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INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL CRISTINA GIOVANONI 1 FERNANDA TRENTIN 2 RESUMO ABSTRACT O congestionamento do judiciário e a lentidão nas sentenças judiciais causam questionamentos sobre a necessidade de ampliar a celeridade processual e nesse caso, a implementação da inteligência judicial como meio auxiliar. O objetivo deste estudo é analisar o uso de ferramentas de inteligência artificial e se podem ser reconhecidos como auxiliares à prestação jurisdicional. Conclui-se que se trata de ferramenta de extrema importância ao judiciário e devem ser reconhecidos como métodos de auxílio à prestação jurisdicional e ao acesso à justiça. Este estudo é de abordagem quantitativa, método indutivo e o estudo será desenvolvido a partir de dados reconhecidos cientificamente e de bases confiáveis, procedendo-se de pesquisas que explicitem o tema e que corroboram o assunto, dando embasamento teórico à pesquisa. Palavras-chave: Celeridade Processual. Garantias Constitucionais. Inteligência Artificial The congestion of the judiciary and the slowness of judicial sentences raise questions about the possibility of increasing procedural speed and, in this case, the implementation of judicial intelligence as an auxiliary means. This study has a quantitative approach, inductive method and the study will be developed from scientifically recognized data and from reliable bases, proceeding from research that explains the theme and that corroborates the subject, giving theoretical basis to the research. The objective of this study is to analyze the use of artificial intelligence tools and if they can be recognized as auxiliaries to the jurisdictional provision. It is concluded that it is an extremely important tool for the judiciary and should be recognized as methods of aiding judicial provision and access to justice. Keywords: Procedural Speed. Constitutional Guarantees. Artificial intelligence INTRODUÇÃO A Inteligência Artificial é um avanço tecnológico que permite que sistemas simulem uma inteligência similar à humana, indo além da programação de ordens específicas para tomar decisões de forma autônoma, baseadas em padrões de enormes bancos de dados. Atualmente é muito questionada e debatida no meio jurídico como possível meio alternativo para celeridade processual e descongestionamento do judiciário. Neste contexto , questiona-se se os avanços tecnológicos inaugurados pelo uso das ferramentas de inteligência artificial no âmbito do Poder Judiciário podem ser reconhecidos como métodos de auxílio à prestação jurisdicional. 2 Advogada, Professora e coordenadora do Curso de Direito Unoesc PZO. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Especialista em Direito do Consumidor e da Empresa (UNOPAR); Direito civil e processual civil (UNOESC) e Direito e Processo do Trabalho Contemporâneo (UPF). 1 Acadêmica curso de Direito Unoesc PZO, 10o período 2 O presente estudo tem como objetivo analisar se o uso de ferramentas de inteligência artificial pode ser reconhecido como métodos de auxílio à prestação jurisdicional. Assim, busca-se analisar; a aplicação da Inteligência Artificial ao Direito, com o fim de promover eficiência à jurisdição para materializar o direito fundamental da celeridade processual; conhecer modelos de uso de inteligência artificial eventualmente utilizados pelo judiciário; analisar se o uso de ferramentas de inteligência artificial pode ser reconhecido como métodos de auxílio à prestação jurisdicional. Justifica-se o tema para analisar a importância da inteligência artificial na prestação jurisdicional, o que é essa inteligência e quais seus benefícios e ou prejuízos causados à sociedade. Uma das preocupações do judiciário é a busca de soluções para resolver o problema na demora do despacho dos processos, para resolver a questão de demanda, que é muito maior do que capacidade de atendimento. A crescente judicialização de demandas congestiona a prestação jurisdicional. O princípio da razoável duração do processo, juntamente com as leis reformadoras no ordenamento processual trazem uma garantia constitucional por um processo mais célere, eficaz e econômico, o que quase nunca ocorre. A pesquisa a ser realizada aplicará ao método indutivo, o qual permite a conclusões mais amplas do que o conteúdo estabelecido, observando repetidos fenômenos que confirmem uma resposta para o problema, dada ênfase à pesquisa quantitativa, da qual é possível analisar o perfil descritivo, uma relação lógica das proposições apresentadas, além de um método de pesquisa teórico, com a fundamentação de dados. Além disso, será desenvolvida a partir de dados reconhecidos cientificamente e de bases confiáveis, procedendo-se de pesquisas que explicitem o tema e que corroborem o problema, dando embasamento teórico profundo à pesquisa. São vários os desafios a serem superados para que a inteligência artificial seja implantada no sistema jurisdicional. A celeridade processual é o ponto mais sensível do judiciário. A partir deste estudo será possível compreender, de forma mais aprofundada, os fundamentos da inteligência artificial na prestação jurisdicional, abrindo caminhos para construir novos olhares e debates sobre o assunto. Nos tópicos seguintes discorre-se sobre a aplicação da Inteligência Artificial ao Direito, com o fim de promover eficiência à jurisdição para materializar o direito fundamental da celeridade processual e a apresentação de modelos de uso de inteligência artificial 3 eventualmente utilizados pelo judiciário. Discutir o que é a inteligência artificial e os sistemas jurídicos inteligentes, e como se dá a aplicação de tal tecnologia no direito. 1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS SOBRE A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL A inteligência artificial é um ramo da ciência da computação, tem como principal interesse, em desenvolver computadores que pensam de forma inteligente, é potencialmente relevante para qualquer esfera da atividade intelectual humana. Teve início após a segunda guerra mundial. Pode-se destacar que o primeiro trabalho da inteligência artificial foi realizado por Warrem Macculloch e Walter Pitts, basearam-se em três fontes: “o conhecimento da fisiologia básica e da função dos neurônios do cérebro, uma análise formal da lógica proporcional criada por Russell e Whitehead e a teoria da computação de Turing .”. (GOMES, 2010 .) Após anos de estudos complexos e persistência dos pesquisadores, em 1980, surge o primeiro programa bem-sucedido, o R1, era um programa responsável pela configuração de pedidos de novos sistemas de computador, a empresa Digital Equipament Corporation lucrou milhões com seu uso. A partir daí, despertou interesse de grandes empresas Americanas e Japonesas, expandindo a cada vez, resultando em uma grande evolução até os dias atuais. (GOMES, 2010 .) Atualmente, sistemas baseados na Inteligência Artificial operam em várias áreas de nosso cotidiano. Resultando em grandes investimentos no setor privado e no setor público. Em setorespúblicos, o uso da inteligência artificial demonstra-se muito efetivo, após pesquisas realizadas por estudiosos, indicam que a IA possa reduzir encargos administrativos, ajudar a resolver problemas de alocação de recursos e assumir tarefas significativamente complexas. Hoje os serviços estão concentrados em cinco categorias, quais sejam; responder questões, preencher e pesquisar documentos, gerenciamento de pedidos, tradução e elaboração de documentos. (MHER, 2017). Entende-se por inteligência artificial o estudo de um conjunto de métodos, abordagens e tecnologias que promovem a um computador se comportar de maneira inteligente, ou seja, com uma percepção de aprendizagem, raciocínio, planejamento, percepção, processamento de linguagem natural e robótica de formas eficazes e ágeis. A base de fundamentação da inteligência artificial é o algoritmo, caracterizado por um conjunto de entrada de dados, processamento e saída. Um procedimento lógico voltado à solução de determinado problema, 4 tendo como ponto de partida os dados que são fornecidos ao sistema. ( Revista RD Uno- Uno Chapecó, 2021). Segundo John McCarthy, conhecido como “pai