram durante
longos anos. Simultaneamente, vem despertando as atenções de
diversos alunos em várias de nossas universidades. Acreditamos que a
presença de dicionários, quaisquer que sejam eles, sejam sempre uma
obra primordial para dar início, de forma correta e com conceitos bem
elaborados, o estudo de diversas épocas e temas. Assim, é com
extrema alegria que vejo a elaboração do DICIONÁRIO DA MITOLOGIA
NÓRDICA: SÍMBOLOS, MITOS E RITOS. Primeiramente, por se tratar de um
trabalho extremamente bem elaborado, com especialistas de diversas
localidades e universidades, brasileiras e estrangeiras, que elaboram
verbetes que, diga-se de passagem, foram muito bem selecionados.
Encontramos ali alguns lapidares como Vikings, Valhala, Asgard,
Odin, Thor, Tyr, Hel entre outros que seria longo citar. Depois, porque
vem preencher uma extensa lacuna existente em nosso país sobre essa
temática e que vem sendo uma ausência sentida de forma bem intensa
na atualidade. E, num olhar direcionado, colabora para o
conhecimento da civilização escandinava que, por fim, o estimula de
maneira apropriada e instrumentaliza os novos pesquisadores a
procederem com maior exatidão em seus estudos, escapando, dessa
maneira, às várias criações ficcionais e apenas imaginativas sobre ela.
Ainda com relação à própria evangelização da Escandinávia, que
citamos acima, encontramos temas com os quais o cristianismo terá
que se defrontar em sua tentativa de tornar-se hegemônico ali. Apenas
para citar alguns exemplos, a existência de uma “Teogonia nórdica”,
seus conceitos de “Alma e espiritualidade”, sua “Cosmogonia” e
“Cosmologia”, sua “Hierogamia”, suas ideias sobre “Vida após a
Morte”, seus hábitos de “Funerais e enterros”, o “Paganismo Nórdico”
e a “Cristianização das Eddas” e da própria região, entre outros, sendo
os temas supracitados verbetes constitutivos do Dicionário. Assim, a
obra que o leitor tem agora em suas mãos, constitui um precioso
material para desvendar não apenas a Escandinávia, mas a Europa
Medieval e, sintomaticamente, perceber também alguns dos outros
caminhos e sincretismos que a evangelização cristã desenvolverá no
período em estudo. É, pois, um instrumento fundamental para o
conhecimento daquilo que somos e de onde viemos. E esperamos que,
a partir dessa iniciativa, outras obras fundamentais sobre essa região e
temática venham a ganhar espaço em nossas livrarias e universidades.
Prof. Dr. Ruy de Oliveira Andrade Filho UNESP-ASSIS
Introdução
Os mitos nórdicos tornaram-se tema constante do imaginário
contemporâneo. Tanto na arte quanto na mídia e nos meios de
comunicação, as antigas narrativas de deuses, deusas, monstros,
guerreiros, entidades fantásticas e localidades imaginárias vêm
despertando curiosidade e interesse, mas ainda faltam obras
acadêmicas no Brasil para sanar essa ânsia de conhecimento. Em
parte, esperamos que a presente coletânea em forma de dicionário
possa assegurar, ao menos parcialmente, essa demanda por parte de
um público brasileiro cada vez mais ávido pelos temas escandinavos.
Trata-se de uma proposta editorial inédita que visa a auxiliar os alunos
de graduação e pós-graduação dentro da área de ciências humanas,
assim como os interessados em medievalismo e religiosidades antigas
em sentido amplo.
Como se trata de verbetes, não é algo que tenha caráter definitivo;
são antes reflexões que procuram apontar novos caminhos, novos
problemas e estímulos futuros. Cada verbete procura fornecer
elementos básicos das investigações da mitologia escandinava e da
Escandinavística de forma mais geral.
Alguns critérios conceituais por nós adotados neste livro
correspondem tanto a padrões comuns nos estudos escandinavos
quanto a tendências mais recentes nas investigações. Por exemplo, o
termo “viking” aqui é utilizado como sinônimo de habitante da
Escandinávia durante a Era Viking (séculos VIII a XI d.C.), não como
identidade étnica, mas como conceito didático objetivamente
contemporâneo. Se por um lado ocorriam padrões gerais para as
sociedades nórdicas durante a Alta Idade Média (como linguagem,
mitologia, cotidiano e cultura material), também existiram diferenças
regionais que foram enfatizadas em diversos estudos no presente livro
(a produção imagética e rúnica, a variação de cultos religiosos, entre
outras). Neste sentido, “viking” é um termo didático para melhor
estudarmos este recorte espaçotemporal. Nos casos em que utilizamos
o termo no sentido original das fontes – pirata, comerciante,
guerreiro, explorador –, elas serão indicadas.
Seguindo a padronização escandinavística em língua inglesa,
francesa e espanhola, adotamos em português o termo éddico para
referir-nos à EDDA, conservando a grafia dupla da consoante D. Para
nomes de divindades mais conhecidas do grande público, mantivemos
a grafia usual no português corrente, como Odin, Thor, Tyr, Frigg;
localidades, como Valhala, Hel, Asgard; nomes de obras literárias mais
divulgadas em português, como a SAGA DOS VOLSUNGOS, a SAGA DE EGIL;
termos como “escaldo para poetas”, entre outros. Nomes, termos e
nomenclaturas menos conhecidos no Brasil permanecem no idioma
original, seja em nórdico antigo, bem como no anglo-saxão, no antigo
alto alemão e em outras línguas medievais.
Outro conceito fundamental aos trabalhos reunidos nesta obra é o
relativo ao mito. Aqui trabalhamos essencialmente o referencial de
que os mitos estão em relação direta com outros aspectos da
religiosidade, como a produção de símbolos, os rituais e cultos
públicos e domésticos, as práticas mágicas, as manifestações artísticas
do sagrado, entre outras, motivando o subtítulo dolivro – SÍMBOLOS,
MITOS E RITOS. A maioria dos temas investigados neste dicionário trata
de questões relacionadas à religiosidade da Escandinávia pré-cristã,
aos mitos e seus significados para os nórdicos habitantes da
Escandinávia, ilhas britânicas, França, Irlanda e leste europeu, mas
também de outros assuntos relacionados à mitologia após o período de
cristianização, como as sagas islandesas, e às reapropriações artísticas
e imaginárias de temas míticos dos nórdicos no período pós-medieval
e contemporâneo.
Nossas fontes primárias foram concentradas em dois grupos
básicos. Primeiro as literárias, advindas das EDDAS, as sagas islandesas,
as crônicas históricas escandinavas e não escandinavas, a poesia
escáldica e a literatura europeia continental. Em segundo, fontes
iconográficas da cultura material, como representações em pingentes,
joias, esculturas, estátuas, gravações de cenas mitológicas em pedras
tumulares, inscrições rúnicas, igrejas, cruzes e monumentos, do
período das migrações até o advento do cristianismo. Para o período
pós-medieval, utilizamos essencialmente as artes plásticas, a ópera, a
literatura e os quadrinhos.
As perspectivas teóricas e metodológicas adotadas na presente
obra vão dos estudos clássicos em mitologia comparada e
estruturalista até as recentes pesquisas em História Cultural e a
influência de autores da Antropologia Cultural adaptados para as
investigações de História, Literatura e Mitologia Medieval.
A abordagem básica também é a de fornecer aos leitores tanto a
possibilidade de investigar os temas míticos em parâmetros
diferenciados – demonstrando a variação cultural e o dinamismo
intenso percebido na Era Viking, especialmente em questões religiosas
– quanto a de olhar as fontes tradicionais a partir de novas
perspectivas e através de diversas abordagens metodológicas. Em
parte, o projeto foi originado pelas pesquisas desenvolvidas pelos
integrantes do NEVE, NÚCLEO DE ESTUDOS VIKINGS E ESCANDINAVOS –
grupo pioneiro em estudos nórdicos de língua portuguesa –, que
constituem a grande maioria dos colaboradores deste dicionário.
A estrutura básica do presente livro (organização alfabética dos
verbetes, remissões e ortografia) foi baseada nas principais obras de
referência sobre o tema: HÉROES ET DIEUX DU NORDE, de Régis Boyer;
NORSE MYTHOLOGY, de John Lindow; e DICTIONARY OF NORTHERN
MYTHOLOGY, de Rudolf Simek. Ao final de cada verbete são indicadas
sugestões e referências bibliográficas, que remetem o leitor tanto para
os clássicos quanto às mais recentes investigações na área.
É justamente essa a finalidade fundamental do presente livro. Permitir
aos jovens pesquisadores que obtenham referenciais mais sólidos na
concretização de seus objetivos, possibilitando o avanço das pesquisas
sobre temas escandinavos em nosso país.
Prof. Dr. Johnni Langer
NÚCLEO DE ESTUDOS VIKINGS E ESCANDINAVOS (NEVE)
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES da
Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
A.
1.1 ADÃO DE BREMEN
Adão de Bremen (em alemão, Adam Von Bremen; em latim,
Adamus Bremensis; CA. 1045–1081–85) foi um dos mais famosos e
importantes cronistas alemães da Alta Idade Média. É conhecido pelo
livro GESTA HAMMABURGENSIS ECCLESIAE PONTIFICUM (lat.: “História dos
Arcebispos de Hamburg-Bremen”), dedicado ao arcebispo Liemar
(1072–1101). É possível que Adão tenha composto sua obra em 1075, e
é bastante provável que a mesma tenha sido revista e atualizada até CA.
1081.
Pouca informação sobre o autor pode ser extraída a partir do texto
da GESTA. De si mesmo, Adão apenas nos diz ser “MINIMUS SANCTAE
BREMENSIS ECCLESIAE CANONICUS” (lat.: “o menor de todos os cônegos da
santa Igreja de Bremen”) e um “prosélito e estrangeiro” (“PROSELITUS ET
ADVENA”). Existe uma conjectura de que Adão era original da Saxônia,
com base em traços dialetais contidos no seu texto latino. Ele foi
convidado pelo arcebispo Adalberto para atuar na igreja de Bremen
em CA. 1067–68, e, numa passagem do epílogo da GESTA e por uma
carta de junho de 1069, sabe-se que foi feito MAGISTER SCHOLARUM ainda
jovem. No Livro I-14 da CHRONICA SLAVORUM de Helmold de Bosau (CA.
1120–1177), existe uma referência ao MAGISTER Adam, que era o mais
eloquente escritor da Igreja de Hamburgo e Bremen, além de
inúmeras outras citações do texto da GESTA. Pode-se, portanto, inferir
que Adão vivia e participava da comunidade eclesiástica de Bremen
como membro do cabido da catedral e que o título de MAGISTER
atribuído a ele pela CHRONICA SLAVORUM indica-nos mais que uma
deferência do autor, mas sim, de fato, o exercício do magistério junto à
comunidade capitular da catedral.
