Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
S U M Á R I O Apresentação Linguística no ensino básico e resolução de problemas: como é possível? Os problemas autossuficientes e a experiência dos alunos de ensino básico PARTE 1 - Introdução aos Problemas de Linguística CAPÍTULO 1 - Motivação Por que linguística? Por que problemas? Por que problemas de linguística? CAPÍTULO 2 - Como problemas podem contribuir para o ensino de línguas Diversidade linguística e cultural Ressignificação da aprendizagem de gramática Aprendizagem de língua adicional Contato com a investigação em linguística Diálogos transversais CAPÍTULO 3 - Como usar os problemas em sala de aula Planejamento: como inserir os problemas? Problema: como conduzir a resolução? 6 7 11 13 16 17 18 23 29 31 33 37 41 44 47 48 52 Pós-problema: como fechar o processo? CAPÍTULO 4 - Como usar este material Problemas apresentados no material PARTE 2 - Problemas de Linguística PROBLEMA 1 PROBLEMA 2 Omul-păianjen PROBLEMA 3 Kasa Hiragana PROBLEMA 4 Futoshiki Fonético PROBLEMA 5 Numerais Inuktitut PROBLEMA 6 Trem das Cores PROBLEMA 7 Jethro Tull PROBLEMA 8 Tupicidades PROBLEMA 9 Die Gurien brigen in dem Kamiong 55 57 60 64 63 71 81 94 103 116 125 134 150 Plural em aragonês PROBLEMA10 Opt sau optzeci PROBLEMA 11 Okun na Yora PROBLEMA 12 LoCoS PROBLEMA 13 PROBLEMA 14 Xokléng e Kaingáng PROBLEMA 15 Sarie Marais PROBLEMA 16 Números Birom APÓS O LIVRO 165 180 193 213 222 231 243 253 Shekh ma shieraki A P R E S E N T A Ç Ã O 7 A P R E S E N T A Ç Ã O LINGUÍSTICA [NO ENSINO BÁSICO] E RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS: COMO É POSSÍVEL? Suelen Érica Costa da Silva1 Priscilla Tulipa da Costa2 1 CEFET-MG 2 UFMG Para começarmos esta conversa sobre Linguística, ciência ainda pouco conhecida pelas pessoas em geral, é importante mencionar os interlocutores preferenciais deste livro: professores de língua materna ou de línguas adicionais dos ensinos fundamental e médio, ou seja, do ensino básico, interessados em conhecer – um pouco mais – essa área do conhecimento e buscar respostas para a indagação que abre esta Apresentação. Convidamos também os colegas pedagogos e professores que lecionam para os cursos de licenciatura – Matemática, Física, Biologia, Geografia, História – e todos os interessados pela Ciência da Linguagem. Neste ponto, os leitores destes parágrafos iniciais devem fazer o seguinte questionamento: qual é a razão que fundamenta o convite para profissionais de áreas tão diversas? A resposta para essa pergunta é a transdisciplinaridade entre a Linguística e os demais campos de estudo. E é sobre isso que os leitores – professores em atividade ou em formação – vão ler na Parte I deste livro. Na seção, intitulada Introdução aos Problemas de Linguística, os autores Artur Corrêa Souza, 8 A P R E S E N T A Ç Ã O Bruno L´Astorina, Cynthia Lacroix Herkenhoff, Eduardo Martins e Rodrigo Pinto Tiradentes, apresentam a Olimpíada Brasileira de Linguística (OBL), os problemas autossuficientes e as possibilidades de desenvolvimento pessoal e acadêmico que a abordagem baseada em problemas proporciona para os estudantes, como a autonomia e o protagonismo. Compreender o que é a Ciência da Linguagem, saber que existem outras formas – além da imposta pela tradição gramatical normativa – de se estudar a língua, entender o que a Linguística explica e descreve e apreender suas formas de análise em seus diferentes níveis: o fonético, o fonológico, o morfológico, o sintático, o semântico, o pragmático, o textual e o discursivo. Tudo isso é muito importante para cada leitor deste exemplar, seja o iniciante ou o experiente. Por isso, o Capítulo 1 se ocupa de divulgar respostas para as seguintes perguntas: Por que linguística? Por que problemas autossuficientes? Por que os problemas de Linguística?. Os leitores, quando encontram explicações efetivas para essas indagações, são motivados a aplicarem a Linguística e seus problemas autossuficientes para o ensino de língua [materna e adicional] nas salas de aula das escolas do país. Nesse sentido, o Capítulo 2 – Como problemas podem contribuir para o Ensino de Línguas e o Capítulo 3 – Como usar os problemas em sala de aula, além de ampliarem o capítulo inicial, fornecem contribuições teóricas para que cada leitor apresente resposta(s) para a pergunta que intitula esta tessitura: Linguística [no Ensino Básico] e resolução de problemas: como é possível?. Ademais, o Capítulo 3 também direciona o leitor para o efetivo trabalho com os problemas de Linguística em sala de aula, fornecendo dicas de preparo do processo, que vão desde o planejamento até o fechamento das atividades com os alunos. Assim, ao detalharem o passo a passo de cada uma das etapas, os 9 A P R E S E N T A Ç Ã O autores orientam os docentes nos procedimentos de inserção, condução e fechamento das questões autossuficientes. Por fim, e também de grande importância para o trabalho pedagógico dos professores, o Capítulo 4 – Como usar esse material – apresenta 5 pontos essenciais para a aplicação da seleção de 16 problemas autossuficientes, escolhidos pelos autores a partir das provas de edições anteriores da OBL. Essas questões previamente selecionadas são apresentadas na Parte II desta obra – Problemas de linguística. Se cada leitor aplicá- los em sala de aula representará um renovo para as práticas pedagógicas de educação em língua materna no ensino básico, historicamente centradas no ensino metalinguístico, prescritivo, gramatical. Ousamos esperar que o trabalho com os desafios de Linguística nas escolas espalhadas pelo Brasil seja tão prazeroso e produtivo como foi [e ainda é] para nós e para os nossos alunos. Por isso, pedimos licença aos leitores, mas fazemos absoluta questão de encerrar esta apresentação com um depoimento pessoal: Linguística no [Ensino Básico] e resolução de problemas foi e continuará sendo possível nas salas de aula do CEFET-MG. Desde que, em meados de 2018/2019, tivemos a oportunidade de conhecer o trabalho da equipe à frente da OBL, nossa práxis no Ensino Médio entrelaça Linguística e questões autossuficientes. Esse primeiro e frutífero encontro fomentou a participação de estudantes do CEFET-MG na Olimpíada de Linguística, na Escola de Outono e gerou medalhas olímpicas para os nossos alunos. Entendemos, assim, que precisávamos divulgar para outros professores, além CEFET-MG, o que é a OBL, quem a faz e como ela é, com afinco, idealizada e realizada. Assim, o “flerte” de 2018/2019 com a Olimpíada e a sua Escola de Outono, realizada na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), deu origem ao nosso Linguística: o que 10 A P R E S E N T A Ç Ã O é e como se faz?, evento de extensão e de divulgação científica que tem como um de seus vários objetivos a apresentação da OBL, dos problemas autossuficientes e da divulgação da Linguística como campo de pesquisa interdisciplinar para docentes, alunos e público em geral. Assim como fizemos nesta Apresentação, convidamos cada leitor a produzir também um breve depoimento, com os resultados da aplicação dos problemas autossuficientes de Linguística em suas salas de aula. Compartilhem essas experiências conosco! Essa interlocução será de grande valia para refletirmos sobre o trabalho com línguas materna e adicional e, ao mesmo tempo, para trocarmos “figurinhas” a respeito da nossa indagação inicial: Linguística [no Ensino Básico] e Resolução de Problemas: Como é Possível? Boa leitura! 11 A P R E S E N T A Ç Ã O OS PROBLEMAS AUTOSSUFICIENTES E A EXPERIÊNCIA DOS ALUNOS DE ENSINO BÁSICO Os problemas autossuficientes de linguística são um universo de infinitas possibilidades para nós, estudantes do Ensino Básico. Aprendemos, ao resolvermos os problemas, diversas palavras e informações sobre uma língua e uma cultura. Essa atividade promovida pela Olimpíada Brasileira de Linguística (OBL) nos permite desenvolver a intuiçãolinguística, o raciocínio lógico, autonomia e cultiva em nós um sentimento de detentores do conhecimento. Para nós, estudantes, após a utilização dos problemas de linguística da olimpíada na escola, as aulas de línguas se tornaram muito mais atrativas, lúdicas, curiosas, significativas, fascinantes e transformadoras. Compreendemos que a linguagem (e a linguística) está em todos os lugares, é um elemento vivo, complexo e muito importante para os aspectos biológicos, culturais e sociais das nossas vidas. Recomendamos a presente obra por acreditar que resolver problemas de Linguística pode contribuir muito para que mais estudantes descubram essa Ciência, as possibilidades e as oportunidades que ela pode oferecer. A linguística tem transformado a vida de diversos alunos no Brasil e nós pudemos vivenciar isso de perto. Esperamos que mais pessoas possam ter experiências tão significativas como as nossas e serem impactadas pelo contato com a área. Dalmo Buzato1 Elias Victor2 1 CEFET-MG/CNPq 2 CEFET-MG I n t r o d u ç ã o a o s P r o b l e m a s d e L i n g u í s t i c a P A R T E 1 Autores Artur Corrêa Souza Bruno L'Astorina Cynthia Lacroix Herkenhoff Eduardo Cardoso Martins Rodrigo Pinto Tiradentes 13 A Olimpíada Brasileira de Linguística (OBL) é um projeto educacional que acontece desde 2011 para estudantes de escolas públicas e privadas de todo o Brasil. A cada ano, recebe uma ênfase e um nome diferente, que procura refletir a tônica daquela edição particular. Inserida na tradição de olimpíadas de linguística que começou na Rússia dos anos 1960, ela promove, dentre outros objetivos, o interesse pela linguística e por outras ciências sem demandar conhecimentos prévios. Atualmente, a OBL possui três categorias: Mirim (para estudantes do 5° ao 8° ano do Ensino Fundamental), Regular (para estudantes do 9° ano do Ensino