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Contribuições da antropologia para a prática profissional e de pesquisa


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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA 
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE ANTROPOLOGIA E ETNOLOGIA
CONTRIBUIÇÕES DA ANTROPOLOGIA PARA A PRÁTICA PROFISSIONAL E DE PESQUISA EM FARMÁCIA
Salvador, BA
2022
CONTRIBUIÇÕES DA ANTROPOLOGIA PARA A PRÁTICA PROFISSIONAL E DE PESQUISA EM FARMÁCIA
Trabalho apresentado à Universidade Federal da Bahia, como critério de avaliação do Componente Curricular Antropologia da Saúde, no curso de Farmácia.
Salvador, BA
2022
CONTRIBUIÇÕES DA ANTROPOLOGIA PARA A PRÁTICA PROFISSIONAL E DE PESQUISA EM FARMÁCIA
Um objeto de estudo que vem crescendo cada vez mais no campo da antropologia é o medicamento. Podemos evidenciar tal importância quando relacionamos a antropologia, saúde e doença. Conforme Langdon e Wiik (2010), não podemos ver a saúde dos indivíduos de forma individual, mas sim todo o contexto de cada sujeito visando condições socioculturais. Esse ponto das condições socioculturais é importante, pois cada grupo social apresenta diversas particularidades no modo de vida. Nesse aspecto, a consequência disso será nas inúmeras interpretações de mundo, entre elas a visão de fenômenos sociais e doenças. No texto de Bezerra Júnior (2006) se debate sobre o normal e patológico. O autor alega que um médico não deve observar para o paciente conforme as perspectivas dos saberes e disciplinas científicas (biologia, matemática, física, etc.), porém considerar o indivíduo como ser humano e que apresenta suas individualidades. Diante do exposto, vivemos no século XXI no qual vivemos com a grande quantidade de indivíduos que estão sofrendo com problemas de saúde psicóticos como depressão, ansiedade, crise de pânico, dentro outros. Sendo assim, para combater tais problemas patológicos é necessário que um farmacêutico tenha a capacidade de lidar com os pacientes em um estabelecimento de saúde tendo como dever não apenas fazer a dispensação de medicamentos, mas também saber dialogar com os mesmos e conhecer seus hábitos socioculturais, tentando entender de qual forma os modos de vivência acaba afetando o processo doença e cura.
 O conhecimento da antropologia é bastante importante para o estudante de farmácia, uma vez que esses futuros profissionais da saúde terão que ter a capacidade de lidar com tudo que tange a drogas. Nesse aspecto, o conhecimento de todo um contexto social onde os indivíduos estão inseridos tem importância em razão de que o Brasil é um país onde ainda existem questões sociais de muito preconceito. Podemos relacionar essa questão da importância da antropologia na prática profissional, pesquisa e farmácia com a obra de MacRae (2021). Em seu livro, o autor aborda sobre as drogas no contexto social (história, políticas públicas e redução de danos). É mencionado como as drogas é uma ponte para o controle social e a classe branca e rica implementam sua forma de poder através das drogas ilícitas. Segundo MacRae (2021, p. 203),
O caso da proibição das drogas e, em especial, da maconha, no Brasil revela um processo que tem como resultado a vigilância e o controle sobre determinados grupos sociais, assim como a desqualificação, enquanto cidadãos, de seus membros, acusados de ameaçarem a moral, a família e o sistema vigente. Contudo, apesar das medidas drásticas adotadas nessa direção, as autoridades não têm tido sucesso em reduzir a produção, comércio e uso de substâncias psicoativas ilícitas e, atualmente, a violência associada ao tráfico de drogas se apresenta como um dos principais problemas de segurança pública.
Nesse contexto, embora a maconha seja uma droga ilícita, o farmacêutico tem o dever de saber respeitar os usuários da planta. O preconceito com quem se utiliza dessa droga não é apenas uma atitude antiética, mas também apresenta traços racistas e xenofóbicos, uma vez que a maconha foi trazida para o Brasil pelos escravos negros e essa minoria se utilizava muito. Outrossim, a toxicologia é uma área extremamente dentro das ciências farmacêuticas, logo é importante que o estudante e profissional saiba lidar com as drogas ilícitas e seus usuários, prezando sempre pela ética em saúde e o respeito pelas individualidades. 
Outro campo onde o farmacêutico deve ter conhecimento sobre a antropologia é na história de como as drogas foram utilizadas pela humanidade. Segundo Escochotado (2004, p. 91),
Por volta de 1900, todas as drogas conhecidas se encontram disponíveis nas farmácias e drogarias, podendo- -se também comprá-las ao fabricante pelo correio. Isto acontece a nível planetário, tanto na América como na Ásia e Europa. A propaganda que acompanha esses produtos é igualmente livre, e tão intensa como a que apoia outros artigos de comércio, para não irmos mais longe. Há sem dúvida dependentes do ópio, morfina e heroína, mas o fenómeno no seu conjunto – os consumidores moderados e imoderados – mal chama atenção de jornais ou revistas, e nada a juízes e polícias. Não é um assunto jurídico, político ou de ética social.
