Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MOTORES À COMBUSTÃO Rafael Bertoncini 2 SUMÁRIO 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS ................................................................... 3 2 COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES E SISTEMA DE LUBRIFICAÇÃO ............. 34 3 SISTEMAS DE ARREFECIMENTO E DE INJEÇÃO DE COMBUSTÍVEL .......... 59 4 COMBUSTÃO ......................................................................................... 91 5 CONSUMO DE AR NOS MOTORES 4T ................................................... 110 6 PROPRIEDADES E CURVAS CARACTERÍSTICAS DOS MOTORES, TENDÊNCIAS E TECNOLOGIAS FUTURAS ................................................. 133 3 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS Apresentação Neste bloco será feita a introdução aos motores de combustão através das suas definições, arquitetura mecânica e ciclos-padrão. A compreensão destes conceitos é fundamental para que possamos, então, compreender os seus subsistemas e o seu funcionamento global. Neste curso, iremos nos ater somente aos motores de combustão interna (MCI), mas vale notar que existem também motores de combustão externa (MCE), como os motores a vapor (ciclo de Rankine). 1.1 Definições Os motores são máquinas térmicas, isto é, são dispositivos que transformam calor (Q) em trabalho (W). Existem diversas fontes de calor disponíveis e, no caso dos motores, o calor é obtido através da queima de um combustível, ou seja, a energia química do combustível é transformada em energia mecânica útil (BRUNETTI, 2012). Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 1.1 – Fluxos de massa e energia em um motor de combustão interna. 4 O fluido ativo (FA), também conhecido por fluido motor, é a substância na qual os processos necessários para a obtenção do trabalho são realizados. No caso dos MCIs, como ilustrado na figura 1.1, o FA é formado pela mistura ar-combustível. Assim, o movimento dos componentes do motor é provocado por uma série de processos realizados pelo FA. Segundo Brunetti (2012), as máquinas térmicas são classificadas quanto ao comportamento do FA, como segue: ▪ Motor de combustão externa (MCE): o FA não participa da combustão, ele é apenas o veículo da energia térmica que será transformada em trabalho. Exemplo: máquina a vapor (motor de Stirling); ▪ Motor de combustão interna (MCI): o FA participa diretamente da combustão. Os MCIs são classificados em: ▪ Motores alternativos: são aqueles no qual o trabalho é obtido através do movimento linear de vaivém do pistão e transformado em rotação contínua pelo sistema biela-manivela. São motores de combustão cíclica; ▪ Motores rotativos: são aqueles no qual o trabalho é obtido diretamente pelo movimento de rotação. Exemplo: motor Wankel (combustão cíclica) e turbina a gás (combustão contínua); ▪ Motores de impulso: são aqueles no qual o trabalho é obtido pela propulsão (empuxo) gerada por gases expelidos em alta velocidade. Exemplo: motores a jato e foguete (combustão contínua). Os motores alternativos, de maior aplicação no mercado, serão o foco deste curso: 5 Fonte: Wikimedia Commons, 2006. Figura 1.2 – Peças móveis de um motor alternativo. 1.1.1 Nomenclatura dos motores alternativos A partir deste ponto, iremos começar a detalhar os MCIs e, para isso, necessitamos unificar algumas nomenclaturas básicas. A figura a seguir ilustra os principais componentes de um MCI, neste caso, um motor do ciclo Diesel, e a tabela na sequência identifica os seus componentes: Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 1.3 – Principais componentes de um MCI do ciclo Diesel. 6 1. Bomba de água 15. Bloco 29. Balancim da válvula de escape 2. Válvula termostática 16. Eixo comando de válvula 30. Coletor de escape 3. Compressor de ar 17. Volante 31. Pistão 4. Duto de admissão 18. Virabrequim 32. Motor de partida 5. Injetor de combustível 19. Capa do mancal 33. Dreno de água 6. Válvula de escape 20. Biela 34. Filtro de óleo 7. Coletor de admissão 21. Bujão do cárter de óleo 35. Radiador de óleo 8. Válvula de admissão 22. Bomba de óleo 36. Vareta do nível de óleo 9. Linha de combustível 23. Cárter 37. Bomba manual de combustível 10. Haste de válvula 24. Engrenagem do virabrequim 38. Bomba injetora de combustível 11. Duto de água 25. Amortecedor vibracional 39. Respiro do cárter 12. Tampa de válvula 26. Ventilador 40. Filtro de combustível 13. Cabeçote 27. Duto de admissão 14. Tampa lateral 28. Balancim da válvula de admissão Fonte: Brunetti, 2012. A figura abaixo apresenta a posição do pistão no cilindro: Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figuras 1.4 – Posições do pistão no cilindro. 7 Sendo: ▪ PMS – Ponto Morto Superior: é o ponto mais alto que o pistão pode atingir dentro do cilindro; ▪ PMI – Ponto Morto Inferior: é o ponto mais baixo que o pistão pode atingir dentro do cilindro; ▪ S – Curso do pistão: é a distância percorrida entre o PMS e o PMI e vice-versa; ▪ V1 – Volume total: é o volume contido entre o topo do pistão e a face do cabeçote quando o pistão se encontra no PMI; ▪ V2 – Volume morto (volume da câmara de combustão): é o volume contido entre o topo do pistão e a face do cabeçote, quando o pistão se encontra no PMS; ▪ Vdu – Cilindrada unitária ou volume deslocado útil ou deslocamento volumétrico: é o volume deslocado pelo pistão de um ponto morto a outro; ▪ z – Número de cilindros do motor; ▪ D – Diâmetro dos cilindros do motor; ▪ Vd – Volume deslocado do motor ou deslocamento volumétrico do motor ou cilindrada total; Da figura 1.4 temos: Assim, para um motor com z cilindros, o volume deslocado do motor Vd (cilindrada) será: Vd= π*D2 4 *S*z Vdu= π*D2 4 *S 8 Um parâmetro importante que influencia o rendimento térmico do motor é a relação volumétrica (rv) ou taxa de compressão, ou seja, a relação entre o volume total (V1) e o volume morto (V2): Os valores habituais de taxa de compressão variam em função da tecnologia do motor e do combustível, como segue: ▪ Ciclo Otto, gasolina E22: de 8:1 a 11:1; ▪ Ciclo Otto, etanol hidratado: de 10:1 a 14:1; ▪ Ciclo Otto, flex fuel: de 10:1 a 13:1; ▪ Ciclo Diesel: de 15:1 a 24:1. As características cinemáticas dos motores são apresentadas na figura 1.5: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.5 – Nomenclatura cinemática. Onde: ▪ V.E.: válvula de escape; ▪ V.A.: válvula de admissão; ▪ r: raio do virabrequim; ▪ n: frequência do virabrequim; rv= V1 V2 = Vdu+V2 V2 9 ▪ ω: velocidade angular do virabrequim; ▪ Vp: velocidade média do pistão; ▪ α: ângulo formado entre a manivela e o eixo vertical de referência o α=0° quando o pistão está no PMS; o α=180° quando o pistão está no PMI; ▪ L: comprimento da biela; ▪ x: distância para o pistão atingir o PMS. 1.1.2 Classificações dos motores alternativos Segundo Brunetti (2012), os motores alternativos podem ser classificados de diversas maneiras: ❖ Quanto à ignição A ignição (calor) é o processo que dá início à combustão, isto é, ela é o agente que provoca a reação do combustível com o oxigênio do ar (comburente). Os motores alternativos são divididos em dois tipos de ignição: ▪ Motores de ignição por faísca (MIF) – ciclo Otto: a mistura ar-combustível admitida, previamente dosada ou formada no interior dos cilindros, no caso dos motores com injeção direta de combustível, é inflamada por uma faísca formada entre os eletrodos da vela de ignição, como ilustrado na figura 1.6. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.6 – Motor de ignição por faísca. 10 ▪ Motores de ignição espontânea (MIE) – ciclo Diesel: o pistão comprime o ar até que ele atinja uma temperatura elevada e, perto do PMS, o combustível é injetado, reagindo espontaneamente com o oxigênio do ar aquecido sem a necessidade de uma faísca, como ilustrado na figura 1.7. A temperatura de autoignição(TAI) é a temperatura do ar necessária para que haja a reação espontânea com o combustível. A tabela abaixo apresenta valores típicos da TAI para diferentes combustíveis. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.7 – Motor de ignição espontânea. Tabela 1.1 – Valores típicos da TAI para diferentes combustíveis. Temperatura de autoignição [°C] Diesel Etanol hidratado Metanol Gasolina E22 250 420 478 400 ❖ Quanto ao número de tempos do ciclo de operação O ciclo é a sequência de processos periódicos sofridos pelo FA para obter a energia mecânica útil. Os diversos tempos de um ciclo referem-se ao curso do pistão. Desta forma, os motores alternativos, MIFs ou MIEs são classificados em dois grupos de tempos, 4T e 2T: ▪ Motores a quatro tempos (4T): o pistão percorre quatro cursos ou duas voltas do virabrequim para completar um ciclo. A figura a seguir apresenta os quatro tempos do ciclo. 11 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.8 – Os quatro tempos do motor alternativo. 1. Admissão: o pistão desloca-se do PMS ao PMI, gerando uma depressão (sucção) que promove a entrada da mistura ar-combustível ou só do ar, no caso dos MIFs de injeção direta e MIEs, através da válvula de admissão que está aberta. 2. Compressão: a válvula de admissão se fecha e o pistão desloca-se do PMI ao PMS, comprimindo a mistura ar-combustível ou só o ar, dependendo do tipo de motor. 3. Expansão: quando o pistão está próximo ao PMS, a faísca provoca a ignição nos motores MIFs, enquanto é injetado o combustível em meio ao ar quente nos motores MIEs, iniciando a combustão que provoca o aumento da pressão no cilindro, empurrando assim o pistão ao PMI, de maneira que o FA sofra o processo de expansão. A expansão é a responsável pelo trabalho útil do motor. 4. Escape: o pistão desloca-se do PMI ao PMS com a válvula de escape aberta, empurrando os gases queimados para fora do cilindro, finalizando o ciclo. 