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Sistema Nervoso Central: Medula Espinhal APRESENTAÇÃO A medula espinhal é a principal via para o fluxo de informações, em ambos os sentidos, entre o encéfalo e a pele, as articulações e os músculos do corpo. Se a medula espinhal é seccionada, há perda da sensibilidade da pele e dos músculos, bem como a perda da capacidade de controlar a contração voluntária dos músculos. Nessa Unidade de Aprendizagem, abordaremos os aspectos anatômicos e fisiológicos da medula espinhal e seus reflexos medulares. Bons estudos! Ao final desta unidade você deve apresentar os seguintes aprendizados: Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar as partes da medula espinhal;• Reconhecer as principais funções fisiológicas da medula espinhal;• Identificar os reflexos medulares.• DESAFIO INFOGRÁFICO O esquema mostra a medula espinhal e suas principais estruturas anatômicas. CONTEÚDO DO LIVRO O conhecimento das funções da medula espinhal são fundamentais para o entendimento da transmissão das informações entre o corpo e o encéfalo e vice-versa. Acompanhe a obra Biofísica e Fisiologia e leia o capítulo Sistema nervoso central: medula espinhal. Bons estudos. BIOFÍSICA E FISIOLOGIA Camilla Lazzaretti Sistema nervoso central: medula espinhal Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever as partes da medula espinhal. � Reconhecer as principais funções fisiológicas da medula espinhal. � Identificar os reflexos medulares. Introdução A medula espinhal faz parte do sistema nervoso central (SNC) e se es- tende pela coluna vertebral até o segmento lombar. Ela realiza a con- dução de informações do encéfalo até a periferia do corpo e vice-versa. As sensações de frio, calor e dor, além dos movimentos que realizamos no cotidiano, são mediadas com o auxílio dos nervos espinhais, que inervam partes importantes do nosso corpo, como a pele e os músculos. Quando lesões danificam a medula espinhal, o indivíduo pode ter danos sensoriais e/ou motores, pois há dificuldade de transmissão da informação pelas vias que ascendem ou descendem do encéfalo. Neste capítulo, você irá estudar os componentes básicos anatômicos da medula espinhal e as partes relacionadas com sua funcionalidade. Também vai entender como ocorre a propagação de informações desde as vias periféricas até o encéfalo e as respostas motoras executadas pelos músculos através do comando medular. Partes da medula espinhal A medula espinhal, ou medula espinal, faz parte do sistema nervoso central (SNC), juntamente com o encéfalo. Os nervos espinhais que dela emergem fazem parte do sistema nervoso periférico (SNP) e inervam pele, músculos e vísceras. Ela tem formato cilíndrico e está localizada dentro do canal vertebral, na coluna vertebral; tem comprimento aproximado de 42 cm e espessura de 1,8 cm. Sua extensão se dá a partir da conexão com o crânio pelo forame magno e segue pela coluna junto das vértebras cervical (C), torácica (T) e lombar (L), terminando, aproximadamente, nas vertebras L1/L2. Sendo assim, ela é mais curta do que a coluna vertebral. A medula possui intumescências na região cer- vical e lombar, onde há a inserção nervosa dos membros superiores e inferiores (MARIEB; HOEHN, 2008; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; TORTORA; DERRICKSON, 2017; DERRICKSON, 2017; DERRICKSON, 2017). Acompanhe uma ilustração da medula espinhal na Figura 1. Figura 1. Medula espinhal e raízes dos nervos espinhais. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 401). Sistema nervoso central: medula espinhal2 A proteção medular se dá por membranas de tecido conjuntivo denominadas meninges. A meninge mais externa, em contato com as vértebras, é a dura- -máter, termo que significa “mãe rígida”. Esse nome se dá por sua consistência de tecido conjuntivo denso modelado, que se estende até a região sacral. Entre a dura-máter e os ossos vertebrais está o espaço epidural, que possui gordura e tecido conjuntivo, ambos também protetores da medula. A meninge intermediária é a aracnoide-máter, denominada assim porque possui grande quantidade de fibras elásticas e colágenas semelhantes a uma teia — “arac” = aranha. Abaixo dela localiza-se o espaço subaracnóideo, por onde circula o líquido cefalorraquidiano (LCR). O LCR é um líquido salino e incolor que protege química e mecanicamente a medula. A continuidade entre a dura-máter e a aracnoide se dá até a região sacral, entretanto a medula termina antes, na região lombar. Isso ocorre pelo fato de o desenvolvimento embrionário da coluna ser mais rápido e maior do que o do sistema nervoso. Por fim temos a pia-máter — “pia” = delicada —, que é uma membrana mais interna e fina, rica em vasos sanguíneos, que se adere à medula espinhal (MARIEB; HOEHN, 2008; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; TORTORA; DERRICKSON, 2017). A Figura 2 ilustra as partes constituintes da medula espinhal. Figura 2. Secção transversal da medula espinhal. Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 428). 3Sistema nervoso central: medula espinhal O corpo humano tem 31 pares de nervos espinhais, que emergem do forame intervertebral da coluna e são conectados à medula por raízes formadas de axônios. A raiz dorsal (posterior) é constituída por axônios sensoriais que transmitem informações sensitivas, oriundas de pele, musculatura e vísce- ras. Os corpos celulares da raiz dorsal localizam-se fora do espaço medular, em dilatações denominadas gânglios espinhais. Já a raiz ventral (anterior) conduz informações motoras do sistema nervoso central para os músculos e glândulas. Como a medula espinhal é mais curta do que a coluna vertebral, raízes nervosas saem da medula e espalham-se para baixo até a região do cóccix, e são denominadas “cauda equina”, por sua aparência similar a um rabo de cavalo (MARIEB; HOEHN, 2008; TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017). Em uma visualização transversal da medula espinhal, observam-se sulcos que a dividem em duas metades: o sulco mediano posterior (região dorsal) e a fissura mediana anterior (região ventral). A medula é constituída de substância branca e cinzenta. No centro da parte cinzenta está o canal central, que se estende ao longo de toda a medula e contém LCR (MARIEB; HOEHN, 2008; TORTORA; DERRICKSON, 2017). A substância cinzenta tem formato de “H” e é subdivida em cornos: � Corno dorsal: é uma entrada de axônios sensoriais e possui núcleos somatossensoriais e sensoriais autonômicos. As células presentes nesse corno são interneurônios e neurônios sensoriais, além de feixes de axônios. � Corno ventral: é a saída de informações motoras. Possui os corpos celulares de neurônios motores somáticos que realizam a contração de músculos esqueléticos. Os núcleos presentes são denominados motores somáticos e autonômicos. � Corno lateral: localiza-se nas porções torácica e lombar. Possui corpos de neurônios motores autonômicos que inervam musculatura cardíaca, lisa e glandular. (MARIEB; HOEHN, 2008; TORTORA; DERRICK- SON, 2017). Já a substância branca é dividida em funículos, que são colunas que possuem tratos, que são projeções axonais aferentes e eferentes relacionadas a funções específicas semelhantes. Os tratos sensoriais são ascendentes e transportam a informação da medula para o encéfalo, e os tratos motores são descendentes levam a informação do encéfalo para a medula (MARIEB; HOEHN, 2008; TORTORA; DERRICKSON, 2017). Sistema nervoso central: medula espinhal4 Na Figura 3 você encontra uma ilustração das substâncias cinzenta e branca. Figura 3. Substância cinzenta e substância branca da medula espinhal. Fonte: Silverthorn (2017, p. 284). 5Sistema nervoso central: medula espinhal O líquido cefalorraquidiano (LCR) é coletado por punção lombar do espaço subaracnói- deo em torno da terceira e quinta vértebras lombares. Esse procedimento é realizado com anestesia local e é feito quando há suspeitade infecções, como a meningite. A introdução de agulha nessa região também pode ser realizada para a administração de fármacos (antibióticos, quimioterápicos, entre outros), meios de contrastes para exames de mielografia ou aferições da pressão do LCR. Esse recurso é seguro, pois não há perigo de lesão nervosa, visto que a medula espinhal é mais curta do que a coluna vertebral (TORTORA; DERRICKSON, 2017). Principais funções fisiológicas da medula espinhal Como vimos, a medula faz a conexão entre o encéfalo e a periferia corporal. Ela realiza a integração de informações e gera respostas motoras apropriadas aos contextos ambientais em que o corpo está submetido. As informações sensoriais originadas por receptores nervosos do SNP entram na medula pela raiz dorsal (posterior) e percorrem vias distintas (TORTORA; DERRICK- SON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016): 1. Podem ascender ao encéfalo por meio da medula espinhal, percorrendo as vias nervosas da substância branca (tratos). Além disso, a informação motora pode transitar do encéfalo para a medula, chegando à substância cinzenta e direcionando-se aos músculos, que realizam sua contração, buscando assim a homeostase. 