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64 sinergia à organização da educação nacional” (CARNEIRO, 2006, p. 61). Ainda analisando as políticas públicas de financiamento da educação, focando especificamente no Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), De Costa (2010, documento on-line) acrescenta que “[...] o PDDE se constitui num programa que concretiza a ação supletiva da União na educação, [...] uma forma legal de exercício do regime de colaboração. Esse programa é um exemplo da função que a União assume no que tange à educação básica, considerando especificamente a característica supletiva da transferência de recursos”. Analisando algumas das inúmeras políticas públicas educacionais existentes na atualidade e a sua articulação com as esferas federal, estadual e municipal, podemos perceber que a organização pública da educação nacional se reconfigurou de um modelo descentralizado proposto pelas políticas anteriores “[...] para um modelo mais compacto, pelo mecanismo de dependência que cria entre os sistemas de ensino de Estados, Distrito Federal e Municípios” (CARNEIRO, 2006, p. 61). Um ponto crítico a analisar, no entanto, é que a própria ideia de sistemas que atualmente organiza a nossa educação no Brasil é complexa, uma vez que, no momento em que qualquer parte desse sistema se encontrar comprometida ou inoperante, todas as demais serão afetadas nos seus resultados. 13 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL As políticas públicas de educação direcionam os investimentos para essa área. Tais políticas mostram quais são as prioridades no âmbito de formação da 65 educação básica. No caso da educação infantil, têm se destacado políticas públicas que privilegiam aspectos como: saúde, alimentação, nutrição, convivência familiar e comunitária, assistência social, cultura, lazer, espaço, meio ambiente e proteção. A formulação de políticas públicas de educação, como você vai ver, envolve diversas lutas, movimentos e discussões da sociedade. (BIERWAGEN, 2019) 13.1 Histórico das políticas públicas na educação infantil Você sabe o que são políticas públicas? Políticas públicas são um conjunto de ações, programas e atividades realizadas pelo Estado, direta ou indiretamente, com a participação dos entes públicos ou privados, que têm o objetivo de equacionar os problemas sociais e políticos conforme as demandas da sociedade civil (SECCHI, 2013). As políticas públicas para a educação infantil são aquelas voltadas para equacionar os problemas sociais e políticos relacionados ao público infantil e suas famílias. É importante você notar que a formulação de políticas públicas não é uma tarefa simples. Além disso, ela sempre está atrelada ao cenário político, econômico e social internacional e nacional. Mas como as políticas públicas para a educação infantil foram construídas ao longo da história brasileira? No século XIX, período em que a população se centralizava na área rural, as mulheres eram responsáveis por cuidar das crianças, enquanto os homens trabalhavam. Havia poucas instituições especializadas em cuidados infantis. No geral, existiam apenas orfanatos e internatos para crianças órfãs e delinquentes. Nas primeiras décadas do século XX, a história da educação infantil foi marcada por uma dicotomia: havia um atendimento específico para crianças das famílias das classes trabalhadoras, realizado pelas creches, e instituições voltadas para alunos de classes sociais mais favorecidas, chamadas de jardins de infância (ROMANELLI, 2012; SOUZA; GARCIA, 2015). Contudo, em ambos os períodos citados, não havia desenvolvimento de políticas públicas específicas para a educação infantil, apenas algumas iniciativas da sociedade civil. Por volta das décadas de 1970 e 1980, como você sabe, ocorreram mudanças sociais e econômicas, além de modificações na estrutura familiar. As 66 mulheres começaram a trabalhar fora e houve várias alterações no cenário nacional e internacional, inclusive relacionadas à concepção da infância. Nas universidades e em setores da sociedade civil, por exemplo, surgiram discussões sobre se a educação infantil deveria ter caráter assistencialista ou educacional (ROMANELLI, 2012; SOUZA; GARCIA, 2015). Nesse período, Kuhlmann (2007) destaca que as políticas públicas de educação infantil