12 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.9 – Motor de ignição por faísca 4T e quatro cilindros. ▪ Motores a dois tempos (2T) de ignição por faísca: o pistão percorre apenas dois cursos ou uma única volta do virabrequim para completar um ciclo. Os processos que ocorrem no motor 4T também ocorrem da mesma maneira no motor 2T, porém alguns destes processos se sobrepõem num mesmo curso. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.10 – Motor de ignição por faísca 2T. 1. 1º tempo: o ciclo se inicia com o pistão no PMS e a mistura ar-combustível comprimida. A combustão tem início com a faísca, empurrando o pistão ao PMI. Durante este deslocamento, o pistão comprime o conteúdo do cárter até o ponto no qual a janela de escape (B) fica exposta e os gases queimados em alta pressão saiam do cilindro. Na sequência, o pistão expõe a janela de admissão (C), comunicando o cárter pressurizado com o cilindro de modo que 13 uma nova mistura entre. Neste momento, as janelas de admissão e escape estão abertas, permitindo o fluxo de mistura nova ao escape, chamado de curto-circuito. Este problema pode ser reduzido com um projeto adequado de janelas aliado ao formato do topo do pistão. 2. 2º tempo: durante o deslocamento do pistão do PMI ao PMS, ocorre o fechamento das janelas de admissão (C) e depois a de escape (B), abrindo a passagem (A) que, devido à depressão (sucção) criada no cárter pelo movimento ascendente do pistão, permite o preenchimento de mistura nova no cárter. Neste mesmo instante, está ocorrendo a compressão da mistura previamente admitida no cilindro e, com o aproximar do pistão ao PMS, uma nova faísca inicia o próximo ciclo. Nesse motor, o trabalho útil ocorre a cada dois cursos do pistão ou uma volta do virabrequim. Dessa maneira, se esperaria que este motor produzisse o dobro da potência de um motor 4T a uma mesma rotação, no entanto, isso não ocorre devido a precariedade dos processos sobrepostos. Outro ponto negativo é a lubrificação, uma vez que o cárter é utilizado para a admissão da mistura ar-combustível, não permitindo a sua utilização como reservatório de lubrificante. Dessa forma, o lubrificante é misturado ao combustível numa proporção de 1:20 (1 litro de lubrificante para 20 litros de combustível) e a lubrificação ocorre de maneira precária por aspersão, diminuindo a durabilidade dos componentes e aumentando as emissões, visto que o lubrificante é queimado junto ao combustível, prejudicando a combustão. Em contrapartida, por não apresentar um sistema de válvulas, o motor 2T é simples, pequeno, leve e barato quando comparado a um motor 4T de mesma potência. 14 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.11 – Ciclo completo do motor de ignição por faísca 2T. ▪ Motores a dois tempos (2T) de ignição espontânea: o motor 2T do ciclo Diesel, diferentemente do MIF 2T, não utiliza o cárter para a admissão, mas sim uma máquina auxiliar acionada pelo virabrequim. A bomba de lavagem é um compressor volumétrico, isto é, um componente que expele os gases queimados ao introduzir uma grande quantidade de ar pelas janelas de admissão, empurrando-os para fora. Contudo, uma parte desses gases fica retido no cilindro quando as válvulas fecham. Ao se aproximar do PMS, o pistão os comprime fortemente até a injeção do combustível que irá iniciar o processo de ignição espontânea, gerando a pressão necessária (expansão) para a produção do trabalho útil. Após a expansão, no deslocamento do pistão ao PMI, as janelas de admissão são novamente expostas e a bomba faz a lavagem dos gases queimados, proporcionando uma nova admissão, fechando assim o ciclo. Existem versões de MIE 2T com e sem válvulas de escape, neste caso, mais baratos com a utilização de janelas de escape. 15 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.12 – MIE 2T com válvula de escape. Tabela 1.1 – Principais diferenças dos motores 4T e 2T. Diferenças 4T 2T Tempos x ciclo útil 2 voltas do virabrequim 1 volta do virabrequim Sistema mecânico Mais complexo Mais simples com a ausência de válvulas e eixo comando Admissão Boa Ruim com perda de mistura no escape e presença de lubrificante Lubrificação Boa Ruim com a presença de combustível ❖ Quanto ao ciclo de operação Mecanicamente, não há diferenças relevantes entre os motores do ciclo Otto e Diesel a 4T, a não ser pela maior robustez do motor Diesel devido a maior taxa de compressão e pressões envolvidas. A seguir, são apresentadas as principais diferenças: ▪ Injeção de combustível: nos MIFs, geralmente, a mistura é injetada já homogeneizada e dosada, com exceção dos motores com injeção direta, onde apenas o ar é admitido e a injeção ocorre diretamente dentro do cilindro. Nos MIEs, admite-se somente o ar e o combustível é finamente pulverizado no cilindro ao final da compressão. Um sistema de injeção de alta pressão é o responsável por atomizar o combustível. 16 ▪ Ignição: nos MIFs, a ignição é dada por uma faísca oriunda de um sistema elétrico. Nos MIEs, a combustão ocorre espontaneamente por autoignição; ▪ Taxa de compressão: nos MIFs, a taxa de compressão é baixa para evitar autoignição, visto que o momento correto de ignição será dado pela faísca. Nos MIEs, em contrapartida, a taxa de compressão deve ser alta de modo que o ar ultrapasse o TAI do combustível. ❖ Quanto ao sistema de alimentação de combustível A alimentação de combustível dos MIFs pode ser feita por um carburador ou por um sistema de injeção de combustível. Embora o carburador ainda seja utilizado em aplicações de baixa potência sem as restrições de emissões impostas aos automóveis, não iremos estudá-lo neste curso. A injeção de combustível é mais precisa, contribuindo para uma combustão mais eficiente e com emissões reduzidas, podendo ser realizada no duto de admissão (Port Fuel Injection – PFI) ou diretamente no cilindro (Gasoline Direct Injection – GDI), como segue: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.13 – Tipos de injeçãode combustível dos MIFs. Como informado anteriormente, a injeção de combustível nos motores MIEs é feita com um sistema de alta pressão, em torno de 2000 bar, de modo a atomizar o combustível dentro do cilindro durante a compressão. 17 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.14 – Esquema de um sistema de injeção dos MIEs. ❖ Quanto à disposição dos cilindros Os cilindros dos motores podem estar dispostos de maneiras diferentes num motor. A figura a seguir apresenta o esquema de disposições típicas (a): em linha, em V e oposto ou boxer. Pode-se observar também dois exemplos aeronáuticos (b): oposto e radial, onde os cilindros estão dispostos radialmente em torno do virabrequim. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.15 – Disposições de cilindros típicas. No Brasil, a disposição mais comum é a linha com quatro cilindros. Já nos EUA, a disposição mais comum é a em V com seis ou oito cilindros. 18 Existem outras disposições de cilindros disponíveis no mercado, mas menos habituais. Entre elas, podemos elencar a disposição em W, podendo ser dois blocos em V ou três em linha unidos, em U, em H, e a de pistões opostos, onde a câmara de combustão é formada pelo topo dos dois pistões opostos entre si (não há cabeçote): Fonte: adaptado de Martins, 2016. Figura 1.16 – Outras disposições de cilindros. ❖ Quanto ao sistema de arrefecimento Boa parte do trabalho gerado pela combustão é perdida em forma de atrito e calor, que podem reduzir a durabilidade dos componentes caso não sejam tratados adequadamente. O sistema de arrefecimento existe justamente para dissipar a temperatura nas áreas e componentes mais sensíveis do motor. Basicamente existem dois sistemas de arrefecimento: a ar, que é mais simples, porém é menos homogêneo e, portanto, menos eficiente; e a água, sendo mais eficiente e contribui na redução do ruído do motor, mas é muito mais complexo. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.17 – Sistemas de arrefecimento a água e a ar. 19 ❖ Quanto ao comando de válvulas O eixo comando de válvulas é o componente responsável pela abertura e fechamento das válvulas. Este eixo pode estar posicionado, basicamente, em duas regiões diferentes no motor: ▪ No bloco do motor: o eixo comando aciona tuchos que são ligados a hastes que por sua vez acionam os balancins no cabeçote, abrindo ou fechando as válvulas. Trata-se de um sistema complexo e que permite folgas que impactam o desempenho do motor. ▪ No cabeçote: o eixo comando pode ser montado no cabeçote em duas configurações, eixo único que aciona balancins (OverHead Camshaft – OHC) e eixo duplo que acionam tuchos (Double OverHead Camshaft – DOHC), sendo um sistema mais eficiente e com menos peças móveis. Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 1.18 – Sistemas de acionamento de válvulas. ❖ Quanto à admissão de ar A quantidade de ar admitido por um motor irá determinar o seu desempenho, pois quanto mais ar for admitido e retido no cilindro, mais combustível poderá ser alimentado, aumentando assim a eficiência para uma mesma rotação. Para isto, existem dois sistemas: 20 ▪ Naturalmente aspirado (pressão negativa): neste sistema, o fluxo de ar para o cilindro na admissão ocorre devido a depressão (sucção) criada pelo movimento do pistão do PMS ao PMI, onde a pressão do coletor (pressão atmosférica) é maior do que a pressão no cilindro (pressão negativa). Neste caso, o gradiente de pressão é limitado pela pressão de admissão que será, no máximo, a pressão atmosférica. ▪ Sobrealimentado (pressão positiva): visando aumentar o gradiente de pressão, de modo a admitir mais ar, foram desenvolvidos sistemas com dispositivos que aumentam a pressão no coletor de admissão acima da atmosférica. No geral, existem dois sistemas de sobrealimentação: 1. Turbocompressor: os gases de escape giram a turbina, que transfere esse trabalho ao compressor, que, por sua vez, comprime o ar, aumentando assim a pressão de admissão: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.19 – Motor com turbocompressor. 