2. São encaminhadas diretamente para neurônios motores da substância cinzenta medular, para a geração de reflexos medulares. Controle medular do sistema motor somático Os movimentos do nosso corpo são gerados pelos músculos, que contém fibras musculares compostas de proteínas contráteis, a actina e a miosina. Basicamente, temos três tipos de tecidos musculares: liso, estriado cardíaco, estriado esquelético. (TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Sistema nervoso central: medula espinhal6 O músculo liso se encontra nos órgãos viscerais e é controlado pelo sistema nervoso autônomo (SNA), gerando os movimentos digestórios (peristálticos) estomacais e intestinais, por exemplo. Já os músculos estriados possuem controle nervoso diferenciado: o músculo cardíaco tem seus potenciais de ação, que geram os batimentos controlados pelo SNA no tronco encefálico. O músculo esquelético, que está aderido aos ossos, é o gerador de movimento corporal, como caminhar, digitar e escrever, que são movimentos voluntários executados pelo SNP motor somático. (TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). A musculatura esquelética é comandada por neurônios motores, que contém seus corpos celulares na parte ventral da substância cinzenta medular. Esses neurônios são denominados inferiores, pois, no encéfalo, estão os neurônios superiores, que fazem o controle central do movimento. Os axônios dos neurônios motores deixam a medula espinhal para se unir a fibras sensoriais e formar um nervo denominado misto (TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Veja na Figura 4 uma ilustração dos neurônios motores inferiores. Figura 4. Neurônios motores inferiores que inervam a fibra muscular. Fonte: Bear, Connors e Paradiso (2017, p. 457). 7Sistema nervoso central: medula espinhal Os neurônios motores abordados neste capítulo serão os inferiores, pois não estão no encéfalo. A distribuição de músculos pelo corpo é desigual, isto é, eles estão em maior quantidade associados aos membros. Isso faz com que neurônios motores também estejam nessa conformação, pois há maior quantidade deles nas porções vertebrais cervicais e torácicas (relacionadas aos membros superiores) do que na parte lombar da medula (relacionada aos membros inferiores). Esse aspecto é explicado pelas intumescências cervical e lombar, observadas na Figura 1. (TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Os neurônios motores possuem duas classificações: alfa e gama. Neste momento veremos os neurônios motores alfa, e os neurônios motores gama serão abordados no tópico seguinte (TORTORA; DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Segundo Bear, Connors e Paradiso (2017) e Hall (2011). Os neurônios motores alfa são responsáveis pela geração da força muscu- lar. Um único neurônio motor alfa é capaz de inervar diversas fibras musculares esqueléticas. O conjunto de todas as células musculares inervadas por ele é denominado unidade motora. O disparo neuronal alfa gera a liberação do neurotransmissor acetilcolina (Ach) e, com isso, a contração muscular ocorre. A contração não gera a mesma força para todos os movimentos — nota- mos isso quando estamos caminhando, por exemplo, pois a força muscular necessária para caminhar é menor do que em uma corrida com obstáculos. Dessa forma, a gradação de força é efetuada pelo SNC, pela geração de maior número de potenciais de ação na corrida, isto é, quanto mais força exercida, maior o disparo neuronal alfa com maior liberação de Ach. Junto a isso, para uma maior quantidade de contrações musculares, o SNC recruta um maior número de unidades motoras. As aferências para esses neurônios motores podem ser três: 1. Sensoriais do fuso muscular, que é um receptor de comprimento contido no interior da fibra muscular. 2. Do córtex cerebral motor e do tronco encefálico, que auxiliam nos movimentos voluntários. 