adquiriram força. Isso ocorreu especialmente devido à promulgação da Constituição Federal de 1988, que reconheceu a necessidade de proteção à infância e o direito das crianças ao atendimento em creches e pré-escolas. Inicialmente, a proposta de concepção de educação da infância estava relacionada a suprir as “carências culturais” das crianças das classes desfavorecidas, oferecendo a elas serviços e cuidados assistenciais (KUHLMANN, 2007; SOUZA; GARCIA, 2015). As políticas educacionais elaboradas na década de 1990 tiveram por objetivo favorecer interesses econômicos e contribuir com uma mundialização financeira. As agências multilaterais, entre elas o Banco Mundial, forçaram as políticas sociais a priorizar um processo de “desenvolvimento humano”. O Estado passou a ser promotor de serviços sociais básicos, em especial para a população mais pobre. As políticas educacionais de atendimento da primeira infância foram marcadas por discursos de prioridade do desenvolvimento sustentável dos países, especialmente dos que estavam em desenvolvimento (ABUCHAIM, 2018). A partir de 1990, esse tema tornou-se recorrente e teve como foco a educação e o cuidado infantil. Segundo Abuchaim (2018), na Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em Jomtien (Tailândia), cerca de 183 países (inclusive o Brasil) assumiram o compromisso de, até 2000, suprir as necessidades básicas de crianças, jovens e adultos, erradicando o analfabetismo e universalizando o acesso à escola para as crianças. Na Declaração de Jomtien, reconheceu-se que a aprendizagem inicia-se com o nascimento, implicando “[...] cuidados básicos e educação infantil na infância, proporcionados por famílias, comunidades ou programas institucionais [...]” (WORLD CONFERENCE ON EDUCATION FOR ALL, 1990, art. 5º, documento on-line). 67 Em 2000, com a realização do Fórum Mundial de Educação para Todos em Dakar (Senegal), fixou-se que uma das metas para a educação seria “[...] expandir e melhorar o cuidado e educação da criança pequena, especialmente para as crianças pequenas mais vulneráveis e em maior desvantagem [...]” (UNESCO, 2000, p. 2). Conforme Moreira e Lara (2012), alguns documentos sobre a concepção de infância, a educação infantil e o cuidado com a criança orientaram o Ministério da Educação Cultura (MEC), nos períodos de 2000 a 2005, a implementar diretrizes para a educação infantil. São eles (MOREIRA; LARA, 2012): Marco de Ação Dakar, da Unesco em 2000; Os serviços para a criança de zero a seis anos no Brasil, da Unesco em 2003; Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, do Banco Mundial nos anos de 1990, 1995 e 1996; Romper o ciclo da pobreza: investir na infância, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em 1999; Sobre a CEPAL, da Comissão Econômica para a América Latina em 2005. Moreira e Lara (2012, p. 159) destacam que as principais categorias de recomendações políticas desses organismos para a educação infantil foram: UNESCO: direito humano; qualidade; aprender a aprender, a fazer, a conviver; educação para o trabalho; desenvolvimento sustentável; expansão e melhoria; focalização à educação básica primária, às meninas, aos pobres; equidade. CEPAL: equidade; transformação produtiva; desenvolvimento sustentável, focalização à pobreza; educação para a competitividade. BANCO MUNDIAL: desenvolvimento sustentável; focalização à pobreza; capital humano; qualidade; descentralização. BANCO DE DESENVOLVIMENTO INTERAMERICANO: focalização à pobreza; cuidado infantil; desenvolvimento sustentável; focalização à educação básica; qualidade;descentralização; aumento produtivo. 68 Momma-Bardela e Passone (2015) apontam que a Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 reforçaram os direitos das crianças e indicaram a importância da educação infantil como direito assegurado, devendo ser oferecido pelo poder público. A Lei de Diretrizes e Bases apontou a educação infantil como primeira etapa da educação básica. No entanto, tais legislações não indicaram como ela deveria funcionar no âmbito das instituições escolares. Posteriormente, o Ministério da Educação e da Cultura introduziu os documentos e Referenciais Curriculares para a Educação Infantil (RCNEI), em 1998. Eles consistem em um conjunto de referências e orientações pedagógicas para os docentes. Em 