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Choque séptico Professora Luciana Teixeira 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO RITTER DOS REIS CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA DISCIPLINA DE EMERGÊNCIAS E CUIDADOS INTENSIVOS SIRS Síndrome da resposta inflamatória sistêmica Anormalidades nos órgãos vitais e na contagem de leucócitos Sem critérios específicos em veterinária Presente se animal apresentar 2 (cães) ou 3 (gatos) de 4 critérios de SIRS - SEPSE Critérios para diagnóstico de SIRS em cães e gatos Cães (2/4) Gatos (3/4) Temperatura (°C) <38,1 ou >39,2 <37,8 ou >40 Frequência cardíaca (bpm) >120 <140 ou >225 Frequência respiratória (mpm) >20 >40 Leucócitos (x 103)/ % bastonetes <6 ou >16/ >3% <5 ou >19 2 SIRS 2 Sepse É a resposta inflamatória sistêmica a uma infecção Diagnóstico requer identificação (ou forte suspeita) de infecção + presença dos critérios de SIRS “Como parte das novas definições de consenso, a sepse é definida como disfunção orgânica com risco de vida causada por uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção” 3 Sepse A sepse trata-se de uma síndrome que causa mais de 10 milhões de mortes ao ano no mundo, e é responsável por gastos elevados em saúde publica, além de estar vinculada a sequelas irreversíveis em pacientes, que podem comprometer sua qualidade de vida. Esse tema vem ganhando cada vez mais espaço na medicina veterinária, apesar de não termos um consenso cientifico como o publicado na JAMA – O Surviving Sepsis Campaign (2016) – que atualizou a definição de sepse no ano de 2016, tanto no tocante aos conceitos como a terapêutica, os quais tem sido extrapolados da medicina humana. A taxa de mortalidade decorrente da sepse em cães possui valores de 21% podendo chegar até 68%. Essa grande variação é multifatorial e inclui a presença de comorbidades, tipo bactéria presente (gram positivo ou gram negativo), sítio infeccioso, desencadeamento da resposta sistêmica e número de disfunções orgânicas (KENNEY et al., 2010). A sepse é uma disruptura multifacetada do equilíbrio imunológico de mecanismos inflamatórios e anti-inflamatórios. Ocorre regulação para cima de vias pró e anti-inflamatórias que levam a uma liberação massiva de citocinas, mediadores e moléculas relacionadas a patógenos, resultando em ativação da coagulação e cascata de complemento. Durante as fases iniciais da sepse, ocorre aumento de citocinas pró e anti-inflamatórias, porém, conforme a doença progride, os neutrófilos, que formam uma parte significativa da primeira linha de defesa contra patógenos, elevam sua concentração. A elevação nas formas maduras e imaturas de neutrófilos caracterizam uma deterioração clínica. Ainda que o marco da sepse seja a SIRS, há significativa imunossupressão que ocorre tanto nos estágios iniciais quanto finais da doença. 3 sepse 4 Sepse Choque séptico Paciente em sepse +: Hipotensão persistente não responsiva à expansão volêmica São pacientes dependentes de vasopressores para manter PAM ≥65 mmHg e que apresentam lactato >3 mmol/L, apesar de reanimação volêmica 5 Instabilidade cardiovascular induzida pela infecção Choque séptico As anormalidades metabólicas, celulares e cardiocirculatórias são profundas o suficiente para aumentar a mortalidade. As causas mais comuns do choque séptico são: queimaduras contaminadas, traumatismo extenso, peritonite, obstrução intestinal, isquemia intestinal, enterite, pericardite, abscessos, osteomielite, enfermidades hepáticas, meningite, piometrite e choque hemorrágico. As fontes de infecção por gram-negativos comumente incluem o trato gastrointestinal e o gênito-urinário. As bactérias gram-negativas possuem, em sua parede celular, uma molécula denominada lipopolissacarídeo (LPS) que é um dos mais potentes estímulos ao sistema imune. Já a sepse por bactérias gram-positivas possuem como fontes a pele, tecido mole danificado e cateteres intravenosos. A ativação da cascata inflamatória por tais bactérias ocorre em resposta a componentes da parede celular como o ácido lipoecoico, peptideoglicanos ou ao DNA bacteriano ou, ainda, por exotoxinas (BOLLER; OTTO, 2015). 