A arquidiocese de Bremen viveu seus momentos de apogeu na
Alta Idade Média sob os arcebispos Unwan (1031–1029), Adalbrand
(1035–1043) e, especialmente, Adalberto (1043–1072), o influente
conselheiro do imperador Henrique III. Sob o primeiro, houve uma
considerável expansão territorial da sede; sob Adalbrand, sabe-se que
a cidade de Bremen, a catedral e boa parte da biblioteca capitular
foram destruídas por um incêndio, em 1041, e que o arcebispo iniciou
longos trabalhos de reconstrução da igreja; durante o arquiepiscopado
do terceiro, a jurisdição expandiu-se ainda mais, tornando parte da
Igreja de Bremen as dioceses de Mecklenburgo, Oldenburgo e
Ratzeburg, além das já sufragâneas dioceses escandinavas. Adalberto
tinha ambiciosos planos para tornar a Igreja de Bremen um
patriarcado para as dioceses do norte da Europa. Contudo, esses
planos foram frustrados pela morte do papa Clemente II – que ele
ajudou a escolher –, em 1054, e pela morte do imperador – sobre o
qual tinha tão grande influência –, em 1056; de sorte que
comunidades cristãs dos territórios setentrionais, em 1103, passaram à
recém-criada arquidiocese de Lund, quando o bispo local tornou-se
metropolita de toda a Escandinávia.
É possível que a obra de Adão tenha sido, em certa medida, uma
tentativa de recuperar parte da memória perdida da arquidiocese, que
teve boa parte de sua biblioteca consumida pelo fogo, além de servir
como explícita propaganda em prol das ambições da Igreja de Bremen.
A GESTA é, sobretudo, um trabalho de história missionária e
propagandística. Para Adão, a missão da Igreja de Hamburgo-Bremen
junto aos povos não cristãos (LEGATIO GENTIUM), especialmente do norte
da Europa, é um direito natural; o PRIMUM OFFICIUM da arquidiocese é
alargar o reino de Cristo, conforme ele também menciona no prólogo
(“QUOS PER TOTAM SEPTENTRIONIS LATITUDINEM SUAE LEGATIONI COTIDIE VIDET
ACCRESCERE”).
Adão escreve a partir de Bremen, no melhor gênero GESTA
EPISCOPORUM, sobre as regiões eslavas, sobre a Saxônia e sobre a
Escandinávia. O livro é uma história das origens da arquidiocese de
Hamburgo e Bremen até o tempo do autor, além de fornecer uma
visão ampla da expansão do cristianismo nas regiões centro-leste e
norte da Europa do século IX ao XI. O texto inicia-se com a conquista
da Saxônia por Carlos Magno, passando pela relação dos saxões com
os dinamarqueses e eslavos, até a derrocada política do arcebispo
Adalberto, em 1066, junto ao imperador Henrique IV (1056–1106), e
sua morte, em 1072. A narrativa termina com a consagração do novo
arcebispo, Liemar (1073–1101), e contém quatro livros. O prólogo é
escrito de acordo com as convenções clássicas, e Adão faz referência a
fontes escritas e orais. O primeiro livro trata da história das guerras de
conquista dos saxões (772–804), da fundação da sé de Bremen (787) e
Hamburgo (831), bem como das primeiras missões rumo às terras do
norte da Europa e dos ataques vikings. No segundo livro, o autor
aborda as missões junto aos dinamarqueses, suecos, noruegueses e
eslavos, além de apontamentos políticos da história germânica de CA.
945 até CA. 1045. O terceiro livro é dedicado inteiramente ao período
do arcebispo Adalberto. O quarto livro proporciona um relato
etnográfico e geográfico sobre “as ilhas do norte”, I.E. a Escandinávia.
Ele mesmo nunca visitara as regiões escandinavas a que faz menção,
mas usa o encontro, em CA. 1070, com o reidinamarquês Sven II
(1047–1076) e as informações que dele recebeu em seu livro. Adão diz
que as informações sobre Dinamarca, Islândia, Vinland, Suécia e
regiões ao redor do mar Báltico são baseadas no relato do rei Sven.
Rodrigo Mourão Marttie
Ver também Cristianização da Escandinávia; Saxo Grammaticus;
Snorri Sturluson; Templo de Uppsala.
ASMUSSEN, Jacob. DE FONTIBUS ADAMI BREMENSIS
COMMENTATIONEM […]. Kiel: Kiliae, Mohr. 1834.
BRUGNOLI, Giorgio. “Modelli Classici in Adam di Bremen”,
IN SANTINI, Carlo (ed.). TRA TESTO E CONTESTO. STUDI DI
SCANDINAVISTICA MEDIEVALE – I Convegni di Classiconorroena 2.
Roma: Calamo, 1994. pp. 5–12.
COIT, Daniel (ed.) et alii. THE NEW INTERNATIONAL
ENCYCLOPAEDIA. Nova York: Dodd, 1905.
DIETSCH, Walter. CATHEDRAL OF ST. PETER, BREMEN. Bremen:
Carl Schünemann, 1960.
GOETZ, Hans-Werner. “Constructing the Past. Religious
Dimensions and Historical Consciousness in Adam of Bremen’s
Gesta Hammaburgensis Ecclesiae Pontificum”, IN MORTENSEN,
Lars Boje (ed.). THE MAKING OF CHRISTIAN MYTHS IN THE PERIPHERY OF
LATIN CHRISTENDOM (C. 1000–1300). Copenhague: Museum
Tusculanum Press, 2006. pp. 17–52.
SCHMEIDLER, Bernhard. HAMBURG-BREMEN UND NORDOST-
EUROPE VOM 9. BIS 11. JAHRHUNDERT. Leipzig: Dieterich, 1918.
1.2 AEGIR
O deus do mar adquire o seu nome do substantivo AEGIR – em
nórdico antigo, oceano ou mar, usado na poesia escáldica, isto é,
estamos ante a personificação do mar. Na primeira parte da
ORKNEYINGA SAGA (Saga dos habitantes de Orkney), FUNDINN NOREGR
(Fundação da Noruega), está escrito que um rei do norte da Noruega
chamado Fornjót teve três filhos: Hlér, Logi e Kári. Como AEGIR, HLÉR é
um substantivo que significa mar, LOGI significa fogo e KÁRI está
incluído nos THULUR ou nomes poéticos para vento. Na seção
SKÁLDSKAPARMÁL da EDDA de Snorri Sturluson, Aegir também é
identificado como um JÖTUNN, especificamente como o gigante do mar
Hlér, que habitou na ilha que agora se chama Hlésey, e que estava
profundamente versado na magia negra, o que é confirmado por
diferentes metáforas ou KENNINGAR. No entanto, outros acreditam que
Aegir era um dos deuses primordiais, antecipando a existência dos
AESIR (Ases), os VANIR (Vanes), JÖTNAR (gigantes), ÁLFAR (elfos) e
DVERGAR (anões).
Na realidade, a nossa principal fonte sobre Aegir é justamente
SKÁLDSKAPARMÁL, que consiste em um diálogo entre Aegir e Bragi, o
deus da poesia, acerca de um grande banquete onde, segundo o relato
de Snorri, os AESIR se reuniram. Quando Bragi chega ao ponto de
descrever as metáforas para o mar, podemos inferir o nome da esposa
de Aegir através de “marido de Rán”. Snorri também oferece os nomes
das nove filhas que Aegir tem: Himinglaeva, Dúfa, Blódughadda,
Hefring, Udr, Hrönn, Bylgja, Bára, Kolga. Aqui encontramos alguns
KENNINGAR: as “filhas de Aegir” são as ondas do mar, de fato a maioria
dos nomes delas realmente significa onda; “fogo de Aegir” é o ouro;
“cavalo de Aegir” é um barco etc. Posteriormente, Snorri, na voz de
Bragi, escreve que Aegir e o gigante Gymir são ambos o mesmo.
Sabemos que essa identificação não corresponde com outro gigante
chamado Gymir, descrito nos poemas éddicos (SKÍRNISMÁL e
HYNDLULJÓD) como marido de Auboda, e cuja filha, Gerd, se casou com
o deus Frey.
Nos poemas éddicos, Aegir é habitualmente anfitrião para os
deuses. As qualidades de Aegir como anfitrião são mencionadas por
Odin diante do rei Geirröd no poema éddico GRÍMNISMÁL. Em
HYMISKVIDA os deuses vão visitar Aegir, e eles precisam de um enorme
caldeirão para preparar a cerveja que será consumida. O poema conta
como Thor adquire o caldeirão do gigante Hymir. Em LOKASENNA, Aegir
oferece uma festa para os deuses em seu salão, onde ele fornece
cerveja fabricada em um caldeirão enorme. Durante a festa, um dos
servos de Aegir, Fimafeng (Eldir é o outro), é morto por Loki, que é
expulso da festa. Mas Loki retorna impetuoso, e é neste ponto que
Thor põe fim ao frenesi de insultos de Loki, ameaçando-o com seu
martelo Mjollnir. Dado que o relato gira em torno da festa, o poema
chama-se também AEGISDREKKA, festa de bebida de Aegir, nos
manuscritos. Em relação ao culto, evidentemente o mar desempenhou,
e ainda desempenha, um papel muito importante na sociedade
escandinava, mas o mar foi um elemento temido e respeitado ao
mesmo tempo. Os deuses do mar (SAEKONUNGAR), Aegir e sua esposa,
Rán, foram protetores e patronos dos marinheiros e exploradores.
Carlos Osvaldo Rocha
Ver também Mitologia Escandinava; Njord.
LINDOW, John. NORSE MYTHOLOGY: A GUIDE TO THE GODS,
HEROES, RITUALS, AND BELIEFS. Oxford/Nova York: Oxford University
Press, 2002.
SIMEK, Rudolf. DICTIONARY OF NORTHERN MYTHOLOGY. Trad.
Angela Hall. Cambridge: Brewer, 1993.
1.3 AEGISHJÁLMUR
Ver Símbolos rúnicos.
1.4 ÁGUIA
A águia é um animal muito presente na literatura e nas mitologias
do medievo europeu, geralmente simbolizada como mensageira dos
deuses e do fogo celeste, mas também acompanhando grandes heróis.
Enquanto substituto do Sol em várias religiosidades euro-asiáticas, foi
um animal amplamente utilizado na heráldica e nas representações de
realeza e nobreza.
Na mitologia nórdica a águia foi representada no topo da árvore
Yggdrasill (GRÍMNISMÁL 31), inimiga e oposta a uma serpente-dragão
em sua base. A imagem de uma árvore cósmica cujo topo é habitado
por um pássaro e em sua base/raiz por uma serpente ou dragão é
comum a diversos povos espalhados pelo mundo, da Eurásia à
América pré-colombiana, e, como nas fontes nórdicas, ambos os
animais que a habitam são inimigos, sendo a serpente assimilada à
terra, e a ave, ao céu. Como no caso escandinavo, a forma mais usual
do pássaro inimigo da serpente nos diversos mitos euro-asiáticos é a
de uma águia, cuja representação pode ser observada na pedra rúnica
de RAMSUNDSBERGET (SÖ 101). Isso talvez tenha sido influenciado
também pela observação na área nórdica da constelação do Cisne
(geralmente em posição elevada no céu) em contraposição à
constelação de Escorpião (visível na linha do horizonte), reforçando a
dicotomia pássaro-serpente no imaginário escandinavo.
Outra referência da águia na mitologia escandinava refere-se ao
deus Odin, especialmente no mito do roubo do hidromel
(SKÁLDSKAPARMÁL 1; HÁVAMÁL 104–110). Após fugir com o precioso
líquido da montanha Hnibjorg, tanto Odin quanto seu perseguidor (o
gigante Suttungr) transformam-se em águias. Segundo Jens Peter
Schjødt, esse episódio também deve ser percebido em termos de
dicotomia: a serpente (forma animal que o deus adotou para adentrar
Hnibjorg) representa o ctônico, a terra, o baixo, o submundo,
enquanto a águia é a esfera celeste, o alto, está relacionada a Asgard.