Fundamental ao 3° ano do Ensino Médio) e Aberta (para o público em geral). A olimpíada acontece em quatro fases . Concorrentes das categorias Mirim e Aberta participam apenas das duas primeiras fases1. • Fase 1, online (Agosto/Setembro), que pode ser realizada em qualquer computador, tablet ou celular, através do aplicativo da OBL; • Fase 2, em papel (Outubro/Novembro), que é realizada em mais de 40 polos em todos os estados, em universidades ou escolas parceiras da olimpíada; • Fase 3, Escola de Linguística de Outono (de Março a Maio), que reúne cerca de 60 dos estudantes mais bem colocados para três meses intensivos de encontros virtuais e uma semana presencial, com palestras, oficinas e atividades olímpicas (escrita de artigo enciclopédico, projeto de pesquisa, resolução de problemas, e sessões de debates); 1 Mais detalhes sobre as fases e os processos podem ser encontrados em www.obling.org. INTRODUÇÃO AOS PROBLEMAS DE LINGUÍSTICA I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A 14 I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A • Fase 4, Olimpíada Internacional de Linguística (Julho), que congrega delegações de 30-40 países, cada ano em um dos países-membros. Como em todas as olimpíadas de conhecimento, na OBL ocorre um processo de afunilamento do número de participantes, em que as etapas significam diferentes níveis de aprofundamento: a degustação da linguística em um primeiro contato com problemas na fase 1, os problemas clássicos na fase 2, o percurso formativo intensivo na fase 3 e o fórum internacional na fase 4. Os níveis são pensados para os diferentes graus de interesse pelos temas linguísticos. Mais do que eventos pontuais, a OBL é pensada como um processo de formação contínua, em que as etapas são marcos de estímulo, proficiência e autossuperação, que ajudam os participantes a desenvolverem gradativamente suas habilidades. Além disso, o papel formativo do processo olímpico não se restringe aos estudantes, pois ajuda os professores, as comunidades escolares e a sociedade a caminharem juntos em certas direções, que ficarão mais claras ao longo das próximas seções. Mas como, exatamente, isso pode ser feito? Se por um lado a própria ciência da linguagem tem uma vocação transdisciplinar, por reunir as habilidades analíticas ligadas à matemática, o tratamento investigativo das ciências naturais, e as consciências históricas, sociais e culturais próprias das ciências humanas, por outro lado, a abordagem via problemas cria um contexto educacional peculiar, que põe em primeiro plano a autonomia e o protagonismo dos estudantes, tornando o aprendizado, ao mesmo tempo, mais lúdico e mais significativo. Os problemas autossuficientes de linguística, como um gênero específico, evidenciam esses elementos e promovem o contato dos estudantes com as línguas (a sua e as demais), a comunicação, a cognição e as culturas. Por essas razões, produzimos este material, especialmente 15 I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A dedicado aos professores de língua materna ou adicional, que gostariam de utilizar os problemas de linguística como um dos instrumentos de seu fazer pedagógico. Esperamos que as discussões contidas aqui possam enriquecer seu trabalho cotidiano, dentro e fora da sala de aula. Naturalmente, adaptações precisam ser feitas para os diferentes contextos – sempre lembrando que o desafio faz parte da abordagem por problemas. Desejamos que este material possa ser de benefício a muitos estudantes e, por meio deles, à nossa sociedade, às diversas línguas e às diversas formas de vida. M ot ivação C A P Í T U L O 1 I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A 17 1 . M O T I V A Ç Ã O Por que linguística? A linguística é muito mais do que o estudo de português ou de outra língua específica. A chamada ciência da linguagem poderia ser melhor descrita como uma confederação de ciências, porque ela utiliza uma diversidade de abordagens e métodos para tratar temas tão diversos como, por exemplo, a relação entre linguagem e mente, os aspectos físicos da fala, o processamento das línguas humanas em sistemas computacionais e inteligências artificiais, os efeitos de sentido dos textos, as diferentes variantes geográficas/etárias/ sociais da língua, a investigação dos discursos públicos e privados, os papéis e as relações políticas entre as línguas, suas transformações no tempo e no contato com outros idiomas, suas relações com a história e cultura dos povos, entre outros temas. Diante disso, já é possível ver que a linguística tem importantes relações com todas as disciplinas escolares: do português à matemática, da biologia à computação, da história às línguas estrangeiras, da ciência experimental às expressões artísticas. Por isso mesmo, ela pode ser um instrumento importante para atravessar a compartimentalização das matérias e permitir discussões mais amplas, transdisciplinares, no ambiente educacional. Além de romper as fronteiras disciplinares, a linguística nos permite desenvolver uma série de competências, pois está relacionada a uma gama de habilidades, que incluem muito mais do que as capacidades comunicativas ou reflexivas. Não vamos aqui nos debruçar na conceitualização e classificação de todas as competências que podem ser ativadas. Limitamo- nos a mencionar que elas incluem dimensões metalinguísticas, analíticas, políticas, culturais e sociais. As habilidades linguísticas incluem não só nos comunicarmos em línguas 18 1 . M O T I V A Ç Ã O que dominamos, mas também lidar com linguagens e códigos sobre os quais sabemos pouco ou nada. Isso está ligado não apenas a capacidades conscientes e inconscientes de reconhecimento de padrões, mas também a uma “sensação” de que é possível entender, pelo menos em parte, uma troca comunicativa por meio dos contextos, de analogias e de outros aspectos. Por que problemas? O uso de problemas como exercícios da mente e como instrumento formativo remonta aos problemasgeométricos gregos e a práticas semelhantes em diferentes culturas como, por exemplo, os sangaku japoneses. O olhar moderno do uso de desafios complexos como método educacional – a aprendizagem baseada em problemas – remonta ao final do século XIX e às primeiras décadas do século XX, em pelo menos dois desenvolvimentos paralelos. Nos EUA, John Dewey incluía na sua filosofia pragmática uma visão sobre educação que se pode resumir com “learning by doing” (aprender fazendo), visão que foi sistematizada e aplicada por William Kilpatrick na formação de professores de Columbia, sob o nome de “método de projetos”. No Leste Europeu, sociedades de matemáticos e físicos da Romênia e da Hungria começaram a organizar competições de problemas de matemática para estudantes de ensino médio. Em 1934, foi fundada a Olimpíada de Matemática de Leningrado – até onde se sabe, o primeiro evento desse tipo a usar o nome ‘olimpíada’. Esse desenvolvimento de problemas e projetos como ferramenta pedagógica ocorreu paralelamente, e com muitos pontos de contato, a visões educacionais ligadas à então nascente ciência da psicologia. Essas visões enfatizavam 19 1 . M O T I V A Ç Ã O que a educação precisa levar em conta os desenvolvimentos (cognitivos, emocionais, sociais, etc.) possíveis para cada criança, em cada período do seu amadurecimento. Assim, nomes como Piaget e Vygotsky foram delineando as visões que depois ficaram conhecidas como construtivistas. No pós-segunda guerra, outros movimentos educacionais importantes surgiram: a visão de desescolarização do filósofo croata Ivan Illich, a educação democrática de Summerhill, os vários movimentos decoloniais, a obra singular de Paulo Freire no Brasil, entre muitos outros. Um ponto comum entre todas essas visões é a ideia de que qualquer projeto educacional precisa estar centrado na autonomia dos sujeitos, nas suas diferenças, no fato de que as pessoas aprendem, essencialmente, aquilo que lhes interessa. Em outras palavras, a educação pressupõe protagonismo (mas não liderança), individualidade (mas não individualismo), autonomia (mas não ausência do professor) e criatividade (mas não abandono do que é aprendido). É nessa constelação de pedagogias e práticas que se insere a concepção baseada em problemas. Mas o que isso significa exatamente? No ensino tradicional, estamos acostumados à ideia de que um exercício é apenas a prática ou aplicação de uma teoria apresentada previamente. Assim, os materiais didáticos são constituídos de blocos de explicações e, na sequência, blocos de “aplicação” do conhecimento apreendido. A motivação para a resolução de uma atividade vem da memorização ou da execução das “fórmulas” corretas, geralmente ligadas ao comando da autoridade que “mandou” fazer, ou da escola que “premia” e “pune” por meio das notas, ou mesmo na perspectiva de uma aplicação futura, como o vestibular. A aprendizagem baseada em problemas reverte essa lógica. Para entender melhor, podemos fundamentá-la em três elementos. 