da Inteligência artificial”, pode-se definir a IA como: fazer com que uma máquina se comporte de maneira que, caso se tratasse de um ser humano, seria considerada inteligente. (MCCARTHY, 2000) 1.1 A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E O PODER JUDICIÁRIO Com o grande avanço tecnológico, e o surgimento da IA, como alternativa que pode ser imposta ao poder judiciário, para auxiliar nas elevadas demandas, contando com celeridade nos processos e respeitando o princípio norteador da celeridade processual. Os ideais, portanto, de otimização do tempo x redução de custos, bem como de incremento na produção x acurácia de resultados, propiciados pela automatização de processos, são de interesse de todos os setores produtivos. O Poder Judiciário não poderia resistir a esse fenômeno da virada tecnológica, ainda mais diante do contingente avassalador de processos judiciais em andamento no Brasil e da intensificação na adoção de meios virtuais e de outras tecnologias estimuladas pela recente pandemia da Covid-19, com a consequente impossibilidade, durante o período de isolamento social, do comparecimento pessoal de juízes, das partes e de seus advogados para a realização de atos processuais. (MELCHIOR, 2021) As empresas do setor apresentam a inteligência artificial como uma sedutora alternativa ao descontingenciamento de processos, especialmente relacionados aos litígios de massa, bem como de redução de custos, além de permitir um melhor aproveitamento do tempo pelos humanos. Não se pode descartar o perigo de a tecnologia ser utilizada não como auxílio para a tomada de decisões, mas sim para que sejam tomadas decisões de forma inteiramente automatizada. (MELCHIOR, 2021) Quando se trata da utilização de IA no processo decisório, em especial na confecção de decisões, o tema se torna bastante controverso; é necessário regulamentação emanada do Poder Legislativo. No momento, é feito uso de tecnologia como ferramenta de classificação, triagem, identificação de processos que atendam a determinadas características, entre outras opções. O objetivo é aprimorar a prestação da atividade jurisdicional, justificada pela redução do congestionamento processual na base de proferimentos de sentença. 5 A preocupação com a qualidade do sistema judiciário do país, que deve ser efetivo, adequado e acessível, com disponibilização da justiça para todos os que precisarem, traz a necessidade de criação de alternativas para a solucionar o atual problema de congestionamento do judiciário. O uso da inteligência artificial, no meio jurídico, vem ganhando várias controvérsias, são vários desafios a serem enfrentados. Por conseguinte, demonstra-se o posicionamento de artigos e pesquisa sobre a temática abordada no presente projeto. Para Paulo e Alexandrino (2016) a demora nas soluções dos conflitos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões entre outros infortúnios, atrasam o progresso nacional, desanimam investidores, facilitam o inadimplemento, geram impunidade e acabam com a crença de que os cidadãos possuem no sistema democrático e, devido a esse cenário caótico. O princípio da razoável duração do processo, garantia fundamental inserida no texto constitucional em 2004, no Art. 5°, LXXVIII, também exposto no Art. 4° do NCPC, afirmam que: Art. 4º, as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Art. 5º LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Fica evidente a necessidade dos jurisdicionados perceberem as suas demandas solucionadas adequadamente em prazo razoável. Há uma grande expectativa da elaboração de sentenças judiciais por Inteligência Artificial, que poderia reduzir consideravelmente a morosidade, bem como a discricionariedade excessiva; tais fatores possibilitam a redução de custos e a insegurança jurídica. Contudo, há que se prezar pela cautela na utilização dessas ferramentas. Portanto, os algoritmos elaborados para as soluções de IA devem seguir diretrizes específicas que reflitam os princípios norteadores do ordenamento jurídico em que serão utilizados, em consonância com os preceitos constitucionais: Toda a potencialidade tecnológica oferecida pelos algoritmos utilizados no judiciário brasileiro deve ser analisada de forma inteligente, reanimando a Constituição e fortalecendo a fruição de direitos. Não deve ser utilizada tão somente para persecução de agilidade e rapidez decisória, de forma a facilitar a produção de padrões decisórios, sem participação dos sujeitos afetados pelo provimento: tampouco examinada ao alvedrio da necessária reconstrução argumentativa do caso, como justificativa para resolução da chamada "crise" do judiciário. (MELO, 2020, n/p) 6 Estas iniciativas devem considerar as diretrizes éticas ao obter maior celeridade processual, não podem causar prejuízos aos demais direitos fundamentais. Contudo, no que diz respeito à busca da celeridade, o eminente processualista Nelson Nery Júnior alerta: A busca da celeridade e razoável duração do processo não pode ser feita a esmo, de qualquer jeito, a qualquer preço, desrespeitando outros valores constitucionais e processuais caros e indispensáveis ao estado democrático de direito. O mito da rapidez acima de tudo e o submito do hiperdimensionamento da malignidade da lentidão são alguns dos aspectos apontados pela doutrina como contraponto a celeridade e a razoável duração do processo que, por isso, devem ser analisados e ponderados juntamente com outros valores e direitos constitucionais fundamentais, notadamente o direito ao contraditório e a ampla defesa. (JUNIOR, 2010, p. 323). Além dos preceitos fundamentais a serem considerados, vários contextos precisam ser estudados no desenvolvimentodesta ferramenta. A importância da transparência e da segurança do sistema é fundamental. Os sistemas de segurança devem estar muito bem preparados. Pode-se definir os algoritmos usados para criar sistemas de Inteligência Artificial em cinco abordagens distintas: a) agir de forma humana, simular o comportamento humano de forma que um interlocutor não seja capaz de discernir se interage com um humano ou uma máquina); b) modelagem cognitiva: determina-se o modo do pensar humano e replica-se a forma estabelecida para o programa; c) leis do pensamento: os sistemas inteligentes são construídos através de enunciados da lógica formal, desenvolvida no século XIX; d) tem-se a abordagem do agente racional: o objetivo é agir para alcançar o melhor resultado esperado, num cenário de incertezas; e) máxima proteção contra hackers e vírus que podem comprometer as decisões. . (MELCHIOR, 2021) Como exposto, existem vários desafios a serem superados para que a inteligência artificial seja implantada no sistema jurisdicional. A celeridade processual é o ponto mais sensível do judiciário. Apesar da celeridade com o uso desta tecnologia, é necessário repensar outros problemas que a informatização poderia trazer aos magistrados e em consequência ao próprio ser humano. É evidente que muita pesquisa precisa ser efetuada antes da implantação de qualquer sistema, mas sobretudo apresenta-se possível o auxílio da inteligência artificial na prestação jurisdicional. (MELCHIOR, 2021) O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na busca por melhorias no sistema judiciário e aprimorar os canais de atendimento com a sociedade, tem investido cada vez mais no desenvolvimento e aperfeiçoamento de soluções tecnológicas. O desenvolvimento dessas iniciativas deve promover a economicidade, a celeridade processual, a interoperabilidade tecnológica dos sistemas processuais eletrônicos, o uso de tecnologias em formatos abertos e 7 livres, a transparência, acesso à informação, capacitação e o estabelecimento da governança colaborativa. (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020) Conforme relatório “Justiça em Números” de 2020, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), destaca que o Brasil tinha cerca de 77,1 milhões de processos em tramitação até o final de dezembro de 2019. Apesar de o relatório registrar, pela segunda vez consecutiva, uma redução no número de casos acumulados e destacar a diminuição de aproximadamente 1,5 milhão de processos em comparação com o ano anterior, o panorama geral da litigância no Brasil