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AULA 5 FARMACOLOGIA APLICADA II Prof.ª Adriana de Oliveira Christoff A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 2 O sistema cardiovascular é composto por vários órgãos e tecidos, dentre eles o coração, os ductos fechados representados por veias e artérias, os rins e o sangue. Cada componente apresenta uma função especial e complementar para que o sistema dê conta de suas funções, as quais consistem em levar oxigênio e demais elementos até os órgão e tecidos e remover os metabólitos como o CO2, a ureia e a creatinina. O coração funciona como uma verdadeira bomba e é um órgão mecânico e elétrico. O componente mecânico é responsável pelo bombeamento do sangue, ao passo que o elétrico controla o ritmo da bomba (Golan et al., 2016). Desta forma, ambos precisam estar em harmonia. Caso o componente elétrico passe a funcionar de forma desorganizada, o que ocorre nas arritmias, os cardiomiócitos não conseguem contrair de modo sincronizado, o que acarreta comprometimento do bombeamento do sangue para os tecidos. Além disso, caso um paciente apresente disfunções renais, por exemplo a insuficiência renal, ocorrerá um acumulo do volume sanguíneo, o que provocará aumento de força e frequência cardíacas, desencadeando hipertensão arterial. Caso a composição dos elementos do sangue não esteja adequada, haverá redução da oxigenação dos tecidos e, com a mesma importância, caso o paciente apresente oclusão de vasos e artérias, como o que ocorre na trombose e na aterosclerose, ocorrerá redução na oxigenação dos tecidos. Ainda, é importante salientar que, caso essa oclusão aconteça nas coronárias, o paciente pode apresentar aterosclerose e, como consequência, angina pectoris. Desta forma, entende-se que todos os componentes do sistema cardiovascular precisam estar em bom funcionamento para garantir uma perfusão sanguínea adequada. Qualquer alteração em um dos componentes promove problemas teciduais e no próprio coração. Nesta aula, vamos tratar sobre duas doenças cardiovasculares: a hipertensão arterial e a insuficiência cardíaca. Essas patologias ocorrem com frequência na população e são consideradas graves, mas existem maneiras de manejá-las, como uso de medicamentos para controle dos sinais e sintomas e tratamentos não medicamentosos que envolvem, especialmente, a mudança no estilo de vida. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 3 TEMA 1 – HIPERTENSÃO ARTERIAL A hipertensão arterial (HA) lidera o ranking das doenças cardíacas no Brasil e em muitos países do mundo (Who, 2014). No Brasil, ela afeta 36 milhões de indivíduos adultos, dos quais 60% são idosos (SBH, 2017). Como ocorre para outras doenças crônicas e agudas, o farmacêutico deve buscar a interação direta com o paciente para aumentar o conhecimento que o paciente tem sobre a sua condição de saúde e, sobretudo, para que ele possa ter um entendimento sobre os medicamentos de que faz uso. Sabe-se que a adesão à terapia farmacológica é de extrema importância, sobretudo nas doenças crônicas, como a hipertensão arterial. Segundo Correr (2013), uma das principais causas de falta de adesão ao tratamento farmacológico está relacionada à falta de conhecimento sobre a doença e sobre os medicamentos. Desta forma, o farmacêutico deve se responsabilizar pelas necessidades dos pacientes relacionadas ao medicamento, de forma continuada, sistematizada e documentada em colaboração com o próprio paciente e com os demais profissionais da área da saúde com objetivo de alcançar resultados concretos que melhorem a qualidade de vida do paciente. Segundo a sétima diretriz da sociedade brasileira de hipertensão arterial (2017), a HA é uma condição multifatorial caracterizada pelo aumento sustentado dos níveis pressóricos, quando estes ultrapassam 140x90 mmHg. Frequentemente, seu quadro está ligado a alterações metabólicas, funcionais e estruturais de órgãos e tecidos. A HA é agravada pela presença de outros fatores de risco, como obesidade, dislipidemia, intolerância a glicose e diabetes, além de estar associada a desfechos clínicos ruins, como acidente vascular cerebral (AVC), infarto agudo do