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Finanças Solidárias

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Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Instituto Multidisciplinar
Departamento de Administração e Turismo - DAT Curso de Bacharelado em Turismo
Discentes: Marianne Moraes | Gabriela Freixo
FINANÇAS SOLIDÁRIAS EM PAUTA: CONFLITOS IDEOLÓGICOS E MORAIS EM
TORNO DA CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS À
DEMOCRATIZAÇÃO DO CRÉDITO (livro: Economia solidária e o mundo do trabalho:
Aprender a ensinar)
FINANÇAS SOLIDÁRIAS: UM DOS PILARES DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
A “Economia Solidária” é uma forma de organização das atividades econômicas que se baseia na
solidariedade, cooperação, autogestão, partilha, confiança mútua, gestão democrática e na
sustentabilidade, este sistema visa opor-se ao sistema capitalista. Este “jeito diferente de fazer
economia” é, portanto, o conjunto de atividades de produção, distribuição, consumo e crédito.
Entre os instrumentos relacionados a um de seus pilares, as finanças solidárias, figuram os mais
conhecidos: as Cooperativas de Crédito Solidário, os Bancos Comunitários de Desenvolvimento
(BCD), as Moedas Sociais Circulantes Locais e os Fundos Solidários. De modo geral, são
metodologias de gestão coletiva de recursos e operam como instrumentos de crédito solidário para
viabilizar a utilização de recursos por grupos (eventualmente, indivíduos) que normalmente não têm
acesso aos serviços financeiros oferecidos por bancos públicos e privados.
No Brasil, entre 2010 e 2013, ao longo da execução de convênios estabelecidos entre organizações da
sociedade civil e a SENAES (Secretaria Nacional de Economia Solidária), mapeou nas cinco regiões
do país, os instrumentos de finanças solidárias baseados na metodologia de Fundos Solidários e de
Bancos Comunitários de Desenvolvimento. Identificou neste momento, cerca de mil experiências de
Fundos Solidários no Brasil e 106 bancos vinculados à rede de BCD espalhados nas regiões Norte,
Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste.
No entanto, algumas dessas experiências são desenvolvidas à margem do marco regulatório financeiro
atual que, por sua vez, não prevê o empréstimo de recursos financeiros por entidades que não estejam
vinculadas ao Banco Central ou, em outros termos, que não se constituam enquanto instituições
financeiras. Os Fundos Solidários e muitos BCD, por exemplo, operam informalmente, não possuindo
personalidade jurídica e, por esta razão, para além da necessidade de recursos não retornáveis ao
financiador, encontram dificuldades em cruzar as fronteiras rígidas da burocracia do sistema
financeiro. Nesse sentido, o processo de mapeamento teve como principal meta, não apenas a
identificação das experiências, mas a construção de um “sujeito coletivo” capaz de exercer incidência
política sobre o debate acerca de uma nova regulamentação financeira no país.
OS BANCOS COMUNITÁRIOS DE DESENVOLVIMENTO COMO FERRAMENTAS DE
INCLUSÃO FINANCEIRA E BANCÁRIA
Ainda que cada BCD faça uso dos instrumentos que estejam em concordância com seus objetivos,
alguns são partilhados por todos os bancos que integram a Rede Nacional de BCD, pode-se citar: a
concessão de crédito, o uso de moedas sociais circulantes locais, mapeamento do consumo e da
produção local e a instituição de espaços de participação comunitário que visam garantir a gestão do
banco (os chamados Fóruns de Desenvolvimento Comunitário). Mesmo que essas ferramentas sejam
pensadas e implementadas tendo como fundamento a economia solidária, os BCD são, por vezes,
criticados, entre outras coisas, pelo fato de que alguns assumem também o papel de correspondentes
bancários em seus territórios de origem. A crítica, nesse sentido, diz respeito, em primeiro lugar, ao
questionamento sobre o verdadeiro papel assumido por este instrumento das finanças solidárias nos
territórios e sobre a concepção de economia e desenvolvimento por trás dessas ações, uma vez que se
promove, a partir da oferta desses serviços, a bancarização dessa parcela da população que, até então,
vivia à margem do sistema bancário convencional. E, em segundo lugar, ao que se considera como
precarização do trabalho dos bancários, já que os bancos convencionais optam, muitas vezes, em não
estar presentes em localidades periféricas e buscam oferecer, através desses parceiros locais ofertar
parte de seus serviços financeiros. No entanto, contrariando as expectativas de parte de seus militantes
e dos documentos produzidos em plenárias do Movimento, não são pautadas as questões que fazem
referência ao enfrentamento ao sistema econômico hegemônico, tampouco as proposições que
apontam para uma alteração nas dinâmicas do sistema financeiro nacional, mas ao contrário, passa-se
a enxergar na economia solidária, e em seus instrumentos, tão somente uma ferramenta estratégica
para garantir a geração de trabalho e renda para uma significativa parcela da população que, vivendo
em situação de pobreza, encontrava-se integrando os programas de transferência condicionada de
renda. Para tanto, foram criados, ao longo destes 12 anos, uma série de políticas e programas voltados
ao combate à “pobreza”, seja através das transferências monetárias, de uma maior oferta de serviços e
ações vinculados à proteção social básica, daqueles que implantaram tarifas sociais ou, ainda, daqueles
que subsidiam os grupos de baixa renda para compra de bens duráveis. E foi, ao receber a proposta,
através do responsável pelo BPB, que o Banco Palmas se tornou o primeiro banco comunitário a
operar também como correspondente bancário trazendo, novamente para o centro do debate, a
discussão sobre o potencial destas ferramentas no que tange à minimização da condição de pobreza e
exclusão destes territórios. Porém foi no âmbito da Estratégia Brasil Sem Miséria, que as ações e
iniciativas voltadas à economia solidária, e aos bancos comunitários de desenvolvimento por extensão,
vêm sendo financiadas e debatidas pelo poder público em nível nacional.
Em termos gerais, se, por um lado, a dimensão de “pobreza” assume, na implementação e execução
dos programas de transferência de renda, por exemplo, um caráter de “vulnerabilidade” por parte dos
beneficiários, por outro lado, os BCD partem do princípio de que as comunidades e seus habitantes
não são “pobres”, pura e simplesmente, mas, ao contrário, vivem em condições de “empobrecimento”.
É relevante pensar que negar a “pobreza” tão somente como uma condição de ausência é o que permite
aos BCD atuarem e proporem ações que visam uma modalidade de desenvolvimento endógeno, uma
vez que esses territórios possuem riquezas, mas que, devido às práticas econômicas e sociais que
experimentam em seu cotidiano, são “exportadas” para os grandes centros econômicos.

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