continua sendo surpreendente e insustentável . (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020) A preocupação desses dados estampa a preocupação do CNJ em busca de soluções para amenizar este grande congestionamento do judiciário. Uma das alternativas presentes na realidade atual de proporcionar eficiência no julgamento e corroborar de diversas formas com a persecução do princípio constitucional da duração razoável do processo, é o desenvolvimento, pelos tribunais, de forma esparsa e descentralizada, de mecanismos de Inteligência Artificial (IA). (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020) Como exposto pelo próprio CNJ, hoje existem no Brasil 41 projetos de IA sendo conduzidos em 32 tribunais. Dentre estes, destaca-se: O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) possui 4 projetos. Em seguida, com 2 projetos, vêm os Tribunais do Alagoas (TJAL), Santa Catarina (TJSC), Tribunais Federais da 3ª (TRF4) e 4ª região (TRF4) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST). (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020) Preocupados com o bom desempenho do uso da IA, em 21 de agosto de 2020, o CNJ lança A Resolução nº 332, dispõe sobre a ÉTICA E GOVERNANÇA PARA PRODUÇÃO E USO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO PODER JUDICIÁRIO. Art. 2º A Inteligência Artificial, no âmbito do Poder Judiciário, visa promover o bem-estar dos jurisdicionados e a prestação equitativa da jurisdição, bem como descobrir métodos e práticas que possibilitem a consecução desses objetivos. Nesta resolução estão implantadas diretrizes que devem ser seguidas nas aplicações da IA nas prestações jurisdicionais. Nos tribunais, sistemas inteligentes estão sendo utilizados para tomar decisões referentes a casos que se enquadrem em temas de repercussão geral. Sua função é auxiliar analistas, interpretando recursos e separando-os por temas, identificando e separando as 8 principais peças do processo, além de funcionalidades que auxiliam a execução processual (SALVO, 2020). A base do direito está atribuída ao processo de fundamentação, em argumentar, expor sua tese de defesa relacionado ao caso concreto, demonstrando as peculiaridades do fato. Segundo Manuel Atienza (2005), argumentar constitui, definitivamente, a atividade central dos juristas e se pode dizer inclusive que há muito tempo poucas profissões em que a argumentação tenha um papel mais importante que no Direito”. Para o filósofo Alexy, afirma que os argumentos jurídicos eram definidos em quatro graus, quais sejam: o discurso prático geral; o procedimento legislativo; o discurso jurídico; e o procedimento judicial. Concluindo todas estas etapas a argumentação jurídica teria passado por todas as regras do discurso racional e procedimentos legislativos, sendo a partir disso, positivado com a lei. Com base no Direito posto, ...a argumentação jusfundamental, especialmente com as formas e regras da interpretação na justificação externa”, busca atingir seu objetivo, que seria ‘a determinação de direitos definitivos a partir dos direitos prima facie assegurados pela declaração principiológica dos direitos fundamentais (TOLEDO, 2005, grifos no original) Para Alexy, citado por Toledo, como normas de aprimoramento, os princípios jurídicos efetivam-se para diferentes tipos de decisão. Desse modo, a definição do direito fundamental como direito definitivo, só seria possível na ocorrência do caso concreto. Neste sentido, Toledo expõe: Todo esse percurso para a determinação, no caso concreto trazido ao procedimento judicial, de direitos definitivos a partir de direitos de prima facie apenas se faz discursivamente, seguindo-se, de maneira imprescritível, as formas e regras da argumentação jurídica para ser tida como racional, ou seja, como correta – a despeito, mais uma vez, de não se afirmar como a única necessariamente possível. Formalmente, a controlabilidade da decisão somente pode ser feita, então, pelo exame do procedimento racional de justificação efetivado (TOLEDO, 2005, grifos no original). No Brasil, além dos tribunais, a IA está sendo adotada em diversos escritórios de advocacia, sua principal utilização é automatizar certos procedimentos que se repetem em processos judiciais, extraindo as informações e o armazenado em banco de dados. 2 JUDICIÁRIO BRASILEIRO E A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL Neste tópico, serão prestados alguns exemplos de IA apresentados utilizados no judiciário Brasileiro. Inteligência Artificial no Brasil vem obtendo significativas evoluções, 9 havendo um vastocrescimento nesse sentido, para fins de potencializar a entrega da prestação jurisdicional e sofisticar o serviço prestado. 2.1 SISTEMAS DE JULGAMENTO UTILIZADAS PELA IA A origem para criação de um sistema inteligente que seja confiável e eficaz se baseia em sistemas de aprendizado de máquina, ligado ao processamento de linguagem natural como forma de interface para a compreensão dos textos jurídicos. Vários programas já foram testados para tomadas de decisões dos processos. (ALETRAS, 2016) Um grupo de engenheiros de computação da faculdade de Londres, em testes na criação de programa de IA, desenvolveram um programa para prever com precisão o resultado de casos relacionados a Direitos Humanos. Utilizaram como base, várias decisões sobre o tema, repassando essas informações a algoritmos de aprendizado da máquina. O treinamento consistiu da captura de cada um dos documentos, transformando-o em um conjunto de palavras a ser analisado. (ALETRAS, 2016) Nikolaos Aletras, um dos componentes do grupo de estudo, declara que: “imagine que você deseja analisar o sentimento expressado em comentários de filmes. Como humanos, o que basicamente se faz é ler os comentários e realizar um julgamento sobre cada comentário. Se quisermos fazer algo mais abstrato, poderíamos contar quantas palavras positivas ou negativas existem em cada comentário e baseado nessa informação, decidir se um comentário é positivo ou negativo”. Este método foi o primeiro a prever os resultados de um grande tribunal internacional analisando automaticamente o texto usando um algoritmo de aprendizado de máquina. Para evitar preconceitos e erros de aprendizagem, eles selecionaram um número igual de casos de violação e não violação. Ao contrário de pesquisas já desenvolvidas anteriormente, que utilizam dados da natureza do crime, esta pesquisa se fundamenta em análises textuais, buscando o aperfeiçoamento desta ferramenta tão prometedora nos tribunais. A pesquisa foi muito satisfatória, demonstrou certa confiabilidade nas decisões, mas não demonstra a possibilidade de substituição de juízes humanos para a IA. (ALETRAS, 20 16). Inicialmente, a própria OAB disponibilizou um sistema de pesquisa de jurisprudência baseado em inteligência artificial. O sistema, tem como objetivo gerar maior praticidade aos profissionais do direito, permitindo, entre outras funcionalidades, a pesquisa dos resultados desejados por tribunais, partes, área do direito e data da ação, com resultados otimizados. 