21 2. Compressor mecânico: um compressor é acionado mecanicamente pelo motor e comprime o ar de admissão: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.20 – Motor com compressor mecânico do tipo roots. No caso dos motores sobrealimentados, a compressão do ar provoca o aumento da sua temperatura, reduzindo a sua massa específica (densidade) e, portanto, reduzindo a eficiência da combustão. Com o objetivo de minimizar esse efeito, foram desenvolvidos trocadores de calor que são posicionados depois do compressor, podendo ser eles ar-ar, onde o ar que passa pelo veículo refrigera o ar de admissão, ou ar-água, onde o fluido de arrefecimento do motor refrigera o ar de admissão. Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 1.21 – Motor com turbocompressor e trocador de calor ar-ar. 22 ❖ Quanto à relação diâmetro-curso do pistão Segundo Martins (2016), ao se tratar das características de um motor, habitualmente se menciona o diâmetro do cilindro (D) seguido pelo curso (S) da seguinte forma: D x S. Exemplo: 82,5 x 92,8 mm. Assim, num MCI, o curso pode ser maior ou menor que o diâmetro. No entanto, a relação diâmetro-curso apresenta uma razão de compromisso que deve ser observada: ao diminuir o curso, reduz-se a velocidade linear do pistão e aumenta-se a velocidade angular do virabrequim para uma mesma rotação; adicionalmente, um motor com diâmetro maior dispõe de mais espaço para o desenho da câmara de combustão e posicionamento das válvulas, bem como permite válvulas de diâmetro maiores que favorecem o enchimento e o escape dos gases; contudo, motores com diâmetro excessivos apresentam perdas de compressão, pior queima da mistura ar-combustível e elevadas perdas térmicas. Existem três relações de diâmetro-curso para classificar os MCIs: superquadrado (D>S), apresentam torque e potência em altas rotações; quadrado (D=S), com bom desempenho em todas as faixas de rotação; e subquadrado (D<S), que apresentam torque e potência em baixas rotações. ❖ Quanto à rotação Os MCIs podem ser classificados em: ▪ Lentos: n < 600 rpm ▪ Médios: 600 < n < 1500 rpm ▪ Rápidos: n > 1500 rpm Os MIFs tendem a ser motores rápidos. Já os MIEs, quando aplicados industrialmente ou em navios são lentos e médios, e quando aplicados em veículos de passageiros ou veículos comerciais são rápidos. 23 ❖ Quanto à fase do combustível Os MCIs podem ser classificados quanto à fase do combustível que utilizam, liquida como a gasolina, o etanol ou o óleo Diesel, e gasosa, como o gás natural veicular (GNV). ❖ Quanto à potência específica As novas e restritivas regulamentações para as emissões veiculares vêm forçando as montadoras a investir pesado no desenvolvimento de MCIs mais eficientes: 𝐍𝐞específica = 𝐍𝐞 𝐕T Onde: ▪ Neespecífica: potência efetiva específica ▪ Ne: potência efetiva ▪ VT: cilindrada total – Vd Estes novos MCIs apresentam aumento de torque e potência para uma mesma cilindrada total (VT), habitualmente com o uso da sobrealimentação, ou uma redução da cilindrada total para uma mesma potência ou ainda a redução de cilindros (z). MCIs mais eficientes são os que consomem menos combustível e, consequentemente, que emitem menos poluentes para um mesmo trabalho. Isto, entre outros, é possível em razão da redução das perdas por bombeamento do motor, devido ao menor volume deslocado pelos pistões a cada rotação do motor e a maior pressão no cilindro; do maior aproveitamento térmico no trabalho de expansão dada uma menor transferência de calor devida à redução da área de superfície interna; e da redução das perdas por atrito, seja pelo tratamento de baixo atrito de alguns componentes, seja pela dimensão menor dos componentes do motor. O MCI vem sendo otimizado passo-a-passo desde a sua invenção, conforme novas tecnologias foram sendo desenvolvidas,e a principal otimização é a redução dos deslocamentos volumétricos com o passar do tempo. A diminuição da cilindrada não é recente, mas foi só recentemente que o termo downsizing foi cunhado para 24 denominar esta evolução que agregava algumas soluções técnicas que proporcionavam aumento de eficiência, permitindo assim o aumento do torque e da potência enquanto havia a redução da cilindrada e do consumo de combustível. Dentre estas soluções, podemos listar a câmara de combustão multiválvula (mais de uma válvula de admissão e escape para melhor enchimento e escape), o eixo comando de válvulas variável na admissão e/ou escape, sobrealimentação, injeção direta de combustível, tratamentos para a redução de atrito etc. 1.2 Aplicações dos motores alternativos Segundo Brunetti (2012), a escolha de um MCI para uma determinada aplicação é importante para garantir a melhor eficiência a esta aplicação. Entretanto, outras características dos motores devem ser observadas como volume, peso, ruído, vibrações, consumo de combustível, emissões, potência máxima, durabilidade, robustez, confiabilidade, facilidade de manutenção, custo operacional etc. Muitas vezes, pode haver mais de uma possível solução a uma aplicação e caberá à montadora aportar o seu conhecimento ou estratégia para definir a melhor solução. Os MIFs a 4T possuem uma baixa relação peso-potência ou volume-potência, além de possuir um funcionamento suave em todas as faixas de rotação, baixo custo inicial e baixa complexidade. São mais adequados aos veículos de passageiros e podem ainda ser utilizados em pequenos veículos comerciais, empilhadeiras, aplicações estacionárias, geradores, pequenas embarcações esportivas e pequenos aviões. Os MIFs a 2T possuem custo inicial inferior aos MIFs a 4T, porém apresentam elevado consumo específico de combustível e baixa durabilidade dos componentes devido a lubrificação precária, o que os tornam mais caros no longo prazo. Logo, eles limitam-se a aplicações de baixa potência. Ademais, são motores poluentes, ruidosos e instáveis em algumas faixas de rotação, sendo aplicados a pequenas motocicletas, pequenas embarcações, aplicações estacionárias, geradores, cortadores de grama, motosserras etc. 25 Os MIEs caracterizam-se por uma elevada eficiência térmica, porém apresentam um custo inicial elevado e funcionamento pouco suave. Possuem durabilidade, robustez e confiabilidade elevados, além do baixo custo operacional. Existem aplicações com potência superior a 30000 cv, sendo que acima de 4000 cv, geralmente são MIEs a 2T visto que não possuem as mesmas desvantagens dos MIFs a 2T. São habitualmente aplicados nos veículos comerciais, ônibus, navios, locomotivas, tratores, máquinas de construção civil, aplicações estacionárias, geradores e veículos de passageiros em alguns países com pesadas regulamentações de emissão. 1.3 Ciclos-padrão a ar O FA é muito complexo, sua composição varia durante os processos e os processos (físicos e químicos) por si só são complexos, tornando difícil o estudo dos ciclos do motor (BRUNETTI, 2012). Consequentemente, um ciclo real é associado a um ciclo- padrão (teórico) de modo a facilitar o estudo, a obter conclusões qualitativas e até quantitativas, utilizando hipóteses simplificadoras que guardem semelhança com o ciclo real e permita a aplicação da termodinâmica. Seguem as hipóteses: 1. O FA é ar (sem combustível); 2. O ar comporta-se como um gás perfeito (G.P.); 3. Não há admissão nem escape, o sistema é fechado (S.F.) só ocorrendo a troca de calor e/ou trabalho com o meio, permitindo a aplicação da 1ª Lei da Termodinâmica no lugar da 1ª Lei para Volume de Controle; 4. Os processos de compressão e expansão são considerados isentrópicos (adiabáticos) e reversíveis; 5. A combustão é substituída pela adição de calor ao FA a partir de uma fonte externa. Tal fornecimento de calor poderá ocorrer num processo isocórico, ou num isobárico, ou numa combinação dos dois a depender do ciclo; 6. A abertura da válvula de escape é substituída pela retirada de calor (rejeição) por uma fonte fria, num processo isocórico, restituindo o FA ao seu estado inicial; 7. Todos os processos são considerados reversíveis. 26 Segue uma breve recapitulação sobre os processos termodinâmicos: ▪ Processo reversível: é aquele que transcorridos os estados intermediários retorna ao estado inicial sem perda de energia. ▪ Processo irreversível: é aquele que transcorridos os estados intermediários retorna ao estado inicial com perda de energia (na prática, os processos são irreversíveis devido às perdas por atrito). ▪ Principais processos: o Isobárico: pressão (p) constante; o Isocórico: volume (V) constante; o Isentrópico: entropia (S) constante; o Isotérmico: temperatura (T) constante; o Adiabático: sem troca de calor. ▪ Ciclo: sequência de processos que leva a um estado final coincidente com o inicial. A diferença entre os ciclos teóricos está na fase de fornecimento de calor, sendo a volume constante no ciclo Otto (instantâneo) e a pressão constante no ciclo Diesel, durante a descida do pistão. 