3. De caráter excitatório ou inibitório, que são as maiores das aferências de interneurônios da medula espinhal, permitindo a programação motora da medula espinhal (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; HALL, 2011). Sistema nervoso central: medula espinhal8 Vias ascendentes e descendentes As vias ascendentes levam as informações somatossensoriais captadas na periferia, passam por tratos medulares e ascendem ao encéfalo. São três vias: � Via espinocerebelar: localiza-se no trato anterior e posterior da medula espinhal. Transporta informações específicas sobre músculos ou tendões ao cerebelo, que é a região encefálica responsável pela coordenação motora. Suas fibras se cruzam duas vezes no caminho e assim desfazem uma a decussação da outra. � Via lemniscal medial: envia informações específicas da localização corporal de tato discriminativo e vibrações. Ascendem pelos fascículos grácil e cuneiforme da medula e após seguem a trajetória pelo trato lemniscal medial para o bulbo, onde decussam. Posteriormente, passam para o tálamo e para o córtex somatossensorial. � Via espinotalâmica: leva as informações sensoriais (nociceptivas, de temperatura e tato grosseiro) captadas por inúmeros receptores corporais ao encéfalo por tratos medulares no funículo anterior e lateral da substância branca. Após ocorre a decussação de fibras na medula, que ascendem ao encéfalo pelo trato espinotalâmico anterior. São não específicas, pois não se pode determinar sua localização corporal (MARIEB; HOEHN, 2008; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017). Acompanhe as Figura 5 e 6 para visualizar essas estruturas. Encontre mais informações sobre elas no Quadro 1, mais adiante neste texto. 9Sistema nervoso central: medula espinhal Figura 5. Tratos ascendentes e descendentes da medula espinhal. Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 430). Para saber mais sobre as principais vias ascendentes (sensoriais) e tratos da medula espinhal, consulte a página 432 do livro Anatomia e Fisiologia, de Elaine N. Marieb e Katja Hoehn. As vias descendentes trazem informações do encéfalo para a medula espi- nhal por duas vias: diretas (corticoespinhal) e indiretas, acompanhe (MARIEB; HOEHN, 2008; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017). � Vias diretas (corticoespinhais): também denominadas vias piramidais, pois se originam de neurônios piramidais do córtex motor e realizam sinapses com o corno ventral da substância cinzenta medular. Estas vias fazem a regulação de movimentos de motricidade fina e rápida, como o ato de escrever. � Vias indiretas: mais de uma via participa deste processo, e também são conhecidas por extrapiramidais ou subcorticais. Antigamente, pensava- -se queestas vias não sofressem a modulação piramidal, entretanto, já se sabe que, por serem multissinápticas, sofrem essa influência, sim. Sistema nervoso central: medula espinhal10 São vias controladas, principalmente, por núcleos subcorticais e têm funções de controle postural (trato reticuloespinhal e vestibuloespinhal), equilíbrio (trato vestibuloespinhal), movimentos grosseiros (trato ru- broespinhal), da cabeça e de olhos (colículos superiores). Figura 6. Vias ascendentes. Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 431). 11Sistema nervoso central: medula espinhal Visualize essas estruturas na Figura 7, mas adiante, e saiba mais sobre elas no Quadro 1, a seguir. Trato espinhal Localização (funículo) Origem Finalização Função Vias diretas (piramidais) Cortico- espinhal lateral Lateral Neurônios piramidais do córtex motor do cérebro; decussam nas pirâmides do bulbo. Faz sinapses diretamente com neurô- nios motores e inter- neurônios do corno ventral; os in- terneurônios controlam, por sua vez, a atividade de neurônios motores. Transmite impulsos motores do cérebro para neurônios motores da medula espinhal (que ativam músculos esqueléticos no lado oposto do corpo); trato motor voluntário. Cortico- espinhal anterior Anterior Neurônios piramidais do córtex motor; as fibras cruzam acima do nível da medula espinhal. Corno ven- tral (como descrito an- teriormente). Similar ao descrito para o trato corticoes- pinhal lateral. Quadro 1. Principais vias descendentes (motoras) e tratos da medula espinhal (Continua) Sistema nervoso central: medula