miocárdio (IAM), IC, doença arterial e doenças renais. A HA é caracterizada como doença multifatorial, e entre os fatores de risco encontram-se: idade (acima de 60 anos), sexo e etnia (mulheres e raça negra), excesso de peso e obesidade, hábitos e costumes, como ingestão de sal e álcool, sedentarismo, fatores socioeconômicos e genéticos. Estudos brasileiros que avaliaram o impacto de polimorfismos genéticos na população de quilombolas não conseguiram identificar um padrão prevalente, mas mostraram forte impacto da miscigenação, dificultando ainda mais a identificação de um padrão genético para a elevação dos níveis pressóricos (Kimura et al., 2012; Kimura et al., 2013). A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 4 1.1 Estratégias para implementação de medidas de prevenção Estratégias para prevenção do desenvolvimento da HA são extremamente relevantes, e o farmacêutico pode atuar no planejamento de políticas públicas de saúde combinadas com ações das equipes de saúde e dos meios de comunicação. Essas ações devem estimular o diagnóstico precoce, o tratamento continuado, o controle frequente da PA e dos fatores associados, por exemplo com mudanças dos hábitos e costumes, como a redução da ingestão de sal (o recomendável são 2g/dia) e do consumo de álcool e tabaco, o controle do peso e da glicemia e a prática de atividade física (DSBH, 2017). TEMA 2 – ANTI-HIPERTENSIVOS – DIURÉTICOS E FÁRMACOS QUE ATUAM NO SISTEMA NERVOSO SIMPÁTICO Para fins de tratamento, é necessário identificar se a HA é primária ou secundária e se há uma HA baseada em problemas diretos do coração, chamada de HA baseada na bomba. No caso, o débito cardíaco (DC) é aumentado, e a resistência vascular é normal. Nesse tipo de HÁ, mais frequente em pacientes jovens, é provável que haja uma desregulação do controle endócrino e neuronal da PA, e recomenda-se o uso de betabloqueadores (BB). A HA baseada na função vascular é a forma mais comum em idosos, os quais apresentam maior sensibilidade a estimulação simpática dos vasos, a fatores circulantes e a reguladores do tônus. Ainda, quando há a presença de fatores de risco, como aterosclerose ou defeitos em canais iônicos no músculo liso vascular, há um aumento na resistência vascular periférica, ou seja, o vaso encontra-se contraído. O uso de diuréticos tiazídicos é indicado nesse tipo de situação. Na HA baseada na função renal, ocorre um aumento do volume sanguíneo em decorrência de doença renovascular, doença parenquimatosa renal, lesão glomerular, dentre outras. Esses eventos podem provocar aumento na secreção de renina (Figura 1) pelas células justaglomerulares, promovendo aumento da aldosterona e retenção de sódio e água. Esses eventos fazem com que a máquina (coração) tenha que trabalhar com força e velocidade maior para dar conta do aumento da demanda. Nesse tipo de HA, há um aumento do DC e da resistência vascular periférica (RVP). A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 5 Ainda, pode haver uma disfunção do sistema neuroendócrino, como o aparecimento de respostas atípicas ao estresse e resultados anormais desencadeados pela ativação dos barorreceptores, com aumento de PA persistente (Brunton et al., 2016). Figura 1 – Sistema renina-angiotensina Crédito: joshya/Shutterstock. O número e o espectro de ação dos anti-hipertensivos disponíveis se ampliaram nas últimas décadas. Esses fármacospodem ser utilizados de forma isolada (monoterapia) ou associados, o que é mais comum nos estágios 2 e 3 da HA (veja a videoaula). Os alvos clínicos variam de um paciente para outro, mas as metas terapêuticas a serem alcançadas são as mesmas, as quais consistem em reduzir a PA para níveis normais, ou seja, na faixa de 130x80 mmHg (DSBH, 2017). É importante salientar que a HA é uma doença silenciosa, ou seja, não há sintomas clássicos. Por essa razão, são necessárias estratégias para identificar o indivíduo assintomático. Muitas vezes, o paciente assintomático pode não aderir ao tratamento, por isso as informações sobre os riscos da doença são imprescindíveis para desfechos clínicos positivos (Correr; Otuki, 2013). 