1.3.1 Ciclo Otto a 4T padrão a ar Representa o ciclo real do motor Otto (MIF) considerando as hipóteses apresentadas anteriormente. A figura a seguir apresenta dos diagramas p-V e T-S: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.22 – Diagramas p-V e T-S do ciclo Otto. 27 Segundo Brunetti (2012) e de acordo com a hipótese 3, temos quatro processos: ▪ 1-2, Compressão – isentrópico (adiabático): o FA é comprimido pelo trabalho de compressão (Wcompr, negativo) e definido pela área 1-2-V2-V1 no diagrama p-V; ▪ 2-3, Fornecimento de calor – isocórica: simula o calor liberado na combustão (Q2-3) instantaneamente ao pistão no PMS, definido pela área 2-3-S4-S1 no diagrama T-S; ▪ 3-4, Expansão – isentrópica (adiabática): o FA se expande com o trabalho de expansão (Wexp, positivo), definido pela área 3-4-V1-V2 do diagrama p-V; ▪ 4-1, Retirada de calor – isocórica: simula o calor rejeitado nos gases ao abrir da válvula de escape (Q4-1), definido pela área 4-1-S1-S4 no diagrama T-S. O trabalho útil do ciclo, ou simplesmente trabalho do ciclo (Wc), e o calor útil (Qu) são apresentados a seguir: Wc = Wexp – Wcompr = área 1-2-3-4 no diagrama p-V Qu = Q2-3 – Q4-1 = área 1-2-3-4 no diagrama T-S Para qualquer motor térmico, a equação da eficiência térmica é: ηt= Wc Q2-3 = Q2-3-Q4-1 Q2-3 =1- Q4-1 Q2-3 =1- T4-T1 T2-T3 =1- T1 T2 ( ( 𝑻𝟒 𝑻𝟏 ) − 𝟏 ( 𝑻𝟑 𝑻𝟐) − 𝟏 ) Como rv= V1 V2 (taxa de compressão) e k= Cp Cv (razão entre os calores específicos do FA), temos: T1 T2 = ( V2 V1 ) k-1 = 1 rvk-1 e como T4 T3 = ( V3 V4 ) k-1 = ( V2 V1 ) k-1 = T1 T2 Temos T4 T1 = T4 T3 * T3 T2 * T2 T1 = T3 T2 e, finalmente, ηt=1- 1 rvk-1 Assim sendo, a eficiência térmica do ciclo Otto cresce ao aumentar a taxa de compressão e, quanto maior o valor de k, maior será o valor de eficiência do ciclo. 28 A seguinte figura apresenta a variação qualitativa da eficiência térmica (ηt) do ciclo Otto, com a taxa de compressão (rv), para FA com diferentes fatores de k: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.23 – Variação qualitativa da eficiência térmica de um ciclo Otto. Nota-se que quanto maior for a taxa de compressão menor será o ganho em eficiência térmica. Os resultados teóricos obtidos para o ciclo Otto correspondem qualitativamente com a realidade, onde podemos verificar o aumento da eficiência térmica de acordo com o aumento da taxa de compressão. Ademais, quanto maior a taxa de compressão nos motores do ciclo Otto, maior será o risco de autoignição, dependendo da resistência do combustível (TAI), e de detonação. Vale lembrar também que, para os gases reais, o valor da razão k declina com o aumento da temperatura. 1.3.2 Ciclo Diesel a 4T padrão a ar Representa o cicloreal do motor Diesel (MIE) e, como já informado anteriormente, a única diferença entre os ciclos Diesel e Otto se refere ao processo de fornecimento de calor ao FA que será isobárico ao invés de isocórico. Os diagramas reais dos ciclos Diesel e Otto são semelhantes em formato. 29 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.24 – Diagramas p-V e T-S do ciclo Diesel. Os conceitos apresentados no ciclo Otto sobre as áreas nos diagramas permanecem válidos, de sorte que a área 1-2-3-4 no p-V é o Wc e a área 1-2-3-4 no T-S é o Qu = Q2-3 – Q4-1. Assim, a equação da eficiência térmica do ciclo-padrão a ar com adição de calor a pressão constante é: ηt=1- 1 rvk-1 * [ ( T3 T2 ) k -1 k ( T3 T2 -1) ] Para uma mesma taxa de compressão, a eficiência térmica do ciclo Otto é sempre maior que a do ciclo Diesel, ou seja, a combustão a volume constante é mais eficiente que a combustão à pressão constante. Todavia, como os motores do ciclo Diesel podem usar taxas de compressão maiores, na prática eles são mais eficientes termicamente, conforme a figura a seguir que inclui também o ciclo Misto ou Sabathé: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.25 – Comparação entre a eficiência térmica e a taxa de compressão. 30 1.3.3 Outros ciclos Existem outros ciclos de combustão no mercado que não farão parte do nosso estudo. Os mais importantes são: ciclo Misto ou de Sabathé, ciclo Atkinson e ciclo Miller. 1.3.4 Comparação dos ciclos reais com os ciclos teóricos Embora os valores obtidos para misturas e produtos de combustão com os diagramas teóricos apresente alguma melhoria, eles ainda não são aderentes aos valores reais. É obvio que esta falta de aderência está mais relacionada com os processos ideais adotados e menos com o comportamento do FA, dado que estes diagramas permitem uma boa aproximação aos valores reais. A seguinte comparação baseia-se no ciclo Otto padrão a ar (MIF), mas os conceitos introduzidos poderiam ser adaptados para a comparação de qualquer outro ciclo real com o seu correspondente teórico. A figura abaixo apresenta a sobreposição de um ciclo Otto com o real correspondente, quer dizer, mesma taxa de compressão (rv), mesmo volume total (V1) e mesmo calor adicionado ao ciclo. As letras A, B, C e D indicadas no diagrama representam os fenômenos expostos na sequência. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 1.27 – Sobreposição de um ciclo Otto padrão a ar com o real. A. Admissão e escape: esses processos não estão presentes no ciclo teórico e a área compreendida pelos dois se constitui num trabalho negativo usado para a 31 troca do fluido no cilindro. Esse trabalho de “bombeamento” é usualmente incorporado no trabalho perdido por atrito. Será tão maior quanto maiores forem as perdas nos dutos de admissão e escape. Nos motores com corpo de borboleta (controle de carga através da restrição de fluxo), esta área será tão maior quanto mais fechada estiver a borboleta do acelerador, uma vez que a perda de carga provocada fará cair a curva de admissão para uma posição inferior à da pressão atmosférica. Se os dutos forem bem desenhados, o motor em plena aceleração deveria apresentar uma área praticamente desprezível. B. Perdas de calor: os processos de compressão e expansão do ciclo teórico são considerados isentrópicos, ao passo que no ciclo real as perdas de calor são sensíveis. A diferença não é tão grande na compressão, mas na expansão, quando a diferença de temperatura entre o cilindro e o meio é muito grande, a troca de calor será igualmente grande e, consequentemente, os dois processos se afastarão sensivelmente. C. Perda por tempo finito de combustão: a combustão é considerada instantânea no ciclo teórico uma vez que o processo é considerado isocórico. Na realidade, a combustão leva um tempo significante em relação à velocidade do pistão. Assim, a faísca deve ser dada antes do PMS e a expansão se inicia antes da combustão alcançar a máxima pressão possível. É claro que, ao adiantar a faísca até determinado ponto, perde-se área na parte inferior do ciclo, no entanto ganha-se na parte superior e, ao atrasar, acontece o contrário, de tal maneira que a faísca deve ser estudada visando obter a menor diferença possível na perda de áreas (trabalho). O momento ideal de ignição é aquele que faz com que o balanço do trabalho negativo na compressão e do trabalho positivo na expansão seja o máximo possível. Normalmente, tal momento de ignição é chamado de maximum brake torque (MBT), isto é, o avanço de ignição que gera o maior torque possível para a condição de operação. D. Perdas pelo tempo finito de abertura da válvula de escape: o escape foi substituído por uma expansão isocórica no ciclo teórico, rejeitando calor para uma fonte fria. O tempo para o processo de escape no ciclo real é finito e, 32 portanto, a válvula deve ser aberta com uma certa antecedência. Quanto mais adiantada for a abertura em relação ao PMI, mais irá se perder área na parte superior e menos na parte inferior, e vice-versa. Desta forma, o momento de abertura da válvula de escape tem o objetivo de otimizar a área nessa região. É o resultado entre o balanço do trabalho gasto no final do curso de expansão e o trabalho necessário para expulsar os gases queimados no tempo de escape. Estima-se que o trabalho do ciclo real seja da ordem de 80% do trabalho do ciclo- padrão a ar correspondente. Claramente, com os diagramas para misturas, a aproximação é melhor. A perda de trabalho poderia ser assim distribuída: aproximadamente 60% às perdas de calor (B), cerca de 30% ao tempo finito de combustão (C) e em torno de 10% à abertura da válvula de escape. É claro que estes valores são médios, podendo ser alterados em alguns casos particulares. Conclusão Este primeiro bloco serviu para introduzir os conceitos fundamentais dos motores de combustão interna (MCI). Nele, foram apresentadas as suas definições, nomenclaturas básicas e de cinemática, as diversas classificações dos motores e, finalmente, foram apresentados os principais ciclos de combustão, sejam eles teóricos para fins educativos, sejam eles reais e as suas diferenças. Este bloco foi o alicerce para que possamos nos aprofundar nos diferentes sistemas dos motores. 33 REFERÊNCIAS BRUNETTI, F. Motores de Combustão Interna – Volume I. São Paulo: Blucher, 1 jan. 2012. MARTINS, J. Motores de Combustão Interna. 5. edição. Portugal: Engebook, 01/01/2016. SWAROOPVARMA. Cutaway view of a V-6 engine. Wikimedia Commons, 2006. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:IC_engine.JPG>. Acesso em: 15/04/2021. 34 2 COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES E SISTEMA DE LUBRIFICAÇÃO Apresentação Este bloco irá abordar os diferentes tipos de combustíveis em utilização no mercado, assim como as suas características e aplicações. Serão apresentados também as características e aditivações dos lubrificantes, de modo a compreender a sua importância para os MCIs e, na sequência, iremos estudar o sistema de lubrificação dos motores. 2.1 Combustíveis Os combustíveis, principalmente o querosene e o gás natural, passaram a ser utilizados a partir da metade do século XIX basicamente para iluminação, iniciando o desenvolvimento da indústria do petróleo. Ao final deste século, a demanda pela gasolina começa a aumentar devido ao crescimento do transporte motorizado, porém esta gasolina era basicamente composta por leves destilados do petróleo e apresentava baixa resistência à detonação. A adição de álcoois etílico e metílico se mostrou eficaz resolução deste problema. Na 2ª Guerra Mundial, o consumo de petróleo aumentou consideravelmente e o esforço de guerra proporcionou a criação de novos processos de refino e a descoberta de novos catalisadores, possibilitando o surgimento da indústria petroquímica. As crises do petróleo de 1973 e 1979 proporcionaram o desenvolvimentode combustíveis alternativos, porém poucos países adotaram a sua utilização em larga escala. Um destes poucos países foi o Brasil, que criou em 1975 o Programa Brasileiro de Álcool, o PróÁlcool. Apesar de já adicionar álcool etílico à gasolina desde 1935, ao teor de 5%, foi somente a partir de 1980 que o teor aumentou para 20-22% e, mais recentemente, para 22-27%, variação dada em função da sazonalidade da produção do etanol. 