10 No TJDFT, conforme informações do site do TJDFT, os quatro projetos em produção são: Amon, Artiu, Hórus e Natureza Conciliação – e outros dois em fase de finalização – Toth e Saref - que ainda não aparecem no painel, o TJDFT vem utilizando a IA com sucesso há cerca de dois anos para aprimorar a prestação jurisdicional. ( TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS , 2020) Os sistemas têm sido desenvolvidos pela Coordenadoria-Geral de Tecnologia da Informação – CGTI do TJDFT, por meio das equipes da Secretaria de Desenvolvimento de Sistemas - SEDES. Cada sistema possui sua característica e função específica; O sistema Amon atua no reconhecimento facial, a partir de fotografias, gerencia o controle integrado de acesso às dependências do Tribunal. Em funcionamento desde junho de 2020, o sistema permite realizar a conferência de cada pessoa pelo reconhecimento facial, gerando maior controle sobre os acessos ao Tribunal. Com isso, o TJDFT consegue oferecer mais segurança aos magistrados, servidores e todos os que ingressam em seus prédios. ( TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS , 2020) Ao contrário do sistema Amon, o sistema Artiu atua no encaminhamento correto de mandados. Para a distribuição e o cumprimento dos mandados, a Coordenadoria de Administração de Mandados – COAMA necessita do CEP do destinatário. Quando não é possível localizá-lo, seja por dado faltante ou por alguma inconsistência, a IA procura identificar qual é o setor ao qual será enviado o mandado e faz o ajuste do endereço de forma automática. O sistema também foi treinado para obter o tipo de mandado, sendo capaz de classificá-lo e enviá-lo com a prioridade necessária. Agiliza os procedimentos tornando-os mais eficazes. ( TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS , 2020) O sistema Hórus, por sua vez, realiza a inserção automática no PJe de processos digitalizados, reconhece o código de caracteres dos documentos via OCR, recupera dados de sistema de tramitação de processos físicos, classifica tipos de documentos e utiliza certificado digital do Tribunal para inserir documentos no PJe. ( TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS , 2020) Integrando o Projeto de Modernização da Vara de Execuções Fiscais – VEF, o Hórus trouxe resultados efetivos e velozes ao cadastramento de processos digitalizados, integrou a digitalização de processos físicos com o PJe e viabilizou movimentações processuais no 11 sistema judicial legado – SISTJ, tornando o TJDFT o primeiro Tribunal a utilizar técnicas de Inteligência Artificial nesse caso. Para agilizar processos de conciliação foi criado o projeto Natureza Conciliação, atende aos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSCs. O Sistema de Conciliação utilizado pelos CEJUSCs, que já era capaz de realizar a importação automática de processos de redução a termo do PJe, passou a classificar procedimentos por meio do processo de aprendizado da máquina. Para cada processo importado, é gerado um novo procedimento que resultará em uma ou mais sessões de conciliação. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS, 2022) Após ser criado, cada um desses procedimentos ainda precisa passar por uma triagem visando a complementação de informação necessária para a realização da sessão. Isso era feito por um ou mais servidores ou estagiários e agora é realizado de maneira automática pelo próprio sistema, eliminando tarefas repetitivas e dispensando os servidores para novas atribuições. O projeto Toth busca recomendar a classe e os assuntos do processo, durante a etapa do fluxo do PJe, identificada como petição inicial. Essa recomendação é baseada no treinamento supervisionado de algoritmos de classificação tendo como base a inicial submetida pelo advogado. A unidade piloto escolhida para iniciar os testes de usuário será a 1ª Vara Cível, de Família e de órgãos e Sucessões de Santa Maria. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS, 2020) Em 14 de junho de 2021, entrou em operação na Vara de Execuções das Penas em Regime Aberto - VEPERA a primeira fase do Sistema de Apresentação Remota e Reconhecimento Facial - SAREF. O sistema possui como objetivo principal facilitar a apresentação dos apenados na Vara. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS, 2020) Este projeto visa agilizar a apresentação de uma população de 20 mil apenados na VEPERA, por meio de algoritmos de reconhecimentofacial, auxiliando e modernizando o controle de presença da unidade. O sistema possui 03 fases no total e ainda se encontra em homologação das fases dois e três. No Tribunal de Justiça de Alagoas, a ferramenta de inteligência artificial foi criada pelo Laboratório de Estatística de Ciências dos Dados da Universidade Federal de Alagoas 12 (Ufal) em parceria com a Diretoria de Tecnologia (DIATI) do Tribunal de Justiça de Alagoas. Nesta parceria foram desenvolvidos dois programas de IA. ( UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS , 2021) ; O sistema H ércules lê petições e faz a triagem de peças, dando condições para que as varas agilizem os procedimentos para conclusão dos processos. Em função distinta , o sistema Spartacus possui a função de gerir depósitos judiciais. Com objetivo de organizar o cadastro de depósitos para que o Tribunal tenha o controle deles. ( UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS , 2021) ; O sistema de inteligência artificial implantado no TJSC, no momento não possui nome específico, atua semanalmente, com o auxílio dos robôs para varrer todos os sistemas que possuem cadastramento de endereço, para identificar o endereço das partes, após certificado, gera um arquivo em PDF que será juntado ao processo. Em seguida é feita a intimação da parte, com informações sobre os resultados da pesquisa e orientação sobre o recolhimento das diligências – quando necessárias –, e, por fim, a indicação do endereço na petição. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA SANTA CATARINA, 2021) Nos tribunais Federais da 3° (TRF3) o sistema é conhecido como SIGMA, a IA utilizada no TRF3 é um sistema inteligente de utilização de modelos para produção de minutas. O programa ordena os textos armazenados, comparando informações extraídas das peças processuais com a maneira como cada unidade utiliza seus modelos. A inteligência artificial gera insumos para a redação do relatório e, observando as peças processuais, sugere modelos já utilizados para um mesmo tipo de processo, acelerando a produtividade de magistrados e servidores, de forma a evitar, ainda, decisões conflitantes. (TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3° REGIÃO, 2020) O programa facilita e acelera a pesquisa no acervo do órgão de Justiça. Para isso, utiliza ferramentas de tecnologia da informação, que, diferentemente dos sistemas convencionais, são capazes de executar tarefas mais rapidamente do que o raciocínio humano. Conhecido como clusterização de processos, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT4) desenvolveu, pela equipe interna do Tribunal, a IA que tem como função o agrupamento de processos semelhantes, com o propósito de agilizar a análise de admissibilidade dos Recursos de Revista. Agrupamento de processos semelhantes nos gabinetes dos Desembargadores a fim de otimizar a elaboração de votos. (TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO, 2021) https://ufal.br/ https://ufal.br/ https://ufal.br/ https://ufal.br/ 13 O tribunal superior do trabalho utiliza o sistema Bem-te-vi, sistema desenvolvido a partir de inteligência artificial, conta com diversos filtros que permitem saber, por exemplo, quantos processos estão relacionados a determinado tema, há quanto tempo essas ações chegaram ao gabinete ou se o número de julgados está de acordo com as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também permite a análise automática da tempestividade (observância de prazos) dos processos. Analisando que atualmente, cerca de 3% dos processos que chegam anualmente ao TST (10 mil ações) são considerados intempestivos, isto é, foram apresentados fora do prazo. Utilizado pelo Superior Tribunal Federal, o projeto Victor, teve seu lançamento oficial em 30 de agosto de 2018, tendo como missão o aumento da eficiência e desempenho na avaliação judicial dos processos. O anúncio oficial foi feito pela Ministra Carmen Lúcia, à época presidente do STF, que, de acordo com notícia veiculada no site oficial do Supremo Tribunal Federal, explicou: que a ferramenta será utilizada na execução de quatro atividades: conversão de imagens em textos no processo digital, separação do começo e do fim de um documento (peça processual, decisão, etc) em todo o acervo do Tribunal, separação e classificação das peças processuais mais utilizadas nas atividades do STF e a identificação dos temas de repercussão geral de maior incidência. (CARMEM, 2018) A necessidade apresentada pelo STF, foi a criação de uma ferramenta que realizasse a separação das peças jurídicas que compõem os processos que chegam ao Tribunal. Após muitos testes, os pesquisadores desenvolveram o sistema utilizando-se da aprendizagem de máquina, os ensinamentos ao computador foram no sentido de classificar os temas de repercussão geral e classificar as peças jurídicas. A máquina não decide, não julga, isso é atividade humana, mas Victor está sendo treinado para atuar em camadas de organização dos processos