2001, foi aprovado o Plano Nacional de Educação (PNE) para 2001 a 2011, por meio da Lei nº 10.172/2001. Esse plano estabeleceu metas para a educação infantil tendo como base as recomendações mundiais e a legislação brasileira. Ele determinou a corresponsabilidade de municípios, estados e União e da família, indicando o regime de colaboração para garantir a educação infantil (MOREIRA; LARA, 2012). O PNE estabeleceu um conjunto de 26 objetivos e metas para a educação infantil. Entre eles, estão: [...] a ampliação da oferta de creches e pré-escolas; a elaboração de padrões mínimos de qualidade e infraestrutura para o funcionamento adequado das instituições de educação infantil; a autorização de funcionamento dessas instituições; a formação dos profissionais da área; a garantia da alimentação escolar para as crianças atendidas nos estabelecimentos públicos e conveniados; o fornecimento de materiais adequados às faixas etárias; o estabelecimento de padrões de qualidade como referência para a supervisão; o controle, avaliação e aperfeiçoamento da educação infantil [...] (MOREIRA; LARA, 2012, p. 141) As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) de 1999 e 2009 definiram os princípios para as propostas pedagógicas das instituições de educação infantil. Elas promoveram o reconhecimento pessoal de todos envolvidos, provendo conteúdos básicos para a constituição de conhecimentos e valores, organizando as estratégias de avaliação por meio do acompanhamento e de registros e valorizando um ambiente de gestão democrática e participativa, com profissionais formados como professores (MOREIRA; LARA, 2012). 69 Por meio da Lei nº 13.005, de 2014, foi aprovado o Plano Nacional de Educação para 2014 a 2024, que inclui, direta ou indiretamente, as seguintes metas para a educação infantil: Meta 1: universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de educação infantil em creches, de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE. Meta 4: universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados (ABUCHAIM, 2018, documento on-line) Em 2016, o Marco Legal da Primeira Infância ressaltou a importância de políticas públicas que privilegiassem saúde, alimentação, nutrição, educação infantil, convivência familiar e comunitária, assistência social, cultura, brincadeiras, lazer, espaço, meio ambiente e proteção (ABUCHAIM, 2018). 13.2 Políticas públicas e financiamento para a educação infantil Você sabe como se financia a educação infantil? A partir da década de 1990, alguns órgãos internacionais, por meio de suas instituições, estimularam políticas externas e internas de financiamento para a expansão econômica e a inserção de países em desenvolvimento no mercado global. Como você sabe, o Brasil é um desses países. Tais órgãos influenciaram as políticas públicas de educação e financiamento naqueles anos e nos anos posteriores. Como exemplos desses órgãos, você pode considerar o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Comissão Econômica para a América Latina. (BIERWAGEN, 2019) Moreira e Lara (2012) apontam que órgãos como o Banco Mundial, que financiavam projetos e ações educativas por meio de suas instituições, estabeleceram a noção de que para o crescimento de países em desenvolvimento era necessário investir em capital humano. Isso deveria ocorrer por meio de 70 educação básica. Assim, seria possível obter crescimento econômico e produtividade. O Banco Interamericano de Desenvolvimento buscou desenvolver a América Latina e o Caribe financiando programas e projetos que tivessem como prioridade a redução da pobreza e o incentivo à equidade social. De acordo com Moreira e Lara (2012, p. 111), um discurso que perpassava as orientações políticas do BID era “[...] o de que o investimento na infância contribuía para minimizar ou eliminar a pobreza dos países em desenvolvimento [...]”