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13
APRESENTAÇÃO
Cristiane Rose Duarte
Paulo Afonso Rheingantz
Giselle Azevedo
Laís Bronstein
Que lugar ocupa o projeto de arquitetura e desenho urbano no campo acadêmico? 
Quais as dificuldades de ensinar (e aprender) projeto de arquitetura, uma vez que se 
trata de uma abstração e comporta uma infinidade de resultados possíveis, sem haver 
um “certo” ou “errado”? Quais são as perspectivas e as possibilidades de focar o projeto 
de arquitetura como objeto de pesquisa no âmbito dos programas de pós-graduação? 
Quais as possibilidades de construir reais rebatimentos de pesquisas sobre projetos na 
construção de um diálogo com a sociedade?
Buscando responder a essas e a outras perguntas pertinentes à questão do ensino e 
da pesquisa em projetos de arquitetura e urbanismo, este livro reúne textos elaborados 
por arquitetos, professores e pesquisadores que têm procurado refletir de maneira crítica 
sobre a arquitetura que produzem, suas bases conceituais e teóricas, seus modelos e seus 
impactos sociais, culturais e/ou ambientais.
A exemplo de autores (por exemplo, Douton, 1992; Boudon e outros, 1994) que têm 
sustentado a reestruturação da pesquisa e do próprio ensino em arquitetura como a mais 
eficaz ferramenta de qualificação da produção arquitetônica, os textos selecionados para 
este livro justificam a premência de discutir o papel do projeto no ensino e na pesquisa em 
arquitetura e urbanismo. De fato, se, de um lado, entende-se por arquitetura e urbanismo 
a atividade humana que transforma de maneira intencional o ambiente físico, por meio de 
projetos de intervenção, de outro, essas intervenções no ambiente físico têm sido cada vez 
menos fundamentadas em bases críticas e conceituais por parte de seus autores. 
A valorização de modelos arquitetônicos mais e mais padronizados, muitas vezes 
inspirados em modelos publicados em revistas e veículos especializados, sugere a neces-
sidade de verificar se esse problema seria reflexo da deficiência das bases pedagógicas do 
“fazer arquitetônico” em nossas escolas ou da falta de debate e de publicações científicas 
na área. Como ressaltam Segawa, Crema e Grava, publicações de arquitetura e urbanis-
mo “têm se voltado cada vez menos para a crítica honesta de projetos de arquitetura, ur-
banismo e paisagismo contemporâneos, e cada vez mais o que se publica é promocional 
ou simples documentação” (Segawa, Crema & Gava, 2003: 122).
No momento em que emergem novos programas de pós-graduação com áreas de 
concentração em projeto e crítica da arquitetura e se consolida uma efetiva produção 
14 LUGAR DO PROJETO
científica na área, busca-se aqui integrar e articular diferentes experiências e conheci-
mentos gerados por professores e pesquisadores da área, a fim de consolidar bases para 
enfrentar os novos desafios que se prenunciam, inclusive aqueles relacionados com a 
formação de mestres e doutores em arquitetura. Com isso, procurou-se atender à de-
manda pela capacitação de novos docentes nas instituições brasileiras de ensino superior 
e contribuir para fomentar a ainda fraca tradição de pesquisa científica específica da área 
no país. Cabe lembrar que não faz muito tempo, os professores de projeto de arquite-
tura e urbanismo eram, sobretudo, profissionais liberais dotados de um saber-fazer, mas 
não necessariamente de um saber-ensinar projetos de arquitetura. 
A demanda crescente por educação continuada e qualificação dos arquitetos inseri-
dos em um mercado de trabalho competitivo e global tem contribuído para aumentar 
a procura por cursos de pós-graduação em arquitetura e urbanismo, considerados im-
portante diferencial de inserção nesse mercado e alternativa para melhorar as práticas 
profissionais dos arquitetos tanto na concepção dos projetos quanto no ensino. A proli-
feração de programas e cursos, bem como de mestrados profissionalizantes é representa-
tiva dessa nova tendência. Além disso, a melhoria do ensino de graduação passa, neces-
sariamente, pela melhoria do ensino dos cursos de pós-graduação, lugares destinados, 
por excelência, à formação de novos quadros de docentes e pesquisadores da área. 
A possibilidade de vislumbrar uma revisão teórica e prática, capaz de viabilizar a 
superação de “preconceitos” e “vícios” de formação ou concepção relacionados com o 
papel do arquiteto e do profissional de ensino de arquitetura, bem como os desafios da 
pesquisa e do ensino na área sugerem a necessidade de analisar os impactos e as trans-
formações provocadas pelos novos paradigmas sócias, técnicos, culturais e econômicos 
nas relações homem-ambiente. Os impactos produzidos pelas novas tecnologias e redes 
informacionais e de telecomunicação no processo de concepção, produção e uso do am-
biente construído ampliam o foco da discussão, já que incluem novas e enriquecedoras 
dimensões teóricas e práticas no projeto de arquitetura como campo disciplinar.
Os textos reunidos neste livro foram selecionados entre os trabalhos apresentados no 
II Seminário sobre Ensino e Pesquisa em Projeto de Arquitetura (Projetar 2005), promovi-
do pelo Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da Universidade Federal do Rio de 
Janeiro (PROARQ/FAU-UFRJ) em novembro de 2005. Esse evento foi precedido pelo 
Projetar 2003 – I Seminário Sobre Ensino e Pesquisa em Projeto de Arquitetura, realizado 
na Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2003. Desse encontro resultou 
um livro que, salvo o do Seminário realizado pela Universidade Federal do Rio Grande 
do Sul em 1984 e os anais dos eventos promovidos pela Associação Brasileira de Ensino 
de Arquitetura (ABEA), constitui a única referência nacional sobre o tema. 
Somando-se a essas iniciativas, o presente livro busca não só preencher uma lacu-
na gerada pelo aumento da produção científica na área de arquitetura e urbanismo, 
como também responder à necessidade de um maior aprofundamento da questão da 
produção do conhecimento nessa área, hoje em franco desenvolvimento. Os textos 
aqui reunidos, após as alterações e revisões feitas por seus autores, buscam abordar as 
questões mais atuais relacionadas com a construção do conhecimento e o ensino do 
projeto de arquitetura e seus rebatimentos, suas práticas, suas interfaces e diálogos, 
tendo sido divididos em quatro grandes eixos: Conferências, Ensino, Concepção e crítica e 
Pesquisa e prática.
15APRESENTAÇÃO
I. Conferências
Georges Teyssot indaga a possibilidade de pensar a arquitetura e o ambiente construído 
a partir do abandono da noção clássica de corpo e organismo. Sua conferência Arquite-
tura no corpo: entre a prótese e o parasita retoma o pensamento de Gilles Deleuze e Félix 
Guattari para ensaiar uma crítica à lógica funcionalista em que o organismo/edifício se 
resume à soma de certo número de órgãos/funções específicos. O estudo oferece aproxi-
mações culturais e históricas de ordem antropomórfica – cyborg, parasita, prótese – nas 
quais a lógica racional é constantemente deslocada.
Na conferência de Philippe Boudon, Do espaço arquitetural ao espaço de concepção, 
são apresentadas as bases da arquiteturologia, ciência que analisa o ato de concepção 
da arquitetura. Ao exemplificar as premissas da arquiteturologia, Boudon sugere a pos-
sibilidade de criar duas linhas de pesquisa: a “poiética arquiteturológica” e a “didática 
arquiteturológica”, que poderiam ser desenvolvidas em programas de pós-graduação em 
arquitetura. 
Em Os Seminários Montevideo: um olhar ao projeto de arquitetura e de urbanismo des-
de o Sul, Salvador Schelotto apresenta, expõe e comenta os principais aspectos de uma 
experiência inovadora que vem sendo realizada nos últimos oito anos no Uruguai.
Paulo Bruna, por sua vez, analisa o curso de mestrado oferecido pela Universidade 
Católica de Santiago do Chile à luz dos mecanismos críticos de Manfredo Tafuri, si-
tuando-o em sua condição histórica contemporânea no texto As relações entre a crítica 
operativa e o Mestrado em Arquitetura da Universidade Católica de Santiago/Chile.
Por fim, Vicente del Rio, valendo-seda premissa do “aprender fazendo”, discute, 
em Considerações sobre a universidade e seu papel social – a participação de alunos em 
projetos urbanos reais: o caso da Cal Poly San Luis Obispo, duas experiências com projetos 
comunitários que envolveram pesquisa aplicada, ação pedagógica direta e problemas 
reais, assim como sua importância para o desenvolvimento comunitário e o aumento 
do interesse e a melhora do desempenho dos alunos.
II. Ensino 
Em Três discursos sobre arquitetura, projeto e seu ensino, Hélio Novak aborda a dificul-
dade de explicar ao aluno a pouca relevância com que os condicionantes econômicos – 
“fundamentais para o projeto” – têm sido tratados pela academia. O autor discute as 
conseqüências práticas de três modos distintos de ver os edifícios – produto que exem-
plifica a ordem imposta pelos projetos ao mundo sensorial, algo capaz de produzir re-
sultados no mundo cotidiano e modo de corporificar valores pessoais ou comunitários – 
e analisa como os arquitetos trabalham essas abordagens e os reflexos destas no ensino 
de projeto. 
Heliana Comin Vargas reflete sobre as práticas e mitos que envolvem o ensino de 
projeto. Em face da impossibilidade de incorporar o método científico decorrente de 
Descartes, seu artigo Ensino/aprendizagem em arquitetura e urbanismo: mitos e métodos 
apresenta novas tecnologias educacionais centradas no aluno. Ao questionar o tradicio-
nal “aprender fazendo” como prática predominante no ensino de projeto – sem fun-
16 LUGAR DO PROJETO
damentação teórica e metodológica –, a autora propõe o estabelecimento de objetivos 
educacionais claros para que se atinjam os fins pretendidos, definindo-se conceitos no 
lugar de uma mera visão doutrinária que reproduza chavões (ditos), aforismos e axiomas 
com o intuito de disseminar princípios.
No texto Os espaços como categoria reveladora dos projetos pedagógicos das instituições 
de educação superior, Mara R. Sordi e José Roberto Merlin examinam a questão dos 
espaços universitários e problematizam o forte componente informativo do verdadeiro 
projeto institucional pedagógico. Constatam que o compromisso com a qualificação 
dos espaços educativos confirma projetos pedagógicos sintonizados com a formação 
humana e que reagem ao viés mercadológico. Conclamam, então, um esforço de apro-
ximação entre a comunidade acadêmica e os arquitetos por intermédio da prática do di-
álogo interdisciplinar e horizontalizado, em que se compartilham experiências e saberes 
profissionais na concepção de um espaço capaz de cumprir sua função educativa.
Com base em resultados de estudos da neurobiologia, Maria de Jesus Britto Leite sus-
tenta, no texto intitulado Formar ou informar? Sobre o aprendizado do arquiteto, a necessida-
de de o sistema de ensino-aprendizagem das escolas de arquitetura apresentar uma estrutura 
mais fundamentada na experimentação, de forma a aguçar os estímulos humanos.
Buscando revelar as formas de construção dos saberes construídos pelo professor ar-
quiteto e urbanista, em grande parte apoiados em sua prática profissional, o texto A práti-
ca do ensino de projeto e a construção dos saberes do professor arquiteto, de Rosilaine Isoldi e 
Maria Isabel da Cunha, aborda questões relativas às práticas educativas dos professores de 
ensino superior e desvenda as origens dos saberes envolvidos na atividade docente.
Em Crítica e avaliação no ensino do projeto arquitetônico: subsídios para uma discussão 
necessária, Elvan Silva expõe sua reflexão acerca da avaliação na disciplina Projeto de Arquite-
tura e da dificuldade (ou impossibilidade) de sua objetivação, posto tratar-se de um juízo de 
valor. Assim, defende a aplicação de procedimentos da crítica da arquitetura que procurem 
desvendar o conteúdo e o significado da obra. Ao verificar a observância das premissas na 
obra, a crítica avalia a prática e a teoria, viabilizando seu mútuo aperfeiçoamento. 
Ao traçar uma análise do distanciamento histórico entre teoria e prática e seus refle-
xos no ensino de projeto, Juliana Torres de Miranda relaciona o risco de uma “produção 
irrefletida” à carência de fundamentos de sua prática e sugere uma renovação mediati-
zada pela crítica. A autora de A relação entre teoria e prática na arquitetura e seu ensino: 
teoria reflexiva e projeto experimental conclui que o desafio do ensino aponta para uma 
pedagogia que enfatize o estúdio como locus de experimentação, capaz de superar a 
relação estanque entre as disciplinas teóricas e as de projeto.
Gleice Elali indica caminhos para a reflexão do processo ensino-aprendizagem em 
arquitetura e urbanismo, tendo como eixo central a construção da autonomia proposi-
tiva do aluno. Para projetar (nossos) elefantes: considerações sobre a conquista da autonomia 
pelo estudante de arquitetura e urbanismo propõe que o “aprender” em arquitetura e ur-
banismo envolve a consolidação de um acervo de conhecimentos/interesses que formam 
um repertório projetual, e que é a aquisição dessa cultura arquitetônica-urbanística que 
fundamentará a construção da autonomia do estudante. 
Tendo como base o esboço do panorama das dificuldades de avaliação na disciplina de 
Projeto em faculdades de arquitetura em seu trabalho, chamado A avaliação no ensino do 
projeto de arquitetura e urbanismo: problemas e dificuldades, Maria Lucia Malard sustenta, 
17APRESENTAÇÃO
com muita propriedade e lucidez, que os professores de projeto avaliam os alunos a partir 
de seus pressupostos e tradição, derrubando os mitos da originalidade e da isenção. 
Em Senso e conceito no construto da disciplina projetual, Marcos Fávero e Andrés Passaro 
apresentam uma experiência de ensino de projeto realizada na Pontifícia Universidade 
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e discorrem sobre uma estratégia metodológica que 
vai da análise perceptiva à interpretação formal compositiva, com a definição de concei-
tos que sustentam o objeto arquitetônico. Também questionam a abordagem de projeto 
como uma simples questão de imagens referenciais e o excesso e a frivolidade da informa-
ção imagética desprovida de senso e de conceito, propondo um método capaz de instru-
mentalizar o aluno para uma postura projetual mais crítica diante do fazer arquitetônico.
Eduardo Westphal, Maria Helena Cavalheiro e Benamy Turkienicz, em Função am-
pliada, flexibilidade e contextualização, analisam os exercícios iniciais da disciplina de 
Projeto Arquitetônico do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Federal 
do Rio Grande do Sul (UFRGS) que utilizam o conceito de “affordance” de Barbara 
Tversky e a alternância de contexto para ampliar a percepção do uso-função de objetos e 
estimular a “relativa autonomia dos estudantes, influenciando positivamente o processo 
cognitivo na geração de projetos de arquitetura”. 
Em Estudos cinestésicos: uma experiência projetual em torno do exercício experimental da li-
berdade, Kátia de Paula, Ethel Pinheiro e Cristiane Duarte apresentam exercícios experimen-
tais de projeto de arquitetura realizados com alunos do quarto período de duas faculdades 
de arquitetura e urbanismo distintas: UFRJ e Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). Esses 
exercícios, inspirados em experimentos de Hélio Oiticica, buscam incorporar os sentidos 
visuais, espaciotemporais e cinestésicos a partir do movimento do homem no espaço. 
O ensino de projeto no curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Federal 
da bahia (UFBA) é analisado em Ensino de projeto: um passo à frente, dois atrás?, no qual 
se enfatiza a diferença entre o ensino factual e a proposta com enfoque construtivista 
da reforma curricular de 1996 e seus reflexos nos procedimentos pedagógicos dessa 
disciplina. Susana Olmos narra uma experiência que incorpora o desenvolvimento da 
autonomia no olhar e no agir no mundo ao ensino da criatividade em atividades que 
incluem história, teoria e crítica.
No trabalho Estratégias para o uso da simetria no ensino de projeto, Rosirene Mayer, 
Mateus Paulo Beck, Cândida Marcon e Benamy Turkieniczrelatam experiência desen-
volvida na disciplina Projetos-III, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFR-
GS. A experiência propõe a exploração da simetria e o uso do computador como ferra-
menta de projetação (e não apenas de representação), a fim de ampliar as habilidades 
cognitivas empregadas pelos alunos na resolução de problemas de projeto. 
O artigo A praga do infinito e a ressurreição do lugar, de Frederico Holanda, discute 
o campo do desenho urbano e seu ensino. O autor reflete sobre o paradigma moderno, 
que não é mais hegemônico em sua totalidade, apresenta a experiência de ensino de 
projeto de urbanismo na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de 
Brasília (FAU/UnB), e demonstra como esse método permite uma visão crítica e a 
produção do conhecimento morfológico da cidade. Apesar de, em Brasília, predominar 
o espaço infinito em detrimento da configuração do lugar, o autor reconhece que os 
projetos dos estudantes superam a “praga” do espaço infinito modernista, delineando 
um novo paradigma de projeto que resgata as mais belas lições do passado. 
18 LUGAR DO PROJETO
Silvio Macedo, em Ensino de projeto de paisagismo e, por que não, de urbanismo e pro-
jeto de arquitetura discute e apresenta procedimentos e métodos de ensino de ateliê que 
têm sido desenvolvidos nas disciplinas obrigatórias de paisagismo na Faculdade de ar-
quitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), tecendo interessantes 
considerações sobre o papel do aluno, do professor e das práticas tradicionais de ateliê.
A experiência da disciplina Arquitetura e Mídia Digital II, ministrada na FAU/
UFRJ, é relatada por Teresa C. Malveira de Araújo, José R. Kós e Ângela M. Gabriella 
Rossi em Arquitetura e Mídia Digital II – um estudo comparativo, no qual discorrem 
sobre o contexto dos exercícios de aprendizagem colaborativa à distância e ressaltam a 
relevância do intercâmbio virtual via internet. Os autores valorizam aspectos positivos 
da experiência didática que oferecem a oportunidade de confrontar idéias e conhecer 
novas culturas de projeto, bem como intercambiar metodologias de ensino.
Iana Alves Rufino e Maísa Veloso analisam o contexto de ensino do projeto de arqui-
tetura em face das novas tecnologias informacionais. No texto Entre a bicicleta e a nave 
espacial: os novos paradigmas da informática e o ensino do projeto arquitetônico, discutem o 
surgimento de novos paradigmas como o “projeto colaborativo”, a “simulação” e a “arquite-
tura digital” e suas implicações no processo ensino-aprendizagem, destacando que as novas 
práticas e ferramentas, apesar de facilitarem o processo, não garantem a qualidade do objeto 
arquitetônico concebido, nem uma formação na melhor do aluno na área de projeto.
Em Habitar a cidade: algumas lições de uma experiência de ensino, Marcelo Tramon-
tano, Varlete Benevente e Sonia Marques propõem, com base em quatro experiências 
internacionais e uma experiência de ateliê virtual com ênfase em processos de ensino 
através da internet, uma reflexão sobre as possibilidades de uso das chamadas tecnolo-
gias de informação no ateliê de projeto de arquitetura. 
No texto Projeto Academia: uma reflexão crítica sobre o ensino de arquitetura, urbanis-
mo e paisagismo no Brasil, as professoras Vera Regina Tângari e Maria Ângela Dias apre-
sentam o projeto da Revista Academia da FAU/UFRJ e discutem o papel e a impor-
tância do registro sistemático da produção acadêmica como forma de refletir sobre o 
ensino de arquitetura, urbanismo e paisagismo no Brasil, em razão tanto de sua revisão 
histórica quanto da discussão do momento atual. 
Mary Hardin relata, em A pesquisa como prática ética: objetivos acadêmicos alinhados 
às necessidades da comunidade, uma interessante experiência da Universidade do Ari-
zona, na qual alunos e docentes buscaram, na prática, soluções de barateamento da 
construção para comunidades de baixa renda, por meio de projetos executados com 
solo-cimento e o uso da técnica da taipa de pilão.
III. Concepção e crítica
No artigo O projeto como argumento, Guilherme Lassance defende a associação do pro-
cesso de concepção ao processo de argumentação como meio de situar o projeto de 
arquitetura em um campo que contemple tanto a pesquisa quanto a própria prática 
disciplinar.
Ao lançar um olhar bem fundamentado sobre o ato de projetar por meio de dese-
nhos à mão (croquis), Paulo Horn Regal, no texto intitulado Ressignificação e prática 
19APRESENTAÇÃO
gráfica, defende que o croquis é um ato de interpretação que acompanha a comunicação 
gráfica, uma vez que o significado (o desenho) não é um puro e simples “desempacota-
mento operado no significante” (objeto ou idéia), e sim um novo significante.
Fernando Vázquez Ramos atesta a importância dos modelos analógicos na concep-
ção do projeto de arquitetura. Seu trabalho Arquitetura: os planos de proposta. Criação, 
representação e informação reconhece as finalidades idênticas que desenho e modelo 
cumprem nas distintas etapas do processo criativo.
Em Território do projeto, José Roberto Merlin estabelece a existência de diferentes 
fases na concepção projetual, que podem ser agrupadas segundo dois momentos mais 
amplos e intimamente relacionados: o de criação e o de aperfeiçoamento formal. Seu es-
tudo se pauta na análise dos processos de projeto de determinados arquitetos e também 
em depoimentos de docentes de arquitetura.
Ada Kwiatkowska constata a crescente influência da realidade virtual e do concei-
to de ciberespaço na arquitetura, para propor, em A gênese das formas arquitetônicas: 
projetos inventivos na era virtual, uma investigação de como a idéia inicial do projeto 
é expressa formalmente e revela processos que podem ser efetuados com ferramentas 
tradicionais de representação ou tecnologias digitais. 
Recitais imagéticos: criação, transferência e disseminação na arquitetura, de Milton Fe-
ferman, centra-se na análise de um conjunto de projetos e imagens para demonstrar que 
a revolução visual característica dos tempos atuais tem origem no imaginário presente 
na criatividade artística do século XVIII.
Ao reafirmar o valor da planta como elemento central na compreensão da dimensão 
experiencial/topológica da arquitetura, Douglas Vieira de Aguiar ressalta, em Planta e 
corpo: elementos de topologia na arquitetura, a importância de valorizar a dimensão invi-
sível, mas freqüentemente sublimada, quedefine o real modo de utilização do espaço, 
permitindo visualizar sinteticamente as seqüências espaciais e o padrão de fruição dos 
corpos no espaço arquitetônico. 
Em Questões de escala, Claudia Piantá Costa Cabral propõe uma atualização do con-
ceito de escala em face das transformações verificadas no entendimento desse termo 
desde a abordagem funcionalista que lentamente relativizou e desmontou a tradição 
clássica ate as praticas arquitetônicas contemporâneas. 
Em Além da linguagem, além do objeto: ordem e experimentação na metodologia proje-
tual de Rem Koolhaas, Gentil Porto Filho aborda o trabalho do arquiteto holandês, para 
não só analisá-lo sobretudo a partir de seu viés experimental e crítico, como também 
revelar a postura combativa desse arquiteto em relação aos clichês que dominaram a 
cultura arquitetônica depois do Modernismo.
O caso do projeto paradigmático do Ministério da Educação é retomado por Carlos 
Eduardo Comas em Projeto arquitetônico, obra coletiva: o caso do Ministério da Educação, 
com o propósito de “enfatizar o caráter coletivo de sua autoria” e “atacar o mito da ori-
ginalidade e da inspiração sem desenvolvimento trabalhoso”. 
IV. Pesquisa e prática
Edson Mahfuz, em A pesquisa e suas possíveis relações com o projeto, reflete sobre a indis-
20 LUGAR DO PROJETO
sociabilidade entre pesquisa, prática e ensino de projeto. Comenta sobre as várias nuan-
ças assumidas pela pesquisa assume seja no âmbito da graduação, seja nas investigações 
desenvolvidas na pós-graduação ou na pesquisa efetuada como procedimento inerente à 
prática arquitetônica,bem como sustenta que não deve haver antagonismo entre teoria 
e prática, e que o ensino e a pesquisa em projeto devem estar constantemente em diálo-
go, a fim de que os valores oriundos do mercado não imponham à produção arquitetô-
nica tendências desprovidas de reflexão teórica. 
No trabalho Humanização do edifício hospitalar, um tema em aberto, Luiz Carlos 
Toledo analisa a relação entre os saberes, práticas e políticas de saúde pública e a arqui-
tetura hospitalar brasileira no século XX, sugerindo que o processo de humanização 
da atenção à saúde e da arquitetura dos hospitais ainda está em construção. Em sua 
argumentação, relaciona os obstáculos para alcançar os princípios de integralidade, uni-
versalidade e eqüidade defendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) aos desafios a 
serem superados para a humanização do ambiente hospitalar, assim como apresenta um 
conjunto de propostas projetuais com vistas a aprimorar sua concepção. 
Márcio Minto Fabricio e Silvio Burrattino Melhado discorrem sobre a formação 
projetual em arquitetura perante a atividade de coordenação de projetos multidiscipli-
nares na construção de edifícios no artigo Formação projetual em arquitetura e coordena-
ção de projetos multidisciplinares de edifícios.. 
A edificação como produto imobiliário no desenvolvimento da arquitetura contemporâ-
nea em São Paulo, Brasil, de Roberto Righi e Luiz Guilherme de Castro, baseia-se em 
práticas recentes de desenvolvimento de empreendimentos imobiliários e nas teorias e 
práticas arquitetônicas identificadas na cidade de São Paulo para relacionar o produto 
imobiliário com o projeto de arquitetura. 
A amplitude de possibilidades e a importância da programação arquitetônica no 
projeto de edificações de funções complexas pelo porte ou pela quantidade de variáveis 
envolvidas são ressaltadas por Frederico Barreto e Antonio Pedro de Carvalho. Em Pro-
gramação arquitetônica em edificações complexas, eles descrevem com clareza e didática 
alguns modelos e técnicas de pesquisa e organização de dados que corporificam os pro-
cedimentos de programação arquitetônica e apontam sua importância como campo de 
pesquisa vinculado ao projeto, bem como sua contribuição para a melhoria qualitativa 
da síntese criativa.
No texto intitulado Contribuição dos métodos de investigação qualitativos para a abor-
dagem científica do projeto de arquitetura, cujo estudo de caso é uma comunidade de 
autoconstrutores em Florianópolis, Adriana Cordeiro e Wilson Silveira propõem uma 
pesquisa baseada na interface entre as ciências sociais e a arquitetura, visando a um 
maior enriquecimento das formas de analisar e compreender o projeto arquitetônico.
Em Por uma conservação do espaço da arquitetura, ao encarar a dimensão espacial 
como parte integrante do fato cultural, Claudia Loureiro e Luiz Amorim se preocupam 
com a dissociação entre as práticas de restauro e as teorias arquitetônicas, e apresentam 
propostas de metodologia de descrição e análise, contribuindo para o enriquecimento 
das práticas consolidadas de conservação e restauro.
Cristiane Rose Duarte, Alice Brasileiro, Ethel Santana, Kátia de Paula, Mariana 
Vieira e Paula Uglione, em Projeto como metáfora: explorando ferramentas de análise do 
espaço construído, apresentam diretrizes das pesquisas e análises sobre a inter-relação 
21APRESENTAÇÃO
pessoa-cultura-ambiente construído desenvolvidas no Grupo de Pesquisa Arquitetura, 
Subjetividade e Cultura. A partir do delineamento de ferramentas cuja base é o leque 
interdisciplinar das ciências humanas – adaptadas à linguagem e à sensibilidade pró-
prias à área de arquitetura e urbanismo –, refletem a respeito das metáforas espaciais, 
contribuindo para o debate sobre a importância da interdisciplinaridade na pesquisa em 
arquitetura e urbanismo.
Com o trabalho intitulado Uma abordagem transdisciplinar e inclusiva da criança na 
avaliação e na concepção de ambientes construídos para a educação infantil, Giselle Arteiro 
Azevedo, Paulo Afonso Rheingantz, Leopoldo Eurico Bastos, Vera Vasconcellos, Ligia 
de Aquino e Fabiana Souza relatam o processo de criação e as atividades do Grupo Am-
biente-Educação (GAE), que investiga novos paradigmas para projetos de arquitetura 
para a educação infantil, apresentam os enfoques utilizados pelo GAE em seus traba-
lhos, que descartam a visão do edifício escolar isolado de seu contexto social, histórico 
e cultural, enfatizando seus vínculos nessa inter-relação.
***
Em face da importância da reflexão crítica sobre o “ensinar”, o “pensar” e o “fazer” ar-
quitetura, esperamos que este livro contribua não só para o avanço da reflexão sobre o 
projeto de arquitetura e urbanismo como campo de ensino e de pesquisa, mas também 
para sua consolidação nos programas de pós-graduação e a conseqüente renovação do 
ensino de graduação. Desejamos que a leitura dos textos aqui reunidos sirva de incen-
tivo para o surgimento de outros fóruns de discussão que ampliem e democratizem a 
reflexão crítica sobre a construção do conhecimento e do ensino do projeto de arquite-
tura e seus rebatimentos, práticas, interfaces e diálogos com a sociedade e com outros 
campos disciplinares e/ou áreas do conhecimento.
Referências bibliográficas
BOUDON, Philippe; DESHAYES, Philippe; POUSIN, Frédéric & SCHATZ, Françoise
(1994) Enseigner la conception architecturale. Paris : Éditions de la Vilette.
DUTTON, Thomas A. 
(1991) Voices in architectural education: cultural politics and pedagogy. New York: Bergin e Garvey.
SEGAWA, Hugo; CREMA, Adriana & GAVA, Maristela
(2003) “Revistas de arquitetura, urbanismo, paisagismo e design: a divergência de perspectivas”, 
Ci. Inf., vol. 32, n. 3. Brasília, p. 120-7.
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ApresentAção
Cristiane rose Duarte
paulo Afonso rheingantz
Giselle Azevedo
Laís Bronstein
Que lugar ocupa o projeto de arquitetura e desenho urbano no campo acadêmico? 
Quais as dificuldades de ensinar (e aprender) projeto de arquitetura, uma vez que se 
trata de uma abstração e comporta uma infinidade de resultados possíveis, sem haver 
um “certo” ou “errado”? Quais são as perspectivas e as possibilidades de focar o projeto 
de arquitetura como objeto de pesquisa no âmbito dos programas de pós-graduação? 
Quais as possibilidades de construir reais rebatimentos de pesquisas sobre projetos na 
construção de um diálogo com a sociedade?
Buscando responder a essas e a outras perguntas pertinentes à questão do ensino e 
da pesquisa em projetos de arquitetura e urbanismo, este livro reúne textos elaborados 
por arquitetos, professores e pesquisadores que têm procurado refletir de maneira crítica 
sobre a arquitetura que produzem, suas bases conceituais e teóricas, seus modelos e seus 
impactos sociais, culturais e/ou ambientais.
A exemplo de autores (por exemplo, Douton, 1992; Boudon e outros, 1994) que têm 
sustentado a reestruturação da pesquisa e do próprio ensino em arquitetura como a mais 
eficaz ferramenta de qualificação da produção arquitetônica, os textos selecionados para 
este livro justificam a premência de discutir o papel do projeto no ensino e na pesquisa em 
arquitetura e urbanismo. De fato, se, de um lado, entende-se por arquitetura e urbanismo 
a atividade humana que transforma de maneira intencional o ambiente físico, por meio de 
projetos de intervenção, de outro, essas intervenções no ambiente físico têm sido cada vez 
menos fundamentadas em bases críticas e conceituais por parte de seus autores. 
A valorização de modelos arquitetônicos mais e mais padronizados, muitas vezes 
inspirados em modelos publicados em revistas e veículos especializados, sugere a neces-
sidade de verificar se esse problema seria reflexo da deficiência das bases pedagógicas do 
“fazer arquitetônico” em nossas escolas ou da falta de debate e de publicações científicas 
na área. Como ressaltam Segawa, Crema e Grava, publicações de arquitetura e urbanis-
mo “têm se voltado cada vez menos para a crítica honesta de projetos de arquitetura, ur-
banismo e paisagismo contemporâneos, e cadavez mais o que se publica é promocional 
ou simples documentação” (Segawa, Crema & Gava, 2003: 122).
No momento em que emergem novos programas de pós-graduação com áreas de 
concentração em projeto e crítica da arquitetura e se consolida uma efetiva produção 
14 o LUGAr Do proJeto
científica na área, busca-se aqui integrar e articular diferentes experiências e conheci-
mentos gerados por professores e pesquisadores da área, a fim de consolidar bases para 
enfrentar os novos desafios que se prenunciam, inclusive aqueles relacionados com a 
formação de mestres e doutores em arquitetura. Com isso, procurou-se atender à de-
manda pela capacitação de novos docentes nas instituições brasileiras de ensino superior 
e contribuir para fomentar a ainda fraca tradição de pesquisa científica específica da área 
no país. Cabe lembrar que não faz muito tempo, os professores de projeto de arquite-
tura e urbanismo eram, sobretudo, profissionais liberais dotados de um saber-fazer, mas 
não necessariamente de um saber-ensinar projetos de arquitetura. 
A demanda crescente por educação continuada e qualificação dos arquitetos inseri-
dos em um mercado de trabalho competitivo e global tem contribuído para aumentar 
a procura por cursos de pós-graduação em arquitetura e urbanismo, considerados im-
portante diferencial de inserção nesse mercado e alternativa para melhorar as práticas 
profissionais dos arquitetos tanto na concepção dos projetos quanto no ensino. A proli-
feração de programas e cursos, bem como de mestrados profissionalizantes é representa-
tiva dessa nova tendência. Além disso, a melhoria do ensino de graduação passa, neces-
sariamente, pela melhoria do ensino dos cursos de pós-graduação, lugares destinados, 
por excelência, à formação de novos quadros de docentes e pesquisadores da área. 
A possibilidade de vislumbrar uma revisão teórica e prática, capaz de viabilizar a 
superação de “preconceitos” e “vícios” de formação ou concepção relacionados com o 
papel do arquiteto e do profissional de ensino de arquitetura, bem como os desafios da 
pesquisa e do ensino na área sugerem a necessidade de analisar os impactos e as trans-
formações provocadas pelos novos paradigmas sócias, técnicos, culturais e econômicos 
nas relações homem-ambiente. Os impactos produzidos pelas novas tecnologias e redes 
informacionais e de telecomunicação no processo de concepção, produção e uso do am-
biente construído ampliam o foco da discussão, já que incluem novas e enriquecedoras 
dimensões teóricas e práticas no projeto de arquitetura como campo disciplinar.
Os textos reunidos neste livro foram selecionados entre os trabalhos apresentados no 
II Seminário sobre Ensino e Pesquisa em Projeto de Arquitetura (Projetar 2005), promovi-
do pelo Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da Universidade Federal do Rio de 
Janeiro (PROARQ/FAU-UFRJ) em novembro de 2005. Esse evento foi precedido pelo 
Projetar 2003 – I Seminário Sobre Ensino e Pesquisa em Projeto de Arquitetura, realizado 
na Universidade Federal do Rio Grande do Norte em 2003. Desse encontro resultou 
um livro que, salvo o do Seminário realizado pela Universidade Federal do Rio Grande 
do Sul em 1984 e os anais dos eventos promovidos pela Associação Brasileira de Ensino 
de Arquitetura (ABEA), constitui a única referência nacional sobre o tema. 
Somando-se a essas iniciativas, o presente livro busca não só preencher uma lacu-
na gerada pelo aumento da produção científica na área de arquitetura e urbanismo, 
como também responder à necessidade de um maior aprofundamento da questão da 
produção do conhecimento nessa área, hoje em franco desenvolvimento. Os textos 
aqui reunidos, após as alterações e revisões feitas por seus autores, buscam abordar as 
questões mais atuais relacionadas com a construção do conhecimento e o ensino do 
projeto de arquitetura e seus rebatimentos, suas práticas, suas interfaces e diálogos, 
tendo sido divididos em quatro grandes eixos: Conferências, Ensino, Concepção e crítica e 
Pesquisa e prática.
15ApresentAção
I. Conferências
Georges Teyssot indaga a possibilidade de pensar a arquitetura e o ambiente construído 
a partir do abandono da noção clássica de corpo e organismo. Sua conferência Arquite-
tura no corpo: entre a prótese e o parasita retoma o pensamento de Gilles Deleuze e Félix 
Guattari para ensaiar uma crítica à lógica funcionalista em que o organismo/edifício se 
resume à soma de certo número de órgãos/funções específicos. O estudo oferece aproxi-
mações culturais e históricas de ordem antropomórfica – cyborg, parasita, prótese – nas 
quais a lógica racional é constantemente deslocada.
Na conferência de Philippe Boudon, Do espaço arquitetural ao espaço de concepção, 
são apresentadas as bases da arquiteturologia, ciência que analisa o ato de concepção 
da arquitetura. Ao exemplificar as premissas da arquiteturologia, Boudon sugere a pos-
sibilidade de criar duas linhas de pesquisa: a “poiética arquiteturológica” e a “didática 
arquiteturológica”, que poderiam ser desenvolvidas em programas de pós-graduação em 
arquitetura. 
Em Os Seminários Montevideo: um olhar ao projeto de arquitetura e de urbanismo des-
de o Sul, Salvador Schelotto apresenta, expõe e comenta os principais aspectos de uma 
experiência inovadora que vem sendo realizada nos últimos oito anos no Uruguai.
Paulo Bruna, por sua vez, analisa o curso de mestrado oferecido pela Universidade 
Católica de Santiago do Chile à luz dos mecanismos críticos de Manfredo Tafuri, si-
tuando-o em sua condição histórica contemporânea no texto As relações entre a crítica 
operativa e o Mestrado em Arquitetura da Universidade Católica de Santiago/Chile.
Por fim, Vicente del Rio, valendo-se da premissa do “aprender fazendo”, discute, 
em Considerações sobre a universidade e seu papel social – a participação de alunos em 
projetos urbanos reais: o caso da Cal Poly San Luis Obispo, duas experiências com projetos 
comunitários que envolveram pesquisa aplicada, ação pedagógica direta e problemas 
reais, assim como sua importância para o desenvolvimento comunitário e o aumento 
do interesse e a melhora do desempenho dos alunos.
II. ensino 
Em Três discursos sobre arquitetura, projeto e seu ensino, Hélio Novak aborda a dificul-
dade de explicar ao aluno a pouca relevância com que os condicionantes econômicos – 
“fundamentais para o projeto” – têm sido tratados pela academia. O autor discute as 
conseqüências práticas de três modos distintos de ver os edifícios – produto que exem-
plifica a ordem imposta pelos projetos ao mundo sensorial, algo capaz de produzir re-
sultados no mundo cotidiano e modo de corporificar valores pessoais ou comunitários – 
e analisa como os arquitetos trabalham essas abordagens e os reflexos destas no ensino 
de projeto. 
Heliana Comin Vargas reflete sobre as práticas e mitos que envolvem o ensino de 
projeto. Em face da impossibilidade de incorporar o método científico decorrente de 
Descartes, seu artigo Ensino/aprendizagem em arquitetura e urbanismo: mitos e métodos 
apresenta novas tecnologias educacionais centradas no aluno. Ao questionar o tradicio-
nal “aprender fazendo” como prática predominante no ensino de projeto – sem fun-
16 o LUGAr Do proJeto
damentação teórica e metodológica –, a autora propõe o estabelecimento de objetivos 
educacionais claros para que se atinjam os fins pretendidos, definindo-se conceitos no 
lugar de uma mera visão doutrinária que reproduza chavões (ditos), aforismos e axiomas 
com o intuito de disseminar princípios.
No texto Os espaços como categoria reveladora dos projetos pedagógicos das instituições 
de educação superior, Mara R. Sordi e José Roberto Merlin examinam a questão dos 
espaços universitários e problematizam o forte componente informativo do verdadeiro 
projeto institucional pedagógico. Constatam que o compromisso com a qualificação 
dos espaços educativos confirma projetos pedagógicos sintonizados com a formação 
humana e que reagem ao viés mercadológico. Conclamam, então, um esforçode apro-
ximação entre a comunidade acadêmica e os arquitetos por intermédio da prática do di-
álogo interdisciplinar e horizontalizado, em que se compartilham experiências e saberes 
profissionais na concepção de um espaço capaz de cumprir sua função educativa.
Com base em resultados de estudos da neurobiologia, Maria de Jesus Britto Leite sus-
tenta, no texto intitulado Formar ou informar? Sobre o aprendizado do arquiteto, a necessida-
de de o sistema de ensino-aprendizagem das escolas de arquitetura apresentar uma estrutura 
mais fundamentada na experimentação, de forma a aguçar os estímulos humanos.
Buscando revelar as formas de construção dos saberes construídos pelo professor ar-
quiteto e urbanista, em grande parte apoiados em sua prática profissional, o texto A práti-
ca do ensino de projeto e a construção dos saberes do professor arquiteto, de Rosilaine Isoldi e 
Maria Isabel da Cunha, aborda questões relativas às práticas educativas dos professores de 
ensino superior e desvenda as origens dos saberes envolvidos na atividade docente.
Em Crítica e avaliação no ensino do projeto arquitetônico: subsídios para uma discussão 
necessária, Elvan Silva expõe sua reflexão acerca da avaliação na disciplina Projeto de Arquite-
tura e da dificuldade (ou impossibilidade) de sua objetivação, posto tratar-se de um juízo de 
valor. Assim, defende a aplicação de procedimentos da crítica da arquitetura que procurem 
desvendar o conteúdo e o significado da obra. Ao verificar a observância das premissas na 
obra, a crítica avalia a prática e a teoria, viabilizando seu mútuo aperfeiçoamento. 
Ao traçar uma análise do distanciamento histórico entre teoria e prática e seus refle-
xos no ensino de projeto, Juliana Torres de Miranda relaciona o risco de uma “produção 
irrefletida” à carência de fundamentos de sua prática e sugere uma renovação mediati-
zada pela crítica. A autora de A relação entre teoria e prática na arquitetura e seu ensino: 
teoria reflexiva e projeto experimental conclui que o desafio do ensino aponta para uma 
pedagogia que enfatize o estúdio como locus de experimentação, capaz de superar a 
relação estanque entre as disciplinas teóricas e as de projeto.
Gleice Elali indica caminhos para a reflexão do processo ensino-aprendizagem em 
arquitetura e urbanismo, tendo como eixo central a construção da autonomia proposi-
tiva do aluno. Para projetar (nossos) elefantes: considerações sobre a conquista da autonomia 
pelo estudante de arquitetura e urbanismo propõe que o “aprender” em arquitetura e ur-
banismo envolve a consolidação de um acervo de conhecimentos/interesses que formam 
um repertório projetual, e que é a aquisição dessa cultura arquitetônica-urbanística que 
fundamentará a construção da autonomia do estudante. 