para aumentar a eficiência e a velocidade de avaliação judicial, inclusive para propor minutas de decisão (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2018). A IA está presente na área judicial, embora ainda não relacionada a decisões de sentenças, mas mostrando-se eficaz em três exemplos de IA que trabalham em prol da diminuição de prazos na solução de conflitos: os projetos Victor no STF, Sinapses no Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJRO) e o Radar do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). No STF, Victor, a ferramenta de inteligência artificial é resultado da iniciativa do STF em conhecer e aprofundar a discussão sobre as aplicações de IA no Judiciário. Na 14 primeira fase, o Victor lê os recursos extraordinários que sobem dos tribunais para o STF, identificando quais estão vinculados a determinados temas de repercussão geral, acelerando as etapas de distribuição de processos para os gabinetes dos ministros. Para evitar violações de princípios constitucionais, dos riscos de danos diante da possibilidade de igualar os julgamentos pelo STF decorrente do julgamento dos recursos pelo Victor, é que se evidencia a necessidade de acompanhamento do Projeto pela sociedade em geral e principalmente pela comunidade jurídica. 2.2 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, DIREITO E O ACESSO À JUSTIÇA O acesso à justiça, é um direito fundamental de primeira dimensão, previsto no Art. 5, XXXV da CRFB/88; “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”. Regido pelo princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou princípio do direito de ação, é a garantia de que qualquer pessoa pode ter seu conflito analisado pelo Poder Judiciário. Neste mesmo sentido o art. 8º, 1 da Convenção Interamericana sobre Direitos Humanos prevê, artigo 8º – Garantias judiciais: Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscalou de qualquer outra natureza. O acesso à justiça concede o direito do ser humano de ser ouvido em juízo e atender para a proteção de seus direitos, concedendo-lhe a garantia de que a solução de seus conflitos será dada de forma justa e adequada. O objetivo deste direito fundamental nada mais é do que a realização da justiça. (MARCIA, 2008) É a certeza de um processo justo que passa necessariamente pelo juiz independente, imparcial e que não subverte a ordem legal, é um compromisso de superar os obstáculos que impedem ou dificultam que grande parcela da população tenha acesso a uma ordem jurídica justa, bem como que desfrutem de assistência jurídica plena e integral. 15 Segundo Pereira, (2005, p.12) O acesso à justiça é um direito do cidadão, ocorre a materialização da cidadania e a efetivação da dignidade da pessoa humana. Mediante o exercício dos direitos humanos e sociais torna possível o Estado democrático de direito. Atualmente, observa-se uma alta demanda ao acesso à justiça, gerando um congestionamento no poder judiciário, dificultando para que o acesso à justiça seja efetivo para que todos os cidadãos tenham de forma justa e ágil a solução de seus conflitos. O objetivo da IA é fazer com que os computadores possam “pensar” exatamente como os humanos, criando análises, raciocinando, compreendendo e obtendo respostas para diferentes situações, sem envolver sentimentos ou emoções. uma das metas da IA é a descoberta de sistema que consiga se autodesenvolver, ou seja, avaliar as informações já obtidas para que se desenvolva algo novo. O fenômeno da utilização das IA se explica porque, à medida em que se tem evoluções tecnológicas, o homem fica mais tendente a utilizar dos novos recursos proporcionados, buscando uma facilitação na realização de seus afazeres quotidianos, o que é justificável, tendo em vista que, cada vez mais, pretende-se deixar de lado as atividades de realização mais árdua. ( RAPHAEL, 2020). A pesquisa mais completa sobre a IA realizada em tribunais brasileiros foi efetuada pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luís Felipe Salomão. Com intuito de analisar e eficiência da IA, relacionada à grande demanda recorrente no judiciário: No Brasil, a quantidade de litígios, estimada em cerca de 78,7 milhões,1 demonstra a existência de espaço e necessidade para aprimoramento das técnicas de gestão dos órgãos, processos e pessoas ligadas ao Poder Judiciário, de modo que inovações adequadas e bem-sucedidas se mostram relevantes para melhorar os impactos econômicos e sociais atrelados à atuação judicial. Assim, seja para assegurar o cumprimento dos deveres organizacionais e constitucionais do Poder Judiciário, seja para atribuir sua dimensão adequada, na economia, torna-se importante que o Poder Judiciário tenha sua atuação bem administrada, com o uso de mecanismos de gestão para melhor alocação de recursos, aumento da qualidade do serviço prestado e, com isso, a maximização de sua eficiência. ( LUIS FELIPE SALOMÃO, 2021) O Poder Judiciário brasileiro assumiu um compromisso relevante no que se refere à concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas, tendo sido reconhecido como o primeiro Judiciário no mundo a integrar oficialmente os ODS aos seus procedimentos cotidianos. Além deste compromisso, o Brasil faz parte, desde de 2019, da Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE), com o intuito de desenvolvimento tecnológico. 16 No total são 42 Países que buscam ampliar seus sistemas e inovar a prestação de seus serviços. O documento da OCDE implantou diretrizes que devem ser seguidas na implantação da IA, que deve ser de forma inovadora, confiável e que respeite os direitos humanos e os valores democráticos. Além de estarem presentes os cinco princípios para a administração responsável da Inteligência Artificial confiável (HOUTEN, 2021); 1) Crescimento inclusivo, desenvolvimento sustentável e bem-estar: a IA deve ser criada para colocar os interesses das pessoas e do planeta em primeiro lugar, por meio do aumento das capacidades humanas, da promoção do crescimento inclusivo e do desenvolvimento sustentável, bem como da proteção dos ambientes naturais (HOUTEN, 2021). 2) Valores e justiça centrados no ser humano : os atores de IA devem respeitar o Estado de Direito, os direitos humanos e os valores democráticos, durante todo o ciclo de vida do sistema, incluindo liberdade, dignidade e autonomia, privacidade e proteção de dados, não discriminação e igualdade, diversidade, justiça, justiça social e direitos trabalhistas internacionalmente reconhecidos (HOUTEN, 2021). 3) Transparência e explicabilidade : sistemas de IA devem ser regidos pela transparência e divulgação responsável. Para tanto, os atores devem fornecer informações com significado, apropriadas ao contexto e consistentes com o avanço tecnológico. Tal princípio é essencial para promover informação ampla e de fácil compreensão pela sociedade sobre os sistemas de IA, para possibilitar que os adversamente afetados desafiem seus resultados, bem como para conscientizar as partes interessadas sobre suas interações com os sistemas de IA, inclusive no local de trabalho (HOUTEN, 2021). 4) Robustez, segurança e proteção: um sistema de IA robusto é aquele protegido durante todo o seu ciclo de vida, para que possa funcionar de forma apropriada e não coloque riscos de segurança inaceitáveis. Por isso, os atores de IA devem assegurar a rastreabilidade, incluindo a relativa aos conjuntos de dados, processos e decisões tomadas ao longo do ciclo de vida do sistema de IA. Ainda, os atores da IA devem aplicar uma abordagem contínua de avaliação e de gerenciamento de riscos (HOUTEN, 2021). 