Esse simbolismo de oposição estaria relacionado aos rituais de
iniciação, onde a visita ao submundo para obter algum tipo de
conhecimento ou bem precioso faz parte da cosmovisão e da
religiosidade pré-cristãs.
Segundo Hilda Davidson, a jornada de Odin transmutado em
águia também é mencionada em poemas arcaicos nórdicos e
relaciona-se a suas características xamânicas em busca de
conhecimento. A pesquisadora ainda lembra que tanto Odin quanto o
deus irlandês Lug estão relacionados a águias e pássaros em geral,
sendo um símbolo celeste e de soberania devido a sua associação com
os imperadores romanos.
O simbolismo da águia também era refletido na religiosidade
nórdica. Segundo Catharina Raudvere, a FYLGJA de pessoas ou famílias
muitas vezes era representada por águias, enquanto a alma (HUGR ou
HAMR) adotava temporariamente essa forma animal revelando a
origem nobre (status moral) da pessoa.
As representações imagéticas de águias durante o período de
migração até a Era Viking são muito variadas, sendo compostas por
imagens em bracteados, esculturas, pingentes e pedras rúnicas. As
duas pedras pintadas de Gotland mais famosas envolvendo águias são
Hammar I e Stora Hammar III, ambas relacionadas aos simbolismos e
mitos odínicos. A primeira contém mais referências religiosas, sendo o
animal relacionado a práticas de sacrifícios humanos, enquanto a
segunda está conectadaao mito do roubo do hidromel por Odin.
Johnni Langer
Ver também Águia de sangue; Alma e espiritualidade; Animais
totêmicos; Hammar I; Hugin e Munin; Odin.
GRÄSLUND, Anne-Sophie. “Wolves, serpents, and birds:
their symbolism meaning in Old Norse beliefs”, IN ANDRÉN,
Anders et alii (orgs). OLD NORSE RELIGION IN LONG-TERM PERSPECTIVES.
Lund: Nordic Academic Press, 2004, pp. 124–29.
DAVIDSON, Hilda. MYTHS AND SYMBOLS IN PAGAN EUROPE:
EARLY SCANDINAVIAN AND CELTIC RELIGIONS. Manchester: Manchester
University Press, 1988, pp. 91, 129, 175.
JESCH, Judith. “Eagles, raven and wolves: beasts of battle,
symbols of victory and death”, IN JESCH, Judith (Ed.). THE
SCANDINAVES: FROM THE VENDEL PERIOD TO THE TENTH CENTURY, AN
ETHNOGRAPHIC PERSPECTIVE. Nova York: Boydell Press, 2002,
pp. 251–71.
LANGER, Johnni. “O céu dos vikings: uma interpretação
etnoastronômica da pedra rúnica de Ockelbo (Gs 19)”. DOMÍNIOS DA
IMAGEM 6(12), 2013, pp. 97–112.
SCHJØDT, Jens Peter. INITIATION BETWEEN TWO WORLDS:
STRUCTURE AND SYMBOLISM IN PRE-CHRISTIAN SCANDINAVIAN RELIGION.
Odense: The University Press of Southern Denmark, 2008,
pp. 163–67.
1.5 ÁGUIA DE SANGUE
O BLÓDÖRN (Águia de sangue) é um ritual que consiste em abrir a
costela das vítimas, extraindo os pulmões e abrindo-os na forma de
asas. Em algumas fontes, a prática é percebida também como um
método de tortura ou execução. Ela é mencionada em várias fontes
literárias, como REGINSMÁL 26; ORKNEYINGA SAGA 8; GESTA DANORUM 13,
315; NORNA-GESTS ÞÁTTR 6; KNÚTSDRÁPA de Sighvatr Thórðarson.
O BLÓDÖRN é um tema polêmico nos estudos escandinavos. Para os
autores que defendem a sua existência histórica, como Alfred Smyth,
Ronald Hutton e Régis Boyer, ele podia ter relação com os sacrifícios
humanos realizados para o deus Odin. Segundo Boyer, a prática pode
ter perdido seu caráter religioso e mesmo ter ficado em desuso, na
época da cristianização, mas auxiliou a reforçar a imagem de barbárie
dos nórdicos frente aos povos invadidos.
Em um detalhado e crítico estudo, a historiadora Roberta Frank
sugere que as narrativas envolvendo o tema nas fontes foram
construções literárias e invenções criadas para reforçar o horror dos
povos invasores, negando qualquer origem ritualística para a prática.
Segundo outros pesquisadores, os próprios poetas da Era Viking não
souberam interpretar corretamente as informações históricas,
perpetuando fantasias sobre este ritual, enquanto outros entendem
que este ritual possui relação direta com as divindades da guerra e
mesmo algumas evocações em gravuras da Idade do Bronze
escandinava. A utilização das imagens da pedra pintada de Hammar I,
na ilha de Gotland, como evidência para o BLÓDÖRN, é questionável.
A sequência ao lado de um enforcado, próximo a um símbolo de
valknut e uma águia, na qual um homem de pé segura uma lança sobre
o corpo de outro humano deitado (que pode ser uma criança ou outro
homem, numa escala menor), demonstra a existência de sacrifícios
humanos na Era Viking, mas não existe detalhamento na imagem para
verificarmos se o pulmão está sendo extraído do corpo da vítima.
Johnni Langer
Ver também Águia; Paganismo nórdico; Odin; Xamanismo
nórdico.
BOYER, Régis. “Aigle de sang”. HÉROS ET DIEUX DU NORD. Paris:
Flammarion, 1997, p. 12.
FRANK, Roberta. “Viking atrocity and skaldic verse: the rite
of the Blood-Eagle”. ENGLISH HISTORICAL REVIEW 99 (391), 1984,
pp. 323–43.
HAYWOOD, John. “Blood eagle”. ENCYCLOPAEDIA OF THE VIKING
AGE. Londres: Thames and Hudson, 2000, pp. 34–35.
LANGER, Johnni. “Religião e magia entre os Vikings”.
BRATHAIR 5(2), 2005, pp. 55–82.
1.6 ÁLFABLÓT
ÁLFABLÓT (Sacrifício aos elfos) é um ritual pagão descrito nas
fontes literárias medievais.
Para Rudolf Simek, existiram três momentos do registro deste
ritual nas fontes. O primeiro está relacionado ao escaldo Sighvatr
Thórdarson, que em sua obra AUSTRFARARVÍSUR menciona sua viagem
no outono de 1018 para a Suécia, onde foi hostilizado pelos pagãos
suecos. Em parte, a recusa de hospitalidade nas fazendas suecas teria
conexão com o ritual álfablót (que estava sendo realizado no momento
da chegada de Sighvatr), e, em especial, sua entrada foi negada por
uma anciã que temia a ira de Odin.
Um segundo momento da descrição do ritual é na KORMÁKS SAGA
22, onde um tipo diferente de ritual é executado: ao herói Þórvarðr é
recomendado despejar o sangue de um boi nas montanhas habitadas
pelos elfos e preparar uma refeição com a carne do animal. De acordo
com a cronologia interna da fonte, o incidente teria ocorrido no século
X, mas como esta saga foi escrita somente após o século XIII, Simek
acredita que a crença nos poderes dos elfos ainda continuava na
Escandinávia após a cristianização. O terceiro momento em que o
ritual foi citado é na YNGLINGA SAGA 44, 48, 49, relacionada ao rei Ólafr
Guðrøðarson. Após um período de grande sucesso do reinado, Ólafr
morre e é sepultado em Geirstad. Seus súditos o denominam
Geirstaðaálfr, e sacrifícios a ele são realizados. Seu bisavô é chamado
de brynjálfr em uma estrofe. Segundo Peter Schjødt, este ritual foi
executado para garantir fertilidade e anos de paz na comunidade.
Neste sentido, os elfos estariam relacionados aos espíritos da terra,
sendo ambos ctônicos e associados com os simbolismos de morte,
fertilidade e proteção da localidade.
Na concepção de John Lindow, o ritual aos elfos também possuía
conexão explícita com os deuses. Para Catharina Raudvere, tanto os
espíritos da terra (LANDVÆTTIR) quanto os elfos estão estreitamente
conectados à fazenda, mas assumem formas diferentes. Enquanto na
KORMÁKS SAGA ele está envolvido em rituais de cura, na YNGLINGA SAGA
ele é uma celebração aos ancestrais.
Johnni Langer
Ver também Dísir; Elfos; Landvættir; Paganismo nórdico.
LINDOW, John. “Álfablót”. NORSE MYTHOLOGY: A GUIDE TO THE
GODS, HEROES, RITUALS, AND BELIEFS. Oxford: Oxford University Press,
2001, pp. 53–54.
RAUDVERE, Catherina. “Popular Religion in The Viking
Age”, IN BRINK, Stefan; PRICE, Neil (eds). THE VIKING WORLD.
Nova York: Routledge, 2008, pp. 235–43.
SIMEK, Rudolf. “Álfablót”. DICTIONARY OF NORTHERN
MYTHOLOGY. Londres: D.S. Brewer, 2007, pp. 7–8.
SCHJØDT, Jens Peter. INITIATION BETWEEN TWO WORLDS:
STRUCTURE AND SYMBOLISM IN PRE-CHRISTIAN SCANDINAVIAN RELIGION.
Odense: The University Press of Southern Denmark, 2008,
pp. 159, 381, 384–85.
1.7 ÁLFAR
Ver Elfos.
1.8 ALFHEIMR
Em nórdico antigo, Alfheimr significa mundo dos elfos. De acordo
com Snorri no GYLFAGINNING 16, é a residência dos elfos claros, que
segundo Simek ele teria imaginado que se situaria nos céus, enquanto
os elfos escuros seriam localizados no submundo. No poema éddico
GRÍMSNIMÁL 5, Alfheimr é dominado de residência de Freyr, uma das
muitas residências dos deuses listadas nesta fonte. Para John Lindow,
não existem fontes que conectem diretamente Freyr com os elfos. Para
a historiografia medieval, Álfheimar era uma região situada entre os
rios Gota e Glom, separando a Noruega da Suécia.
Johnni Langer
Ver também Elfos; Nove mundos.
LINDOW, John. “Álfheim (elf-land)”. NORSE MYTHOLOGY: A
GUIDE TO THE GODS, HEROES, RITUALS, AND BELIEFS. Oxford: Oxford
University Press, 2001, p. 54.
SIMEK, Rudolf. “Alfheimr”. DICTIONARY OF NORTHERN
MYTHOLOGY. Londres: D.S. Brewer, 2007, p. 8.
1.9 ALIMENTAÇÃO E MITOS
Ver Banquetes rituais na Era Viking; Bebidas sagradas nórdicas;
Hidromel da poesia; Mitos alimentares nórdicos.