. A Comissão Econômica para a América Latina é uma agência criada com o objetivo de auxiliar no crescimento econômico dos países da América Latina, coordenando ações dos países dessa região com os demais países do mundo. Ela propôs programas e projetos que promoviam a transformação produtiva com equidade (MOREIRA; LARA, 2012). A partir da influência desses órgãos na produção de políticas públicas e financiamento, chega-se à Constituição Federal brasileira de 1988, que determinou a aplicação na educação de no mínimo 25% das receitas de tributos estaduais, municipais e do Distrito Federal e de 18% dos impostos federais (BRASIL, 1988, art. 212º, documento on-line). Os recursos dos municípios são orientados às etapas que são suas atribuições — educação infantil e ensino fundamental, especialmente os anos iniciais. Os estados concentram suas despesas nos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio. Já a União realiza a oferta, o acompanhamento e a regulação do ensino superior. No Quadro 1, a seguir, você pode ver a organização da educação no Brasil. 71 A Constituição prevê o salário-educação como fonte adicional ao financiamento da educação. O salário-educação é uma contribuição social aplicada ao financiamento de programas voltados para a educação básica. É um valor recolhido das empresas a partir da remuneração dos funcionários (ABUCHAIM, 2018). Do montante arrecadado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), retém-se 1% de taxa de administração e retiram-se as despesas com o sistema de manutenção do ensino. Desse valor, 90% é dividido para: (1) Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que aplica esses recursos em programas federais de educação básica; (2) estados e municípios, que aplicam os recursos na educação básica. Os 10% restantes do montante da arrecadação do salário- educação são também direcionados ao FNDE (ABUCHAIM, 2018). 72 Além disso, ainda em 1996, o Ministério da Educação criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) para auxiliar com recursos o ensino fundamental e os profissionais dessa etapa. Em 2007, o FUNDEF foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), cuja regulamentação está na Lei nº 11.494/2007 e que passou a beneficiar todas as etapas da educação básica. (BIERWAGEN, 2019) O FUNDEB é um fundo estadual para o qual cada estado e seus municípios contribuem com 20% da arrecadação de impostos e transferências definidos por lei. A redistribuição dos recursos é calculada de acordo com o númerode alunos matriculados por etapa da educação básica, com as modalidades e os tipos de estabelecimento de ensino. Os valores atribuídos a esses itens são definidos por representante do MEC, dirigentes municipais de educação e secretários de educação. O FUNDEB tem vigência de 2007 a 2020 (ABUCHAIM, 2018). Como você pode imaginar, esse fundo é muito importante para que haja menos desigualdade nas redes de ensino. Além disso, ele ajuda os sistemas de ensino a se organizarem melhor no atendimento escolar de toda a educação básica, garantindo segurança financeira aos municípios e estados para expandirem seu número de matrículas e orientando-os no cumprimento de suas responsabilidades com a educação. Em 2007, buscando relacionar a questão do financiamento com a qualidade de atendimento, foi lançado um estudo sobre o Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi). Esse é um dispositivo que integra em seu cálculo o trabalho educacional de qualidade, a remuneração dos professores e da equipe técnica, a infraestrutura, o número de alunos por turma e o professor. O FNDE é responsável por calcular o valor anual mínimo por aluno. A União é responsável por repassar o valor complementar aos municípios e aos estados caso não seja atingido tal valor. No Quadro 2, a seguir, você pode ver o custo mínimo por aluno. (BIERWAGEN, 2019) 73 O valor investido na educação infantil em todos esses anos é menor do que o investido no ensino fundamental, no ensino superior e no ensino médio. Além disso, há grande desigualdade de investimento por aluno nas diferentes regiões do País (ABUCHAIM, 2018). Há problemas no que diz respeito à infraestrutura das instituições, às propostas pedagógicas, à capacitação de profissionais e à remuneração. Nesse sentido, surgiram programas, patrocinados pela União, que investem na educação infantil. No tópico a seguir, você vai conhecer alguns desses programas. 14 PROGRAMAS FEDERAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL A União dispõe de recursos para a educação infantil que são aplicados por meio de programas federais, conduzidos pelo orçamento do Ministério da Educação. A seguir, você vai conhecer alguns deles. (BIERWAGEN, 2019)
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