20 1 . M O T I V A Ç Ã O Encantamento. O aprendizado, em qualquer olimpíada, não começa por um detalhamento teórico, mas pelo encantamento no desafio posto por uma situação nova, enigmática, de conclusão desconhecida. Um problema não é apenas um dispositivo de divulgação de um conhecimento pré-existente (embora possa fazer este papel) e também não é um item de treinamento técnico para aprender um tipo de operação (embora possa contribuir para isso), mas é, sobretudo, uma instância de abertura de visão. A partir do problema, o estudante vê algo de um jeito que nunca tinha visto antes. Autonomia. A partir do problema, o estudante entra em uma jornada autodirigida, elencando habilidades, ferramentas, teorias ou materiais que ele considere úteis para solucionar o desafio. Isso inclui não apenas uma postura ativa na busca de conhecimentos, mas o manejo de suas próprias competências cognitivas (raciocínio dedutivo e indutivo, inferências, implicações, entre outras), metacognitivas (avaliação, definição de estratégias e abordagens, etc.) e socioemocionais (autoestima, curiosidade, iniciativa, cooperação, resiliência, etc.). Em uma palavra: autonomia. A autonomia não está ligada apenas à utilidade do que se aprende, mas também ao prazer. Isso diz respeito ao que o psicólogo húngaro-americano Mihály Csíkszentmihályi (famoso pela sua Teoria do Fluxo) chama de experiência autotélica, quando o prazer que acompanha o aprender vem de dentro do indivíduo e se basta em si mesmo. Em termos neurológicos, essa sensação de conforto advinda do conhecimento como um fim em si é benéfica em um sentido amplo, uma vez que envolve a ativação de recursos da atenção no córtex pré-frontal e um maior engajamento dos circuitos envolvidos na potenciação sináptica, ou seja, um estado mental altamente focado. 21 1 . M O T I V A Ç Ã O Em um processo de aprendizagem baseado em autonomia, o papel do professor não é o de uma fonte de conhecimentos, hoje facilmente disponíveis. Em vez disso, o docente é um facilitador e um coaprendiz. Ele não conhece todas as trilhas, mas seus anos de treinamento e de experiências o tornaram um trilheiro mais maduro, que pode estimular e ajudar os mais jovens a desenvolverem seus próprios caminhos de autonomia. Relações. Muitas vezes, as olimpíadas ou outros eventos baseados em problemas podem ser vistos como competitivos e individualistas, e portanto são rejeitados por educadores sensíveis a essas características, já desequilibradamente excessivas em nossa sociedade. A estes, convidamos a olhar novamente. A valorização da individualidade, nesse contexto, se contrapõe à massificação: cada pessoa se interessa por assuntos diferentes que, no seu processo de formação inerentemente individual, se desvelam em caminhos diversos. Que o florescimento de cada um comece na sua singularidade não significa que ele deve permanecer nela. Os sujeitos, afinal, não deveriam ser vistos de forma compartimentada, mas em constante interação e em comunidade. Um indivíduo solitário, sem uma ampla rede de trocas e apoios, não é sustentável. De fato, podemos dizer que todas as visões educacionais centradas em autonomia surgiram aninhadas em perspectivas de emancipação social – não focada em produzir um conjunto de “líderes” ou elites intelectuais, mas uma rede de agentes capazes de transformar suas comunidades a partir de suas melhores qualidades. A valorização da autonomia, desta forma, fortalece coletividades ativas e diversas. Para descrever esse processo, mais adequada do que competição é a palavra jogo: quando eu jogo futebol, videogame ou xadrez com um amigo, meu objetivo principal não é superá- lo, mas me divertir com ele. Quando resolvo um problema 22 1 . M O T I V A Ç Ã O individual, eu me divirto primeiro comigo, superando aquilo que eu achava impossível para mim, mas também com aqueles que eu vejo como meus pares, compartilhando experiências sobre o processo. É dessa forma que a competição pode alimentar ambientes lúdicos e cooperativos em que o desafio e a excelência humana são celebrados. De fato, desde seu início, os jogos olímpicos modernos evocam a noção grega de areté, ligada às noções de excelência e virtude, lida a partir de ideais pacifistas e de fraternidade universal do final do século XIX. Hoje, noções como fair play seguem sustentando um horizonte de ludicidade e celebração coletiva para os jogos esportivos. Esses valores podem ser transferidos de forma mais ou menos direta também para as olimpíadas de conhecimento. É claro que os contextos reais são sempre mais complexos dos que os ideais desejados, e formas excessivas de competitividade aparecem em todas as partes da nossa sociedade. Ainda assim, mesmo em ambientes escolares que estimulam a competição, os nichos olímpicos tendem a ser menos competitivos e mais lúdicos que seu entorno, porque são fundados numa fraternidade presente, embora tácita,e numa valorização mútua das autonomias. Esse tipo de ambiente e de relações, muitas vezes apontado pelo termo “cultura olímpica”, tem sido percebido em diferentes escolas e olimpíadas e conformou experiências como à própria OBL, referindo-se a um tipo de experiência que é, fundamentalmente, compreendida por quem a vivencia. 23 1 . M O T I V A Ç Ã O Por que problemas de linguística? A noção de problemas autossuficientes de linguística remonta à Moscou dos anos 1960, principalmente aos linguistas Alfred Jurinski e Andrei Zalizniak2. A visão deles era a de criar desafios, puzzles, enigmas que, para serem resolvidos, não exigiriam o domínio de nenhuma língua específica (além daquela já falada por quem o resolve) nem de teorias particulares. Assim, para resolver um problema deste gênero, o estudante precisa contar apenas com seu raciocínio, sua intuição linguística e seu conhecimento de mundo. Mas através dos problemas, novas habilidades, teorias e línguas são eventualmente aprendidas e desenvolvidas. Em outras palavras, um problema não avalia um conhecimento previamente adquirido, mas incentiva a exploração de novos conhecimentos e o desenvolvimento de novas habilidades. Em um problema linguístico, o estudante se depara com dados (palavras, frases, textos) selecionados pelo seu compositor, que evidenciam um ou mais fenômenos de uma ou mais línguas – ambos tipicamente desconhecidos pelo estudante. Com isso, sua tarefa é identificar os fenômenos e aplicá-los à leitura e à produção de outras palavras, frases e textos. Depois de resolver o problema, tendo entendido organicamente o fenômeno, é possível que os estudantes se interessem em expandir o seu conhecimento do fenômeno: sua denominação, os modelos teóricos associados a ele, outras línguas em que ele aparece, outros fenômenos similares, ou o que mais o engajamento e o interesse lhes permitirem. 2 Publicamos, no blog de linguística da Unicamp, dois artigos de divulgação contando um pouco essa história: um introdutório (https://www.blogs.uni- camp.br/linguistica/2017/09/16/olimpiada-de-linguistica/) e outro focado na vida e na obra de Andrei Zalizniak, falecido em 2018 (https://www.blogs. unicamp.br/linguistica/2018/01/11/andrei-zalizniak-e-os-problemas-de-lin guistica/).” 24 1 . M O T I V A Ç Ã O Para ficar mais claro, vamos dar um exemplo3: segue o nome de cinco países da América do Sul em georgiano, com a tradução de três deles para o português. Quais são os outros dois países? Naturalmente, não é necessário saber georgiano nem conhecer o alfabeto mkhedruli para resolver o problema; pelo contrário, sabendo isso, o desafio perde a graça. Mas no processo de resolvê-lo, vamos ver como intuição linguística, raciocínio e conhecimento de mundo se misturam. Diante de um problema, formulamos diversas perguntas. Algumas delas têm a ver com conhecimento de mundo. O estudante carrega consigo informações sobre cultura, sociedade, geografia, história do seu povo e de outros povos. Neste problema, por exemplo, o que eu posso imaginar sobre a Geórgia e sobre como eles nomeiam os países? Talvez seja razoável pensar que países culturalmente ligados à Geórgia possam receber nomes diferentes, como acontece com o nome da Alemanha em diferentes línguas europeias: Germany, Allemagne, Tyskland, Niemcy, etc. Por outro lado, com países da América Latina, distantes culturalmente da Geórgia, é provável que os nomes não sejam muito diferentes de suas contrapartes em português ou espanhol. ბრაზილია პერუ ურუგვაი არგენტინა კოლუმბია Brasil Peru Uruguai ? ? 3 Problema composto por Bruno L’Astorina e utilizado na Olimpíada Brasi- leira de Linguística, edição Ñanduti, primeira fase.” 25 1 . M O T I V A Ç Ã O Junto a isso, é importante também a intuição linguística e seu conhecimento metalinguístico. Mesmo para a resolução de um problema simples como o do exemplo, muitas escolhas são necessárias, implícita ou explicitamente: o alfabeto georgiano é escrito da esquerda para a direita, como o alfabeto latino, ou da direita para a esquerda, como a escrita árabe e hebraica? Os símbolos representam fonemas, sílabas, palavras, conceitos? Os sons são os mesmos do português? Caso não sejam, como podem variar? Da mesma forma, em outros problemas, pode ser importante pensar como segmentar palavras, ou identificar possíveis funções, flexões, variações desses morfemas ou de palavras. Todas essas perguntas dizem respeito a categorias linguísticas, sejam elas conhecidas explicitamente ou não. Assim, o conhecimento metalinguístico pode ajudar, mas é sobretudo a intuição linguística do participante que vai orientá-lo a decidir o que pode fazer sentido em uma língua nova ou não. Nesse aspecto, o uso de uma língua desconhecida é interessante, porque cria um jogo entre o que a pessoa acha possível e o que ela permite que a surpreenda em uma língua diferente. A intuição linguística e o conhecimento de mundo operam juntos na concepção e na seleção das hipóteses, axiomas e pressupostos. A partir daí, é preciso testá-los, organizar os dados, mapear os diversos detalhes. Nesse ponto são fundamentais as habilidades cognitivas e metacognitivas que são, às vezes, designadas como raciocínio. No nosso 26 1 . M O T I V A Ç Ã O ე უ ა ი e u პ რ გ ვ p r g u* a i exemplo, podemos notar que as formas escritas de “Peru” e “Uruguai” possuem a mesma quantidade de símbolos em português e em georgiano, o que reforça algumas hipóteses mencionadas. Além disso, no terceiro nome, o primeiro e o terceiro símbolos são iguais e provavelmente correspondem ao U de “Uruguai” – o que significa que georgiano se escreve da esquerda para a direita. Com isso, conseguimos fazer