Tendo como base o esboço do panorama das dificuldades de avaliação na disciplina de 
Projeto em faculdades de arquitetura em seu trabalho, chamado A avaliação no ensino do 
projeto de arquitetura e urbanismo: problemas e dificuldades, Maria Lucia Malard sustenta, 
17ApresentAção
com muita propriedade e lucidez, que os professores de projeto avaliam os alunos a partir 
de seus pressupostos e tradição, derrubando os mitos da originalidade e da isenção. 
Em Senso e conceito no construto da disciplina projetual, Marcos Fávero e Andrés Passaro 
apresentam uma experiência de ensino de projeto realizada na Pontifícia Universidade 
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e discorrem sobre uma estratégia metodológica que 
vai da análise perceptiva à interpretação formal compositiva, com a definição de concei-
tos que sustentam o objeto arquitetônico. Também questionam a abordagem de projeto 
como uma simples questão de imagens referenciais e o excesso e a frivolidade da informa-
ção imagética desprovida de senso e de conceito, propondo um método capaz de instru-
mentalizar o aluno para uma postura projetual mais crítica diante do fazer arquitetônico.
Eduardo Westphal, Maria Helena Cavalheiro e Benamy Turkienicz, em Função am-
pliada, flexibilidade e contextualização, analisam os exercícios iniciais da disciplina de 
Projeto Arquitetônico do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Federal 
do Rio Grande do Sul (UFRGS) que utilizam o conceito de “affordance” de Barbara 
Tversky e a alternância de contexto para ampliar a percepção do uso-função de objetos e 
estimular a “relativa autonomia dos estudantes, influenciando positivamente o processo 
cognitivo na geração de projetos de arquitetura”. 
Em Estudos cinestésicos: uma experiência projetual em torno do exercício experimental da li-
berdade, Kátia de Paula, Ethel Pinheiro e Cristiane Duarte apresentam exercícios experimen-
tais de projeto de arquitetura realizados com alunos do quarto período de duas faculdades 
de arquitetura e urbanismo distintas: UFRJ e Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). Esses 
exercícios, inspirados em experimentos de Hélio Oiticica, buscam incorporar os sentidos 
visuais, espaciotemporais e cinestésicos a partir do movimento do homem no espaço. 
O ensino de projeto no curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Federal 
da Bahia (UFBA) é analisado em Ensino de projeto: um passo à frente, dois atrás?, no qual 
se enfatiza a diferença entre o ensino factual e a proposta com enfoque construtivista 
da reforma curricular de 1996 e seus reflexos nos procedimentos pedagógicos dessa 
disciplina. Susana Olmos narra uma experiência que incorpora o desenvolvimento da 
autonomia no olhar e no agir no mundo ao ensino da criatividade em atividades que 
incluem história, teoria e crítica.
No trabalho Estratégias para o uso da simetria no ensino de projeto, Rosirene Mayer, 
Mateus Paulo Beck, Cândida Marcon e Benamy Turkienicz relatam experiência desen-
volvida na disciplina Projetos-III, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFR-
GS. A experiência propõe a exploração da simetria e o uso do computador como ferra-
menta de projetação (e não apenas de representação), a fim de ampliar as habilidades 
cognitivas empregadas pelos alunos na resolução de problemas de projeto. 
O artigo A praga do infinito e a ressurreição do lugar, de Frederico Holanda, discute 
o campo do desenho urbano e seu ensino. O autor reflete sobre o paradigma moderno, 
que não é mais hegemônico em sua totalidade, apresenta a experiência de ensino de 
projeto de urbanismo na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de 
Brasília (FAU/UnB), e demonstra como esse método permite uma visão crítica e a 
produção do conhecimento morfológico da cidade. Apesar de, em Brasília, predominar 
o espaço infinito em detrimento da configuração do lugar, o autor reconhece que os 
projetos dos estudantes superam a “praga” do espaço infinito modernista, delineando 
um novo paradigma de projeto que resgata as mais belas lições do passado. 
18 o LUGAr Do proJeto
Silvio Macedo, em Ensino de projeto de paisagismo e, por que não, de urbanismo e pro-
jeto de arquitetura discute e apresenta procedimentos e métodos de ensino de ateliê que 
têm sido desenvolvidos nas disciplinas obrigatórias de paisagismo na Faculdade de Ar-
quitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), tecendo interessantes 
considerações sobre o papel do aluno, do professor e das práticas tradicionais de ateliê.
A experiência da disciplina Arquitetura e Mídia Digital II, ministrada na FAU/
UFRJ, é relatada por Teresa C. Malveira de Araújo, José R. Kós e Ângela M. Gabriella 
Rossi em Arquitetura e Mídia Digital II – um estudo comparativo, no qual discorrem 
sobre o contexto dos exercícios de aprendizagem colaborativa à distância e ressaltam a 
relevância do intercâmbio virtual via internet. Os autores valorizam aspectos positivos 
da experiência didática que oferecem a oportunidade de confrontar idéias e conhecer 
novas culturas de projeto, bem como intercambiar metodologias de ensino.
Iana Alves Rufino e Maísa Veloso analisam o contexto de ensino do projeto de arqui-
tetura em face das novas tecnologias informacionais. No texto Entre a bicicleta e a naveespacial: os novos paradigmas da informática e o ensino do projeto arquitetônico, discutem o 
surgimento de novos paradigmas como o “projeto colaborativo”, a “simulação” e a “arquite-
tura digital” e suas implicações no processo ensino-aprendizagem, destacando que as novas 
práticas e ferramentas, apesar de facilitarem o processo, não garantem a qualidade do objeto 
arquitetônico concebido, nem uma formação na melhor do aluno na área de projeto.
Em Habitar a cidade: algumas lições de uma experiência de ensino, Marcelo Tramon-
tano, Varlete Benevente e Sonia Marques propõem, com base em quatro experiências 
internacionais e uma experiência de ateliê virtual com ênfase em processos de ensino 
através da internet, uma reflexão sobre as possibilidades de uso das chamadas tecnolo-
gias de informação no ateliê de projeto de arquitetura. 
No texto Projeto Academia: uma reflexão crítica sobre o ensino de arquitetura, urbanis-
mo e paisagismo no Brasil, as professoras Vera Regina Tângari e Maria Ângela Dias apre-
sentam o projeto da Revista Academia da FAU/UFRJ e discutem o papel e a impor-
tância do registro sistemático da produção acadêmica como forma de refletir sobre o 
ensino de arquitetura, urbanismo e paisagismo no Brasil, em razão tanto de sua revisão 
histórica quanto da discussão do momento atual. 
Mary Hardin relata, em A pesquisa como prática ética: objetivos acadêmicos alinhados 
às necessidades da comunidade, uma interessante experiência da Universidade do Ari-
zona, na qual alunos e docentes buscaram, na prática, soluções de barateamento da 
construção para comunidades de baixa renda, por meio de projetos executados com 
solo-cimento e o uso da técnica da taipa de pilão.
III. Concepção e crítica
No artigo O projeto como argumento, Guilherme Lassance defende a associação do pro-
cesso de concepção ao processo de argumentação como meio de situar o projeto de 
arquitetura em um campo que contemple tanto a pesquisa quanto a própria prática 
disciplinar.
Ao lançar um olhar bem fundamentado sobre o ato de projetar por meio de dese-
nhos à mão (croquis), Paulo Horn Regal, no texto intitulado Ressignificação e prática 
19ApresentAção
gráfica, defende que o croquis é um ato de interpretação que acompanha a comunicação 
gráfica, uma vez que o significado (o desenho) não é um puro e simples “desempacota-
mento operado no significante” (objeto ou idéia), e sim um novo significante.
Fernando Vázquez Ramos atesta a importância dos modelos analógicos na concep-
ção do projeto de arquitetura. Seu trabalho Arquitetura: os planos de proposta. Criação, 
representação e informação reconhece as finalidades idênticas que desenho e modelo 
cumprem nas distintas etapas do processo criativo.
Em Território do projeto, José Roberto Merlin estabelece a existência de diferentes 
fases na concepção projetual, que podem ser agrupadas segundo dois momentos mais 
amplos e intimamente relacionados: o de criação e o de aperfeiçoamento formal. Seu es-
tudo se pauta na análise dos processos de projeto de determinados arquitetos e também 
em depoimentos de docentes de arquitetura.
Ada Kwiatkowska constata a crescente influência da realidade virtual e do concei-
to de ciberespaço na arquitetura, para propor, em A gênese das formas arquitetônicas: 
projetos inventivos na era virtual, uma investigação de como a idéia inicial do projeto 
é expressa formalmente e revela processos que podem ser efetuados com ferramentas 
tradicionais de representação ou tecnologias digitais. 
Recitais imagéticos: criação, transferência e disseminação na arquitetura, de Milton Fe-
ferman, centra-se na análise de um conjunto de projetos e imagens para demonstrar que 
a revolução visual característica dos tempos atuais tem origem no imaginário presente 
na criatividade artística do século XVIII.
Ao reafirmar o valor da planta como elemento central na compreensão da dimensão 
experiencial/topológica da arquitetura, Douglas Vieira de Aguiar ressalta, em Planta e 
corpo: elementos de topologia na arquitetura, a importância de valorizar a dimensão invi-
sível, mas freqüentemente sublimada, quedefine o real modo de utilização do espaço, 
permitindo visualizar sinteticamente as seqüências espaciais e o padrão de fruição dos 
corpos no espaço arquitetônico. 
Em Questões de escala, Claudia Piantá Costa Cabral propõe uma atualização do con-
ceito de escala em face das transformações verificadas no entendimento desse termo 
desde a abordagem funcionalista que lentamente relativizou e desmontou a tradição 
clássica ate as praticas arquitetônicas contemporâneas. 
Em Além da linguagem, além do objeto: ordem e experimentação na metodologia proje-
tual de Rem Koolhaas, Gentil Porto Filho aborda o trabalho do arquiteto holandês, para 
não só analisá-lo sobretudo a partir de seu viés experimental e crítico, como também 
revelar a postura combativa desse arquiteto em relação aos clichês que dominaram a 
cultura arquitetônica depois do Modernismo.
O caso do projeto paradigmático do Ministério da Educação é retomado por Carlos 
Eduardo Comas em Projeto arquitetônico, obra coletiva: o caso do Ministério da Educação, 
com o propósito de “enfatizar o caráter coletivo de sua autoria” e “atacar o mito da ori-
ginalidade e da inspiração sem desenvolvimento trabalhoso”. 
IV. pesquisa e prática
Edson Mahfuz, em A pesquisa e suas possíveis relações com o projeto, reflete sobre a indis-
20 o LUGAr Do proJeto
sociabilidade entre pesquisa, prática e ensino de projeto. Comenta sobre as várias nuan-
ças assumidas pela pesquisa assume seja no âmbito da graduação, seja nas investigações 
desenvolvidas na pós-graduação ou na pesquisa efetuada como procedimento inerente à 
prática arquitetônica, bem como sustenta que não deve haver antagonismo entre teoria 
e prática, e que o ensino e a pesquisa em projeto devem estar constantemente em diálo-
go, a fim de que os valores oriundos do mercado não imponham à produção arquitetô-
nica tendências desprovidas de reflexão teórica. 
No trabalho Humanização do edifício hospitalar, um tema em aberto, Luiz Carlos 
Toledo analisa a relação entre os saberes, práticas e políticas de saúde pública e a arqui-
tetura hospitalar brasileira no século XX, sugerindo que o processo de humanização 
da atenção à saúde e da arquitetura dos hospitais ainda está em construção. Em sua 
argumentação, relaciona os obstáculos para alcançar os princípios de integralidade, uni-
versalidade e eqüidade defendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) aos desafios a 
serem superados para a humanização do ambiente hospitalar, assim como apresenta um 
conjunto de propostas projetuais com vistas a aprimorar sua concepção. 
Márcio Minto Fabricio e Silvio Burrattino Melhado discorrem sobre a formação 
projetual em arquitetura perante a atividade de coordenação de projetos multidiscipli-
nares na construção de edifícios no artigo Formação projetual em arquitetura e coordena-
ção de projetos multidisciplinares de edifícios. 
A edificação como produto imobiliário no desenvolvimento da arquitetura contemporâ-
nea em São Paulo, Brasil, de Roberto Righi e Luiz Guilherme de Castro, baseia-se em 
práticas recentes de desenvolvimento de empreendimentos imobiliários e nas teorias e 
práticas arquitetônicas identificadas na cidade de São Paulo para relacionar o produto 
imobiliário com o projeto de arquitetura. 
A amplitude de possibilidades e a importância da programação arquitetônica no 
projeto de edificações de funções complexas pelo porte ou pela quantidade de variáveis 
envolvidas são ressaltadas por Frederico Barreto e Antonio Pedro de Carvalho. Em Pro-
gramação arquitetônica em edificações complexas, eles descrevem com clareza e didática 
alguns modelos e técnicas de pesquisa e organização de dados que corporificam os pro-
cedimentos de programação arquitetônica e apontam sua importância como campo de 
pesquisa vinculado ao projeto, bem como sua contribuição para a melhoria qualitativa 
da síntese criativa.
No texto intitulado Contribuição dos métodos de investigaçãoqualitativos para a abor-
dagem científica do projeto de arquitetura, cujo estudo de caso é uma comunidade de 
autoconstrutores em Florianópolis, Adriana Cordeiro e Wilson Silveira propõem uma 
pesquisa baseada na interface entre as ciências sociais e a arquitetura, visando a um 
maior enriquecimento das formas de analisar e compreender o projeto arquitetônico.
Em Por uma conservação do espaço da arquitetura, ao encarar a dimensão espacial 
como parte integrante do fato cultural, Claudia Loureiro e Luiz Amorim se preocupam 
com a dissociação entre as práticas de restauro e as teorias arquitetônicas, e apresentam 
propostas de metodologia de descrição e análise, contribuindo para o enriquecimento 
das práticas consolidadas de conservação e restauro.
Cristiane Rose Duarte, Alice Brasileiro, Ethel Santana, Kátia de Paula, Mariana 
Vieira e Paula Uglione, em Projeto como metáfora: explorando ferramentas de análise do 
espaço construído, apresentam diretrizes das pesquisas e análises sobre a inter-relação 
21ApresentAção
pessoa-cultura-ambiente construído desenvolvidas no Grupo de Pesquisa Arquitetura, 
Subjetividade e Cultura. A partir do delineamento de ferramentas cuja base é o leque 
interdisciplinar das ciências humanas – adaptadas à linguagem e à sensibilidade pró-
prias à área de arquitetura e urbanismo –, refletem a respeito das metáforas espaciais, 
contribuindo para o debate sobre a importância da interdisciplinaridade na pesquisa em 
arquitetura e urbanismo.
Com o trabalho intitulado Uma abordagem transdisciplinar e inclusiva da criança na 
avaliação e na concepção de ambientes construídos para a educação infantil, Giselle Arteiro 
Azevedo, Paulo Afonso Rheingantz, Leopoldo Eurico Bastos, Vera Vasconcellos, Ligia 
de Aquino e Fabiana Souza relatam o processo de criação e as atividades do Grupo Am-
biente-Educação (GAE), que investiga novos paradigmas para projetos de arquitetura 
para a educação infantil, apresentam os enfoques utilizados pelo GAE em seus traba-
lhos, que descartam a visão do edifício escolar isolado de seu contexto social, histórico 
e cultural, enfatizando seus vínculos nessa inter-relação.
***
Em face da importância da reflexão crítica sobre o “ensinar”, o “pensar” e o “fazer” ar-
quitetura, esperamos que este livro contribua não só para o avanço da reflexão sobre o 
projeto de arquitetura e urbanismo como campo de ensino e de pesquisa, mas também 
para sua consolidação nos programas de pós-graduação e a conseqüente renovação do 
ensino de graduação. Desejamos que a leitura dos textos aqui reunidos sirva de incen-
tivo para o surgimento de outros fóruns de discussão que ampliem e democratizem a 
reflexão crítica sobre a construção do conhecimento e do ensino do projeto de arquite-
tura e seus rebatimentos, práticas, interfaces e diálogos com a sociedade e com outros 
campos disciplinares e/ou áreas do conhecimento.
referências bibliográficas
BOUDON, Philippe; DESHAYES, Philippe; POUSIN, Frédéric & SCHATZ, Françoise
(1994) Enseigner la conception architecturale. Paris : Éditions de la Vilette.
DUTTON, Thomas A. 
(1991) Voices in architectural education: cultural politics and pedagogy. New York: Bergin e Garvey.
SEGAWA, Hugo; CREMA, Adriana & GAVA, Maristela
(2003) “Revistas de arquitetura, urbanismo, paisagismo e design: a divergência de perspectivas”, 
Ci. Inf., vol. 32, n. 3. Brasília, p. 120-7.
pArte I
c o n f e r ê n c i a s
25
ArqUItetUrA no Corpo: entre A prótese e o pArAsItA
Georges teyssot
A concepção greco-romana do isomorfismo se baseava na representação de um corpo 
canônico, previamente constituído na produção da obra de arte. Após o abandono da 
teoria clássica, que invocava a imitação das proporções do corpo humano na arquite-
tura, como repensar as relações entre corpo e ambiente construído? A partir de então, 
parece urgente interrogar-se sobre as relações dinâmicas entre os termos do corpo e 
do mundo. Existe um corpo? Ele é uma posse ou um instrumento? Temos um corpo? 
O que é um corpo? Esse corpo é habitado? Como corpo e cérebro interagem com o 
mundo? O breve exame de algumas teorias do corpo permitirá medir seus efeitos na 
concepção do ambiente, construído ou não, bem como no projeto arquitetônico.
Corpo sem órgãos
Em Lógica do sentido, Gilles Deleuze se refere à intercessão dramática que Antonin Ar-
taud pronunciou ao sair do hospital psiquiátrico de Rodez: “Sem boca, sem língua, sem 
dentes, sem laringe, sem esôfago, sem estômago, sem ventre, sem ânus. Eu reconstruirei 
o homem que eu sou” (Deleuze, 1969). Essa invocação chamava a um corpo soldado e 
fluido, feito de ossos e sangue, que não havia sido reduzido a cada um de seus órgãos. 
Mais tarde, em O anti-Édipo, Deleuze e Félix Guattari retomarão essa invocação na hi-
pótese de um corpo concebido como uma máquina libidinal, uma “máquina desejante” 
que conduz à possibilidade teórica de um “corpo sem órgãos” (Deleuze & Guattari, 
1972). Essa noção se apoiava novamente em textos de Artaud, como Pour en finir avec 
le jugement de Dieu, de 28 de novembro de 1947: “Pois me amarrem se quiserem, mas 
não há nada mais inútil do que um órgão”; ou ainda este outro, de 1948: “O corpo é o 
corpo/ ele é único/ e não necessita de órgão/ o corpo nunca é um organismo/ os orga-
nismos são os inimigos do corpo”.
Nos dias de hoje, somos confrontados a duas hipóteses que aparentam excluir-se 
mutuamente: de um lado, o “corpo sem órgãos”, ou seja, uma noção de corpo que não 
se apóia na singularidade e na autonomia de cada órgão, e em que os órgãos seriam in-
determinados; do outro, uma concepção cuja base é a organização orgânica dos órgãos, 
chamada de “organismo”, e que corresponde à noção simples de corpo, funcionando 
26 o LUGAr Do proJeto
segundo hierarquias e obedecendo a uma lógica interna, que dominou por muito tem-
po a fisiologia e o discurso da clínica. Na explicação do corporal, essas duas abordagens 
parecem claramente opostas, ainda que uma não exclua realmente a outra. 
Haveria, de um lado, um “corpo sem órgão”, um sonho (fértil) de esquizofrênico, 
que considera o corpo meramente na sua exterioridade em relação a outros corpos, 
percebidos por meio de relações de superfície, de diferenças, de afeto, de desejo, fun-
cionando “como um espaço virtual e liso, inseparável dos fluxos que o percorrem e se 
interceptam” (Sasso e Villani, 2003: 62). Do outro, a realidade, ou a normalidade do 
organismo, que concebe o corpo exclusivamente em sua interioridade, em seu regime 
de distribuição interna, no qual órgãos autônomos decompõem o todo em múltiplas 
partes, fragmentando a integridade. Essa lógica, aliás, reflete-se na distribuição de um 
centro hospitalar e suas diversas especializações nosológicas. É também nesse tipo de 
funcionalismo que repousa toda a arquitetura dita “moderna”, que não é, com efeito, 
nada além de uma aplicação do organicismo.
A análise de Deleuze e Guattari adota uma posição crítica em relação a certas corren-
tes psicanalíticas, influenciadas pelo estruturalismo lingüístico, reprovando-as porque 
elas concebem o corpo como uma mesa rasa, um tipo de quadro-negro sobre o qual 
poderão ser inscritos os acontecimentos traçados pela linguagem, ou seja, onde o poder 
poderá escrever o texto da lei. Em resumo, uma certa concepção do corpo (lacania-
na, lato sensu) parece passar pela de uma pontuação do desejo vazio pelo significante, 
criando uma ordem fálica, a da família, e, por conseguinte, a do Estado, enquanto a 
concepção de Deleuze e Guattari insiste no fato de que ao desejo nada falta, não lhe falta 
seu objeto, isto é, que o desejo e seu objeto são um, uma mesma coisa, que o desejo é 
uma máquina e que o objeto do desejo é uma outra máquina conectada a ela (Deleuze 
e Guattari, 1972: 34). Para Deleuze e Guattari, portanto, o corpo é uma superfície 
múltipla, dobrada como uma pele, como o descrevem em Mil platôs: 
É a pele como envelope ou anel, a meia como superfície reversível. Talvez seja 
uma casa, um cômodo de casa, tantas coisas ainda,qualquer coisa. Um corpo 
sem órgãos não é um corpo vazio e desprovido de órgãos, mas um corpo sobre o 
qual o que serve de órgãos [...] se distribui a partir de fenômenos inumeráveis, de 
acordo com movimentos brownianos, sob forma de multiplicidades moleculares. 
[...] O corpo sem órgãos não é um corpo morto, mas um corpo vivo, tão vivo, 
tão fervilhante, que fez saltar o organismo e sua organização. [...] O corpo pleno 
sem órgãos é um corpo povoado de multiplicidades (1980: 42-3). 
Nessa topologia, as casas se apresentam como algo reversível, como a pele de um ani-
mal ou como a forma de uma meia. Conduzindo a uma nova variedade de organicismo, 
o interior se torna um exterior, enquanto este recua, formando uma superfície lisa ou 
estriada, dobrada ou desdobrada, invaginada e exogastrulada.
órgãos sem corpo
Hoje, a própria idéia de prótese se encontra voltada para aplicações que se dividem, essen-
cialmente, entre a restauração, positiva ou substitutiva, das enfermidades da percepção e a 
27ArqUItetUrA no Corpo
multiplicação das tentativas de cultivos tecidulares e transplantes de órgãos com resultados 
diversos. Ora, o transplante é a forma mais sutil de prótese: ele desencadeia a separação de 
matéria e a reparação funcional em uma troca de alteridades. Atualmente, o “corpo sem 
órgãos” é confrontado com a perspectiva desconcertante de um órgão sem corpo – trata-
se de órgãos, conservados em bancos de órgãos, cujo nome é bem escolhido1. Híbrido, 
quase monstruoso, o transplante é uma nova espécie feita de carne e de aparelho. Isolado 
do organismo “doador”, o órgão transplantado é um órgão “livre”, disponível no mercado 
como qualquer mercadoria, como bem ilustra o filme Coma (1978), de Michael Crichton. 
Aqui, a demanda excede a oferta, e se cria um tráfico mundial. O órgão, portanto, está sem 
corpo, órfão e sozinho, entre a vida e a morte. Ele provém desse “intervalo produzido entre 
a morte relacional e a morte funcional” (Guillou, 1979: 136-8), e a cirurgia de transplante 
introduz, assim, uma cesura entre o órgão e o corpo, continuando o órgão “outro” em 
seu novo corpo e requerendo um tratamento regulador farmacêutico intensivo (à base de 
ciclosporina, por exemplo), a fim de impedir sua rejeição pelo receptor.
A partir disso, o órgão transplantado se 
torna outro para substituir no organismo 
“recebedor” uma parte deficiente, corrigir 
o desvio patológico e, ao mesmo tempo, 
“suscitar uma nova regulação e determinar 
outra normalidade” (Guillerme, 1990), 
conduzindo a outras patologias, como 
testemunham sobreviventes de transplan-
tes. Em “O intruso”, o filósofo Jean-Luc 
Nancy, que se submeteu a um transplante 
de coração, cita na epígrafe de seu texto 
esta lamentação de Arnaud: “Não há nada 
mais supérfluo do que o órgão chamado 
coração, que é o meio mais desagradável que os seres puderam inventar para bombear 
a vida em mim”. Após anos de “acompanhamento” médico, ele admite, em páginas 
dignas de Michel Foucault: “Eu acabo sendo apenas um fio tênue, de dor em dor, de 
estranheza em estranheza” (Nancy, 2000: 40). Não pode mais fugir desse “sentimento 
geral de não ser mais dissociável de uma rede de medidas, de observações, de conexões 
químicas, institucionais, simbólicas [que] mantém expressamente a vida sempre adver-
tida por sua presença e supervisão” (: 40-1). Ao se tornar o objeto de uma mutação, 
observa com ironia: “Torno-me uma espécie de andróide de ficção científica”.
A descrição de Deleuze e Guattari da maquinaria libidinal introduz também a frag-
mentação, como revela esta citação de O anti-Édipo: “tudo funciona ao mesmo tempo, 
mas nos cortes e rupturas, nas avarias e defeitos, nas intermitências e curto-circuitos, 
nas distâncias e fragmentos, em uma soma que jamais reúne suas partes em um todo. 
[...] Nós estamos na era dos objetos parciais. [...] Nós não acreditamos em uma totali-
dade original, nem em uma totalidade de destinação” (Deleuze & Guattari, 1972: 50). 
O fragmento não remete mais a um todo, seja ele original ou incompleto. Para as má-
1 Ver a recente interpretação dada pelo filósofo esloveno Slavoj Zizek (2004), uma tentativa de 
réplica dos hegelo-lacanianos à critica deleuziana.
Coma, dirigido por Michael Crichton, fotograma, 1980
28 o LUGAr Do proJeto
quinas desejantes de Deleuze e Guattari, os cortes são produtivos e são, eles mesmos, 
ajuntamentos. Sem conseguir mais amalgamar as partes do “corpo fragmentado” pela 
reflexão ou pela representação, o espelho de Lacan não pode mais reunir os fantasmas 
fragmentados do corpo anterior ao narcisismo. Assim, segundo Deleuze e Guattari, o 
estado do espelho parece corresponder à repressão da fragmentação, restando-lhe apenas a 
fetichização do objeto de desejo perdido. O anti-Édipo é uma celebração dos fragmentos, 
dos cortes, dos objetos parciais, das conjunções e disjunções, das ligações e dos registros.
Emergem, a partir de então, duas hipóteses distintas, porém ligadas entre si, so-
bre a fragmentação do corpo. A primeira é aquela definida pela formulação do órgão 
sem corpo, que pode ser, a um só tempo, “livre” e oferecido no mercado mundial, e 
igualmente “livre”, ou seja, “transplantado” em um outro corpo, um outro órgão, es-
teja vivo ou não, seja ele mecânico, biológico ou informatizado. Uma vez que o termo 
de transplantação deriva etimologicamente de graphein – vocábulo grego para escrever –, 
todo transplante se torna uma escrita ou código, e toda escrita, toda representação gráfica, 
uma transplantação. A segunda hipótese define o corpo sem órgãos, que se torna um cor-
po pleno, desejante, em superfície. Ele seria incessantemente percorrido (igualmente) por 
transplantes, ligações e códigos, porém essas seriam experiências efêmeras, dando lugar a 
efeitos vitais artificialmente induzidos: tato e contato, sensação e vibração, afloramento e 
atrito, carícia e fricção, prazer cutâneo, satisfação curta, gozo fugaz, fluxos e escoamento. 
Incorporação
Nas artes visuais nos Estados Unidos, o corpo humano foi reintroduzido por meio da 
“performance-arte” e da “body art”, durante orquestrações em que, freqüentemente, o 
artista empenhava seu próprio corpo – uma prática que acontece em tempo real e da qual 
permanecem apenas traços fotográficos como registro dos traços de uma ação ocasional 
(Vergne, 1996; Siebers, 2000). Em 1961, Robert Morris exibe-se em uma “caixa para 
manter-se de pé”: Untitled (box for standing). Esse mesmo artista oferece seu retrato (Por-
trait, 1963) sob a forma de garrafas monocromáticas, bem ordenadas em um quadro; com 
efeito, trata-se de recipientes que contêm seus humores corporais (sangue, suor, esperma, 
saliva, lágrimas, urina, fezes). No ano seguinte, concebe uma escultura sem título, forma-
da por marcas de passos e de réguas – Untitled (footprints and rulers), 1964 – confirmando 
essa forma de engajamento entre o corpo e a galeria de arte (Robert Morris, 1995).
Em From hand to mouth (1967), o artista Bruce Nauman toma uma impressão que 
reproduz em cera uma parte de seu corpo; de alguma forma, essa modelagem extrai um 
trajeto que conduz da boca à mão, situando-se fora de toda lógica organológica. Em 
1968 e 1969, Nauman empreende numerosos experimentos filmados, em que explora 
diversas partes do corpo (mãos, braços, testículos, coxas, joelhos, pés) que o levam a 
uma série de performances sobre a distorção de seus lábios, observadas em First holo-
gram series: making faces (1968), hologramas projetados sobre vidro (Simon, 1994). 
Como Morris, Nauman trabalha com a medição, a metragem, a impressão, a modela-
gem e o holograma todas as marcas deixadas pelo corpo. 
Em Drifts (1970), Vito Acconci fotografa vestígios deixados sobre a areia. Outras obras 
situadas entre a fotografia e o cinema, como Trademarks – filme super-oito em cores, de 
29ArqUItetUrA no Corpo
20 min (1970) –, expõem a marca de seus dentes, exibida em sua própria pele após uma 
mordida. Na performance filmada Lick (3 min, 1970), ele põe em jogo impulsos maso-
quistas,ao lamber o chão da galeria. Enfim, na série Conversões (filme super-oito em preto 
e branco de 24 min, 1971), Acconci, nu, mantém-se de pé diante da câmera, fazendo 
desaparecer seus órgãos genitais entre as pernas. Assim, tenta, por meio dessa mudança de 
atributo, tenta recriar um corpo hermafrodita. Seu corpo, ao se tornar uma superfície lisa, 
permite que inscrições sejam marcadas, gravadas ou apagadas (Jones, 1998: 103-50).
Perturbadoras e cortantes, as primeiras obras de Rebecca Horn esboçam uma carto-
grafia de funções subjetivas e psicológicas do corpo humano. Suas esculturas corporais 
(body-sculptures) são fabricadas com fragmentos de equipamentos biomédicos (tubos, 
ligações, membranas, bombas), como em Overflowing-blood-machine (1970), em que 
oito tubos transparentes, colocados verticalmente e ligados por faixas em torno do cor-
po nu de um modelo, revelam os fluxos e as pulsações rítmicas da circulação sangüínea, 
projetados fora da pele (Rebecca Horn, 1993). A obra de Horn exibe – como se fossem 
uma operação cirúrgica ou “incorporações” tecnológicas, por exemplo, rádios, endosco-
pias, eletrocardiogramas (ECG), eletroencefalogramas (EEG), tomografias de emissão 
de pósitrons (TEP), ressonâncias magnéticas nucleares (RMN) – o funcionamento das 
vísceras e de uma parte do sistema vegetativo (a circulação, a respiração), um “olhar” até 
então proibido, perigoso ou mesmo fatal. 
No coração da arte carnal, descobre-se um corpo recortado, laminado, descentraliza-
do, do qual um dos melhores exemplos é oferecido pela performance (semi-voluntária) 
Shoot, de Chris Burden, obra doada ao “F Space”, em Santa Ana, na Califórnia, no dia 
19 de novembro de 1971. O fato de o artista ter recebido uma bala de pistola no braço 
é apenas um aspecto acidental e, em suma, anedótico da história. Em Shoot, põe-se em 
cena o corpo como último terreno experimental. 
Vito Acconci, Lick, fotograma, 1970 
(Linker, 1994)
Ao LADo
Überströmer, rebecca Horn, 
diversas mídias, 1970. Coleção 
privada (rebecca Horn, 1993).
À DIreItA
Chris Burden, Shoot
performance, 1971
Chris Burden, Beyond the limits 
(noever, 1996)
30 o LUGAr Do proJeto
Na obra intitulada Shelf (1984), o ar-
tista Charles Ray se apresenta frontalmen-
te, com o corpo nu, apoiado na parede da 
galeria, e uma prateleira horizontal passa 
através do seu pescoço, de tal modo que 
sua cabeça, pintada de cinza, confunde-se 
com objetos, também pintados de cinza, 
que estão no mesmo local (Schimmel & 
Phillips, 1998). De 1985 até sua sétima 
operação cirúrgica (Omniprésence, 1993), 
o espetáculo das lipoaspirações a que se 
submeteu a artista francesa Orlan, transmi-
tido ao vivo em várias galerias no mundo, 
torna-se literalmente insuportável para o 
espectador (Orlan, 2004). Por sua vez, as 
transformações que a artista Cindy Sher-
man exerce em seu próprio corpo, em seu 
próprio “rosto”, são observadas e registradas 
por gigantescos cibacromos, e provocam 
sentimentos desconfortáveis no observa-
dor. Na série Untitled, realizada em 1989 
e 1990, ela se reveste de diversas máscaras, 
como em Untiled #183, ou de um seio bulboso e diversas protuberâncias e intumescên-
cias, revelando, entre outras coisas, o arquétipo de Madonna Lactens, como em Untitled 
#216. Essa arte perturbadora pode tornar o real ainda mais real, real demais, e conduzir, 
assim, a um hiper-realismo, capaz de perturbar a percepção da realidade e da imagem do 
corpo, e de confundir correspondências lógicas e semióticas (Cindy Sherman, 1993).
Menos espetacular, mas igualmente convincente, o parcelamento corporal é reto-
mado por um artista como Gary Hill, cuja instalação Inasmuch as it is always already 
taking place (1990) expõe, em tempo real, diferentes imagens de seu próprio corpo em 
dezesseis telas de vídeo de dimensões variadas (Gary Hill, 1992; Morgan, 2000). 
No que poderia evocar uma curiosa inversão do “estádio do espelho”, o corpo está, 
primeiramente, decomposto em objetos parciais e, em seguida, recomposto por ima-
gens, recorte e enquadramento, oferecendo uma simulação do objeto fetiche, tornado 
inacessível. Novamente, no projeto de arte e vídeo Cremaster 4 (1994), de Matthew Bar-
ney, corpos e máquinas se lançam em mutações genéticas e morfológicas incontroláveis, 
com a repentina aparição de excrescências, tão efêmeras quanto inexplicáveis. Ainda nele, 
corpos lisos de magníficos hermafroditas exibem seus peitorais (Barney, 1995). De Her-
mann Nitsche (membro do acionismo vienense) a Dan Graham, Gordon Matta-Clark, 
Charles Ray, Robert Gober, Kiki Smith, Mike Kelley, Paul McCarthy, Sophie Calle, An-
drea Blum, Andrea Zittel, Jana Sterbak, Vanessa Beecroft, Jake & Dinos Chapman, Ste-
larc, Atelier van Lieshout e Bernard Lallemand, o corpo se torna não somente o lugar de 
uma crítica política dos aparelhos disciplinares da sociedade, mas sobretudo o lugar de um 
processo de incorporação ou encarnação, que, ao menos em teoria, pode ser testado até os 
limites da desencarnação. O limite consiste na vulnerabilidade do próprio corpo.
Cindy sherman, Untitled #216, cibacromo, 1989 
(Cindy sherman, 1993)
31ArqUItetUrA no Corpo
Ciborgues
Durante vinte séculos, o desenvolvimento da aparelhagem biomecânica foi marcado 
por duas etapas principais que atingiram o status e a dignidade de ficções teóricas ou 
paradigmas. Em primeiro lugar, a aparição do termo robô, que adveio como uma me-
táfora do trabalhador em um ambiente industrial, após ter sido inventado pelo escritor 
Karel Čapek (1890-1938) em sua peça de teatro R.U.R., acrônimo de Robôs Universais 
de Rossum (Čapek, 1920). Robô deriva do tcheco robota, que significa “tédio” ou “mo-
notonia”, e se refere à escravidão, ao trabalho forçado ou mesmo repetitivo em usinas, 
sobretudo na área de montagem. Na peça, aliás, os robôs, na condição de escravos, ten-
tam se rebelar. Enquanto o homem devia tornar-se uma máquina ou motor, a máquina 
devia assemelhar-se ao homem.
Em segundo, a criação do termo ciborgue, abreviação do “organismo cibernético”, 
que designa um ser híbrido, quase monstruoso, encarnando a desconcertante idéia de 
um autômato, a um só tempo, humano e alienígena. Foi essa a terminologia proposta 
pelos especialistas Manfred E. Clynes (músico e engenheiro, estudou física e mate-
mática, e depois neuropsicologia) e Nathan S. Kline (psiquiatra), no laboratório de 
simulação dinâmica do hospital psiquiátrico do Estado de Rockland, em Orangeburg 
(Nova Iorque), em um estudo de biocibernética sobre as condições de vida no espaço, 
realizado para a NASA e publicado no periódico Astronautics, em setembro de 1960 
(Clynes e Kline 1960: 26-27; 74-76). Seria possível que robôs e ciborgues fossem não 
Gary Hill, Inasmuch as it is always already taking place, videoinstalação, 1990 (Morgan, 2000).
Matthew Barney, Cremaster 4, 1995
Unresolved dualities, racecar (Barney, 1995)
Matthew Barney, Cremaster 4, vídeo, 1994 
(Barney, 1995)
32 o LUGAr Do proJeto
apenas duas etapas da evolução tecnológica, como também duas alternativas, dois pa-
radigmas do desenvolvimento. Afinal, é significativo que um tenha nascido em uma 
usina industrial, e o outro em um hospital, um ambiente regido pela biologia e pelo 
eletrônico fim de século.
Foi no contexto da Segunda Guerra Mundial e, em seguida, da Guerra Fria, que a 
teoria dos sistemas homeostáticos se desenvolveu. O estudo da interface homem/má-
quina (e máquina/homem) conduziu às generalizações da cibernética. Do controle da 
máquina feito por dispositivos auto-reguladores às generalizações sobre a configuração 
do corpo como sistema de informação, concebida pelos pais da cibernética (Norbert 
Wiener, Claude Shannon, Léon Brillouin, Warren McCulloch), passamos para um am-
biente estimulado sensorialmente e capaz de recriar um mundo como o da realidade 
virtual, a ser compreendida como uma forma (doravante bastante banal) do ciborguis-
mo (Hayles, 1999: 50-80; 84-112). Desde 1960, as figuras do robô e do ciborgue se 
fundem, ainda que alguns queiram mantera distinção. Numerosas obras de sociologia, 
como O homem remodelado (1977), de Vance Packard, ou de vulgarização, como Quan-
do o homem ser torna máquina (1978), de David Rorvik, anunciaram a dominação 
próxima de máquinas inteligentes sobre o corpo humano, que deverá submeter-se a 
múltiplas mutações, por meio de próteses, clonagem e feedback biológico.
Hoje, parece que a cultura ciborgue questiona tanto a noção clássica de organismo/
máquina quanto os limites entre as noções de inteligência/sensibilidade, animal/huma-
no, natureza/cultura, macho/fêmea, primitivo/civilizado e virtual/real. Em 1985, Don-
na Haraway, especialista americana em biologia, publicou seu manifesto do ciborgue, 
no qual propôs repensar as fronteiras que habitualmente delimitam nosso mundo: 
a cultura high-tech põe em questão esses dualismos de formas intrigantes. Não 
está mais tão claro quem faz e o que é feito na relação entre homem e máquina. 
edmund A. emswiller, An android of rare perfection
(Galaxy science Fiction, 1954)
Karel Čapek, R.U.R. (Rossum’s Universal Robots),
fotografia da montagem, 1921
33ArqUItetUrA no Corpo
Não está mais tão claro o que é o cérebro e o que é o corpo nas máquinas, cujo 
modo de funcionamento reside em práticas de codificação. À medida que nós 
mesmos nos conhecemos, tanto no discurso formal (a biologia, por exemplo) 
quanto nas práticas cotidianas (a economia do trabalho em domicílio, integrada 
aos circuitos e redes, por exemplo), descobrimos nossa natureza de ciborgues, 
de híbridos, de mosaicos, de quimeras. Os organismos biológicos se tornaram 
sistemas bióticos, dispositivos de comunicação como os outros. Não há separa-
ção fundamental, ontológica, em nosso conhecimento formal da máquina e do 
organismo, da técnica e do orgânico (Haraway 1985: 177-8). 
Aliás, essa semelhança entre technè e organon não é nova, visto que já se encontra 
no pensamento grego e, depois, em Descartes. O ciborgue, contudo, deslocou o limite 
entre o organismo e a máquina, ao acoplar os dispositivos cibernéticos aos organismos 
biológicos; ele confundiu o animal e o humano, substituindo a cognição pelo feedback 
neuronal; tornou obsoletas as distinções entre animado e inanimado pela teoria do 
comportamento dos sistemas homeostáticos.
O aspecto insólito do ciborgue provavelmente se encontra no nível de uma iden-
tidade inquietante e de uma sexualidade inédita, abrindo para um erotismo que talvez 
apenas a ficção do romance (Philip K. Dick, certamente) e do cinema possa explicar: “a 
replicante Rachel em Blade runner (1982), de Ridley Scott, coloca-se como a imagem de 
uma cultura do ciborgue, entre o medo, o amor e a confusão” (Haraway, 1985: 178). Ao 
longo dos anos 1980, esse texto de Haraway permitiu definir um tipo inédito de hibridez 
e levou a um estado posterior os mitos da Quimera e do “monstro” clássico – de Golem 
a Frankenstein –, para chegar a imaginar um híbrido produzido pela tecnologia de in-
formação – o ciborgue. Essa versão cibernética da quimera define possibilidades insólitas 
de mutação e conduz a uma revisão da noção de evolução. Os ciborgues são produtos 
de uma reflexão que reúne partes humanas, misturadas a outras criaturas orgânicas per-
tencentes ao meio high tech, como “os sistemas de informação, os textos, os postos de 
trabalho e suas interfaces ergonômicas, e todos os outros sistemas de desejos, de prazeres 
e de reproduções” (: 1). É assim que um dos constituintes dos ciborgues se compõe 
nas máquinas, mas apenas quando elas surgem sob suas novas espécies, a dos sistemas 
de comunicação, de textos, e de aparelhos projetados pela ergonomia, promovidos por 
princípios de autopoiese, e capazes de armazenar memória e tomar decisões (Edwards, 
1997; Clark, 2003). Na cultura do ciborgue, os corpos não nascem mais; são fabricados. 