1.10 ALMA E ESPIRITUALIDADE
Os germanos possuíam uma concepção de alma interna, HAMR
(forma) e FYLGJA (acompanhante), o duplo fiel que todo humano
possui. O hamr é suscetível de sair do corpo, desafiando as leis de
espaço e tempo. É possível que esta noção tenha sido influenciada pelo
xamanismo euro-asiático. A palavra hamr designa a forma interna que
cada um possuiria. Como dito, é suscetível de evadir-se do suporte
corpóreo, que entra em catalepsia ou levitação. O hamr é capaz de
retornar para outros locais ou outras épocas, com a finalidade de
acompanhar as missões com a forma de seu possuidor. Ele assume
uma formaanimal, em geral simbólica de seu suporte. Uma vez que a
empreitada está cumprida, ele regressa ao corpo de seu possuidor.
A origem destas imagens pode remontar aos lapões, que ocupavam a
Escandinávia antes dos germanos. Existem relações entre o hamr e as
representações de lobisomens, de homens transformando-se em lobos
durante a noite (HAMRAMMR, RAMMAUKIN, EIGI EINHAMR).
A FYLGJA é uma entidade sobrenatural (espírito tutelar),
geralmente feminina, que está ligada a um indivíduo e que o
acompanha pela vida toda, sendo visível quando a morte se aproxima,
sendo espíritos tutelares com funções semelhantes às de valquírias,
dises e hamingja. É o vocábulo etimologicamente relacionado à alma
mais antigo e também designa no nórdico antigo as membranas
placentárias que envolvem a criança no momento do nascimento.
O verbo fylgja significa “seguir”, no sentido de acompanhar. Este
duplo possui a mesma imagem que seu suporte material, mas também
uma figura simbólica animal. A fylgja da família é conhecida como
AETTARFYLGJA. Na HELLGAQUIVÐA HJÖRARÐZSOMAR, a fylgja de Helgi
aparece sob a forma de uma mulher andando com lobo e cobras.
Assim, hamr e fylgja são os constituintes internos da
espiritualidade do homem, enquanto o HUGR (equivalente ao MANA
polinésico, a alma do mundo) é o externo, mas todos possuem relação
direta com o destino e os mortos. O hugr seria a alma do mundo, que
se manifesta ao homem no momento de situações reflexivas (espirros,
bocejos, coceiras) ou, mais geralmente, graças a palavras mágicas, com
fins cognitivos, ou ainda em sonhos e aparições. Este hugr podia
realizar atos benéficos ou maléficos: morder (BÍTA), cavalgar (RIÐA) e se
manifestar por meio de pesadelo (MARA).
Por mais individualistas que os nórdicos tenham sido, suas
representações são fortemente alargadas com a ideia de família, de clã.
Assim, temos o conceito de HAMINGJA, a figura tutelar de um clã,
relacionada especialmente com a personalidade deste mesmo clã,
como a descrita na SAGA DE VIGA-GLÚMR, onde uma gigantesca mulher
surge ao herói, exatamente no momento em que ele morre,
encarnando valores de proteção, ou seja, é a forma com que o destino
se aplica a uma família. Também existia a noção de AETTARFYLGJA, a
fylgja atrelada a toda uma família e encarregada de velar por sua
prosperidade. A HAMINGJA podia ser alterada, como consequência do
duelo entre clãs familiares (HAMINGJASKIPTI).
A noção do “nada” não existia entre os escandinavos antigos, era
totalmente estrangeira. A morte não era jamais um termo absoluto
nem mesmo uma ruptura radical, era considerada uma simples
mudança de estado. Morrer era simplesmente passar ao estado dos
ancestrais, com o saber e poder tutelar. Podia-se retornar sob outra
forma pela reencarnação ou metempsicose, que era limitada ao clã.
Perpetuar um nome era necessariamente ressuscitar um ancestral,
relacionado ao ÓÐAL, o patrimônio indivisível que se transmite de
geração a geração.
Não ocorria uma demarcação clara entre vivos e mortos.
A circulação de um domínio e outro não era jamais interrompida – os
mortos frequentemente vinham informar aos vivos em aparições ou
revelações. A mentalidade germânica não possuía uma consciência
clara de outro mundo: foi o cristianismo que o introduziu. Se
analisarmos as fontes literárias, não teremos somente um, e sim vários
mundos intercalados. Os mortos são os guardiães dos clãs e se
comunicam com os vivos através de sonhos, aparições, signos e
símbolos.
O destino não era jamais individual, mas sim inscrito dentro da
perspectiva de uma família, extremamente dotada de uma qualidade
própria de fatalidade. Quando Gauka-Þórir fala de “nossa força” (AFL
OKKAT) e de “nossa capacidade de vitória”, ele tenta considerar essas
palavras muito além de seus companheiros de escolta: a longa
corrente, na verdade, dos ancestrais que fazem sua identidade.
Johnni Langer
Ver também Paganismo nórdico; Vida após a morte; Xamanismo
nórdico.
BOYER, Régis. LE MONDE DU DOUBLE: LA MAGIE CHEZ LES ANCIENS
SCANDINAVES. Paris: Berg, 1986.
BRYAN, Eric Shane. “Icelandic fylgjur tales and possible Old
Norse context”. THE HEROIC AGE 13, 2000.
DAVIDSON, Hilda. “The conception of the soul”. THE ROAD TO
HEL: A STUDY OF THE CONCEPTION OF THE DEAD IN OLD NORSE LITERATURE.
Nova York: Greenwood Press, 1968.
LANGER, Johnni. “Religião e magia entre os Vikings”.
BRATHAIR 5(2), 2005, pp. 55–82.
STRÖMBÄCK, D. “The concept of soul in nordic tradition”.
ARV 31, 1975, pp. 5–22.
1.11 ALVÍSSMÁL
Poema éddico encontrado somente no Codex Regius da EDDA
POÉTICA. É considerado o último poema da seção mitológica devido ao
fato de ser um anão o tema principal. Consiste em 35 estrofes em
forma de diálogo utilizando a métrica ljóðaháttr. Lee Hollander o
caracteriza como sendo um poema didático utilizado pelos escaldos
para memorizar mais facilmente o vocabulário mitológico. Segundo
Rudolf Simek o Alvíssmál teria sido escrito no século XII e não seria
derivado de uma narrativa mítica, mas de material poético como a
lista de nomes do Þulur (EDDA de Snorri) e apresentada pelo poeta
como um trabalho mitológico. Também John Lindow concorda que a
temática de duelos verbais de anões e do próprio Thor são incomuns,
demonstrando a origem tardia do poema, mas a ação de proteção das
mulheres pelo deus é apropriada ao contexto. Mogk e Henry Bellows
também acreditavam que o poema datava do século XII, no período
denominado de renascimento da poesia escáldica.
Na narrativa, o anão Alvíss tenta conseguir em casamento a filha
de Thor, mas tem que passar por uma série de questões gnômicas
feitas pelo próprio deus. Nas primeiras estrofes, Thor indaga os nomes
para a Terra, o céu, a Lua, o Sol, vento, fogo, mar, madeira, noite etc.
No desfecho, o anão é enganado e transformado em pedra pela luz do
Sol nascente.
Johnni Langer
Ver também Codex; Edda Poética; Mitologia Escandinava.
ACKER, Paul. “Dwarf-lore in Alvíssmál”, IN ACKER, Paul &
LARRINGTON, Carolyne (eds). THE POETIC EDDA: ESSAYS ON OLD
NORSE MYTHOLOGY. Nova York e Londres: Routledge, 2002,
pp. 213–27.
LINDOW, John. “Alvíssmál”. NORSE MYTHOLOGY: A GUIDE TO THE
GODS, HEROES, RITUALS, AND BELIEFS. Oxford: Oxford University Press,
2001, pp. 56–58.
SIMEK, Rudolf. “Alvíssmál”. DICTIONARY OF NORTHERN
MYTHOLOGY. Londres: D. S. Brewer, 2007, pp. 12–13.
1.12 AM 748 I 4to.
Fragmento de manuscrito islandês que contém diversos poemas
éddicos, datado do início do século XIV e inserido na coleção
Arnamagnæan da Biblioteca da Universidade de Copenhague, motivo
de também ser denominado CODEX ARNAMAGNÆANUS. Contém
integralmente as versões dos poemas GRIMNISMÁL, HYMSKVIDA e BALDRS
DRAUMAR e fragmentos dos poemas SKÍNISMÁL, HÁRBARDSLJÓD,
VAFDRÚDNISMÁL e VOLUNDARKVIDA. É o único manuscrito medieval que
preservou o poema BALDRS DRAUMAR (Os sonhos de Balder), e todos os
outros possuem outras versões no Codex Regius da EDDA POÉTICA,
considerado superior em termos de preservação e originado da mesma
fonte do qual o AM 748 I 4to foi baseado.
Johnni Langer
Ver também Codex; Edda Poética; Mitologia Escandinava.
HOLLANDER, Lee M. “General introduction”. THE POETIC
EDDA. Austin: University of Texas, 2008, pp. ix-xxix.
1.13 AMULETOS MÁGICOS
Objetos mágicos utilizados para proteger o portador de
infortúnios ou para conceder algum poder especial. O uso de amuletos
entre os germanos antigos e os escandinavos é atestado pela
Arqueologia e por diversos pesquisadores. Esses amuletos são de
origem animal, vegetal ou mineral (pedaços de ossos, conchas,
mandíbulas animais, raízes, fragmentos de âmbar etc.), mas o mais
comum é serem fabricados com metal, como os bracteados. Amuletos
com inscrições rúnicas ou símbolos mágicos também são
significativos, mesmo após a cristianização, alguns inclusive utilizando
cápsulas de prata ou bolsinhas com ervas.
O pesquisador Signe Fuglesang em 1989 realizou uma densa
sistematização sobre o uso de amuletos na Escandinávia da Era
Viking, mas questionou muitas interpretações. Para ele, a associação
entre divindades e amuletos é duvidosa,com exceção do martelo de
Thor, sendo que o uso das fontes literárias para estabelecer o contexto
ritual dos objetos seria nulo. Apesar disso, a maioria dos
pesquisadores vem relacionando a existência de numerosos amuletos
mágicos entre os nórdicos pré-cristãos.
Segundo Rudolf Simek, alguns amuletos não se relacionam
diretamente com proteção mágica, mas estabelecem uma conexão
entre uma deidade em particular, como pequenas estatuetas de
deuses, como Freyr e Thor. Pequenos martelos de Thor foram
utilizados como pingentes-amuletos (em contraposição aos crucifixos),
simbolizando a fé pagã durante o processo de conversão da
Escandinávia. Outras armas miniaturizadas, como pingentes de
pequenas cabeças de lança, podem significar uma conexão com a
devoção a Odin, como documentado pelos bracteados.
Escavações arqueológicas na Estônia da Era Viking revelaram
uma quantidade imensa dos mais variados tipos de amuletos pagãos,
sistematizados por Andres Tvauri. Alguns destes são bem exóticos,
como pingentes de ossos em formato de pequenos pentes, vistos como
objetos de proteção mágica ou que trazem força vital para os cabelos.
A maioria absoluta destes amuletos possui proporções e origens
diferentes, sendo confeccionados com caninos e garras dos mais
variados animais: ursos, lobos, cachorros, raposas, porcos selvagens e
domésticos, cavalos, castores, falcões. Tvauri considera que o uso
masculino destes objetos tinha uma significação de proteção marcial,
enquanto o feminino seria utilizado para fins mágicos de fertilidade.