a relação entre letras para esses dois países: A última letra da coluna da direita, correspondente ao terceiro “u” de “Uruguai”, é diferente das demais. Mesmo em português, embora esses dois sons sejam representados pela mesma letra, eles não são exatamente iguais: um deles é uma vogal plena, enquanto o outro é chamado de semi-vogal. Assim, é de se esperar que em outros sistemas de escrita, esses sons possam ser representados por símbolos diferentes (na verdade, no alfabeto georgiano, ვ corresponde a v). Já o nome “Brasil” possui mais letras em georgiano. Se marcarmos as letras que já conhecemos, encontramos [_ r a _ i _ i a], o que provavelmente corresponde a “Brazilia”. Com tudo isso, enfim, podemos transcrever o quarto e o quinto nomes como [a r g e _ _ i _ a] e [_ _ l u _ b i a]. Pensando nos países existentes na América do Sul, fica fácil concluir que eles só podem ser Argentina e Colômbia (Columbia). Todo problema precisa poder ser resolvido e isso impõe uma estrutura lógica ao mesmo. O enunciado e os dados pre- 27 1 . M O T I V A Ç Ã O cisam ser selecionados de forma que os fenômenos possam ser deduzidos com clareza e sem ambiguidades. Claro, essa apre- sentação não pode ser fácil demais de forma que o problema não tenha graça, nem difícil demais de forma que ele seja im- penetrável. A composição de um problema exige delicadeza. De toda forma, é a estruturação lógica do problema que o diferencia de uma mera adivinhação ou de uma aplicação de conhecimentos prévios. Ao comparar dados, testar hipóteses, reconhecer padrões, o resolvedor busca um insight, o “clique” de que algo foi desvendado, de que as coisas fizeram sentido. Por fim, após a resolução do problema, várias portas são abertas. É possível notar, por exemplo, que o sistema de es- crita georgiano é um alfabeto, como o nosso – possuindo entretanto algumas diferenças relevantes, como não distin- guir entre maiúsculas e minúsculas, ou diferenças entre as representações dos sons. Através dele, é possível refletir sobre vários elementos do nosso próprio alfabeto. Por exemplo, ele permite lembrar que a correspondência entre sons e le- tras nunca é perfeita: há letras que representam mais de um fone (x em fixo, faixa e êxodo), fones que são representadospor letras diferentes (como [s] em cinto, sino e osso), fones re- presentados por duas letras (os dígrafos), e até letras que não representam fone nenhum (como h no início das palavras). Essa correspondência ainda se torna mais complexa quando lembramos dos fenômenos de variação e mudança linguísti- ca, que fazem uma palavra como mesmo ser pronunciada de diversas formas (mezmo, meʒmo, mermo, memo). Por uma via histórica, podemos ressaltar que o alfabeto georgiano tem 4 O canal de linguística no YouTube NativLang tem uma boa série exploran- do esse tema, chamada Toth’s Pill: an animated history of writing. Os vídeos são narrados em inglês, porém a compilação possui legendas em português. https://www.youtube.com/watch?v=PdO3IP0Pro8 28 1 . M O T I V A Ç Ã O origem comum ao alfabeto latino, grego, árabe, etc. no siste- ma de escrita fenício. Assim, é possível explorar a história da tecnologia escrita na humanidade4. Por uma via comparativa, é possível explorar as características dos diferentes sistemas de escrita que não são alfabéticos: os silabários, abugidas, abjads, logogramas etc. É possível discutir, enfim, o que faz uma lín- gua adotar um sistema de escrita: porque sérvio é escrito em cirílico e croata em latino? Por que farsi é escrito com a escrita árabe, mas osseta é escrito em cirílico e armeno tem um alfa- beto próprio? Pode-se também explorar os aspectos históricos, geográ- ficos e culturais da Geórgia. Embora pequeno, o país é berço de figuras históricas importantes, como o líder político Josef Stalin, o escritor Maxim Gorky ou o músico Aram Kacha- turian. Usando um mapa, é possível contextualizar os países do Cáucaso nas relações internacionais entre União Soviéti- ca/Rússia, Turquia e Irã. Aqui aparecem temas políticos im- portantes como o genocídio armênio pelo Império Otoma- no ou as guerras de independência pós-soviéticas (Abkhazia, Ossétia, Chechênia, etc.). Em uma chave religiosa, é possível avaliar as raízes do cristianismo georgiano e armênio, muito antigo e não alinhado com a Igreja Romana nem com a Igreja Ortodoxa. Até mesmo uma aula de dança permite uma cone- xão, usando vídeos de música e dança georgiana, como os da companhia de balé სუხიშვილი (Sukhishvili). Enfim, o co- nhecimento pode ser expandido em muitas direções. Com o p r oblemas pod e m cont ribuir para o ensino d e línguas C A P Í T U L O 2 I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A 30 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S O exemplo no final do capítulo anterior mostra uma dupla função do problema: como um momento de aprendizado por si só e como ponto de partida para outros possíveis desenvolvimentos. O primeiro ponto não deve ser menosprezado. Como mencionamos, textos do gênero “problema de linguística” produzem ganhos diversos em termos de habilidades cognitivas, metacognitivas e emocionais. Então, trazer tais desafios para a sala de aula, através da participação dos estudantes na olimpíada ou da resolução dos problemas em sala (mesmo sem estarem conectados a nenhuma outra atividade), já seria benéfico. É fundamental que esse lugar de geração de encantamento e autonomia não seja negligenciado. Dito isso, é importante salientar que os problemas também podem gerar motivação e disposição investigativa na direção dos elementos que os professores trabalham em suas aulas. Isso diz respeito a como a olimpíada e os problemas, para além de sua presença pontual, podem contribuir para o processo continuado, do dia a dia, da sala de aula. Em outras palavras, diz respeito a como os problemas podem ser usados como instrumentos pedagógicos contextualizados na abordagem pedagógica geral. Como vimos no exemplo, as possibilidades são quase inesgotáveis. No entanto, para fins discursivos, dividimos as contribuições possíveis em cinco frentes principais: (i) os estudos sobre diversidade linguística e cultural; (ii) o estudo ressignificado de teoria gramatical explícita na língua materna 31 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S (português); (iii) a aprendizagem de língua adicional5; (iv) o contato com a investigação em linguística; e (v) a interação com outras disciplinas e com os temas relevantes para o mundo contemporâneo. Diversidade linguística e cultural As três Américas, e o Brasil em particular, vivem uma situação linguística paradoxal. Elas abrigam uma enorme variedade de línguas ainda vivas, da ordem de centenas ou mesmo de milhares, mas a maioria de sua população é monolíngue em um de quatro idiomas dos colonizadores europeus: espanhol, português, inglês ou francês. Isso tem implicações sociais diversas para os falantes de línguas minoritárias – em sua maioria membros dos povos indígenas que ainda resistiram aos últimos séculos de colonização e escravização – que são mal vistos, mal compreendidos e têm um acesso precário aos direitos garantidos pelo Estado. Especialmente nesses casos, os direitos linguísticos estão fundamentalmente unidos aos direitos humanos em geral. 5 Utilizamos aqui a nomenclatura com que tradicionalmente são referidos, de um lado, o ensino de português, de outro, o ensino de inglês, espanhol e outras línguas nacionais, em que pese as diferentes nomenclaturas utilizadas para as línguas adicionais: “língua estrangeira”, “segunda língua”, “L2”, entre outros. É importante não perder de vista que a dinâmica do que seja língua materna e língua adicional se altera significativamente nas diferentes reali- dades escolares brasileiras, por exemplo nas escolas voltadas para indígenas, descendentes de imigrantes ou pessoas surdas, e consideramos que as contri- buições posteriormente enunciadas se aplicam para todos os casos. Contudo, é fundamental informar que as atividades da OBL são direcionadas a um pú- blico falante de português brasileiro e que muitas considerações sobre “língua materna” feitas a partir desse momento tratarão, sobretudo, dessa variedade do português. 32 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S Um grande passo para mudar essa situação é aumentar a conscientização e o contato da população brasileira com outras línguas, existentes aqui ou em outras partes do mundo, para que travem contato com realidades plurilíngues. Através de problemas de linguística, os estudantes conhecem línguas de todos os continentes – em sua maior parte, línguas minoritárias e minorizadas, muitas vezes restringidas em sua atuação política, econômica e social. Em particular, os problemas oferecidos na OBL tendem a dar um enfoque especial às línguas indígenas brasileiras, à Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e às línguas africanas que têm ou tiveram mais contato com o português, através dos negros escravizados trazidos ao Brasil ou através dos países africanos de língua portuguesa. Essa ênfase pode ser percebida também nos sobrenomes de cada edição, que usualmente são palavras tiradas de línguas que têm contato próximo com o português. Desse modo, a própria resolução do problema já instiga o interesse pelas línguas retratadas – interesse que pode ser conduzido a atividades de ampliação do reconhecimento da diversidade humana e de expansão do conhecimento sobre condições históricas, culturais e sociais diversas das nossas. Por exemplo, um problema que mostre uma língua indígena amazônica pode ser usado para se explorar a diversidade de línguas e de famílias linguísticas que compartilham o espaço da Amazônia, bem como suas relações com línguas indígenas presentes em outros países ou em outras