2.1 Diuréticos O efeito primário dos diuréticos consiste em aumentar a excreção de sódio e, por consequência, reduzir a reabsorção de água pelos túbulos renais. Com a redução da reabsorção de água, há uma redução do volume sanguíneo, o que acarreta em menor desempenho de força e frequência cardíaca, reduzindo a HA. Os diuréticos apresentam efeito anti-hipertensivo quando usados isolados (estágio 1) e podem potencializar a ação de outros fármacos (Brunton et al., 2016). A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 6 2.1.1 Diuréticos tiazídicos Os tiazídico são amplamente utilizados na HA, sendo a hidroclorotiazida e a clortalidona as principais representantes. Apresentam farmacocinética e farmacodinâmica favoráveis no controle da HA crônica. O mecanismo de ação dessa classe, basicamente, consiste na inibição de uma proteína de cotransporte localizada no túbulo contornado distal do néfron, a qual realiza um simporte de sódio e cloreto. A entrada de cloreto na célula renal promove a ativação da bomba de NA+K+ATPase, o que gera reabsorção de sódio. Com a inibição dessa proteína de simporte, o NA+ se mantém na urina, e, por consequência, a água, também. Normalmente, o túbulo contornado distal desencadeia uma reabsorção de NA+ e água em torno de 5%. Com o uso de tiazídico, o volume urinário aumenta em torno de 5%, reduzindo o volume sanguíneo, o que provoca a redução do DC. Ainda, parece que os tiazídico desempenham uma função de vasodilatadores pela abertura de canais de K+, que promovem uma hiperpolarização das células endoteliais com redução da vasoconstrição (Brunton et al., 2016). Os tiazídico inibem a enzima anidrase carbônica, que promove a alteração do pH das células do músculo liso sustentando a abertura dos canais de K+. A hidroclorotiazida, em especial, pode promover uma redução da sensibilidade a insulina pelos tecidos, com chance de provocar hiperglicemia. Desta forma, pacientes diabéticos devem monitorar a glicemia constantemente (Golan et al., 2016). A perda de K+ na urina pode ser um problema frequente e é proporcional à dose utilizada. Muitos médicos prescrevem a hidroclorotiazida associada com inibidores da ECA (enzima conversora de angiotensina) e antagonistas dos receptores AT1 (receptores da angiotensina II) para compensar a perda de K+ e potencializar seus efeitos hipotensores. 2.1.2 Diuréticos poupadores de K+ São menos eficazes que os tiazídico, mas utilizados primariamente associados com outras classes com o objetivo de atenuar ou corrigir a excreção de K+. Dentre os representantes dessa classe, a espironactona é um dos principais. Esse fármaco atua como antagonista dos receptores MR1 e MR2 (receptores da aldosterona). A aldosterona, quando liberada pelas suprarrenais, promove aumento da reabsorção de sódio e água atuando nos receptores MR1 e A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 7 MR2, os quais resultam no aumento da transcrição de canais de sódio na membrana apical da célula renal do túbulo coletor. A espironolactona inibe esse efeito. Em relação aos seus efeitos adversos estão ginecomastia, disfunção erétil, hiperplasia prostática, efeitos que ocorrem em função do bloqueio dos receptores de androgênios (Brunton et al., 2016). A amilorida e o triantereno são outros representantes dessa classe. São inibidores competitivos dos canais de sódio na membrana apical das células epiteliais no túbulo coletor. Todos os diuréticos poupadores de potássio podem apresentar hipercalemia e redução na secreção de H+, levando a acidose metabólica. Muitas vezes, essa classe de diuréticos é prescrita para atenuar os efeitos colaterais de diuréticos com ação mais proximal, incluindo os diuréticos de alça, que serão abordados na videoaula. A discreta ação dos poupadores de K+ minimiza o risco de comprometimento cardiovascular em decorrência de uma diurese muito extensa ou rápida (Brunton et al., 2016). 