5 Fisiopatologia 6 Descompartimentalização Fisiopatologia As manifestações clínicas e o curso da doença no paciente em sepse dependem do local da infecção, da virulência do organismo, tamanho do inóculo, estado nutricional do hospedeiro, comorbidades, idade, resposta imune e função orgânica. 6 Microrganismos (DAMPs e PAMPs) SIRS Disfunção do endotélio e de microcirculação Hipoperfusão global e disfunção orgânica SEPSE Disfunção orgânica múltipla com hipotensão refratária Choque séptico 7 Huang et al., 2019 Fisiopatologia Quando a inflamação em resposta a um insulto tem efeitos sistêmicos, ao invés de permanecer localizada no local do insulto, a manifestação clínica resultante é caracterizada por SIRS. SIRS se refere a um estado pró-inflamatório sistêmico que não é controlado adequadamente pelas respostas endógenas anti-inflamatórias. Apesar de a inflamação localizada ser uma resposta protetora à lesão tecidual, a inflamação sistêmica é deletéria. É difícil diferenciar SIRS de sepse, já que a fisiopatologia das duas entidades é quase idêntica, com exceção do insulto inicial. 7 Situações comuns na sepse Perfuração gastrointestinal Peritonite séptica biliar por ruptura de vesícula biliar Ruptura de trato urogenital infectado Pneumonia Piotorax Piometra/ prostatite/ abcesso prostático Pielonefrite 8 Abcesso hepático Infecção do trato urinário inferior Infecção cutânea Babesiose, erliquiose e outros micoses sistêmicas Infecções virais sistêmicas Infecções parasitárias e protozoárias Diagnóstico 9 10 Diagnóstico Buscando disfunções orgânicas 11 INTESTINAL METABÓLICA HEPÁTICA HEMOSTÁTICA RENAL CARDIOVASCULAR RESPIRATÓRIA NEUROLÓGICA Diagnóstico Sinais clínicos Variáveis de acordo com: O foco da infecção As consequências da disfunção orgânica O estágio de compensação do paciente 12 Critérios para diagnóstico de SIRS em cães e gatos Cães (2/4) Gatos (3/4) Temperatura (°C) <38,1 ou >39,2 <37,8 ou >40 Frequência cardíaca (bpm) >120 <140 ou >225 Frequência respiratória (mpm) >20 >40 Leucócitos (x 103)/ % bastonetes <6 ou >16/ >3% <5 ou >19 Sinais clínicos 12 Sinais clínicos Sistema Sinais clínicos e alterações laboratoriais Cardiovascular FC, PAS, lactato, edema periférico, perfusão periférica, enzimas cardíacas e arritmia Respiratória Dispneia, FR, cianose e hipoxemia Neurológica Confusão, nível de consciência, agitação, polineuropatias Renal Oligúria e elevação de enzimas Hematológica Anemia, plaquetas, coagulopatia, leucocitose, leucopenia Gastroenterológicas Diarreia, hemorragias digestivas, distensão abdominal Hepáticas Colestase, enzimas hepáticas Endócrinas e metabólicas Hiperglicemia, triglicerídeos, hipoalbuminemia 13 Sinais clínicos Na síndrome de disfunção múltipla de órgãos induzida pela sepse, o pulmão é o órgão mais afetado. Isso ocorre pela interação entre citocinas inflamatórias e mediadores celulares que danificam a unidade alvéolo-capilar. Inicialmente, ocorre uma fase exsudativa com edema e hemorragia alveolar nos primeiros dias. Após, segue uma fase proliferativa, marcada por reparo, ao que segue uma fase fibrótica, que usualmente ocorre 3 a 4 semanas após a fase inicial, caracterizada por fibrose. 