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Migração e Saúde Migrações como determinante social de saúde 2 M ód ul o 2Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Fundação Escola Nacional de Administração Pública Presidente Diogo Godinho Ramos Costa Diretor de Desenvolvimento Profissional Paulo Marques Coordenador-Geral de Produção Web Carlos Eduardo dos Santos Equipe responsável Alexandre Santos (conteudista, 2020) Cindy Nagel Moura de Souza (revisora, 2020) Ana Carla Gualberto Cardoso (desenhista gráfica, 2021) Adriana C. G. dos Santos Gadioli (coordenadora, 2021) Geisiane do Nascimento Silva Basso (coordenadora, 2021) Thiego Carlos da Silva (designer instrucional; implementador Rise, 2021) Guilherme Teles da Mota (implementador moodle, 2021) Desenvolvimento do curso realizado no âmbito do acordo de Cooperação Técnica FUB / CDT / Laboratório Latitude e Enap. Fonte das imagens modificadas e utilizadas no curso: Freepik e Blackillustrations Curso produzido em Brasília, 2021. Enap, 2021 Enap Escola Nacional de Administração Pública Diretoria de Educação Continuada SAIS - Área 2-A - 70610-900 — Brasília, DF 3Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Unidade 1. Por que as pessoas migram? .......................................... 5 1.1 Migrações em números ........................................................ 5 1.2 Quem é a pessoa migrante ................................................. 10 1.3 Possíveis causas das migrações ........................................... 11 Unidade 2. A saúde no processo migratório .................................... 15 2.1 Definição de determinantes sociais em saúde e o contexto da migração .......................................................... 15 2.2 O cuidado em saúde da pessoa migrante ........................... 17 Referências .................................................................................... 20 Sumário 4Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 5Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Unidade 1. Por que as pessoas migram? Objetivo de aprendizagem: Identificar os dados sobre os fluxos migratórios modernos. 1.1 Migrações em números Apesar do tema das migrações humanas ter ganhado maior evidência nos meios de comunicação, levando a percepção de um aumento abrupto do número de pessoas que decidem sair de seus países pelas mais variadas causas, a observação atenta dos dados estatísticos e da série histórica da evolução demonstra uma tendência de aumento discreta e sustentável no tempo: Gráfico demonstrando a evolução das migrações em números no período compreendido entre os anos de 1970 e 2019 Fonte: World Migration Report (2020) M ód ul o Migrações como determinante social de saúde2 6Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Então, quais são os números das migrações na atualidade? Migração mundial em números: principais características População migrante total O número total de migrantes internacionais corresponde a 272 milhões de pessoas (3,5% da população mundial). Distribuição por gênero e fase da vida Cinquenta e dois por cento dos migrantes são homens, 48% mulheres e 13% crianças. País de origem O país com o maior número de emigrantes (pessoas vivendo fora de seu país) é a Índia (17,5 milhões), seguida pelo México (11,8 milhões) e China (10,7 milhões). País de destino O país de destino campeão dos migrantes é os Estados Unidos da América, com 50,7 milhões de migrantes internacionais. Idade reprodutiva Setenta e quatro por cento deles estão em idade produtiva (20-64 anos). População trabalhadora migrante Noventa e seis milhões de migrantes trabalhadores são homens e 68 milhões são mulheres. Os migrantes da região da América Latina e Caribe têm como destino principal a América do Norte, onde estima-se que vivem cerca de 26,6 milhões de pessoas. O México foi o país com o maior número de emigrantes, seguido da Colômbia e Venezuela, em 2019 12. Fonte: Relatório sobre Migração Mundial (2020) 1_ World Migration Report 7Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Então, como são os números da migração no Brasil? Os dados da Polícia Federal, obtidos através do Sistema de Registro Nacional Migratório (Sismigra), até novembro de 2019, apontam um total de 1,5 milhões de migrantes com registro ativo (detentores de visto ou autorização de residência vigentes), representando aproximadamente 0,7% da população. Veja a distribuição