espinhal12 Quadro 1. Principais vias descendentes (motoras) e tratos da medula espinhal Trato espinhal Localização (funículo) Origem Finalização Função Vias indiretas (extrapiramidais) Tetoes- pinhal Anterior Colículo superior do mesencéfalo (as fibras cruzam para o lado oposto da medula espinhal). Faz sinapses com inter- neurônios do corno ventral que controlam neurônios motores. Transmite impulsos motores do mesencéfalo, importantes para o movimento coordenado da cabeça e dos olhos em direção a um alvo visual. Vestibulo- espinhal Anterior Núcleos vestibulares do bulbo (as fibras descendem sem cruzar). Faz sinapses com neurô- nios motores e inter- neurônios do corno ventral; os in- terneurônios controlam a atividade de neurônios motores. Transmite impulsos motores que mantêm o tônus muscular, ativa músculos extensores ipsilaterais dos membros e tronco, e dos músculos que movem a cabeça; assim, auxilia na manutenção da postura em posição ereta e durante o movimento. (Continua) (Continuação) 13Sistema nervoso central: medula espinhal Quadro 1. Principais vias descendentes (motoras) e tratos da medula espinhal Trato espinhal Localização (funículo) Origem Finalização Função Vias indiretas (extrapiramidais) Rubroes- pinhal Lateral Núcleo rubro do mesencéfalo (as fibras cruzam para o lado oposto logo abaixo do núcleo rubro). Corno ven- tral (como descrito an- teriormente). Em experi- mentos que utilizaram mo- delos animais, observou-se que este trato transmite im- pulsos motores envolvidos no controle do tônus muscular dos membros distais (prin- cipalmente flexores), localizados no lado contrala- teral do corpo; em humanos, estas funções foram ampla- mente assumi- das pelo trato corticoespinhal, com exceção de alguns movimentos de membros superiores. (Continua) (Continuação) Sistema nervoso central: medula espinhal14 Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 435). Quadro 1. Principais vias descendentes (motoras) e tratos da medula espinhal Trato espinhal Localização (funículo) Origem Finalização Função Vias indiretas (extrapiramidais) Reticulo- espinhal (anterior, medial e lateral) Anterior e lateral Formação reticular do tronco encefálico (grupo nuclear medial da ponte e do bulbo); possui tanto fibras que cruzam como fibras que permanecem ipsilaterais. Corno ven- tral (como descrito an- teriormente). Transmite impulsos envolvidos no controle do tônus muscular e de muitas funções motoras viscerais; pode controlar a maioria dos movimentos mais grosseiros. (Continuação) As lesões medulares acarretam perdas funcionais de diferentes graus aos indivíduos afetados. Acompanhe o caso: uma mulher de 24 anos sofreu acidente automobilístico e teve lesão total medular ao nível da vértebra C7. Os prejuízos ocasionados foram paralisia, perda sensitiva e alterações do SNA (bexiga e intestino). Após a lesão, ela apresentou choque medular, que é uma paralisia de musculatura, e ausência de reflexos abaixo do nível da lesão, que pode durar semanas a meses. Posteriormente, com a melhora do choque, intestinos e bexiga estavam reflexos (esvaziamento quando ocorre enchimento), entretanto a paciente apresentou espasticidade em extremidade inferior (rigidez muscular) e hiper-reflexia, que serão cuidados principalmente com fisioterapia. Atualmente, a regeneração completa das funções medulares não é possível, todavia a melhora da qualidade de vida dos indivíduos é conseguida com fisioterapia e exercícios apropriados para a melhora do tônus muscular e o progresso de funções viscerais. Fonte: Adaptado de Burke-Doe e Jobst (2015). 15Sistema nervoso central: medula espinhal Figura 7. Vias descendentes. Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 434). Reflexos medulares Reflexos são respostas geradas automaticamente a estímulos, isto é, sem a necessidade de um pensamento consciente para tal. São produzidos por arcos reflexos, que são as unidades funcionais básicas que realizam esse processo. Os componentes do arco reflexo são: Sistema nervoso central: medula espinhal16 � receptores sensoriais; � neurônios sensoriais; � interneurônios; � neurônios motores; � órgãos efetores. A sequência de acontecimentos acerca dos reflexos decorre, inicialmente, de uma entrada de estímulo sensorial pela raiz dorsal da medula espinhal, vindo de um nervo periférico. A partir disso, uma