35 O petróleo bruto é uma mistura complexa de compostos orgânicos (com carbono) e inorgânicos (sem carbono), com predominância de hidrocarbonetos (HC), desde o metano (CH4), o mais simples, até os aromáticos, mais complexos, como o benzeno (C6H6). O petróleo é composto elementarmente de: ▪ Carbono (C): 83,90 a 86,80%m (em massa) ▪ Hidrogênio (H): 11,40 a 14,00%m ▪ Enxofre (S): 0,06 a 9,00%m ▪ Nitrogênio (N): 0,11 a 1,70%m ▪ Oxigênio (O): 0,10 a 2,00%m ▪ Metais diversos: 0,30%m Algumas impurezas são encontradas na composição do petróleo bruto, como segue: ▪ Compostos sulfurados: são os principais responsáveis pela corrosividade, mau cheiro e efeito poluidor dos produtos derivados do petróleo; ▪ Compostos nitrogenados: causam o escurecimento dos derivados com o tempo, devido à sua oxidação; ▪ Compostos oxigenados: conferem caráter ácido aos derivados; ▪ Compostos organometálicos: são compostos, em sua maioria, de ferro, níquel, cobre e vanádio, sendo envenenadores para catalisadores de processamento e causam corrosão a altas temperaturas; ▪ Água, sais minerais, areia e argila: são causadores de corrosão e depósitos durante o processamento do petróleo. A queima do petróleo bruto irá produzir monóxido e dióxido de carbono (CO e CO2), vapor de água, hidrocarbonetos não queimados e óxidos de nitrogênio (NOx), contribuindo para as emissões de gases do efeito estufa e para a poluição atmosférica (fumaça e particulados). No refino, o petróleo bruto é separado em diversas frações que são na sequência processadas quimicamente para produzir os seus derivados. A destilação fracionada produz os seguintes derivados, dos mais leves aos mais pesados: 36 ▪ Gases (butano, propano, GNV, GLP etc.); ▪ Gasolina e solventes; ▪ Querosene e petróleo; ▪ Óleo Diesel; ▪ Óleos combustíveis (leves e pesados); ▪ Parafinas; ▪ Óleos lubrificantes; ▪ Betumes; ▪ Asfaltos; Em torno de um terço do petróleo bruto irá produzir gasolina, outro terço o óleo Diesel e o restante irá produzir os demais derivados. Os principais combustíveis derivados do petróleo utilizados atualmente nos MCIs são as gasolinas, os óleos Diesel, o querosene de aviação e os óleos combustíveis marítimos. 2.1.1 Propriedades dos combustíveis Os combustíveis apresentam diferentes propriedades que definem a maneira como eles reagem. As principais propriedades são apresentadas a seguir: ▪ Estequiometria da combustão: os combustíveis são hidrocarbonetos (HC), ou seja, são constituídos de hidrogênio e carbono que reagem com o oxigênio do ar (O2). Desta forma, combustíveis com diferentes proporções de HC irão reagir com proporções diferentes de O2. Conhecendo a proporção de oxigênio no ar (23%) e a relação HC de um combustível, é possível calcular a relação ar-combustível para a sua reação estequiométrica (ver bloco 4). ▪ Pressão de Vapor Reid e temperatura de ebulição: a Pressão de Vapor de Vapor Reid (PVR) é a pressão de vapor de uma mistura líquido-vapor a 37,8°C. As gasolinas e os óleos Diesel são misturas de diversos HC com diferentes temperaturas de ebulição, apresentando assim uma curva de destilação. A composição da gasolina varia com as estações do ano, alterando sua curva de destilação, para no inverno haver suficiente vaporização que permita a partida a frio e, no verão, menor pressão de vapor caso o veículo fique ao sol. A curva 37 de destilação apresenta ao menos 3 temperaturas importantes: o volume de combustível que vaporiza abaixo de 70°C deve ser suficiente para a partida a frio, o volume de vaporização acima de 100°C determina a qualidade de aquecimento do motor e a rápida resposta de aceleração, e a quantidade de líquido disponível a 150°C deve ser a menor possível para minimizar a diluição do lubrificante. ▪ Calor latente de vaporização: os combustíveis líquidos devem ser vaporizados para que se misturem ao ar, necessitando assim de calor (latente de vaporização) que é retirado do ar que então resfria. Este arrefecimento nos MIFs é benéfico, pois provoca o arrefecimento da câmara de combustão, permite o uso de taxa de compressão mais elevada e, portanto, aumenta o rendimento do motor. ▪ Ponto de fulgor: é a temperatura de um combustível na qual se produz uma mistura estequiométrica do seu vapor com o ar, entrando facilmente em ignição, seja através de uma faísca ou espontaneamente. Desta forma, o ponto de fulgor mostra a inflamabilidade de um combustível. Quando a temperatura ambiente se aproxima do ponto de fulgor do combustível, aumenta drasticamente a probabilidade de ignição e propagação de chama, pois a existência dos vapores do combustível misturados com ar se aproxima da razão estequiométrica, sendo um risco para o manuseio e estocagem do combustível. Valores muito baixos ou altos do ponto de fulgor não produzirão misturas combustíveis, dado que ficarão muito ricas ou pobres. ▪ Limites de explosividade: para que haja uma combustão completa num MIF, é necessário que a mistura esteja dentro de alguns limites, os limites de explosividade. O Limite Inferior de Explosividade (LIE) é a menor concentração de combustível que misturado ao ar forma uma mistura inflamável, abaixo deste nível a mistura é pobre e não queima, e o Limite Superior de Explosividade (LSE) é a maior concentração de combustível que misturado ao ar forma uma mistura inflamável, e acima deste nível a mistura é rica e não queima. Estes valores são apresentados em porcentagens volumétrica. 38 ▪ Temperatura de autoignição: a mistura, quando aquecida, chega a uma temperatura na qual inicia a sua combustão espontaneamente, é a temperatura de autoignição. ▪ Temperatura adiabática de chama: é a temperatura do final da combustão de uma mistura, sem trocas de calor, isto é, a maior temperatura da combustão. A produção de óxidos de nitrogênio (NOx) está ligada à temperatura de chama, ou seja, quanto maior for esta temperatura, maior será a produção do NOx. Misturas pobres ou com a adição de gases de escape (recirculação dos gases de escape – RGE) causam temperaturas de chama mais baixas. Contudo, quanto maior for a temperatura (média e máxima), maior será o rendimento. ▪ Poder calorífico: é a quantidade de energia química disponível num combustível. Ele é medido a partir da quantidade de calor extraída durante a combustão. O poder calorífico superior (PCS) é a soma da energia liberada em forma de calor e da energia de vaporização da água, que é um dos constituintes dos gases de escape, e o poder calorífico inferior (PCI) é apenas a energia liberada em forma de calor. Se o combustível não possuir hidrogênio em sua composição, não haverá formação de água e, portanto, PCI será igual ao PCS. 2.1.2 Gasolina A gasolina é um derivado do petróleo produzido a partir de sua destilação fracionada, contendo cadeias de hidrocarbonetos de 4 a 12 carbonos, estando a maioria entre 5 e 9. No Brasil, são assim classificadas: ▪ Gasolina A: isenta de álcool etílico anidro, com comercialização restrita somente a refinadores e distribuidores; ▪ Gasolina C: com adição de álcool etílico anidro na ordem de 22% em volume, podendo chegar a 27% dependendo da sazonalidade da produção de etanol, comercializada nos postos de abastecimento. Nota: o chumbo foi banido da gasolina no Brasil em 1989. 39 São adicionados à gasolina aditivos que visam reduzir os depósitos nas válvulas, topo do pistão e nos injetores, melhorara combustão, reduzir o atrito entre os componentes, inibir a corrosão e reduzir a formação de precipitados durante a armazenagem. A combustão da gasolina, iniciada pela faísca, abre uma frente de chama esférica na câmara de combustão, se estendendo a todo o volume da mistura até o cilindro. Assim, a gasolina deve suportar pressões e temperaturas elevadas durante a combustão sem que a mistura não queimada entre em combustão irregular, chamada de detonação, que se caracteriza por pressões muito altas e frequências vibracionais destrutivas, conhecida popularmente como “bater pino”. Portanto, a gasolina deve ter alta resistência à detonação. Os combustíveis dos MIFs possuem uma característica muito importante que influencia no desempenho dos motores, chamada octanagem, número de octano (NO) ou poder antidetonante. Ela é a capacidade de resistência do combustível, em mistura com o ar, à autoignição, responsável pela detonação. Quanto maior for a octanagem, maior será a resistência à detonação. Esta propriedade determina a possível taxa de compressão do motor e, indiretamente, a velocidade da combustão. Quanto maior for a octanagem de um combustível, mais eficiente será a sua queima devido a possibilidade de usar uma taxa de compressão maior. Por outro lado, um combustível de alta octanagem em um motor de baixa taxa de compressão terá o mesmo rendimento de um combustível de baixa octanagem nele. Existem dois métodos diferentes para caracterizar a octanagem de um combustível, um caracteriza o motor em alta rotação (método MON – Motor Octane Number) e o outro a baixa rotação (método RON – Research Octane Number). Como as temperaturas das misturas e os avanços de ignição não são iguais, os valores dos métodos são diferentes, sendo os de RON habitualmente superiores aos de MON. Como MON e RON não apresentam o poder antidetonante dos combustíveis em condições normais, foram desenvolvidos testes para determinar a “octanagem de estrada”. 