13 Sinais clínicos Fase hiperdinâmica DC elevado RVS diminuído PAS normal Hipertermia Hiperglicemia 14 Fase hipodinâmica DC reduzido RVS aumentado Hipotensão Hipotermia Hipoglicemia Queda na entrega de oxigênio Sinais clínicos Tratamento A precocidade da identificação no diagnóstico e no início do tratamento estão diretamente relacionadas à sobrevida do paciente 15 Tratamento Pacote da 1ª hora Identificar o foco infeccioso (coleta e hemoculturas) Antimicrobianoterapia imediata Reanimação volêmica Cristaloides – 10 a 20 ml/kg Vasopressores 16 Reanimação baseada no lactato: mensurar lactato Depuração (clearance) de 20% nas primeiras 2h Manter sem elevação por 8h Tratamento São5 intervenções que devem ser feitas na primeira hora: (1) hemocultura antes de administrar antibiótico, (2) administração de antibiótico de largo espectro, (3) administração de fluido IV, (4) uso de vasopressores e (5) mensuração de lactato. Estudos em humanos apontam que lactato elevado de forma persistente por mais de 24h se associou a mortalidade superior a 95% daqueles pacientes, e que a hiperlactatemia por mais de 48h se associou ao óbito de todos os pacientes. O lactato deve ser monitorado de perto e a cada 1 a 2h se valores estiveram acima de 2 mmol/L. Ele é tão importante que a definição de choque séptico atual diz que “um valor de lactato > 2 mmol/l, apesar da reposição adequada de volume, juntamente com a administração de vasopressores para manter PAM > 65 mmHg, define choque séptico”. Os objetivos da reanimação volêmica são tratar a hipoperfusão tecidual e contrabalançar a hipovolemia absoluta e/ou relativa causada pela vasodilatação, perda de fluido e vazamento capilar. 16 Antimicrobianos Requer compreensão da origem da sepse e dos prováveis patógenos envolvidos e padrões de resistência local Considerar: Amplo espectro Dose máxima inicial Via intravenosa Não corrigir dose para insuficiência renal e hepática Abordagem é cirúrgica para infecção intra-abdominal, abscessos, colangites, pielonefrite obstrutiva, necrose pancreática Remover catéteres infectados 17 Tratamento Espectros antimicrobianos. Suscetibilidades antimicrobianas comuns ilustradas em um gráfico de 4 quadrantes de patógenos bacterianos com base em sua classificação de Gram-positivo versus Gram-negativo e aeróbio versus anaeróbico. Patógenos que não se encaixam neste esquema de classificação (ou seja, atípicos) são documentados no quadrante inferior direito do gráfico. Para os antimicrobianos no centro do gráfico que fornecem cobertura de 4 quadrantes, é importante estar ciente de que existem organismos que se enquadram nessas classificações, mas podem não ter suscetibilidade a um desses antimicrobianos (ou seja, infecções por Pseudomonas são comumente resistentes à amoxicilina -ácido clavulânico). Observe que este gráfico não leva em consideração a resistência antimicrobiana. 17 18 Stuart e Allen, 2019 Espectros antimicrobianos. Suscetibilidades antimicrobianas comuns ilustradas em um gráfico de 4 quadrantes de patógenos bacterianos com base em sua classificação de Gram-positivo versus Gram-negativo e aeróbio versus anaeróbico. Patógenos que não se encaixam neste esquema de classificação (ou seja, atípicos) são documentados no quadrante inferior direito do gráfico. Para os antimicrobianos no centro do gráfico que fornecem cobertura de 4 quadrantes, é importante estar ciente de que existem organismos que se enquadram nessas classificações, mas podem não ter suscetibilidade a um desses antimicrobianos (ou seja, infecções por Pseudomonas são comumente resistentes à amoxicilina -ácido clavulânico). Observe que este gráfico não leva em consideração a resistência antimicrobiana. 