2.2 Fármacos que atuam no sistema nervoso simpático Sabe-se que o SNA (sistema nervoso simpático), por meio da liberação da noradrenalina, controla de forma direta a força e a frequência cardíacas. A adrenalina, um hormônio formado a partir da noradrenalina, também exerce efeito cronotrópico e ionotrópico positivo. Esse controle exercido por ambas as substâncias é desencadeado pela ligação delas em receptores β1 (Gs) localizados no miocárdio e α1(Gq) localizados nas células endoteliais. Os efeitos resultantes dessa ligação são o aumento da força e da frequência e redução da RVP. Desta forma, o bloqueio desses receptores é uma ferramenta eficaz no controle da HA. Os betabloqueadores são um dos medicamentos mais prescritos para controle da HA, além dos antagonistas α1 e dos simpatolíticos indiretos, como a clonidina e a metildopa. 2.2.1 Beta bloqueadores Os betabloqueadores são responsáveis por redução do débito, frequência cardíaca e volume sistólico. Também há uma diminuição do tônus vasomotor com consequente redução da RVP durante o tratamento prolongado. Esse efeito pode A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 8 ser explicado por meio do bloqueio dos receptores β1 localizados nas células justaglomerulares com consequente redução da liberação da renina. O efeito principal dos betabloqueadores consiste em bloquear o receptor β1 diretamente no coração. Porém, essa classe de medicamento difere em relação a sua seletividade por receptores β, atualmente reclassificados em: • Primeira geração de betabloqueadores: são aqueles que não apresentam seletividade para os receptores β1, ou seja, são antagonistas dos receptores β1 e β2. Exemplo clássico é o propranolol, protótipo dessa classe. O receptor β2 é encontrado no músculo liso e, quando é ativado, gera relaxamento da musculatura lisa, provendo, por exemplo, broncodilatação. Desta forma, antagonistas não seletivos podem provocar broncoconstrição, o que é considerado grave em pacientes com doença respiratória como DPOC, enfisema e asma. • Segunda geração de betabloqueadores: justamente por causa dos efeitos respiratórios, foram desenvolvidos os bloqueadores seletivos, como o atenolol, o bisoprolol e o metoprolol. • Terceira geração de betabloqueadores: também chamados de bloqueadores mistos, além dos efeitos bloqueadores, possuem ação vasodilatadora. Como exemplo, o nabivolol, que é doador de NO (óxido nítrico), e o carvedilol, que é antagonista α1. 2.2.2 Alfabloqueadores Os antagonistas dos receptores α1, como a prazosina, a doxazonina e a terazosina, apresentam como efeito inicial uma redução da RVP. Na clínica, observa-se que esse efeito provoca um aumento do reflexo simpático, na frequência cardíaca e na liberação de renina. Durante a terapia prolongada, a vasodilatação persiste, mas o DC, a FC e a atividade da renina retornam ao normal. Existem evidências cientificas de que os reflexos ativados pela prazosina são menores quando comparados com o de vasodilatadores clássicos e parece haverredução da ativação do barorreceptores (Brunton et al., 2016). Os efeitos adversos dessa classe consistem em hipotensão postural e síncope. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 9 2.2.3 Simpatolíticos de ação central Os fármacos agonistas α2, como a metildopa e a clonidina, reduzem o efluxo simpático, com diminuição consequente de FC, contratilidade e tônus motor. O receptor α2 está acoplado à proteína Gi e, assim, controla a liberação de NOR pelo neurônio pós-sináptico, o que reduz a liberação de NOR. Desta forma, os agonistas desses receptores diminuem a liberação de NOR e, consequentemente, os seus efeitos. Essa classe já foi amplamente usada na clínica, mas, devido aos seus efeitos colaterais e ao surgimento de fármacos mais seguros, acabaram tendo o uso reduzido. Dos representantes dessa classe, a metildopa ainda é utilizada, especialmente no tratamento da hipertensão gestacional. A metilopa é uma pró- droga, análoga estrutural da DOPA, substância captada pelo neurônio noradrenérgico para a produção de NOR. Com o uso da metildopa, as vesículas de NOR são substituídas por metildopa. Na chegada de um potencial de ação, a metildopa é liberada e atua como agonista parcial dos receptores α e β. TEMA 3 – ANTI-HIPERTENSIVOS – FÁRMACOS QUE ATUAM NO SISTEMA RENINA-ANGIOTENSINA, BLOQUEADORES DE CANAIS DE CA++ E POTENCIALIZADORES DE CANAIS DE K+ 3.1 Sistema renina-angiotensina Esse sistema participa de modo significativo na fisiopatologia da HA e de muitas outras doenças cardiovasculares. A renina é uma enzima produzida pelas células justaglomerulares nos rins e é determinante na taxa de produção do angiotensina II. Veja a videoaula. 