de migrantes no Brasil de acordo com registros da Polícia Federal: Número de migrantes internacionais com registro ativo ou solicitação de reconhecimento da condição de refugiado na Polícia Federal em novembro de 2019 (PF, 2019) SP 544.076 RR 164.992 RJ 86.223 PR 85.380 RS 70.921 SC 67.574 AM 43.245 AC 37.826 MG 26.415 BA 18.064 DF 18.037 MS 15.675 CE 13.872 GO 12.891 PE 12.462 MT 10.799 PA 8.291 RO 8.232 ES 7.545 RN 4.244 MA 4.092 PB 3.075 AL 2.741 SE 2.299 AP 1.927 PI 1.655 TO 1.185 Outros 490 Total 1.280.153 8Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Migração no Brasil: dados sobre o mercado de trabalho População imigrante total Setecentos e setenta e quatro mil imigrantes foram registrados no Brasil no período de 2011 a 2018. Distribuição por gênero e fase da vida Pessoas do sexo masculino, jovens e com nível de escolaridade médio e superior conformam a maioria do fluxo migratório no Brasil. País de origem Pessoas do “ sul global” foram predominantes no ano de 2018, sendo os haitianos e venezuelanos os que mais obtiveram carteiras de trabalho emitidas. Foram 36.384 carteiras de trabalho emitidas a imigrantes, sendo 68,4% emitidas a venezuelanos e 19% a haitianos. População trabalhadora migrante Os haitianos foram a principal nacionalidade de migrantes inseridos no mercado de trabalho formal brasileiro em 2018. Fonte: Cavalcanti et al . (2019) As três nacionalidades das pessoas que mais imigraram para o Brasil no período de 2010 a 2018 foram as de haitianos, bolivianos e venezuelanos. Observaram-se ainda migrações significativas de pessoas de nacionalidade colombiana, argentina, chinesa, portuguesa e peruana. Demonstra ção das principais nacionalidades de imigrantes no Brasil entre os anos de 2010 e 2018 Fonte: Cavalcanti et al. (2019) 9Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública A partir de 2018, o número de venezuelanos superou o de haitianos: Demonstra ção das principais nacionalidades de imigrantes no Brasil em 2018 Fonte: Cavalcanti et al. (2019) No período compreendido entre os anos de 2011 e 2018 observou-se uma tendência de acolhida mais significativa nas regiões sudeste, sul e norte, com predomínio em São Paulo (41.2%) , Rio de Janeiro (9.4%) e Roraima (4.3%). Assim como outros países, o Brasil não apenas recebe migrantes, mas é também o país de origem de muitos. São aproximadamente 1,7 milhões de brasileiros no exterior, segundo a UN DESA, ou 3 milhões de acordo com estimativas de 2014 do Ministério de Relações Exteriores, disponíveis no portal consular. Esses números correspondem a 0,8% ou 1,4% da população que reside no Brasil, respectivamente. Ou seja, independentemente da fonte dos dados, é provável que exista duas vezes mais brasileiros vivendo em outros países do que migrantes internacionais vivendo no Brasil. A tarefa de coletar dados e produzir estatísticas referentes às migrações é árdua. Não há um número preciso, pois há fatores diversos e fontes diferentes. Um dos principais desafios é o fato de muitas pessoas migrarem sem passar por controle ou registro migratório. O censo é frequentemente um instrumento mais preciso utilizado pelos países, mas a sua periodicidade não permite acompanhar as dinâmicas mudanças dos movimentos migratórios. Para saber mais sobre dados de migração no mundo e no Brasil, acesse o endereço eletrônico da Organização Internacional para as Migrações no Brasil: https://brazil.iom.int/ http://www.portalconsular.itamaraty.gov.br/no-exterior/brasileiros-no-mundohttps://brazil.iom.int/ 10Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 1.2 Quem é a pessoa migrante Fonte: https://www.flickr.com/search/?text=immigration A Organização Internacional para as Migrações observa que, no cenário internacional, não existe uma definição universalmente aceita para o termo "migrante" e define migrante da seguinte maneira: Um termo abrangente, sem definição no âmbito do direito internacional, que reflete o entendimento comum de uma pessoa que se move do seu local habitual de residência, seja dentro de um país ou através de fronteiras internacionais, de forma temporária ou permanente, por uma variedade de razões. O termo inclui um número de categorias bem definidas de pessoas, tais como trabalhadores migrantes; pessoas cujos tipos particulares de movimento são legalmente definidos, tais como migrantes que cruzaram fronteiras através do contrabando de migrantes; assim como aqueles cuja