regiões do Brasil. Além disso, é possível explorar mais detidamente o contexto cultural dos falantes daquela língua, suas visões de mundo, suas manifestações artísticas, livros e filmes compostos por seus membros, etc. Já um problema baseado em uma línguaafricana permite investigar, por exemplo, as condições 33 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S históricas sob as quais seus habitantes foram trazidos ao Brasil, as relações dos falantes de português dentro do universo da lusofonia, ou as diversas características históricas, linguísticas e políticas do continente africano. Em ambos os casos, é possível discutir sobre as implicações políticas e identitárias que as línguas promovem, suas atuações no mundo globalizado, a legitimidade social e institucional desses idiomas, as diferentes políticas de valorização, preservação e reconstituição de línguas minoritárias e minorizadas, entre outros temas. Todos esses tópicos transbordam o interesse específico das aulas de línguas e exibem interesses óbvios para as aulas de história, geografia, sociologia, entre outras. Adicionalmente, se as aulas de línguas têm como um de seus objetivos combater o preconceito linguístico, que se manifesta também em relação a língua do outro, então faz parte de seu currículo o ensino da interação entre língua e sociedade, da realidade social e linguística do país, de aspectos de política linguística. Enfim, o ensino sobre o respeito para com a diversidade linguística. Assim, o tema da diversidade contribui diretamente para a formação democrática e cidadã dos estudantes – objetivo do qual nenhuma escola e nenhuma disciplina deveria se eximir. Ressignif icação da aprendizagem de gramática O caráter investigativo dos problemas de linguística nos permite reconectar a sala de aula com o ensino de gramática, por um viés diferente daquele que é tradicionalmente utilizado. De fato, desde os anos 1980, existe um consenso entre os linguistas de que o ensino de português como língua materna não deve ser fundamentado na memorização de conteúdos gramaticais, nem na proposição de atividades mecânicas 34 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S de identificação, nem na classificação de elementos e nem na atenção privilegiada à norma padrão. Hoje temos como bem estabelecido que essas abordagens não contribuem para o desenvolvimento da competência comunicativa, não estimulam o pensamento crítico e sequer são eficientes quanto ao objetivo de ensinar um dado conteúdo – que, por não ser significativo, logo é esquecido. Em termos teóricos, uma dificuldade do modelo acima é que ele ensina gramática como algo externo, um conjunto de regras que o falante deveria aprender (o foco prescritivo). Opostamente, é consenso entre os linguistas que todos os falantes de uma língua já entendem (implicitamente) a gramática dessa língua – sem isso, eles não conseguiriam formular frases nem se comunicar. De fato, a gramática é mais bem entendida como uma série de estruturas cognitivas que permitem que a língua seja usada, independentemente da escolarização. Nesse sentido, os livros de gramática não deveriam ser conjuntos de regras, mas descrições e reflexões sobre como a gramática efetivamente se manifesta, seja na comunicação ou na mente dos falantes. Assim, não faz sentido gastar tempo na escola ensinando algo que os estudantes já sabem e já usam. O que eles não dominam é o conjunto total de possibilidades de uso dessas estruturas em textos reais. Isso tem levado a uma mudança de foco na sala de aula, passando a enfatizar mais concretamente a competência comunicativa. O que a escola deveria fazer, então, é expor os estudantes a uma grande quantidade e variedade de textos, para ampliar e diversificar seu leque de possibilidades. Essa ampliação acontece em pelo menos dois sentidos: por um lado, ao investigar diferentes gêneros textuais, os estudantes podem entrar em contato com diferentes estratégias linguísticas, relacionadas a objetivos comunicativos, efeitos de sentido ou orientações 35 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S argumentativas específicas, dentre outros fatores. Por outro lado, o estudante pode ser exposto a variantes linguísticas com que ele tenha menos contato, percebendo como falantes em diferentes circunstâncias sociais, geográficas, culturais etc. têm preferências distintas de vocabulário, de estruturas gramaticais e de realizações sonoras. De fato, o tema da variação linguística não deveria ser um tópico a mais na lista de temas da aula de português, mas uma perspectiva que permeia todos os temas, um fenômeno que ocorre em todas as áreas da gramática. Com tudo isso, a partir da análise de textos já existentes e da produção de novos textos, o estudante pode adquirir domínio, explícito ou implícito, sobre as estruturas necessárias para uma performance comunicativa fluente, flexível e adequada aos diferentes contextos sociais. A importância e relevância da abordagem comunicativa pode ser considerada tópico consensual hoje. Mais recentemente, contudo, alguns pesquisadores têm se concentrado em outro aspecto do ensino: o domínio da descrição explícita da língua, ou o conhecimento de teoria e descrição gramatical como metalinguagem. Evidências empíricas têm sido acumuladas no sentido de que, mesmo que certas estratégias linguísticas sejam dominadas no nível concreto, sua abstração ancora, enriquece e amplia as competências dos falantes, tanto no aspecto cognitivo quanto na comunicação. É importante ressaltar, porém, que ‘gramática como metalinguagem’ de forma nenhuma se resume ao uso de uma certa nomenclatura. Ela diz muito mais respeito a aprender a refletir sobre processos que já acontecem implicitamente, a articular suas estratégias para si mesmo. Uma discussão similar acontece no ensino de matemática e de ciências naturais: o foco necessário em problemas concretos e ancorados na intuição dos estudantes sobre o mundo natural tem como contrapartida a conceitualização e abstração 36 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S dos conceitos, que é o que permite com que os estudantes consigam, competentemente, ampliar seu repertório e aplicar com confiança seus raciocínios a uma gama maior de situações. Essa visão, que advoga pelo ‘retorno’ do ensino explícito de gramática, focado em reflexão e metalinguagem, exige também novas abordagens metodológicas. De fato, faz pouco sentido esperar que estudantes aprendam a articular e refletir sobre suas próprias operações mentais apenas ouvindo uma aula expositiva. Em vez disso, diversos autores propõem, de diferentes formas, um ensino investigativo6 de gramática. É assim que Mário Alberto Perini (2002) enfatiza o estudo de gramática como “instrumento para exercitar o raciocínio e a observação”; Luiz Carlos Travaglia (2003) elenca três estratégias para o ensino de teoria gramatical: redescobrir teorias existentes, criticar teorias existentes e formular novas teorias; Marcos Bagno (2007) estimula a coleta de dados para a pesquisa de variação linguística, mais especificamente de fenômenos variáveis; Renato Basso e Roberta de Pires de Oliveira (2012) e Roberta de Pires de Oliveira e Sandra Quarezemin (2016) propõem a “construção de gramáticas” por e com os estudantes; Eloisa Pilati (2017) advoga pela centralidade das metodologias de aprendizagem ativa através da confecção de atividades metalinguísticas de caráter lúdico; e Jane Eder Girardi (2020) sugere o trabalho de criação de línguas artificiais por e com os alunos. Essas estratégias de ensino privilegiam a análise de conjuntos de dados, a testagem de hipóteses e a participação ativa dos estudantes na construção de conhecimento e, portanto, são nitidamente convergentes com os problemas de linguística. De fato, um problema de linguística é precisamente 6 As obras citadas neste parágrafo são listadas na bibliografia, ao final do capítulo. 37 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D EM C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S um processo de investigação que exige do estudante, a partir da análise dos dados, a formulação de suas próprias categorias e, em muitos casos, a explicitação de sua análise sobre como certos fenômenos gramaticais funcionam. Mesmo os problemas que tratam de outras línguas servem a esse propósito para o ensino de português. A comparação com formulações em outros idiomas permite jogar luz nas suas próprias estratégias implícitas, levando-o a questionar, buscar respostas, investigar e raciocinar sobre diferenças e semelhanças, possibilidades e limites. Assim, com uma perspectiva investigativa e uma ludicidade própria, o problema de linguística é um instrumento potente para ajudar a ressignificar o ensino de gramática. Claro, utilizado como método de ensino, este gênero possui limites, pois nem sempre trata dos tópicos gramaticais elencados pela escola, e quando trata não necessariamente conduz a uma formalização explícita do conhecimento. Esses limites, contudo, podem ser superados e expandidos a partir de uma boa condução do professor. O processo investigativo iniciado pelo problema pode desencadear em conversas entre os estudantes, formulações conjuntas de hipóteses, outros jogos, investigações em outros textos, etc. Cabe lembrar que, para muitos dos autores citados acima, o conteúdo em si é pelo menos tão importante quanto aprender a aprender. Aprendizagem de língua adicional Os problemas de linguística também podem ser aliados do ensino de línguas adicionais, por vias similares às da aprendizagem de língua materna. De fato, nas ciências cognitivas é conhecida uma estratégia mental sofisticada chamada de bootsrapping, que parte de um conhecimento sintático ou semântico rudimentar e pouco a pouco se 38 