Os organismos são, por exemplo, construções por codificação criada em imunologia.
ecotecnia
Nosso ser de modo algum pode ser reduzido a cada um de nossos órgãos: podemos 
transformar alguns deles ou mesmo substituí-los por outros, ainda que isso não seja 
simples. Racionalizar sobre uma parte, todavia, não é argumentar sobre o todo, e é nessa 
disjunção teórica entre corpo e órgão que se situa a possibilidade de distinções ontoló-
gicas sutis entre ter e ser um corpo. O sujeito não é um espírito habitando um corpo; 
além de termos um corpo, somos um corpo em que todas as partes “pensam”. Jean-Luc 
34 o LUGAr Do proJeto
Nancy vai mais longe, ao afirmar que não há nada que se pareça com um corpo. Não há 
corpo. Há apenas recitações perseverantes e ardentes de diversos corpus, como costelas, 
esqueletos, pélvis, irritações, carapaças, como ele evoca em uma passagem de tom quase 
deleuziano (Nancy, 1990: 31). Em Corpus (2000), opúsculo sobre as técnicas do corpo, 
o autor generaliza sua reflexão e observa que todo corpo é “multiplicado, multisexuado, 
multifigurado, multizoneado, [...] organizado, inorgânico” (: 31). Os corpos são criados, 
e essa criação conduz a uma técnica do corpo que responde, quase exclusivamente, pela 
verdade do mundo: “Nosso mundo é o mundo da ‘técnica’, o mundo no qual o cosmos, 
a natureza, os deuses, o sistema completo em sua juntura íntima se expõe como ‘técnica’: 
mundo de uma ecotecnia” (: 78). Tal oikos tecnológica age como uma máquina e tam-
bém como um órgão. A ecotecnia funciona porque é o feito de aparelhos a que estamos 
constantemente ligados, de parte em parte; “mas o que a ecotecnia faz são nossos corpos, 
que ela põe no mundo e liga a esse sistema; nossos corpos que ela cria mais visíveis, mais 
proliferativos, mais polimorfos, mais comprimidos, mais em ‘massas’ e ‘zonas’ do que 
jamais foram” (: 78). Como um ciborgue, mas sem a empolgação da ficção científica, o 
corpo é primeiramente criado, depois ligado em todas as partes e, enfim, reconfigurado.
É o romance ciberpunk Neuromancien (1984), de William Gibson, que introduz o 
termo “ciberespaço”, definido como uma “ilusão consensual” de todos os que se “co-
nectam” a um computador. Essa ficção genial evoca acoplamentos incestuosos entre 
órgãos e máquinas, com todas as conotações eróticas de uma projeção total dentro de 
circuitos, similar aos fluxos de máquinas desejantes. Ao imaginar uma ligação direta 
entre sistemas neuronais e redes, os usuários podem percorrer uma nova paisagem, a 
de “uma representação gráfica da informação extraída de todos os bancos de dados de 
todos os computadores no sistema humano. Uma complexidade impensável. Alinha-
mento de luzes ordenadas no não-espaço do intelecto, em conjuntos e em constelações 
de dados. Como as luzes da cidade, que se distanciam” (Gibson, 1984: 51). Enquanto 
Jean-François Lyotard preparava sua exposição sobre Os imateriais (1985), o romance 
de Gibson evocava um espaço não material de representação, cujos dados imediatos 
eram os da simulação numérica, e explorava teoricamente a clivagem entre presença 
física e uma consciência, um “espírito”, capaz de navegar no “ciberespaço”. Evocar uma 
paisagem onde os bancos de dados estatísticos ordenam as formas da nova cidade é, 
aliás, o que haviam tentado os arquitetos holandeses MVRDV (1999) em sua instala-
ção de vídeo METACITY/DATATOWN. Conceber uma arquitetura que, por meio de 
grafos e transplantes, move-se em uma perpétua mutação é o que o arquiteto francês 
François Roche (R, DSV & Sie P., 1998) imaginara.
esferas
A fragilidade da espécie humana confrontada com o desenvolvimento tecnológico e in-
dustrial, a solidão do homem situado diante de abismos numéricos, o apagamento ver-
tiginoso das diferenças entre seres animados e inanimados, as mutações desconcertantes 
do corpo humano no nível imunológico: a fragilidade inerente, zoológica, do humano 
é precisamente a deficiência revelada e exposta pela arquitetura “radical” entre os anos 
1960 e 1970. Com efeito, para dar apenas um exemplo, as neovanguardas austríacas 
35ArqUItetUrA no Corpo
tinham se alimentado da iconografia da investigação espacial, como no projeto do hotel 
móvel feitopelos austríacos Gernot e Johanne Nalbach, uma torre que se estende a par-
tir de um pedestal levado por um semi-reboque, sobre o qual oitenta quartos podem ser 
enxertados (Quarmby, s/d, figura 147). Gernot Nalbach é o projetista do famoso tapete 
móvel, cujas dezesseis células infláveis podiam, ao se levantarem ou baixarem, criar um 
ambiente móvel e evolutivo (Pneumatic Furnishing Carpet, 1967, citado por Dessauce, 
1999, figura 63). Em Viena, onde a influência do acionismo está presente, é como se a 
prática de uma arquitetura alternativa por “grupúsculos” quisesse se aproximar de um 
desmanche inspirado no acontecimento e na performance.
Nesse mesmo caminho, tendências protéticas se manifestam, com clareza, nas cabi-
nes do grupo Haus-Rucker-Co, como seu famoso Pneumacosm (1967), seu Gelbes Herz 
(1968) ou ainda seus capacetes multissensoriais, de Mind expander I (1967), Fly head 
(1968) ou Mind expander II (1968–1969), evocando as formas encefálicas de imensos 
insetos que se abrem a uma exploração de intermedialidade (Topham, 2003); ou ain-
da, nas ligações orgânicas do grupo Coop-Himmelblau, como em Villa Rosa (1967), 
inflável, Cloud (1968), respirando como um pulmão, ou Astroballon (1969), capaz de 
traduzir batimentos cardíacos do coração em emissão de sons e de luzes (Werner, 2000). 
Em Ballon für zwei (Viena, 1967) e em Oasis nº 7 (Kassel, 1972), de Haus-Rucker-Co, 
um casal é exposto em uma estufa em forma de bola transparente. Esse parasita é ligado 
à fachada do imóvel e os habitantes são projetados para a rua. A intimidade, extraída de 
sua trincheira, levada para fora e posta à vista, se oferece como espetáculo. Esse projeto 
é o da rejeição do sujeito, pois age como uma projeção dos habitantes para o exterior, 
comportando a rejeição da intimidade. A provocação parece implicar uma devastação 
r DsV & sie. p, Zone d’Immersion, 
exposição Couvent des Cordeliers, paris, 2005
MVrDV (Winy Maas), METACITY/ DATATOWN, 
videoinstalação, 1998–1999
36 o LUGAr Do proJeto
da intimidade e a ruína dos lugares. Nessa experimentação, todavia, a “nudez” é vo-
luntária. Os corpos são auto-expostos, mas se trata de uma exibição da pele, alegre e 
lúdica: de uma “auto-ex-peau-sition” (exposição da própria pele), podendo levar a um 
verdadeiro apocalipse do ser. 
É possível se perguntar se o que é testado nesses múltiplos projetos arquitetônicos 
não foi anunciado pelos escritos de Marshall McLuhan nos mesmos anos: como a pele e 
os instrumentos, e a mídia, a arquitetura seria a extensão do ser humano. Por conseguin-
te, o meio ambiente se desenharia e conceberia pela superposição de diferentes esferas: 
a pele, o envelope epitelial, as coisas, os instrumentos, a terra e o fogo, o ar e a água, a 
luz e as nuvens, astros e desastres, o clima, os aparelhos e as máquinas, a meteorologia, a 
interface midiática. Tratar-se-ia de uma arquitetura “atmosférica”, algo que nos remete 
a Esferas I. Bolhas (1998), de Peter Sloterdijk.
Como mostrou o mesmo Sloterdijk ao falar da domesticação do ser, a idéia de habi-
tação está ligada, sobretudo, à da ocupação do solo, em particular, à da abertura de um 
espaço que precisa ser providenciado. A noção de abertura deriva da noção de clareira 
(Lichtung), tal como aparece em Carta sobre o humanismo, de Martin Heidegger. Essa 
idéia deriva também da khôra platônica, como mostrou Jacques Derrida, concebida 
como matriz das dimensões e alimentadora da evolução. É nesse sentido, aliás, que a 
noção de esfera se refere à organização “matricial” das dimensões e das orientações. Fora 
de qualquer metáfora, essa esfera pode ser vista como uma estufa ou bolha, uma vez que 
ela estabelece condições climáticas especiais. Como garantia da vida orgânica, o meio 
ambiente – essa região, essa área que nos cerca – é, a princípio, uma gaiola, uma bolha 
ou anel. É constituído como um mundo mediano, situado entre a projeção orgânica de 
uma vida animal e a projeção, ou a abertura, dos hominídeos para o mundo (Sloterdijk, 
2000: 43). A esfera é topologicamente intermediária. Há, de um lado, um ser (animal) 
envolvido por um anel, uma cerca, um limite; do outro, um ser (humano) capaz de 
superação estática, abrindo-se para um mundo indeterminado. Intermediária, a esfera é 
também uma situação de intermedialidade. 
Haus-rucker-Co, Pneumacosm, maquete, 1967-1968 
(Brayer, 2003)
Coop Himmelblau, Villa Rosa, maquete, 1967 
(Brayer, 2003)
37ArqUItetUrA no Corpo
Ao definirem as condições da domesticação, as esferas são envelopes, “membranas 
ontológicas”, entre o interior e o exterior. As esferas determinam o (e são determinadas 
pelo) “meio”, entre aqui e ali (: 43). Situadas entre a proximidade e o distanciamento das 
coisas, o finito e o infinito, instaladas entre o terminado e o indeterminado, localizadas 
entre o simbólico e o diabólico, as esferas se definem justamente por esse “entre” (latim, 
inter) que forma a raiz do interior, do intermediário, mas também da intermedialida-
de. Com efeito, como precisa Sloterdijk, as esferas são mídias, “precedendo as mídias” 
contemporâneas (: 43). Em sua posição de intermediárias entre o cerco (corporal e ani-
mal) e o simbólico (corporal e huma-
no), elas oferecem uma situação de 
intermedialidade. Ao prover um 
abrigo onde se tor- nam possíveis os 
contatos físicos, os processos metabó-
licos, a reprodu- ção e a incubação, 
oferecem um supor- te às necessidades 
orgânicas e, portan- to, asseguram um 
hábitat ao sentido biológico do termo. 
Esse é igualmente uma “casa” (latim, 
mansio) e uma per- manência. O termo 
casa, aqui, deve ser entendido no sen-
tido (grosso modo, heideggeriano) de alojamento do ser, ou seja, como local da evolução 
humana. Tal concepção vê a casa como aquilo que permite uma aclimatação em nível 
ontológico. As esferas oferecem a ocasião de uma instalação, de uma domesticação e 
de uma interioridade; ao mesmo tempo, por intermédio de um procedimento estático, 
permitem a abertura para o simbólico e a linguagem, na direção da exterioridade do 
mundo, dando acesso aos objetos fora de contato, como o horizonte e os astros. Entre-
tanto, como lembra Nancy, “os círculos, as esferas, suas harmonias enlatadas”, são todos 
“formas de anulação do espaço” (Nancy, 1990: 90), pois nem nossos corpos, nem o 
mundo são circulares ou esféricos. Nas criações da ecotecnia, não se deveria dissimular 
o que “não gira redondo”.
parasita
No centro dessa problemática, seria urgente questionar a interação entre quadro e pró-
tese: o quadro como extensão e projeção da instrumentalidade, a prótese como nova 
forma de hospitalidade; e a partir de então, desenvolver as categorias de hostilidade, 
não-habitual, desconforto, alienação e perturbador. Com efeito, assim como um trans-
plante, uma prótese pode ser, ao mesmo tempo, hospitaleira e hostil. Ela oscila entre 
estes dois pólos, hospes e hostis, o hóspede (ou o convidado) e o inimigo, a hospitalidade 
e a hostilidade (Derrida, 1992: 20-33). Isso é reconhecido no âmbito da cirurgia mé-
dica. Em arboricultura, sabe-se enxertar (do grego, emphuton, transplante) um ramo 
que se tira de uma árvore, transplantando-o em outra. Em termos gastronômicos, isso 
poderia pôr em questão a significação habitual de mesa do hóspede (sempre freqüentada 
por um convidado pouco discreto, um parasita). No plano da política, a ambigüidade 
Haus-rucker-Co, Oasis nº 7, diversas mídias, 
Documenta 5, Kassel, 1972 (Brayer, 2003)
38 o LUGAr Do proJeto
entre os dois termos (hospitalidade e hostilidade) é contraditória apenas à primeira vis-
ta; provém do fato de que o estabelecimento de qualquer Estado (uma “cidade”, a pólis, 
um organismo) só encontra sua determinação diante do posicionamento de um inimigo 
(estrangeiro, invasor, colonizador, parasita, vírus), ao qual deverá se opor, o que leva à 
urgência de examinar outras categorias, como as de transplante e parasita (Serres 1980). 
Em uma situação de ausência, diante de uma necessidade ou de uma lacuna, o órgão 
transplantado é algo que age comouma permuta, levando a uma lógica de substituição 
no espaço da arquitetura. O campo da substituição abre a possibilidade da colocação, 
do deslocamento e da recolocação, isto é, uma definição inédita do termo “local”.
A posição defendida aqui é de que não é necessário representar (ou “projetar”) um 
ambiente para o ciborgue, pois este já constitui um ambiente em si. O que não quer 
dizer que se proclame a inutilidade da arquitetura virtual ou, mais precisamente, que 
se negue o uso de instrumentos digitais em arquitetura. É urgente, contudo, pensar o 
corpo (humano) em relação a esses novos meios (essas novas mídias) digitais, virtuais 
etc., que são incontornáveis hoje. Seria preciso, então, poder pensar nesses novos meios 
como se pensou na perspectiva (latim, perspicere) na Idade Média e no Renascimento, ou 
seja, como um meio (mídia) que transformou a maneira de ver, de conceber o mundo. 
É preciso igualmente evitar certos atalhos. Hoje, a oposição não está entre real e virtual, 
mas sim entre o atual (o presente, a realidade dada) e o virtual (do latim virtus, força). O 
virtual não está presente hoje, mas se revela como uma força potencial (Deleuze, 1996). 
Isso que dizer várias coisas: primeiramente, que o virtual existe há muito tempo, bem 
antes da introdução do digital. O virtual existe ao menos desde o Renascimento: a pers-
pectiva artificial é o virtual; a dióptrica de Descartes também é o virtual, assim como o 
são os jogos de espelhos de Athanase Kircher e a câmara obscura no século XVIII. Por 
outro lado, é inútil observar que há tanta realidade no atual quanto no virtual. Enfim, 
essas duas categorias – atual e virtual – não aparecem em oposição, ou de maneira exclu-
dente, e sim como uma diferenciação, que pode se articular conceitualmente por meio 
da configuração da dobra, como mostrou Deleuze.
O ambiente do ciborgue se configura como um organismo híbrido: uma espécie 
de corpo sem órgão, atravessado de fluxos (mensagens), mas também de parasitas (ru-
ído). A teoria da informação, aliás, ensina que mensagem e ruído são contraditórios 
e necessários um ao outro. A integração da tecnologia não se fará “imaginando” um 
novo ambiente, mas talvez reconfigurando o próprio corpo, levando-o a exteriorizar-se 
para atingir o ponto em que as extremidades artificiais encontram o mundo. Não se 
trata de imaginar novas habitações para os ciborgues. Essas entidades meio-humanas e 
meio-sintéticas, em mutação permanente, já são ambientes, superfícies onde são postos 
em jogo os proveitos para si e para o mundo. Trata-se também de reconsiderar o nosso 
corpo e de, literalmente, (re)criá-lo como um organismo melhorado e equipado com 
instrumentos, de modo que ele possa habitar no mundo e negociar as transações com as 
múltiplas esferas do conforto, da informação e da mídia.
A partir de então, por meio dessas tecnologias de implantação, autoplastia e am-
plificação, as categorias de confortável, midiático e informação poderiam tornar-se 
múltiplas, isto é, uma multiplicidade que conduza à desmultiplicação dos registros. O 
interior da habitação poderia, por fim, redefinir-se como a projeção do corpo para o 
exterior, uma forma de ex-stasis atravessando diferentes filtros (lugares, paragens, passa-
39ArqUItetUrA no Corpo
gens, portas, entradas, quadros, cornijas, janelas, vãos, saídas, fileiras fronteiras, limites, 
penetrações, brechas, écrans, conversões, cabos, ondas, redes). Seria possível passar do 
interior para o exterior, por meio das superfícies que delimitam nosso ambiente, nosso 
ser-lugar: poros e aberturas, cicatrizes e pontos, feridas e cortes, a pele como um en-
velope ou anel, a pele dobrada, redobrada, desdobrada, multiplicada, tumescências e 
chanfraduras, turgências e invaginação, tegumentos e carapaças, nós e desenlaces, fios e 
retículos, tráficos e redes, portos de conexão com o ciberespaço ligados diretamente aos 
neurônios, tiras de materiais reversíveis, transplantações topológicas. Com efeito, como 
em uma garrafa de Klein, ou com uma simples meia, seria concebível que esse interior 
pudesse se tornar lógica e topologicamente um exterior. A arquitetura se metamorfose-
aria, então, em um dispositivo que participará desse êxtase, por meio do qual o projeto 
não será mais simplesmente um objeto a se ver, e sim um instrumento a mostrar algo 
além dele.
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43
Do espAço ArqUItetUrAL Ao espAço De ConCepção1
philippe Boudon
A questão dos programas de doutorado relativa à arquitetura requer uma representação 
epistemológica das áreas de pesquisa relativas a esse campo. Podem-se distinguir os 
esclarecimentos que lhe trazem as ciências humanas ou outras constituídas fora dela, e 
que reúnem pesquisas externalistas, dos programas formulados, ditos internalistas, para 
serem constituídos a partir do próprio campo. Esse é o caso da arquiteturologia, da qual 
alguns postulados – medida, concepções – e elementos conceituais maiores – modelo, 
escalas arquiteturológicas – serão descritos inicialmente, permitindo uma modelização. 
A partir dessa modelização, tentar-se-á mostrar a possibilidade de examinar a cons-
tituição de linhas de pesquisa, à luz de dois exemplos: o de uma “poiética arquitetu-
rológica” e o de uma “didática arquiteturológica”. No contexto de uma interrogação 
sobre programas de pós-graduação em arquitetura, a apresentação que farei aqui sobre 
a arquiteturologia consistirá, a princípio, em relembrar, de forma sucinta, porém neces-
sária, os elementos que a fundam, para em seguida mostrar a possibilidade desses dois 
prolongamentos programáticos possíveis para a pesquisa. 
relembrando os fundamentos da arquiteturologia
A arquiteturologia se originou de princípios epistemológicos. Observava-se que, nos es-
tudos da arquitetura, era possível encontrar, de um lado, o projeto – naturalmente, no 
centro dos estudos – e, do outro, diversas disciplinas, chamadas, dependendo do caso, de 
“disciplinas de acompanhamento”, fossem elas relativas às ciências humanas ou às ciências 
exatas. Mas, no que diz respeito ao conhecimento da arquitetura como tal, parecia-me 
que, nos anos 1970, não se encontrava nada sobre uma teoria propriamente arquitetural. 
A lingüística, de todo modo, sugeria a possibilidade de uma abordagem teórica, e mesmo 
científica, da arquitetura, pois a linguagem que aborda tudo (como a arquitetura) foi estu-
dada para si mesma, desde que se pôde questionar como ela permitia a comunicação.
1 Conferência apresentada no Seminário Projetar 2005, transcrita e traduzida por Juliana Cas-
tro e Cristiane Rose Duarte.
44 o LUGAr Do proJeto
Em outras palavras, pode-se distinguir o que chamarei de as abordagens “exter-
nalistas” da arquitetura e as abordagens “internalistas” eventuais, no que eu visara, ao 
estabelecer a linha de pesquisa da arquiteturologia. Isso não quer dizer que minha meta 
fosse um esclarecimento exterior voltado para a arquitetura, como na sociologia, na tec-
nologia ou, de forma mais rara, na economia, mas sim uma produção de conhecimento 
própria ou mesmo específica da arquitetura. 
Ao traçar a hipótese de que o espaço era uma característica fundamental da arquite-
tura (Zévi Focillon), fui levado a me questionar sobre o que podia diferenciar o pensa-
mento do espaço característico do arquiteto daquele pensamento do espaço que é o do 
geômetra, considerando, empiricamente, que suas particularidades estavam na presença 
da escala, termo muito freqüente no discurso dos arquitetos. O valor estético certo, de 
acordo com cada um desses pontos de vista, poderia, pareceu-me, conferir um valor 
propriamente epistemológico. De fato, o espaço arquitetural é bem diferente do espaço 
geométrico, uma vez que se acompanha necessariamente de medidas, ao passo que o 
espaço geométrico, de certa forma, deixa as dimensões reais do espaço entre parênteses: 
os triângulos de Thales são semelhantes, independentemente de seu tamanho.
A partir de então, surgiu uma linha de pesquisa voltada para a arquiteturologia, e o 
exame do próprio conteúdo da noção de escala se sobressaía, algo que passei a estudar 
examinando a sua polissemia. Emergiram daí duas dezenas de significações, que chamei 
de “escalas arquiteturológicas”. Assim, a escala arquiteturológica se tornou um conceito 
definido por mim como pertinência da medida.
Nessa etapa, em resumo, o programa arquitetural, como linha de pesquisa, pode 
ser formulado a partir destas duas propostas: 1) o espaço arquitetural difere do espaço 
geométrico pela escala; e 2) o modelo geométrico não é suficiente para explicar a com-
plexidade do espaço arquitetural, sendo preciso atrelá-lo a uma modelização do espaço ar-
quitetural, distinta da modelização utilizada na geometria. Dizer que o Arco da Défense, 
em Paris, é um cubo não é dizer grande coisa, se entendemos por cubo o que o geômetra 
define como uma figura caracterizada independentemente de suas dimensões.
O fato, porém, é que essa primeira observação, segundo a qual a medida é um pos-
tulado inicial da arquiteturologia, e, diga-se de passagem, um postulado independente 
de todo julgamento de valor2, não basta. Reconhecer que o Arco da Défense possui di-
mensões supõe também o questionamento da maneira por meio da qual tais dimensões 
lhes foram dadas.
Uma primeira interrogação torna possível a emergência da arquitetura como linha 
de pesquisa sob a forma de uma pergunta: “De que forma o arquiteto atribui medidas 
ao espaço?”. A esse respeito, pude mostrar como podem ser complexas as operações que 
atribuem medidas às bordas de uma simples piscina. A formulação da questão “de que 
forma o arquiteto atribui medidas ao espaço?” abriu para a arquitetura, portanto, todo 
um programa de pesquisa. 
Abro um parêntese: devo dizer que são as questões que, primeiramente, caracterizam 
a pesquisa para mim. Chamo de questão uma frase com um ponto de interrogação no 
final. Isso quer dizer que “a questão da arquitetura”, “a questão da cidade”, “a questão da 
história” ou mesmo “a questão da memória” não são questões para mim. Uma questão, 
2 Distinção entre “teoria” e “doutrina”. 
45Do espAço ArqUItetUrAL Ao espAço De ConCepção
como ponto de interrogação no fim, apresenta uma característica particular sobre a qual 
é preciso trabalhar para tentar respondê-la.3
A questão “De que forma o arquiteto atribui medidas ao espaço?”, se consideramos 
que seu trabalho não pode fugir da função de atribuir medidas, dá origem, portanto, 
a uma linha de pesquisa. Em outros termos, duas palavras têm valor de postulado na 
arquitetura: medida e concepção.
Após ter evidenciado a primeira, é preciso que eu me detenha agora na segunda, a 
concepção. A concepção procede de uma consideração – no fundo, paradoxal – que 
pode se enunciar assim: “o objeto arquitetural, quando ainda não existe, existe para a 
concepção”. Isso pode parecer evidente e ser considerado uma banalidade, todavia tem 
algumas conseqüências do ponto de vista epistemológico. Por exemplo, para alguém 
que deseje analisar a arquitetura por meio de um procedimento científico, não há o que 
“analisar”, uma vez que o objeto não existe. O cientista, em geral, é alguém que “analisa” 
sejam fatos naturais, físicos, químicos, nas ciências da natureza, sejam fatos humanos ou 
sociais, no que concerne às ciências humanas. 
Tem-se o direito, pois, de se interrogar se cabe considerar a existência de algum 
conhecimento científico diferente da arquitetura, uma vez que o fato de os objetos ar-
quitetônicos serem caracterizados por sua não-existência proíbe todo enfoque científico 
em sua forma clássica de análise. A esse respeito, a idéia de “ciências da concepção”, 
desenvolvida por Hebert A. Simon, é muito feliz. Simon mostrou que, ao lado das 
ciências da natureza e das ciênciashumanas, deve-se considerar o que chama de “ci-
ências do artificial”, ainda que se deixe para trás a palavra “artificial” dos edifícios, das 
composições musicais, dos objetos técnicos ou das organizações. Tomo de empréstimo, 
portanto, a idéia de Simon de que a “simulação”, no caso das ciências da concepção, 
pode ser aquilo que substitui o método geral relativo à “análise” nas ciências que, para 
simplificar, chamarei de ciências clássicas.
exemplificação das escalas arquiteturológicas
Após ter lembrado os dois postulados com os quais se abre a linha de pesquisa que cha-
mei de “arquiteturologia”, e ter dado à noção de escala o lugar que lhe é próprio como 
diferença entre espaço arquitetural e espaço geométrico, gostaria agora de exemplificar 
a possibilidade de pesquisas com esse enfoque.
Disse que o exame da polissemia do termo de escala levou ao inventário empírico 
de duas dezenas de escalas arquiteturológicas, que procurarei ilustrar aqui. Para levar às 
conclusões que pretendo esboçar nesta apresentação, tentei dar uma idéia da arquite-
turologia retomando a questão de um “programa”, no sentido que pode ser atribuído 
a essa palavra nas ciências, no ensino ou nas linhas de pesquisa dos programas de pós-
graduação, e dizendo que esse enfoque é basicamente fenomenológico. 
3 No âmbito do terceiro ciclo (quinto e sexto anos do curso de Arquitetura), a maior dificul-
dade, para mim, é fazer com que os alunos trabalhem os temas que mais os motivam sob a 
forma de questões.
46 o LUGAr Do proJeto
A arquiteturologia, de fato, decorre de um procedimento que se pode dizer “feno-
menológico” e é relativo à “concepção”. O termo de “fenomenologia da concepção”, 
que poderia defini-la parcialmente, pode chocar a quem considera possível apenas uma 
“fenomenologia da percepção”, sustentando que é quase por definição que a fenomeno-
logia tem relação com a percepção. A leitura de Husserl, todavia, não me parece contra-
ditória com a idéia de uma fenomenologia da concepção distinta da fenomenologia da 
percepção, que é, inclusive, o título de uma obra de Merleau-Ponty.
Não quero entrar nessa discussão, mas admitir que a linha de pesquisa arquiteturoló-
gica é, em parte, fenomenológica quer dizer também que ela é de difícil manipulação 
científica, da mesma forma que é complicado admitir que uma ciência positiva sustente 
algum programa de pós-graduação. Por isso, retomando meu argumento, ao refletir 
sobre a possibilidade de que a arquiteturologia ajude na constituição de possíveis linhas 
de pesquisa para cursos de pós-graduação em arquitetura, pareceu-me útil a idéia de 
duas pistas de programas que podem ser desencadeados por ela. De um lado, uma linha 
que trate da “arquiteturologia poiética” – ou de poiética arquiteturológica, pois, nesse 
âmbito, não parece útil distinguir o que cada uma dessas duas expressões pode englobar; 
do outro, uma “didática arquiteturológica”. 
poiética arquiteturológica
Uma vez desenvolvidas as ferramentas conceituais que são as escalas arquiteturológicas4, 
pode-se investigar o que chamo de “espaço de concepção” de um arquiteto e expor, 
dentro de alguns limites, o “estilo” desse arquiteto. Em outras palavras, tais ferramentas 
permitem investigar a presença das escalas arquiteturológicas que caracterizam o traba-
lho de um arquiteto.
De acordo com esse ponto de vista, certamente se encontra, de forma imponente, a 
presença de uma “escala geométrica” em Kahn, de uma “escala geográfica” em Wright 
ou de uma “escala de visibilidade” em Alvar Aalto. Isso salta aos olhos, mas pode-se 
acompanhar também o exame dos discursos desses arquitetos. “Eu começo sempre por 
um quadrado”, diz Kahn; “A casa nasce do chão”, afirma Wright, ambos indícios que 
provam a presença dessas escalas5.
Uma vez percebida a presença de escalas em um arquiteto, cabe interrogar ainda o 
que difere um arquiteto dos demais, bem como a utilização de uma mesma escala e de 
suas operações em cada um dos trabalhos examinados pela pesquisa. Assim, a escala 
geométrica parece interessar a Kahn, mas também a Tadao Ando e a Le Corbusier. 
Percebe-se, contudo, que, no momento de concepção, nem todos colocam em jogo as 
mesmas peças. A palavra “geometria” empregada por um ou outro dos arquitetos não 
4 As escalas, na verdade, são mais complexas do que mostrei aqui. Para se ter uma idéia, basta 
saber que compreendem três operações constitutivas de referência, recortes e dimensiona-
mento. Refiro-me aqui ao Curso de arquiteturologia (cf. Boudon e outros, 2001).
5 Espero que meus exemplos não pareçam ultrapassados. Eu os escolhi porque são referências 
que todos conhecem. Poderia falar de uma escala técnica em Shigeru Ban, mas isso tornaria 
difícil uma comunicação mais fluida entre nós.
47Do espAço ArqUItetUrAL Ao espAço De ConCepção
possui o mesmo significado, nem engloba a mesma coisa, e isso pode ser estudado. É 
precisamente o interesse que essa dificuldade apresenta que pode gerar uma pesquisa, 
que passaria pela consideração das relações entre escalas, ou seja, não partiria do pressu-
posto da existência de uma única escala para todos. Em Le Corbusier, a geometria se 
apresenta freqüentemente na forma de um traçado regulador, o que não acontece em 
Kahn. O que, então, entendemos por expressões como “a geometria de Kahn” ou “a 
geometria de Le Corbusier”? No fundo, nada de preciso, se não for buscada a simulação 
das operações de concepção utilizada por esses arquitetos em seus trabalhos.
Aqui, a arquiteturologia produz questões. Fornece ferramentas conceituais, cujos 
detalhes não terei tempo de explicar aqui, porém basta um exemplo: pode-se falar de 
Ronchamp do ponto de vista de escala geométrica? A resposta é sim, se for aceita a 
simulação feita pelo arquiteto Pingusson, segundo a qual Ronchamp seria, a princípio, 
um cubo, certamente deformado, mas ainda um cubo. O conceito de “grau zero” das 
escalas em arquiteturologia aparece com todo o seu sentido nesse exemplo e permite 
abordar esse tipo de questão. Outro exemplo de “grau zero” pode ser encontrado na 
escala geométrica na planta do Turun Sanomat, de Alvar Aalto, que se distingue funda-
mentalmente de uma planta de Mies van der Rohe pelas variações de módulos da trama, 
assim como pela variação da forma dos pontos de sustentação, que são os pilares.
Há interesse também pelos valores relativos das diferentes escalas do que se pode cha-
mar de sistema de concepção de um arquiteto – se é que existe um “sistema” –, pois cabe a 
hipótese de que todas as escalas sem dúvida estão presentes na concepção dos arquitetos, 
ainda que em graus diversos, e de que o “estilo” de cada um é feito precisamente dos va-
lores relativos que tomam umas e outras em seu sistema de concepção. Assim, constrói-se 
ou simula-se o sistema arquitetural, levando em consideração as escalas presentes de forma 
recorrente ou aquelas que dominam ou precedem as demais nas operações da concepção.
Evocando o termo usado por Paul Valéry, apresentarei agora algumas idéias sobre 
uma possível linha de pesquisa, que chamo de “poiética arquiteturológica”, e que forne-
ce ferramentas para o conhecimento do “fazer” do arquiteto. Trata-se do que Caroline 
Lecourtois, pesquisadora em meu laboratório, chama, com muita propriedade, de uma 
“arquiteturologia aplicada”. Segundo esse ponto de vista, pode-se considerar a constru-
ção de uma didática arquiteturológica.
Didática arquiteturológica
É preciso, porém, retornar à idéia da situação de concepção em que o objeto arquitetural 
não existe. Como vimos, essa idéia postula um espaço de concepção diferente do espaço 
arquitetural que é o resultado do processo.
Ao se referir às “quatro composições” que são a Villa do Doutor Jeanneret, a Villa 
dos Garches, a Villa de Tunis e a Villa Savoye, Le Corbusier parece querer interrogar a 
“sua” própria concepção, pois mostra como esses quatro objetos foram concebidos de 
formas diferentes. Deve-se, de todo modo, estar atento ao fato de que, para efetuar esse 
retorno sobre a concepção,Le Corbusier já dispõe dos produtos prontos que concebera, 
enquanto na situação de concepção que era a sua, ao trabalhar em cada uma delas, eles 
ainda não estavam, por definição, produzidos.
48 o LUGAr Do proJeto
O que chamo de “espaço” de concepção é, portanto, um espaço teórico fictício, uma 
ficção teórica necessária, e que deve ser entendida como um espaço de representação e de 
operações. Essa distinção não é feita não apenas por Le Corbusier, apesar de seu zelo ao in-
terrogar-se sobre seu trabalho, como também, de forma geral, no ensino da arquitetura.
Uma didática precisa levar em conta a necessidade introduzida pela arquiteturologia 
de distinguir espaço de concepção e espaço arquitetural, e de descrever o primeiro a 
partir dos indícios fornecidos pelo segundo. Em geral, quando os professores falam de 
arquitetura para seus alunos, mostram os resultados arquitetônicos. Para a arquiteturo-
logia6, no entanto, a questão é saber como se pode levar o estudante a olhar um objeto 
arquitetônico e perceber a forma em que ele foi concebido, ou seja, compreender as 
operações de concepção em jogo para que esse objeto pudesse existir. Trata-se de uma 
questão bem diferente de descrever o objeto depois de pronto.
Normalmente, a leitura dos objetos é uma leitura “poética”, em que, de acordo com 
o que eu disse, poderíamos considerar uma leitura “poiética”. Trata-se, pois, não de fazer 
uma descrição mais ou menos enfática de um espaço arquitetural como um discurso 
crítico pode fazer, associando valores positivos ou negativos a essa descrição, de acordo 
com o caso, mas sim de identificar as operações de concepção. O desafio didático em 
jogo aqui é o de distinguir o espaço arquitetural, a que se referem diversos comentários 
encontrados aqui ou diversas críticas, e o espaço em que se desenrolou a concepção.
Para que me compreendam, compararei o discurso de críticos sobre a Baker House, 
de Aaltoa e a descrição arquiteturológica que pode ser proposta para o mesmo trabalho. 
Todos conhecem o edifício sinuoso que beira o Charles River em Cambridge, nos Esta-
dos Unidos, construído por Aalto para os estudantes do MIT.
Eis, então, alguns comentários críticos: S. Giedion: “Por toda sorte de meios – tra-
çado das escadas, fusão entre os cômodos, junção dos quartos – Aalto consegue indivi-
dualizar o conjunto. Ele ousa dissolver a fachada em uma parede ondulada, a fim de que 
cada estudante, segundo ele, possa ter uma vista livre sobre o Charles River, que corre 
embaixo do edifício, sem se sentir esmagado pela imensa superfície da fachada. [...] 
Essa grande curva de parede, aliás, não é um anacronismo fortuito. [...] Ali, justamente 
embaixo na estrada, ondula um alinhamento de bow-windows de Boston, e Aalto deu a 
essa linha sinuosa uma réplica à escala de nosso século”.
J. M. Dixon: “Sempre pensei a Baker House como uma resposta a seu entorno: 
existe o lado ‘rio’, engenhosamente trabalhado para as vistas, e o lado ‘campus’, ra-
dicalmente diferente, com sua entrada principal indicada de maneira dramática pela 
convergência dessas extraordinárias escadas em balanço. Como ela se ergue em um 
alinhamento de prédios, a Baker House possui apenas dois lados visíveis: não teria tido 
sentido algum como construção isolada. [...] Ainda que jamais tivesse sido utilizado nos 
prédios construídos pelo MIT, o tijolo vermelho era o material dominante do alinha-
mento heteróclito e vetusto em que se encontra a Baker House. [...] Talvez Aalto tenha 
aproveitado a ocasião para firmar a interação entre a instituição e seu entorno.
S. Wrede: “Talvez o mais claro exemplo do confronto subjacente representado pela 
residência dos estudantes seja sua total indiferença (no sentido de uma tentativa de se 
apropriar de alguns temas do corpus existente) em relação ao contexto onde ele se situa. 
6 Em particular, por intermédio dos estudos de Caroline Lecourtois.
49Do espAço ArqUItetUrAL Ao espAço De ConCepção
Nas tensões interiores da planta, ele quase ameaçaria seu entorno. Imaginem que, em 
um grande espasmo muscular, a parte frontal encurvada da residência de estudantes do 
MIT infrinja livremente a frágil pressão que lhe impõe um fundo maciço e anguloso, e 
se estenda, empurrando simultaneamente árvores e prédios vizinhos”.
B. Zevi: “Está claro que ele se volta para a reunificação do corpo do prédio, di-
vidido no processo analítico racional, porém, desprovido de um método de compo-
sição, teve de relembrar as ondulações barrocas e recorrer, na parte de trás, a gaiolas 
de escadas espantosas à vista. O desenho da fachada sobre o rio parece denunciar esse 
constrangimento: ele é atravancado de árvores que desfiam os ângulos, interrompendo 
a concavidade e convexidade, deixando a percepção difícil. Por que razão? Ele tenta 
compensar uma lacuna metodológica, o ‘salto’ da quarta invariante. Sem decomposição, 
emerge outra vez a superposição das ‘ordens’ nos furos do bloco da esquerda, enquanto 
o mesmo fenômeno se esconde à direita no expediente de uma vegetação impossível, 
atingindo essa extremidade um nível mais elevado”.
L. W. Speck: “Baker House é um prédio bastante eclético. Enquanto a maioria de 
seus contemporâneos tira suas formas de um vocabulário fundado na única cultura in-
dustrial moderna, Baker House encontra livremente suas raízes formais em um campo 
mais vasto e mais complexo. Aalto sabe associar as formas. Essa faculdade altamente 
assimiladora da criação não pertence ao Movimento Moderno; ela não existe sem re-
lembrar aquela do fim do século XIX. Ele toma de empréstimo abordagens, materiais e 
figuras dos trabalhos dos heróis do passado, de seus contemporâneos, da expressão local 
e mesmo de suas próprias realizações. É um processo de deriva reflexiva e consciente. 
Cada elemento é emprestado e cuidadosamente colocado onde é apropriado, e se adap-
ta. As peças são reunidas entre elas por vínculos conceituais poderosos”.
Vê-se que as descrições acima são eminentemente variadas e têm como origem a 
imaginação dos críticos que as escreveram. Meu propósito ao retomá-las, contudo, não 
é pôr em questão a sua variedade, e sim simplesmente sugerir que uma leitura do espaço 
de concepção é algo diferente disso. Retomo aqui a leitura que fiz em meu livro Intro-
dução à arquiteturologia:
Uma escala geográfica recorta a concepção do prédio em duas partes: do lado do 
Charles River, uma longa fachada continua e sinuosa, e do outro lado, ou seja, 
do lado do campus, volumes distintos, angulosos. Aalto se utiliza do partido da 
sinuosidade da primeira fachada com a intenção de fornecer vistas variadas aos 
diferentes quartos de estudantes, cujos olhares são, assim, orientados de formas 
diversas. Reconhece-se aqui a escala da visibilidade. Do outro lado, uma primeira 
divisão se opera no espaço de concepção, que é gerada por uma escala sociocultu-
ral, separando moças e rapazes e, em seguida, uma escala funcional, que destina a 
cada um dos grupos uma parte do prédio. A entrada ao centro separa, portanto, 
dois conjuntos, mas não da forma que os edifícios escolares sempre foram con-
cebidos a partir de uma composição de simetria bilateral. Aqui, os conjuntos são 
diferenciados graças ao recurso a duas escalas diferentes: uma escala de parcela-
mento joga a escada dos rapazes no próprio plano da rua que beira o terreno, 
enquanto a escada das moças se instala em um plano determinado por uma escala 
geométrica, a saber, um ângulo reto apoiado na direção da entrada. Essa direção 
da entrada é função da escala de vizinhança: o centro do Campus do MIT leva ao 
50 o LUGAr Do proJeto
prédio de Aalto por um caminho oblíquo em relação ao parcelamento ortogonal 
geral do campus (Boudon, 1992)
Pode-se pensar, evidentemente, que tal descrição é muito menos enfática do que as 
apresentadas anteriormente. Estas eram “críticas”, a minha é “teórica”. As primeiras se 
referiam ao “espaço arquitetural”, sendo encaminhadas por leituras subjetivas, ao passo 
que a última, sobre o “espaço de concepção”, correspondeà produção desse espaço 
arquitetural.
Trata-se, pois, de identificar operações relativas a escalas arquiteturológicas (referen-
ciamento, recorte e dimensionamento7) das operações utilizadas tanto por Aalto quanto 
por qualquer outro arquiteto. Tanto o pavilhão suíço da cidade universitária em Paris, 
de Le Corbusier, quanto o pavilhão brasileiro recortam o edifício por uma escala so-
ciocultural moças/rapazes. Naturalmente, o espaço arquitetural dos três edifícios não é 
o mesmo, mas é possível perceber, com clareza, que há uma operação de recorte socio-
cultural nos três casos, e não se pode deixar de notar essas operações partilháveis que 
constituem o espaço de concepção8, sendo esse o objeto de estudo da arquiteturologia. 
Para falar do espaço de concepção, apenas localizei algumas escalas para mostrar 
como a leitura arquiteturológica se distingue de uma leitura crítica, que comenta, de 
forma mais ou menos rapsódica, as possibilidades de leitura de um edifício que se tem 
diante dos olhos. A continuação de tal leitura mostraria que as relações entre escalas 
podem ter naturezas diferentes, por exemplo, relações de sobredeterminação. Assim, en-
tendo que várias escalas podem agir sobre um mesmo objeto.