17 5) Responsabilidade ou prestação de contas: os atores da IA devem ser responsabilizados pelo seu funcionamento adequado e em harmonia com os princípios acima, conforme seus papéis, o contexto e consistência com o avanço tecnológico (HOUTEN, 2021). Com base nos cinco princípios citados, para uma gestão responsável dos sistemas de IA e em observância às suas recomendações, foi criada a Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA) em abril de 2021. Essa estratégia busca potencializar o desenvolvimento e a utilização da tecnologia para a promoção do avanço científico e a solução de problemas concretos do país, identificando áreas prioritárias nas quais há maior potencial de obtenção de benefícios (HOUTEN, 2021). Para sua implementação, foram estabelecidos os nove eixos temáticos abaixo: Fonte: Luís Felipe Salomão, 2021 A partir destes nove pilares, a estratégia busca: (i) contribuir para a elaboração de princípios éticos para o desenvolvimento e uso de IA responsáveis; (ii) promover investimentos sustentados em pesquisa e desenvolvimento em IA; (iii) remover barreiras à inovação em IA; (iv) capacitar e formar profissionais para o ecossistema da IA; (v) estimular a inovação eo desenvolvimento da IA brasileira em ambiente internacional e (vi) promover ambiente de cooperação entre os entes públicos e privados, a indústria e os centros de pesquisas para o desenvolvimento da IA. (Salomão, 2021) A criação deste projeto demonstra a importância das ações estratégicas para que o Brasil atue no cenário Internacional também como produtor de tecnologia e não apenas como importador. 18 3 A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A PRESTAÇÃO JURISDICIONAL A possibilidade do ingresso da IA nos atos decisórios dos processos judiciais guarda consigo preocupações sobre a possibilidade de falhas e seus respectivos impactos, sobretudo no atual momento de desenvolvimento tecnológico. Deve-se identificar algumas premissas que são adequadas para o enfrentamento de problemas de desafios que a IA apresenta no direito e premissas que são inadequadas. A mais recorrente nas discussões jurídicas é a ideia que a IA busca algum tipo de submissão humana, no direito, é muito concreto quando é debatido sobre a IA como um elemento enfraquecedor, empobrecedor das discussões jurídicas. Isso ocorre quando a filosofia jurídica, teoria do direito ou a ética se tornam mais rasas quando se está usufruindo e construindo soluções com base na IA, são premissas absolutamente inadequadas. Segundo Hartamann 3 , após experiências elaboradas, é comum e recorrente a análise sobre a IA, e quando necessário rever o processo e efetuar alguns ajustes, é recorrido a teoria do direito, a filosofia jurídica e a ética. A discussão ética é fundamental em qualquer instalação de sistemas de IA. Qualquer discussão de um propósito adequado relacionado à IA é voltada na discussão ética. Neste ponto, pode-se considerar ineficaz o comentário sobre a IA que torna o direito mais raso, muito pelo contrário, mostra-se que a IA abre caminhos, destaca as deficiências e os necessários debates e construções sobre os ideais da profissão do direito como um todo, concretização de justiça, de diminuição de desigualdades, de promoção de direitos fundamentais. Outro ponto saliente sobre a IA, é a discussão que ela se torna limitada em termos de capacitação da sensibilidade, do caráter passional que as pessoas utilizam no raciocínio jurídico, e que seria impossível a IA ter este sentimento de sensibilidade e de nível de atenção, em controvérsia, que o ser humano sempre age com total atenção e sensibilidade, cuidado com o outro, o que nem sempre é verdadeiro. Quando é possível identificar as construções de partida de benefícios e de riscos, ocorre ganhos consistentes nos parâmetros de observação da tecnologia como algo estratégico, como algo que pode ser para o bem e como algo que pode nos defender do mal uso, a tecnologia bem aplicada não afeta de forma negativa, seu desenvolvimento do conhecimento criado para proteger os valores contra o mal uso. 3 Coordenador acadêmico do Projeto Victor UnB-STF Coordenador Acadêmico do Projeto Mandamus (UnB-TJRR). 19 O primeiro caso bem-sucedido de Inteligência artificial implantado no Judiciário Brasileiro foi a urna eletrônica, utilizada pela primeira vez nas eleições municipais de 1996. Após a solidificação desse sistema na Justiça Eleitoral, houve um grande avanço na geração de investimentos aplicados em tecnologia nos tribunais. (TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, 2021) Outro marco do uso da tecnologia no sistema judiciário ocorreu com a digitalização dos processos físicos para formato eletrônico. Com este avanço tecnológico ocorre um grande avanço nos despachos dos processos e torna mais ágil os serviços judiciários. Além das audiências virtuais e citações por meios eletrônicos. Vários caminhos foram encurtados até o momento, utilizando-se das praticidades e celeridade que a tecnologia nos fornece. Cabe ainda citar, a IA utilizada em escritórios de advocacia no Brasil; um escritório do interior de São Paulo passou a utilizar o supercomputador Watson da IBM para advogar (MOSCELLA, 2011; RAVAGNANI, 2017). Esse escritório aumentou a produtividade e desempregou advogados. Hoje é o maior escritório de contencioso de massa do país com mais de 10% das ações do Brasil, recebe 25 mil novas por mês e teve um faturamento de 110 milhões de reais em 2014 (BUENO, 2015). Igualmente, um grande escritório de advocacia do Recife desenvolveu uma solução baseada no Watson, qualificando o seu processo de negócio e diminuindo o quadro funcional nas tarefas mais básicas. Em uma declaração, o juiz do TJSC Alexandre Morais da Rosa atesta o amplo uso de ferramentas tecnológicas avançadas e a diminuição de empregos de advogados em outro grande escritório de advocacia no Rio de Janeiro. Porém concluiu que, a maioria dos juízes ainda não se deu conta da informatização (digitalização) e do uso da IA. 3.1 A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL FRENTE ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS É de suma importância sinalizar as lesões que o uso da Inteligência Artificial tem sobre os direitos e garantias constitucionais. Desde os direitos mais básicos do homem, as inteligências artificiais geram um perigo velado pela seguridade gerada pela confiança no processo matemático e sua suposta exatidão. Como já mencionado anteriormente, a IA tem evoluído com o passar dos anos, e que a etimologia está atrelada a “alguém” que realiza trabalhos obrigatórios e repetitivos, auxiliando nas tarefas mais árduas e cuja prática pretende ser evitada pelo próprio homem, que almeja, cada vez mais, por simplificar os seus meios de trabalho e o seu estilo de vida. 20 Nesse aspecto, Nunes e Marques (2018, p. 421) “sustentam que a utilização desses sistemas tecnológicos é sobremaneira crescente, haja vista que eles trazem, de fato, precisão e eficiência na prestação dos serviços desempenhados, otimizando-os de maneira tal que as demandas atendidas têm apuração mais rápida”. A implementação das IA no âmbito do Poder Judiciário baseia-se nos fundamentos de redução de mão de obra e agilidade no processo, no entanto, o que precisamos nos questionar é se, realmente, a celeridade, a eficiência e a redução do número de demandas, hoje tão almejados, devem ter preferência com a utilização de tecnologias artificiais de reprodução do comportamento humano, colocando em eventual prejuízo os demais direitos constitucionalmente previstos e que são, da mesma forma, aplicáveis ao processo. O devido processo legal constitui um super princípio diretamente ligado à noção de justiça, que abarca todos e abrangem os demais princípios menores, informadores e universais. (THEODORO JUNIOR, 2020, p. 46). Isso também pode ocorrer porque, processo justo e devido é o processo que, não observa somente as disposições legais, dá ao juiz o dever de valer-se de critérios integrativos, aplicando e considerando, para o caso concreto, não apenas as normas de direito positivo na exata medida do que indicam, mas sim valer-se de outras fontes e costumes utilizadas nas decisões. O direito ao duplo graude jurisdição, não está expressamente previsto na Constituição Federal, tem feição de direito fundamental, é visto através de hermenêutica pautada em interpretação extensiva, a sua previsão, ainda que subjacente. O duplo grau de jurisdição decorre de um amplo aspecto que se dá ao princípio constitucional da ampla defesa, pelo qual é dado aos litigantes o direito de defenderem-se em juízo, traduzindo-se tal defesa, inclusive, no direito à revisão da decisão prolatada, nos termos do art. 5º, LV da CRFB/88. A utilização da inteligência artificial no ordenamento jurídico, ofende o princípio da publicidade (art. 5º, LX e 93, IX da Constituição e art. 8º do CPC), além de ferir o direito do contraditório, já que o processo algorítmico é inacessível. Há que se lembrar do previsto no inciso XXXV, do art. 5º, da CF/88, que se garante acesso à justiça, assim como o princípio do juiz natural. 