40 O Índice AntiDetonante (IAD) é uma boa aproximação desta octanagem, e é calculado da seguinte forma: IAD=(MON+RON)/2. No Brasil, assim como nos EUA, a octanagem é expressa pelo IAD enquanto a Europa utiliza os valores de RON. A gasolina comum no Brasil possui um IAD de 87, a premium de 91 e a Podium (Petrobrás) 95. Para efeito de comparação, nos EUA, a comum possui IAD de 87, a gasolina intermediária (mid-grade) de 89 e a premium 91. Na Europa, a premium apresenta um RON de 90 e a super premium, 93. Os motores são desenvolvidos para poderem rodar em todo o país, assim, é considerado durante o desenvolvimento (definição da taxa de compressão) o combustível que é mais facilmente encontrado pelo país, no caso, a gasolina comum (IAD = 87). Logo, consumir uma gasolina de melhor desempenho não trará maior desempenho ao motor. Caso o motor tenha alta taxa de compressão, deve-se utilizar um combustível com maior octanagem sob risco de perda de potência e detonação. Com o passar do tempo, a octanagem requerida por um motor aumenta, dados os depósitos acumulados nas paredes dos cilindros e nas câmaras de combustão, que dificultam a troca de calor e aumentam a taxa de compressão. É por isso que muitas vezes vemos veículos mais antigos detonando (“batendo pino”). 2.1.2 Óleo Diesel Nota: iremos chamar o combustível por diesel, enquanto o ciclo térmico será designado por Diesel. O óleo diesel é um derivado do petróleo produzido a partir de sua destilação fracionada, contendo cadeias de hidrocarbonetos maiores que as da gasolina. É o combustível mais polivalente e de maior consumo no mundo, sendo utilizado em veículos de passageiros (em alguns mercados) e comerciais, no ramo agrícola, ferroviário, marítimo, industrial, na geração de energia elétrica e até no aquecimento residencial (calefação). É compreensível, então, que o óleo diesel possua diversas propriedades para as diversas aplicações. Mesmo nas aplicações veiculares, a composição e propriedades do diesel varia bastante devido as regulamentações de cada país. No Brasil, o diesel recebe a adição de 12% de biodiesel de base éster, de fonte renovável, sendo aproximadamente 80% feito a partir da soja. 41 Os combustíveis dos MIEs devem possuir características de autoignição, que é determinada pela cetanagem ou número de cetano (NC). Ela representa a facilidade do combustível em entrar em autoignição e influencia a partida do motor, o funcionamento sob carga e as emissões. A medição da cetanagem utiliza os mesmos princípios da medição da octanagem, e os seus valores variam no mundo entre 40 e 55. Quanto maior for o seu valor, mais suave será o funcionamento do motor e menores serão as emissões, porém menor será o seu poder calorífico, ao contrário da octanagem. Desta forma, o aumento da cetanagem a partir de um determinado ponto não é interessante, pois irá causar o aumento do consumo de combustível. O diesel apresenta uma densidade maior que a gasolina, portanto um menor consumo quando medido em volume. Como derivado do petróleo, tem características lubrificantes, porém a contínua diminuição dos teores de enxofre no diesel tem diminuído a sua lubricidade, apesar de ser benéfico para as emissões do outro lado. O TAI do diesel não é superior à temperatura de vaporização, assim, parte de seus componentes não serão vaporizados após a queima, diferentemente da gasolina, porém apresenta poder calorífico similar à gasolina. 2.1.3 Compostos oxigenados Os compostos oxigenados são basicamente os álcoois, os éteres e os ésteres. Os álcoois mais utilizados no mundo como combustível são o metanol e o etanol, se caracterizando por serem hidrocarbonetos parcialmente oxidados. Já os éteres são hidrocarbonetos com um átomo de oxigênio, são líquidos ou gasosos e muito inflamáveis. Os ésteres (biodiesel) são produzidos a partir da esterificação de óleos vegetais (ácidos gordos) em reação com o metanol, sendo o processo mais comum o de transesterificação. O biodiesel será tratado no próximo item junto com os óleos vegetais. Em relação à gasolina, possuem poder calorífico 30% menor, logo, um maior volume de combustível deve ser alimentado para um mesmo volume de ar admitido (maior consumo em volume). Ademais, possuem alto calor latente de vaporização, o que permite maior enchimento do motor, por retirar mais calor do ar da mistura, deixando-o mais frio e, portanto, com maior massa específica (menor volume), ou seja, 42 mais ar entra no cilindro e a combustão gera mais energia. Na prática, o elevado calor latente de vaporização compensa um pouco o poder calorífico mais baixo. A octanagem dos oxigenados é maior do que a da gasolina e, quando misturados a ela, tendem a subir a octanagem dela justamente pelo maior calor latente de vaporização, que resfria a câmara de combustão e reduz a tendência de detonação, fazendo com que a octanagem suba. A alta octanagem permite taxas de compressão maiores, permitindo a operação com avanço de ignição mais alto que a gasolina, logo, apresentam maiores pressões de combustão e maior potência. Temos no Brasil a aplicação de dois tipos de etanol: ▪ Etanol anidro: com máximo teor de água de 0,4% em volume, é adicionado à gasolina e possui coloração alaranjada para não ser vendido como etanol hidratado (mais barato por não haver incidência de impostos). Sua mistura em teores maiores aporta ganho em eficiência térmica e potência aos motores, além de aumentar a octanagem; ▪ Etanol hidratado: incolor, é o etanol disponível nos postos de abastecimento. O máximo teor de água permitido é de 4,9% em volume. Apresenta problema de partida a frio abaixo de 12,7°C (ponto de fulgor do etanol) e necessita de um sistema de pré-aquecimento próximo ao injetor de modo a evitar os tanques de partida a frio com gasolina. Os oxigenados apresentam uma combustão seca, assim como o gás natural veicular (GNV),impactando a lubricidade dos componentes da câmara de combustão. Ademais, em excesso, podem lavar o cilindro, contaminando assim o lubrificante que poderá perder as suas propriedades básicas de lubrificação. Isso não ocorre com a gasolina e nem com o diesel, pois são subprodutos do petróleo e, de certa forma, são lubrificantes também. Eles atacam plásticos, resinas e elastômeros em geral, corroem materiais metálicos como o aço, alumínio e ligas, zinco e ligas. Quando misturados à gasolina, tendem a dissolver os depósitos de polimerização de olefinas, formando uma goma que se acumula em algumas regiões do veículo como no tanque, linha e filtro de combustível, 43 galeria de injeção e injetores, dutos e válvulas de admissão, além do sistema de blow-by (respiro e separação de óleo do motor). Neste caso, a única solução é utilizar aditivos detergentes junto aos oxigenados. 2.1.4 Óleo vegetais (ácidos gordos) São combustíveis alternativos ao diesel (MIEs) e compostos por substâncias oriundas de biomassa (renováveis). Estes óleos são extraídos de oleaginosas, como soja, girassol, mamona, dendê, canola, entre outros, e são esmagadas, filtradas, degomadas e refinadas para o uso nos motores. Puros ou em mistura com o diesel, apresentam uma série de problemas resultantes de sua combustão incompleta, como dificuldade de partida a frio, formação de depósitos nos injetores, formação de depósitos nos cilindros (redução das trocas térmicas e aumento de hidrocarbonetos não queimados – emissões), formação de laca, diluição do óleo, entupimento dos dutos de lubrificação, entre outros. Todos estes problemas acabam por limitar o uso destes óleos como combustíveis. O biodiesel apresenta uma estrutura química diferente dos óleos vegetais tradicionais graças ao seu processo de transesterificação que produz ésteres de cadeias menores, tornando-o um combustível mais adequado, não demandando qualquer alteração no motor para utilizá-lo. Seu menor poder calorífico (10% menor do que o Diesel) é compensado por sua maior massa específica. É um combustível perfeitamente miscível ao diesel, apresenta cetanagem maior do que o diesel devido aos ésteres dos óleos vegetais, por ser um composto oxigenado reduz a produção de CO e de particulados, com teores de enxofre e aromáticos quase nulos, mais lubrificante do que o diesel o que aumenta a durabilidade dos componentes e apresenta ponto de fulgor mais alto do que o diesel, deixando-o mais seguro para ser manipulado e estocado. Entretanto, o biodiesel pode atacar alguns tipos de tintas e elastômeros, há a diluição do lubrificante, a formação de depósitos na válvula de admissão, apresenta alta oxidação e degradação. 44 2.2 Lubrificantes Os óleos lubrificantes são derivados do petróleo bruto assim como a gasolina e o diesel, e são responsáveis por formar uma fina película de óleo entre os componentes metálicos com movimento relativo, evitando o contato metal-metal que poderia gerar um engripamento (fusão entre os componentes). Eles são produzidos a partir da destilação do petróleo e são denominados minerais, enquanto outros óleos que são produzidos por processos químicos, mesmo que a base seja o petróleo bruto, são denominados sintéticos. Os lubrificantes não limitam apenas a lubrificar o motor e os seus componentes, na verdade existe uma série de funções que eles exercem e benefícios que entregam, como segue: ▪ Reduzir o atrito e o desgaste: economia de combustível, aumento de desempenho e de durabilidade do motor; ▪ Trocar calor: auxilia no aquecimento do motor na fase fria e retira calor dos componentes em funcionamento; ▪ Proteger contra corrosão: protege os componentes metálicos da corrosão de alguns combustíveis; ▪ Limpar e manter limpo: resistência à carbonização (formação de depósitos), detergentes e dispersantes; ▪ Vedar: vedação de possíveis comunicações externas e entre pistão e cilindro (diluição); ▪ Transmitir energia: pressão e vazão do óleo na lubrificação do motor, acionamento de componentes (tensionadores, polia variadora de fase etc.); ▪ Durabilidade do próprio lubrificante: estabilidade térmica; ▪ Proteção contra reações químicas: antioxidantes, passivadores etc.; ▪ Limitação do ruído: insulamento acústico do motor; ▪ Propriedades a frio: facilidade de partida a frio, redução de fuligem e borra. 