A curva da Baker House está concernida, ao mesmo tempo, por uma escala ótica 
e por uma escala de visibilidade. Da mesma forma, encontramos em outro projeto de 
Aalto, a Villa Mairea, uma escala de visibilidade aplicada ao ângulo de visão que faz com 
que as janelas lancem um olhar em uma direção que não é estritamente perpendicular 
ao plano da fachada. Esse mesmo arquiteto faz uso de uma escala ótica quando projeta 
seus famosos vasos de cristal, que mudam de aspecto, dependendo do ponto de vista em 
que são olhados, se os fazemos girar ou se giramos em torno deles. 
Deve-se observar que, na Baker House, as duas escalas, ótica e de visibilidade, con-
cernem ao objeto sinuoso que é a fachada, algo que chamo de sobredeterminação de esca-
las. Tendo sido identificada uma relação de sobredeterminação distinta de uma relação de 
justaposição de escalas, podem-se conceber operações compostas da passagem de uma 
para a outra; por exemplo, a disjunção que é a passagem de uma sobredeterminação a 
uma justaposição, passível de ser escrita como: <S=>J>.
Para explicar essa passagem de uma escala à outra, darei um exemplo em Kahn e 
outro em Le Corbusier. Não há dúvida de que é difícil classificar as escalas da “planta 
livre” de Le Corbusier e da tal janela de Louis Kahn, no entanto, se tentarmos conside-
rar, nos termos arquiteturológicos das operações que um e outro efetuaram nesses dois 
exemplos, acharemos em ambos exemplos de disjunção de escalas.
7 Desculpo-me por entrar em uma tecnicidade que talvez seja um pouco hermética
8 Note-se que distingo “concepção” de “criação”, que permanecem, para mim, misteriosas e 
inexprimíveis…
51Do espAço ArqUItetUrAL Ao espAço De ConCepção
Com efeito, sabe-se que, enquanto a parede tem a função separadora que lhe é pró-
pria na ordem da distribuição e a função estrutural que assegura na ordem técnica, Le 
Corbusier, no dispositivo que chamou de “planta livre”, distingue os elementos relativos 
à escala funcional (“distribuir”), a partir de então assegurada por divisórias, e aqueles 
relativos à escala técnica (“levar”), firmada pelos pontos estruturais. 
Louis Kahn, em outra situação, pois se trata de conceber uma janela, separa as 
escalas funcional e visibilidade tradicionalmente associadas na janela: “olhar para fora” 
(escala de visibilidade) e “fazer com que entre luz” (escala funcional) são utilizadas em 
partes distintas na janela “kahniana”.
Evidentemente, Le Corbusier e Kahn não têm o mesmo problema arquitetural, mas 
em ambos os casos uma operação de disjunção de escalas (S=>J) é observável, ainda que 
não se tenham as mesmas escalas, nem o mesmo objeto arquitetural. Contudo, quando 
se olha esse problema na ótica do quadro teórico da arquiteturologiam percebe-se que 
se trata de operações de concepção arquitetural idênticas e identificáveis como disjunção 
de escalas, ou, ainda, de casos de conjunções de escala.
“espaço arquitetural” e “espaço de concepção”
Espero que tenha se tornada clara a validade de uma distinção radical entre espaço arqui-
tetural e espaço de concepção. Neste espaço, trata-se de modelizar operações de concepção 
da arquitetura, podendo ser estudado a partir dos trabalhos de Aalto, Kahn e Le Corbu-
sier, ou de qualquer outro arquiteto ou mesmo de um estudante de arquitetura.
Esse é o conjunto de operações que a arquiteturologia tenta descrever e que pode 
ser desdobrado tanto em sua “poiética” quanto em sua “didática”. No fundo, todo ar-
quiteto, seja qual for o seu talento, utiliza operações de referenciamento, de recorte e de 
dimensionamento, que são constitutivas do espaço de concepção. É na hierarquização 
das escalas, em sua valorização relativa, no sistema que as associa entre si, que se produz 
algo que a arquiteturologia analítica pode abordar com o objetivo de identificar o estilo 
de determinado arquiteto.
Em Alvar Aalto, vê-se a pregnância da escala de visibilidade, ao mesmo tempo que se 
pode sublinhar de que forma a escala geométrica é importante nas operações de Le Cor-
busier ou compará-la com a força da escala geográfica no primeiro. Em outras palavras, 
a arquiteturologia fornece ferramentas que permitem identificar, comparar e conhecer 
mais detalhadamente as formas de concepção dos arquitetos. Como escrevi no Curso de 
arquiteturologia, “a leitura arquiteturológica de um edifício recorta o espaço de concep-
ção arquitetural, seguindo um conjunto de escolhas e decisões, cujas pertinências, assim 
como as referências, são enunciáveis”. 
No fundo, tal como Le Corbusier, acredito que o espaço arquitetural é inexprimível. 
As tentativas de descrição dos críticos são um sinal da dificuldade em jogo, quando 
não de sua impossibilidade. Em contrapartida, o espaço de concepção, cujas operações 
a arquiteturologia busca identificar, representa o que se pode descrever do trabalho do 
arquiteto, independentemente de impulsos críticos, tanto positivos quanto negativos. 
Esses impulsos críticos podem comentar o resultado, mas isso é assunto do crítico, e 
não da arquiteturologia.
52 o LUGAr Do proJeto
referências bibliográficas
BOUDON, Philippe
(1992) Introduction à l’architecturologie. Paris: Dunod.
BOUDON, Philippe e outros
(2001) Enseigner la conception architecturale: cours d’architecturologie. Paris: Éditons de 
la Villette.
53
os seMInárIos MonteVIDéU: UM oLHAr Do sUL 
pArA o proJeto De ArqUItetUrA e De UrBAnIsMo1
salvador schelotto
A postura de pensamento do arquiteto a respeito da cidade 
é paralela à postura de pensamento do psicanalista a respeito 
do inconsciente. Para forçar o paralelismo, pode-se dizer que 
este, guiado pelo inconsciente, pensa o que o inconsciente o 
faz pensar. Do mesmo modo, o arquiteto, guiado pela cidade, 
pensa o que a cidade o faz pensar.
Ignácio Lewkowicz e Pablo Sztulwark
A inquietante correlação proposta por Ignacio Lewkowicz e Pablo Sztulwark entre in-
consciente e cidade, e entre arquitetura e psicanálise, incitou-me a refletir mais uma vez 
sobre o relacionamento sempre dinâmico entre pensamento arquitetônico e realidade 
urbana, servindo também de provocação para a leitura das linhas que se seguem. O 
presente artigo tem como objetivo apresentar, expor e comentar algumas das principais 
facetas de uma experiência inovadora que vem sendo realizada há oito anos no Uruguai, 
e que contém alguns elementos de análise no que diz respeito às necessárias atualização 
e renovação da prática de projeto de arquitetura e, em particular, de projeto urbano. Há 
algum tempo, Montevidéu, a capital situada mais ao Sul do planeta, tornou-se referên-
cia e sinônimo de uma cultura de projeto urbano relacionada com as circunstâncias pe-
culiares da mudança de século. Em todo mês de março, desde 1988, vem ocorrendo na 
Faculdade de Arquitetura da Universidade da Repúblicaum acontecimento singular.
Trata-se da realização dos Seminários Montevidéu – Ateliês de Projeto Urbano. Re-
ferimo-nos a uma atividade que, sem dúvida, não só teve impactos profundos na vida 
de nossa faculdade, contribuindo notavelmente para a renovação didática e o debate 
acadêmico, como também transcendeu legalmente os seus limites e se projetou nos 
meios social, institucional e profissional. 
1 Este artigo reúne, sintetiza e amplia algumas das idéias contidas em Schelotto (2005). Tradu-
ção de Laís Bronstein.
54 o LUGAr Do proJeto
De fato, seu impacto não está restrito, nem delimitado ao espaço acadêmico e sua 
projeção natural no meio social. Em conseqüência de sua natureza “multiatoral” (mais 
do que interdisciplinar), repercutiu fortemente em diferentes âmbitos: na administra-
ção municipal da cidade, em primeiro lugar, no âmbito mais geral da administração 
pública e do governo, no meio profissional e no meio social e dos moradores.
A face mais evidente dos Seminários têm sido a presença e a participação de arquite-
tos renomados internacionalmente, seja coordenando ateliês, seja proferindo conferên-
cias ou integrando júris; há teóricos da cidade, realizadores, pesquisadores e professores 
de relevância acadêmica, provenientes não apenas do Cone Sul, como também de vários 
países da Europa, da Ásia e da América do Norte. Seus resultados mais conhecidos 
foram as propostas surgidas nos Ateliês de Projeto Urbano, expressas em maquetes, 
painéis, instalações, apresentações multimídia e performances, e seus episódios mais 
comentados, as discussões e os debates, o confronto de diferentes posturas em face de 
uma mesma temática e as críticas produzidas no júri final dos trabalhos produzidos e na 
platéia nas sessões plenárias de encerramento, sempre tumultuadas e polêmicas. 
Além de todos esses fatos verificáveis e das realizações tangíveis, entre as quais diver-
sas publicações em papel e em CD2, ocorreu nestes oito anos um tipo de movimentação 
subterrânea, menos visível, porém certamente mais profunda, que julgo ser necessário 
fazê-la aflorar.
Ao ensaiar um olhar retrospectivo panorâmico, parece que, de algum modo, a tra-
jetória dos Seminários Montevidéu quase sempre acompanhou o rumo dos aconteci-
mentos nacionais uruguaios, tendo formado uma agenda paralela, relacionada à agenda 
dos grandes problemas nacionais. Com efeito, foram formuladas propostas diretamente 
vinculadas aos principais questionamentos lançados pelo conjunto da sociedade, ao 
mesmo tempo que também se construíram, de forma criativa e original, algumas alter-
nativas. Repassemos sumariamente esta trajetória.
De um lado, a conjuntura do início do ano de 1998 possuía, ao menos na cidade de 
Montevidéu, um novo cenário: a inauguração, em sua jurisdição, de uma figura de pla-
nejamento geral, o Plano de Ordenação Territorial – Plano Montevidéu, cuja aplicação 
particular, em termos do que tradicionalmente tem sido reconhecido em nossa cultura 
arquitetônica e urbanística como “Projeto Urbano”, abalou os entendimentos até então 
2 Com relação ao primeiro Seminário (1998), se realizou neste mesmo ano um número mono-
gráfico da revista de arquitetura Elarqa. Com respeito aos Seminários de 1999 e 2000 se reali-
zaram publicações com formato de livro, contendo ensaios e fundamentalmente os trabalhos 
produzidos pelos Ateliês. Sobre os demais Seminários existem publicações em CD e em 2005 
se publicou um livro-resumo das oito primeiras edições.
Figura 1
o primeiro seminário: propostas para a 
Baía de Montevidéu. Fonte: salvador schelotto.
55os seMInárIos MonteVIDéU
vigentes3. Sua aplicação e sua verificação, em alguns casos, implicaram forte renovação 
nos âmbitos conceitual e de instrumentos e técnicas aplicáveis em intervenções urbanas. 
Inclui-se aqui o importante desenvolvimento verificado nos meios informáticos a partir 
dos anos 1990, não só programas e instrumentos vinculados aos sistemas de informação 
geográfica, o tratamento digital de dados e sua aplicação urbanística, mas também tudo 
que se relaciona às tecnologias de informação e de comunicação, à impressão digital e a 
aplicativos multimídia.
Isso ocorreu em um contexto maior não isento de facetas contraditórias: o con-
texto de um país e de uma sociedade, que na década de 1990, viveram um tipo de 
ilusão coletiva, em um ambiente de “prosperidade frágil”, combinando o crescimento 
da economia com as também crescentes desigualdades sociais e os evidentes desajustes 
territoriais. Em outras palavras, um cenário que, de um lado, gerou a expectativa de 
importantes transformações urbanas alentadas e/ou dirigidas pela administração mu-
nicipal e, de outro, propiciou a imaginação e a prefiguração de respostas projetuais, 
estabelecendo, em termos mais definidos e tangíveis, algumas das principais estratégias 
do Plano Montevidéu, assim como capitalizando e evidenciando a potencialidade de 
determinadas peças territoriais, infra-estruturas e equipamentos4.
Parte dessas expectativas se cumpriu, entre as quais os projetos e as intervenções 
municipais realizadas na margem interior da baía de Montevidéu ou aquelas realizadas 
nos espaços adjacentes ao riacho Miguelete, ambas claramente devedoras do primeiro 
e do segundo Seminários, respectivamente. Outras atuações similares, todavia, ficaram 
no papel e não chegaram a ser cumpridas.
Um segundo momento na história dos Seminários se iniciou em 2000, com o III 
Seminário, intitulado “As paisagens de lazer na cidade contemporânea”. Trata-se de 
período caracterizado por uma dupla tensão: de um lado, a evidência de uma busca 
teórico-conceitual alimentada pelo meio acadêmico no território do projeto, em dire-
ção a temáticas mais genéricas e abstratas; do outro, o término de um período de forte 
intervenção urbana por parte da autoridade municipal, cujo clima marcou os dois pri-
meiros eventos, seguido por um processo de ênfase na compreensão de processos e na 
antecipação e na previsão de tendências.
Por ocasião do V Seminário, realizado em 2003, inicia-se um terceiro momento. 
A ruína do modelo neoliberal, produzida pela crise financeira do inverno de 2002, e o 
conseqüente agravamento da situação socioeconômica do Uruguai determinaram que 
essas visões se alterassem profundamente e impulsionassem uma reflexão mais cautelosa 
sobre os determinantes dos processos espaciais, urbanos e territoriais, e sua incidência 
3 Desde 1950, a cidade de Montevidéu não contava com uma visão e um discurso planificador 
de caráter geral. O POT ou Plano Montevidéu surgiu mais de quarenta anos depois. Há que 
se ter em conta que esse Plano, em sua fase de elaboração, entre 1995 e 1997, realizou-se em 
grande parte em razão de um convênio celebrado entre a Prefeitura Municipal de Montevidéu 
e a Faculdade de Arquitetura da Universidade da República.
4 O Plano, que conjugava características de um plano geral de ordenação com componentes 
próprios de planificação estratégica urbana, sistematizou os instrumentos disponíveis de in-
tervenção urbanística e alguns outros até então inéditos. Ficaram no papel, todavia, as aplica-
ções do Plano na escala do Projeto Urbano.
56 o LUGAr Do proJeto
na configuração das realidades metropolitanas e na sempre conflitiva relação entre cida-
de e território, ou conexões entre as cidades formal e informal. Nesse terceiro momento, 
há clara inflexão no curso temático dos Seminários e, em conseqüência, são abordados 
cenários territoriais mais amplos, bem como temáticas mais gerais: “vazios urbanos e 
novas urbanizações”, informalidade urbana, centralidades populares, mobilidade, turis-
mo e inclusão social, entre outras.
Ainda que a agenda temática dos sucessivos Seminários não tenha respondido nem 
direta, nem mecanicamente aos interesses imediatos, diretos e particulares, às priori-
dades e às necessidades de alguma ou de várias instituições participantes, uma visão 
perspectiva nos permite admitir que, em sua globalidade, as preocupações abordadas 
foram, como afirmado, claramenteconfluentes com as principais questões que a socie-
dade uruguaia, por meio de seus agentes, tinha, mais ou menos explicitamente, nesse 
período. Levando em conta as novas determinações do contexto nacional e regional, 
pode-se aventar uma nova inflexão temática e metodológica, uma espécie de “quarto 
momento” da proposição de novas metas e objetivos, de novas temáticas e novos meca-
nismos apropriados para abordá-las.
Por esse motivo, de certo modo, a experiência, em meu entender, altamente satisfató-
ria e exitosa dos Seminários Montevidéu pode contribuir para responder a esta questão: 
é possível formular exercícios de Projeto Urbano por intermédio de uma modalidade de 
articulação de agentes que implique um jogo onde “todos ganham”? Dito de outro modo, 
considero muito importante elucidar, a partir da academia, em que medida se pode con-
tribuir para encarar o difícil problema da associação sinérgica entre instituições, grupos e 
pessoas com identidades e interesses diversos, com a finalidade de interagir e construir um 
vocabulário, um imaginário e uma cultura comum em relação ao urbano e o territorial. 
Vocabulário, imaginário e cultura nascidos de um espaço de interação, em um âmbito 
inovador, uma espécie de “espaço-entre”, que não pertence exclusivamente a nenhuma 
tradição institucional, mas capaz de incluir todas as tradições existentes.
Acreditamos que isso foi e tem sido possível porque, em cada edição anual, em 
cada Seminário, enquadrados em uma intensa experiência que consome quinze dias, 
sentem-se convocados, reúnem-se e interagem: estudantes universitários dos últimos 
anos, especialistas e profissionais de diversas e variadas disciplinas, docentes e pesquisa-
dores nacionais, renomados professores estrangeiros convidados, funcionários técnicos 
e profissionais de diversos órgãos públicos, responsáveis políticos, moradores do local, 
pessoas vinculadas ao meio empresarial e uma diversidade de pessoas interessadas nos 
problemas tratados.
Isso explica o fato de o Seminário ter transcendido e superado amplamente o forma-
to clássico de um “workshop” de projeto – como tantos outros promovidos nas Escolas e 
Faculdades de Arquitetura de todo o mundo –, centrado sobre a realização de propostas 
para responder a uma situação arquitetônica ou urbana, ou a um determinado problema 
dado, para constituir-se em um espaço complexo e de reflexões propositivas em termos 
da estrutura da cidade e de seu território. Os problemas e os temas da agenda urbana e 
territorial, fundamentalmente aqueles relacionados com a cidade de Montevidéu e sua 
área metropolitana, fizeram-se presentes em cada edição e foram abordados de maneira 
criativa, sem os compromissos e os limites impostos pela gestão pública, constituindo-se 
em um fórum de debates e de intercâmbio de alta produtividade.
57os seMInárIos MonteVIDéU
Considero interessante atermo-nos à geração e à densificação da rede de associações 
construída. Ano a ano, os Seminários Montevidéu foram crescendo e se tornando mais 
complexos em sua “densidade institucional”. A princípio, incorporaram como sócios a 
Prefeitura Municipal de Montevidéu e a Câmara de Vereadores; em seguida, o Minis-
tério de Transporte e Obras Públicas, a Sociedade de Arquitetos do Uruguai e o Centro 
de Estudantes de Arquitetura, o Ministério de Turismo e de Habitação, Ordenação 
Territorial e Meio Ambiente, e, finalmente, em suas duas últimas edições, a Faculdade 
de Ciências Sociais da Universidade da República.
Tais experiências permitiram que, em março de 2005, por ocasião da abertura de um 
novo Seminário, fosse possível subscrever um “acordo interinstitucional” reunindo os anseios 
de três Ministérios do governo central (Habitação, Transporte e Obras Públicas e Turismo), 
em que as instituições já mencionadas se comprometeram a tornar os Seminários Montevi-
déu um espaço permanente de coordenação e reflexão sobre os problemas da cidade.
Tudo isso nos leva a abordar os desafios trazidos pelo futuro imediato, e que são 
particularmente marcantes porque não estão esgotados, assim como a agenda temática 
prioritária (urbana e territorial) e a demanda por inovações nessa matéria permanecem 
em aberto.
Algumas correlações nada casuais. o novo cenário mundial e o renasci-
mento do urbanismo sob novos olhares nos anos 1990 
Tudo que ocorreu no processo em questão não esteve alheio a certa tendência de alcance 
geral: uma clara reversão de processos nascidos em meios acadêmicos e intelectuais nas 
três últimas décadas, que se traduziu numa curiosa “volta ao urbanismo”, isto é, numa 
espécie de nova atitude diante do urbano, plasmada em um ambiente internacional 
mais favorável, considerando-se que os processos urbanos podem ser programáveis ou, 
ao menos, governáveis a partir de instrumentos como a planificação estratégica urbana 
e o urbanismo da indeterminação e da incerteza. Essa situação se verifica logo após 
uma longa etapa de buscas, de abandono de instrumentos e de descrença, de ceticismo 
em relação a atitudes, ferramentas projetuais tradicionais e, conseqüentemente, recuo 
dos urbanistas e do urbanismo. Tais circunstâncias se conjugaram com um retorno à 
centralidade do ensino do projeto urbano e a consideração de questões urbanísticas nas 
Faculdades e Escolas de Arquitetura, tanto na graduação quanto na pós-graduação.
A visita e o reconhecimento das “lógicas projetuais” próprias dessa fase tardia da mo-
dernidade foram uma conquista dos Seminários, cuja permanente obsessão pelo con-
temporâneo alimentou a convocação dos mais destacados teóricos e realizadores atuais. 
Figuras 2 e 3
Imagens do VIII seminário. Fonte: salvador schelotto
58 o LUGAr Do proJeto
Trata-se não apenas de “lógicas projetuais”, mas também da oportunidade de conjugá-
las com diferentes visões do pensamento arquitetônico e urbanístico atual, podendo 
envolver aproximações tão diversas como aquelas obtidas de leituras e interpretações 
da “cidade global” características das realidades mais distantes do capitalismo avançado 
(Sassia Sasken participou do I Seminário), e do “urbanismo extremo” da intervenção 
em realidades urbanas carentes. Por exemplo, as favelas do Rio de Janeiro nas propostas 
de articulação cidade formal/cidade informal de Jorge Mario Jáuregui, caracterizadas 
como exemplos do “realismo mágico” latino-americano (Machado, 2003). Tais extre-
mos evidenciaram e manifestaram, no contexto dos Seminários, a riqueza e diversidade 
do pensamento contemporâneo sobre a cidade.
Da prática à teoria: cenários para o aprendizado
Os arquitetos naturalmente tratam a idéia de projeto como uma experiência complexa 
que conjuga pesquisa e proposta, análise e reformulação, trânsito das categorias con-
ceituais aos requerimentos concretos e abstração dos mesmos até sua generalização. 
Essa versatilidade se manifestou na experiência dos oito Seminários realizados até o 
momento, em um contexto que permitiu gerar uma conjunção singular de experiência 
e oportunidade para a reflexão teórica.
Vejamos alguns exemplos, tomados entre tantos:
a) o arquiteto paulista Paulo Mendes da Rocha, um dos expositores do pavilhão do 
Brasil na Bienal de Arquitetura de Veneza em 2000, apresentou como amostra de seu 
trabalho um conjunto de propostas urbanísticas para cidades situadas à margem de uma 
baía, entre as quais aquela elaborada em seu ateliê para a baía de Montevidéu, correla-
cionando-as com propostas realizadas para situações urbanas em condições geográficas 
similares. Isso pôs em evidência a significação que Mendes da Rocha atribuiu à experi-
ência montevideana, posteriormente repetida em outros seminários.
b) o arquiteto grego Yorgos Simeoforidis, crítico e jurado de arquitetura e urbanis-
mo, de projeção internacional, conhecido por seu destacado papel no EUROPAN e 
assíduo participante dos Seminários até sua morte precoce, postulou, na sessão de en-
cerramento do III Seminário em 2000, que a cidade de Montevidéu poderia tornar-se 
a “capital do urbanismo temático” no plano internacional.A experiência internacional 
de Simeoforidis indicava, já nesse momento, a enorme potencialidade da realização 
continuada dos Seminários.
Figura 4
paulo Mendes da rocha e Mariano Arana. 
Bienal de Veneza 2000. projeto para a Baía de Montevidéu. 
Fonte: salvador schelloto
59os seMInárIos MonteVIDéU
c) a formulação da noção de “cidade discreta” (“discret city”), feita pelo reconhe-
cido arquiteto japonês Hiroshi Hara (2004). Essa conceituação, inicialmente expressa 
por meio de diversas propostas concretas (Hara participou ininterruptamente dos Se-
minários, dirigindo ateliês de 1998 até 2003), explicitou-se de forma extensa em um 
documento-ensaio publicado em Tóquio no fim de 2004, no qual expôs sua visão da 
cidade e das alternativas para a urbanidade e a habitação na sociedade contemporânea. 
Hara esteve atento sobretudo às modalidades de conformação física das comunidades 
urbanas, bem como preocupado em enfrentar situações de pobreza extrema e encontrar 
alternativas para a habitação social. Sua proposta, não isenta de componentes utópicos, 
comporta uma complexa articulação entre diversas escalas e o levou a implementar seu 
projeto “Casa Experimental” em Montevidéu, experiência logo repetida na cidade de 
Córdoba, na Argentina, e que pretende estender-se a Porto Alegre.
Figura 5 
Um dos Ateliês de projeto Urbano
Fonte: salvador schelotto
Figura 6
Hiroshi Hara em seu ateliê. 
Fonte: salvador schelotto
Tais exemplos, entre outros que poderiam ser citados, manifestam a possibilidade, 
concretizada na experiência dos Seminários, de transitar naturalmente da prática pro-
jetual à teorização, do conhecimento gerado pelo estudo de problemas específicos para 
um conhecimento de aplicação, decerto passível de abstração e generalização, e também 
disponível e apropriável por aqueles que integram o meio acadêmico e por gestores 
públicos, profissionais e o público em geral.
Da prática teórica ao ensino da arquitetura e do urbanismo
Todas essas experiências não ficaram à margem das idéias e propostas especificamente 
docentes, próprias a uma Faculdade de Arquitetura. Ao contrário, a experiência dos 
Seminários teve impactos profundos no ensino de arquitetura em nossa faculdade. 
A partir dela, nossos ateliês de arquitetura se abasteceram de novas visões e de novos 
enfoques metodológicos e disciplinares. 
Isso se efetuou em diversas vias, entre as quais a considerável participação, ao lon-
go dos anos, de professores de Projeto da faculdade como “adjuntos” e assessores dos 
Ateliês de Projeto Urbano, nos quais acompanharam docentes convidados do exterior, 
a participação, ainda que quantitativamente menor, de docentes como “estudantes” ou 
“participantes de ateliês”, e a assistência e a participação, na mesma qualidade, de um 
grande número de estudantes de fim de curso, além da difusão de propostas em ativida-
des abertas e conferências, a edição dos trabalhos etc.
60 o LUGAr Do proJeto
A temática do Seminário e sua aplicação concreta nos Ateliês de Projeto Urbano, os 
exercícios propostos e as informações coletadas ou produzidas incrementaram o acervo 
da Faculdade, situando-o em um patamar superior vis-à-vis o momento de sua apli-
cação em cursos regulares. Essa incidência não foi a única, embora provavelmente te-
nha sido a principal, já que ainda não há avaliações produzidas sobre a mesma. Nesse 
contexto, destacam-se ainda a própria pesquisa urbana e as atividades de extensão e de 
relacionamento com o meio, o ensino de pós-graduação e as atividades da faculdade em 
geral, inclusive as articulações acadêmicas interdisciplinares. 
Como diz Hugo Gilmet: 
[...] a modalidade de ateliê, de tácita aceitação, é um dos pilares fundamentais 
dos Seminários Montevidéu e, com significado similar, pertence à identidade da 
própria Faculdade de Arquitetura. Essa relação especular entre os Ateliês de Pro-
jeto Urbano e os Ateliês regulares da Faculdade, contudo, mostra suas variações 
da mesma forma que o fazem os espelhos curvos.
A Faculdade de Arquitetura adota, desde a sua fundação em 1915, e em con-
junto com os estudos de engenharia, o modelo da École des Beaux Arts de Paris, 
tendo como eixo o ateliê de projetos arquitetônicos, em variados enfoques que 
vão da composição decorativa à grande composição paisagística, como âmbito 
privilegiado do processo ensino-aprendizagem.
Não obstante as mudanças introduzidas e de seu significado de ruptura, o 
Plano de Estudos do de 1952 continua com a modalidade pedagógica centrada 
no Ateliê de Projetos. Aparece, contudo, uma variante desse ateliê, chamada de 
“Ateliê Vertical” e que unifica o âmbito dos cinco cursos de Projetos de Arqui-
tetura segundo uma visão totalizadora da planificação territorial. Essa visão se 
elabora como insumo de apoio por parte dos institutos de pesquisa, com papel 
diretor no Instituto de Teoria da Arquitetura e Urbanismo (ITU) na elaboração 
do expediente urbano.
Com o fim da intervenção, irrompe, em 1984, a chamada “massividade” es-
tudantil e o conseqüente incremento do plantel docente dos ateliês. Entre suas 
conseqüências, estão as novas dificuldades que o ateliê deve enfrentar e o fim 
do “Ateliê Vertical”. De todo modo, em seu apogeu na década dos anos 1960, 
muitos testemunham que se tratava de uma ilusão de verticalidade, embora, nas 
últimas duas décadas, apesar do significativo aumento do número de estudantes, 
o ateliê como modalidade de trabalho docente mantenha sua vitalidade.
Com o novo Plano de Estudos de 2002, ratifica-se o papel vertebral do ateliê, 
reconhecido em sua distinção na Faculdade de Arquitetura da Universidade da 
República. Assim como o “Ateliê Vertical”, integrado por grupos de estudantes 
de diferentes cursos, os Ateliês de Projeto Urbano reúnem participantes com 
formações díspares. Os insumos de apoio também são elaborados previamente, 
sob a orientação do Comitê Acadêmico e, em várias oportunidades, com a parti-
cipação ativa do ITU. No “Ateliê Vertical”, no entanto, condiciona-se o âmbito 
dos trabalhos dos cursos iniciais à elaboração dos cursos superiores. No Ateliê 
dos Seminários Montevidéu não existe esta verticalidade, mas são notórias as 
assimetrias que subjazem nas diversas experiências dos participantes que lançam 
sua sombra de verticalidade.
61os seMInárIos MonteVIDéU
Em suma, e guardando a devida distância em relação à experiência dos Semi-
nários Montevidéu, nasce outra vez, com o mesmo sentido mítico de um pás-
saro fênix “moderno”, o “Ateliê Vertical”, tornado possível, entre outras razões, 
pelo reduzido número de participantes em termos relativos no que diz respeito à 
“massividade” dos Ateliês dos cursos regulares. A falta de hierarquia, de verticali-
dade, característica do “Ateliê Vertical” é de grande interesse para essas reflexões. 
Os Seminários Montevidéu estão mais próximos da concepção integral de Walter 
Gropius e da idéia do ateliê medieval de arquitetura (GIlmet, 2005).
Essa extensa citação se justifica porque permite contextualizar a experiência prática 
dos Ateliês de Projeto Urbano, desenvolvidos durante as duas semanas dos Seminários, 
em relação à tradição e à prática dos ateliês como experiência vertebral do ensino da 
arquitetura na nossa Faculdade. Além disso, essa contextualização permite aquilatar o 
impacto que essa experiência produziu na prática acadêmica.
os seminários Montevidéu no contexto de um país em transição e de 
uma projeção de futuro. Alguns desafios e buscas de renovação
Porque no mês de março de cada ano ocorre em Montevidéu um Seminário que se tor-
nou uma espécie de festival de urbanismo – no qual expõem-se trajetórias, obras de au-
tor e modelos de gestão, experiências, metodologias de intervenção urbana e de ensino, 
sensibilidades, e modalidades projetuais e didáticas que se contrastam, enriquecendo-se 
umas com as outras – existe hoje um espaço de encontro e de reflexão com capacidade 
convocatória não usual. A fraternidade que se vive durante esses dias nem sempre esteve 
isenta de tensões e da competitividadenatural que a confrontação de propostas e de 
soluções imaginadas a partir de diferentes formas de analisar e de transformar a reali-
dade supõe, assim como da não menos natural paixão com que se abordam as possíveis 
respostas projetuais.
Dos temas tratados ao longo das sete edições já realizadas surgem novas interroga-
ções para a análise e a investigação urbana. Do tecido de relações interinstitucionais e 
interpessoais que vem sendo construído, emerge um repertório ampliado de problemas 
a serem considerados em projetos de investigação, em atividades de extensão nos cursos 
dos Ateliês de ensino de Anteprojeto e Projeto de Arquitetura, ou na própria adminis-
tração pública, tanto municipal quanto nacional. São problemas novos e antigos, mas 
passíveis de ser iluminados por meio de novos olhares e abordagens.
Daqui em diante, o desafio dos Seminários será o de conseguir manter a tensão, a 
qualidade e o interesse acadêmico alcançados, conjugando os mesmos com a pertinên-
cia na seleção dos temas e a determinação dos âmbitos em que se focalizará o interesse. 
Figuras 7 e 8
Duas propostas para Montevidéu: porto, áreas rurais e periurbanas. Fonte: salvador schelotto
62 o LUGAr Do proJeto
Como complementação, está lançada uma aspiração que nunca foi concretizada em 
toda a sua potencialidade: o impacto no espaço regional dos Seminários, que convocam 
e envolvem como protagonistas docentes, estudantes e especialistas de países vizinhos.
O ano de 2005 terá sido um ano transcendente para o país e também para a nossa 
Faculdade de Arquitetura. Em março, assumimos a presidência da Associação de Esco-
las e Faculdades de Arquitetura de Universidades Públicas do MERCOSUL (ARQUI-
SUR), e nossa Associação escolheu Montevidéu como a sede de sua secretaria técnica 
permanente, procurando dessa forma consolidá-la como espaço acadêmico de alcance 
regional, compatível com sua vocação para o país e a região.
Essa decisão coincide com ao celebração dos noventa anos da criação da Faculdade 
de Arquitetura, data que sem dúvida convoca nossa comunidade acadêmica à reflexão 
sobre o caminho percorrido em quase todo o século XX, sobre as conquistas alcançadas 
e sobre as dificuldades e os impedimentos que retardam ou dificultam nosso avanço ao 
longo do século XXI. Trata-se de conquistas e dificuldades que devem ser consideradas 
para calibrar nossas potencialidades, fortalezas e oportunidades neste ano em que adqui-
rem uma significação especial, haja vista o novo e inédito acordo econômico, político, 
social e cultural em vigor no país5.
Nesse novo contexto, incerto e desafiador, mas também auspicioso, a Universida-
de deve, mais do que reivindicar mais recursos para si, situar-se na posição de ocupar 
o lugar que lhe corresponde e lhe é eticamente exigido na reconstrução nacional. A 
experiência que expusemos e comentamos aqui constitui um claro exemplo de tais pro-
pósitos, bem como incita-nos a continuar transitando pelos caminhos da inovação e da 
criatividade. Afinal, é precisamente disso que trata o Projeto.
5 O Uruguai passa por um processo de profunda transição política, que tem gerado muitas 
expectativas. Em outubro de 2004, a Frente Ampla (coalizão de esquerdas) ganhou, pela 
primeira vez em sua história, as eleições nacionais, assumindo o governo em março do ano 
seguinte. Nas eleições municipais de maio, reafirmando a tendência eleitoral, o setor que 
governa a capital desde 1990 passou a controlar de um a oito departamentos, com mais de 
70% da população nacional e mais de 75% da geração do PIB do país.
63os seMInárIos MonteVIDéU
referências bibliográficas
GILMET, Hugo
(2005) “Una reflexión desde el Comité Académico”. Em: SCHELOTTO, Salvador e outros. 
Nuevos escenarios montevideanos. Seminarios Montevideo – Talleres de Proyecto Urbano. 
Montevideo: Facultad de Arquitectura, Universidad de la Republica.
HARA, Hiroshi
(2004) Discrete city. Tokio: Toto Shuppan. 
LEWKOWICZ, Ignacio & SZTULWARK, Pablo
(2002) Arquitectura plus de sentido. Notas ad hoc. Buenos Aires: Kliczkowski.
MACHADO, Rodolfo (ed.)
(2003) The Favela Bairro Project. Jorge Mario Jáuregui Architects. Cambridge: Harvard University 
Graduate School of Design.
SCHELOTTO, Salvador 
(2005) “Los Seminarios Montevideo em uma visón retrospectiva”. Em: Nuevos escenarios monte-
videanos. Seminarios Montevideo – Talleres de Proyecto Urbano. Ob. cit.
SCHELOTTO, Salvador e outros
(2005) Nuevos escenarios montevideanos. Seminarios Montevideo – Talleres de Proyecto Urbano. 
Ob. cit.
65
As reLAções entre A CrítICA operAtIVA e o MestrADo eM 
ArqUItetUrA DA UnIVersIDADe CAtóLICA De sAntIAGo, no CHILe
paulo Bruna 
Compreender as relações entre a crítica operativa, tal como definida por Manfredo Tafu-
ri em Teorias e história da arquitetura1 (Tafuri, 1979), e o Mestrado em Projeto oferecido 
pela Faculdade de Arquitetura, Design e Estudos Urbanos (FADEU), da Universidade 
Católica de Santiago, no Chile, foi um desafio suscitado pela brochura que apresenta 
o curso, na qual se lê: “O mestrado é um programa para a reflexão e a ação sobre a 
arquitetura na dinâmica e intensidade do espaço latino-americano contemporâneo, exa-
minadas a partir de uma avaliação crítica das condições históricas e por intermédio do 
desenvolvimento de novos métodos e instrumentos de projeto”. As palavras-chave nessa 
apresentação são “reflexão” e “ação”, examinadas pela avaliação crítica das “condições 
históricas”. Para Tafuri, a “dimensão específica da crítica operativa é sempre a da ação. 
Ela parte, já nas primeiras experiências setecentistas, da descoberta das qualidades ativas 
ínsitas em qualquer contemplação e da introdução de uma ousada identificação entre 
pensamento e ação” (Tafuri, 1979: 188).
Gabriel Ruiz Cabrero (1989) se refere à ausência de uma crítica sistemática em Madri 
durante os anos iniciais do regime franquista, uma vez que a “ação é inimiga da reflexão”, 
embora o extraordinário desenvolvimento da arquitetura espanhola nos últimos trinta 
anos pareça negar esse fato, fazendo-nos pensar melhor em uma “reflexão ativa” ou, para 
usar a expressão de Manfredo Tafuri, em uma “crítica operativa”. O que habitualmente 
é descrito como “crítica operativa” corresponde a uma análise da arquitetura e mesmo 
das artes em geral cujo objetivo é não um levantamento abstrato, mas a “projetação de 
uma precisa orientação poética, antecipada nas suas estruturas e resultante de análises 
históricas programaticamente acabadas e deformadas. Nesta acepção, a crítica operativa 
representa o ponto de encontro entre história e o projeto” (Tafuri, 1979: 177).
Assim, pode-se dizer que a crítica operativa transporta a história passada em direção 
ao futuro; a sua verificabilidade não reside em abstrações de princípio, sendo avaliada 
caso a caso, com os resultados que obtém. Seu horizonte teórico é a tradição pragmática 
1 Trata-se de tradução realizada por Ana de Brito e Luis Leitão do original italiano 
Teorie e storia dell’architettura (1968). Ver, especialmente, o capítulo 4, páginas 177 
e seguintes.
66 o LUGAr Do proJeto
e instrumentalista. Nestas notas, não se pretende examinar suas origens históricas, mas 
apenas abordar alguns aspectos relacionados às tendências contemporâneas, com base 
em uma posição operativa conferida à crítica moderna e suscitada pelo Mestrado em 
Arquitetura da Universidade Católica de Santiago.
Para o arquiteto Horacio Torrent, seu diretor, o público alvo do programa foi defi-
nido como: “aquele que se propõe a ter um maior nível de conhecimento dos processos 
e métodos de pesquisa disponíveis para o desenvolvimento da arquitetura como profis-
são, mas também para aqueles que, provenientes de outras disciplinas, assumem uma 
etapa de formação na pós-graduação que lhes permitirá integrar os conhecimentos da 
pesquisa em arquitetura com os da história e da crítica arquitetônica”.
No quadro a seguir, que mostra a malha curricular do programa de mestrado da FA-
DEU, o “Projeto Complexo” é entendido como o projetodas múltiplas e heterogêneas 
condições da sociedade atual. Tem como condição incorporar conceitos provenientes 
das diferentes escalas do projeto, ou seja, desde aquelas próprias à paisagem e ao territó-
rio até a intra-urbana e a da edificação.
SEMESTRE
OBRIGATÓRIAS 
FADEU
OBRIGATÓRIAS / MESTRADO EM ARQUITETURA
OPTATIVAS
MALHA
INTEGRADADISCIPLINAS
COMUNS
ESPECIALIDADE 
PROJETO 
COMPLEXO
ESPECIALIDADE 
HISTÓRIA E 
CRÍTICA
1º
[40]
projeto de 
pesquisa: 
estratégias, 
Montagem 
e Gestão [10]
problemas de 
Arquitetura 
Contemporânea
[10]
Laboratório 
de Arquitetura
[10]
Historiografia 
da Arquitetura
[10]
optativa 1 [10]
2º
[55]
ética, Arquitetura 
e Cidade
[10]
Arquitetura na 
América Latina
[10]
Ateliê de projetos 
e pesquisa
[10]
seminário de 
História e Crítica 
da Arquitetura
[15]
optativa 2 [10]
optativa 3 [10]
3º
[60]
Dissertação de Mestrado
[40]
optativa 4 [10]
optativa 5 [10]
FACULDADe De ArqUItetUrA, DesIGn e estUDos UrBAnos (FADeU) 
MestrADo eM ArqUItetUrA – estrUtUrA, MALHA CUrrICULAr e DIsCIpLInAs
[155 CréDItos]
São objetivos específicos das duas “especialidades” propostas: a) contribuir para a 
formação dos mestrandos nos processos e métodos de pesquisa tradicionais ou pro-
venientes da tecnologia digital, em relação a estratégias de projeto de arquitetura que 
possam assumir a variabilidade e a complexidade dos desafios propostos pela dinâmica 
metropolitana do espaço latino-americano (Projeto Complexo); e b) contribuir para 
67As reLAções entre A CrítICA operAtIVA e o MestrADo...
a formação de acadêmicos e pesquisadores nos campos da história e da crítica, com 
ênfase no Chile e na América Latina; busca alcançar uma renovação conceitual ligada 
às demandas do desenvolvimento nacional e latino-americano, bem como fomentar a 
geração de discursos interpretativos da realidade (História e Crítica).
 O aluno deverá desenvolver as seguintes habilidades: a) para a especialidade em 
Projeto Complexo, os cursos e ateliês deverão incorporar as tecnologias digitais e a in-
formática para o desenvolvimento de projetos de complexidade urbano-arquitetônica. 
Isso requer também o desenvolvimento de posturas críticas em relação às tecnologias. 
Espera-se um alto nível de integração entre tecnologia, cultura e meio ambiente em re-
lação ao projeto de arquitetura com o território e a paisagem; b) para a especialidade em 
História e Crítica, além dos conhecimentos metodológicos específicos de história e de 
crítica arquitetônica, os alunos, especialmente aqueles provenientes de outras áreas do 
conhecimento, deverão desenvolver a habilidade de compreender o espaço arquitetôni-
co, seus sistemas de representação e a previsão antecipatória própria do projeto.