situação ou tipo de movimento não estão especificamente definidos no direito internacional, tais como estudantes internacionais. – Glossary on Migration (2019). Disponível em https://publications.iom.int/system/files/pdf/ iml_34_glossary.pdf. A legislação brasileira define migrante segundo o disposto na Lei de Migração (Lei no 13.445/2017). Assim, as variações do termo migrante no Brasil podem ser: Imigrante Pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou reside e se estabelece temporária ou definitivamente no Brasil. Emigrante Brasileiro que se estabelece temporária ou definitivamente no exterior. Residente fronteiriço Pessoa nacional de país limítrofe ou apátrida que conserva a sua residência habitual em município fronteiriço de país vizinho. https://www.flickr.com/search/?text=immigration https://www.flickr.com/search/?text=immigration https://publications.iom.int/system/files/pdf/iml_34_glossary.pdf. https://publications.iom.int/system/files/pdf/iml_34_glossary.pdf. 11Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Visitante Pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao Brasil para estadas de curta duração, sem pretensão de se estabelecer temporária ou definitivamente no território nacional. Apátrida Pessoa que não seja considerada como nacional por nenhum Estado, segundo a sua legislação, nos termos da Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, promulgada pelo Decreto no 4.246, de 22 de maio de 2002 , ou assim reconhecida pelo Estado brasileiro. Fonte: Lei no 13.445/2017 Destaque h, h, h, h, A definição mais importante é que o migrante é, antes de tudo, um ser humano que, de forma voluntária ou forçosa, decide migrar, movimentar-se, mudar de seu lugar de origem para outro local, seja dentro do seu próprio país ou cruzando fronteiras. O perfil predominante do imigrante, no Brasil, é de homens, jovens, com escolaridade média e superior, segundo o último relatório do Ministério da Justiça de 2019. 1.3 Possíveis causas das migrações O deslocamento humano ocorre há séculos e é motivado por diferentes fatores e influenciado pelos mais variados contextos geográficos, sociais, políticos e econômicos que podem estimular ou frear essas movimentações humanas. O direito de migrar é considerado um direito humano fundamental e está resguardado na Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, sendo assim reconhecido pela maioria dos países. As migrações podem estar relacionadas com fatores que se desenvolvem no longo e médio prazo, como mudanças demográficas, ambientais, desenvolvimento econômico, descobrimentos de novos conhecimentos e avanços tecnológicos, e até mesmo surgimento de novos meios de comunicação e transporte. As migrações também podem estar relacionadas com eventos agudos que ocorrem no curto prazo, como guerras, conflitos, instabilidades políticas, econômicas, desastres naturais ou causados pelo homem e perseguições políticas, religiosas, raciais e culturais24. Destaque h, h, h, h, Você sabia que o fator econômico tem um peso preponderante nas migrações, sejam elas forçadas ou espontâneas? (ILO, 2018). 2_ WMR (2020) http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4246.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4246.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4246.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4246.htm 12Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Imagem alusiva às grandes navegações dos séculos XV e XVI Fonte: https://incrivelhistoria.com.br/grandes-navegacoes-era-dos-descobrimentos/ Por exemplo, nos séculos XV e XVI ocorreram migrações que foram motivadas pelas descobertas e conquistas de novas terras que forneceram matérias-primas para o enriquecimento das nações dominantes desse período. A maior parte de migrantes, nos dias de hoje, é composta por trabalhadores que saem em busca de oportunidades no mercado de trabalho ou foram levados a migrar devido às desigualdades econômicas dos seus locais de origem. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, em 2017, dos 258 milhões de migrantes internacionais existentes, 164 milhões (64%) eram de migrantes trabalhadores 3: 3_ ILO (2018) https://incrivelhistoria.com.br/grandes-navegacoes-era-dos-descobrimentos/ 13Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Gráfico demonstrando a proporção de migrantes internacionais trabalhadores em relação ao número estimado de migrantes internacionais e maiores de 15 anos de idade Fonte: ILO (2018) Reprodução da clássica imagem de Lewis Hine de trabalhadores na construção do Empire State Building, NYC, 1930 Fonte: https://www.cuv3.com/2012/04/19/lewis-hine-el-fotografo-del-empire-state/. Por outro lado, cabe destacar que as causas da migração são complexas e multidimensionais. Fluxos migratórios podem ser mistos, incluindo tanto pessoas em busca de trabalho, quanto outras fugindo de conflitos e perseguição. Ao mesmo tempo, um mesmo indivíduo pode estar, simultaneamente, buscando melhores condições econômicas e de vida e estar fugindo de um contexto composto por desastres naturais e crises sociais, políticas e econômicas. Assim, as causas da migração são várias e podem ser concomitantes 4. As mudanças climáticas e do meio ambiente também são reconhecidas como causas da migração, inclusive com a ocorrência de migrações planejadas, realocação e deslocamento de pessoas como parte de estratégias da política internacional para enfrentar os impactos das mudanças climáticas5. 4_ Cavalcanti et al. (2019) 5_ WMR (2020) https://www.cuv3.com/2012/04/19/lewis-hine-el-fotografo-del-empire-state/ 14Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública M embro da California Army National Guard caminhando entre os destroços de uma casa queimada em Paradise CA, EUA, novembro de 2018 Fonte: https://e360.yale.edu/digest/natural-disasters-caused-160-billion-in-damage-in-2018 Em 2018 cerca de 17 milhões de pessoas, em 144 países e territórios, tiveram de ser deslocadas dentro de seu próprio país devido a desastres ambientais. Até a primeira metade de 2019 esse número de deslocamentos internos foi de 7 milhões de pessoas. O monitoramento de série histórica de deslocamentos internos demonstra que, de 2008 a 2018, cerca de 265 milhões de pessoas tiveram de se deslocar internamente como resposta a desastres. As migrações causadas por alterações ambientais e mudanças climáticas geralmente ocorrem dentro dos próprios países afetados, caracterizando-se por migrações internas. Eventualmente, observam-se as situações em que o migrante tem de cruzar fronteiras para sobreviver e refazer a sua vida após incidentes de natureza climática ou ambiental. Um exemplo de migração internacional causada pelas consequências de um desastre natural foi o terremoto no Haiti, em 2010, que resultou na migração de haitianos para países vizinhos, inclusive o Brasil 6. Exemplos recentes de migrações ambientais internas no Brasil foram as observadas após o rompimento das barragens em Mariana e Brumadinho, noEstado de Minas Gerais, em 2015 e 2019, respectivamente. 6_ https://migrationdataportal.org/themes/environmental_migration https://e360.yale.edu/digest/natural-disasters-caused-160-billion-in-damage-in-2018 https://migrationdataportal.org/themes/environmental_migration 15Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Unidade 2. A saúde no processo migratório Objetivo de aprendizagem: Reconhecer a migração como determinante social de saúde. 2.1 Definição de determinantes sociais em saúde e o contexto da migração Os determinantes sociais da saúde são definidos pela OMS como os fatores não médicos que influenciam a saúde. Eles são as circunstâncias nas quais as pessoas nascem, crescem, trabalham, vivem e envelhecem. Essas condições são moldadas por um conjunto mais abrangente de forças e sistemas, que incluem políticas e sistemas econômicos, agendas de desenvolvimento, normais e políticas sociais, e sistemas políticos7. Determinantes Sociais da Saúde 8 Fatores individuais Idade, sexo e fatores hereditários, necessidades especiais. Estilo de vida Situação econômica, barreiras linguísticas e culturais, uso abusivo de substâncias tóxicas. Condições de moradia Acesso a água, saneamento , moradia segura. Condições de trabalho Acesso e existência de trabalho que proporcione um salário mínimo. Fatores sociais e de comunicação Existência de discriminação, estigma, inclusão social. Governança e condições socioeconômicas Existência de legislação e políticas que protejam ou afetem a saúde do migrante. A migração está relacionada com uma série de determinantes sociais da saúde que têm efeitos no bem-estar dos indivíduos em diferentes estágios do fenômeno migratório. O fluxograma a seguir mostra alguns dos fatores que, ao longo do processo migratório , podem afetar positiva ou negativamente a saúde dos migrantes: 7_ https://www.who.int/health-topics/social-determinants-of-health#tab=tab_1 8_ https://migrationdataportal.org/themes/migration-and-health https://www.who.int/health-topics/social-determinants-of-health#tab=tab_1 https://migrationdataportal.org/themes/migration-and-health 16Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Aspectos transversais: idade gênero e status socioeconômico Lugar de Origem Retorno Lugar de Destino Viagem e Trânsito Eventos pré-migração, em particular traumas, violações de direitos humanos e violência sexual Proximidade linguística, cultural e geográfica ao destino, incluindo crenças e comportamen tos relacionados à saúde Perfil epidemiológico e como se compara ao perfil nodestino Eficiência do sistema de saúde em proporcionar atençãopreventiva e curativa Nível de serviços disponíveis na comunidade de origem (possivelmente destruídos), especialmente após situações de crise Laços comunitários remanescentes Duração da ausência Perfil comportamental e de saúde adquirido na comunidade de acolhida Políticas mitratórias e sanitárias;inclusão ou discriminação Status legal e acesso a serviços Idioma evalores culturais Separação da família/parceiro(a) Duração da estadia Serviços adequados cultural, linguística e epidemiologicamente Abuso, violência (sexual) ou exploração, condições de vida e trabalho Condições e modo da viagem (perigos e necessidades básicas de saúde), especialmente para fluxos migratórios irregulares Duração da jornada Eventos traumáticos, abuso, violência (sexual) Movimento isolado ou em massa Fonte: https://www.iom.int/social-determinants-migrant-health https://www.iom.int/social-determinants-migrant-health https://www.iom.int/social-determinants-migrant-health 17Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Assim, conceito de migração e saúde engloba diversos fatores e condições que afetam a saúde do migrante e que são considerados como determinantes sociais da saúde. A relação entre saúde e migração formam uma dinâmica complexa. Apesar de não ser a regra, uma parcela da população de migrantes pode estar sujeita a condições inadequadas de trabalho e de moradia e com dificuldade de acesso aos serviços de saúde, aumentando a suscetibilidade dessa população frente a determinados condicionantes de saúde, como condições crônicas não transmissíveis, doenças infecciosas e parasitárias, condições ligadas à saúde sexual e reprodutiva e saúde ocupacional. Por outro lado, parte da população de migrantes pode vir de locais expostos a violência e crises econômicas, cujos sistemas de saúde podem ter sofrido rupturas organizacionais importantes, podendo ou não encontrar acolhimento em um sistema de saúde mais estruturado que o de seu local de origem (OIM, 2020). 2.2 O cuidado em saúde da pessoa migrante Apesar dos fenômenos migratórios fazerem parte da história e da evolução humana, recentemente tem-se observado uma maior visibilidade do assunto no cenário das negociações e dos diálogos internacionais. O cuidado em saúde está relacionado ; e raramente esta discussão enfatiza a migração como um determinante de saúde. Há evidências de que a morbidade observada na população de migrantes pode variar de acordo com diferentes fatores, como condições de saúde antes de iniciar o processo de migração, condições socioeconômicas, epidemioló gicas e ambientais , exposição a situações de risco, inclusive comportamentais, aspectos culturais e religiosos, e acesso ao cuidado em saúde, que inclui medidas de promoção, prevenção, proteção e assistência médica ao longo do processo migratório (ABUBAKAR et al., 2018) 9. A anamnese, tal qual é conhecida a coleta sistemática de informações clínicas através de entrevista semiestruturadas, caracteriza-se pela recordação de todos os fatos relacionados com o motivo da visita da pessoa ao serviço de saúde, incluindo identificação detalhada da pessoa, caracterização dos sintomas, descrição acurada da história clínica, além de coleta e registro de informações, como hábitos da pessoa sob cuidado, incluindo aspectos culturais e religiosos, profissão ou ocupação habitual, antecedentes familiares e pessoais, assim como procedência (BADDINI, 2013). A precisão com que as informações de interesse clínico são coletadas, registradas e transmitidas entre os profissionais, incluindo os dados de procedência da pessoa migrante, pode ser fundamental para o planejamento e execução do cuidado da pessoa migrante (OIM, 2019). As condições em que se dá o processo de migração influenciará os determinantes de saúde relacionados ao trânsito. Sobretudo em situações de emergência, de migrações forçadas e/ou migrações através de rotas arriscadas, a pessoa migrante recém- chegada ao local de destino, definitivo ou temporário, pode apresentar sinais e sintomas sugestivos de lesões acidentais, violência ou abuso, inclusive abuso sexual, hipotermia ou hipertermia, queimaduras, desidratação, doenças gastrointestinais, manifestações cardiovasculares, gravidez e complicações relacionadas ao parto, além de agravamento por situações clínicas pré-existentes, como hipertensão e diabetes. 