As garras de águia eram associadas com o deus do trovão e os
relâmpagos no céu – seu uso era um privilégio da elite, pois estes
animais só podiam ser caçados pela aristocracia. Outros tipos de
pingente, como caninos de castores, podem estar relacionados com
uma espécie de culto ao castor (com função mágica), mas também são
considerados símbolo de alto status social.
Um dos tipos de amuletos nórdicos mais estudados atualmente
são os bracteados, objetos circulares com decorações em somente um
dos lados e utilizados como pingentes, datados dos séculos V a VII
d.C. Originalmente, eram imitações dos medalhões clássicos dos
imperadores romanos. Até o presente momento foram recuperados na
Escandinávia e em outras regiões europeias mais de 650 exemplares.
Além de runas e símbolos (como círculos concêntricos, suásticas,
triskelions e espirais) os bracteados apresentam imagens de animais
(porcos, aves, cavalos, serpentes e criaturas fantásticas) e entidades
antropomórficas. Estes objetos foram encontrados em sepulturas
masculinas e femininas, com predominância destas últimas, e foram
feitos em ouro ou prata. Para Hilda Davidson, as runas presentes nos
bracteados serviram para aumentar o poder mágico do amuleto e
foram símbolos de poder associados ao destino da família. Alguns
também podem ter sido utilizados como proteção contra danos ao
portador. Algumas cenas dos bracteados foram identificadas com a
morte de Balder, a mutilação de Týr por Fenrir e outras a Odin e seus
corvos.
Outros tipos de objetos considerados como amuletos são
pequenas lâminas de ouro, encontradas nas fundações de certas
construções (algumas conectadas a salões reais e centros sagrados).
Geralmente as imagens consistem em um homem abraçando uma
mulher, comumente interpretadas como sendo Freyr e Gerd,
conectando o objeto com os deuses da fertilidade, o abençoar da terra,
as famílias com a comunidade. As pesquisas recentes de Gro
Steinsland relacionam estes objetos com as dinastias reais e as
ideologias aristocráticas para manutenção do poder por meio da
releitura social e política dos mitos.
Mas sem dúvida os tipos de amuletos mais importantes para
entender a religiosidade nórdica pré-cristã são os que portam
inscrições rúnicas, devido ao fato de podermos contrastá-los
diretamente com as fontes literárias. Segundo o minucioso estudo de
Mindy MacLeod e Bernard Mees, os tipos de inscrições mais comuns
são os que solicitam ajuda aos deuses. Algumas invocam deidades
(Logathore, Wodan e Thonar) para um amuleto amoroso, como a
inscrição do broche de Nordendorf (Alemanha, séc. VI). Outra, como
Pforzen (Alemanha, séc. VI), é um encanto para favorecer a caça,
invocando Aigil e Airun (seres semidivinos citados no VOLUNDARKVIDA).
Algumas vezes, palavras de encanto em amuletos rúnicos
funcionam como símbolos não alfabéticos, como o uso de suásticas,
flechas e árvores encontradas em broches, tornando o amuleto mais
poderoso. A invocação de deidades para a cura também ocorre, como o
texto de Ribe (Dinamarca, 725 d.C.): “ULFR AUK ÓÐINN AUK HÓ. HJALP ES
VIÐR/ÞÆIMA VÆRKI. AUK DVERG UNNINN. BÓURR” (“Ulfr e Odin e o grande
Tyr/Ajudam Bur contra o mal/ E o anão é derrotado/Bóurr”). O deus
Thor também aparece relacionado à cura, como na inscrição de
Kvinneby (Suécia, séc. XI): “HÆR RÏSTI EK ÞÆR BERG, BÖFI/MÆR FULLTY!
ÏHÜÐ ES ÞÆR VÏSS./EM BRÄ HALDI ILLU FRÄN BÖFA./ÞÖRR GÆTI HANS MEÐ ÞËM
HAMI SEM UR HAFI KAM./FLY FRÄM ILVËTT! FÆR EKKI AF BÖFA./GUÐ ERU UNDIR
HÄNUM AUK YFIR HÄNUM.” (“Aqui eu gravei para seu socorro,
Bofi/Socorra-me! O conhecimento é certo para você/e pode o
relâmpago carregar todo o mal sobre Bofi/Thor poderoso protege com
seu martelo e sai do oceano/Evite o mal! Ele não conseguiu nada de
Bofi/ Os deuses estão acima dele e abaixo dele”). Como esta inscrição
também possui o desenho de um peixe, MacLeod e Mees acreditam
que também tenha conexão com o episódio da pesca da serpente do
mundo por Thor.
Os amuletos com funções puramente curativas, obviamente, em
se tratando de uma sociedade medieval, são abundantes. Muitas
inscrições do período de transição mesclam conhecimentos clássicos,
com a tradição pagã e o folclore cristão. O mal (as doenças, a dor, as
crises e violências) muitas vezes é percebido simbolicamente na figura
do lobo e dos gigantes, como no amuleto de Sigtuna (Suécia, séc. XI):
“ÞURS SARRIÐU, ÞURSA DRÖTTIN; FLY ÞÚ NU, FUNDINN ES! AF ÞÉR ÞRJÁR ÞRÁR,
ÜLFR!” (“Gigante da gangrena, senhor dos gigantes, foge, você foi
descoberto! Tenha para si três tormentos, lobo!”). A runa em questão
(Þurs) também pode significar o mal causado pelos anões e elfos. No
dialeto sueco moderno, TUSS tanto significa lobo quanto gigante, ogro e
pesadelo. Essa mesma runa possui conotações negativas para as
mulheres.
Ao estudar especificamente amuletos rúnicos na Dinamarca dos
séculos XI ao XV, o epigrafista Rike Olesen percebe os mesmos como
objetos essencialmente funcionais, sem o caráter estético presente nas
fontes literárias. Eles foram confeccionados por pessoas buscando
algum tipo de proteção, alguns já conectados diretamente com a
tradição religiosa cristã, mas ainda preservando referenciais de
eficácia mágica dos tempos pagãos. Assim, são considerados por
Olesen como materiais híbridos, conservando elementos tradicionais e
adicionando temas novos.
Johnni Langer
Ver também Anéis; Espiral; Magia rúnica; Paganismo nórdico;
Plantas mágicas; Valknut; Símbolos rúnicos; Runas; Suástica.
DAVIDSON, Hilda. “Early amulets”. THE LOST BELIEFS OF
NORTHERN EUROPE. Nova York: Routledge, 2001, pp. 37–45.
FUGLESANG, Signe Horn. “Viking and medieval amulets in
Scandinavia”. FOR VÄNNEN: JOURNAL OF ANTIQUARIAN RESEARCH 84,
1989, pp. 15–27.
LANGER, Johnni. “Símbolos religiosos dos vikings”.
HISTÓRIA, IMAGEM E NARRATIVAS 11, 2010, pp. 1–28.
MACLEOD, Mindy & MEES, Bernard. RUNIC AMULETS AND
MAGIC OBJECTS. Londres: Boydell Press, 2006.
MAREZ, Alain. “Magie, culte et religion/Rites et
malédictions”. ANTHOLOGIE RUNIQUE. Paris: Les Belles Lettres, 2007,
pp. 158–96.
OLESEN, Rikke Steenholt. “Runic amulets from Medieval
Denmark”. FUTHARK: INTERNATIONAL JOURNAL OF RUNIC STUDIES 1,
2010, pp. 161–76.
1.14 ANDVARI
Ver Anel; Fafnir; Nibelungos; Sigurd.
1.15 ANÉIS
O anel é um artefato que simboliza um elo, geralmente associado
a uma promessa, uma aliança ou um vínculo social. Na tradição de
estudos medievais, é comum atribuirmos a possibilidade da entrega de
um anel durante um ritual feudo-vassálico. Ainda que longe dessa
realidade, é possível encontrarnas sagas a entrega de um anel como
forma de pagamento por um feito, o acordo entre um rei e seus
súditos, ou ainda como identificação de elevado gênero social. Na
mitologia escandinava, os anéis também representam uma associação
com as funções de certas figuras divinas.
Na HRÓLFS SAGA KRAKA OK KAPPA HANS (Saga de Hrólfr Kraki e Seus
Campeões), Björn é amaldiçoado pela sua madrasta e toma a forma de
um urso. Bera, sua amante, recolhe de seu corpo um anel que possuía
no braço para que o identificassem não como o urso amaldiçoado, mas
como o príncipe Björn, filho do rei Hringr. Na mesma saga,
encontramos o SVÍAGRISS (Pequeno Porco dos Suecos) que é entregue
pela rainha Yrsa ao seu filho Hrólfr enquanto ele visitava o rei Aðils
(que tentou perfidamente assassinar Hrólfr e seus campeões). Junto a
esse anel, a rainha lhe deu um chifre de prata, além de vários outros
tesouros inestimáveis. Ameaçado em uma emboscada, Hrólfr agita o
chifre, esparramando todo o tesouro no chão, levando seus inimigos a
parar a perseguição para a coleta dessas riquezas (o tema da
perseguição pode ainda ser encontrado na YNGLINGA SAGA e na GESTA
DANORUM). O rei Aðils, não sendo iludido por essa tática, só é parado
quando Hrólfr arremessa o SVÍAGRISS no chão, sendo levado a
recuperar o anel com sua lança. Ao tentar recuperar o anel, Hrólfr
compara Aðils a um suíno: “Eu agora o fiz andar como um porco,
aquele que dos suecos era o mais poderoso”.
No SKALDSKAPARMÁL é descrito o mesmo episódio envolvendo o
SVÍAGRISS de maneira similar. O rei Hrólfr junto aos seus campeões vão
ao auxílio de Aðils, que se recusa a pagar o preço pela ajuda que
recebeu: o elmo HILDIGÖLTR (Javali de Batalha), a armadura FINNSLEIF
(Herança dos Finns) e o próprio SVÍAGRISS. As representações desses
animais em equipamentos guerreiros podem estar associados a
práticas mágicas da transformação do homem em animal, ou a
inspiração sobre suas forças, ainda que esse ponto esteja aberto à
discussão na cultura material e nas narrativas escandinavas.
O SVÍAGRÍSS (bem como todo o equipamento com desenhos de
suínos) pode estar atrelado ao culto dos deuses Freyr e Freyja, que,
apesar de estarem ligados em torno da esfera da fertilidade, também
são notáveis no aspecto guerreiro. A feitiçaria Seiðr era praticada por
Freyja, que teria ensinado a prática aos outros deuses, especialmente
Óðinn, que se utiliza desse conhecimento no campo divinatório, de
controle da inteligência alheia e das doenças. O SVÍAGRÍSS, dessa
maneira, é um artefato precioso que invoca o domínio mágico-
guerreiro dos deuses Freyr e Freyja (além da figura suína, que traz em
si sua própria belicosidade), mas que também pode estar ligado ao
poder mágico que a deusa representa (ainda que nenhum ritual ligado
à prática de Seiðr apareça na narrativa).