3.2 Bloqueadores de canal de cálcio Considerada uma das classes mais efetivas no tratamento da HA, são agentes orais que produzem uma variedade de efeitos hemodinâmicos alterando a dinâmica do cálcio no controle dos eventos elétricos e mecânicos do ciclo cardíaco e na regulação vascular. São representantes dessa classe: anlodipina, difedipina, verapamil e diltiazem. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 10 De uma maneira geral, esses fármacos podem atuar como vasodilatadores, agentes inotrópicos negativos e cronotrópico negativo. Basicamente, esses efeitos são provocados pelo fato de esses agentes inibirem os canais de cálcio sensíveis a voltagem (canais tipo L), os quais medeiam a entrada de cálcio nos cardiomiócitos e nos nodos SA e AV em resposta à despolarização elétrica. Sabe- se que a presença de cálcio deflagra o processo de contração cardíaca. Com o bloqueio desses canais, obtém-se a redução da contração. Além disso, esses fármacos podem bloquear os canais de cálcio sensíveis a voltagem, encontrados no musculo liso vascular, o que leva a vasodilatação. (Brunton et al., 2016) A forma de comprimidos de liberação prolongada é usada na clínica para manter os níveis terapêuticos, além de reduzir a taquicardia reflexa. A taquicardia reflexa é um efeito colateral de muitas classes de anti-hipertensivos. Quando o paciente passa a utilizar os bloqueadores de canais de cálcio, por exemplo, a PA tende a cair, e, com essa queda, acontece a ativação dos mediadores de controle de PA fisiológicos, como a ativação dos barorreceptores e o aumento da liberação de renina. Com isso, há uma taquicardia persistente, reflexa ao uso dos medicamentos. 3.3 Vasodilatadores O minoxidil e a hidralazina são vasodilatadores arteriais disponíveis pela via oral, mas que, na prática, são utilizados como uma das últimas opções terapêuticas. Muitos efeitos estão relacionados com esses achados, como a retenção compensatória de sódio e água que ocorre durante o seu uso. Essa retenção pode desencadear taquicardia reflexa. A prescrição de antagonistas betas e um diurético concomitante pode atenuar tais achados. Os bloqueadores de canal de cálcio apresentam um perfil mais favorável, e, por essa razão, o uso dessa classe (vasodilatadores) fica restrito para pacientes com hipertensão refratária a outros medicamentos. A hidralazina parece inibir a liberação de cálcio induzido pelo IP3 das células arteriais, além de promover dilatação arterial ao realizar a abertura de canais de potássio. O grande problema desse medicamento é a acentuada estimulação do SNS devido a reflexos mediados pelos barorreceptores, o que gera aumento persistente da contratilidade cardíaca, além de aumento da liberação de renina e consequente aumento do volume sanguíneo (Brunton et al., 2016; Golan et al., 2016). Também é comum o aparecimento de tolerância. Por A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 11 todas essas razões, esse medicamento não é considerado fármaco de primeira linha para o tratamento da hipertensão. Já o minoxidil é um pró-fármaco que ativa o canal de potássio modulado pelo ATP, o que resulta em um relaxamento do músculo liso. Seu uso é reservado para pacientes com HA grave, os quais não respondem a outras medicações, sobretudo em pacientes do sexo masculino com a presença de insuficiência renal (Brunton et al., 2016). O minoxidil deve ser prescrito associado a diurético para evitar a retenção hídrica e com um agente simpatolítico para controlar os efeitos cardiovasculares reflexos. Pode ocorrer hipertricose em pacientes tratados por longos períodos, e, por essa razão, esse medicamento é usado no tratamento da calvície (Golan et al., 2016). TEMA 4 – INSUFICIÊNCIA CARDÍACA (IC) A insuficiência cardíaca (IC) tem alta prevalência e grande impacto na morbidade e na mortalidade em todo o mundo, além de ser considerada hoje um grave problema de saúde pública de proporções epidêmicas (Montera, 2009). Atualmente, conhecemos