sinapse é realizada com interneurônios, que, posteriormente, fazem sinapse com neurônios motores na parte ventral da substância cinzenta medular. A resposta motora é gerada com a inervação de músculos ou órgãos-alvo. Mas qual a função dos reflexos? Basicamente, eles servem para a manu- tenção da homeostase de funções no corpo, e isso pode ser visto nos reflexos autônomos como a ingestão de água caso haja baixas concentrações de líquido no corpo, por exemplo. Similarmente, os reflexos somáticos podem ser demons- trados quando tocamos em algo que provoca alguma lesão, como uma panela quente. Automaticamente, nosso corpo busca se afastar desse evento aversivo. Podemos classificar os reflexos morfologicamente em: � monossinápticos, quando há apenas uma sinapse entre neurônios sen- soriais e motores na medula espinhal; � polissinápticos, que são mais complexos; há maior número de entradas sinápticas nesta conexão entre neurônios sensoriais e motores. Os reflexos necessitam de integração por parte do SNC; com isso alguns reflexos realizam esse processo na medula e outros no encéfalo, e podem envolver diferentes tipos neuronais: excitatórios ou inibitórios. Os reflexos que serão citados aqui são três dos mais importantes: o reflexo miotático, o reflexo do órgão tendinoso de Golgi e o reflexo de retirada. Reflexo miotático: este reflexo é muito simples. Seu funcionamento transcorre quando músculos sofrem estiramento e se contraem. Os neurônios motores gama inervam fibras musculares intrafusais, isto é, fibras contidas no fuso muscular. O fuso muscular é um receptor sensorial de estiramento, localizado no interior das fibras musculares, e é envolvido por uma cápsula fibrosa. Sua função é detectar alterações do comprimento da fibra muscular por meio de fibras sensoriais denominadas Ia. O estiramento muscular traciona os polos do fuso muscular pela ativação gama e, com isso, asfibras Ia adentram na raiz 17Sistema nervoso central: medula espinhal dorsal da medula espinhal e realizam uma sinapse com os neurônios motores alfa, contraindo este músculo. Vamos entender melhor? Pense no reflexo patelar, quando o médico utiliza um martelo de reflexos e toca seu joelho. A resposta gerada por sua perna é um pequeno chute para cima. O que é isso? O toque com o martelo no joelho estimula o ligamento patelar distendendo o músculo. O fuso muscular é ativado (pois distendeu-se também) e as fibras sensoriais Ia fazem sinapse com o neurônio motor, promovendo uma contração (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; HALL, 2011). Visualize esse processo na Figura 8. Figura 8. O reflexo patelar e os neurônios motores alfa, gama e o fuso muscular. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 406). O reflexo miotático auxilia na manutenção postural. Quando estamos de pé, os mús- culos da coluna vertebral estão estirados. Se nos inclinamos para frente ou para trás, os neurônios sensoriais Ia do fuso muscular geram potenciais de ação que estimulam os neurônios motores alfa a contraírem a musculatura contralateral, corrigindo alterações posturais. Sistema nervoso central: medula espinhal18 Reflexo tendinoso de Golgi: este reflexo é dependente de uma estrutura composta de terminações nervosas contida nos tendões, o órgão tendinoso de Golgi. Esse órgão age para proteger os tendões de cargas excessivas quando há contração muscular. Um neurônio sensorial que está no órgão tendinoso, denominado Ib, é estimulado durante a contração muscular e, com isso, ele adentra a raiz dorsal da medula espinhal e faz sinapse com interneurônios inibitórios. Os interneurônios realizam sinapse com neurônios motores alfa, promovendo uma inibição da contração. Alguns atletas de levantamento de peso, por exemplo, suportam cargas excessivas nos músculos, e isso pode exceder a funcionalidade desse reflexo, o que os deixa mais propensos a lesões tendíneas e musculares (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; HALL, 2011). Veja, na Figura 9, como funciona esse reflexo. Figura 9. Reflexo tendinoso de Golgi. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 407). 