21 Segundo Roque e Santos, “[...] seria inconstitucional a tomada de decisões exclusivamente por robôs, sem que suas decisões sejam de alguma forma submetidas à revisão humana, sendo assegurado pela Carta Magna o direito público subjetivo de acesso aos juízes” (2021, p. 71) Não é sem razão que a própria Constituição Federal brasileira de 1988, trata dos direitos sociais, reconhece a necessidade de proteção dos trabalhadores em face da automação: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei (BRASIL, 1988). Muitos fatores constitucionais precisam ser analisados para a fiel implantação da IA, ao tempo que traz conforto, pode haver um efeito de rebote, buscar medidas que, embora facilitadoras, poderiam afrontar objetivos e fundamentos da República, colocando em xeque os postulados da dignidade da pessoa humana e da erradicação das desigualdades. 3.2 MALEFÍCIOS DO USO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO DIREITO A base de todas as pesquisas relacionadas à IA é a análise de algoritmos na alimentação dos sistemas, que buscam entender o comportamento humano e sua previsão. Uma pesquisa implantada em Nova Jersey, relacionada à análise para prestação de fiança, identifica que a tomada de decisão da IA relacionada à personalidade é mais eficaz que a decisão tomada por juízes. No entanto, outra pesquisa realizada em Harvard, tem mostrado uma ameaça real de discriminação não intencional, mesmo quee esses algoritmos tenham criados conforme legislação e que teoricamente de forma legal e justa, aumentam a discriminação e o racismo. Apesar dos critérios implementados nos algoritmos não serem incluídos a raça, outros critérios podem acabar sendo agrupados e agregando para o final da decisão, como exemplo, local de residência, nomes semelhantes, profissões, resultando em efeitos inconstitucionais. (Salvo, 2020) Atualmente, no Brasil, as inteligências artificiais jurídicas estão em um patamar de assistência processual. Têm-se algoritmos que analisam tempestividade, prazos, 22 gerenciamento de controvérsias, modelos, pesquisas de jurisprudências e doutrinas, todos voltados para o auxílio e a celeridade processual. Ao contrário, os softwares estadunidenses usados no âmbito jurídico estão, de certa forma, mais em níveis mais avançados que os brasileiros. A eles já foram atribuídas um maior grau de autonomia. Conforme O’Neil (2020), há o questionário LSI-R, Level of Service Inventory – Revised, que é um dos modelos mais populares aplicados. Trata-se de um longo questionário que um detento deve responder e cuja relevância encontra-se no fato de ele realizar o cálculo do risco de reincidência desse preso. Assim, existem perguntas como se o indivíduo é reincidente, se houve ou não cúmplices e, ainda, acerca do uso de entorpecentes em geral. Contudo, conforme se dá seguimento ao questionário, é notável o surgimento de questões com viés discriminatório. (O’NEIL, 2020) O questionário é composto de perguntas como nascimento, criação, família, amigos e vizinhança, não sendo questões relevantes para o caso criminal ou para a sentença, contrapondo-se à relevância da sentença justa e imparcial que descartaria estes fatos que não se correlacionam com o crime, sendo notável a injustiça contida neste questionário. Outro caso emblemático, que pode ser citado, é o sistema compas , um software chamado Correctional Offender Management Profiling for Alternative Sanctions, é um outro sistema de questionário. Este sistema utiliza vários dados para calcular as chances de um jurisdicionado reincidir e os juízes utilizam tais resultados para decidir sobre a manutenção da prisão preventiva e sobre a pena a ser aplicada. Serve para o cálculo da reincidência e da dosimetria da pena (VIEIRA, 2019). O compas , assim como o LSI-R, é composto por questionário, destina-se a categorizar o indivíduo como de baixo ou alto risco, de acordo com seu resultado. Conforme Agra (2021), O COMPAS é uma inteligência artificial que usa “aprendizado de máquinas”, conhecida como machine learning, e tem a intenção de tornar as decisões judiciais cada vez menos influenciáveis por erros humanos. Importante entender que essa solução de tecnologia digital se utiliza das experiências de sentenciamento do Poder Judiciário, identificando padrões de dosimetria através de correlações e análises de dados e das respostas dos questionários. A partir desses padrões analisados, a máquina vai conseguir fazer determinações e até predições, por variáveis encontradas dentro de todo o seu banco de dados. Em uma pesquisa publicada por uma empresa dos EUA, com intuito de calcular a probabilidade de reincidência criminal dos jurisdicionados, revelou que esse sistema era enviesado contra negros, classificando essas pessoas como duas vezes mais propícias a reincidir. O algoritmo do COMPAS aprendeu com base em decisões anteriores nas quais o 23 preconceito e discriminações raciais tiveram forte influência e passou a se comportar conforme essa regra. Ou seja, a base de dados do sistema era alimentada com aqueles dados fornecidos pelas autoridades públicas, como estatísticas de prisões baseadas em etnia, idade, raça e condição econômica. Assim, o racismo praticado na realidade física era importado para a realidade digital. (HOW WE ANALYZED THE COMPAS RECIDIVISM ALGORITHM) Esse sistema possui até 19 fatores de risco quando analisa diferentes grupos e pessoas. Dentre as diversas propostas, destacam-se a análise do risco individual do comportamento violento, da prática de novos delitos e da obstrução do processo. Em síntese, trata-se de relatórios atuariais que definem os "riscos" do acusado/réu a partir desse programa de computador e, com isso, cria-se uma orientação para o sistema de justiça criminal. (VIEIRA, 2019) A análise utilizada pelo sistema a partir dos "riscos" resulta sempre na supervalorização da taxa de periculosidade de indivíduos específicos, como daquelas populações majoritariamentemarginais na sociedade americana (negros, latinos, imigrantes no geral, pessoas economicamente hipossuficientes, entre outros). Isso porque a própria base de dados que era alimentada no sistema já estava enviesada. (VIEIRA, 2019) Fica demonstrado que o peso das perguntas dispostas em ambos os questionários resulta em uma pontuação mais elevada para as populações periféricas, perpetuando as desigualdades já existentes. Percebe-se que o indivíduo solto após uma condenação encara o mundo com antecedentes criminais, dificultando ainda mais sua reinserção social. Há de se tratar, também, acerca da grande incidência de disfunções no reconhecimento facial. O documentário Coded Bias (2020) demonstra o caso de como uma pesquisadora da Tecnologia de Massachusetts (MIT), Joy Buolamwini, descobre e investiga o viés racista por parte da codificação em Inteligência Artificial no que tange ao reconhecimento facial. A pesquisadora, em uma tarefa, descobre que, ao posicionar um rosto negro em frente a um algoritmo dessa espécie, o rosto não era reconhecido, portanto, ao adicionar uma máscara branca em frente a câmera, era instantaneamente identificado. Ela, então, dá início a uma investigação que constata que tais algoritmos de inteligência artificial são programados para a identificação de padrões baseados nos dados de entrada. Rostos negros e femininos não eram reconhecidos, pois o banco de dados da IA era carregada com rostos de homens brancos. (CODED BIAS, SHALINI KANTAYYA, 2020) 24 Nos sistemas de Inteligência Artificial, é difícil identificar qual seria os algoritmos decisórios seguidos pela máquina, tendo em vista que o sistema possui uma complexidade extremamente alta, de modo que não é possível identificar as relações entre entrada e saída, ou seja, não é possível identificar o motivo e/ou o caminho seguido pela máquina para se chegar a uma conclusão/decisão específica. 