um pouco mais sobre os pacientes com IC aguda, em comparação com 10 anos atrás. A sobrevida dos pacientes pode ser de apenas 35% após 5 anos de diagnóstico, e a prevalência aumenta com a idade. No Brasil, é a primeira causa de hospitalização. Muito provavelmente, existem muitos fatores relacionados a esse achado, como o aumento da população idosa. Ainda, há registros de que existe uma falta de adesão a terapia medicamentosa, muito provavelmente em função do número de medicamentos que os pacientes utilizam. Há de se considerar o fato de que, como a maioria dos pacientes são idosos, muitos já apresentam outras comorbidades e utilizam medicamentos para tratá-las, sendo considerados pacientes polifarmácia, o que os torna alvo de interações medicamentosas importantes. A polifarmácia, por si só, já é responsável pela falta de adesão, uma vez que há aumento da incidência de reações adversas, risco de quedas e aumento na taxa de hospitalizações. A IC é uma síndrome complexa, com alterações na função cardíaca, o que resulta em sintomas e sinais de baixo débito cardíaco com a possível presença de congestão pulmonar sistêmica em repouso ou em resposta a um esforço (Golan et al., 2016). A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 12 Em nível celular, as alterações que são encontradas na contração cardíaca são consequência de desregulação da homeostasia do cálcio, alterações na regulação do padrão de expressão de proteínas contráteis e de alterações nas vias de transdução de sinais dos receptores βadrenérgicos. Os sinais e sintomas mais comuns da IC são: • Falta de ar/dispneia; • Dispneia paroxística noturna; • Fadiga; • Cansaço; • Intolerância ao exercício; • Pressão venosa jugular aumentada. Dentre os sintomas menos típicos, podem-se encontrar tosse noturna, aumento do peso, edema periférico e taquicardia. Os fatores de risco associados a IC são: isquemias, HAS, doençade chagas, cardiomiopatias, cardiotoxicidade (por uso de medicamentos, por exemplo), uso de álcool e tabagismo (Montera, 2009). As descompensações de pacientes com IC costumam ser de origem multifatorial, como a falta de adesão ao tratamento, bem como a ativação dos sistemas neuro-humorais. Basicamente, a IC é caracterizada pela incapacidade do coração de encher ou esvaziar o ventrículo esquerdo de forma adequada. As complicações desse achado são graves, pois além de reduzir a perfusão tecidual, o coração pode entrar em processo de congestão com aumento de tamanho. A insuficiência cardíaca congestiva (ICC) é o estado patológico no qual o coração é incapaz de bombear sangue de acordo com a demanda (Brunton et al., 2016). De acordo com os sintomas, a ICC pode ser classificada em: • Classe I: assintomático em atividades habituais • Classe II: assintomático em repouso, mas com sintomas em atividades habituais • Classe III: assintomático em repouso, mas com sintomas em atividades menores do que as habituais • Classe IV: sintomas exacerbados em atividades menores e dispneia em repouso. Um dos fatores complicados do IC acontece quando o miocárdio não possui capacidade de manter o débito cardíaco normal o que leva a ativação de A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 13 mecanismos para compensar a função cardíaca, levando a um processo grave chamado de remodelagem hipertrófica. Na videoaula, será explicado o processo de remodelagem com mais detalhes. Os preditores de mau prognóstico são: idade acima de 65 anos, classe III ou IV, cardiomegalia acentuada, dilatação progressiva do ventrículo esquerdo, diabetes, doença pulmonar, presença de fibrilação atrial, taquicardia ventricular. Dentre as dosagens laboratoriais: altos níveis de creatinina, valores baixos de sódio e elevado valor de BNP (fator atrial natriurético). TEMA 5 – TRATAMENTO DO ICC De acordo com fisiopatologia da doença, o tratamento farmacológico objetiva-se a atenuar os sinais e sintomas, como a redução do DC, melhora da função hemodinâmica, redução da pressão de enchimento ventricular e reduzir a remodelagem hipertrófica. Com a terapia farmacológica, é possível reduzir a morbidade, aumentar a qualidade de vida e reduzir as alterações hormonais, a