19Sistema nervoso central: medula espinhal Reflexo de retirada: este reflexo tem por objetivo afastar o membro ou parte do corpo de um local aversivo que cause uma potencial lesão. Ao tocar com o pé em um prego, por exemplo, neurônios sensoriais de dor são ativados e adentram a raiz dorsal da medula espinhal, realizando sinapses com interneurônios excitatórios. Estes fazem sinapses com neurônios motores alfa, que contraem o músculo flexor, que promove a retirada do membro do local de dano — neste caso, o prego (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; HALL, 2011). Acompanhe a Figura 10. Figura 10. Reflexo de retirada. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 408). Sistema nervoso central: medula espinhal20 Para aprimorar o reflexo de retirada, a inervação recíproca acontece. Os neurônios sensoriais fazem sinapse também com interneurônios inibitórios no corno dorsal. Esses interneurônios fazem sinapse com neurônios motores alfa dos músculos extensores antagonistas, opostos aos flexores que provem a retirada do membro afetado. Com isso, no reflexo de retirada, os músculos extensores estão inibidos, facilitando o movimento dos flexores para o reflexo de retirada (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; HALL, 2011). Veja como ocorre a inervação recíproca na Figura 11. Figura 11. Inervação recíproca e reflexo de retirada. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 408). Para o auxílio do reflexo de retirada, outro reflexo pode ser realizado: o reflexo de extensão cruzada. Os interneurônios excitatórios da medula espinhal podem agir simultaneamente no neurônio motor alfa e atravessar a comissura da substância branca até o outro lado da medula espinhal. Desse modo, realizam sinapses com os neurônios motores alfa de músculos extensores do outro membro, não afetado por um agente lesivo, como um prego. Assim, essa musculatura é distendida, evitando quedas e sustentando o peso corporal no outro membro (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; HALL, 2011), conforme mostra a Figura 12. 21Sistema nervoso central: medula espinhal Figura 12. Reflexo de extensão cruzada. Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 409). Neste capítulo você aprendeu os componentes da medula espinhal e suas funcionalidades principais. Viu que a medula espinhal é a principal conexão entre o encéfalo e a periferia do corpo e que essa ligação proporciona a ex- celência entre as funções sensoriais e motoras, como sentir dor, chutar uma bola ou retirar a mão de uma panela quente. Para tal, as sinapses neuronais realizadas entre o SNC e o SNP buscam o alcance das funções homeostáticas corporais. Com isso, podemos dizer que a medula espinhal é a regente de uma orquestra, em que o funcionamento de todas as vias é essencial para o equilíbrio das funções do organismo. Sistema nervoso central: medula espinhal22 Você sabia que recém-nascidos têm reflexos inatos? Sim, são respostas automáticas e fisiológicas prontas para responderem aos estímulos que o bebê é submetido, como a sucção de mama na amamentação. Confira o link abaixo com conteúdo didático sobre o assunto. https://qrgo.page.link/hrNox BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. BURKE-DOE, A.; JOBST, E. E. Casos clínicos em fisioterapia e reabilitação neurológica. Porto Alegre: AMGH, 2015. (Série Lange). HALL, J. E. Guyton & Hall: tratado de fisiologia médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. MARIEB, E. N.; HOEHN, K. Anatomia e fisiologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Anatomia e fisiologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. VANPUTTE, C.; REGAN, J.; RUSSO, A. Anatomia e fisiologia de Seeley. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2016. Leitura recomendada KANDEL, E. R. et al. Princípios de neurociências. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. 23Sistema nervoso central: medula espinhal DICA DO PROFESSOR A seguir, você irá assistir a um vídeo abordando os seguintes tópicos: a medula espinhal suas estruturas e funções. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) Os nervos raquianos possuem duas raízes - uma anterior e outra posterior. É correto afirmar que: A) As duas raízes são exclusivamente motoras. B) Ambas são exclusivamente sensitivas. C) As anteriores são sensitivas e as posteriores são motoras. D) As posteriores são sensitivas e as anteriores são motoras. E) Ambas são mistas, pois é variável o sentido em que ocorre o estímulo nervoso em cada uma delas. 