18 Uso empírico de antimicrobianos 19 Cav. Oral Gram +, anaeróbicos Pele Gram +, aeróbicos Trato genitourinário Gram -, anaeróbicas Trato gastrointestinal Gram -, anaeróbico Trato Ósseo Gram +, aeróbias Trato respiratório Gram + e gram –, aeróbicos 1 2 3 4 5 6 Tratamento Reanimação volêmica 1 Prova de carga – 10-20 ml/kg Evitar coloides Causam IRA, coagulopatias, entre outros Manter fluido caso haja melhora hemodinâmica 20 Se hipotensão refratária à reanimação volêmica Vasopressores Tratamento Vasopressores Objetiva atingir PAM>65 mmHg Norepinefrina é 1ª escolha, infusão continua 0,1 a 1,5 µg/kg/min Vasopressina pode ser associada Dobutamina é recomendada quando há disfunção miocárdica Hipoperfusão mesmo após restabelecimento de volume e PA adequados 21 Tratamento Inflamação sistêmica Sistólica Diastólica Morte Citocinas inflamatórias NO Vasodilatação RVS DC VS PDFVE Congestão pulmonar Perfusão sistêmica Hipotensão Pressão de perfusão coronária Vasoconstrição compensatória Hipoxemia Isquemia Disfunção miocárdica progressiva Disfunção miocárdica Fonte: Bolfer e Sleeper, 2019 22 Fisiopatologia Outras medidas 23 Tratamento Controle glicêmico Evitar hiperglicemia/ hipoglicemia Transfusão sanguínea Avaliação clínica Hb < 7g/dL Sedação e Analgesia Controle de dor essencial para recuperação Tratamento das disfunções presentes Nutrição Assim que hemodinamicamente estável. Minimizar prejuízo aos órgãos Controle glicêmico Glicemia > 180 mg/dL em cães ou > 250 mg/dL em gatos: Terapia com insulina regular >10 kg, 2 UI <10 kg, 0,25UI/kg Monitorar a cada 1-2 h 24 Glicemia < 60 mg/dL (hipoglicemia): Aumento da utilização de glicose periférica causada pelo estado hipermetabólico Glicose 50% bolus (0,5-1 ml/kg, diluído 1:3, IV) Glicose 25 a 5% em infusão contínua Hiperglicemia Hipoglicemia Tratamento Ao serem injetadas doses de endotoxinas capazes de determinar choque serão observadas rápida hiperglicemia e mais tarde hipoglicemia. O resultado é uma acentuada diminuição nas reservas de hidrato de carbono. Este mecanismo é explicado da seguinte maneira: as endotoxinas atuam como falsos mensageiros para ativarem as enzimas responsáveis pela glicogenólise hepática detectando-se, então, a hiperglicemia inicial. A hipoglicemia secundária é devida ao consumo das reservas de hidratos de carbono, aumento no metabolismo da glicose e diminuição na sua síntese. Tanto a glicogenogênese como a gliconeogênese não se processam porque as endotoxinas inibem a conversão de glicose em glicogênio hepático e a indução através dos glicocorticoides endógenos necessários para a síntese das enzimas gliconeogênicas. No estresse, a lipólise é iniciada pelas catecolaminas e glicocorticoides, proporcionando ácidos graxos e glicerol, que no ciclo glicolítico são admitidos na reação piruvato -acetil coenzima A e, então, convertidos em intermediários do ciclo energético para produzir ATP. Tem sido demonstrado que, em cães submetidos a choque endotóxico, os ácidos graxos livres aumentam significativamente. Neste tipo de choque parece que esta resposta dos ácidos graxos é mediada por uma via mais complexa que a simples estimulação hormonal. No metabolismo proteico foi verificado experimentalmente que as endotoxinas bloqueiam o metabolismo do triptofano. Este é o precursor do acido nicotínico, componente do NAD (nicotinamina dinucleotídeo). 24 Referências SHARP, Claire R. Systemic Inflammatory Response Syndrome, Sepsis, and Multiple Organ Dysfunction Syndrome. Textbook of Small Animal Emergency Medicine, p. 1030–1037, 7 Out 2018. SINGER, Mervyn e colab. The Third International Consensus Definitions for Sepsis and Septic Shock (Sepsis-3). JAMA, v. 315, n. 8, p. 801–810, 23 Fev 2016. STEWART, Samuel D. e ALLEN, Sarah. Antibiotic use in critical illness. Journal of Veterinary Emergency and Critical Care, v. 29, n. 3, p. 227–238, 1 Maio 2019. HUANG, Min e CAI, Shaoli e SU, Jingqian. The Pathogenesis of Sepsis and Potential Therapeutic Targets. International Journal of Molecular Sciences 2019, Vol. 20, Page 5376, v. 20, n. 21, p. 5376, 29 Out 2019. GOTTS, Jeffrey E. e MATTHAY, Michael A. Sepsis: pathophysiology and clinical management. BMJ, v. 353, 23 Maio 2016. JARCZAK, Dominik e KLUGE, Stefan e NIERHAUS, Axel. 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