As disciplinas que compõe a grade do primeiro semestre são: a) Projetos de Pes-
quisa: estratégias, montagem e gestão: visa à formulação de projetos de pesquisa nas 
disciplinas de Projetos de Arquitetura, Estudos Urbanos e Ambientais, a fim de iden-
tificar determinantes metodológicos e técnicas de desenvolvimento; b) Problemas de 
Arquitetura Contemporânea: curso de caráter formativo que busca familiarizar o aluno 
com os principais tópicos de discussão na elaboração teórica contemporânea; c) Labo-
ratório de Arquitetura: destinado à opção Projeto Complexo, visa ao desenvolvimento 
de estratégias projetuais baseadas no “caráter operativo” dos conceitos de arquitetura; 
d) Historiografia da Arquitetura: para a opção História e Crítica, procura desenvolver 
os principais tópicos da teoria da história e da historiografia da arquitetura, com ênfase 
nos diferentes enfoques e escolas historiográficas.
No segundo semestre, a grade é composta pelas seguintes disciplinas: a) Ética, Ar-
quitetura e Cidade: proporciona um panorama da ética e de seus problemas fundamen-
tais que afetam a gestão, o projeto, a construção do hábitat e o ambiente da cidade e do 
território; b) Arquitetura na América Latina: apresenta e revisa a produção arquitetôni-
ca da América Latina na atualidade; c) Ateliê de Projetos e Pesquisa: para a opção Pro-
jeto Complexo, procura desenvolver uma pesquisa projetual mediante as técnicas e os 
métodos do projeto de arquitetura em nível superior, isto é, com embasamento teórico, 
procedimentos de pesquisa, desenvolvimento gráfico e acuidade técnica; d) Seminário 
de História e Crítica da Arquitetura: destinado à opção História e Crítica, propõe-se a 
enfrentar os problemas de método na história e na crítica da arquitetura, bem como a 
definição de temas e problemas de pesquisa.
No terceiro semestre, que pode, eventualmente, englobar o quarto semestre, as princi-
pais atividades são a pesquisa e a elaboração da dissertação, que corresponde ao desenvol-
vimento avançado de uma pesquisa, em que o candidato seja capaz de definir, sintetizar, 
analisar e concluir, com implicações para a produção do conhecimento e o progresso para 
disciplina. Há duas formas de dissertações: a dissertação teórica e a dissertação projeto.
A primeira terá, fundamentalmente, um caráter de pesquisa da arquitetura, do pro-
jeto, da análise ou da crítica. Apresenta-se sob a forma de um texto, eventualmente 
acompanhado por ilustrações, notas e referências. A segunda, por sua vez, implica a 
formalização de um projeto não apenas como peça gráfica, mas também como formu-
68 o LUGAr Do proJeto
lação de objetivos e hipóteses, e de um referencial teórico. Demanda precisão teórica, 
desenvolvimento projetual e pesquisa gráfica e técnica, sendo formalizada em plantas, 
desenhos, croquis, modelos e demais elementos de representação e compreensão, além 
de textos escritos e documentos adequados à formulação teórica escolhida.
Em 2005, os cursos optativos oferecidos pela FADEU foram: Arquitetura e Tecnolo-
gia Digital; Tecnologias Digitais para Análise Espacial; Tecnologia Digital e Multimídia 
em Arquitetura; Arquitetura e Transformação Urbana na América Latina; Identidade 
Cognitiva e Projeto; Debates Contemporâneos de Projeto Urbano; Arquitetura Tran-
sitória; Projetos Urbanos e Sociais; Patrimônio Moderno e Projeto Contemporâneo; 
Visão Romântica da Arte e da Arquitetura do Século XIX; Pensamento e Obra na 
Arquitetura do Século XX; e Arquitetura e Fenomenologia. Note-se que o aluno pode 
fazer suas opções a partir de um leque maior de disciplinas. 
Retornando a Tafuri em função da experiência chilena, pode-se afirmar que a crí-
tica e a historiografia operativa, tal como propostas por Horacio Torrent, revelam um 
aspecto essencial: seu caráter didático. E acrescentar que elas, forçando-a, tornam explí-
cita esta condição irrecusável, típica de qualquer história: a recuperação filológica dos 
códigos de leitura do passado só é possível se partimos dos códigos atuais. A história, 
por sua própria natureza, é um jogo de equilíbrio, que a crítica operativa deflagra ao 
desencadear a dimensão do presente.
Livros como Espaço, tempo e arquitetura, de Siegfried Giedion, e História da arqui-
tetura moderna, de Bruno Zevi, são, ao mesmo tempo, contribuições historiográficas e 
autênticos projetos arquitetônicos. A excepcional importância da história de Giedion, 
publicada originalmente em 1941, decorre do fato de que se trata de uma das primeiras 
tentativas de religar a arquitetura moderna ao passado como orientação para desenvolvi-
mentos futuros. Nesse contexto, o passado é continuamente utilizado como confirmação 
do presente – “a história legítima o que já é” (Tafuri, 1979: 190) – e desempenha uma 
função tranqüilizadora; seu estímulo se destina, eventualmente, a retardar as inovações. 
De acordo com Tafuri, a crítica operativa pode ser essencialmente ideológica, isto é, à 
luz de termos marxistas, substituir o rigor analítico por juízos de valor já constituídos, 
conduzindo a uma repetição de propostas, soluções e críticas2. Resta como conclusão, 
portanto, a excepcional qualidade da proposta didática do Mestrado em Arquitetura e 
Urbanismo da Universidade Católica de Santiago.
referências bibliográficas
CABRERO, Gabriel Ruiz(1989) Spagna architettura 1965–1988. Milano: Electa Editora. 
TAFURI, Manfredo
(1979) Teorias e história da arquitectura. Lisboa: Editorial Presença, 1979.
2 Tafuri prossegue sua análise examinando a historiografia arquitetônica e seus limites, algo que 
não interessa a presente análise.
69
ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL: 
A pArtICIpAção De ALUnos eM proJetos UrBAnos reAIs. 
o CAso DA CAL poLy sAn LUIs oBIspo
Vicente del rio
Considerações iniciais
Há apenas dois anos, sob os auspícios da Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
(UFRN), em Natal, deu-se continuidade às importantes discussões sobre o ensino do 
projeto iniciadas em encontro da Universidade Federal do Rio grande do Sul (UFRGS) 
em 1985 (Comas, 1986). Ao avançar questões sobre a formação do arquiteto e do 
ensino do projeto no Brasil, o primeiro Seminário sobre Ensino e Pesquisa em Projeto 
de Arquitetura reuniu diversos pesquisadores e, no livro nascido do evento, Fernando 
Lara e Sonia Marques apontaram que, nos últimos vinte anos, temos assistido ao for-
talecimento da nossa área com a expansão de cursos de graduação e pós-graduação, a 
retomada das publicações e a proliferação de eventos. Seguindo os caminhos da redemo-
cratização do país, esses movimentos foram causa e efeito de um aumento significativo 
nas pesquisas e no pensar a arquitetura e o urbanismo. Entretanto, como observam esses 
autores, tal consolidação não se fez acompanhar do pensar o ato de projetar e as peda-
gogias do ensino do projeto; “consequentemente, ainda se ensina e se discute o projeto 
da mesma maneira que há vinte anos” (Lara & Marques 2003: 8). 
Envolvido com o ensino do projeto desde 1978, comungo com essas preocupações. 
Interesso-me, em particular, pelo ensino de metodologias que levem a processos proje-
tuais mais abertos e fujam do modelo da “caixa preta”, ao unir criatividade e método, e 
aproximar os paradigmas artístico, técnico e social (Del Rio 1990a, 1990b, 1998). “Mé-
todos projetuais mais conscientes, que busquem o equilíbrio do triângulo de Vitruvius, 
e menos destrutivos das lógicas preexistentes, participativos e em consonância com as 
expectativas do público usuário” (1998: 212). 
Ainda assim, nos dois eventos citados houve uma ausência preocupante. Embora no 
Brasil já existam diversas experiências pedagógicas que fazem uso da investigação direta 
junto a usuários a fim de coletar informações para o processo projetual, parece-me que 
não se discute o ensino do projeto valendo-se de pedagogias que ensinem aos alunos 
como incorporar esses usuários, ou seja, a comunidade, noprocesso decisório. Nos Esta-
dos Unidos, e no dizer de Sanoff (1999, 2000), esse é o modelo pedagógico participa-
70 o LUGAr Do proJeto
tivo ou de “pesquisa-ação” cuja base é o que se convencionou chamar de “community 
design”, ou projeto comunitário. Essa pedagogia visa promover o ensino do projeto por 
meio de um enfoque de maior responsabilidade social, mais ético, de acordo com um 
modelo participativo que ensina ao estudante como lidar com as comunidades e como 
conduzir um processo projetual aberto à participação de diversas formas e em diversos 
momentos (Sanoff 2000; Salama 1995). Esse ensino do projeto, portanto, acontece 
em um contexto que explicita as relações e os atritos sociais, culturais, econômicos e 
políticos da vida real.
Neste texto, retomo uma antiga preocupação em defesa de uma pedagogia que en-
fatize a necessidade de as escolas de arquitetura e urbanismo apresentarem programas 
curriculares para assistência técnica a comunidades (Del Rio 1990a; 1998). Em pers-
pectiva inserida em um paradigma sobre o papel social da universidade junto à socie-
dade – que, a meu ver, coincide com o nosso papel ético como arquitetos-urbanistas: a 
democratização do saber e do poder sobre as decisões relativas ao projeto –, discuto a 
atuação do docente de projeto. Não é preciso aqui enfatizar a importância dessa temá-
tica para o contexto brasileiro, cujo desenvolvimento social precisa muito do apoio das 
universidades.
A princípio, é importante esclarecer o meu conceito de projeto, entendido como 
um procedimento organizado de atividades para a tomada de decisões relacionadas a 
mudanças no mundo físico (Zeisel 1981). O projeto também pode ser visto como um 
meio de investigação que nos permite dar forma a idéias sobre o morar e os assenta-
mentos humanos (Rowe 1995). Assim, o projeto pode ser entendido como uma forma 
prática de investigação, pois se preocupa em fazer e em ter certa utilidade. Para que o 
projeto exista, admite-se a necessidade de melhorar o ambiente construído, ou seja, 
a preocupação de resolver um problema que, segundo Thorndike (citado por Rowe 
1995), é o que existe quando um organismo quer algo, mas cujas ações necessárias para 
obtê-lo não são óbvias. No âmbito pedagógico, entende-se o projeto como a atividade 
de ateliê em que o produto final visa a um pacote de medidas/ações que melhorem o 
ambiente construído.
Essas noções nos ajudam a entender a simbiose entre os projetos de arquitetura e 
de urbanismo, a ponto de não conseguirmos separar essas duas esferas. Isso serve de 
base para o que discuto a seguir, pois trato indistintamente do ensino de urbanismo, 
de desenho urbano e de planejamento urbano em ateliê, a despeito das definições que 
possamos dar a cada uma dessas áreas. Minhas idéias se valerão do contexto de minha 
atuação docente dos últimos cinco anos na Escola de Planejamento Urbano e Regional 
da California Polytechinic State University em San Luis Obispo, nos Estados Unidos.
o caráter público e participativo do planejamento nos estados Unidos
O urbanismo e o planejamento urbano moderno surgiram como respostas a problemas 
urbanos e aos desafios gerados pela vida nas cidades. Desde sua origem, o planejamento 
urbano tem caráter público, seja como um conjunto de práticas facilitadoras da produ-
ção e da reprodução do capital, seja como soluções diante de necessidades de ordem e 
saúde pública ou resultado de pressões políticas. Como o planejamento urbano se baseia 
71ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
no princípio de regular e limitar os direitos de construção do indivíduo em função do 
interesse público, deve ser uma atividade fundamentalmente pública, incluir os diferen-
tes atores sociais e ter cunho participativo.
Nos Estados Unidos, no início dos 1960, em razão de movimentos por direitos so-
ciais iniciados na década anterior, do trabalho de ativistas políticos, como Paul Davidoff 
e o seu “advocacy planning”, e de profissionais e pesquisadores de ponta, o paradigma 
do planejamento tecnocrático faliu e deu vez a um planejamento socialmente cons-
ciente. Em meados dessa mesma década, o governo federal norte-americano passou a 
exigir que seus programas de assistência social, financiamento habitacional e renovação 
urbana incluíssem a participação comunitária. Os public hearings, ou audiências públi-
cas, foram a maior conquista da época e abriram o planejamento para processos menos 
tecnocráticos e autoritários. Os passos seguintes seriam no sentido de melhorar os canais 
de comunicação com o público e de métodos para a construção de consensos, a fim 
de garantir que os grupos afetados pudessem participar da tomada de decisões desde o 
início do processo. 
Nasceu nessa época o community design, baseado na admissão de que o conheci-
mento técnico é inadequado e insuficiente para identificar e resolver os problemas das 
comunidades. O community design representa a adição de um conteúdo moral e político 
à prática profissional (Comerio 1990; Sanoff 2000) e é um conceito forte no planeja-
mento urbano norte-americano, implicando o trabalho não apenas para uma comuni-
dade, mas também com a comunidade, em que o projeto é desenvolvido por meio de 
um processo participativo de tomada de decisões. O primeiro centro para projetos co-
munitários foi aberto no Harlem em 1963, em apoio à luta contra a construção de uma 
via expressa. Logo, surgiramvários outros desses centros, organizados por universidades 
e pelo American Institute of Architects, ou como organizações não governamentais, via 
de regra dependentes de trabalho voluntário, de recursos repassados pelo governo fede-
ral (por exemplo, através do Community Development Block Grants) ou de outros tipos 
de doação (Sanoff 2000). Diversos deles ainda estão funcionam, embora tenham se 
tornado menos idealistas, mais práticos e focados na eficácia dos processos e produtos. 
O planejamento urbano com consciência social se tornou o que hoje é conhecido 
como “equity planning”, ou planejamento igualitário, e prevê os mesmos direitos para 
todos os cidadãos (Dalton, Hoch & So 2000). Nesses termos, a dimensão pública do 
planejamento se torna ainda mais evidente. No processo de planejamento contempo-
râneo, trabalha-se para que a comunidade compreenda as questões e os problemas que 
a atingem, e possa definir uma série de metas e alternativas para enfrentá-los. Esse 
processo tem lugar em audiências públicas, nas quais os planejadores atuam como fa-
cilitadores do processo e tentam fazer com que os diversos grupos de interesse estejam 
representados e consigam chegar a um consenso. 
Outra característica importante do planejamento nos Estados Unidos é o fato de ele 
ser considerado uma atividade para e com públicos múltiplos. Não poderia deixar de ser 
assim, uma vez que a sociedade norte-americana se caracteriza por suas múltiplas clas-
ses, diversas culturas, inúmeros grupos étnicos e marcantes diferenças raciais. Na Cali-
fórnia, por exemplo, enquanto os brancos representam 50% da população – percentual 
que tem diminuído –, os latinos correspondem a 30%, os asiáticos, a 10% – ambos 
crescendo cada vez mais, e os afro-americanos se estabilizaram em menos de outros 10% 
72 o LUGAr Do proJeto
do total. Além disso, esses grupos abrigam diversos subgrupos, que representam raças, 
origens, línguas e religiões ainda mais específicas.
Para garantir o caráter público de todo esse processo, existe um emaranhado de 
leis nacionais, estaduais e locais, com exigências que se imiscuem no sistema de plane-
jamento sob a forma de processos participativos. O arcabouço legal do planejamento 
norte-americano garante a participação pública ou, ao menos, obriga a divulgação com-
pleta de todas as informações ao longo de um plano, tornando-o transparente e aberto 
a litígios. Nesse contexto, o cidadão comum ou grupos organizados têm enorme poder 
legal. O National Environmental Act (1969) e o California Environmental Quality Act 
(1970) são exemplos clássicos da legislação nacional que estabelece sistemas de revisão 
de impacto ambiental (environmental impact review) morosos e detalhados, e incluem 
a participação comunitária. Hoje, o Estado da Califórnia exige que condados e cidades 
possuam planos gerais e planos específicos, ambos com formatação de conteúdo pre-
definida (Fulton 1999).1 O sistema prevê ainda planos distritais e outros instrumentos 
complementares, como zoneamentos, plantas de loteamento, diretrizes de projeto para 
cidades inteiras, setores específicos ou áreas históricas, comissões especiais de aprovação 
e acordos entre os setores público e o privado.
Diversas dessas regulamentações são oriundas de movimentos comunitários e mui-
tas delas limitam o direito de construir. Em 1972, houve um plebiscito na Califórnia 
que apoiou a lei estadual que estabeleceu a poderosa California Coastal Commission, des-
tinando recursos e outorgando poderes para estudar, planejar e controlar o uso da zona 
costeira. Os limites para controlar o crescimento de subúrbios em Portland, no Oregon, 
ou em San Luis Obispo e Santa Barbara, na Califórnia, são outros exemplos de políticas 
públicas decorrentes da pressão de movimentos populares. Há ainda o chamado ballot 
planning, bastante usado na Califórnia, e que é uma forma curiosa de planejamento em 
que qualquer grupo organizado ou cidadão pode levar um projeto contencioso para um 
plebiscito legal, cujo resultado é capaz de passar por cima de qualquer outra legislação 
local, tornando o planejamento um fato definitivamente político (Fulton, 1999). Em 
San Luis Obispo, no ano passado, um abaixo-assinado movido por grupos de cidadãos 
conseguiu forçar a realização de um plebiscito destinado a reverter a vontade do prefeito 
e a decisão da câmara de vereadores, que haviam aprovado a construção de um shop-
ping center em uma área agrícola. É claro que a história pode ser também o oposto, ou 
seja, um empresário pode iniciar um processo desses para ter o seu projeto aprovado 
pela comunidade, apesar de a legislação local proibi-lo. Por isso, Fulton afirma que, na 
Califórnia, o planejamento funciona bem, quando há uma grande variedade de grupos 
de interesse bem organizados envolvidos no processo, e que, no fim, terminam se equi-
librando.
Aqui, devemos notar dois fatos típicos no planejamento norte-americano, que são 
curiosos e se destinam a minorar custos legais e demoras na tramitação dos processos. 
Em primeiro lugar, a premissa de que o consenso é fundamental para evitar litígios, que 
1 Na Califórnia, as cidades e os condados são obrigados a adotar um General Plan, ou seja, um 
documento que expressa as metas, as políticas e as definições gerais de desenvolvimento e uso 
do solo. O Community Plan é um plano para uma comunidade ou área urbana que segue o 
mesmo escopo do General Plan, mas cujo escopo é mais detalhado e específico.
73ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
geram lentidão e maiores custos financeiros na implementação dos planos. Em segun-
do, o entendimento de que a construção do consenso é importante no cenário político 
americano, pois se trata de democracia representativa e não total, na qual o cidadão 
expressa a sua opinião, mas são os líderes eleitos (políticos, comissões, diretorias de asso-
ciações etc.) quem votam e tomam a decisão final, ainda que, em geral, sigam a opinião 
da maioria de seus eleitores, inclusive para evitar futuros litígios legais. A realização de 
um plano diretor é acompanhada, desde o inicio, por uma comissão formada por vinte 
a trinta cidadãos representantes, que eventualmente o enviam para a aprovação final da 
prefeitura. Como observa Fulton, o “planejamento é [...], no fim, política”, uma vez que 
o planejador está intimamente envolvido com o processo decisório, desde a concepção 
do plano até a sua aprovação e sua a implementação; “em última instância, planejamen-
to é conseguir três entre cinco, ou cinco entre sete votos” (Fulton 1999: 9).
Em suma, pode-se dizer que esse caráter público justifica a existência das quase 
cem escolas de planejamento ou estudos urbanos nos Estados Unidos, muitas das quais 
como mais de um programa.2 A maioria dos estudantes desses programas são atraídos 
para a profissão em decorrência de seu desejo de servir ao interesse público: em 2000, 
mais de 70% dos profissionais registrados na American Planning Association trabalha-
vam para alguma agência governamental (Dalton, Hock & So 2000: 5). Infelizmente, 
contudo, a maioria desses programas concentra seus interesses em temas como políticas 
públicas, administração, modelos estatísticos, estudos sociais e economia urbana, tendo 
praticamente abandonado o interesse pelo planejamento físico e o desenho urbano. Não 
obstante, como indicam os movimentos do mercado e de um público consumidor bem 
mais consciente – movidos, em grande parte, pelas duas maiores tendências urbanísticas 
norte-americanas, o “new urbanism” e o “smart-growth” –, o design tende a se fortalecer 
nas escolas de planejamento (Forsyth 2004). Uma das características mais marcantes do 
departamento em que trabalho na Cal Poly é que sempre se deu importância ao desenho 
urbano, algo que nos tornou um programa bem marcante na Califórnia e nos Estados 
Unidos.
projetos acadêmicos reais e o trabalho na Cal poly
Pedagogias de ensino de projeto que tentam simular o “mundo real” ou “problemas re-
ais” são comuns e, em geral, aquelas indicadaspara a prática de ateliê, cuja cultura tenta 
corresponder à prática profissional. Para muitos educadores, não há substituto para a 
experiência adquirida no “aprender fazendo” do ateliê, nos quais é comum convidar 
representantes da realidade com que o aluno está lidando para palestras ou avaliação 
dos trabalhos. 
Obviamente, há críticas a essas pedagogias, das quais mais comum sugere que esse 
modelo reproduz as condições do mercado de maneira acrítica e limita a capacidade 
criadora e o pleno desenvolvimento do estudante. Criticam-se também os modelos de 
ateliê que levam os alunos a adotar processos de inspiração artística – com ênfase na 
2 Dados disponíveis na página da Association of Collegiate Schools of Planning: www.acsp.org. 
Acesso em 20 de agosto de 2005.
74 o LUGAr Do proJeto
criatividade livre e na imaginação – ou modelos tipológicos e historicistas, mas que não 
permitem maiores aproximações às reais necessidades dos usuários. Por fim, há críticas, 
mais duras, à própria filosofia do ensino em arquitetura, entre as quais a de Dutton, 
que observa que a maioria dos docentes “entende o desenvolvimento da prática e da teoria 
da arquitetura como mais importante do que a prática e da teoria da educação” (1991: 
xvii). Nessa crítica, inserem-se alguns trabalhos do Projetar 2003, como o de Rheingantz 
(2003), que defende uma perspectiva sócio-interacionista, em que a ênfase é deslocada do 
produto para o processo e as interações sociais que se dão durante esse processo.
Por mais importantes que sejam essa questão e suas críticas, discuti-las foge aos meus 
objetivos presentes, razão pela qual remeto o leitor a um trabalho já publicado (Del Rio 
1998). Minha posição em relação ao ensino e às metodologias de projeto é conhecida. 
Aproxima-se da posição sócio-interacionista de Rheingantz (2003) e coincide com a de 
Sanoff (1977) em seu já clássico livro sobre métodos de programação: deve-se partir da 
premissa de que a compreensão das necessidades e dos comportamentos dos usuários é 
pré-requisito para toda ação projetual. Alguns teóricos vão mais longe e defendem que 
a criatividade tem a ver mais com a forma de aquisição do conhecimento e a própria 
identificação do problema a ser resolvido (Rapoport 1987; Peña & Marshall 2001). Eis 
o que Peña e Marshall, sócios da famosa firma HOK e autores do livro Problem seeking: 
an architectural primer, utilizado como base para o exame de ordem nos Estados Uni-
dos, dizem sobre o processo de projeto, em que se nota a importância da participação: 
Bons edifícios não acontecem simplesmente. Eles são planejados para serem bo-
nitos e funcionar bem, o que sé possível quando bons arquitetos e bons clientes 
juntam-se em um esforço deliberado e cooperativo. Programar as necessidades 
do edifício é a primeira tarefa do arquiteto, geralmente a mais importante (Peña 
& Marshall 2001: 12).
Para funcionar em contextos sociais reais e integrar a criatividade à responsabilidade 
social, a educação do arquiteto-urbanista deve introduzi-lo ao paradigma social e ao seu 
papel na sociedade, reunindo-se teoria e prática. Ao contrário de alguns críticos, como 
Lara (2003: 62), não defendo a mensuração quantitativa, como em muitos enfoques 
de avaliação pós-ocupação. Ao contrário, minha posição defendeu a inclusão de uma 
mensuração que incorpore a compreensão da dimensão qualitativa, segundo os usuá-
rios, bem como a operacionalização dessas informações no projeto. Devemos exercer 
nossa criatividade em campos em que ela é mais apropriada socialmente e pode ser 
socialmente produzida (Cuff 1991). É na confluência equilibrada dos paradigmas que 
a educação do arquiteto-urbanista deve se basear, uma educação que deve ser capaz de 
juntar os valores intrínsecos (internos ao estudante) aos extrínsecos (vindos de fatores 
ambientais, sociais, políticos e culturais da comunidade). Além disso, as universidades 
devem garantir que as pedagogias possibilitem aos estudantes inserir essas preocupações 
não apenas nos processos projetuais, como também em sua própria formação ético-pro-
fissional e no desempenho de sua função social.
Em relação ao projeto de arquitetura e urbanismo, o modelo pedagógico para res-
ponder a esses desafios é, indiscutivelmente, o do community design, para o qual há três 
possibilidades perfeitamente complementares: por meio da oferta de serviços comuni-
tários pela universidade, pelas pedagogias adotadas em sala de aula e por intermédio da 
75ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
pesquisa aplicada. A primeira possibilidade é representada pelos centros comunitários 
de pesquisa e projeto, que prestam assistência técnica a comunidades, independente-
mente dos currículos das escolas. Em geral, esses centros são semi-independentes; com 
o intuito de terem mais agilidade financeira e de trabalho, e garantirem a continuidade 
de trabalhos de mais longo prazo, os docentes complementam sua carga horária docente 
e os alunos se inserem como estagiários. A segunda possibilidade, indicada quando os 
alunos já possuem maturidade suficiente para o melhor desempenho possível – “quase 
profissional”, como se diz –, é inserir a prática do community design no próprio currículo 
e em disciplinas específicas de ateliê ou projeto. Tal possibilidade é adotada pelo City 
and Regional Planning Department (CRP), um dos cinco departamentos que formam 
o College of Architectural and Environmental Design (CAED), da Cal Poly State Uni-
versity San Luis Obispo.3 A Cal Poly é uma universidade de origem politécnica, cuja 
filosofia básica de “aprender fazendo” fomenta pedagogias apoiadas em “community 
outreach” (oferecer-se para a comunidade). Em outras palavras, a universidade incentiva 
o professor a se engajar na profissão e em trabalhos comunitários, por meio da univer-
sidade e com rebatimento direto no ensino.4
Criado em 1968, o CRP tem como missão formar profissionais planejadores que 
promovam a qualidade do lugar e das comunidades consoante um desenvolvimento 
sustentável e as necessidades públicas. Para o departamento, os planejadores devem 
possuir o conhecimento compreensivo e analítico para as decisões públicas sobre o de-
senvolvimento urbano, orientadas por um modelo racional adaptado da investigação 
científica (Hoch, 2000): a) definir as metas; b) identificar os problemas que evitam a 
realização dessas metas; c) identificar soluções alternativas para os problemas, de modo 
que tais metas sejam alcançadas; e d) comparar os méritos de cada alternativa como 
solução dos problemas. 
O ensino em ateliê, considerado o coração do programa, alia o aprender fazendo ao 
trabalho em situações reais, ou seja, engajado em comunidades. No âmbito do projeto, 
isso se chama de community design; no de planejamento, community planning. As pe-
dagogias adotadas seguem modelos participativos, por entenderem que eles preparam 
melhor o estudante para a realidade e para o trabalho em equipe em um ambiente 
multidisciplinar, valorizando-se contratos com entidades públicas e privadas, e a comu-
nidade em geral. Nos níveis mais avançados do ateliê, a partir do fim do segundo ano, 
os processos internos também são participativos: ao desenvolver um trabalho único com 
a turma, todas as informações são compartilhadas, os alunos assumem diferentes papéis 
de acordo com suas preferências ou “especializações”, e as decisões são atingidas por 
consenso, como veremos nos exemplos a seguir.
Nesses exemplos, também veremos que, assim como o roteiro de investigação 
científica mencionado acima, nossos ateliês adotam um modelo pedagógico que pos-
sui quatro fases: a) conscientização (a descoberta de novas realidades); b) percepção (a 
3 Ver as seguintes páginas na internet: http://www.caed.calpoly.edu/ e http://planning.calpoly.edu/.
4 As universidades públicas na Califórnia estão ligadas a dois sistemas distintos. O California 
State University, com 23 politécnicas e universidades, e o University of California, que con-
grega dez universidades ditas de pesquisae diversos centros médicos e avançados. A Cal Poly 
San Luis Obispo está ligada ao primeiro sistema.
76 o LUGAr Do proJeto
compreensão dessas realidades e a identificação de problemas); c) tomada de decisões 
(como enfrentar a situação); e d) implementação (desenvolvimento da solução esco-
lhida) (Salama 1995; Del Rio, 1998). Assim, quando se promove um enfoque ético e 
social no trabalho de ateliê, identificam-se necessidades humanas e sociais, e avalia-se o 
ambiente (construído e natural), no qual as intervenções são propostas e se envolvem 
as comunidades afetadas, à luz de um misto de “profissional que resolve o problema” e 
“profissional que facilita a resolução do problema”.
Nesse contexto ético e de objetivos pedagógicos claros, nossos ateliês mais avan-
çados procuram desenvolver planos e projetos comunitários em resposta a problemas 
reais “contratados” por agentes externos, possibilitando aos alunos o “aprender fazen-
do” engajado socialmente e próximo da realidade profissional. A seguir, são discutidas 
duas experiências recentes dessa forma de trabalho, uma na graduação e outra na pós-
graduação, que foram extremamente bem-sucedidas e se tornaram modelos em nosso 
programa.
Apoiando o desenvolvimento comunitário 
O primeiro exemplo do “aprender fazendo” e de pedagogia junto a comunidades ado-
tada em nosso departamento é o trabalho realizado durante dois trimestres letivos pelas 
disciplinas Community Planning Lab I & II, durante o quarto e último ano do programa 
de graduação.5 Já tendo cursado três ateliês de projetos urbanos, os alunos integram e 
solidificam os conhecimentos adquiridos para a escala de uma pequena cidade: no pri-
meiro trimestre, dedicam-se ao diagnóstico e à análise; no segundo, ao desenvolvimento 
de um plano diretor. 
Há alguns anos, a pedagogia adotada nesses ateliês se baseia no desenvolvimento de 
planos elaborados segundo um processo participativo que reproduz os contextos social e 
profissional, e em resposta a um contrato com órgão local de planejamento, o que geral-
mente se dá no âmbito do condado de San Luis Obispo.6 Nosso programa já é famoso 
por essas iniciativas, tomadas com seriedade pelas equipes de planejamento de prefeitu-
ras e condados, pois lhes provê estudos e idéias, cobrem a sua já crônica falta de pessoal 
disponível e possibilitam a identificação de expectativas legítimas da comunidade para 
direcionar ações e prioridades. Por outro lado, sendo o projeto acadêmico, os alunos 
encontram as comunidades mais dispostas a discutir temas delicados, que certamente 
seriam objeto de controvérsia e radicalismo em uma situação “real”. Os “clientes” sem-
pre demonstram boa vontade em participar e contribuir para o aprendizado dos alunos, 
além de compreenderem que, desse modo, também estão aprendendo sobre sua própria 
comunidade e debatendo o futuro.
5 Coordenados pela professora Zeljka Pavlovich Howard.
6 O território do condado é planejado e administrado de modo semelhante ao de um estado, 
sendo que as cidades, como San Luis Obispo, possuem suas próprias prefeituras e departa-
mentos de planejamento.
77ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
Trata-se, nesse exemplo, da realização do Plano Comunitário de San Miguel, realiza-
do no outono de 2003 e no inverno de 20047, após ter sido encomendado à disciplina 
pelo diretor de long term planning do condado de San Luis Obispo.8 San Miguel é um 
vilarejo com 1.500 habitantes, que serve como uma espécie de cidade-dormitório de 
Paso Robles, cuja população é de trinta mil habitantes. Fundada em 1797, a partir de 
uma das missões espanholas, cresceu com a exploração agrícola de uma base militar e 
de uma estação do trem já desativadas. A maior parte de sua população é humilde, de 
origem mexicana, e o único atrativo local é a própria missão, uma das mais autênticas 
da Califórnia, infelizmente interditada desde o terremoto de 2003. As moradias são 
predominantemente residências unifamiliares e as poucas lojas existentes se espalham 
ao longo de uma poeirenta rua paralela à linha férrea; prevalece o estilo eclético, embora 
diversos prédios sejam históricos. O trabalho dos alunos revelou que, em San Miguel, 
há um forte senso de comunidade, orgulho do caráter de pequeno povoado, estando 
a população determinada em participar das decisões sobre o desenvolvimento de seu 
vilarejo.
O trabalho teve diversas fases e contou com quatro sessões públicas, nas quais a 
comunidade participou ativamente: três workshops e uma apresentação final.9 Nos 
workshops, os alunos facilitaram as discussões, organizando os participantes em peque-
nos grupos e, depois, em assembléia, assim como sistematizaram os dados e resultados 
(Figura 1). A turma realizou diversas visitas a San Miguel, inclusive à noite e nos fins 
de semana, para ter acesso mais direto à comunidade. Como em todo trabalho “pro-
fissional” dessa natureza, surgiram líderes na turma, cada um com sua “especialidade”, 
incentivados pela professora. Dois deles se responsabilizaram pela editoração de em dois 
volumes (diagnóstico e proposição) um relatório final do plano, que excedeu o trimestre 
letivo e pelo qual receberam créditos extra.
7 O trimestre do outono (fall quarter) vai de meados de setembro a primeira semana de dezem-
bro, e o do inverno (winter quarter), dos primeiros dias de janeiro até o início de março.
8 Na Califórnia, os departamentos de planejamento, em geral, estão divididos em long term 
planning (planejamento de longo prazo, planos diretores, estudos etc.) e em short term plan-
ning (implementação, aprovação, atendimento ao público etc.).
9 A turma de quarto ano que realizou esse trabalho tinha 19 alunos.
Figura 1
Um dos workshops com a comunidade, durante 
o desenvolvimento do plano para san Miguel, 
em que alunos agem como facilitadores em 
pequenos grupos de trabalho.
78 o LUGAr Do proJeto
A primeira fase, iniciada no fim de setembro de 2003, teve as seguintes etapas: a) 
perfil da comunidade, condições existentes, estudos de caso; b) identificação de tendên-
cias, projeções estatísticas, estudos de mercado; c) workshop público na comunidade 
(diagnóstico, principais temas e problemas); d) elaboração do relatório de diagnóstico 
e análise. A segunda fase, iniciada em janeiro e finalizada em março de 2004, incluiu: 
a) estudo cognitivo e pesquisa de preferências ambientais; b) workshop público na Cal 
Poly com representantes da comunidade, urbanistas do condado, professores e estudan-
tes da graduação e pós-graduação (design charrette), no qual se estabeleceram quatro pla-
nos conceituais alternativos; c) refinamento e escolha de duas alternativas; d) workshop 
público em San Miguel para discutir e escolher um dos planos; e) desenvolvimento do 
plano final; f ) apresentação do mesmo em San Miguel (com pôsteres, resumos execu-
tivos, cópias do trabalho e Powerpoint), seguidos da publicação e da distribuição dos 
relatórios finais. 
Sem entrar em detalhes sobre o plano, basta dizer que ele seguiu três grandes linhas 
de planejamento: a) lidar com as enormes pressões para o desenvolvimento residencial 
que afetam o condado; b) capitalizar o desenvolvimento turístico centrado na missão e 
na indústria do vinho; e c) desenvolver uma comunidade sustentável e equilibrada. O 
plano desenvolve diversos tópicos, entre os quais: uso do solo, habitação, desenvolvimento 
econômico, desenho urbano, circulação, parques e áreas livres, ruído, segurança, preserva-
ção e serviços públicos As simulações comparativas entre o que existia e cenários futuros 
possíveis, segundo as propostas do plano, foram feitas em programas como Photoshop e 
SketchUp, e facilitaram a compreensão e a participação do público (Figuras 2 & 3).
Figuras 2 e 3
o mapa de zoneamento proposto no plano Comunitário de são Miguel, 
e imagens comparativas entre o que existia e o proposto em uma simulação em photoshop
79ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
O processo pedagógico para o desenvolvimento desse community planfoi valioso 
para os estudantes, capacitando-os por meio do aprendizado de procedimentos e técni-
cas de planejamento que simularam um ambiente profissional e um contrato real. Ape-
sar do pouco tempo dedicado a um trabalho desse porte (apenas seis meses), o resultado 
final foi muito satisfatório. Os alunos ganharam tanto o aprendizado quanto a satisfa-
ção de verem seu trabalho ter utilidade para a comunidade. Esta, por sua vez, obteve um 
plano que servirá de referência para a equipe de planejamento do condado, contratante 
do trabalho, durante o processo de refinamento do general plan de San Miguel, que, em 
breve, certamente terá o seu plano especifico oficial. Elogiado pela comunidade e pelas 
entidades profissionais, esse trabalho foi premiado pela American Planning Association 
(melhor trabalho da região, Central Coast Section; melhor trabalho do estado, California 
Chapter) em 2004, e pelo American Institute of Certified Planners (melhor trabalho 
acadêmico nos Estados Unidos) em 2005.
Ajudando a negociação entre atores sociais
Outro importante exemplo de trabalho comunitário em nosso departamento é o Plano 
Conceitual para a Área de Park Marina (Park Marina Area Concept Plan). Trata-se de 
um trabalho que, desde a proposta pedagógica inicial, engajou-se na resolução de um 
problema real, contribuiu para solucionar um impasse político e ainda tem rendido 
frutos junto à comunidade. 
Foi realizado durante o winter quarter (janeiro a março) de 2005 no âmbito da 
disciplina Project Planning Lab, ateliê de desenho urbano do segundo e último ano de 
nosso programa de pós-graduação. Importa esclarecer que se trata de um Programa de 
Mestrado Profissional em Planejamento Urbano e Regional, ou seja, os alunos são oriun-
dos das mais variadas áreas de graduação e poucos possuem alguma base ou experiência 
em urbanismo.10 Nesse ateliê, eles devem elaborar um plano específico11, utilizando os 
conhecimentos recebidos ao longo do curso, além dos parcos conhecimentos de desenho 
urbano, adquiridos na disciplina eletiva Principles of Urban Design, realizada no ano ante-
rior. Seguindo a filosofia de “aprender fazendo” da Cal Poly, sempre propomos um projeto 
“real”, sob contrato ou encomenda de um governo ou entidade comunitária local.
A área desse projeto fica em Redding, cidade de noventa mil habitantes e área metro-
politana de 170 mil km2, localizada a cerca de três horas de carro de Sacramento, capital 
10 Essa turma teve vinte alunos, dos quais 19 mestrandos sem qualquer experiência em urbanis-
mo e um aluno do último ano de graduação em planejamento urbano, que se inscreveu na 
disciplina atendendo a um pedido meu, em razão de seu domínio de programas de simulação 
em 3D (principalmente SketchUp e animação), já que constatara que nenhum dos inscritos 
possuía conhecimentos de projeto ou representação gráfica.
11 Plano específico (specific plan) se refere a um tipo de plano urbano formatado pelo Estado 
da Califórnia para uma área geográfica específica. Trata-se do nível de planejamento imedia-
tamente abaixo do general plan, o plano diretor. Definem-se objetivos, conceitos, padrões e 
regras urbanísticas a serem implementadas no longo prazo pelos setores público e privado. 
Ver, por exemplo, Fulton (1999).
80 o LUGAr Do proJeto
da Califórnia. Com aproximadamente 11 hectares e situada na margem oeste do rio Sa-
cramento, a área possui excelente acessibilidade por meio de auto-estradas estaduais. Está 
próxima ao centro da cidade e junto a uma área residencial unifamiliar, e a outra de co-
mércio e serviços, ambas com gabarito de um a três pavimentos. De propriedade da famí-
lia Kutras12, diversos trechos da área haviam sido arrendados e subarrendados, resultando 
em um conjunto não planejado de usos do solo e edificações esparsas, em que, apesar do 
grande potencial, prevalecem áreas livres ou subutilizadas, a má conservação e o abando-
no. Os Kutras ainda mantêm o controle direto de algumas parcelas e, em dez ou quinze 
anos, com o esgotamento dos prazos de arrendamento, retomarão as demais parcelas. 
O imbroglio político sobre a propriedade que gerou o convite para realizarmos o traba-
lho ocorreu entre os proprietários, o city manager13 e a McConnell Foundation, poderosa 
fundação local fundada com recursos de uma grande herança. Na verdade, a área já possuía 
um antigo plano modernista da prefeitura, mas jamais aprovado e de baixa qualidade, que 
não previa uso habitacional e dedicava grandes áreas para estacionamento. A Fundação, 
um dos principais arrendatários da área, contratara um arquiteto para realizar um projeto 
para toda a área, sem o conhecimento dos proprietários. Com o apoio do city manager, 
acusava os proprietários de “atrasar o progresso da cidade” e de não entender “o que era 
bom para Redding”. Evidentemente, os Kutra não gostaram disso, lutaram pelo direito de 
decidir ou participar do futuro de sua propriedade, e o impasse político se impôs.
Convencidos por arquiteto amigo14 de que a área necessitava de um plano global que 
garantisse a qualidade do desenvolvimento e, ao mesmo tempo, tanto os seus interesses 
quanto os da comunidade, os Kutras permitiram que um fosse feito um convite ao 
nosso College e ao departamento. Essa seria a maneira mais rápida, barata e eficiente de 
obter um plano conceitual “neutro” que contribuísse para o debate; um pontapé inicial 
em um processo de implementação que, certamente, ainda levará muitos anos. Após 
combinarmos um contrato verbal para o pagamento de todas as despesas relativas ao 
trabalho e um montante como doação ao departamento, engajamo-nos na empreitada 
em janeiro de 2005.15
O desenvolvimento do trabalho contou com o apoio de um escritório de arquitetura 
em San Luis Obispo associado ao arquiteto amigo dos Kutra, além de seu consultor 
para investimentos imobiliários.16 Eles nos acompanharam nas visitas à área, proferiram 
12 De procedência grega, a família Kutras estava representada pelo patriarca George Kutras e por 
seus filhos Demetra e Chris. 
13 O city manager, cargo existente em muitas cidades norte-americanas, é o administrador exe-
cutivo da cidade, contratado pela Câmara Municipal (City Council). Nessas cidades, o city 
mayor, ou prefeito, é apenas o presidente da câmara, e não possui função executiva.
14 Arquiteto Leslie Melburg, sócio da firma Nichols, Melburg & Rosetto, de Redding, na 
Califórnia.
15 Os custos incluíram as despesas com duas viagens a Redding (translado, hospedagem e ali-
mentação) para dois grupos de alunos, além de material de desenho, plotagens, impressões 
etc. A doação foi investida na publicação da revista anual do departamento, chamda Focus. 