3.3 A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL COMO MÉTODO DE AUXÍLIO À PRESTAÇÃO JURISDICIONAL A IA consegue ir além de certos limites que nós seres humanos conseguimos atingir, como exemplo, atividades repetitivas, cansativas e limitantes, foi a base seguida para criação do projeto Vitor, utilizado pelo STF. Pois o processo cansativo da realização das mesmas tarefas, acaba dispersando a atenção necessária para o real julgamento e discernimento para tomada de decisões, fato que não ocorre com a IA. Acresce o conceito que a IA melhora o desempenho das atividades realizadas, com redução de tempo e percentual de erros. Um dos principais pontos que retardam os processos, atualmente, são as citações e intimações, pensando nisso, foi desenvolvido o sistema Mandamus, utilizados pelo TJ de Roraima, sistema inteligente do controle de processos judiciais, da decisão ao cumprimento do mandado. Funciona 100% digital. Sistema simples, mas que ataca um problema muito grande no judiciário. ( MANDAMUS...,2019). Além da IA ser vista como um apoio técnico, ela deve ser vista com um apoio comportamental, porque indica, auxilia, permite que o ser humano desempenhe suas atividades de forma mais estratégica. Para ter razão, fundamento ela tem que ser indissociável de uma base ética, essa a principal premissa dos pesquisadores do direito e da IA. A inteligência artificial possui o raciocínio, a personalidade e conhecimento baseado nos exemplos previamente apresentados, ou seja, trata-se de um modelo matemático sofisticado, que é inspirado na nossa arquitetura cerebral, com a capacidade de se auto ajustar e aprender a concluir por uma configuração que melhor responda aos exemplos em que ela foi exposta. (ROMANEIRA, 2020) A tecnologia será lastreada não só com as regras gerais dispostas em todo Ordenamento Jurídico, mas também em conformidade com base de dados preexistente e até com a interpretação da norma, de acordo também com os valores éticos orientados pela sua equipe de desenvolvimento. 25 Independentemente da aplicação prática que a Inteligência Artificial possa ter no âmbito do Poder Judiciário Brasileiro, o seu sustento e legitimação tem sido alicerçado na garantia da efetivação da duração razoável do processo. A utilização da Inteligência Artificial no Poder Judiciário se apresenta como um caminho sem volta e muito promissor. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A estratégia digital do Poder Judiciário se voltou ao uso de tecnologias mais avançadas do que a informática convencional: estuda-se como utilizar ferramentas de IA em todas as etapas do processo judicial, desde o ingresso dos feitos no gabinete do juiz, na preparação e fundamentação da decisão, acelerando o processo de decisão do caso fático, inclusive qualificando a decisão. Os algoritmos podem classificar e separar as informações de cadastro e documentos que são recebidos, acelerando e qualificando o andamento dos processos judiciais. O judiciário Brasileiro sofre com as elevadas demandas de processos, causando um congestionamento e grandes atrasos em seus despachos. Com o grande avanço tecnológico, estão surgindo alguns meios alternativos para auxiliar na solução deste problema; a implantação de ferramentas digitais para auxiliar nas funções administrativas com o intuito de agilizar e resolver o problema da morosidade do judiciário, é a proposta para o futuro. Pode-se identificar que a inteligência artificial é um assunto relevante no meio jurídico, fomentando muitas discussões, dúvidas, certezas e incertezas. Comporta-se como uma proposta tentadora para o judiciário suportar a demanda atual, respeitando os princípios constitucionais e cumprir sua função de transmitir segurança jurídica aos cidadãos. A IA deve ser entendida como ponto estratégico para a profissão do direito e não como concorrência, uma estratégia para resolução dos problemas que enfrentamos no direito, principalmente na demanda da justiça substancial, de modo a aproveitar um momento de transformação e inovação de padrões que a IA está provocando no mundo como um todo. Há muita pesquisa a ser definida sobre o assunto na esfera jurídica, porém os testes de sistemas já implantados no judiciário, apresentam uma grande evolução e cumprem a finalidade para que foram propostos. Vários projetos já estão sendo executados e passando por várias atualizações. A inteligência Artificial, vem sendo tratada como a grande aliada ao aumento da produtividade do Poder Judiciário brasileiro, havendo importante investimento 26 direcionado à automação de algumas atividades. Não há dúvidas de que a tecnologia pode tornar a justiça mais efetiva e com mais qualidade. A configuração da IA, por meio de algoritmos inteligentes e imparciais, torna o trabalho de selecionar quais leis, decretos, regulamentos, casos e decisões anteriores e jurisprudências que podem ser utilizadas em cada caso concreto, com grau de precisão igual ou maior do que a dos especialistas humanos (juízes e assessores). A ideia da Inteligência Artificial para julgamentos imparciais, seja qual for, encontra, aqui, um revés. Surge oquestionamento de como o software, em sua maneira de atuação, alcança um resultado. Se máquinas geram resultados a partir da absorção dos dados retirados de cada indivíduo em seu uso algorítmico, conclui-se que esta reproduz a perspectiva moral por meio do aprendizado de máquina dos dados colhidos ou do próprio programador, na criação de seu código. A questão da transparência do processo algorítmico é um dos pontos mais críticos a serem analisados, visto que o programador, ao criar o código, poderá inserir nos mesmos, vieses preconceituosos que não poderão ser vistos e, portanto, não poderão ser argumentados. desta forma, durante a criação dos softwares, poderão ser inseridos preconceitos já enraizados na sociedade e, até mesmo, do próprio programador, indo contra os princípios e garantias constitucionais. Assim, além de afetar o indivíduo, o sistema consegue criar uma mecânica de repercussão que pesará na condenação de todos os que cercam aquele cidadão condenado, gerando uma bolha de comunidades marginalizadas. Pode-se explicar usando-se o mesmo exemplo do indivíduo já demonstrado anteriormente, uma vez que esta condenação ecoará em toda sua comunidade e sua família, impactando na pontuação dos próximos que passarem por esses sistemas. Em suma, a Inteligência artificial aplicada na sociedade gera um tipo de efeito dominó de lesão aos direitos e garantias fundamentais, ferindo a todos em escalas diferentes. As classes sociais menos favorecidas, por óbvio, são as mais injuriadas. Fica evidente o risco da utilização das Inteligências Artificiais citadas neste trabalho, pois se mostram falhas em sua aplicabilidade. Se inseridas no sistema brasileiro, aumentariam a disparidade de classes já existentes, assim como poderiam vir a afetar o sistema judiciário e carcerário, ferindo o próprio princípio da dignidade humana e o da ampla defesa. 27 Contudo, a IA é um reforço para o judiciário, um caminho sem volta no mundo tecnológico que estamos inseridos, deve ser utilizada de apoio, é uma ferramenta que poderá contribuir em muitos sentidos. O grande desafio da IA, é promover a possibilidade desses algoritmos serem inseridos de forma imparcial, livre de fundamentos racistas e desiguais, os resultados da IA se ajustarem à realidade em que o ser humano esteja inserido. Os programas de IA já utilizados pelo judiciário Brasileiro demonstram-se efetivos, pois atuam como auxiliares da justiça e não impactam na tomada de decisões, ao contrário dos sistemas internacionais citados ao longo do trabalho, que atuam na tomada de decisões, deixando aparente que estes agem com padrões parciais, não tendo o réu, um julgamento justo e imparcial. É notório que a IA contribuiu diretamente para a eficácia e eficiência do exercício dos princípios da celeridade processual, tendo em vista o grande número de processos judiciais e consequentemente a morosidade no deslinde processual para alcançar a sua solução que já afeta a própria duração razoável do processo e dificulta o acesso à justiça da sociedade, sendo este, mais um princípio constitucional. Sendo que, qualquer tecnologia guarda consigo uma curva evolutiva, ou seja, demanda de aperfeiçoamento, no sentido de eliminar eventuais falhas resultantes do seu uso. REFERÊNCIAS CAYGILL, Bex. 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