Um segundo anel presente na mitologia nórdica e que deve ser
mencionado é o DRAUPNIR (Gotejante), encontrado na EDDA POÉTICA e
na EDDA EM PROSA. A criação desse artefato está ligada ao episódio do
roubo dos cabelos dourados da deusa Sif por Loki, narrado no
SKÁLDSKAPARMÁL. O anão Brokkr confecciona tesouros maravilhosos
para os deuses, como uma aposta pela cabeça de Loki: um javali com
arreios de ouro e o barco Skíðblaðnir para o deus Freyr, o martelo
Mjöllnir para o deus Þórr (junto com novos cabelos para sua esposa,
Sif), e para o deus Óðinn a lança Gungnir junto com o anel de ouro
DRAUPNIR. Esse anel possui a seguinte propriedade: a cada nove noites
ele deverá verter oito anéis com o mesmo peso que ele. O número nove
é vinculado à visão cósmica na mitologia escandinava, pois são nove os
mundos. Nove anos são necessários para que as donzelas-cisnes
retornem a sua condição primordial de Valquíria na VÖLLUNDARKVIÐA
(Canção de Völundr); certos festivais religiosos em Lejre, na
Dinamarca, e Uppsala, na Suécia, aconteciam a cada nove anos (em
Gamla Uppsala era realizado um grande sacrifício de animais, com
nove tipos de machos sendo enforcados ao deus Óðinn). Por fim, o
número nove representa o sacrifício feito na árvore Yggdrasill no
intuito de receber conhecimento enforcando-se por nove dias.
Outras referências às propriedades do DRAUPNIR aparecem em
Ditos de Skírnir (SKÍRNIRSMÁL), onde o deus Freyr se apaixona por uma
giganta e seu emissário, e Skírnir, é enviado para trazê-la. Em certo
momento, Skírnir lhe oferece o anel DRAUPNIR: “Então você tomará
esse anel,/aquele que foi queimado/com o jovem filho de Óðinn,/oito
são de pesos iguais/que dele vertem/a cada nona noite”. Assim
responde Gerðr, a giganta: “O anel não irei aceitar,/mesmo sendo
queimado,/com o jovem filho de Óðinn;/o ouro não me falta/nas
cortes de Gyrmir/divido as riquezas de meu pai”. Durante o funeral de
Baldr, no GYLFAGINNING (Visão de Gylfi), Óðinn deposita seu anel na
pira funerária de seu filho, reforçando seu caráter de tesouro precioso:
“Óðinn colocou seu anel de ouro na pira, aquele chamado DRAUPNIR.
Ele prosseguia dessa maneira: a cada nove noites vertia ele oito anéis
de mesmo peso” (GYLFAGINNING 49).
A propriedade de Óðinn sobre esse artefato está amplamente
ligada aos exercícios da guerra, principalmente ao domínio sagrado da
liderança guerreira. Os implementos são mais que simples posses: eles
compartilham integralmente as funções sagradas de cada deus. Dessa
maneira, o DRAUPNIR pode representar todas as atividades provenientes
do acúmulo de tesouros (uma das metáforas poéticas para ouro no
SKÁLDSKAPARMÁL é justamente “gotas do DRAUPNIR” ou “chuva do
DRAUPNIR”), entre elas o patrocínio da inspiração poética (que é outro
domínio odínico), o financiamento das expedições guerreiras,
presentes para outras chefias guerreiras (com a finalidade de adquirir
apoio) etc.
A VÖLSUNGA SAGA (Saga dos Volsungos) contém uma narrativa mais
concentrada em torno da maldição do ANDVARANAUT. Andvari
amaldiçoa o anel (bem como todo o seu tesouro), o ouro enche a sacola
feita com a pele de Ótr, e Fáfnir assassina seu pai, tomando o tesouro e
se transformando no dragão. Impossibilitado de transpor a muralha
de chamas, transposição necessária para alcançar a Valquíria
Brynhild, Gunnar pede que Sigurðr vá buscá-la. Sigurðr derrotara
previamente o dragão Fáfnir e tomara seu tesouro, inclusive o anel; foi
quando saiu de sua batalha e encontrou a Valquíria, e fizeram
promessas de amor que acabaram esquecendo por motivos
relacionados à narrativa.
Quando Sirgurðr encontra Brynhild, ele retira o ANDVARANAUT e lhe
dá outro anel do tesouro de Fáfnir, entregando o anel amaldiçoado a
sua esposa, Gudrun. O ANDVARANAUT é a prova necessária para a
vingança de Brynhild. Em certa discussão a rainha Gudrun argumenta
que não surgiu homem mais pródigo que Sigurðr, que ele matou o
dragão Fáfnir e resgatou Brynhild das chamas, ao invés de Gunnar.
O anel Andvaranaut é ao mesmo tempo a identificação dos feitos
heroicos e o símbolo que anuncia a tragédia que iria dar
prosseguimento a essa saga: Brynhild leva o rei Gunnar a planejar o
assassinato de Sigurðr, que acaba sendo morto por Guttormr, irmão de
Gunnar (pois esse não rompe nenhum laço de lealdade com o ato).
Com o assassinato feito, Brynhild se mata, profetizando antes a morte
dos Giukungos, a linhagem de Gunnar e Gudrun.
Pablo Gomes de Miranda
Ver também Amuletos mágicos; Saga dos Volsungos; Sigurd.
CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. DICIONÁRIO DE
SÍMBOLOS. Rio de Janeiro: José Olympio Editor, 2002.
DUBOIS, Thomas A. NORDIC RELIGIONS IN THE VIKING AGE.
Pensilvânia: University of Pennsylvania Press, 1999.
LANGER, Johnni. “Seiðr e magia na escandinávia medieval:
reflexões sobre o episódio de Þorbjörg na EIRÍKS SAGA RAUÐA”.
SIGNUM 11(1), 2010, pp. 177–202.
MIRANDA, Pablo Gomes de. “Sobre os anéis de poder”.
HISTÓRIA, IMAGEM E NARRATIVAS 15, 2012, pp. 1–32.
1.16 ANIMAIS TOTÊMICOS
Praticamente todos os animais citados nas fontes literárias e que
foram representados imageticamente na Era Viking, são diretamente
associados ao deus Odin.
O lobo e o cão geralmente são companheiros das jornadas da alma
para o outro mundo em rituais votivos. Cachorrose lobos estão
conectados com a ideologia guerreira, especialmente para o grupo dos
berserkir – homens jovens, não casados, especializados na arte da
guerra. Várias gerações de guerreiros combinavam o nome de termos
de batalha com elementos relacionados ao lobo – também se referindo
à iniciação de jovens no mundo marcial.
Os pássaros – aves de rapina, como gaviões e falcões, são
tradicionalmente signos da aristocracia, enquanto a águia é emblema
de poder. Em alguns pingentes, dois corvos metamorfoseiam-se nas
pontas dos chifres de uma figura barbada, demonstrando a
continuidade de antigos cultos pré-vikings na área nórdica.
Um tipo de amuleto muito difundido na Era Viking, tanto na área
finlandesa quanto nas ilhas britânicas, era o uso de dentes de ursos –
tanto imitações em bronze quanto peças originais. Supunha-se que
continham propriedades mágicas, relacionadas à captura do espírito
dos ursos (KARHUNPEIJAISET). Na HRÓLFS SAGA KRAKA, o personagem
Bodvarr tem a alma transformada em urso, uma referência aos antigos
rituais pré-cristãos ainda preservados na literatura centro-medieval.
Em recente estudo, o historiador Thomas DuBois analisou a
relação do simbolismo animal atrelado à dieta e ao culto dos deuses,
como o gado, cavalos, bodes, ovelhas, renas, porcos, peixes e ursos,
demonstrando a estreita relação entre cotidiano e religiosidade na
Escandinávia pré-cristã.
Johnni Langer
Ver também Fenrir; Hugin e Munin; Odin; Paganismo nórdico;
Xamanismo nórdico.
DUBOIS, Thomas. “Diet and deities: contrastive livelihoods
and animal symbolism in Nordic Pre-Christian Religious”, IN
RAUDVERE, Catharina & SCHJØDT, Jens Peter (eds). MORE THAN
MYTHOLOGY: NARRATIVES, RITUAL PRACTICES AND REGIONAL DISTRIBUTION
IN PRE-CHRISTIAN SCANDINAVIAN RELIGIONS. Lund: Nordic Academic
Press, 2012, pp. 65–96.
GRÄSLUND, Anne-Sophie. “Wolves, serpents, and birds:
their symbolism meaning in Old Norse beliefs” IN ANDRÉN,
Anders et alii (orgs.). OLD NORSE RELIGION IN LONG-TERM PERSPECTIVES.
Lund: Nordic Academic Press, 2004, pp. 124–29.
LANGER, Johnni. “Símbolos religiosos dos vikings”.
HISTÓRIA, IMAGEM E NARRATIVAS 11, 2010, pp. 1–28.
1.17 ANÕES (DVERGAR)
Os DVERGAR (singular DVERGAR) são um dos grupos de seres
inferiores na mitologia escandinava. Ao contrário da maioria desses
grupos, como os ÁLFAR (“elfo”) ou as DÍSIR (um tipo de espíritos
femininos), muitos DVERGAR têm nomes individuais e, em alguns casos,
desempenham um papel importante nos mitos. A tradução de DVERGAR
para “anão” responde a razões mais etimológicas que históricas; os
“anões” da mitologia não são, necessariamente, de pequena estatura.
O termo é encontrado em todas as línguas germânicas, como o DWARF
moderno inglês (antigo DWEORG) ou alemão ZWERG (antigo alto alemão
TWERG). A raiz original germânica DWERGAZ é de etimologia incerta,
talvez relacionada a temas indo-europeus, “torto, fraco”, denotando
um ser deformado, aleijado e, possivelmente, monstruoso. A mesma
palavra DVERGAR também indica um pilar de apoio no hall. De forma
semelhante, um papel desempenhado pelos anões na mitologia é como
pilares de sustentação do céu em cada ponto cardeal.
Além disso, os DVERGAR aparecem com frequência na poesia
éddica, embora seu papel seja geralmente secundário. Apenas um
poema, o tardio ALVÍSSMÁL, focaliza num deles. Eles também são
ocasionalmente associados com o mundo dos mortos, como é indicado
por nomes como NÁINN, NAR (“cadáver”), Dáinn (“morto”). Outro
aspecto associado com os DVERGAR é o conhecimento (incluindo magia)
e sabedoria: este aspecto é destacado no poema éddico ALVÍSSMÁL (“o
discurso do que sabe tudo”) e também em nomes como Ráðspakr
(“sábio conselho”) ou Vitri (“sábio”). Embora não se deva exagerar na
utilidade da etimologia, é lógico pensar que tinha algum significado
para os homens da época, como demonstra o lar de várias listas de
nomes dos DVERGAR, incluindo a que está presente (talvez interpolada)
no poema VǪLUSPÁ. Não temos nenhum vestígio de que fosse concebida
a existência de DVERGAR femininos.
No entanto, o papel principal dos DVERGAR na mitologia é o de
ferreiros e moradores de rochas. Ao contrário dos ÁLFAR, os DVERGAR
não parecem ter sido adorados ou incluídos nos nomes humanos.
Neste sentido eles se assemelham aos JÖTNAR, antagonistas dos deuses.
Contudo, o DVERGAR é geralmente indeterminado, ausente, com ele é
possível estabelecer laços comerciais não hostis, mas não sociáveis.
Eles normalmente são gananciosos, mas não inerentemente
agressivos. Podem ocupar uma posição de neutralidade na cosmologia,
e permanecem fora da batalha entre os deuses e seus inimigos no
RAGNARǪK.