Ver http://planning.calpoly.edu/ 
16 Richmod, Rea & Luker Architects – R2L, San Luis Obispo, representado pelos arquitetos 
Robert Richmond e Glenn Wood, e pelo consultor de negócios imobiliários J. C. Martin.
81ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
palestras para os alunos e participaram de avaliações do trabalho. Um dos arquitetos 
do grupo visitava com freqüência o nosso ateliê. Em termos de dinâmica de classe, os 
alunos se engajaram como se estivessem em uma típica colaboração profissional: líderes 
na turma assumiram papéis específicos nas diversas etapas do processo e tarefas foram 
distribuídas de acordo com as preferências e/ou backgrounds de cada aluno. 
O processo projetual começou com o diagnóstico completo da área e de seu contex-
to, das demandas de mercado e das percepções e expectativas da comunidade. A turma 
foi dividida em cinco grandes subgrupos, empenhados em temas de estudo diferentes. 
Como a área do projeto fica muito distante da escola (oito horas de carro), realizamos 
apenas uma visita de estudos. Pela mesma razão, não pudemos contar com a participa-
ção comunitária ao longo do processo de projeto, mas, como se verá a seguir, utilizamos 
um valioso instrumento para preencher essa lacuna. Nessa visita de estudos, realizada 
logo na primeira semana de aula (saímos em uma quinta-feirae voltamos no domingo), 
estiveram presentes, além de mim e de oito alunos representando os diversos temas a se-
rem estudados, dois arquitetos e o assessor imobiliário do escritório de San Luis Obispo. 
Nossa primeira reunião em Redding foi um jantar oferecido pelos Kutras, proprietários 
da área, que nos deixaram totalmente à vontade e garantiram que, apesar de seu interes-
ses evidentes, queriam que nosso trabalho buscasse o melhor para a comunidade.
Durante a visita, levantaram-se dados, fotografou-se muito, conversou-se com repre-
sentantes da prefeitura e da McConnell Foundation, obtiveram-se diversas informações da 
prefeitura e de órgãos locais, bem como mapas em GIS e Autocad, fotografias aéreas e pla-
nos locais existentes. Os alunos aplicaram um questionário-entrevista em diversos pontos 
da cidade, e 32 participantes comentaram suas percepções, expectativas e preferências em 
relação à área do projeto e às possibilidades futuras. Esse questionário também investigou 
o que chamamos de preferências visuais do respondente, ou seja, pedia-se que escolhessem 
fotos representativas de diferentes tipologias urbanísticas e arquitetônicas. A reunião que ti-
vemos com repórteres e o editor do Record SearchLight, maior jornal de Redding, mostrou-
se fundamental, pois nela obtivemos apoio total para desenvolvermos nosso trabalho.
De volta ao ateliê e tendo como base o estudo-piloto, os alunos desenvolveram um 
questionário mais completo para ser aplicado on line, no qual foram incluídas perguntas 
e fotos para compreendermos as reações dos moradores a diferentes usos e tipologias no 
local.17 A nosso pedido, o Record Searchlight publicou, em edição dominical, um artigo 
nosso sobre a revitalização de áreas ribeirinhas e a importância da área do projeto, em 
que convidamos os leitores a participar de nosso trabalho, respondendo ao questionário 
on line.18 O sucesso dessa iniciativa superou nossas expectativas, pois em apenas dez 
dias 864 pessoas responderam àao questionário, das quais 739 responderam à pergun-
ta aberta “Se a área junto ao rio fosse desenvolvida, o que você gostaria de ver lá?”. 
As respostas obtidas foram objeto de criteriosa análise de conteúdo realizada pelos alu-
nos. Além disso, recebemos e-mails, telefonemas e uma carta bastante detalhada de um 
17 O questionário on line foi desenvolvido por meio dos serviços disponíveis no site www.
monkeysurvey.com, que oferece um modelo básico, hospeda o questionário final, recebe as 
respostas e disponibiliza os dados e algumas tabulações. O programa utilizado impedia que o 
mesmo computador respondesse ao questionário mais de uma vez.
18 Artigo “Seeking redding’s future on the riverfront”, de minha autoria com o aluno Sean Nicholas.
82 o LUGAr Do proJeto
dos membros da comunidade. O total de respondentes, apesar de se tratar de trabalho 
acadêmico, foi muito superior à grande maioria de trabalhos urbanísticos dessa natu-
reza, tendo revelado o grande interesse da população e o potencial da área. No mês 
seguinte, com base em release elaborado pelos alunos, o Record Searchlight publicou 
nova matéria sobre o trabalho, comentando o resultado do questionário. Esse canal de 
participação (jornal e sítio na internet) e o instrumento de medida se mostraram extre-
mamente eficientes e indicativos de uma verdadeira participação comunitária.
As informações obtidas nas respostas fornecidas pelos questionários nos permitiram 
uma compreensão bastante aprofundada da área, de seu potencial, bem como a monta-
gem de programa urbanístico preliminar (metas, objetivos e diretrizes projetuais) e do 
partido do projeto. Com efeito, diversas idéias e elementos projetuais foram retirados 
diretamente das respostas ao questionário. Para o desenvolvimento da proposta, a tur-
ma foi novamente subdividida em três subáreas geográficas da propriedade, e diversas 
temáticas urbanísticas (circulação, uso do solo, ambiente natural etc) em subgrupos ou 
individualmente. A turma finalizou o trimestre letivo com um relatório em CD-ROM, 
intitulado Park Marina Area Concept Plan, contendo todas as fases do trabalho, os dese-
nhos e plantas, além da apresentação final em Powerpoint. 19 
19 Diversos elementos deste trabalho estão disponíveis no site do departamento: http://plan-
ning.calpoly.edu.
Figura 4 – o plano conceitual para a área de park Marina
83ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
Novamente sem entrar em detalhes sobre o projeto urbanístico final, basta dizer que 
a intenção do Park Marina Area Concept Plan foi revitalizar a área ribeirinha e criar um 
lugar único que fosse um novo destino tanto para os moradores quanto para os visitan-
tes de Redding (Figuras 4 e 5). A sustentabilidade, a identidade e a interação social são 
promovidas por um conjunto integrado de usos de lazer, recreativos, culturais, residen-
ciais e comerciais. As áreas livres (que totalizaram mais de 60% da proposta), a mistura 
de atrativos e a qualidade do projeto garantem que a área seja um atrativo único, um 
ponto de encontro e de atividades que tende a integrar o rio à vida urbana e a revitalizar 
esse trecho da cidade.
No final do trimestre, o trabalho foi apresentado (em painéis impressos, relatórios 
e Powerpoint) para uma seleta audiência composta por membro da família proprietária, 
seu arquiteto e associados, o dean do College e o chefe de departamento. Os alunos 
foram extremamente elogiados pela qualidade do projeto e pelo profissionalismo da 
apresentação, tendo sido iniciado logo depois o planejamento para apresentá-lo à co-
munidade em Redding. No dia 27 de abril, uma quarta-feira, o Record Searchlight publi-
cou, com base no sumário executivo do projeto, matéria extremamente positiva sobre a 
proposta, incluindo duas perspectivas CAD a cores, em que se convocava a comunidade 
para a apresentação do projeto, a ser realizada no sábado seguinte (Figura 6). No dia 30 
de abril, um grupo de alunos, acompanhados por mim e pelo grupo de arquitetos, reali-
zou a apresentação pública no auditório da câmara em Redding, na qual estiveram pre-
sentes a família Kutra, proprietária do terreno, jornalistas e aproximadamente oitenta 
membros da comunidade (Figura 7). Cópias do sumário executivo foram distribuídas, 
assim como exemplares em CD-ROM do relatório completo, plantas, perspectivas e a 
apresentação em Powerpoint. A proposta foi extremamente bem recebida, com diversos 
comentários elogiosos acerca dos conceitos, da qualidade do projeto e da interpretação 
das vontades da comunidade. A cobertura da TV local foi muito positiva, assim como 
as matérias no jornal no dia seguinte. 
Nosso projeto rendeu importantes frutos políticos para a família Kutras, uma vez 
que o destino de sua propriedade abriu-se à participação da comunidade, demonstran-
do-se que não se tratava de um empreendimento imobiliário com fins especulativos. O 
apoio ao trabalho foi tão grande que, nos meses que se seguiram à apresentação, a câma-
ra indicou um comitê de sete membros – representantes comunitários e moradores da 
Figura 5 – Uma das imagens da maquete eletrônica em sketchUp.
84 o LUGAr Do proJeto
área – para superar o impasse político até então existente e dar continuidade à discussão 
e às propostas abertas pelo nosso projeto. O comitê tem se reunido com representantes 
das partes envolvidas em seções públicas, nas quais nosso projeto tem sido debatido. 
A opinião pública e os articulistas do jornal Record Searchlight apóiam os conceitos e o 
partido da proposta, que os proprietários insistem em declarar que desejam concretizar. 
Para tanto, deverão ser contratados os arquitetos envolvidos no processo, além de equi-
pes complementares e um estudo de mercado detalhado, acerca do qual investidores 
privados têm sido procurados. 
É evidente que os alunos aprenderam muito com esse projeto no nível técnico e 
também no âmbito político, e estão absolutamente radiantes com a repercussão de seu 
trabalho. O departamento e o college ficaram igualmente satisfeitos comos resultados 
pedagógicos, o marketing obtido e as implicações do trabalho junto ao mercado pro-
fissional, uma vez que acabou se desdobrando em contratos para os arquitetos envolvi-
dos. Ademais, o projeto foi premiado em 2006pela seção local do American Planning 
Association.
Comentários finais
Cabe, agora, tentar costurar um pouco o que foi apresentado acima, bem como as ques-
tões e desdobramentos dele decorrentes. Parto da premissa, como já demonstrado pelo 
meu discurso, que o tipo de pedagogia de ateliê adotada na Cal Poly, voltada para traba-
lhos reais de community design e community planning, são os mais indicados a partir do 
momento que os alunos já atingiram certo nível de maturidade. Nossa prática de ateliê 
aplica, em parte, o que Paulo Freire afirma: “ensinar não é transferir conhecimento, mas 
Figuras 6 e 7
Matéria do jornal sobre a proposta dos alunos, 
convocando a comunidade para a apresentação 
pública e foto dessa apresentação.
85ConsIDerAções soBre A UnIVersIDADe e o seU pApeL soCIAL
criar oportunidades para a sua produção ou a sua construção” (citado por Rheingantz 
2003: 109). De um lado, porque existem objetivos pedagógicos que encontram no 
ateliê o melhor contexto para o aprendizado aplicado, entre os quais a representação e a 
apresentação (gráfica, oral, e escrita), métodos de pesquisa, programas computacionais, 
métodos de programação, entre tantos outros saberes que dependem do professor que 
detém e divulga o conhecimento. De outro, porque, ao adotar situações reais e projetos 
participativos criam-se oportunidades para a construção do conhecimento, inserindo-se 
os alunos em um aprendizado interativo em que uns aprendem com outros, ao mesmo 
tempo em que todos eles aprendem com a comunidade, e vice-versa.
Evidentemente, nem tudo são rosas e é possível apontar diversas questões que me-
recem reflexão: a) dependência de fatores externos de difícil controle, mas que influem 
no processo e no produto (o “cliente”, o problema contratado, a localização, o perfil 
da comunidade etc.); b) desenvolvimento do trabalho limitado ao período escolar e ao 
tempo disponível do aluno; c) pouco tempo para aprofundamentos (investigação e de-
talhamento projetual); d) acesso restrito a fontes de informação e a recursos; e) limitada 
capacidade gerencial dos alunos; f ) dependência da qualidade / conhecimento da turma 
e do surgimento de líderes de turma capazes; g) mascaramento da mediocridade e da 
timidez por trás do trabalho em equipe e da ação dos líderes; e h) a simulação sempre 
necessariamente imperfeita no que se refere às suas implicações e aos desdobramentos 
políticos, que são muito diferentes na vida real.
Alguns destes pontos negativos podem ser perfeitamente superados, entre os quais 
o tempo disponível nos projetos “contratados” por intermédio da conscientização dos 
“contratantes” de que se trata de trabalho curricular e não profissional. Outros, como 
a questão do gerenciamento e da dinâmica interna dos grupos de alunos, devem ser 
enfrentados com a intervenção do docente. Vejamos, então, alguns dos muitos pontos 
positivos do nosso modelo de ateliê: a) contribui para a realização do papel social da uni-
versidade; b) promove a integração entre alunos e profissionais externos à universidade, 
principalmente no levantamento de dados e na participação deles nas diversas etapas dos 
trabalhos, mas também em workshops com a comunidade organizados pelos alunos; c) 
favorece a compreensão de dinâmicas sociais e políticas e dos sistemas de planejamento 
institucional; d) gera trabalhos que serão efetivamente úteis para as comunidades, tanto 
em nível sociopolítico (educação ambiental e cívica) quanto em nível técnico (discussão 
de cenários possíveis); e) alarga a compreensão de processos, métodos e instrumentos 
participativos; f ) aumenta a conscientização das implicações políticas, culturais e sociais 
do trabalho do urbanista, e também da ética profissional; g) beneficia a integração dos 
conhecimentos adquiridos ao longo do curso; h) desperta o interesse do aluno e consoli-
da o aprendizado; i) viabiliza o envolvimento de estudantes de vários níveis curriculares, 
com diferentes responsabilidades ou papéis, assim como de outras disciplinas em um tra-
balho interdisciplinar; j) cumpre o duplo papel de educar sobre o ambiente e os processos 
públicos de controle de desenvolvimento, e esclarecer o papel do profissional; l) possui 
desdobramentos dinâmicos no mercado profissional e gera possibilidades de inserção dos 
estudantes; m) é fonte de recursos (pequena mas importante) para a escola e para cobrir 
os gastos do aluno; e n) dá visibilidade ao programa e a seus alunos. 
Acredito, portanto, que tenham sido apresentadas evidências suficientes de que os 
produtos finais e as implicações positivas do modelo do “aprender fazendo” por meio 
86 o LUGAr Do proJeto
do community planning & design e de processos participativos com as comunidades 
envolvidas excedem em muito os pontos negativos. Acima de tudo, o modelo permite 
uma educação como aquela defendida por Feigenberg (2001), cujo foco deixa de ser 
a retenção de fatos e fórmulas pelo estudante, para fazê-lo pensar criticamente, ensi-
nando-o a aprender, sempre inserido em seu contexto social e político, e voltado para 
produtos socialmente conseqüentes. Parece-me fundamental implementar modelos se-
melhantes no Brasil, onde as escolas de arquitetura e urbanismo devem se tornar muito 
mais conscientes de seu papel social e da grande necessidade de contribuírem para o 
desenvolvimento social, cultural e político das comunidades.
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PARTE I I
e n s i n o
91
TRês dIscuRsos sobRE ARquITETuRA, o PRojETo E sEu EnsIno 
Hélio novak 
Há algum tempo, encontrei na rua um colega de turma que não via desde a formatura. 
Era angustiado na faculdade, há muitos anos, e, velho, continua o mesmo. Antes até de 
me dizer “alô”, perguntou, como se estivéssemos continuando uma conversa interrom-
pida ontem, que importância eu dava, nos projetos, às questões de custos e mercado. 
Acho que respondi sempre ter sabido dar a César o que é de César, mas fiquei com a 
dúvida de como explicar a um aluno que na vida real os condicionantes econômicos são 
fundamentais para o projeto, mas na Academia eles são muitas vezes irrelevantes? 
Este trabalho, de certo modo, tenta resolver esse problema, mas meu principal objeti-
vo é apresentar um livro notável (Hubbard Jr., 1995) ao público profissional brasileiro ou, 
ao menos, divulgar a teoria para a prática nele desenvolvida. De acordo com ela, há três 
modos distintos de ver os edifícios. O primeiro é vê-los como o produto de um projeto 
de arquitetura ou urbanismo que exemplifica a ordem1 que tais projetos podem impor ao 
mundo sensorial. O segundo, como algo capaz de produzir resultados no nosso cotidiano. 
E o terceiro, como um modo de corporificar valores pessoais ou comunitários.
A seguir, serão discutidas as conseqüências, para a prática do projeto, dessas três 
formas de ver o edifício, que constituem, segundo Hubbard, discursos ao seu respeito. 
Depois, analisado como os arquitetos conseguem fazer as três abordagens trabalharem 
juntas para produzir um projeto que preencha a visão de cada abordagem sobre ele. 
À guisa de conclusão, chega-se à Academia para refletir sobre o ensino do projeto à luz 
desse modo de compreendê-lo.
Arquitetura e ordem: como pensam os arquitetos
Trata-se de uma tentação humana cada indivíduo considerar a sua experiência pessoal 
universalmente válida. Ao pensar que se os seus conhecimentos e valores pudessem 
ser repassados aos demais, o mundo seria um lugar melhor, os profissionais são dupla-
mente ludibriados por essa impressão. Como nosso encargo de arquitetos é justamente 
1 Como se verá, o conceito é usado aqui no sentido discutido por Marques e Loureiro (2003: 
36–ss).
92 o LuGAR do PRojETo
projetar “lugares melhores”, somos tentados tanto pela oportunidade quanto pela cren-
ça. Na mesma direção, se todos os estudantes tendem a achar que aprendem na facul-
dade como o mundo funciona, nossa formação como arquitetos nos leva a crer que 
estamos aparelhados para diagnosticar a própria condição humana. 
Pensamos isso por uma de três razões. Típica dos mais velhos, a primeira é a luta mo-
dernista pelo racionalismo, tal qual contam Pevsner (1993) e Giedion (1994), ao mostrar 
como as idéias oitocentistas de William Morris foram conduzidas no tempo pelas de Louis 
Sullivan e Frank Lloyd Wright, até as da Bauhaus e de Le Corbusier. De modo resumido, 
uma vez que os padrões tradicionais de viver e construir já não correspondessem às neces-
sidades humanas, o modernismo sugeriu modos “modernos” de satisfazê-las. Era essa, no 
meu tempo de aluno, a base da crença de que o projeto tinha a capacidade de diagnosticar a 
condição humana. Por volta de 1970, a “queda” do modernismo muda tal base para a tradi-
ção, mas mantém a crença. A partir de então, é a tradição que deve revelar a nossa condição, 
para seguir não os hábitos tradicionais, e sim sua essência, ou seja, os padrões, encerrados 
por estes, de como viver e projetar. A terceira base da nossa crença, adotada como reação ao 
modernismo, é a desconstrução, uma teoria mais sofisticada do que a outra e que busca em 
Lacan, Baudrillard, Foucault e Derrida a crítica que revela o próprio significado como coisa 
construída pelo poder. Além de mostrar como o poder nos controla continuamente pelo 
exercício aberto de sua influência, ou pelo processo insidioso de determinar como as pessoas 
devem compreender o mundo, a teoria nos habilita a pôr o projeto por trás de suas alavan-
cas, com o intuito de descobrir os padrões que ainda não influenciou e que, se estivessem 
visíveis para as pessoas, seriam eleitos por essas para reformar suas vidas. 
Nós arquitetos sabemos também, por experiência própria, que as coisas projetadas 
emocionam. Epifanias projetuais nos mostraram a visão de serena harmonia que pode 
ocorrer quando a vida e o ambiente são animados por idéias de projeto, bem como des-
cobrimos, durante a faculdade, que esse deleite pode ser engendrado por coisas criadas 
por nós. Além disso, a comunidade em que nos educamos dividia e validava o nosso 
sentimento pela vida e pelos objetos planejados, experiência que continuou quando 
fomos trabalhar em escritórios onde todos compartilhavam conosco a visão do bem que 
o projeto pode trazer ao mundo.
Em face disso, como resistir à crença de que detemos algo importante e profunda-
mente bom para todos? Não podemos, é claro. Nas palavras do engenheiro Felipe dos 
Santos Reis, grande mestre de resistência dos materiais e de arquitetura, as concepções 
projetuais são corretas quando, guiadas pela ética, respeitam a estática e produzem re-
sultados de importância estética. É esse o nosso discurso de arquitetos, que pode ser 
resumido e batizado como discurso do projeto. Era esse discurso que embasava a velha 
angústia do meu colega de turma: pensar em custos e mercado é atraiçoar aquele que 
deve ser o nosso discurso verdadeiro: fazer o melhor projeto, em que melhor era algo 
abstrato que ele não sabia definir direito.
ordem x resultados
Ainda que a idéia de bom projeto deva incluir a de produzir resultados, de funcionar, meu 
colega sempre achou periféricos os serviços do arquiteto que os interesses usuais pensam 
93TRês dIscuRsos sobRE ARquITETuRA, o PRojETo E sEu EnsIno
úteis. E os que lhe parecem centrais – ordenação do espaço e idéias de vida – não têm 
vantagem comercial mensurável. Como todos os trunfos pertencem ao comércio e são 
seus os valores que determinam o que é legítimo, os argumentos puramente arquite-
tônicos não têm força, e isso o angustia. Imaginemos, porém, que, em uma reunião 
de projeto, um cliente diga: “Não devemos fazer a coisa x porque aumentará o custo 
operacional em dez por cento”. Como o arquiteto pode contra-argumentar que, “se a 
coisa x não for feita, a distribuição regular da grelha de colunas será interrompida!”? 
A inadmissibilidade do segundo argumento nesse contexto é óbvia.
Não que o argumento da grelha de colunas seja inválido. Ele apenas não tem impor-
tância ou cabimento em tal contexto. Em outro contexto, uma escola de arquitetura, 
por exemplo, o argumento do lucro perderia força e as considerações de regularidade ga-
nhariam importância. O problema é que, quando os clientes e o empreiteiro examinam 
alternativas, sempre podem calibrá-las pela previsão das suas conseqüências monetárias. 
Já os arquitetos só podem julgar suas alternativas em uma escala de consistência arqui-
tetônica – por exemplo, quão bem um determinado projeto combina com o conceito 
desenvolvido para ele. 
A razão por que os valores de projeto parecem estar, tão freqüentemente, na pior extre-
midade de uma hierarquiade poder é a grande quantidade de contextos em que as conside-
rações comerciais são absolutas. Nesses contextos, os valores de projeto, que, em si mesmos, 
valem tanto quanto os do comércio, tornam-se marginais diante do poder superior que é 
associado aos valores comerciais. Em relação a si mesmos, porém, os dois tipos de valor são 
apenas disjuntos. A posição superior dos últimos em uma escala de poder hierárquico é uma 
circunstância contingente. Se entendermos isso e descontarmos esse poder hierárquico, po-
deremos imaginar como envolver os valores de projeto com os dos negócios. 
Veremos, então, que o terreno comum entre as duas estruturas de valores – a única 
razão pela qual elas estão em contato – é o edifício em questão. Se uma falar com a 
outra, falarão sobre o tal edifício, sendo a razão pela qual tal diálogo eventualmente não 
ocorre o fato de cada qual falar do edifício sob uma visão própria. Se não, vejamos.
Mesmo um cliente individual tende a enxergar a sua futura casa, ao menos em parte, 
como uma mercadoria que lhe deve garantir liquidez (e lucro), se precisar ser vendida. 
Um outro cliente, comercial, vê em um edifício um meio de gerar renda por meio de 
aluguéis ou uma parte integrante do mecanismo econômico que usa para criar e vender 
produtos ou serviços. Já um empreiteiro verá no edifício, primariamente, o meio mo-
mentâneo de conduzir o negócio de sua escolha, ou seja, um meio de manter sua equipe 
lucrativamente ocupada. 
Todos eles vêem o edifício como algo a ser usado para atingir um propósito diferente 
de trazer o edifício à existência. Para todos, o edifício é um realizador de resultados. Por 
contraste, e como já indicado, os arquitetos vêem o edifício como um meio pelo qual 
idéias podem ser apreendidas segundo paradigmas de ordem arquitetônica. Assim, vêem 
o edifício e falam a seu respeito como um indicador de ordem. Uma vez que cada parte 
emoldura o seu pensamento em coisas originadas de acordo com sua concepção dos 
usos do edifício, advogará alternativas de ganho em uma medida típica de seu próprio 
sistema de valores. Assim, chamaremos cada uma dessas falas advocatícias de discurso.
O discurso sobre resultados pretende ser mais racional do que os outros. Quando, 
porém, levamos adiante a análise e percebemos que a abordagem pode ser representada 
94 o LuGAR do PRojETo
pela idéia de mercado, essa racionalidade talvez fique menos óbvia. É que a pergunta 
“isto funciona?” (resultados) pode perfeitamente ser trocada por “isto vende?” (merca-
do), sem qualquer prejuízo para o significado, pois a idéia de “função” ou “funciona-
mento” só tem sentido em um contexto que interessa a alguém. Hubbard exemplifica 
essa passagem com o exemplo de Henry Ford, que, em 1909, anunciou o modelo T 
como um carro para a multidão, “tão simples e barato que qualquer operário de sua 
fábrica poderia possuir”. Cumpriu a promessa e, em 1923, cerca de metade dos auto-
móveis eram produzidos por ele. Apenas três anos depois, no entanto, um revendedor 
reclamava que dos cinco carros que via de sua janela quatro eram de outras marcas, e o 
único Ford estava para ser trocado (Hubbard, 1995: 57). Essa mudança ocorreu porque 
as mesmas pessoas que desejaram o modelo T queriam variar. Antes, viam-se no plano 
da subsistência, e um carro preto, igual a milhões de outros e sem qualquer novidade, 
era ótimo, ou seja, quando não se tem o bastante, este é satisfatório. Alcançado o bas-
tante, passa-se a querer o diferente. Por isso, quando Ford resolveu responder ao desafio 
do mercado, passando a usar estilizações “irracionais” e mesmo cores em seus carros, já 
havia sido derrotado...
Algo parecido aconteceu com o modernismo na arquitetura. O mercado também 
respondeu positivamente à pretensa racionalidade da arquitetura modernista, mas par-
tiu em outra direção, quando outras qualidades fizeram do modernismo algo superado. 
Usou-se a racionalidade enquanto esta vendia; no momento em que o argumento de 
venda se tornou outro, foi esse outro que o mercado passou a usar.
Vimos, então, que o mercado representa a busca de resultados e como a ordem se 
coloca diante disso. Pensemos, agora, na terceira maneira de ver o edifício e no discurso 
que é gerado por ela. 
Valores x ordem
Como arquitetos, nosso universo íntimo de desejos e valores precisa estar em sintonia 
com o exterior, ou seja, com o público que usará o objeto arquitetônico projetado por 
nós ou que apenas o terá como algum tipo de referência. Necessitamos dos usuários, 
portanto, como uma base a partir da qual projetar, e essa é a maior relevância da nossa 
relação com o mercado. Simultaneamente, precisamos engendrar uma relação de con-
fiança das demais pessoas com o projeto, impedindo que se ressintam por terem sido 
excluídas dele.
São falhas na construção da confiança que mais freqüentemente ocasionam co-
mentários negativos. É claro que um projeto pode não ser tão bom quanto pensa o 
seu autor, e nesse caso será necessária alguma verificação crítica de suas percepções. 
Freqüentemente, contudo, caracterizações sarcásticas como ”o edifício parece uma 
prisão, um prostíbulo ou uma colisão de veículos” são uma forma indireta de nos 
dizer de maneira direta: “Eu não entendo por que é essa a aparência”. A razão, claro, 
é o fato de ser essa versão do paradigma de ordem que orquestra todos os paradigmas 
menores extraídos do que o arquiteto pensa que o projeto deva ser. Se o seu trabalho 
de programação esteve aberto àquilo que os demais interessados tinham a dizer a 
respeito, e se tentou incorporar essas preocupações ao projeto, terá criado uma base 
95TRês dIscuRsos sobRE ARquITETuRA, o PRojETo E sEu EnsIno
para todos compreenderem por que o edifício é como é. O seu pensamento pode ser 
até rejeitado (e, nesse caso, talvez decida trabalhar mais), mas ninguém dirá que não 
entende onde ele quis chegar.
Houve um tempo em que as preocupações do público a respeito de um projeto e sua 
reação a ele não eram ouvidas, mas não é mais assim. Hoje, o mundo em que os arqui-
tetos trabalham é organizado e licenciado por governos, órgãos de controle e mesmo o 
projeto da menor das casas de cachorro se defronta com grupos de interesse desejosos e 
capacitados para dizer o que têm em mente.
Quase todos nós lembramos de uma reunião inventada no inferno, mas ocorrida em 
um órgão licenciador ou na casa de nosso cliente, em que alguém importuno, sem nada 
melhor para fazer, queria simplesmente atrapalhar a nossa vida. Embora não possamos 
ignorar tais pessoas na vida real, fingiremos aqui que elas não existem, a fim de focar 
apenas aqueles que têm interesse sincero no projeto em pauta. Estes têm idéias sobre 
o que se pensou e discutem os materiais de construção, a altura, o lixo, o barulho que 
será gerado ou “a multidão que atrairá”. Segundo Hubbard, eles falam do edifício como 
um incorporador de valores. Todos os que têm interesse legítimo no projeto desse edifício 
querem ter seus valores reconhecidos e incorporados porque, ao contrário do arquiteto, 
é assim que eles acham que o edifício deva ser: estão pensando e falando do edifício em 
um discurso de valores.2 
Se o discurso sobre resultados pode ser resumido no mercado, aquele que se refere a 
valores pode ser, similarmente, resumido pela idéia de comunidade. Sendo um conceito 
universal, seu discurso deve ser dirigido pela nossa crença de que, mesmo quando não 
o somos, deveríamos ser uma comunidade (: 85). Isso tem como conseqüência o fato de 
que, se nos dispusermos a viver com o que diz o discurso da comunidade, estaremos 
qualificados a ter um lugar na discussão. Em compensação, o “produto” apropriado 
desse discurso será aquele que reunir o consenso de todos os que participam dele.
Quando o discurso da ordem e o dos resultados se confundem, a primeira fica dis-
torcida, dada a primazia hierárquica dos últimos. Em contrapartida, os valores tendem 
a se distorcer, quando examinados em termos da ordem. Quando os discursos se mis-
turam, ou quando são aplicados em contextosinadequados, ocorre um jogo do tipo 
“papel-tesoura-pedra”, em que a pedra quebra a tesoura, a tesoura corta o papel e o 
papel cobre a pedra. Na arquitetura, esse jogo de trunfos se dá toda vez que os discursos 
atravessam as fronteiras de suas diferentes perspectivas. Nesse caso, “resultados” trunfam 
sobre a “ordem” em decorrência seu poder. Em compensação, por sua própria ordena-
ção, a “ordem” parece, às vezes, trunfar sobre os confusos e mal resolvidos “valores” de 
um cliente coletivo. Na prática, todavia, podemos ver que, quando os interesses de um 
discurso são trunfados por outro, todos perdem um pouco. Apenas quando se mantêm 
todos separados, isto é, quando se dá a cada um deles o que lhe é devido e se opera sob 
essas regras, todos os interesses podem sair ganhando. 
2 É óbvio que tanto o mercado quanto a ordem também representam valores. Nas referências 
ao discurso sobre valores feitas aqui, deve-se sempre entender o “discurso sobre valores outros 
que não o mercado e a ordem”.
96 o LuGAR do PRojETo
juntando os discursos para produzir um projeto
Nem sempre esses três discursos separados foram necessários à arquitetura. Antigamen-
te, havia convergência total de pontos de vista ou um desses discursos era absolutamente 
dominante. Alberti exemplifica isso, ao “prescrever” o projeto valendo-se de uma crença 
absoluta no telos, a natureza essencial daquilo que pessoas ou coisas aspiram a ser. Para 
Alberti, o telos de uma construção unia inseparavelmente as três visões dos nossos dias. 
A mudança que isolou cada um desses discursos ocorre depois e começa a ficar clara no 
início da Revolução Industrial. Na transição, projetar exemplificando a ordem social 
ainda parecia mais adequado do que visando à obtenção de resultados Assim, a planta 
das Salinas de Chaux, obra-prima de 1778, feita por Charles-Nicholas Ledoux, visa 
reproduzir não o diagrama do processo produtivo, como se faria hoje, e sim as relações 
sociais no lugar de trabalho.
Figura 1 
Esquema de implantação das salinas Reais em chaux.
97TRês dIscuRsos sobRE ARquITETuRA, o PRojETo E sEu EnsIno
Pouco depois a situação mudaria, como se vê na invenção do panóptico (1797). 
Em Chaux, o diretor ocupava uma construção imponente de situação central, mas dali 
não via praticamente nada do trabalho que chefiava. Usando a mesma geometria em 
uma “casa de trabalho para miseráveis”, Jeremy Bentham teve uma preocupação total-
mente diferente daquela de Ledoux. O chefe permanece na posição central, mas passa a 
ter controle visual absoluto sobre tudo o que se passa à sua volta.
Figura 2
o panóptico de jeremy bentham
Agora que temos três discursos para atender, como medir o sucesso na invenção de 
um arquiteto? Qual o critério adequado para medi-la? O da racionalidade na obtenção 
de resultados, que é o do mercado, o dos valores, corporificados na comunidade, ou 
ainda o da ordem, representada pelo projeto de forma absoluta?
Ao tentar resolver isso, Hubbard sugere um modelo em que o projeto é desenvolvido 
em três fases (1995: 85). A primeira, a do trabalho sintetizador, ocorre quando mercado 
98 o LuGAR do PRojETo
e comunidade formulam os encargos que o projeto terá de resolver, procurando padrões 
adequados nos demais discursos para casá-los com seus próprios paradigmas de ordem. 
A segunda, a do trabalho transacional, consiste em conversas entre o arquiteto, na con-
dição de representante do discurso do projeto, e os representantes dos demais discursos, 
que podem ser outras tantas personae do próprio arquiteto, com o intuito de negociar o 
desenvolvimento do projeto, do ponto de vista dos encargos recomendados. Ao fim, com 
o prédio pronto e ocupado durante algum tempo, ocorre o trabalho judicatório, em que 
os três discursos cotejam suas expectativas com o que projeto conseguiu de fato realizar. 
Em outras palavras, cada um dos três segmentos da “opinião pública” que representam os 
discursos em pauta é chamado a julgar o projeto. O mercado julga o funcionamento das 
coisas e se empreendedores e usuários estão satisfeitos. A comunidade, se o novo edifício 
parece com aquilo que a vizinhança conceberia, e também se os grupos antipoluição e os 
de defesa dos deficientes físicos, da moral e de todos os outros que possam achar que o 
edifício deveria respeitar suas respectivas agendas avançar foram atendidos. E, com base no 
discurso do projeto, críticos profissionais, jornalistas e pessoas comuns julgam se o edifício 
abriu novos caminhos para a arquitetura, se oferece uma nova interpretação para um rele-
vante tema de projeto ou se constitui um avanço significativo na obra do arquiteto...
É preciso observar que todos esses julgamentos são provisórios, pois, após uma acei-
tação inicial, o mercado pode resolver seguir para outro lado, bem como a comunidade 
e a crítica podem mudar seus critérios de julgamento. Além disso, as vozes, em geral, 
não são unânimes: enquanto algumas tendem ao sim, outras favorecem o não.
A verdade é que, em grande parte, a síntese, a transação e o julgamento ocorrem na 
cabeça do próprio arquiteto, e se é uma ficção útil pensar que recebeu encargos de três 
grupos representativos dos discursos, tais encargos lhe terão sido passados por simples 
representantes desses grupos; na hora H, os representados podem perfeitamente repudiar 
os representantes, ou seja, o arquiteto pode perceber que interpretou mal os encargos, o 
que dá no mesmo. De quem é a “culpa” pelas falhas? Não se trata aqui de um processo 
jurídico, em que se busca o culpado por algo, e sim de um outro tipo de responsabiliza-
ção. Não queremos saber “que dívida tem o arquiteto para com cada discurso?”, mas “o 
que ele precisa fazer para não continuar devendo?” A busca em questão é a de um fecha-
mento ético da abertura ocorrida quando os três discursos expuseram suas demandas. 
Em outras palavras, se cada discurso imaginou um edifício gerado por suas exigências, o 
projeto só poderá satisfazê-los, se o edifício projetado preencher essas expectativas.
À guisa de conclusão: como tratar este tema na Academia?
O método projetual, como encarado aqui, consiste em encontrar, em cada caso, padrões 
desejáveis de excelência nos discursos do mercado e da comunidade, e em casá-los com 
os padrões de excelência que as concepções de ordem do discurso do projeto elegem para 
ele. Parece complicado, mas talvez se torne mais inteligível, se pensarmos que o trabalho 
projetual tem duas naturezas. Uma é explícita e nela o conceito do projeto responde às de-
mandas do mercado e da comunidade, configurando uma forma que corresponda a seus 
desejos e prioridades. A outra, implícita ao Projeto, exige que o arquiteto alcance o ideal 
de excelência que postulou para si mesmo quando imaginou esse conceito. Os encargos 
99TRês dIscuRsos sobRE ARquITETuRA, o PRojETo E sEu EnsIno
do mercado são cumpridos trabalhando-se do todo para as partes; os da comunidade, tra-
balhando-se das partes para o todo; os do projeto, das duas maneiras ao mesmo tempo. 
No processo, os diferentes discursos sintetizam as suas metas, e o projeto os intercomuni-
ca, ao mesmo tempo que se realiza. Há, é claro, o risco de que esse processo se reproduza 
interminavelmente, o que só é impedido pela habilidade do arquiteto em interromper as 
interações para aterrissar em uma concepção total que se mostre satisfatória. 
Nesse ponto, meu angustiado colega de turma poderia argüir que essa é a aborda-
gem projetual da conformidade, oposta à idéia de que o projeto deve sempre resistir, 
criticamente, aos valores do mundo real. A prática dos arquitetos “da resistência” é e 
deve ser parte integrante da construção do que deve ser a excelência projetual na nossa 
imaginação. Trata-se, contudo, de uma prática que só pode operar onde, por condições 
especiais, os valores do mercado ou da comunidade estiverem suspensos, constituindo, 
na verdade, uma prática não “contra” o mundo, mas “tacitamente consentida” pelo 
mundo em decorrência de algo.
É isso o que ocorre no ensino do projeto.As escolas de arquitetura sempre usaram 
e precisam continuar usando o projeto para desenvolver concepções arquitetônicas crí-
ticas ou alternativas àquelas impostas pelo mundo. Tais propostas, no entanto, só são 
imagináveis porque um ou outro dos discursos transacionais foi suspenso. Assim, é 
exatamente pela ausência de transação que, na Academia, o projeto pode exibir, de ma-
neira clara, aquilo em que os arquitetos acreditam, já que mostra o que ocorre quando 
opera sem o constrangimento de outros valores. Só há problema quando o arquiteto – é 
o caso de meu ex-colega – começa a crer que os valores do projeto são superiores aos do 
mercado e da comunidade. Ao pensar assim, é natural que se recuse a transacionar com 
eles e resista a eles com todo o heroísmo que aparenta a superioridade moral.
O projeto, aliás, nem é mais o princípio e o fim de tudo. Seu término já não coinci-
de com a construção do edifício, pois o uso deste corresponde a uma outra fase da pro-
jetação (Elali & Pinheiro 2003: 133). De todo modo, como pais que precisam deixar 
os filhos livres quando amadurecem, os arquitetos devem liberar seus projetos quando 
estes se transformam em obras realizadas. Sendo a impermanência um aspecto da rea-
lidade atual, é provável que, em pouco tempo, os valores do mercado e da comunidade 
considerem essa obra superada. Nesse caso, se a parte de nós que consideramos oradora 
do projeto respeitar nossas outras personae do mercado e da comunidade, perceberemos 
que, sendo o mundo dinâmico, a realização dos três discursos na arquitetura ocorre 
não no projeto enquanto tal, e sim na fase da experiência vivida nos cenários que ele 
produziu. Quando esses cenários não atendem mais aos discursos, perdem significado e 
o edifício deixa de participar da vida. 
Para encerrar, é preciso lembrar que a prática projetual não se resume a sentar diante 
de uma prancheta ou de um computador para criar formas, como se as reuniões com os 
clientes, as audiências públicas, a publicidade, o lançamento de uma pedra fundamental 
e os demais aspectos requeridos para que o projeto chegue ao seu resultado fossem um 
aborrecimento sem fim (: 133). Ao contrário, essas coisas são parte integrante e neces-
sária do projeto; negá-las é olhar para o próprio umbigo, diminuindo a importância 
do mundo e também do próprio projeto, já que sua justificativa ética é a melhora da 
vida. Como concluem esses autores, é preciso ver que tudo isso é Arquitetura. As coisas 
devem ser dessa maneira e provavelmente o serão. No fim, tudo ficará bem. 
100 o LuGAR do PRojETo
Referências bibliográficas
ELALI, Gleice A. & PINHEIRO, José Q.
(2003) “Edificando espaços e enxergando comportamentos: por um ambiente arquitetônico cen-
trado na relação pessoa-ambiente”. Em: LARA, Fernando & MARQUES, Sonia (orgs) 
Desafios e conquistas da pesquisa e do ensino de projeto. Rio de Janeiro: Editora Virtual 
Científica. 
GIEDION, Siegfried
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HUBBARD Jr., Bill
(1995) A theory for practice: architecture in three discourses. Cambridge: The MIT Press.
MARQUES, Sonia & LOUREIRO, Cláudia
(2003) “Os conceitos de ordem e estrutura nas teorias modernistas”. Em: LARA, Fernando & 
MARQUES, Sonia (orgs) Desafios e conquistas da pesquisa e do ensino de projeto. Ob. cit.
PEVSNER, Nikolaus
(1993) Pioneers of modern design. New Haven: Yale University Press.
101
EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo: 
mITos E méTodos
Heliana comin Vargas
Introdução
A educação se define como o processo pelo qual a sociedade forma seus membros à sua 
imagem e em função de seus interesses (Pinto, 1982). Ao mediar as relações sociais e 
expressar doutrinas pedagógicas baseadas em alguma filosofia de vida, concepção de 
homem e sociedade, a educação não existe de forma única, bem como não ocorre em 
um único lugar (Palos & Mendes, 2001). A igreja, a escola, a rua, os shopping centers 
e o trabalho também são locais onde a educação acontece, constituindo-se em diversos 
meios educacionais.
Outro aspecto da educação é o seu caráter político, pois, no processo educacional, o 
indivíduo deve aprender a atuar no contexto social de forma crítica, com base nos co-
nhecimentos que recebe, adquirindo condições para transformar a realidade. A educa-
ção, portanto, é contraditória por natureza, implicando simultaneamente a conservação 
dos dados do saber adquirido e a criação, ou seja, a crítica, a negação e a substituição do 
saber existente. Se não fosse assim, anularia toda a possibilidade de criação do novo e do 
progresso da cultura (Pinto, 1982).
Segundo Scofidio:
a educação deve encorajar e sustentar a contradição. [...] Keirkegaard foi elo-
quentemente rude, quando escreveu: “retire o paradoxo de um pensador e você 
terá o professor”. Modelos paradigmáticos, essencialmente arquétipos, não são 
inquestionáveis. A ambivalência é fundamental para o espírito do pensamento; 
dá oportunidade para o absurdo, para o oxímoro nascer. Antinomias, para sobre-
viver, necessitam de uma animada conversa, do diálogo, não do monólogo de um 
ditador. É preciso estar ciente dos riscos da metodologia, cuja condenação é um 
tipo de agorafobia, que teme a infinita quantidade de idéias virtuais que possam 
se apresentar (Scofidio, 1996: 41).