9_11 Abubakar et al. (2018) 18Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Ao se deslocarem de um local para outro as pessoas estão sujeitas a condições de saúde que podem variar a depender da forma de transporte : viagem aérea, a pé, em desertos, florestas, regiões pantanosas ou mesmo escondidas em caminhões ou outras formas inadequadas de transporte de humanos. Assim, durante o trânsito, a pessoa migrante pode estar exposta a condições inseguras e insalubres que podem implicar em exposição a patógenos relacionados a doenças infecciosas, como vírus, inclusive o HIV, malária, tuberculose e outros agentes infecciosos diversos que necessitam ser pesquisados no momento do cuidado desses migrantes 10. As condições do local de destino das pessoas migrantes também podem representar exposição a novos condicionantes de saúde relacionados ao meio ambiente local, condições de trabalho, moradia e agravos endêmicos locais. A avaliaçãoda situação vacinal é fundamental para o sucesso do cuidado da pessoa migrante no seu local de destino, pois poderá prevenir doenças não expostas anteriormente. Ainda, observações relativas às condições de trabalho poderão detectar possível exposição a agentes insalubres ou perigosos de origem ocupacional (BRASIL, 2018). Especial atenção deve ser dada às questões de ordem psicológica e social em todas as fases do processo migratório, uma vez que muitas das condições de viagem e adaptação das pessoas podem ser diferentes do idealmente aceito, levando ao estresse acentuado, muitas vezes prolongado, com possíveis repercussões na saúde mental da pessoa migrante 11. As questões relacionadas a gênero e saúde são também importantes na avaliação , uma vez que homens e mulheres podem ser vítimas de violência sexual e de gênero, de exploração durante todo o processo migratório, incluindo a partida, o deslocamento e o trânsito e até no local de acolhida. É importante lembrar que h á casos de migrantes que decidiram ou foram forçados a migrar devido a abusos e violência sexual ou de gênero em seus locais de origem 12. 10_ Abubakar et al. (2018) 11_ Id., 2018 12_ Id., 2018 19Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública Refugiados Rohingya, em trânsito, durante a crise de 2017 Fonte: https://www.unhcr.org/news/press/2017/10/59e4c17e5/ joint-statement-rohingya-refugee-crisis.html Você sabia que durante a crise humanitária em Myanmar entre os anos de 2016 e 2017 houve inúmeros relatos de violência sexual, coerção e exploração sexual em todos os estágios da migração de mulheres e meninas Rohingya que foram forçadas a se deslocar? Para mai s informações sobre violência sexual e de gênero no processo de migração forçada e de refúgio acesse o caminho eletrônico (página em inglês ): https://www.unhcr.org/sexual-and-gender- based-violence.html. O retorno da pessoa migrante ao local de origem pode também impor riscos à sua saúde. Por exemplo, pessoas que tenham sofrido lesões ou adquirido doenças durante o processo migratório podem encontrar o sistema de saúde, no local de origem, escasso ou em condições inadequadas e insuficientes para oferecer o cuidado de que necessite. Fatores emocionais e sociais podem também representar desafios à readaptação , como mudanças culturais, perda de bens , dívidas adquiridas pela família entre outros, representando importantes determinantes sociais da saúde da pessoa migrante que retorna ao local de origem 13. 