45 2.2.1 Propriedades Os lubrificantes possuem diversas propriedades de modo a poder atender as suas finalidades. São listadas abaixo as propriedades mais importantes: ▪ Viscosidade: indica a “facilidade” que um fluido tem a escoar. Fluidos finos são menos viscosos (ex.: água) e fluidos grossos são mais viscosos (ex.: óleo); ▪ Índice de viscosidade (Iv): a viscosidade dos óleos diminui com a temperatura, mas a variação dos óleos de alto Iv é menor do que os óleos da baixo Iv a uma mesma temperatura; ▪ Ponto de fluidez: é a menor temperatura na qual o óleo é capaz de fluir por efeito da gravidade; ▪ Oleosidade: é a capacidade do óleo aderir a uma superfície metálica por adsorção; ▪ Corrosão: o lubrificante deve ter uma proteção contra corrosão, pois eles se oxidam com o tempo e formam ácidos orgânicos que são corrosivos; ▪ Espuma: a presença de gás e vapores, além do contato do lubrificante com peças móveis (ex.: virabrequim), formam espuma que aumentam a oxidação do óleo; ▪ Emulsão: a formação de emulsão se dá quando pequenas gotas de água ficam retidas nos óleos; ▪ Detergência: o lubrificante é detergente/dispersante se for capaz de dissolver os depósitos; ▪ Estabilidade: é a resistência à oxidação de modo a evitar a formação de ácidos, vernizes e sedimentos; ▪ Massa específica: é a densidade; ▪ TBN (Total Base Number, reserva alcalina): é uma medida do potencial alcalino do lubrificante para anular os ácidos dos gases de combustão; 46 ▪ TAN (Total Acid Number): é uma medida de acidez necessária para anular os ácidos em um grama do óleo; ▪ Resistência à extrema pressão: pressões muito elevadas podem romper o filme de óleo entre dois componentes, gerando um aumento da temperatura local por atrito, a perda de metal e, finalmente, o engripamento. 2.2.2 Aditivos Aditivos são adicionados aos lubrificantes de modo a promover todas as características que lhe são necessárias. Estes aditivos vão perdendo estabilidade ao longo do tempo, principalmente em condições extremas de funcionamento (baixas e altas temperaturas), devendo o lubrificante ser trocado por quilometragem ou por tempo. As partidas a frio do motor produzem condensação, ácidos e outros contaminantes que são absorvidos pelo lubrificante, reduzindo a sua capacidade de proteção do motor. Os aditivos modificam propriedades químicas e físicas, permitindo a correta atuação do lubrificante. Os aditivos têm o objetivo de: ▪ Melhorar a viscosidade; ▪ Reduzir a temperatura de solidificação (dispersantes); ▪ Limpar o motor; ▪ Inibir a formação de espuma; ▪ Inibir a oxidação; ▪ Inibir a corrosão; ▪ Reduzir o atrito. 2.2.3 Óleos sintéticos Os óleos sintéticos não necessitam de tantos aditivos uma vez que a sua composição já contém algumas das propriedades necessárias. São lubrificantes mais estáveis, principalmente em condições de funcionamento extremo (pressão e temperatura). Sua variação de viscosidade com a temperatura não é grande como nos lubrificantes minerais, possibilitando que o motor tenha pressão adequada em altas temperaturas, mesmo em marcha lenta, e baixa viscosidade em baixas temperaturas (possui maior índice de viscosidade). Eles não criam depósitos e apresentam boa fluidez em baixa 47 temperatura, possuem durabilidade muito superior aos minerais e podem ser trocados em passos de manutenção com o dobro e até o triplo do tempo de um mineral, dependendo das condições de funcionamento do motor. Sofrem menos degradação térmica quando submetidosa altas temperaturas de funcionamento e possuem menor volatilidade. Ademais, não apresentam enxofre e nitrogênio em sua composição, ao contrário dos lubrificantes minerais; o ponto negativo é o preço mais elevado. 2.2.4 Classificação Os lubrificantes possuem duas classificações, uma quanto à viscosidade e outra quanto à aplicação do motor: ▪ Classificação quanto à viscosidade: a instituição Society of Automotive Engineers (SAE) instituiu um sistema de código numérico para classificar as características de viscosidade dos lubrificantes (SAE J300). Desta forma, dois grupos de códigos indicam a viscosidade de um determinado óleo a frio, onde W refere-se ao inverno em inglês (winter), sendo 0W, 5W, 10W, 15W e 20W; e a quente, sendo 8, 12, 16, 20, 30, 40 e 50; por exemplo, 5W30. Assim, quanto menor o número da classificação a frio, menor será a sua temperatura de aplicação (ex.: 5W pode chegar a -30°C) e o mesmo ocorre ao contrário para o número da classificação a quente (ex.: 30 pode chegar a +45°C); ▪ Classificação quanto à aplicação do motor: a American Petroleum Institute (API) em conjunto com a American Society for Testing and Materials (ASTM) e a SAE, instituíram a referida classificação de modo a definir um nível mínimo de desempenho que cada óleo deveria ter para as diversas aplicações. Ela está em constante evolução de modo a acompanhar a evolução dos motores devido às constantes restrições regulamentares. Os lubrificantes para os MIFs são classificados por “S” de spark ignition (ignição por faísca em inglês) e uma segunda letra que indica o nível evolutivo do óleo e os lubrificantes para os MIEs são classificados por “C” de compression ignition (ignição por compressão em inglês) mais a segunda letra. 48 Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 2.1 – Classificação API para lubrificantes dos MIFs. Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 2.2 – Classificação API para lubrificantes dos MIEs. 49 2.3 Sistema de lubrificação O sistema de lubrificação é fundamental para o correto funcionamento do motor e para a manutenção da sua durabilidade. Esse sistema tem como principais funções: ▪ Reduzir o atrito entre componentes de movimento relativo; ▪ Impedir o contato metal-metal entre componentes, diminuindo o desgaste; ▪ Resfriar os componentes lubrificados; ▪ Auxiliar na vedação do motor e entre o pistão e cilindro; ▪ Proteger os componentes contra corrosão; ▪ Limpar, dispersar e eliminar depósitos e sedimentos; ▪ Evitar a formação de espuma. Algumas condições mínimas são necessárias para o bom funcionamento do sistema de lubrificação e a ausência de alguma destas pode causar danos graves ao MCI: ▪ Disponibilidade de lubrificante na quantidade apropriada; ▪ Lubrificante com propriedades adequadas; ▪ Acabamento das superfícies de contato; ▪ Definição dos materiais e dureza; ▪ Folgas entre os componentes; ▪ Pressão específica da superfície de contato; 2.3.1 Classificação Existem diferentes sistemas de lubrificação disponíveis no mercado: ▪ Lubrificação por salpico ou aspersão: é um sistema pouco utilizado, geralmente em motores pequenos. A lubrificação é realizada por aspersão do óleo, isto é, finas gotículas de óleo são arrastadas por turbulência. Esse sistema permite que o virabrequim entre em contato com o óleo, reduza a potência efetiva do motor e gere espuma: 50 Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.3 – Sistema de lubrificação por aspersão. ▪ Lubrificação dos motores a 2T: o lubrificante adicionado diretamente no combustível, em uma proporção de 1:20, pode ser adicionado diretamente no tanque de combustível ou através de um dosador na linha de combustível. A névoa formada pela mistura de combustível com lubrificante circula dentro do motor, que geralmente são de baixa potência (até 50 cv): Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.4 – Sistema de lubrificação de um motor a 2T. 51 ▪ Lubrificação sob pressão ou forçada: é o sistema de lubrificação mais aplicado no mundo, com uma bomba de óleo de deslocamento positivo distribuindo a vazão de óleo a uma dada pressão, através de orifícios, aos componentes móveis do motor: Fonte: adaptado de Donkie Speed, 2018. Figura 2.5 – Típico sistema de lubrificação. 2.3.2 Componentes do sistema de lubrificação A seguir, serão apresentados os principais componentes do sistema de lubrificação: ▪ Cárter de óleo: sua principal função é armazenar o lubrificante, porém possui outras funções como trocar calor, “calmar” o óleo (reservatório), separar o ar/espuma e ser elemento estrutural em conjunto com o bloco do motor. Recentemente, o cárter de óleo se tornou um sistema ao agregar outros componentes nele, como filtro e defletor de óleo, sensor de nível e trocador de calor. Possui duas configurações: 52 o Cárter úmido: armazena o óleo logo abaixo do motor, é o mais aplicado, porém impõe uma altura maior ao motor; o Cárter seco: o reservatório de óleo não faz parte do motor, sendo aplicado em motores horizontais e em motores de competição; ▪ Válvula PCV (Positive Crankshaft Ventilation – ventilação positiva do cárter): é a responsável pela ventilação positiva do cárter, direcionando os gases ao coletor de admissão, ou seja, a PCV deve regular a pressão do cárter gerado pelo bombeamento do motor. Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.6 – Funcionamento da válvula PCV. ▪ Bomba de óleo: pressuriza o óleo de modo a fazê-lo circular pelas galerias para chegar com pressão suficiente no cabeçote, ponto mais distante. Pode ser acionada de duas maneiras: diretamente pelo virabrequim, ou por engrenagens ou correntes quando a bomba está posicionada dentro do motor. Assim, quanto maior for a rotação do motor, maior será a vazão e a pressão do óleo. Dentre os vários sistemas de bombeamento, os principais são: por lóbulos (duocêntrica), engrenamento externo e engrenamento interno crescente: 53 Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 2.7 – Bombas de lóbulos, de engrenamento externo e de engrenamento interno crescente. As bombas são dimensionadas para a condição mais crítica de trabalho, isto é, baixa velocidade e alta temperatura. No entanto, ao satisfazer esta condição, a bomba fica superdimensionada para as demais condições, produzindo vazão em excesso e tendo a pressão controlada por uma válvula de alívio que, a partir de uma determinada pressão, permite um vazamento interno, baixando assim a pressão do óleo a um nível constante. Foi visando contornar este problema e reduzir o tamanho da bomba que foram desenvolvidas bombas de vazão variável. Elas possuem mecanismos internos que permitem a redução do deslocamento da bomba ao aumentar a rotação, reduzindo o consumo de potência da bomba e, consequentemente, o consumo de combustível, além de serem menores e mais leves: Fonte: adaptado de Karle, 2010. Figura 2.8 – Bomba de vazão variável com palhetas. 54 ▪ Válvula reguladora de pressão: é um sistema de segurança da bomba, sendo posicionada o mais próximo possível ou incorporada a ela, mantendo constante a pressão do óleo. Influencia significativamente na pressão, na temperatura e na viscosidade do óleo a vazão da bomba e o dimensionamento das galerias de óleo: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.9 – Válvula reguladora de pressão. ▪ Filtro de óleo: é responsável por filtrar o lubrificante, retendo contaminantes, resíduos da combustão e particulados. O filtro deve suportar a vazão e pressão do óleo nas piores condições, além de possuir resistência química, térmica e à partida a frio. Devem ser facilmente acessados de modo a facilitar a sua troca: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.10 – Filtro tipo módulo. 55 Basicamente, existem dois tipos de sistemas de filtragem: total, onde toda a vazão de óleo é filtrada e, por consumir muita potência do motor, é menos utilizada; e parcial, ondeapenas uma parte da vazão é filtrada (5-20%): Fonte: adaptado de Brunetti, 2012. Figura 2.11 – Sistema de filtragem total e parcial. ▪ Trocador de calor: é responsável por retirar calor do lubrificante em motores nos quais as temperaturas podem ser superiores a 120°C. Podem ser óleo-ar ou óleo-água, sendo de dois tipos: casco ou tubo, e placas, com a maior capacidade específica de troca de calor: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.12 – Trocador de calor por placas. 56 2.3.3 Blow-by É uma parcela dos gases da combustão, que passa pelos anéis dos pistões durante os ciclos de compressão e expansão. Esta mistura rica desce ao cárter entrando em contato com o óleo e depois é arrastada para a admissão de ar: Fonte: Brunetti, 2012. Figura 2.13 – Gases de blow-by através dos anéis. O blow-by e o consumo de óleo pelos pistões são efeitos opostos que ocorrem na região dos anéis. Um blow-by excessivo pode promover a diluição do óleo e, em casos extremos, quebrar o filme entre o conjunto pistão-anéis e o cilindro, podendo gerar um engripamento. Os gases de blow-by acabam carregando consigo gotículas de óleo e este óleo não pode passar pelo sistema de admissão e ser consumido pela combustão devido às emissões. Dessa forma, torna-se mandatória a separação de óleo dos gases de blow-by. Existem diferentes sistemas de separação do óleo, todos eles com o objetivo de garantir que a mistura rica seja enviada à admissão e o óleo separado retorne ao cárter. O uso do etanol pode contaminar o óleo de tal maneira que o sistema de ventilação (o mesmo da PCV) e de separação do óleo sejam entupidos por um gel com um aspecto de “maionese”, chamado gel de blow-by, e, se houver bloqueio dos dutos de ventilação, a pressão do cárter irá subir muito até que algum componente se rompa, gerando danos ao motor. 57 Fonte: Eichler, et al. 2014. Figura 2.14 – Ventilação dos gases de blow-by para consumo pela admissão de ar. 2.3.4 Razões para o consumo de lubrificante em um motor Algumas causas podem ser citadas: ▪ Mudança da viscosidade do óleo; ▪ Período de amaciamento do motor; ▪ Rotações e cargas de trabalho; ▪ Condição mecânica do motor; ▪ Condição de operação e de manutenção; ▪ Processo natural de lubrificação; ▪ Diluição do óleo pelo combustível; ▪ Maiores intervalos de troca do lubrificante; ▪ Vazamentos internos e externos; ▪ Nível de óleo. 58 Conclusão Pudemos estudar neste bloco as principais propriedades e características dos combustíveis e dos lubrificantes, cuja compreensão é fundamental para a definição de um projeto de motor levando em consideração o ciclo térmico do mesmo e a sua aplicação final. Vimos também o primeiro sistema do motor neste curso, o sistema de lubrificação. Sua importância é fundamental para o correto funcionamento de um MCI, devendo ser considerado com muito cuidado durante a fase de projeto. Mais importante ainda é a sua manutenção, pois mesmo um bom projeto não poderá garantir a durabilidade do motor, caso haja descuido com algum componente, como o filtro de óleo, ou com os intervalos de troca dos lubrificantes. REFERÊNCIAS BRUNETTI, F. Motores de Combustão Interna – Volume I. São Paulo: Blucher, 1 jan. 2012. D8 GTO OIL circulation system. Donkie Speed, 2018. Disponível em: <https://donkiespeed.nl/d8-gto-oil-circulation-system/>. Acesso em: 16 abr. 2021. EICHLER, F. et al. The 1.0-l Three-Cylinder TSI Engine in Volkswagen’s Modular Gasoline Engine System. MTZ worldwide, Alemanha, 75, 11, 18-23, outubro 2014. KARLE, T. et al. Gasoline Engines for the Audi A6. ATZextra worldwide, Alemanha, 15, 11, 46-51, set. 2010. MARTINS, J. Motores de Combustão Interna. 5ª edição. Portugal: Engebook, 1 jan. 2016. 59 3 SISTEMAS DE ARREFECIMENTO E DE INJEÇÃO DE COMBUSTÍVEL Apresentação Este bloco irá abordar outros dois sistemas dos MCIs, o sistema de arrefecimento e o de injeção. Por se tratar de uma máquina térmica, o sistema de arrefecimento é fundamental para a manutenção da temperatura ótima de funcionamento. O sistema de injeção de combustível é, por sua vez, não menos importante, pois cabe a ele dosar o combustível no volume correto de modo que haja uma combustão eficiente. Iremos estudar suas características e componentes de modo a conhecê-los melhor. 3.1 Sistema de Arrefecimento A combustão se dá a temperaturas muito grandes (acima de 2000°C), gerando uma diferença de temperatura elevada entre os gases e os componentes integrantes da câmara de combustão, havendo assim a transferência de calor por gradiente de temperatura a esses componentes. Logo, o sistema de arrefecimento é responsável por retirar o calor dos componentes do motor de modo que estes possam trabalhar em suas faixas corretas de temperatura. Fonte: Brunetti, 2012 (vol. II). Figura 3.1 – Formas de transferência de calor num MCI. 60 Esse sistema é constituído por uma série de componentes hidráulicos e eletromecânicos responsáveis por controlar a temperatura do MCI. O calor gerado na combustão é transferido para o fluido de arrefecimento nas seguintes proporções, verificadas experimentalmente: 25-35% nos motores arrefecidos a água e 20-25% nos motores arrefecidos a ar. Os meios arrefecedores mais comuns são o ar, a água e o óleo. Este meio circula por entre as partes aquecidas do motor, absorvendo o calor para depois transferi-lo ao meio ambiente. Altas temperatura de trabalho podem causar deformações, desgaste, degradação do óleo, corrosão e o engripamento do motor. O dimensionamento do sistema de arrefecimento deve levar em consideração os limites de temperatura dos componentes, como apresentado a seguir: ▪ Lubrificante: não deve ultrapassar 180°C para não degradar e nem perder as suas propriedades; ▪ Cilindros: não deve ser muito superior ao do lubrificante (em torno de 200°C), pois há a formação do filme de óleo entre o pistão e o cilindro; ▪ Pistão: está limitado pelas ligas de alumínio que o compõem (em torno de 320°C), caso o motor exija maiores temperaturas no topo do pistão, tratamentos superficiais serão necessários; ▪ Câmara de combustão (cabeçote): gira em torno de 200°C, dentro dos limites do material, geralmente ligas de alumínio, porém não deve ser muito maior sob o risco de promover a detonação do motor; ▪ Vela de ignição: pode chegar a 600°C; ▪ Válvulas: a de escape pode chagar a 800°C enquanto a de admissão, que é resfriada pela mistura na admissão, fica em torno de 150°C. 61 Fonte: Brunetti, 2012 (vol. II). Figura 3.2 – Temperaturas médias nos principais componentes 3.1.1 Tipos de arrefecimento São três os tipos diferentes de sistemas de arrefecimento habitualmente aplicados aos MCIs: 1. Arrefecimento a ar: também conhecido por arrefecimento direto, uma vez que o calor é transferido diretamente para o ar, motivo pelo qual adota aletas para aumentar a superfície de troca de calor. É o sistema mais simples, mais leve, de fácil manutenção, o meio arrefecedor é abundante, não é corrosivo, não gera incrustações, não evapora e nem congela em qualquer condição de funcionamento do motor. Entretanto, é difícil controlar a temperatura do motor, que acaba trabalhando com temperatura inconstante e ficando facilmente susceptível a superaquecimentos, além de haver a necessidade de limpeza das aletas (queda de rendimento). Ele demanda mais ar para retirar uma unidade de calor do motor, dado o seu baixo calor específico. Como a temperatura não é constante, pode causar pontos quentes que podem promover a detonação, limitando a sua aplicação a motores com baixa taxa de compressão. Existe uma variante, o sistema de arrefecimento forçado de ar, onde uma ventoinha ligada ao virabrequim força a passagem do ar pelos cilindros aletados através de dutos, sendo um pouco mais eficientes: 62 Fonte: Brunetti, 2012 (vol. II).
Compartilhar