A educação, da mesma forma que a produção do conhecimento, deve favorecer a 
aptidão natural da mente em formular e resolver problemas essenciais, e, ao mesmo 
tempo, estimular o uso total da inteligência pelo livre exercício da curiosidade (Morin, 
2000) e por despertar o interesse pelo saber!
102 o LuGAR do PRojETo
Nesse sentido, no que concerne à educação em arquitetura e urbanismo, principal-
mente no âmbito do ensino de projeto, é necessário enfrentar questões fundamentais 
que se encontram intrinsecamente ligadas: as práticas e os mitos que permeiam o en-
sino, o método em projeto, e as novas tecnologias da educação no conceito ensino-
aprendizagem.
Práticas e mitos permeando o ensino
A educação em arquitetura, como aulas de arte e humanidades, tem acreditado que a 
forma adequada é expor aos alunos trabalhos de arquitetos, antigos e atuais. A utilização 
de livros-texto só acontece secundariamente e, mesmo assim, sem discutir o ponto cen-
tral da arquitetura enquanto conceitos, temas e práticas. Os estudantes apenas tomam 
conhecimento de uma grande quantidade de problemas que o arquiteto, ao longo do 
tempo, tentou resolver, tendo frequentemente diante deles um número incomensurável 
de soluções para os mesmos problemas. Soluções que os alunos devem, por sua vez, 
avaliar por si próprios (Johnson, 1994).
Essa situação é diferente daquela encontrada nas áreas de ciências exatas ou médicas, 
em que são fornecidos aos alunos livros-textos das disciplinas (ou apostilas) até os últi-
mos anos, facilitando o fortalecimento dos respectivos paradigmas.
Na arquitetura, os paradigmas são mantidos pelo discurso, por repetição, muito 
mais do que pela argumentação. A arquitetura faz uso de chavões (ditos), aforismos (de-
finição de princípios) e axiomas (premissas aceitas sem necessidade de demonstração) 
como forma de disseminar princípios. 
Teoria como história da arquitetura, que guia a prática, é um dos grandes mitos: o 
design talking (discurso) seria uma explicação científica por mediar a passagem dos con-
ceitos mentalmente integrados com o fazer, razão pela qual slogans, aforismos, axiomas 
e ditados são as formas mais simples de mitos estabelecidos. Facilmente assimiláveis, 
tornam-se os meios mais fáceis de disseminar idéias arquitetônicas, como: form follows 
function (Frank Lloyd Wright), less is more (Ludwing Mies Van der Rohe), less is bore 
(Robert Venturi) e form follows fiasco (Peter Blake).
Além destes, existem alguns outros mitos que permeiam o ensino da arquitetura. A 
arquiteta e crítica Dana Cuff (1991) observa que a idéia do arquiteto como indivíduo 
criativo e original começa na educação em arquitetura, bem como destaca que a princi-
pal relaçãosocial na escola – entre o professor e o aluno no estúdio – é moldada como 
uma relação entre indivíduos únicos. Assim, a primazia do indivíduo é levada à prática 
e promove explicações das ocorrências diárias como questões de personalidade, talento, 
criatividade e convicções. A ênfase no individualismo é um mito que exige mudança, 
mas não eliminação, porque o individual permanecerá central na arquitetura, assim 
como na maioria das profissões.
Outra dificuldade é a inexistência de fundamentação teórica e metodológica no 
exercício da atividade de projeto nos estúdios, o que não permite orientar o rumo em 
direção aos procedimentos esperados por parte dos alunos. Para Rowe (1987), quando 
não se oferece argumentação suficiente, as teorias se tornam frágeis e a prática se enfra-
quece. A multiplicidade de posicionamentos passa a ser, meramente, uma questão de 
103EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
gosto pessoal. Isso é bastante claro quando o trabalho do aluno é analisado por vários 
professores. O aluno se perde em um mar de opiniões diferentes e completamente con-
traditórias, e costuma manifestar seu desconforto.
Outro mito não expresso da educação em arquitetura é o de que os alunos terão 
um posicionamento em relação à arquitetura depois de ter participado de um curso 
de formação e prática, presumindo-se que ter um posicionamento é algo importante 
no próprio campo da arquitetura. Esse posicionamento assume ares de um ato político 
que envolve participação ativa no discurso. A base educacional, portanto, necessitaria 
mostrar as tendências do discurso e a fundamentação das posições específicas. A escolha 
será dos alunos e estará condicionada à visão estratégica que terão sobre a prática da 
arquitetura, estejam eles preocupados com o mercado de trabalho ou com posiciona-
mentos ideológicos (Johnson, 1994). Ambas são válidas e podem ser alteradas com o 
passar do tempo.
É interessante observar que são (ou eram) essas visões doutrinárias sobre arquitetura 
que atraem (atraíam) alunos para uma instituição, criando interesse por um determi-
nado arquiteto ou pela leitura de um livro. A escolha, contudo, é (deverá ser) sempre 
do aluno. 
A crença da educação em arquitetura se alinha com prioridades profissionais 
inevitáveis para se obter o diploma e, consequentemente, aceitação no mercado de 
trabalho.
Cuff argumenta sobre a necessidade de uma abordagem mais incisiva para a prática 
e o ensino, sugerindo que este deve incluir:
integração vertical dos estúdios com a compreensão global dos problemas 
de projeto, permitindo a atuação de consultores; instrução em negociação; 
relações pessoais e lideranças; apresentação de estudos de casos bem-sucedi-
dos de colaborações entre empresários e arquitetos, engenheiros etc. (Cuff, 
1991: 45).
Quando Cuff fala da prática, acredito que, em razão de o arquiteto ser um profissio-
nal liberal, autônomo, refira-se à necessidade de maior ênfase nas questões que envol-
vem o comando de seu próprio escritório (negócio), assim como a negociação entre os 
diversos atores, já que o arquiteto tende a assumir posições de coordenação e liderança 
nas equipes de trabalho.
Se olharmos para o papel do arquiteto na área de planejamento e gestão urbana, não 
poderemos deixar de concordar com Dana Cuff, quanto à formação em administração, 
economia e negociação. Em uma tentativa de resumir estas práticas e mitos na área da 
arquitetura e urbanismo, montamos o Quadro 1, na página seguinte.
método em projeto
Método, do grego methodos, em que meta é “com” ou “partilhando”, e odos, “caminho”, 
quer dizer buscar um conhecimento ou um modo de investigação. É usado, em geral, 
como um meio de atingir um fim, por intermédio de procedimentos ordenados ou 
arranjos sistemáticos sobre o tema. 
104 o LuGAR do PRojETo
A idéia do método que contém princípios firmes, imutáveis e completamente con-
trolados para conduzir a ciência encontra dificuldade considerável quando con-
frontado com os resultados da pesquisa histórica. Nós verificamos, então, que não 
existe uma simples regra, embora plausível ou epistemologicamente consolidada, 
que não possa ser violada em algum momento. Torna-se claro que tais violações 
não são acidentais, não são resultados de conhecimento insuficiente ou de falta de 
atenção que deva ser evitada. Nós vemos essas violações como necessárias ao pro-
gresso [...] [eventos e desenvolvimento científico] apenas ocorrem porque alguns 
pensadores decidiram não concordar com certas regras metodológicas “óbvias” ou 
porque inadvertidamente as quebraram [...]. Existem ainda circunstâncias [...] em 
que o argumento perde sua capacidade de olhar além e torna-se um obstáculo ao 
progresso. Ninguém pode afirmar que ensinar uma criança é exclusivamente uma 
questão de argumentação [...]; e que todos agora concordam que o que parece um 
resultado da razão [...] deve-se parcialmente a um processo de doutrinação e, par-
cialmente, a um processo de crescimento, que age com a força de lei natural. E que 
onde argumentos parecem ter algum efeito é, mais frequentemente, devido à sua 
repetição do que ao seu conteúdo semântico (Feyerabend, 1988: 14).
Com o intuito de esclarecer a questão do método em arquitetura e urbanismo, o Qua-
dro 2 apresenta um sumário e uma comparação entre as quatro regras fundamentais que 
compõem um método científico para Descartes, assim como essas mesmas regras revistas à 
luz de um possível método para o projeto de arquitetura, que será desenvolvido a seguir.
A observação deste quadro permite opor o método de Descartes àquele pensado 
para o projeto.
quadro 1 – Práticas e mitos em arquitetura e urbanismo
• A teoria e a prática da arquitetura e do urbanismo e, mesmo do planejamento urbano, 
têm sido conduzidas, predominantemente, pelo discurso assumido como verdade 
(aforismos, axiomas, ditos);
• A definição e o conceito de projeto são o império da opinião e do gosto pessoal;
• na prática da arquitetura, do urbanismo e do planejamento urbano, há necessidade de 
posicionamento político e ideológico;
• Existe predomínio da relação individual professor e aluno, tida como fundamental;
• Permanece a primazia do estúdio como um local de ensino e prática do projeto, do 
pequeno grupo, com tomadas de decisões discursivas;
• o talento atesta a dádiva de privilégios especiais que permite desculpar, inclusive, erros de 
comportamento;
• Reforça-se a primazia da criatividade individual sobre a produção coletiva (negação do 
trabalho em grupo), ainda que grande quantidade de alunos comece a desestabilizar essa 
relação;
• A imagem do arquiteto como generalista contrária aos especialistas.
105EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
Aforismos e axiomas
Como já mencionado, muitos dos princípios sobre o projeto de arquitetura assumem o 
caráter de aforismos e axiomas, sendo aceitos como verdades, independentemente de sua 
evidência científica, e acordados por um processo de repetição, e não de compreensão.
o todo
Aqueles devotados a encontrar e desenvolver processos e métodos instrumentais para 
o desenho criativo concordarão que existem apenas alguns poucos métodos que come-
çam com o todo e, progressivamente, o refinam. A maior parte desses procedimentos 
é parcial e concebe a tarefa como um problema, atacando, então, partes discretas do 
problema, peça a peça, por meio da análise.
Um método pode auxiliar ou impedir a emergência do todo, pois, muitas vezes, consiste 
em selecionar determinados caminhos pelos quais se pode vislumbrar uma tarefa específica, 
fazendo com que se abrace cada uma das concepções das tarefas como se fosse um todo.
Roger Scruton (1979) aponta ainda que, em decorrência de a maior parte de nossos 
objetivos de projeto não poder ser apresentada a priori, a tentativa de alcançar uma 
solução via meios que atingem um fim envolverá, em geral, uma limitação arbitrária do 
problema a que estes se propõem a resolver.
A análise/síntese/avaliação
Um projeto consta de três etapas – análise, síntesee avaliação – e pressupõe as etapas an-
teriores de aquisição do conhecimento: informação, compreensão e aplicação (discutidas 
adiante). A análise das partes e de seus respectivos relacionamentos é fundamental e exige 
amplo repertório. Ainda que a análise seja fundamental para o método cartesiano ou para 
o assim chamado método científico, que tem servido adequadamente, há vários séculos, 
à promoção da compreensão, ela é, primeiramente, um método de explicação, e não de 
geração (criação). Isso, contudo, não quer dizer que a ciência não possa ser uma atividade 
geradora. Ela o é, por exemplo, quando formula hipóteses (Johnson, 1994). 
quadro 2 - métodos
méTodo PARA dEscARTEs méTodo Em PRojETo
• não aceitar como verdade nada que 
não seja considerado evidente; 
• pensar de modo ordenado, do mais 
simples e fácil para o mais complexo;
• dividir cada dificuldade em tantas 
partes quantas forem necessárias para 
resolvê-la; análise;
• descrever todas as ligações com 
justificativas e argumentos.
• aforismos, ditados, axiomas;
• a unidade e o todo devem ser 
pensados a priori;
• juntar as partes para fazer a síntese;
• histórico das intenções (design talking)
106 o LuGAR do PRojETo
Em outras palavras, o que Feyerabend quer dizer, segundo Johnson, é que métodos 
científicos, dos quais a análise é um, não apenas podem impedir o progresso, como tam-
bém inibir a invenção. Para a arquitetura, isso pode ser um desastre. No caso do projeto, 
que é uma síntese, a análise deve funcionar como uma compreensão dos insumos das 
diversas áreas de conhecimento (realizada a priori) necessárias à sua realização, tanto em 
suas relações entre as partes (insumos) quanto destas com o todo.
A avaliação, por sua vez, pressupõe a inclusão de critérios de avaliação que permitam 
julgar o projeto, de forma a diminuir a subjetividade na tomada de decisões e a alimen-
tar os processos de revisão e aperfeiçoamento. 
design talking (discurso)
O processo mental do arquiteto para inventar espaços é o empurrão da pesquisa para 
dentro do campo da criatividade, enquanto os canais e contextos que levam a esse pro-
cesso mental são objeto dos métodos de pesquisa em arquitetura e urbanismo.
Para Proust (1981), essa inscrição mental tem como origem a mais emocionante 
espécie de geometria, considerada, no âmbito da arquitetura, a coalescência de partes 
em um arranjo com princípios de ordenação. A procura por caminhos que conduzam a 
esse alinhamento mental é o desafio do método e não a sua aplicação como uma ordem 
racional trazida para a tarefa do projeto. Se método for alguma coisa, será, portanto, a 
invenção de uma representação topográfica de fatos de uma tarefa particular, com escala 
e formato perseguidos por determinado projetista. 
Nesse sentido, método só será um procedimento universal, se fizer uso de certos 
mapeamentos devidamente convencionados. O método em projeto, como uma seqü-
ência de procedimentos adotados pelo arquiteto, é como um jogo em que as regras ou 
convenções de comando das ações, que agem como mediadoras, são postergadas ou 
deformadas para permitir flexibilidade ao jogo e mantê-lo vivo. Com esse caráter de re-
gras não aparentes, mas existentes, o método enfrenta sua primeira grande dificuldade, 
podendo, então, ser confeccionado a cada momento: dá indicação apenas para que o 
jogo possa ser jogado, sem estabelecer o seu formato.
Se método é um caminho a ser seguido no projeto, o local ou indício dos passos 
tomados, escolhas feitas ou decisões acordadas, após as ações serem finalizadas, passa a 
ser uma revisão histórica. Considerada, na história, a existência de um inexorável fata-
lismo acerca dos fatos ocorridos, o produto final é da maneira que, de fato, é, além de 
só poder ser dessa maneira, em razão das decisões tomadas. Se outras escolhas tivessem 
sido feitas, o resultado seria diferente, mesmo que de maneira sutil.
Segundo Johnson (1994), o método em projeto pode ser tanto a diferença entre 
uma descrição elaborada e um projeto quanto a descrição de como se chegou a ele. Em 
outros termos,nomear todas as intenções e propósitos corresponde ao método e se trata 
de uma conversa sobre projeto (design talking).
Outro aspecto que dificulta a utilização de um método científico para projetos que 
envolvem estética, como moda, decoração e arquitetura, é o contato íntimo do artista 
com esses produtos, dos quais não consegue manter distância para evitar a influência 
da subjetividade, ou seja, métodos de projeto, salvo quando levam em conta o envolvi-
mento do artista, têm pouco ou nenhuma utilidade, pois a separação que impõem na 
tarefa é completamente fictícia.
107EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
Apesar da desilusão com os métodos de projeto e o aumento da importância de sua 
subjetividade, Johnson (1994) acredita que a certeza de alguma espécie de método de 
projeto ainda é perseguida pelos estudantes de arquitetura. Em que base se deve, então, 
perseguir um método? Por que, aparentemente, precisamos estruturar nossa abordagem 
para projetar? Quem garante que ter um método conduz à resolução de um problema 
ou de um projeto? O que define o fato de que a qualidade dos resultados alcançados 
decorre da utilização de métodos? 
Ainda segundo Johnson, com o qual estou inclinada a concordar, o método é uma 
maneira de, por meio do projeto, falarmos com nós mesmos. Já para Stroeter: 
O método tradicional de projetar mais utilizado é o desenho. Num processo de au-
toalimentação contínuo, o desenhar nutre as idéias que passam a ser redesenhadas e 
transformadas. Dessa forma, um projeto de arquitetura nunca estará completo. Ele só 
é finalizado por imposições de ordem essencialmente prática (Stroeter, 1997: 115).
Segundo Stroeter, o processo de desenhar, ainda que pareça rudimentar, constituiu um 
avanço em relação à forma de trabalho do artesão que trabalhava com modelos, que, em ter-
mos de educação, são fundamentais para a compreensão do espaço. O método adotado por 
Frank Gehry, por exemplo, tem como ponto central a construção de modelos. Os desenhos 
que se sucedem, com alto grau de complexidade, só podem ser realizados hoje pelos avanços 
da informática. Os trabalhos de Gaudí para a Sagrada Família, em Barcelona, até hoje pade-
cem da dificuldade de criar modelos matemáticos que permitam a sua recomposição. 
A diferença de abordagens que desenhos e modelos promovem entre o pensar e o 
fazer, o conceber e o produzir, traz uma série de vantagens: a especialização da produção 
das partes; a ampliação da escala dos projetos; e a velocidade de elaboração do projeto e 
da reprodução do objeto pela possibilidade de industrialização. Mas, apesar do grau de 
desenvolvimento alcançado por alguns métodos, “não se podem esperar milagres. Nada 
ainda foi encontrado, e talvez nunca se encontre um método (conjunto de regras) para 
inventar coisas ou gerar idéias. A criação original, diferentemente das tarefas de rotina, 
não pode ser regulamentada” (: 116)
A quantidade de informação e o conhecimento, de todo modo, podem funcionar 
como um grande insumo para a criatividade. Stroeter apresenta alguns exemplos de 
artistas com os seus respectivos métodos de criação da obra:
Para Le Corbusier, o método era ruminar as idéias até que elas se mostrassem viá-
veis e boas. Só realizava o projeto quando as idéias estavam maduras o suficiente, 
como explicou a respeito do Hospital de Veneza. 
Na música, Stravinsky parece ter adotado o método de trabalhar com as par-
tes. Inicialmente estabelecia relações rítmicas entre intervalos, por meio da ex-
ploração que realizava no piano. A composição só surgia depois de estabelecidas 
essas relações harmônicas ou melódicas. 
Fernando Lemos, desenhista, poeta e pintor, diz que o projeto se faz [manual] depois 
que as coisas estão feitas [mental], ou seja, ele sai pelo mundo para fazer descobrimentos 
a partir de idéias lançadas e, quando volta, resolve o problema fazendo o projeto. Segun-
do ele, quando se produz [executa], não setem tempo para projetar [pensar].
Para Oscar Niemeyer, o mais importante no projeto é a idéia, o partido arqui-
tetônico. Quando desenha sua idéia, ele a faz acompanhar de um texto explicativo 
108 o LuGAR do PRojETo
[design talking], buscando mostrar que, se não tiver argumentos suficientes, é 
porque não está satisfatório.
Gabriel Garcia Márquez, em entrevista dada em 1983, afirmou que seu mé-
todo se constituía de alimentar idéias por anos a fio. Algumas se perdiam no 
caminho, outras se consolidavam e, então, transformavam-se em livros. Antes 
de começar um livro, sempre adotava um ritmo de vida que, de forma alguma, 
assemelhava-se a um processo de trabalho. Depois de algum tempo, o trabalho 
estava pronto, precisando apenas ser escrito. Costumava gastar seis horas diárias, 
escrevendo uma página por dia. Admitia ser um processo doloroso, já que se 
tratava de traduzir para o papel, letra por letra, palavra por palavra, o conteúdo 
de um livro que parecia “já ter lido”. 
O processo de Márquez para a redação do livro procede do todo para as partes, in-
vertendo aquele que originou a sua concepção e que foi, para nós, alimentado, passo a 
passo, por idéias fragmentadas, que passaram a ser articuladas para compor o todo.
Sempre pode haver distância entre a concepção e a formatação final do projeto, mas 
isso tem sido sensivelmente diminuído pela informática1, já que esta facilita a experi-
mentação. 
No caso de um artigo, a disciplina do escritor é fundamental e a redação final, um 
trabalho que o verdadeiro escritor, no sentido restrito do termo, não pode delegar, sob 
pena de lançar mão dos chamados ghost writers e de seu papel, como autor de uma obra 
literária, desaparecer.
No projeto de arquitetura, a construção mental se realiza inicialmente por meio de 
um trabalho em que as partes buscam um todo já imaginado. Em determinado momen-
to, todavia, a passagem para o desenho se torna fundamental, a fim de dar realidade e 
forma às idéias, e promover o diálogo. A fase seguinte, depois de concebido o projeto, 
pode ser delegada, pois exige muito mais tempo dedicado à técnica do desenho do que à 
arte. Pode ser razoavelmente mensurada, embora a concepção do projeto já não permita 
tal precisão temporal. Método em projeto é uma construção mental que se materializa 
no livro, no desenho, na obra de arte, na música e mesmo na arte eletrônica.
Por fim, é preciso ressaltar que, se o projeto é síntese, ele se dá nos mais elevados 
níveis do processo de aquisição do conhecimento. A habilidade em realizar essa síntese 
depende de vários fatores, nos quais a maturidade do indivíduo tem papel fundamental. 
Além do repertório necessário para auxiliá-lo na elaboração da síntese pelo processo da 
análise, a experiência do fazer tem papel relevante no processo. O tempo em que essa 
habilidade aflorará depende, portanto, não apenas da atuação do docente (na condição 
de agente preparador), mas também da disposição do aluno em reforçar o seu repertório 
e de sua dedicação ao exercício do fazer.
1 A informática modifica a arquitetura de duas maneiras: pela mudança em nossas vidas, con-
duzindo à mudança nos programas dos edifícios e no espaço urbano; e pela introdução de 
novos modos de realizar projetos. Conseqüentemente, a modificação do modo de projetar 
pode modificar e transformar a obra, assim como o fazem a introdução de novas técnicas e 
tecnologias dos materiais de construção e dos métodos construtivos. 
109EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
Ensino / aprendizagem
Para nós, professores, pensar sobre esse tema é quase um lugar comum, mas pensar sis-
tematicamente com método, com ciência, e apoio de especialistas da área de educação, 
é raro. Sobretudo, se a área de conhecimento tem caráter profissionalizante, como a 
arquitetura e o urbanismo, em que aprender fazendo é um dos métodos utilizados. 
De modo geral, grande parte das dificuldades encontradas no processo ensino/
aprendizagem2 tem sido uma decorrência do modelo educacional usualmente adotado, 
chamado de modelo formal, que se contrapõe ao modelo não-formal, apresentado como 
uma das alternativas possíveis. As principais características de ambos os modelos estão 
indicadas no Quadro 3, abaixo.
quadro 3 - modelos educacionais
A permanência do modelo formal, apesar das fortes indicações de que ele não res-
ponde mais às nossas necessidades educacionais, pode ter várias razões. A resistência à 
mudança, por parte de alunos e professores, talvez seja a mais forte delas. Na verdade, 
essas mudanças correspondem, ainda que inicialmente, a uma dedicação maior dos 
docentes e, em contrapartida, a uma solicitação mais forte dos alunos.
2 Programa de Apoio ao Docente (PAD), oferecido pela Pró-Reitoria de Graduação, e coordenado e 
ministrado pelo professor Claudio Zaki Dib. Foram oferecidos cursos aos docentes da USP, com a 
finalidade de discutir a questão do ensino em moldes mais científicos e contexto multidisciplinar. 
modELo FoRmAL modELo nÃo-FoRmAL
• centrado no professor/sistema;
• ênfase no ensinar;
• ênfase na atividade do professor;
• voltado para o conteúdo;
• exigência do cumprimento do programa;
• metodologia expositiva;
• exigência da presença física do aluno e do 
professor em sala de aula (presencial);
• avaliações para fins administrativos; 
• mesma metodologia de ensino para dez, 
cinqüenta ou duzentos alunos.
• centrado no aluno;
• ênfase no aprender;
• ênfase na atividade do aluno;
• ênfase no aprendizado, isto é, 
no desenvolvimento das habilidades do 
aluno;
• exigência do alcance dos objetivos 
visados;
• metodologia interativa e participativa;
• outros ambientes de aprendizagem, 
sem a necessidade de presenças 
conjuntas (à distância);
• avaliações para aprimoramento do 
processo educativo;
• metodologia diferenciada para dez, 
vinte ou duzentos alunos.
110 o LuGAR do PRojETo
Correa (1997) afirma que, embora não se saiba se a arquitetura pode ser ensinada, 
sabe-se que ela pode ser aprendida. Para esse autor, aprender é um processo que depende 
de nós mesmos, de nossa atitude mental, e ensinar, encorajar cada estudante até o seu 
próprio julgamento.
Os modelos de educação tradicional, em que o professor era o guru, detinha o saber, 
dava receitas a serem seguidas, promovem uma atitude mental que dificilmente é elimi-
nada, passando longe dos conceitos ideais de educação. Pode-se dizer que esse tipo de 
postura se origina do processo de doutrinação religiosa, em que a repetição cria dogmas 
assumidos como verdade. Na educação, o importante é permitir ao aluno que ele se 
distancie desse conhecimento, para falar com a sua própria voz.
Nós professores, e com maior dificuldade os arquitetos-professores, temos tido mui-
ta dificuldade em abandonar a postura de guru. Isso se refere não apenas à docência, mas 
também à atuação como formadores de opinião e produtores do conhecimento. Uma 
nova realidade social exige uma reorientação curricular que leve em conta a realidade 
dos processos de ensino e de seu receptor mais direto, o aluno. Levar em conta não quer 
dizer aceitar essa realidade, mas antes dela partir, isto é, partir do universo do aluno para 
que ele consiga compreendê-la e modificá-la (Cortella, 2001). 
A participação em dois cursos do Programa de Apoio Docente (PAD) permitiu 
discutirmos os métodos de ensino e a didática. Na Faculdade de Arquitetura e Urba-
nismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), tem-se discutido muito o conteúdo e 
a operacionalização das disciplinas, mas pouco, ou quase nada, o método. Além disso, 
com poucas exceções, isso tem se baseado apenas no discurso proveniente de práticas 
bem ou malsucedidas, sem que haja reflexsobre elas. Na verdade, tem sido a teoria do 
“achismo”, pouco científica.
De todo modo, as novas tecnologias educacionais, por meio do chamado macromodelo 
da tecnologia educativa3, buscam analisar não apenas o conteúdo a ser ministrado, ou seja, 
o que a sociedade quer e precisa que o aluno aprenda como cidadão domundo, antes de se 
tornar profissional, mas também a forma como esse conteúdo é transmitido. A esse respeito, 
dois elementos devem ser focos de atenção: o aluno como público-alvo e o meio educacional 
que compreende a escola, o professor e os instrumentos didáticos. Esse macromodelo, con-
forme apresentado na Figura 1, procura indicar a interação entre todos esses atores.
Não há duvida de que o meio em que o aluno está inserido interage com ele, dando 
origem a comportamentos diferenciados (C), que dependerão de fatores genéticos (G) 
e adquiridos (A), carregados por ele (valores, posturas, interesses, formação, experiência 
de vida etc). A interação de indivíduos diferentes, que apresentam comportamentos 
diferentes em sua relação com o meio educacional, levam-nos a respostas diferentes. 
Essas respostas podem pertencer aos domínios cognitivo, afetivo ou motor. Mantendo 
a atenção nas respostas educacionais, que é o nosso grande objetivo, deve-se saber o que 
o aluno consegue absorver e de que forma isso se dá, isto é, se a resposta está de acordo 
com os objetivos estabelecidos a priori. Será o meio educacional, portanto, que deverá, 
a partir do conhecimento do perfil do aluno, fazê-lo responder de acordo com as respos-
tas educacionais esperadas (objetivos educacionais).
3 Material fornecido em curso do PAD.
111EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
Figura 1 – macromodelo Educacional
Fonte: Adaptado de material fornecido no curso do professor claudio zaki dib.
O meio educacional é aquele em que o aluno está imerso no universo escolar. Para 
Claudio Zaki Dib, o livro, como parte do meio, constitui um meio educacional, pois, 
durante a leitura, o leitor interage com as informações que constam no livro. O meio 
educacional, na verdade, é o ambiente ou a atmosfera criada durante uma exposição, 
seminário, apresentação de filmes. Trata-se da ritualização do momento, podendo os 
demais meios educacionais (escola, casa, shopping etc) concorrer com os objetivos edu-
cacionais pretendidos na escola.
Para trabalhar o meio educacional, que é o ambiente de atuação do docente, temos de 
saber exatamente o que e onde queremos chegar, definindo claramente nossos objetivos, à 
luz das demandas da sociedade. Devemos, pois, conhecer o perfil dos nossos alunos. Como 
não se pode conhecer previamente o perfil dos alunos e estabelecer processos diferenciados 
para alcançar objetivos estabelecidos para todos eles, variáveis mínimas, que serão assumidas 
como existentes, devem constituir-se em pré-requisitos, ou seja, premissas dos exames de 
ingresso na universidade. Essas premissas poderão, retroativamente, interferir nos conteúdos 
e nos meios educacionais dos níveis mais elementares do processo educacional.
As respostas esperadas, o perfil do aluno (pré-requisitos) e o meio educacional (re-
cursos e meios) devem ser pensados em conjunto para que as expectativas sejam devi-
damente satisfeitas. 
definição de objetivos
Qual é o nosso objetivo educacional? Quando dizemos que queremos que uma criança 
passe a apreciar a arte, queremos que ela tenha consciência de que existem obras de arte, 
que ela seja capaz de dar certa atenção ao entrar em contato com uma, ou que ela vá a mu-
seus sozinha para conhecê-las? Que ela olhe uma obra de arte, buscando valores positivos, 
ou se emocione ao olhar uma obra? Que seja capaz de avaliá-la e saber por que e como foi 
elaborada, ou que possa comparar seu impacto estético com outras formas de arte?
Essa dificuldade de precisar o que se quer nos objetivos educacionais é uma das 
grandes dificuldades do processo de aprendizagem. Se não temos clareza desses objeti-
vos, como poderemos avaliá-los?
112 o LuGAR do PRojETo
A chamada taxonomia educacional (Krathwohl, 1971), elaborada como um ten-
tativa para diminuir a falta de precisão na comunicação dos objetivos educacionais, 
acredita que um programa educacional pode ser concebido de modo a mudar o com-
portamento de um aluno em relação a um determinado tema. Quando o comporta-
mento esperado e o assunto são descritos, constrói-se um objetivo educacional. Por 
exemplo: o aluno deverá ser capaz de dizer três princípios da arquitetura moderna. As 
duas partes do objetivo, o tema e o que deve ser feito pelo aluno, são categorizáveis, 
no entanto é o primeiro, isto é, o que está sendo feito com o tema, que constitui as 
categorias da taxonomia. 
Esta se divide em três domínios: cognitivo, afetivo e psicomotor. O domínio cogni-
tivo inclui os objetivos que envolvem conhecimento e resolução de problemas. O afeti-
vo, os objetivos que envolvem atitudes, valores, interesse e apreciação. Já o psicomotor 
envolve habilidades manuais e motoras que têm de ser desenvolvidas, sendo utilizadas 
para profissões que requerem habilidades motoras, como educação física e medicina. 
Cada um desses domínios se subdivide em categorias de uma classificação hierárquica, 
o que quer dizer que cada categoria envolve um comportamento mais complexo e abs-
trato do que aquela que a precede.
Segundo Bloom (1979) o domínio cognitivo se divide em seis momentos principais, 
para os quais tentamos fazer um paralelo com o conhecimento em arquitetura e urba-
nismo, como indicado no Quadro 4.
Já o domínio afetivo se divide em cinco momentos principais (Krathwohl 1964), 
para os quais também tentamos estabelecer relações com o conhecimento em arquite-
tura e urbanismo (Quadro 5).
Como afirma Morin: 
nossos desejos ou nossos medos e as perturbações mentais trazidas por nossas 
emoções multiplicam os riscos de erro. No entanto, não seria o caso de tentar 
evitar erros reprimindo toda a afetividade. Embora as emoções possam nos cegar, 
o desenvolvimento da inteligência é inseparável do mundo da afetividade, isto é, 
da curiosidade, da paixão, que, por sua vez, são a mola da pesquisa filosófica ou 
científica. A educação deve favorecer a aptidão natural da mente em formular e 
resolver problemas essenciais, estimulando o uso total da inteligência que se uti-
liza do livre exercício da curiosidade. Sentimento muito forte durante a infância 
e a adolescência, a curiosidade perde importância quando se aumenta o nível de 
instrução ao adentrar-se a vida adulta. Sentimento esse que cabe aos professores 
reestimular (2000: 39). 
Desse modo, o professor é aquele que, mais do que transmitir conhecimentos ou in-
formações, desperta no aluno o interesse pelo saber. Em um processo de ensino/apren-
dizagem, o grande desafio se encontra, para nós, no campo dos objetivos afetivos, com 
os quais não estamos habituados a trabalhar. Quando o fazemos, trata-se de algo mera-
mente acidental.
A expressão usada pelo professor Paulo Mendes da Rocha, ao dizer “que o aluno, ao 
entrar na faculdade, tem que ser seduzido pela arquitetura” (citado por Vargas 1992), é 
de extrema relevância. Como, porém, promover essa sedução?
113EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
quadro 4 – objetivos do domínio cognitivo
objETIVos no domÍnIo coGnITIVo EXEmPLos nA ARquITETuRA E uRbAnIsmo 
conHEcImEnTo (como um produto) 
Envolve a habilidade de lembrar ou 
recordar-se de informações ou experiências 
específicas.
• defina coeficiente de aproveitamento.
• cite três obras da arquitetura moderna 
brasileira e seus autores.
• cite três agentes produtores do espaço 
urbano.
comPREEnsÃo 
Envolve o entendimento e a percepção; 
necessita do processamento de informações. 
• Explique a possibilidade de verticalização, 
tendo como base a relação entre coeficiente 
de aproveitamento e taxa de ocupação 
máxima. 
• Explique a diferença entre os conceitos de 
adensamento e verticalização.
APLIcAÇÃo 
A partir de uma teoria ou regra geral, 
aplica-se a um caso específico.
• A partir da planta de cobertura 
apresentada, construa um elemento 
tridimensional que corresponda a ela.
• dado um terreno, seu coeficiente de 
aproveitamento e taxa de ocupação 
máxima, dar cinco possibilidades de 
implantação para o edifício.
AnÁLIsE 
divisão do todo em partes, buscando 
determinar anatureza dos relacionamentos 
entre eles,
• caracterizar os agentes de produção do 
espaço urbano e os seus conflitos.
• Tendo como base o programa de projeto 
apresentado, indique quais elementos 
podem inviabilizá-lo (limite de custos, 
terreno, restrições urbanísticas, tecnologia).
sÍnTEsE 
combinação de elementos para formar 
um todo coerente, uma unidade. Está 
diretamente ligada ao pensamento e à 
criatividade. Envolve relações abstratas.
• Explicar a produção do espaço urbano.
• dados: o programa, limites de custos, 
tipo de acabamento, terreno, restrições 
urbanísticas, desenvolver o projeto.
AVALIAÇÃo 
Trabalha com elementos de julgamento de 
valor que podem ser internos ou externos.
• Faça uma avaliação da legislação de uso 
e ocupação do solo, em relação à qualidade 
ambiental urbana.
• dado o projeto, faça uma avaliação qua-
litativa (interna) e, depois, compare com os 
demais (externa).
114 o LuGAR do PRojETo
o público-alvo: o aluno
Qual o conteúdo a ser ministrado para um determinado perfil de aluno que a sociedade 
atual quer e precisa receber com arquiteto e urbanista. Tendo como base a linguagem 
do campo dos negócios, é bastante interessante a analogia que o professor Claudio Zaki 
Dib faz entre o modelo formal, voltado para o produto (professor), e o não-formal, 
voltado para o mercado (aluno/consumidor).
De acordo com os menos introduzidos na ciência dos negócios, isso quer dizer que, 
antes, o sistema de produção e distribuição se preocupava apenas com qual produto se 
deveria trabalhar, insistindo muitas vezes em continuar certa tradição milenar, para cuja 
oferta de produtos haveria poucos consumidores interessados. A descoberta da importân-
cia de consultar o mercado em face de um ambiente mais competitivo conduziu à neces-
sidade de conhecer melhor as necessidades e expectativas do consumidor, revelando-se 
como o grande passo em direção à sobrevivência, à evolução e ao crescimento do sistema 
produtivo. Teorias sobre segmentação de mercado e comportamento do consumidor, ape-
sar do uso de outra linguagem, podem contribuir para a percepção de que diferentes perfis 
de alunos solicitam tempos diversos e formas de transmissão apropriadas.
Arquitetos profissionais afirmam que os alunos não têm habilidades imediatas para a 
prática. Educadores, embora afirmem usualmente que ensinam essa habilidade, têm sua 
atenção voltada, sempre, para os processos conceituais de projeto (design talking), uma 
habilidade, a princípio, não valorizada pelos empregadores, ao menos até o momento 
em que os recém-formados têm de enfrentar os primeiros desafios. A partir de então, 
objETIVos no domÍnIo AFEITIVo EXEmPLos nA ARquITETuRA E uRbAnIsmo 
REconHEcImEnTo 
Aceita receber a mensagem, tem 
consciência do que está acontecendo e tem 
disposição em aceitar.
Aceita a inclusão do tema “novas 
tecnologias na construção civil” no 
curso de arquitetura
REsPonsIVIdAdE 
dá resposta, mostra interesse e motivação; 
(existe apenas um grau de curiosidade).
Está presente às aulas.
Participa do debate voluntariamente.
Toma a iniciativa de trazer exemplos novos.
VALoRIzAÇÃo 
Passa a procurar e a se envolver. 
Reconhece a necessidade de estudar 
estruturas e resistência dos materiais como 
forma de ousar na elaboração do projeto 
arquitetônico. 
oRGAnIzAÇÃo 
organiza-se e propõe planos e ações.
Prepara sua grade de horário para cursar 
disciplinas optativas relacionadas à 
arquitetura de alta tecnologia.
cARAcTERIzAÇÃo PoR um VALoR 
Passa a defender e agir de acordo com os 
valores assumidos.
Promove eventos sobre os avanços e o 
papel das novas tecnologias na arquitetura 
contemporânea.
quadro 5 - objetivos do domínio afetivo
115EnsIno/APREndIzAGEm Em ARquITETuRA E uRbAnIsmo
as questões se invertem e as reclamações dos profissionais se direcionam para a falta de 
elementos teórico-conceituais, entendidos aqui como princípios de projeto ou métodos 
de trabalho que servem de base para a tomada de decisões (Johnson 1994).
O grande objetivo de toda escola é formar o aluno com o perfil demandado pelo mer-
cado, mas “desejado pela sociedade”, que, por sua vez, deveria nortear a elaboração dos pro-
gramas das disciplinas para o conjunto de escolas. Esse seria, com certeza, o primeiro grande 
passo para uma educação melhor, pois muitos desvios, superposições e carências em jogo se 
explicitariam, ajudando a definir e reformular os conteúdos a serem ministrados.
Minhas investidas nas áreas do marketing, da publicidade e da propaganda, de-
correntes de estudos sobre o comércio, em que o cliente, por princípio, deve ser o rei, 
levaram-me a repensar minha atuação como docente não apenas para os alunos, mas 
também em conferências e palestras, em que tento identificar previamente o perfil da 
platéia. Como forma de aprendizado, tenho sempre muito interesse em assistir apresen-
tações e o desempenho de outros colegas das mais diversas áreas profissionais.
o meio educacional
Por fim, a forma de transmissão dos conhecimentos tem apresentado dois grandes desa-
fios, a serem superados: o ensino de massa e a massa de informações, que nos atinges com 
uma velocidade de difícil, para não dizer impossível, absorção. Nessa situação, o professor 
deixa de ser um indivíduo capaz de deter todo e qualquer conhecimento específico sobre 
um determinado assunto. Seguramente, portanto, é na forma de transmissão do conheci-
mento que reside o grande distanciamento entre o ensino e a aprendizagem.
Trata-se de um ponto suficientemente importante para que se faça uma revisão de 
nosso processo didático, inclusive o tipo de aulas ministradas, os exercícios propostos, 
o material preparado, a bibliografia sugerida, o tempo reservado ao aluno, a forma de 
avaliação e o monitoramento do aprendizado. Logicamente, não se pode esquecer a 
limitação dos recursos envolvida nessas questões.
Na FAUUSP, em razão da especificidade de nosso objeto de estudo, temos adotado, 
instintivamente, alguns elementos do modelo não formal, mas ainda estamos muito 
longe do ideal. Por sua especificidade, o projeto de arquitetura e urbanismo, como se 
pôde verificar até aqui, dificulta ainda mais o árduo caminho do aprendizado.
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117
os EsPAÇos como cATEGoRIA REVELAdoRA dos PRojETos 
PEdAGóGIcos dAs InsTITuIÇõEs dE EducAÇÃo suPERIoR
mara Regina Lemes sordi 
josé Roberto merlin
Introdução
Quando se fala em Projeto Político Pedagógico (PPP), uma das dimensões que menos 
têm despertado a atenção dos educadores se refere aos espaços que possibilitam que o 
projeto de formação viceje. Tanto salas de aulas quanto corredores, cantinas, estacio-
namentos, escadas, áreas de convivência e salas de professores expressam algo sobre a 
qualidade do projeto institucional. Basta que superemos nosso analfabetismo na leitura 
desses espaços, preenchendo seus vazios com indagações que permitam entrever o que 
sua arquitetura expõe e o que encobre.
O ato de planejar uma mudança no ensino de graduação capaz de responder aos desa-
fios de uma sociedade submetida a mudanças aceleradas nos remete a uma reflexão acerca 
da concepção de qualidade na educação superior que se quer construir e de para quem essa 
qualidade deve fazer sentido. Em tempos mercadológicos, vence, em geral, a formação 
utilitarista produzida em espaços físicos igualmente cerceadores e convencionais.
Surpreende-nos o comprometimento institucional com a melhora das condições 
de oferta de seus cursos, não sendo incomum forte investimento na ampliação de suas 
instalações físicas. Em nome de uma legítima necessidade de otimização dos espaços 
que interferem na qualidade do ensino de graduação, corre-se o risco de não se chegar 
a uma avaliação mais criteriosa do que deve comportar um espaço para que ele seja 
reconhecido em sua especificidade educativa. Quem se beneficia quando os espaços são 
concebidos de modo a subestimar a especificidade do espaço escolar?