13_ Abubakar et al., op. cit. https://www.unhcr.org/news/press/2017/10/59e4c17e5/joint-statement-rohingya-refugee-crisis.html https://www.unhcr.org/news/press/2017/10/59e4c17e5/joint-statement-rohingya-refugee-crisis.html https://www.unhcr.org/news/press/2017/10/59e4c17e5/joint-statement-rohingya-refugee-crisis.html https://www.unhcr.org/sexual-and-gender-based-violence.html https://www.unhcr.org/sexual-and-gender-based-violence.html 20Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública A Organização Mundial da Saúde possui documentos relevantes na área de migração. Em 2016, o Conselho Diretivo da OMS adotou a Resolução "A saúde dos migrantes" (CD55/11), disponível em: https://www.paho.org/hq/ dmdocuments/2016/CD55-11-s.pdf A organização também possui um documento de orientação sobre migração e saúde na região das Américas, incluindo medidas recomendadas para atuação em torno de cinco linhas estratégicas de ação. Acesse o documento em: https://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman &view=download&alias=48291-documento-de-orientacio-n-sobre-migracio- n-y-salud&category_slug=migracion&Itemid=270&lang=es Os dois documentos estão disponíveis no idioma espanhol. Referências ABUBAKAR, I et al. Lancet Commission on Migration and Health: the health of a world on the move. Lancet, n. 392, p. 2.606-2.654, 2018. CAVALCANTI, L. et al. Resumo executivo. Imigração e Refúgio no Brasil. A inserção do imigrante, solicitante de refúgio e refugiado no mercado de trabalho formal. Observatório das Migrações Internacionais; Ministério da Justiça e Segurança pública/Conselho Nacional de Imigração e Coordenação Geral de Imigração Laboral. Brasília, DF: OBMigra, 2019. Disponível em: <https:// portaldeimigracao.mj.gov.br/images/publicacoes-obmigra/RESUMO%20EXECUTIVO%20_%20 2019.pdf>. INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION. ILO Global Estimates on International Migrant Workers: Results and Methodology. 2nd ed. Geneva: ILO, 2018. INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR MIGRATION. Who is a migrant? Disponível: <https://www. iom.int/who-is-a-migrant>. ______. World Migration Report. 2020. ______. Social Determinants of Migrant Health. Disponível em: <https://www.iom.int/social- determinants-migrant-health>. Acesso em: 11 abr. 2020. OBSERVATÓRIO DAS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS. Acompanhamento de fluxo e empregabilidade dos imigrantes no Brasil: relatório mensal do OBMigra, Brasília, DF, n. 2, fev. 2019. https://www.paho.org/hq/dmdocuments/2016/CD55-11-s.pdf https://www.paho.org/hq/dmdocuments/2016/CD55-11-s.pdf https://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&view=download&alias=48291-documento-de-orientacio-n-sobre-migracio-n-y-salud&category_slug=migracion&Itemid=270&lang=es https://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&view=download&alias=48291-documento-de-orientacio-n-sobre-migracio-n-y-salud&category_slug=migracion&Itemid=270&lang=es https://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&view=download&alias=48291-documento-de-orientacio-n-sobre-migracio-n-y-salud&category_slug=migracion&Itemid=270&lang=es https://portaldeimigracao.mj.gov.br/images/publicacoes-obmigra/RESUMO%20EXECUTIVO%20_%202019.pdf https://portaldeimigracao.mj.gov.br/images/publicacoes-obmigra/RESUMO%20EXECUTIVO%20_%202019.pdf https://portaldeimigracao.mj.gov.br/images/publicacoes-obmigra/RESUMO%20EXECUTIVO%20_%202019.pdf https://www.iom.int/who-is-a-migrant https://www.iom.int/who-is-a-migrant https://www.iom.int/social-determinants-migrant-health https://www.iom.int/social-determinants-migrant-health 21Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Países das Américas abordam necessidades de saúde dos migrantes. Disponível em: <https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_co ntent&view=article&id=5258:paises-das-americas-abordam-necessidades-de-saude-dos- migrantes&Itemid=843>. MARTES, A. C. B.; FALEIROS, S. M. Acesso dos imigrantes bolivianos aos serviços públicos de saúde na cidade de São Paulo. Saúde Sociedade São Paulo, v. 22, n. 2, p. 351-364, 2013. MIGRATION DATA PORTAL. Disponível em: <https://migrationdataportal.org/?i=stock_ abs_&t=2019&cm49=76 consultado em 08/03/2020>. MIGRATION DATA PORTAL. Migration and health. Disponível em: <https://migrationdataportal. org/themes/migration-and-health>. Acesso em: 10 abr. 2020. MINISTÉRIOR DA SAÚDE. Campanha de vacinação em Roraima vai reforçar proteção contra o sarampo. 2018. Disponível em: <https://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/42707- campanha-de-vacinacao-em-roraima-vai-reforcar-protecao-contra-sarampo>. Acesso em: 20 abr. 2020. MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. 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