progressão do IC e os sintomas. O tratamento farmacológico deve restaurar a força de contração, basicamente com a utilização de agentes ionotrópicos positivos, como digoxina, agonistas β e inibidores de fosfodiesterases. Ainda, o tratamento deve reduzir a progressão da remodelagem hipertrófica, controlando os efeitos da renina e da NOR, com a utilização de IECA, betabloqueadores e vasodilatadores. Importante pontuar que o farmacêutico pode contribuir na orientação do paciente com IC por meio do monitoramento de medidas gerais, relacionadas a mudança no estilo de vida, como cessar o fumo, corrigir a obesidade, reduzir a ingestão de álcool e sódio (consumir até 2g/dia) e realizar atividade física assistida por profissional habilitado. Sabe-se que a atividade física retarda o metabolismo anaeróbico, aumenta o tônus vagal e restaura a função endotelial, e todas essas medidas promovem qualidade de vida ao paciente (DSBIC, 2009). A seguir, serão listadas e comentadas as principais classes de fármacos utilizados na terapia do ICC. 5.1 Diuréticos Os diuréticos são considerados medicamentos essenciais no tratamento da IC, uma vez que controlam a pré-carga e contribuem para a redução da congestão A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 14 cardíaca. Entretanto, o uso de diuréticos não parece aumentar a sobrevida dos pacientes (DSBICA, 2009). Dentre as diversas classes de diuréticos, a mais usada, pela sua eficácia e pela alta capacidade de aumentar a diurese e reduzir o volume sanguíneo, são os diuréticos de alça, sendo a furosemida a mais utilizada. Segundo as diretrizes, os diuréticos tiazídico também podem ser utilizados, porém são menos potentes quando comprados aos de alça, apresentam início de ação mais tardio (2h), meia-vida mais longa e duração de ação mais prolongada (12h). Como terapia isolada, os tiazídicos não são recomendados nas situações de descompensação aguda e apresentam efeito reduzido nos pacientes com taxa de filtração glomerular diminuída, mas podem ser úteis em pacientes com insuficiência cardíaca avançada já em uso de altas doses de diurético de alça e baixa resposta diurética para potencializar o efeito (DSBIC, 2009). 5.1.2 Antagonistas dos receptores de aldosterona A espironolactona, conhecida como diurético poupador de potássio, é muito utilizada no controle da IC. Na clínica, é utilizada associada a IECA, o que deve ser monitorado, pois pode haver hipercalemia. 5.2 Vasodilatadores Segundo as diretrizes, os vasodilatadores utilizados devem ser: nitroglicerina, nitroprussiato de sódio e nesiritide, todos usados pela via parenteral em situação de IC aguda. Todos os vasodilatadores citados são doadores de óxido nítrico, após reagir com aminoácidos na circulação, liberando os grupamentos NO (óxido nítrico). O NO atua como agnista dos receptores guanilato ciclase, os quais promovem ativação da PKG (proteína quinase do tipo G). Essa proteína, por meio da doação de fosfato, promove a vasodilatação. Na IC crônica, são bem tolerados os nitratos orgânicos, como o mononitrato de isossorbida (doador de NO) e a hidralazina (inibe canal de IP3 no retículo endoplasmático liso e ativador de canal de potássio). 5.3 IECA Os inibidores da ECA são usados na redução da pós-carga. Ainda, são indicados para reduzir a progressão da remodelagem hipertrófica e a ativação do A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 15 sistema renina angiotensina, o qual, como já descrito, tem a atividade aumentada na fisiopatologia da doença. Basicamente, a administração dos IECA reduz a vasoconstrição e a retenção do volume sanguíneo e aumenta a capacidade venosa ao reduzir a bradicinina, um vasodilatador endógeno. Porém, reduz a degradação de bradicina, e os níveis aumentados de bradicina levam a um evento que ocorre em 30% dos pacientes: a tosse seca. Segundo as diretrizes, o uso de IECA tem impacto muito significativo na sobrevida dos pacientes com IC. Os antagonistas AT1 apresentam perfil semelhante aos IECA, porém não reduzem a degradação da bradicinina, o que pode beneficiar os pacientes com tosse seca por uso de IECA, mas sem melhora na capacitância venosa. 