Nesse contexto, havia a disseminação e utilização de diversas drogas pela população na época. Todavia, o escritor afirma que houve uma “reação antiliberal”. Essa reação se deu por 5 fatores:
a) Imersão da questão religiosa;
b) tensões culminadas pela emergência do proletariado e industrialização, junto ao crescente processo de concentração urbana;
c) crescente na área da medicina;
d) Guerra do Ópio; e
e) expansão da burocracia administrativa.
Toda a conjuntura da humanidade culminou na alteração da visão sobre as drogas: de incentivadas para ilícitas; esse contexto foi influenciado pela classe privilegiada daquele momento. 
Até então, foi-se exposto uma breve síntese sobre a importância da relação antropologia-farmácia e porque um farmacêutico deve saber a importância das drogas e os preconceitos associados. Por fim, é necessária uma síntese sobre como o farmacêutico deve se posicionar na sociedade como profissional da saúde perante a todo o contexto social de preconceitos e doenças que tangem minorias no século XXI.
Segundo Lemos, Kerntopf e Fernandes (2016), 
A contribuição mais contundente da antropologia cultural para a dinâmica e compreensão da etnomedicina reside no fato da antropologia cultural afirmar e demonstrar a influência do contexto social para a construção do saber popular. Afirmando, de forma categórica, que somente os fatores lógicos ou metodológicos não são suficientes para compreender o dinamismo presente nas comunidades sociais e as relações estabelecidas por elas, bem como, a formação do seu corpo de conhecimentos, incluindo o saber relacionado à Medicina Tradicional.
Assim, ara um farmacêutico poder prestar atenção aos pacientes de forma integral, é importante saber o dinâmica e a influência do contexto atual. Nesse sentido, o Brasil passa por grandes problemas como racismo, homofobia, xenofobia, machismo, dentre outros; outrossim ainda há a questão de doenças mentais (vide depressão e ansiedade) e a pandemia do SARS-CoV-2, além dos indígenas e quilombolas, que são populações minoritárias que são desassistidas pelo Poder Público. Diante disso, o entendimento por parte do farmacêutico de como algumas minorias se utilizam de alguns medicamentos (ou não têm acesso) é fundamental para o entendimento de como ocorre o progresso de certas doenças (a nível físico, psicológico e social). Podemos mencionar o papel do farmacêutico perante o uso irracional de medicamentos causados por motivos ideológicos como aconteceu durante a pandemia (GUERREIRO; ALMEIDA, 2021).
Portanto, contribuições da antropologia para a prática profissional e de pesquisa em farmácia é fulcral, uma vez que é uma área fundamental para que o indivíduo saiba cuidar dos pacientes não apenas com base na biologia, física, química e matemática, mas também porque certos grupos sociais estão mais expostos a algumas doenças. Além disso, outra contribuição importante da antropologia para as ciências farmacêuticas é estimular o raciocínio clínico do profissional da saúde de como inserir um medicamento na vida de umpaciente poderá impactar em sua vivência, assim como a retirada de algo considerado como terapêutico (por exemplo, a utilização de uma planta com finalidade religiosa, mas apresenta toxinas) poderá afetar a vida do paciente. Ademais, o aprendizado da história do porque algumas drogas são consideradas ilícitas por motivos preconceituosos é outro motivo relevante para a formação de um profissional da saúde. Dessa forma, a antropologia tem papel fundamental para formar um profissional da saúde com mais empatia e poder proporcionar maior cuidado na hora de lidar com a história de vida do paciente.
REFERÊNCIAS
BEZERRA JÚNIOR, B. O normal e o patológico. In: Souza, Alicia & Pitanguy,
Jacqueline (Org). Saúde, corpo e sociedade. Rio de Janeiro: UFRJ, 2006.
ESCOHOTADO, A. História elementar das drogas. Tradução: José Colaço Barreiros. Lisboa: Antígona, 2004.
GUERREIRO, C.; ALMEIDA, R. Negacionismo religioso: Bolsonaro e lideranças evangélicas na pandemia Covid-19. Religião & sociedade, v. 41, p. 49-74, 2021.
LANGDON, E. J.; WIIK, F. B. Antropologia, saúde e doença: uma introdução ao conceito de cultura aplicado às ciências da saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 18, p. 459-466, 2010.
LEMOS, I. C. S.; KERNTOPF, M. R.; FERNANDES, G. P. Contribuições da Antropologia Para a Prática Assistencial em Saúde: Considerações e Reflexões. Revista Interdisciplinar de Estudos em Saúde, [S. l.], v. 5, n. 1, p. 36-46, 2016.
MACRAE, E. A questão das drogas: pesquisa, história, políticas públicas, redução de danos e enteógenos. Salvador: EdUFBA, CETAD/UFBA: 2021. 283 p.

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