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S aperfeiçoa, alimentando-se do próprio sistema através de um mecanismo de tentativa e erro, até atingir a proficiência. Seria o equivalente a afirmar que a L1 serve como um instrumento heurístico na aprendizagem de L2, facilitando vários processos e economizando energia cognitiva. Uma primeira colaboração dos problemas de linguística nessa direção é a promoção de motivação e confiança para aprender novas línguas. Afinal, se foi possível compreender um fenômeno de uma língua completamente desconhecida, por que não será possível aprender as línguas que estão sendo estudadas na escola? Mais além, a partir dos problemas em que os dados são dispostos em formato de texto, o estudante ganha confiança para enfrentar o desafio de ler textos em outras línguas. Por fim, pode surgir não só uma motivação, mas também uma relação de afeto com as línguas recém- descobertas, o que contribui para uma aprendizagem mais autotélica, ou seja, como finalidade e fonte de prazer para si mesma. Outro aspecto importante é a ideia de que os problemas de linguística possam despertar o estudante para aprendizagens tangenciais. Em sala de aula, se parte expressiva da classe gostar de uma determinada língua, pode ser muito positivo dar certo espaço para comentá-la ou mesmo estudá-la por outros meios (provavelmente num momento extraclasse), porque esse afeto e interesse podem ser aproveitados depois para o estudo mais teórico de gramática (da língua materna ou adicional) e de linguística. Ao se interessar por algum aspecto da cultura ou da língua, o estudante poderá estar mais predisposto e sensível a encontrar este aspecto tangencialmente em sites, jogos, livros, ou quaisquer ambientes de aprendizagem fora dos propostos diretamente pelo professor ou pela escola. Um terceiro aspecto diz respeito à aprendizagem de gramática como metalinguagem. De fato, no ensino de língua 39 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S adicional, existe um debate similar ao feito na seção anterior com relação à primeira língua. Em um primeiro momento, ficaram evidentes as limitações no ensino tradicional de inglês, espanhol, francês etc, usualmente focado na memorização de regras e na correção dos estudantes. Em um segundo momento, essa abordagem tradicional foi substituída pelas abordagens comunicativas, focadas na ideia de imersão, centradas em tarefas comunicativas sem pensamento explícito sobre a língua. Em um terceiro momento, percebeu-se que essa abordagem comunicativa, especialmente benéfica nas fases iniciais da aprendizagem, se tornava limitante em níveis mais altos de fluência. Assim, diferentes autores trouxeram de volta a importância da consciência e da atenção e o ensino explícito da língua, envolvendo também o ensino de gramática como metalinguagem. No ensino de inglês, por exemplo, em 1990, Richard Schmitt7 introduziu o conceito de noticing (consciência ou atenção), chamando atenção para o fato de que os estudantes não podem aprender uma operação gramatical sem que ela seja notada no texto – e nem sempre é possível notar todos os aspectos do funcionamento de uma outra língua sem que eles sejam pelo menos parcialmente apontados ou salientados pelo professor. Novamente, esse debate ecoa uma discussão paralela no ensino de ciências. Durante um período, enfatizou-se o ensino de ciências baseado em experimentos, de forma que as leis físicas e químicas, por exemplo, não fossem oferecidas como dados prontos, mas fossem induzidas pelos estudantes. Mais tarde, contudo, ficou clara a limitação desse método: a história da ciência acontece de forma errante, com muitas idas e vindas e constantes debates entre diferentes cientistas. É uma visão ingênua crer que os fatos 7 O artigo original se chama Awareness and second language acquisition, pu- blicado na Annual Review of Applied Linguistics 13: 206-226. 40 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S acumulados em séculos de investigação científica podem ser “redescobertos” em poucos anos de ensino formal. Assim, as saídas para esse impasse envolvem mesclar as importantes abordagens comunicativas com doses de ensino explícito, não mais em uma chave de memorização e correção, mas a partir de metodologias ativas, alicerçadas em pedagogias voltadas à autonomia. Novamente, o uso de problemas é totalmente convergente com essa conclusão. Em um problema de linguística, os mecanismos da língua não são apresentados como fatos prontos, mas precisam ser desvendados. Além disso, a seleção de dados na composição deste gênero afunila a atenção do estudante. Os mecanismos ilustrados saltam à vista pelo fato de que certos dados, e não outros, foram apresentados. Se deduzir um fenômeno complexo a partir de fragmentos aleatórios de textos é uma tarefa indutivamente ingênua, desvendar os aspectos principais de um fenômeno a partir de dados cuidadosamente selecionados não só é possível, mas é divertido e envolve um papel ativo do estudante. Claro, como qualquer outro método, os problemas de linguística não devem ser vistos como “salvadores” do ensino de línguas. A pluralidade de métodos é sempre importante e bem-vinda. Entretanto, o momento de resolução de um problema – seja abordando diretamente a língua estudada, seja abordando outras línguas que compartilhem elementos gramaticais com a primeira – tem o potencial de servir a diversos propósitos: como uma preparação para se encarar questões e textos mais complexos; como um gatilho para aprendizagens tangenciais; como uma experiência autotélica; ou ainda como uma introdução à reflexão metalinguística explícita posterior a um contato concreto com a língua. 41 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S Contato com a investigação em linguística O aspecto investigativo, ou desvendativo, do problema de linguística também serve como mecanismo de divulgaçãocientífica ou de comunicação pública da ciência. A noção de divulgar ciência remete à noção iluminista de instrução pública, que está na base dos sistemas públicos de ensino. Segundo essa concepção, para além da educação privada que acontece nos ambientes familiares e comunitários, é dever do Estado fornecer a todos os cidadãos elementos “universais” que permitam a eles se manifestarem como seres políticos e racionais. Nas palavras de Nicolas de Condorcet, o currículo público precisa incluir “o conjunto de coisas que um homem não pode ignorar”8. Seguindo essa direção, uma corrente do ensino de ciências, muitas vezes chamada de Ciência, Tecnologia e Sociedade, enfatiza que, em uma sociedade imersa em tantos aspectos nos produtos da ciência moderna, todos os membros da sociedade deveriam compreender os elementos básicos do conhecimento científico – e que essa alfabetização científica é um elemento fundamental para a participação democrática. Um outro lado desse debate são as qualidades do conhecimento científico para a formação de cada sujeito. A palavra formação remete a um conceito do século XIX que diz respeito ao desvelamento das qualidades possíveis da condição humana – um processo que transforma a si mesmo enquanto 8 apud Catherine Kintzler, Condorcet, l’ instruction publique et la naissance du citoyen. Paris: Minerve, 2015. 9 Uma discussão mais detalhada pode ser vista em Hans-Georg Gadamer, Verdad y Metodo, Salamanca: Sígueme, 2003. 42 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S acontece e, por isso, resiste aos planejamentos9. De certa forma, essa noção segue presente em como compreendemos o aprendizado, em especial o contato com conteúdos científicos, em uma gama de aspectos que vão desde um aspecto estético (presente na divulgação de ciência na forma de ficção científica), passando pelo desenvolvimento de habilidades e competências gerais (que podem ser motivadas pelo ensino de ciências, mas ultrapassam o seu escopo), até a motivação e preparação para o ingresso nas carreiras científicas. Em todos esses aspectos, tem sido enfatizado que tão importante quanto falar sobre o que os cientistas sabem é explorar como eles sabem o que sabem. É a forma como o conhecimento é construído, e não meramente seus produtos, que desenvolve uma ampla gama de habilidades e competências, que desenvolve o senso crítico e permite ao cidadão navegar pela abundância de informações sem ser presa fácil de charlatanismos e sensacionalismos, e que permite ao estudante compreender, e apreciar, o que um cientista realmente faz. Quando falamos especificamente da comunicação da ciência da linguística, alguns pormenores surgem. Por um lado, a linguística é relativamente jovem como disciplina científica e pouco presente no imaginário público – e menos ainda nos currículos escolares. Por outro lado, não faltam razões para sua introdução no ensino. Para citar algumas: i) grande parte de seus objetos de estudo são parte constitutiva do dia a dia do estudante – a linguagem humana está ativa a todo momento na vida dos indivíduos e se manifesta de diferentes formas, o que a torna um objeto íntimo de cada sujeito, propenso a ser motivo de curiosidade; ii) as descobertas da linguística são naturalmente embasamento para as aulas de línguas – seu escopo é notoriamente a principal fonte de qualificação, fundamentação para o ensino enraizado em 43 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S como a língua efetivamente se manifesta; iii) a linguística é uma ciência articulada a muitos saberes – seu lugar como uma confederação de visões, métodos e abordagens a coloca em um lugar privilegiado para o diálogo entre as disciplinas escolares; iv) a compreensão da língua e da linguagem é um conhecimento relevante política e socialmente – o objeto ‘língua’ tem um lugar central nas disputas políticas, nos processos identitários e nas configurações sociais de todos os povos humanos, tornando ainda mais destacado o papel do ensino de ciência como instância de formação cidadã e democrática. Também neste aspecto da introdução à linguagem da pesquisa científica no ambiente escolar, a abordagem por problemas se mostra profícua. Conforme já exploramos, o percurso de resolução de um problema de linguística envolve observar dados, formular hipóteses, testá-las, refutá- las ou comprová-las a partir dos dados disponíveis, articular as informações e, assim, chegar a uma conclusão. Ou seja, trata-se de uma metodologia de pesquisa breve e intuitiva, que estimula a criatividade e promove o raciocínio crítico. É importante o aluno perceber o problema como uma forma simples de investigação para que ele entenda que o conhecimento linguístico, como qualquer conhecimento, não é algo acabado, mas está sempre se desenvolvendo e que o próprio estudante, se desejar, pode seguir refinando seus métodos e instrumentos e se aprofundar no caminho da pesquisa e da investigação linguística. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, todas as áreas e abordagens da linguística podem ser apresentadas no formato de problemas. Certamente, como todo gênero textual, estes expressam mais facilmente algumas abordagens do que outras. Por exemplo, fenômenos que têm delimitações mais precisas (pouca variabilidade, menor sujeição à 44 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S subjetividade, delimitação discreta ou pouco gradativa) são mais fáceis de se utilizar, uma vez que todo problema precisa ter informações que possam ser deduzidas. Da mesma forma, fenômenos que podem ser compreendidos a partir de fragmentos menores de texto se beneficiam das limitações de tamanho do corpus de um problema típico. Ainda assim, as formas de interpretar os dados durante a resolução dos problemas, assim como as conclusões formuladas ao final da resolução, podem variar consideravelmente. Nesse aspecto, é sempre importante lembrar que instrumentos de educação ativa, via de regra, não têm o papel de treinar os estudantes em um modelo teórico específico, mas de abrir seus horizontes para diferentes possibilidades e, ao mesmo tempo, refinar seus instrumentos para investigar essas possibilidades. Diálogos transversais Por fim, é importante lembrar que o objetivo dos problemas de linguística ultrapassa a própria linguística e o ensino de línguas. Como já mencionamos, tanto os problemas, por sua natureza investigativa, quanto a linguística, por sua posição naturalmente transdisciplinar, são pivôs para a expansão em direções múltiplas. Do ponto de vista das disciplinas, os problemas de linguística podem ser úteis para professores de várias disciplinas. Por um lado, o caráter estruturado dos dados e o processo de raciocínio e investigação subjacente à resolução interessa diretamente aos professores de matemática e de ciências naturais; por outro lado, o fato de que o problema ilustra fenômenos com implicações culturais, sociais e políticas oferece solo fértil para os professores das diferentes ciências humanas. 45 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S Do ponto de vista das habilidades e competências, a resolução de problemas contribui para o desenvolvimento de diversas habilidades cognitivas, metacognitivas e emocionais, como já argumentamos anteriormente. Do ponto de vista das necessidades do mundo contemporâneo, vale a pena nos debruçarmos um pouco mais. Têm ficado cada vez mais evidentes as limitações do modelo da escola como instrução enciclopédica, disciplinarizada para a formação de profissionais, para oferta de mão-de-obra às empresas. A metáfora do indivíduo como uma engrenagem da máquina social não dá conta de um mundo de transformações rápidas e de problemas cada vez mais complexos.O paradigma da educação para o sucesso individual é inócuo diante dos enormes desafios sociais e ambientais de um planeta cada vez mais hiperconectado. A educação tem se transformado de forma acelerada e novas metáforas, ou metáforas antigas revisitadas, são necessárias – tais como a metáfora renascentista do polímata que consegue circular entre diferentes formas de compreensão do mundo e da vida, ou a do artesão que não se limita a um conjunto fixo de operações, mas tem à sua disposição uma pletora de ferramentas, cada uma contribuindo de uma maneira à forma que se quer manifestar. No meio desse processo de ressignificação, instituições locais e internacionais têm se debruçado na criação de consensos e agendas que possam tornar concretas as nossas necessidades enquanto sociedade global. Um instrumento particularmente relevante é a Agenda 2030 da ONU. Ela traz um conjunto de 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) que, juntos, constituem um horizonte de ações locais e globais para a próxima década. Se a educação serve para fornecer os insumos para os cidadãos de amanhã e apontar horizontes para o que precisa ser feito, então a Agenda 2030 46 2 . C O M O P R O B L E M A S P O D E M C O N T R I B U I R P A R A O E N S I N O D E L Í N G U A S é um instrumento muito rico para se repensar, em termos concretos, o papel das instituições de ensino. Os 17 objetivos da agenda podem ser agrupados de diferentes formas. De uma forma esquemática, podemos dizer que • objetivos como ‘erradicação da pobreza’ (ODS 1), ‘igualdade de gênero’ (ODS 5) ou ‘paz, justiça e instituições eficazes’ (ODS 17) dizem respeito às relações entre os seres humanos; • objetivos como ‘água potável e saneamento’ (ODS 6), ‘energia acessível e limpa’ (ODS 7) e ‘cidades e comunidades sustentáveis’ (ODS 11) falam sobre a relação dos seres humanos com suas ferramentas; • objetivos como ‘saúde e bem-estar’ (ODS 3), ‘consumo e produção responsáveis’ (ODS 12) e ‘vida terrestre’ (ODS 15) tratam da relação dos seres humanos com a vida e o ambiente planetário. Em todos esses aspectos, as línguas desempenham um papel central. Compreender e saber manejar a linguagem – enquanto mediadora de relações interpessoais e sociais, ferramenta de compreensão e produção de conhecimento e dimensão fundamental da condição humana – perpassa efetivamente todos os objetivos e metas. Assim, a linguística enquanto campo vivo de conhecimento e os problemas de linguística enquanto instrumento pedagógico podem ser facilmente colocados a serviço do que precisamos fazer daqui para a frente, como sociedade global inserida em uma biosfera. Com o u sar os p r ob l emas em sal a d e aula C A P Í T U L O 3 I N T R O D U Ç Ã O A O S P R O B L E M A S D E L I N G U Í S T I C A 48 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A O problema autossuficiente de linguística é um rico momento de construção de conhecimento, sendo benéfico mesmo se trabalhado individualmente. Aqui podemos recordar a máxima de que o texto não é pretexto, ou seja, ressaltar que o problema não deve ser apenas um gancho para discussões posteriores. Ao contrário, ele deve ser “saboreado” completamente, sem pressa para a resolução individual, com mínimo de auxílio para priorizar a autonomia dos estudantes, com paciência e perseverança. Ao término, é bom explicar a solução e discuti-la com os alunos, perguntando o que gostaram mais, menos, o que foi mais fácil, mais difícil, e o que acharam da língua e do estilo apresentados. Somente após a experiência completa do problema é que se devem iniciar discussões mais aprofundadas – que constituem um momento diferente, mas igualmente rico em aprendizado. Para detalhar mais este ponto, reunimos algumas dicas práticas para a transposição dos problemas de linguística do contexto olímpico para o contexto escolar. Planejamento: como inserir os problemas? Um passo importante para usar adequadamente um problema de linguística em sala de aula é saber quando e como inseri-los em um conjunto de aulas. Certamente, essas questões são muito amplas e variam conforme cada realidade escolar, mas gostaríamos de oferecer algumas considerações. Começamos com algumas aplicações que desaconselhamos. Em primeiro lugar, os problemas de linguística não devem ser usados como exercícios tradicionais de gramática. Os problemas promovem a construção autônoma de conhecimento, enquanto as atividades tradicionais demandam um conhecimento já ensinado; os problemas se abrem a vários tópicos e caminhos de aprendizagem, enquanto 49 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A os exercícios mais comuns se encerram em um tópico e em uma metodologia predefinidas pelo professor; os problemas servem à expansão do conhecimento, enquanto as tarefas escolares se prestam à verificação, reforço e memorização; os problemas são instigantes e dinâmicos, enquanto os exercícios são previsíveis e mecânicos. Entre ambos há uma diferença não só de método, mas também de fundamentação pedagógica – e isso reverbera no planejamento. Não à toa, tais exercícios costumam ser aplicados após a exposição de um dado tópico ou uma dada área da descrição gramatical, geralmente ao final de um conjunto de aulas, enquanto os problemas são mais bem aproveitados no início ou no decorrer da aprendizagem. Além disso, também não recomendamos o uso dos problemas como forma de incluir ou acrescentar conteúdos obrigatórios. Devido a já excessiva lista de conteúdos pré-estabelecidos, temas de linguística ou de línguas que não façam parte do currículo devem aparecer enquanto decorrência natural do interesse despertado no estudante. Assim, se os estudantes manifestam interesse em aprender, por exemplo, sobre mudança linguística ou simbolismo sonoro, é contraproducente montar uma aula de introdução à teoria linguística de Saussure; basta introduzir, dentro de um contexto significativo, os conceitos relevantes. Em outras palavras, em vez de fazer um planejamento de explicações não solicitadas e de aplicação indireta, é melhor utilizar o próprio problema como base para desenvolver ideias, suscitar perguntas e, a partir dele, recorrer ao conhecimento formalizado. Em vista dos pontos realçados acima, destacamos alguns usos dos problemas que aconselhamos. Boas práticas a nosso ver são incluí-los no início ou no decorrer de uma aprendizagem. 