2) Marque a alternativa correta referente à medula espinhal: A) A medula espinhal é a porção alongada do sistema nervoso periférico, é a continuação do encéfalo. A medula espinhal é a continuação do encéfalo, que se aloja no interior da coluna vertebral em seu canal vertebral, sua parte interna contém a substância branca e sua parte externa B) substância cinzenta. C) A parte externa da medula espinhal contém substância branca e a parte interna substância cinzenta. D) A medula espinhal contém duas raízes anteriores e duas raízes posteriores, sendo que anteriormente apresenta o corno anterior de caráter sensitivo e posteriormente apresenta o corno posterior de caráter motor. E) No adulto, a medula espinhal, localizada dentro do canal vertebral da coluna vertebral, ocupa todo o canal, desde a cervical até o sacro. 3) O reflexo de retirada resulta na: A) Contração dos músculos extensores do lado estimulado. B) Contração dos músculos flexores do lado estimulado. C) Inibição dos músculos extensores do lado não estimulado. D) Contraçãodos músculos flexores do lado oposto. E) Contração de ambos os grupos musculares: flexores e extensores no lado estimulado. 4) É função da medula espinhal: A) Transmitir as informações do corpo para o encéfalo e vice-versa. B) Controle da frequência cardíaca. C) Controle da frequência respiratória. D) Controlar o equilíbrio e a coordenação dos movimentos dos membros superiores e inferiores. E) Controlar os movimentos voluntários dos membros inferiores e superiores. 5) A substância cinzenta da medula espinhal é dominada por: A) Somente por axônios mielínicos. B) Corpos de células neuronais. C) Somente por axônios amielínicos. D) Somente por dendritos. E) Axônios mielínicos e amielínicos. NA PRÁTICA A incidência mundial anual de trauma raquimedular (TRM) é da ordem de 15 a 40 casos por milhão de habitante. No Brasil a incidência de TRM é de 6 a 8 mil casos novos por ano, sendo que destes, 80% das vítimas são homens e 60% se encontram entre os 10 e 30 anos de idade. A lesão medular é uma injúria às estruturas contidas no canal medular (medula, cone medular e cauda equina), podendo levar a alterações motoras, sensitivas, autonômicas e psicoafetivas. As lesões podem se caracterizar pela interrupção parcial ou total do sinal neurológico através da medula, resultando em paralisia e ausência de sensibilidade do nível da lesão para baixo. O nível da lesão e a extensão da lesão irão determinar grau de limitação dos indivíduos com TRM. As lesões em nível mais alto resultam em maior área corporal comprometida. Por exemplo, lesões cervicais (em C1, C2, C3, C4, C5, C6 ou C7) levam ao dos membros superiores, tronco e membros inferiores. Lesões em nível torácico (em T1 a T12) comprometem o tronco e membros inferiores. Lesões lombares (L1 a L5) comprometem membros inferiores e leões sacrais (S1 a S5) causam comprometimento leve dos membros inferiores. Além do local de comprometimento, as lesões podem ser classificadas (extensão da lesão) como completas ou incompletas. Assim, pode-se considerar que: Tetraplégicos são indivíduos com lesão em nível cervical com grande comprometimento dos membros superiores para baixo. Tetraparéticos são indivíduos com lesão em nível cervical com comprometimento leve dos membros superiores para baixo. Paraplégicos são indivíduos com lesão em nível torácico ou lombar com grande comprometimento dos membros inferiores. Paraparéticos são indivíduos com lesão em nível torácico ou lombar com comprometimento leve dos membros inferiores. Além da perda de movimentos, as consequências das lesões medulares podem incluir dor neuropática, alterações vasculares e musculoesqueléticas, úlceras por pressão, espasticidade e automatismos, bexiga neurogênica, intestino neurogênico entre outros. Referência: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_pessoa_lesao_medular.pdf SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Anatomia da Medula Espinhal: Substância branca e cinzenta Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Medula Espinhal - SNC Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! BARRET, K; BARMAN S.; BOITANO, S. Fisiologia Médica de Ganong Leia o capítulo 12 Controle da Postura e do Movimento. MARTINI, F; TIMMONS M.; TALLITSCH R. Anatomia Humana Leia o capítulo 14 A Medula Espinal e os Nervos Espinais.