É possível que a ausência de generosidade e o desejo de acumular
riqueza seja a característica que melhor os distingue dos ÁLFAR com que
regularmente são confundidos. Porém, os DVERGAR são equivalentes aos
SVARTÁLFAR e DÖKKÁLFAR na Edda prosaica. Isso pode explicar por que
eles não receberam adoração dentro de um sistema religioso baseado
na ideia de uma relação de troca entre os adoradores e as divindades.
A avareza dos DVERGAR assemelha-os aos ORMAR (“dragões, vermes,
serpentes”), e é possível que o dragão Fafnir fosse originalmente um
DVERGAR como seu irmão, o ferreiro Reginn, pai adotivo do herói
Sigurðr.
Ausente nas sagas dos islandeses, sua transformação em anões
(no sentido físico) pode ser vista nas sagas lendárias e de cavalaria.
Ainda vivem em rochas, mas agora os DVERGAR têm vida familiar. Eles
vão de uma forma clara trabalhar como ajudantes ou inimigos,
deixando de lado a neutralidade. Trabalham também alinhados com
um dos temas dominantes destas sagas, ajudando na realização de
quadros amorosos. Para isso são dotados de alguns de seus poderes
tradicionais, como a grande habilidade na ferraria, mas também têm
poder em novas áreas, como a capacidade de curar. Portanto, os
DVERGAR das sagas se assemelham a figuras da literatura continental,
mas mantêm as características de temas mitológicos.
Santiago Barreiro
Ver também Alvíssmál; Elfos.
ACKER, Paul. “Dwarf-lore in Alvíssmál”, IN ACKER, Paul &
LARRINGTON, Carolyne (eds.). THE POETIC EDDA: ESSAYS ON OLD
NORSE MYTHOLOGY. Nova York e Londres: Routledge, 2002,
pp. 213–27.
JAKOBSSON, Ármann. Enabling Love: “Dwarfs in Old
Norse-Icelandic Romances”, IN WOLF, Kirsten (ed.), ROMANCE AND
LOVE IN LATE MEDIEVAL AND EARLY MODERN ICELAND: ESSAYS IN HONOR
OF MARIANNE KALINKE. Ithaca: Cornell University Library, 2008,
pp. 183–206.
BATTLES, Paul. “Dwarfs in Germanic Literature: Deutsche
Mythologie or Grimm’s Myths”, IN SHIPPEY, Tom (ed.). THE
SHADOW-WALKERS: JACOB GRIMM’S MYTHOLOGY OF THE MONSTROUS.
Tempe: Arizona Center for Medieval and Renaissance Studies,
2005, pp. 29–82.
MOTZ, Lotte. THE WISE ONE OF THE MOUNTAIN: FORM, FUNCTION
AND SIGNIFICANCE OF THE SUBTERRANEAN SMITH: A STUDY IN FOLKLORE.
Göppingen: Kümmerle, 1983.
1.18 ANTROPOGONIA NÓRDICA
A criação do primeiro homem vincula-se ao personagem Búri, que
de acordo com Snorri nasceu do gelo lambido pela vaca Audhumla, e
de cujo filho Borr nasceram os primeiros deuses. Mas a raça humana
descenderia diretamente de um casal, Ask e Embla, cuja narrativa foi
preservada tanto na EDDA POÉTICA como na EDDA MENOR. Para Régis
Boyer, o termo Askr significa freixo e Embla tronco de videira.
Segundo John Lindow, a tradução de Embla é incerta, mas ele opta
pela tradução de olmo, uma ideia inicialmente defendida por Sophus
Bugge. Para Rudolf Simek, o termo tem conexão com o casal Assi e
Ambri, citado na HISTÓRIA DOS LOMGOBARDOS de Paulo Diácono,
atestando a antiguidade da narrativa mítica. Em 1910, o mitólogo
H. Sperber apontou a semelhança de Embla com o grego ÁMPELOS, que
significa vinho, sugerindo uma conexão indo-germânica com os rituais
relacionados ao fogo e ao sexo. Para alguns pesquisadores, como
Henning Kure, os termos para o casal não têm relação com plantas,
mas com os órgãos sexuais.
Segundo as informações da VÖLUSPÁ 17–18, Ask e Embla teriam
sido criados por três deuses, que lhes repassaram algumas virtudes:
Odin concedeu-lhes o espírito;Hónir, o sentimento; Lódur, o ardor e a
boa coloração. Já no GYLFAGINNING 9, a tríade criadora foi composta de
Odin, Vili e Ve, que ao encontrarem dois troncos de árvore em uma
praia lhes concederam o espírito e a vida, inteligência e movimento,
aparência humana, fala, audição e visão. Também forneceram roupas
e nomes, tendo os descendentes de Ask e Embla habitado Midgard.
Para Rudolf Simek, a antropogonia nórdica se repete no poema
VAFÞRÚÐNISMÁL 45, com a narrativa do casal Lif e Lifþrasir, que
sobrevive ao colapso do mundo e é progenitor de uma nova raça
humana.
Em 1879, A.C. Bang comparou Ask e Embla com Adão e Eva,
seguindo a linha de interpretação de Sophus Bugge segundo a qual as
narrativas nórdicas foram amplamente influenciadas pelo
cristianismo, uma ideia seguida atualmente por vários pesquisadores
– inclusive aparecendo no documentário THOR (Série CONFRONTO DOS
DEUSES, 2009). Apelando ainda para uma matriz pagã da narrativa de
Ask e Embla, Régis Boyer pensa que existe um parentesco muito
próximo entre Ask (freixo) com a árvore Yggdrasill. Isso seria um
reflexo de uma imaginação naturalista, muito característica dos
germanos em geral: a árvore como símbolo da vida. Recentemente, o
pesquisador Hans Hultgård realizou um amplo e detalhado estudo
comparativo desta narrativa com as mais diversas tradições
antropogônicas do Velho Mundo, passando pela área clássica, iraniana
e finlandesa, concluindo que ela pertence a uma tradição indo-
europeia mais antiga, a de mitos em que os homens são gerados em
conexão com árvores. Em especial, Hultgård comparou a VÖLUSPÁ 4,
onde o Sol surge associado a plantas – em um momento cosmogônico,
com a estrofe 17 narrando o surgimento de Ask e Embla. E utilizando
um mito frígio, que relata justamente o momento em que o Sol
ilumina os primeiros humanos, transfigurados em árvores, apela para
a ideia de que o poema éddico preservou uma narrativa muito antiga,
sem vínculo com o cristianismo.
Os primeiros humanos na cosmovisão nórdica tiveram muito
destaque na arte ocidental. Na ilustração ODIN, LODUR, HOENIR SKABE
ASK OG EMBLA, de Lorenz Frølich, 1895, o casal ganha vida pelos três
deuses. Enquanto Lodur e Hoenir seguram os braços de Ask e Embla,
Odin está sentado e abraçando os mesmos. Ao contrário de suas outras
ilustrações, Frølich representou Odin como um ancião barbudo,
lembrando muito as divindades clássicas, especialmente Netuno. O Sol
surge por trás de todo o conjunto, concedendo um sentido óbvio de
início da vida. Em outra ilustração, datada de 1919 e realizada por
Robert Engels, o casal emerge de uma árvore, ladeada pelas três
divindades. O tom geral da composição é muito mais grosseiro,
diferenciando-se da imagem delicada de Frølich. Em 1948 o sueco Stig
Blomberg realizou a escultura ASK OCH EMBLA, para uma praça na
cidade de Sölvesborg. O casal ganha uma estética que se aproxima
muito das representações de Adão e Eva dentro do imaginário cristão.
Em 2003, foi criada a pintura ASK OG EMBLA, integrante de uma coleção
de selos das ilhas Faroe com temas nórdicos, de autoria do artista
Anker Eli Petersen. A imagem inovou pelo uso de cores fortes e
contraste de tons claros e escuros, concedendo um sentido de
submissão humana aos deuses pagãos. Uma das poucas
representações sobre Ask e Embla que mostram o momento em que
Odin, Vili e Ve encontram os troncos, antes de dar forma humana a
estes objetos, foi realizada em 1995 pelo ilustrador James Alexander.
Johnni Langer
Ver também Cosmogonia nórdica; Odin; Teogonia nórdica.
HULTGÅRD, Anders. “Ask and Embla myth in a comparative
perspective”, IN ANDRÉN, Anders et alii (orgs.). OLD NORSE
RELIGION IN LONG-TERM PERSPECTIVES. Lund: Nordic Academic Press,
2004, pp. 58–62.
KURE, H. “Embla ask”. ARKIV FOR NORDISK FILOLOGI 117, 2002,
pp. 161–70.
SPERBER, Hans. “Embla”. BEITRAGE ZUR GESCHICHTE DER
DEUTSCHEN SPRACHE UND LITERATURE 36, 1910, pp. 219–22.
STEINSLAND, Gro. “Antropogonimyten i Völuspá”. ARKIV FOR
NORDISK FILOLOGI 98, 1983, pp. 80–107.
1.19 ÁRABES E RELIGIOSIDADE NÓRDICA
Ver Ritos Rus.
1.20 ARDRE VIII
Pedra pintada encontrada na ilha de Gotland, báltico sueco,
datada do século IX d.C. Uma das mais complexas e importantes
fontes iconográficas da mitologia nórdica. A Estela possui três
conjuntos imagéticos principais: a base, formada por diversas
narrativas mitológicas; a cena central do navio; e o topo, separado por
um detalhe ornamental linear. O topo é muito semelhante
artisticamente à outra Estela, a de Alskog Tjängvide I, o que levou
diversos pesquisadores a considerá-las como tendo sido feitas por um
mesmo escultor: ambas possuem a representação idêntica do cavalo
Sleipnir, com o deus Óðinn montado e com a mão esquerda levantada.
Porém, ao contrário de Alskog Tjängvide I, a de Ardre VIII não contém
nenhuma valquíria recebendo o mesmo, nem a figura de um cão
acompanhando. Ao fundo, em ambas as estelas ocorre a figuração do
palácio do Valhöll, uma estrutura circular e abobadada, semelhante às
casas longas dos escandinavos. O guerreiro morto ocupando a parte
mais elevada (flutuando) também ocorre nas duas estelas. A maior
diferença, entretanto, fica pelas representações do segundo plano de
Ardre VIII. O conjunto imagético mais importante refere-se ao mito do
ferreiro Völlundr, extremamente importante para os povos
germânicos: o momento em que o ferreiro utiliza um par de asas que
fabricou para fugir da prisão, ladeado pela figura de uma Valquíria,
com a mesma estilística de outras estelas e pingentes. No centro, as
ferramentas de forja e ferraria; no lado direito, o corpo descabeçado
dos filhos do rei Nídud. A base da Estela possui imagens não
identificadas: dois personagens pescando (talvez outra representação
de Thor pescando a serpente do mundo), um homem entrando em um
aposento cercado, no qual se encontra um cão e outros dois homens, e
a figura externa de um cão, de formas muito semelhantes à dos
encontrados em outras estelas, porém estes no topo, possivelmente a
representação de Garmr. Várias figuras humanas encontram-se
cercadas por quadrados, mas a desfiguração da Estela não permite
maiores identificações. Ao fundo do navio central, ocorre a imagem da
pesca da serpente do mundo pelo deus Þórr e o gigante Hymir.