50 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A No início, eles podem servir como centros de motivação, que despertam interesse – por exemplo, como demonstrado com o problema de georgiano –, e como ponto de partida para o processo de construção de conhecimento, em que o aprendizado inicial é aprimorado com novos aprendizados posteriores – por exemplo, um problema que evidencia fenômenos sintáticos abre caminho para um estudo mais aprofundado sobre sintaxe. No decorrer, podem constituir momentos de desenvolvimento de habilidades, que contribuirão para um objetivo maior – por exemplo, desenvolver a percepção de morfemas de uma língua desconhecida contribui para o estudo da composição de palavras na língua materna ou adicional –, ou pequenos ganhos de conhecimento, que acrescentarão informações ou indagações relevantes para o estudo em curso – por exemplo, aprender sobre empréstimos linguísticos pode ajudar a compreender relações sociais, culturais e políticas entre povos. Também é possível incluir problemas no final do planejamento, mas essa ação demanda muito mais cuidado, porque estes não servirão para encerrar um processo de aprendizagem. Uma possibilidade é que se prestem à expansão de horizontes, para deixar claro que a aprendizagem escolar termina naquele momento, mas que o conhecimento é ainda mais vasto ou permanece sob investigação nas instituições de pesquisa, como universidades e laboratórios. Porém, o mais provável é que correspondama um recomeço, em que o estágio de conhecimento será avançado – por exemplo, após estudar a diversidade de povos indígenas brasileiros, um problema sobre koronia-go pode impulsionar para que se estude a diversidade de povos imigrantes no Brasil. Essas são formas mais conectadas de inserir os desafios de linguística e apresentam maior potencial para que os 51 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A estudantes assumam a centralidade do processo educacional, para que participem da definição e elaboração do roteiro de estudos. No entanto, também há formas menos conectadas ou mesmo desconectadas ao planejamento, em outras palavras, ao conjunto de aulas estruturadas para o ensino de um determinado tópico. Uma opção é inserir os problemas periodicamente (em intervalo semanal, quinzenal, mensal...); assim, reserva-se um espaço para o desenvolvimento das habilidades favorecidas pelos mesmos. Outra possibilidade é inseri-los paralelamente, realizando um trabalho à parte, em horário alternativo ao tempo de aula, o que permite dar atenção especial a um grupo de estudantes mais interessados em resolver problemas. Ainda assim, reconhecemos que muitas vezes a realidade escolar não permite que nenhuma dessas propostas seja praticada. Resta apenas a última alternativa, que é inserir o problema de forma pontual, breve e não relacionada ao planejamento. Embora não seja a melhor opção, ela surte efeito positivo e demonstra uma abertura para uma outra perspectiva educacional, voltada para a valorização da participação autônoma dos estudantes. Por fim, reiteramos que os problemas compõem uma atividade muito frutífera, que não substitui as demais práticas, mas se soma a elas. Com isso, não negamos a validade de outros instrumentos investigativos de ensino de metalinguagem, tampouco de outros tipos de atividade escolar, como o trabalho de leitura e produção de textos, o estudo de gêneros e tipologias textuais, a aprendizagem comparativa das diversas variantes linguísticas e a reflexão epilinguística sobre os efeitos de sentido. 52 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A Problema: como conduzir a resolução? O processo de resolução de um problema é, por sua natureza, um processo autônomo; mesmo assim, a presença do professor pode ter um impacto positivo em vários sentidos. Algumas dicas práticas: • Escolha um problema de nível adequado. É muito importante atentar para o conhecimento que os estudantes já têm, as habilidades cognitivas que já dominam e o quanto ainda esses fatores podem ser desenvolvidos e aprimorados. Na prática, isso repercute na escolha do problema a ser resolvido: o ideal é que não seja nem muito fácil nem muito difícil para o nível em que o aluno se encontra. Em geral, uma boa opção é seguir as fases da olimpíada, começando pelos problemas da primeira fase, demorando-se nos da segunda até chegar, após praticar bastante, aos da terceira fase nacional e os da fase internacional. Durante esse processo, cada aluno avança no seu ritmo, fazendo com que seja necessário escolher problemas diferentes para alunos diferentes, ou estimular a interação entre os mais experientes e os iniciantes. • Trabalhe com o tempo. Em geral, é importante trabalhar com prazos bem definidos, pois o tempo é um elemento importante a ser gerenciado. Claro, o tempo adequado vai depender do nível do desafio e da experiência do estudante. Às vezes vinte minutos, às vezes uma hora, às vezes um dia. Por esta razão, uma ideia interessante seria trabalhar os problemas em um horário combinado com seus estudantes, seja durante as aulas regulares ou em um horário extra. E por que não dedicar uma aula inteira a um problema e sua discussão? 53 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A • Organize o trabalho (individual ou em grupo). Todo problema pode ser resolvido individualmente, mas também em duplas, trios ou mesmo grupos maiores. Resolvê-los sozinho promove maior autonomia e autoconfiança, enquanto fazê-los em equipe tem a vantagem adicional de trabalhar relações coletivas, intercâmbio de conhecimento, divisão das tarefas ou mesmo interações socioemocionais (a capacidade de conversar com visões diferentes e de mediar o trabalho, por exemplo). É importante avaliar as habilidades de cada aluno e regular a expectativa de tempo de acordo com a modalidade. • Reforce a perseverança e a resiliência. É comum que uma parcela dos estudantes desista antes mesmo de começar a tentar, ou após terem ficado presos em algum ponto intermediário. Nesses casos, é fundamental incentivá-los a ir em frente. Perseverança e resiliência, assim como paciência, são qualidades importantes para a autonomia. A pessoa pode demorar, mas é fundamental saber que todos os problemas oferecidos podem ser resolvidos por qualquer pessoa. É preciso incentivar a confiança em si mesmo. • Incentive sem chicote ou propina. O incentivo a prosseguir não deve vir com pressão ou críticas. Também não se deve incentivar prometendo dar pontos ou prêmios. Ao contrário, deve-se proporcionar um ambiente calmo e relaxado, no qual os estudantes possam desenvolver uma estabilidade interna e uma autoconfiança que permaneçam mesmo quando o estudante esteja em ambientes tensos (por exemplo, no vestibular). O professor deve ser um encorajador dos seus estudantes, mas, para isso, desenvolver confiança é muito mais importante do que sustentar autoridade. 54 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A • Estimule um passo de cada vez. No início do processo de resolução, o caminho a ser percorrido não está claro. Nesse sentido, o processo é análogo a caminhar com uma lanterna: a cada passo, pode-se ver um pouco mais longe. Muitas vezes as pessoas se sentem desmotivadas por não conseguirem enxergar todos os passos da resolução, neste momento, é importante incentivar a confiança de que, no momento seguinte, ao dar os primeiros passos possíveis, novas ideias podem (e provavelmente vão) surgir. • Instigue a criatividade. Incentive os estudantes a serem criativos, isto é, testarem muitas hipóteses e multiplicarem as abordagens sempre que possível. Às vezes, é importante imaginar-se imerso na cultura onde aquela língua é falada; em outras vezes, é mais proveitoso imaginar como um computador lidaria com aqueles dados; em outras ainda, um tratamento mais matemático ou mais gramatical pode ser a melhor saída. De um modo geral, é bom fazer muitas tabelas, diagramas, associações, etc; lápis e papel são ferramentas que não podem ser deixadas de lado. Reorganizar as informações exige mais esforço das mãos, mas alivia muito a pressão sobre a mente. • Chame atenção para a clareza. Quando se fala em testar várias hipóteses, isso não significa todas ao mesmo tempo. Ao contrário: quando surgir uma hipótese, é importante confiar nela por um instante e testá-la cuidadosamente em todos os dados. No pior dos casos, o estudante descobrirá rápido que ela está errada, podendo passar para a próxima ideia. No melhor dos casos, ele terá avançado mais um passo. É importante ter clareza também sobre quais hipóteses já foram refutadas. Melhor começar com hipóteses mais simples, sem ter medo de ideias esquisitas. O caminho até a solução é, na maioria das vezes, tortuoso e cheio de buracos, mas as descobertas são recompensadoras. 55 3 . C O M O U S A R O S P R O B L E M A S E M S A L A D E A U L A • Sorria. Não há nada mais mortífero para a solução de um problema do que o tédio ou o sentimento de obrigação. A única maneira de o professor ajudar os estudantes a se divertirem com os desafios é se ele mesmo estiver se divertindo. Então, permita-se participar da brincadeira e aprender junto. Pós-problema: como fechar o processo? Enfatizamos o processo de abertura que acontece na resolução de um problema, mas igualmente importante é o processo de fechamento
Compartilhar