5.4 Antagonistas β O uso dessa classe parece paradoxal, uma vez que são medicamentos que reduzem a PA, o que num primeiro momento parece piorar os sintomas da IC. Porém, o uso de betabloqueadores aumenta a sobrevida dos pacientes com IC, e o mecanismo central parece estar envolvido com a redução da ativação dos mecanismos de controle de PA neuro-humorais (Brunto et al., 2016). Os betabloqueadores reduzem a liberação de renina por meio da atuação em receptores β1 localizados nas células justaglomerulares, além de bloquearem as ações da noradrenalina e adrenalina. Inclusive, as diretrizes recomendam a associação dos betabloqueadores com IECA para potencializar esse efeito. Uma recomendação se faz necessária: como o paciente com IC para facilmente progredir para edema pulmonar, é preciso ter cautela durante a escolha do antagonista beta. Foi descrito que existem três classes de betabloqueadores de acordo com a sua seletividade pelos receptores β, desta forma é imprescindível que seja prescrito um betabloqueador altamente seletivo para os receptores β1, como atenolol, metoprolol e bisoprolol, sendo este último a melhor escolha. 5.5 Agentes inotrópicos Essa classe de medicamentos é utilizada para aumentar aforça de contração do miocárdio, o que gera melhoria na perfusão dos tecidos. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 16 Basicamente, os medicamentos ionotrópicos promovem efeito ionotrópico positivo sem efeito sobre o cronotropismo. 5.5.1 Glicosídeos cardíacos Os glicosídeos cardíacos são medicamentos derivados da Digitalis purpúrea, e o principal representante é a digoxina. Veja a videoaula. 5.5.2 Aminas simpatomiméticas A dobutamina é a principal amina usada, especialmente em situações de emergência. Trata-se de um análogo da dopamina que se comporta como um agonista parcial dos receptores β, aumentando a força e a frequência cardíacas. Pode ser utilizada em altas doses em pacientes em crise. Em doses reduzidas, pode diminuir a liberação de NOR por meio da atuação em receptores D2. 5.5.3 Inibidores de fosfodiesterases A inarinona e milrinona inibem a degradação do AMPc nos miócitos cardíacos, o que promove aumento do cálcio intracelular, melhorando a contratibilidade cardíaca (Golan et al., 2016). Esse grupo de medicamentos é reservado para ser utilizado para tratamento a curto prazo de pacientes que apresentam descompensação aguda. 5.5.4 Outros fármacos O uso de estatinas (sinvastatina, atorvastatina, pitavastatina) pode contribuir para a melhora do quadro de IC, pois inibe a produção de colesterol endógeno e o metabolismo do mevalonato, o qual está envolvido em processos inflamatórios e no aumento do estresse oxidativo. A terapia farmacológica é planejada de acordo com o estágio da doença, mas, ainda, apesar de todos os avanços, o prognostico é considerado ruim para pacientes que apresentam o IC grave. Por essa razão, é importante que todas as comorbidades sejam tratadas, por exemplo doença arterial coronariana, HAS, insuficiência mitral, dislipidemias, obesidade ou caquexia, diabetes, doença na tireoide, doença renal, DPOC, entre outros. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com 17 REFERÊNCIAS BRUNTON, L. L. et al. As bases farmacológicas da terapêutica. 12. ed. Rio de Janeiro: Mc Graw Hill, 2016. GOLAN, D. E. et al. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacoterapia. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. KIMURA, L. et al. Genomic ancestry of rural African-derived populations from Southeastern Brazil. Am J Hum Biol., 25(1):35-41, 2013. KIMURA, L. et al. Multilocus family-based association analysis of seven candidate polymorphisms with essential hypertension in an African-derived semiisolated Brazilian population. International Journal of Hypertens, 2012. MALACHIAS, M. V. B. et al. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Brazilian Journal of Hypertension, 24(1), 2017. MONTERA, M. W. et al. II Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Aguda. Arq. Bras. Cardiol. 93 (3 supl.3):1-65, 2009. A luno: JE F F E R S O N G O N Ç A LV E S LO P E S E m ail: jefferson.g.lopes@ gm ail.com
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