A representação mais enigmática é a de um gigante segurando uma
figura com várias cabeças, ao lado da valquíria.
Johnni Langer
Ver também Mitologia Escandinava; Paganismo nórdico; Pedras
pintadas de Gotland.
LANGER, Johnni. “As estelas de Gotland”. BRATHAIR 6(1),
2006, pp. 10–41.
NYLÉN, Erik & LAMM, Peder. LES PIERRES GRAVÉES DE
GOTLAND. Paris: Michel de Maule, 2007.
STAECKER, Jörn. “Heroes, kings, and gods: discovering
sagas on Gotlandic picture-stones”, IN ANDRÉN, Anders et alii
(orgs.). OLD NORSE RELIGION IN LONG-TERM PERSPECTIVES. Lund: Nordic
Academic Press, 2004, pp. 363–68.
1.21 ARMAS MÍTICAS
Ver Espadas míticas; Gungnir; Martelo de Thor.
1.22 ARQUEOLOGIA E MITOS NÓRDICOS
Ver Amuletos mágicos; Ardre VIII; Funerais e enterros; Hammar
I; Hogbacks; Ídolos e imagens; Klinte Hunninge I; Pedras Pintadas de
Gotland; Pinturas rupestres nórdicas; Ritos nórdicos; Ritos Rus;
Runas; Sacrifício escandinavo; Templo de Uppsala; Toponímia e mitos
nórdicos.
1.23 ARQUÉTIPOS ESCANDINAVOS
A teoria dos arquétipos constituiu uma das maiores aplicações no
estudo simbólico do mito, em especial na área nórdica. Utilizado
originalmente por Santo Agostinho, num sentido de modelo, foi
popularizada com as teorias de Carl Jung durante a primeira metade
do século XX, num sentido de protótipo de narrativas míticas coletivas
presentes em cada indivíduo, algo posteriormente seguido por Mircea
Eliade, Joseph Campbell e Karl Kerény.
As aplicações da ideia de Mircea Eliade do modelo arquetípico
sacro ao mundo escandinavo foram: o povoamento da Islândia – no
momento em que os colonos chegaram à ilha, eles repetiram o drama
cósmico inicial da transformação do caos na ordem da criação; a
batalha do deus Þórr com o gigante HRUNGNIR, que influenciou o
treinamento de jovens guerreiros – todoconflito teria sempre uma
causa ritual; o RAGNAROK (destruição do mundo seguido de uma nova
criação) seria a repetição do ciclo cósmico presente em todas as
mitologias; a morte primordial e cósmico-criadora do gigante YMIR –
reatualizada nos sacrifícios sangrentos da cultura germânica, mas
principalmente várias citações sobre a árvore cósmica, a YGGDRASILL –
interpretada como o eixo do mundo e símbolo do sagrado por
excelência, expressão dos valores religiosos relacionados com a
vegetação.
Dentro do conceito simbólico-psicológico de Joseph Campbell,
temos alguns exemplos do mundo nórdico, como o deus Wodan
enforcado na árvore cósmica – simbolizando o centro do mundo; a
filha deste mesmo deus, Brunhilda, presa no círculo de fogo (símbolo
da proteção paternal da virgindade) e depois liberta por Siegfried –
uma das encarnações do divino feminino no processo de iniciação
heroica; o autossacrifício de Wodan-Óðinn para obter conhecimento –
um dos referenciais míticos da vitória interior no processo de
transformação do herói; a trajetória de Siegfried, especialmente sua
infância e façanhas adultas.
Vários historiadores já criticaram os autores simbolistas que
difundiram o modelo arquetípico aplicado ao mundo escandinavo
(Mircea Eliade, Carl Gustav Jung, Joseph Campbell, entre outros),
principalmente por motivos de contextualização sócio-histórica,
opondo-se especialmente ao “fixismo” em que o mito foi caracterizado,
dando um valor maior às estruturas diacrônicas que deram origem aos
significados das imagens míticas. Os principais problemas levantados
são: 1. Não existem provas de qualquer herança genética ou biológica
de padrões arquetípicos; 2. Os modelos comparativos de mitos entre
culturas diferentes baseados em diacronias amplas levam a hipóteses
inconsistentes; 3. A função do mito não seria como no modelo
junguiano e elidiano, estritamente relacionada à religiosidade e ao
sagrado; 4. O suposto valor universal e arquetípico da mitologia
abstém-se das referências ao contexto cultural, sociológico e histórico:
os simbolistas se interessam pelo mito em sua forma particular de
narrativa, mas sem esclarecê-lo pela cultura; crítica semelhante
realizada por Carlo Ginzburg: isolar símbolos específicos mais ou
menos difusos confundindo-os com “universais culturais”, e também o
escasso levantamento documental dos dados míticos e de conteúdo
além do contexto histórico das obras; 5. Pouco rigor na aplicação das
teorias junguianas aos fenômenos históricos; 6. O caráter indireto da
explicação e da comprovação das teorias de base psico-históricas; 7.
Impossibilidade de o pesquisador ter acesso direto à psicologia
profunda de um período.
Johnni Langer
Ver também Tripartição do mundo nórdico.
CAMPBELL, Joseph. O HERÓI DE MIL FACES. São Paulo:
Pensamento, 1996.
ELIADE, Mircea. O MITO DO ETERNO RETORNO. Lisboa: Edições
70, 1985.
GINZBURG, Carlo. HISTÓRIA NOTURNA: DECIFRANDO O SABÁ. São
Paulo: Companhia das Letras, 1991.
JUNG, Carl Gustav (Ed.). O HOMEM E SEUS SÍMBOLOS. São Paulo:
Nova Fronteira, 1996.
LANGER, Johnni. “MYTHICA SCANDIA: repensando as fontes
literárias da mitologia viking”. BRATHAIR 6(2), 2006, pp. 48–78.
1.24 ARTE RELIGIOSA NÓRDICA
Ver Amuletos mágicos; Ardre VIII; Hammar I; Hogbacks; Ídolos e
imagens; Klinte Hunninge I; Pedras pintadas de Gotland; Pinturas
rupestres nórdicas.
1.25 ASES E VANES
Ases são uma família de deuses, a mais importante da mitologia
escandinava. O termo em nórdico antigo ÁSS (plural: ÆSIR, feminino:
ÁSYNJA) significa deus, e segundo Régis Boyer também teria um sentido
de força e vida, como no sânscrito ASURA. John Lindow também opina
de forma semelhante, considerando que o termo deriva de uma raiz
indo-europeia significando vida e alento. Segundo Rudolf Simek, o
termo foi anteriormente registrado pelos godos como ANSIS (Getica
XIII, 78) e no anglo-saxão ĒSA. No proto-germânico ela existia aplicada
à palavra VIH-ASA (deusa da batalha) e foi registrada na inscrição
rúnica de Vimose na Dinamarca (“A(N)SAL WÏJA”, eu dedico isso aos
ases), datada de 200 d.C. Os mais importantes deuses ases são Odin e
seus filhos Thor e Balder. Enquanto os ases são divindades
proeminentes da guerra e governantes, os vanes são os deuses da
fertilidade. Na EDDA de Snorri, tanto Odin quanto Thor são
frequentemente denominados simplesmente “o ás”. No poema éddico
SKÍRNISMÁL, não é claro qual dos dois é denominado “o melhor dos
ases”. Entretanto, o nome da runa A (ös, ansuz) é associado a Odin.
Uma das mais interessantes aplicações do termo ases foi empregada
por Snorri Sturluson no prefácio da EDDA MENOR e na YNGLINGA SAGA,
utilizando a similaridade da palavra com a região da Ásia para criar
um referencial evemerista dos deuses.
Na perspectiva dumeziliana, os deuses ases regem a
jurisprudência, a soberania e a magia. Por sua vez, os vanes regem a
fertilidade e a fecundidade. O termo vanes possui etimologia incerta,
segundo Régis Boyer, mas a palavra UEN (desejo) poderia estar
associada a Vênus. Para o pesquisador John Lindow, a palavra vanir é
aparentada com os termos para amigo e desejo, nas linguagens
escandinavas, mas para Rudolf Simek não existe explicação
convincente para ela.
A família dos deuses vanes abrange Njord, seus filhos Freyr e
Freyja, Heimdall (segundo Lindow) Skadi (segundo Boyer), Ullr
(segundo Simek). Os vanes são deidades particularmente relacionadas
a boas colheitas, ao florescimento do Sol, da chuva, de bons ventos e
tempo bom, tanto para os camponeses quanto para os pescadores e
marinheiros. Também são relacionados a certas práticas mágicas,
como o seidr de Freyja. Outro elemento que as fontes relacionam em
oposição aos ases é quanto à prática de incesto, o que para Simek
poderia indicar elementos matriarcais no culto aos vanes.
Segundo Jens Peter Schjødt a diferença entre a religiosidade dos
vanes e a dos ases seria muito grande, sendo a primeira uma
religiosidade autóctone antiga, baseada numa cultura agrícola,
enquanto a segunda seria mais nova, guerreira e mais espiritual. Os
vanes seriam ligados essencialmente à fórmula arcaica: ÁR OK FRIÐR
(abundância e paz), gerando os simbolismos de fertilidade,
sexualidade, natureza e riqueza. E sendo um grupo ctônico, vinculado
diretamente as elfos, o protótipo incestuoso dos vanes não teria sido
usado como modelo para a sociedade humana.
Outro tema muito importante nas fontes é a guerra primordial
entre ases e vanes, relatada na YNGLINGA SAGA 4, GYLFAGINNING 22,
SKÁLDSKAPARMÁL 1, VÖLUSPÁ 21–26, GESTA DANORUM I, 7. Na VÖLUSPÁ, a
causa do conflito teria sido a feiticeira Gullveig, uma personagem não
mencionada por Snorri. A paz é alcançada no momento em que ambas
as partes decidem por uma troca mútua de deuses.
Em 1903, o acadêmico Bernhard Salin propôs a teoria de que a
guerra entre ases e vanes teria um fundo histórico: representaria um
culto mais novo, o dos indo-europeus (de índole guerreira, a família
dos ases), que teria penetrado na região escandinava, onde prolifera o
culto nativo representado pelos vanes, de cunho mais agrário (cultura
megalítica). Posteriormente, houve a fusão entre os cultos
(representada pelo fim dos conflitos nas fontes mitológicas). Essa
guerra de religião também foi defendida por H. Schuch e E. Mogk,
enquanto H. Guntert e A. Philippson inclinaram-se a pensar numa
guerra puramente política e étnica, que teria ocorrido no segundo
milênio antes de Cristo. Georges Dumézil criticou essa teoria,
afirmando que a guerra entre ases e vanes seria o resultado de um
conflito social entre os camponeses e os seguidores do rei/aristocracia.
O resultado da guerra teria sido a formação da sociedade tripartida,
uma ideia também seguida por J. de Vries. Mais recentemente, a
arqueóloga Lote Hedeager propôs que a guerra entre ases e vanes
representaria mitologicamente o conflito que teria existido entre a
migração dos povos hunos em relação aos povos ostrogodos.
Johnni Langer
Ver também Asgard; Balder; Freyja; Freyr, Frigg; Guerra entre
Ases e Vanes; Odin; Valhala; Thor.
BOYER, Régis. “The Aesir

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