Este estudo pretende examinar a questão dos espaços universitários, assumindo sua 
importância no projeto pedagógico. Pretende problematizar o forte componente infor-
mativo do verdadeiro projeto institucional e verificar que concepção de universidade é 
reafirmada quando se planejam os espaços em que ocorrerão os processos educacionais 
e o quanto essas decisões, aparentemente técnicas, confirmam ou não projetos pedagó-
gicos sintonizados com a formação humana, reagindo ao viés mercadológico.
Trata-se de proceder a um exame multifacetado da situação (espaços), mantendo 
não só a coerência das categorias de análise (concepções de universidade, educação, 
vida universitária) em face dos objetivos ambicionados (formação acadêmica e formação 
118 o LuGAR do PRojETo
profissional), como também a clareza quanto às conseqüências dos caminhos tomados 
(conflito entre educar e instruir).
Até que ponto as formas espaciais existentes ou arquitetadas constrangem e desace-
leram a implementação de projetos educativos inovadores que adotam dinâmicas curri-
culares integrativas e mais ligadas à realidade?
Os espaços educativos formais não devem obstaculizar a formação que se auto-intitula 
transformadora e contemporânea. Um projeto pedagógico não se encerra na sala de aula. 
Rompe com essa artificialidade, que tem gerado tanto desinteresse nos estudantes. Uma 
formação acadêmica de qualidade precisa interagir com as grandes questões sociais e, para 
isso, o alargamento do conceito de aula é inadiável. A universidade deve conversar com seu 
entorno, comprometer-se com a transformação qualitativa das condições de vida das pesso-
as. Em que tempos e espaços ocorrerá a sensibilização dos estudantes para seu papel social, 
se não tomarmos a própria realidade como eixo articulador das experiências educativas?
Para responder ao objetivo de examinar a natureza dos espaços existentes nas ins-
tituições de ensino e refletir sobre seus impactos, tanto visíveis quanto invisíveis, nos 
projetos pedagógicos, à luz de uma determinada visão de universidade e de vida univer-
sitária, dividimos o estudo em duas partes: a) aprendendo a ler a arquitetura dos espaços 
educacionais; e b) efeitos educativos dos espaços no projeto pedagógico e na função 
social da universidade.
Aprendendo a ler a arquitetura dos espaços educacionais 
Chega a constranger a constatação da displicência com que se tratam os espaços, quando 
se pensa em educação. Sua inserção como elemento constitutivo do PPP é subestimada 
pelos gestores e pelos educadores. Ambos encontram severas dificuldades para deman-
dar aos profissionais da área as condições necessárias para que o processo educativo se 
realize a contento na direção sinalizada pelo projeto formativo. Os planejadores dos es-
paços educativos, por sua vez, encontram dificuldades em demonstrar sua sensibilidade 
para a função social do espaço que concebem.
A definição de espaço arquitetônico é controversa. Santos propôs uma definição de 
espaço que angaria a simpatia dos arquitetos:
A partir da noção de espaço como um conjunto indissociável de sistemas de objetos 
e sistemas de ações, podem-se reconhecer suas categorias analíticas internas. Entre 
elas, estão as paisagens, a configuração territorial, a divisão territorial do trabalho, 
o espaço produzido ou produtivo, as rugosidades e as formas-conteúdo. Da mesma 
maneira, e com o mesmo ponto de partida, levanta-se a questão dos recortes espa-
ciais, propondo debates de problemas como o da região e do lugar; o das redes e das 
escalas. Paralelamente, impõem-se a realidade do meio com seus diversos conteú-
dos em artifício e a complementaridade entre uma tecnoesfera e psicoesfera. E do 
mesmo passo, podemos propor a questão da racionalidade do espaço como concei-
to histórico atual e fruto, ao mesmo tempo, da emergência das redes e do processo 
de globalização. O conteúdo geográfico do cotidiano também inclui entre esses 
conceitos constitutivos e operacionais, próprios à realidade do espaço geográfico, 
junto à questão de uma ordem mundial e de uma ordem local (Santos 1999: 19).
119os EsPAÇos como cATEGoRIA REVELAdoRA...
O espaço traz implícitas questões sintáticas, semânticas e pragmáticas. O metro 
quadrado pragmático de “espaço físico” tem uma gramática compositiva que revela a 
semântica cultural: as rugosidades, que são cenários antigos – paisagem e objetos –, e 
as formas-conteúdos que incluem a imaterialidade da estrutura social de cada tempo 
em sua análise. Os “fluxos” socioculturais se materializam em “fixos”, ou seja, espaços 
físicos que deixam ver a organização das forças produtivas e o desenvolvimento tecno-
lógico e estético de determinada organização social. Por ser um conjunto indissociável 
de objetos e ações, o espaço ultrapassa os limites da materialidade e desestrutura o 
conceito viciado de “espaço físico”, usual medida quantitativa na linguagem de edu-
cadores desatentos.
Se nós queremos uma educação realmente inovadora, é necessária uma guinada no 
nosso olhar, para perceber o espaço como síntese de inúmeras variáveis, sobretudo na 
pedagogia, que lhe é implícita como produto social. Isso tem como objetivo desvendar 
o caráter empírico dos objetos que, por exemplo, conformam um cenário concreto em 
iluminação unilateral esquerda e pressupõem que todos os alunos sejam destros, para 
que a luz venha sem sombra da esquerda, excluindo-se os canhotos ou forçando-os a 
escrever com a mão direita. Ora, essa exigência lumínica pressupõe alunos enfileirados 
olhando para frente (quadro-negro), onde um professor fala da matéria a ser “tomada” 
posteriormente pela prova, e todos os destros e obedientes alunos prestando atenção. 
Dito de outro modo, esse “espaço físico” específico preconiza a relação aluno ouvinte 
versus professor falante, ao mesmo tempo que diminui a relação aluno-aluno e outras 
formasrelacionais possíveis em sala de aula.
Se houvesse iluminação zenital uniformemente distribuída, premiaríamos destros 
e canhotos, que suportariam qualquer organização física das carteiras, como círculos, 
meias-luas etc. Do mesmo modo, se tivéssemos paredes-lousa, qualquer organização 
seria viabilizada, tornando seu uso multifuncional e extrapolando o mero registro da 
matéria, além de facilitar comparações entre exposições de diferentes grupos. Ou ainda, 
se as iluminações fossem flexíveis e controláveis, haveria um sem-número de organiza-
ções e audiovisuais possíveis.
O espaço é percebido pelos órgãos dos sentidos em diferentes intensidades e inter-
fere em todos eles. Trata-se de um ato inteligente aproveitar essas características huma-
nas e ajudar a desenvolver a percepção. Pessoas que vivem em espaços mais complexos 
tendem a ampliar a estimulação de seus órgãos dos sentidos e a emular seus cérebros 
mais do que aquelas que convivem em espaços não estimulantes. Com efeito, o espaço 
incita a visão por meio de luminosidades distintas, realçando formas e volumes que 
levam tanto à orientação espacial quanto à contemplação voltada para a fruição estética; 
estimula os ouvidos, pois trata das zonas de barulho e silêncio, que podem estimular ou 
atrapalhar as pessoas; e pode convocar o olfato, ao organizar arbustos perfumados na 
linha do vento ou promover sensações olfativas desagradáveis.
Quais as sensações que os espaços existentes nas chamadas instituições de ensino 
provocam nos estudantes, nos docentes e nos funcionários? Pode o espaço contribuir 
para que a vida universitária seja desfrutada e gere o desejo de encontros coletivos, do 
aprendizado cooperativo e do exercício interdisciplinar do pensar?
Inúmeras normas dispõem sobre a relação “aluno por metro quadrado”, a relação 
área de sala de aula por área de galpão, o formato retangular da sala de aula etc., mas 
120 o LuGAR do PRojETo
convém indicar aqui o fato de que tais normativas trazem, em seu bojo, concepções de 
ensino nem sempre explicitadas. Os exemplos citados nos fazem buscar no espaço uma 
maior flexibilidade de ações e práticas educativas, democratizando o processo de ensino 
para todos os alunos, uma vez que não priorizam gestos ou tendências dominantes, e 
ampliam a possibilidade de que o discurso pedagógico emancipatório encontre nos 
espaços um de seus aliados.
Sabe-se que, hoje, algumas lojas de fast-food usam a cor para facilitar o processo de 
digestão e não fazer de um cliente, supostamente com pouco tempo, um sedentário 
da mesa de refeição. Quando nossas escolas aplicarão em seus espaços procedimentos 
que levem o aluno a gostar da vivência escolar, favorecendo condições ambientais que 
convidem a ficar dentro e fora da classe? Todo e qualquer espaço das escolas pode e deve 
ser explorado como um espaço educativo que confirme uma concepção mais ampla de 
currículo. 
O desenho de nossas universidades leva à fragmentação e os educadores parecem 
não perceber que o espaço é, como nos mostra a história, suporte para diferentes tipos 
de organização social. Na verdade, toda civilização tem uma grande questão caracte-
rística que nos remete aos monumentos arquitetônicos. Os egípcios nos legaram as 
pirâmides, fruto de uma arquitetura sepulcral formulada pelos faraós para transpor a 
vida terrena para a esfera espiritual; os gregos, a acrópole, produto de uma democracia 
de elite pensante cuja base era o escravismo; e os romanos, o Coliseu e as Termas, cujo 
objetivo primordial era o cultivo do esporte e do corpo. Da mesma forma, conhecemos 
as cidades introvertidas e muradas da Idade Média, as cidades barrocas com seus eixos 
e igrejas verticalizadas, clamando e apontando para o céu, e as cidades modernas e suas 
praças, parques e avenidas tentando organizar o caos. Brasília, a nossa capital, festeja a 
República com a construção da praça dos Três Poderes – Legislativo, Executivo e Judici-
ário –, cujo grande vazio serviria para o povo se concentrar e exigir seus direitos, fiscali-
zando os que, momentaneamente, ocupam cargos políticos na administração do país. 
É óbvio que o significado dos espaços depende do uso que se faz deles, e que isso 
também contém marcas históricas, de interesses políticos e econômicos. O fato de os 
espaços universitários estarem sendo produzidos como metros quadrados de constru-
ção, a ser rapidamente concluída para atender às demandas da “clientela”, pode revelar 
sua desumanização. A visão utilitarista da especificidade dos espaços nas instituições de 
ensino pode, portanto, induzir ao esquecimento (involuntário?) de que o espaço abriga 
responsabilidades que transcendem a mera instrução de conteúdos, ou seja, pôr a perder 
o verdadeiro sentido de uma vida universitária: questionar os grandes problemas que 
afetam a sociedade, desenvolvendo nos estudantes-cidadãos o sentimento de responsa-
bilidade com o mundo e com a superação das desigualdades sociais que envergonham 
a humanidade. 
Uma grande praça de encontro, em que fervilhasse a vida, não seria uma grande 
contribuição à formação acadêmica? Por que o desenho das universidades parece mais 
propício à contemplação individualizada do que à vida coletiva? Não seria interessan-
te que todos os atores presentes na universidade pudessem se encontrar e debater as 
questões mais candentes de nossa sociedade? Aqui, importa frisar que há encontros que 
levam a compromissos e encontros meramente físicos, nos quais nada há em comum 
com as relações interpessoais. Vale a pena pensar, pois, em possibilidades de encontro, 
121os EsPAÇos como cATEGoRIA REVELAdoRA...
inseridas no projeto pedagógico, que favoreçam compromissos de vida voltados para o 
aprimoramento social. O espaço arquitetônico do campus, se não conseguir incitar ao 
encontro comprometido, deve ao menos não obstá-lo, ou seja, não pode gerar fragmen-
tos dispersos que impossibilitem, definitivamente, a união dos universitários entre si e 
com a comunidade.
Dito de outro modo, a qualidade do espaço arquitetônico pode auxiliar na dissemi-
nação do conhecimento, pois gravitam em torno dele questões tanto intelectuais quanto 
intuitivas. Se a arquitetura traz consigo informações específicas, sua brevidade conceitu-
al pode estar imbricada a preceitos artísticos, que é outra forma de conhecimento. Com 
efeito, a arquitetura como linguagem não verbal, ligada aos materiais e proporções, é 
uma forma de artefato artístico que pode causar sensações de “estranhamento” próprias 
ao campo da arte. Nessa perspectiva, o espaço deixa de ser “espaço físico”, isto é, algo 
inerte e sem importância, e se torna algo vivo e flexível, componente de uma educação 
contemporânea e criativa.
Ao pensar no “espaço físico”, lembremos que o conceito de espaço deve revelar a ma-
terialidade e explicitar a imaterialidade fruto da cultura como um todo. Em outras pala-
vras, devemos considerar a origem do conceito de escola, que prioriza a troca de conhe-
cimentos – um homem experiente ensinando sob a sombra de uma árvore frondosa –, 
e não um amontoado de armários, corredores e salas de aulas, em que os alunos somam 
créditos e se movimentam mecanicamente, sem a intenção de um encontro social com 
sentido civilizatório. “Nossos gigantescos sistemas educacionais, atualmente sob a for-
ma de instituições, tiveram sua origem nessas pequenas escolas, mas o espírito que lhes 
animou o princípio foi esquecido. As salas exigidas pelos nossos estabelecimentos para o 
aprendizado são estereotipadas e pouco inspiradoras” (Kahn 1964: 66).
Reflexões assim nos fazem temer, uma vez mais, que a simplificação dos processos de 
planejamento e de avaliação dos espaços “físicos” empobreça a formação de nossos jo-
vens. Há conseqüências claras nos projetos educativos que estão ligadas ao estreitamen-
to da concepção de currículo. A educação se confinada na sala de aula ou, o que é pior, 
aprende-se com os espaços existentes, pois temos de admitir que todos os espaços me 
uma instituição de ensino são educativos.O que os atuais espaços físicos universitários 
ensinam por meio de suas formas padronizadas, por meio da diminuição dos espaços de 
convívio humano, substituídos pela priorização de estacionamentos e lojas de conveni-
ência, por meio das estruturas pré-fabricadas que pretensamente devem ajudar a produ-
zir os profissionais do futuro? Haverá futuro, se não interrogarmos a serviço de quem os 
PPP são elaborados e os efeitos que produzem na qualidade de vida das pessoas?
Efeitos educativos dos espaços no projeto pedagógico e na função social 
da universidade
Quando se fala dos PPP, há consenso quanto ao caráter coletivo de sua produção. Pro-
dução compartilhada, co-operada, desde a fase de concepção de seus pressupostos e 
assunção dos marcos referenciais e conceituais, cujo caminho segue em direção das 
decisões operacionais que dão corpo ao conjunto de valores para os quais se construiu 
um acordo e se geraram a implementação e a subseqüente avaliação continuada de seus 
122 o LuGAR do PRojETo
processos. Esse coletivo envolve, portanto, múltiplos atores institucionais e sociais, de-
correndo daí a certeza de que o projeto, mesmo depois de formalmente aprovado, não 
prescinde do olhar e da crítica das pessoas para se manter vivo e produtivo. 
Mas como manter vivo o espírito do projeto, se as pessoas que o produziram não 
podem se encontrar e continuar o processo de sua construção? Isso requer tempo e ou-
sadia, pois deve criar e manter espaços públicos em uma instituição social, cujo planeja-
mento tem sido feito para funcionar como organização social, a chamada universidade 
operacional, que é regida por uma lógica de resultados, tomados como sinônimo de 
eficiência, ainda que questionáveis sob o ponto de vista de sua pertinência social para a 
produção de qualidade de vida para a sociedade.
A quem a universidade pertence, hoje? As respostas a essa questão aparentemente 
convergem para o mercado. A fim de responder aos interesses mercadológicos, a ordem 
é pensar a universidade e sua dinâmica, tanto interna quanto externa, à luz de uma lógi-
ca da eficiência, ou seja, dos espaços públicos a serviço de interesses privados. 
Escolas empresas, arquitetura de encomenda. Proliferam prédios que abrigam cor-
pos expropriados do direito de pensar, induzidos pela fúria mercadológica a desejar 
certificados que não abrigam conhecimentos socialmente relevantes, isto é, resumem-se 
a conteúdos muito rapidamente expostos, pouco problematizados e medidos por exa-
mes que visam comprovar a eficácia dessa universidade operacional. Alunos circulam 
por dependências ditas educacionais que parecem esquecer o fato de que devem acolher 
pessoas. Circulam indiferentes uns aos outros, procurando por salas de aula que ainda 
são reconhecidas como o melhor lugar (único?) para que o conhecimento se transmita. 
Assim, à semelhança dos espaços de shoppings, alunos e professores devem circular, 
de modo que permaneçam submetidos à ditadura dos relógios, isto é, deslocar-se sem 
tempo de parar, olhar, conversar, analisar ou discutir. Vida universitária que não existe 
e que, portanto, empobrece os processos de desenvolvimento humano e profissional. 
Como diz Torres Santomé, “quando falamos de educação com modelos e metáforas 
mercantilistas, as dimensões sociais, éticas e políticas imediatamente passam para um 
lugar muito secundário e, na maioria das ocasiões, nem são mencionadas como preo-
cupações” (2003: 237). 
Nesse embate entre bens privados e compromissos públicos derivados de uma for-
mação crítica, as pessoas sofrem quando reproduzem a lógica dominante e quando 
tentam superá-la. Decididamente, a forma de enfrentar esse “sofrimento dual” pode 
ser favorecida pela recuperação da capacidade de auto-organização. Entendida como 
parte de um projeto educativo necessário à formação do cidadão capaz de produzir uma 
sociedade mais feliz e justa, a auto-organização é quase sempre negada pela arquitetura 
dos espaços das instituições de ensino. 
As instituições de ensino, pretensamente formadoras em seus espaços de sala de aula, 
revelam-se conformadas aos espaços que as circundam e às formas de se relacionar com 
o entorno social. A pobreza que ameaça invadir o espaço universitário é igualmente 
banida, refreada. Apartada fisicamente da miséria social, a universidade tende, cada 
vez mais, a se curvar aos interesses do setor produtivo. Evitar a usurpação dessa função 
social exige esforço coletivo e espaços que abriguem uma reflexão que mobilize reações. 
Para isso, contudo, os espaços coletivos precisam existir, e a globalização cuidou de eli-
miná-los. Bauman é um dos que mostram sinais de degradação dos espaços públicos:
123os EsPAÇos como cATEGoRIA REVELAdoRA...
Por isso um território despojado de espaços públicos dá pouca chance para que as 
normas sejam debatidas e para que os valores sejam confrontados e negociados. 
Os veredictos de certo e errado, belo e feio, adequado e inadequado, útil e inútil 
só podem ser decretados de cima, de regiões que jamais deverão ser penetradas 
senão por um olhar inquisitivo. [...] Não há espaço para os “líderes de opinião 
locais”; não há espaços para a “opinião local” enquanto tal (Bauman 1999: 33).
Formação profissional que não inclui compromisso com a sociedade não é forma-
ção. Trata-se de mero esforço instrucional, incapaz de transformar a realidade social, 
razão pela qual exige, por dever de coerência, que se limpem os projetos pedagógicos 
de compromissos que não se propõem a cumprir de fato. A banalização dos discursos 
pedagógicos de transformação precisa ser enfrentada. Desmascarada. A aula universi-
tária ainda é a unidade-padrão tomada para medir o quanto se ofereceu ao estudante 
de informações devidamente mediadas pela ação pedagógica do professor. Nela, supos-
tamente aprende-se, o que, todavia, parece não ser tão importante, decorrendo daí a 
indiferença em face dos espaços universitários.
A aceleração dos tempos e a compressão dos espaços têm servido para tornar su-
perficiais as relações humanas, à busca frenética de fazer algo para preencher a falta de 
sentido da vida dita pós-moderna. Cabe ressaltar, no entanto, que essa situação provoca 
reações. As pessoas, mesmo quando constrangidas pelos espaços que lhes são oferecidos, 
reagem, atuam e retroatuam nas circunstâncias dadas. Segundo Maffesoli, “para aquém 
e além das formas instituídas, que sempre existem e que às vezes são dominantes, existe 
uma centralidade subterrânea informal que assegura a perdurância da vida em socieda-
de” (1998: 5). Em seguida, esse autor afirma: “Isso nos obriga a repensar a misteriosa 
relação que une o ‘lugar e o nós’, pois, ainda que isso irrite os mantenedores do saber 
institucional, a atribulada e imperfeita vida do dia-a-dia não deixa de produzir um 
verdadeiro co-naissance comum; Aquilo que Maquiavel, sempre tão sutil, chamou de 
pensamento da ‘praça pública” (: 208).
Essa resistência inadiável pode ser favorecida pela recuperação dos espaços de en-
contro das pessoas, notadamente nos espaços universitários, que devem estar, de modo 
imperativo, a serviço da emancipação do homem e do desenvolvimento de sua capaci-
dade de pensar. 
considerações finais
Parece que, ao associar ao planejamento dos espaços universitários as questões de ordem 
política e ética que perpassam o problema, qualificamos os metros quadrados oferecidos 
a estudantes e professores, a fim de que, conjuntamente, o projeto pedagógico formal-
mente existente frutifique. Não há como fazer a leitura interpretativa dos espaços sem 
referenciá-la ao projeto pedagógico vigente. Isso nos obriga igualmente a demandar 
nossa participação na definição dos espaços, verdadeiro exercício interdisciplinar objeti-
vado pelo respeito aos fins educativos que se persegue.
O compromisso com a qualificação dos espaços educativos reclama um esforço de 
aproximação entre os gestores institucionais, os docentes e os arquitetos. Pela prática do 
124 o LuGAR do PRojETo
diálogo interdisciplinar e horizontalizado,seus diferentes olhares e vozes, experiências 
e saberes profissionais e tácitos podem se fecundar mutuamente, produzindo uma ou-
tra concepção de espaço, capaz de cumprir sua função educativa. Nisso, os arquitetos 
podem ser protagonistas. Basta que coloquem sua competência a serviço da produção 
de espaços que reconheçam que os homens aprendem uns com os outros em relação, 
mediados pelo mundo. Este não cabe em uma sala de aula. Por isso, alarguem-se as 
fronteiras dos espaços oferecidos aos estudantes para que aprendam. Que os arquitetos, 
na condição de designers, possam projetar esta imagem de futuro. A educação crítica 
agradece.
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FoRmAR ou InFoRmAR? sobRE o APREndIzAdo do ARquITETo
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Arte: grandeza e dificuldades no aprendizado do arquiteto
Deveria ser uma obviedade afirmar que, na escola, o período de aprendizado do ar-
quiteto é um período de formação. Ainda persiste, contudo, uma expectativa (e, não 
raro, uma exigência velada) de que o aprendiz já traga com ele bagagem (conhecimento 
prévio), tendência ou inclinação que negue o sentido mesmo da existência das escolas 
de arquitetura. Nesse caso, “tendência” e inclinação” seriam fenômenos apenas inatos, 
em que ambiente e cultura em nada interfeririam. Discussões semânticas podem envol-
ver os sentidos das palavras ensinar1 e educar2, separando-as de forma contundente ou 
tornando-as inapropriadas ao significado de formação.
Na universidade, aplica-se mais o termo ensinar, permanecendo educar mais vincu-
lado à vivência doméstica ou aos primeiros anos escolares. O próprio termo, todavia, 
denuncia as escolhas adotadas. Embora algumas vertentes teóricas da arquitetura se 
aproximem de uma pragmática, passados quase dois mil anos, a visão de que a arqui-
tetura está fundada nos saberes artístico, técnico, científico e humanístico ainda pre-
domina e exige uma estruturação do aprendizado que torna imprescindível o exercício 
sensível3. Em outras palavras, o estímulo dos sentidos, advogado desde a Grécia Antiga, 
quando a preocupação com a formação do homem não se limitava ao conhecimento 
e incluía a estruturação da consciência,é tido como algo fundamental no ensino da 
arquitetura. 
Hoje, a educação formal do homem se estrutura em fases chamadas de “fundamen-
tal” “médio” e “superior”, bem como partem do princípio de que todo um processo de 
estruturação da consciência já aconteceu quando o homem chega à idade de dedicar-
se ao aprendizado de uma profissão. Por que, então, a preocupação com os aprendi-
zes de arquitetura, que, em tese, já teriam ultrapassado a fase dos “fundamentos” e se 
1 Ensinar tem o significado de transmitir conhecimento. 
2 Além do sentido de transmitir conhecimento, educar quer dizer cultivar o espírito.
3 Entende-se por formação sensível aquela que permite ao homem ser estimulado em sua com-
pletude, o que também se alcança a partir de uma estimulação concatenada dos sentidos.
126 o LuGAR do PRojETo
encontrariam em um estágio “superior” de direcionamento de sua capacidade para o 
aprendizado da profissão? Esse problema é vário, mas é possível questionar três pontos: 
1) a passagem pelo “ensino fundamental” e “médio” dota o aprendiz de arquitetura da 
condição necessária à fusão dos saberes requerida pela formação do arquiteto? 2) o papel 
da universidade é apenas dar ao aluno o domínio de um ofício? 3) a universidade tem a 
responsabilidade de formar “espíritos” humanos?
O princípio que move estas reflexões é o de que, primeiro, é responsabilidade da 
Universidade formar, e de que formar um arquiteto ultrapassa o conhecimento técnico 
que sabe distribuir as funções de uma habitação ou de uma cidade; domina os conheci-
mentos decorrentes leis da estática, da termodinâmica e da acústica, imprescindíveis à 
qualidade ambiental; e aplica as propriedades dos materiais ao erguer seja uma cidade, 
seja um edifício. Formar um arquiteto corresponde, portanto, a dotá-lo da capacidade 
sensível que o permita não só aprender com mais profundidade os conhecimentos téc-
nicos, como também se tornar apto a desenvolver as habilidades que lhe permitem ir 
além da resolução dos problemas e criar soluções arquitetônicas com os quatro saberes 
que lhe são pertinentes. 
Ironicamente, é justamente no domínio da arte que mais se faz presente a difi-
culdade de uma formação sensível. O próprio significado de “estética” traz consigo o 
fenômeno da sensibilidade. Derivada do grego aisthesis, quer dizer o que é sensível. E se, 
na condição de ciência, a estética pode ser entendida como juízo de apreciação, como te-
oria, contém diversas reflexões vinculadas à capacidade perceptiva do homem, nas quais 
sempre há uma procura pelas características típicas de objetos que, ao serem percebidos, 
provocam o que se chama de “emoção estética”. 
No âmbito da formação do arquiteto, após o fim da Idade Média e o início do 
Renascimento, aprender a projetar4 se tornou o principal foco do labor do arquiteto, 
afastando-o do canteiro de obras. Com o apoio do desenho em perspectiva e, mais 
tarde, o desenvolvimento da imprensa e a facilidade de publicar os muitos tratados de 
arquitetura que foram sendo escritos pelos grandes arquitetos, a valorização da atividade 
projetual5 se tornou o universo do arquiteto, cujo instrumento de trabalho passou a ser 
“imaginar” a arquitetura a ser projetada e apresentá-la por meio do desenho. Isso con-
tribuiu para que seu aprendizado adquirisse status intelectual, até então apenas sentido 
no seio das corporações dos mestres construtores de catedrais, onde, em parte, materia-
lizava-se a “escola”.
Aprender a fazer arquitetura
Nato ou inato? A habilidade artística e a criatividade carregam consigo a questão da 
experimentação e do fazer, e têm na neurobiologia a base científico-experimental, de 
que, ao menos durante os três últimos séculos, prescindiram a filosofia da educação e 
4 Projetar no sentido de intento, desígnio.
5 Vinculada à dimensão do intelecto e distante da “manualidade” do processo adotado pelo 
aprendizado artesão. 
127FoRmAR ou InFoRmAR?
a teoria do conhecimento. Experiências que estimulam os sentidos de pacientes com 
lesões neurológicas, por meio de atividades artísticas, têm demonstrado que o cére-
bro é capaz de refazer seus circuitos neurais6 e de criar compensações para uma vida 
saudável dos pacientes, permitindo tecer hipóteses mais consistentes sobre a evolução 
do homem e seu afastamento dos animais. Essas novas descobertas do cérebro contra-
riam inclusive as afirmativas de que a capacidade cerebral pode ser modificada apenas 
na infância. Por exemplo, duzentos anos depois, a neurobiologia dá credibilidade às 
idéias oitocentistas de Rousseau, segundo as quais “nossos primeiros mestres de filo-
sofia são nossos pés, nossas mãos, nossos olhos”. Assim, ele enfatizou a necessidade de 
uma educação artesã como formade treinar o espírito para habilidades que ultrapas-
sam os campos manual e intelectual, as quais são chamadas hoje de consciência pela 
neurobiologia: “É tempo de aprender a conhecer as relações sensíveis que as coisas 
têm conosco. Como tudo o que entra no entendimento humano vem pelos sentidos, 
a primeira razão do homem é uma razão sensitiva; é ela que serve de base para a razão 
intelectual (Rousseau, 1999: 140–1).
Mas por que as atividades artesãs são importantes para uma formação considerada 
sensível? Qual a relação entre essas atividades e o aprendizado de arquitetura? Vários 
fatores os ligam, mas o principal deles é que, por intermédio da atividade artística, 
os sentidos são estimulados simultaneamente e de forma “concertada”7. Esse tipo de 
estímulo “sensível” permite aos aprendizes modificarem e melhorarem suas capacidades 
perceptivas, intuitivas e criativas. Hoje, de posse das novas tecnologias, como exames 
feitos por meio de ressonância magnética ou emissão de pósitrons, pode-se verificar a 
plasticidade de um cérebro em funcionamento e constatar que as inter-relações entre os 
sentidos permitem o redesenho dos circuitos neurais, aumentando o potencial sensível. 
Muitas descobertas demonstram, além disso, que determinada capacidade, ampliada a 
partir de algum tipo de estimulação sensorial, é atrofiada na ausência desta, comprovan-
do que o cérebro está muito longe de ser um “disco rígido”. 
Vinculada à consciência, à percepção e, inevitavelmente, à emoção, a atividade 
artística depende de uma interação orgânica (neuroquímica) entre cérebro e corpo 
que garante o funcionamento dos sentidos após ser acionada por eles: o ambiente age 
sobre o organismo de diversas maneiras, e isso de dá, entre outras maneiras, por meio 
da estimulação da atividade neural dos olhos, dos ouvidos e das terminações nervosas 
localizadas na pele, nas papilas gustativas e na mucosa. Esse grande “sistema de infor-
mação e gerência do corpo” abrange o conhecimento tanto inato quanto nato, razão 
pela qual é possível adquirir estratégias de raciocínio, de seleção e de comportamento, 
6 Circuito neural se refere aos neurônios. Estes são as células nervosas do organismo essen-
ciais para produzir os movimentos e as atividades cerebrais. Existem bilhões de neurônios 
no cérebro humano, organizados em circuitos que os cientistas chamam de regiões corticais 
interligadas. Tais regiões que formam sistemas e, em níveis mais elevados, sistemas de sistemas. 
O intrincado de sistemas comunicantes é denominado rede neuronal. Para maiores esclareci-
mentos ver Damasio (1996; 2000). 
7 Esse termo é adotado para expressar a forma integrada – como o é uma orquestra – em 
que interagem os sentidos humanos, estimulados pelos fatores neuroquímicos e ambientais 
(Damásio 1996).
128 o LuGAR do PRojETo
desde a raiva e o simples gesto de um abraço até a expressão artística, como tocar um 
instrumento, cantar ou pintar. De acordo com Damásio, os meios neuroquímicos 
pelos quais cérebro e corpo interagem são constituídos de “nervos motores e senso-
riais periféricos que transportam sinais de todas as partes do corpo para o cérebro e 
do cérebro para todas as partes do corpo [...]. Outra via é a corrente sanguínea, que 
transporta sinais químicos, como os hormônios, os neurotransmissores e os neuromo-
duladores” (Damásio 1996: 95).
As máximas aristotélicas da centralidade intelectual afastaram os arquitetos do Re-
nascimento do processo de aprendizado “manual” – cuja sala de aula era o canteiro 
de obras, apesar da limitada investigação teórica, em que as ferramentas eram apenas 
a geometria e os experimentos – e relegaram ao esquecimento processos – o aprender 
fazendo, o fazer com as próprias mãos, as viagens de estudo, para conhecer e criticar 
as arquiteturas de que se tinha notícia etc. –, cujo desaparecimento das estruturas de 
aprendizado representa uma perda que repercute, até hoje, nas dificuldades de apreen-
são espacial, nas amarras intuitivas dos aprendizes e nos fundamentos áridos dos “méto-
dos de ensino” adotados pelas escolas.
Formação atual. Formação sensível?
Em síntese, pode-se dizer que hoje, em um processo iniciado com uma mudança de 
perfil, a estrutura de formação do arquiteto é quase livresca. Muitos motivos têm levado 
a isso: primeiro, a absurda separação entre os instrumentais técnico e o artístico; segun-
do, o tratamento do instrumental técnico como algo teórica, com pouca ou nenhuma 
experimentação; terceiro, o ambiente destinado à prática – a sala de aula, sob a forma 
de “ateliês” – quase não instigar o senso arquitetônico. Graeff dizia que:
processo de alienação crescente na gênese das arquiteturas se agrava muito quan-
do a escola de formação de novos arquitetos passa dos ateliês dos artistas plásticos 
para as academias. Agrava-se a alienação porque essa transferência significa um 
distanciamento ainda maior do aprendiz, em relação ao canteiro de construção. 
[...] Uma teia de exigências e rituais burocráticos vai envolvendo o aprendiz, até 
transformá-lo em mero aluno passivo de professores que nem sempre dominam 
o ofício (Graeff, 1995: 130).
A separação entre teoria e prática dificulta ainda mais o processo não apenas de edifi-
car, mas de uma prática projetual que ignora a arquitetura como matéria, pois deixou-se 
de “experienciar” o seu fazer, apoiando-se, entre outras coisas, em uma visão equivocada 
do significado de ciência. Essa visão é observada em estruturas universitárias que co-
bram a separação entre teoria e prática não como sistematização de um conhecimento 
adquirido, e sim como forma de quantificar a sua “produção científica”. Enquanto isso, 
professores continuam a exigir do aluno, em sala de aula, uma criatividade advinda de 
uma capacidade inata.
Pode-se constatar que, de um lado, o próprio aprendiz carece de instrumental para 
estimular sua capacidade sensível e, de outro, que faltam ao professor de arquitetura 
meios para transmitir seu saber e, principalmente, de saber fazer aflorar nos alunos sua 
129FoRmAR ou InFoRmAR?
própria capacidades de perceber e de fazer arquitetura. Com algumas exceções, o profes-
sor de arquitetura não está preparado para ser professor. Enquanto, anos atrás, ele era um 
profissional atuante, o arquiteto-professor, que conseguia, mesmo diante de dificuldades 
de ordem didática, mostrar um como fazer baseado na experiência, hoje a situação é 
mais grave, pois os professores têm cada vez menos a experiência do fazer. Mesmo que 
tenham títulos de mestre e de doutor, os professores-arquitetos recebem conhecimentos 
mais detalhados em alguma área específica da arquitetura e do urbanismo, mas não um 
aprendizado de como ser professor, umas vez as pós-graduações em arquitetura e urba-
nismo não estão voltadas para esse fim. 
 Mesmo na Europa, em que a história escrita existe há mais tempo do que em países 
como o Brasil, a formação do arquiteto continua distante do experimento e do canteiro 
em que a arquitetura deixa de ser idéia e se transforma em matéria. Com isso, vem 
sendo perdido o saber edificar, o domínio do material construtivo, dos sistemas que 
estruturam a edificação, das condições ambientais necessárias à iluminação e ao con-
forto térmico e acústico, entre muitas outras condições físico-espaciais que participam 
da arquitetura. E, paradoxalmente, vem sendo perdida a capacidade de projetar – alvo 
das grandes transformações do papel do arquiteto, desde o Renascimento – em razão da 
quase inexistência da experiência, da capacidade de antever/sorver/rever o espaço cria-
do, tanto em suas nuanças e detalhes quanto no todo organizado, e também de antever/
sorver/rever a harmonia entre as partes e dimensões, entre as aberturas e composições, 
sejam elas internas ou externas aos espaços criados.
A realidade com que a escola se depara, e da qual nem sempre está consciente, 
é que a arquitetura não pode ser reduzida a um objeto artístico, como um edifício 
ou uma cidade, ou a uma análise puramente racional. Dito de outro modo,não 
se deve partir do princípio de que, por meio de processos metodológicos despro-
vidos da dualidade entre conceber e fazer, é possível aprender a fazer arquitetura. 
Carente, a estrutura de formação do arquiteto permanece vinculada a um sistema 
de disciplinas em que, no primeiro ano, dá-se ao aluno um conhecimento fugaz 
das Belas Artes e, nos quatro ou cinco anos seguintes, lhe é cobrado um “talento” 
que, de acordo com a lógica desse sistema, deveria já lhe pertencer ou ter aflorado 
desde o primeiro ano. Depois do primeiro ano, lápis e papel ou mouse e tela em 
branco (ou em preto), tudo se passa como se o organismo dos aprendizes fossem 
“armários”, nos quais são guardadas as suas sensibilidades e, a qualquer momento, 
eles podem buscar “inspiração” para desenvolver, “talentosamente”, seus projetos. 
É evidente que existem situações mais críticas do que outras nas estruturas curri-
culares atuais, mas, via de regra, é mais ou menos assim que acontece (ou não) o 
ensino-aprendizado.
A avaliação que se pode fazer desse já longo episódio da história da formação dos 
arquitetos é que ela se tornou, paulatinamente, uma atividade antipedagógica em que 
o aluno recebe, sem espaço para questionamentos, o que a Escola denomina de ensi-
namentos. Da estrutura atual, à luz de uma reflexão baseada tanto nas neurociências 
quanto na filosofia da educação, o artefato da memorização é o mais estimulado, pade-
cendo a arquitetura de um destrinchar-se em um sem-número de disciplinas, cada uma 
das quais com conteúdos enormes e distintos que separam, de maneira drástica, o que 
deveria ser integrado. 
130 o LuGAR do PRojETo
Aprendiz de arquiteto e artesão
A neurobiologia diz que o organismo humano tem se mostrado como o único capaz 
de elaborar sínteses e integrar saberes. Então, por que forçá-lo negativamente com mil 
informações desvinculadas, em vez de estimulá-lo no que tem de grandioso? O homem 
teria evoluído sem essa capacidade de síntese? Ademais, a construção de tal formação é 
mais difícil – desenvolver, no aprendiz, as capacidades de perceber, intuir e criar – por-
que, ao contrário do que ocorre em outras disciplinas, trata-se de fenômenos difíceis de 
mensurar e transmitir pela palavra.
Na linguagem corrente, “sensível” é tanto a pessoa que tem aptidão para alguma for-
ma de arte quanto aquela emotiva. No âmbito da filosofia, o sensível está vinculado ao 
que pode ser percebido pelos sentidos ou ainda ao que provoca sentimentos afetivos, só 
que, por estar vinculado aos sentidos, tem sido entendido, desde Aristóteles, como algo 
distinto da razão, já que corresponde a experimentar sensações e conhecer intuitivamen-
te. Apenas recentemente, começou a haver outro entendimento do como funcionam 
razão e emoção, bem como de sua indissociabilidade. 
Com base em experimentos sobre o funcionamento do cérebro e as interações entre 
suas áreas, cmo as investigações de cientistas como Damásio e Eccles, é preciso defender 
o crescimento sensível do ser humano. Como afirma Damásio, mente, comportamento 
e cérebro formam uma triangulação de funcionamento; consciência e emoção não são 
separáveis e a consciência não é um monólito. Já Eccles diz que essa interação é um pro-
cesso de reciprocidade: tanto recebe quanto dá, alterando o desempenho do cérebro. 
Assim, poder-se-ia dizer que a mente autoconsciente está, de fato, ajudando a 
moldar os circuitos de memória, o armazenamento de memórias no cérebro. Esse 
estoque de memórias não fica simplesmente à disposição de todos os estímulos 
perceptivos imediatos; está também à disposição da totalidade do mundo sensí-
vel, percebido, e do mundo do pensamento e da imaginação que é o nosso eu 
(Popper & Eccles, 1992: 67–8). 
Observando-se isso sob a ótica neurofisiológica, torna-se mais clara a compreensão 
de por que treinar, de forma estruturada, habilidades artísticas em pessoas com deficiên-
cias neurológicas pode fazer com que elas consigam expressar capacidades não afloradas; 
e de por que a experimentação, no âmbito do aprendizado de arquitetura, é importante, 
embora seja necessário alertar que, nessas experiências, além de técnicas apuradas de 
estimulação, atua a capacidade de motivar o aprendiz e compartilhar seu processo de 
aprendizado, algo que deveria estar presente tanto nos médicos em relação a seus pa-
cientes quanto naqueles que assumem o ofício de professor (Sacks, 1997). 
A interação cerebral que vem sendo verificada, em muitas experiências laboratoriais, en-
tre os sistemas vinculados ao movimento dos dedos, dos braços, dos olhos e da cabeça, e os 
sistemas visual e auditivo quase sempre apresenta a possibilidade de ampliar a percepção 
espacial, por meio da estimulação desses sentidos ou por atividades cerebrais compensatórias 
no caso de lesões neurológicas. Essa interligação começa, pouco a pouco, a ser verificada em 
várias situações. Por exemplo, quando, ante a ausência de funcionamento do sistema auditi-
vo, o cérebro elabora compensações que fazem com que outras áreas, vinculadas aos sistemas 
visuais e motores, assumam o comando daquelas que deveriam ser efetuadas pelo sistema 
131FoRmAR ou InFoRmAR?
auditivo. Nesses casos, e isto é extremamente interessante para a investigação da formação 
sensível, a neurobiologia tem constado que os surdos-mudos, se devidamente apoiados pela 
estimulação dos sentidos e a linguagem dos sinais, têm a sua capacidades de percepção espa-
cial muito ampliada, ultrapassando aquela de pessoas com ouvidos atentos. 
Ao restar a confecção da arquitetura à engenharia, desenhar passou a ser a principal 
ferramenta do arquiteto no processo de projetar, ao menos até a invenção dos sistemas 
computadorizados. Além da visão e do tato, o desenho envolve os sistemas auditivos e 
motores. Experiências laboratoriais com o movimento ocular têm demonstrado a ocorrên-
cia de diferenças no tempo e na orientação da movimentação do olho e da cabeça, quando 
se acompanha um objeto móvel que é seguido de som. Essa cooperação sensorial:
aciona uma estrutura peculiar do cérebro: o colículo superior, essencialmente uma 
máquina biológica que permite reconhecer os objetos em movimento e identificar 
sua novidade com base em índices multissensoriais. Ele guarda, então, segredos im-
portantes sobre a forma como o cérebro realiza a fusão multissensorial e a extração 
de sinais pertinentes. Controla, entre outros comportamentos, as reações de orien-
tação e evitação, e é um magnífico exemplo de estrutura, a um só tempo sensorial 
e motriz, guiando a execução e a correlação de movimentos realizados por diversos 
efetores, como os olhos, a cabeça, o tronco, os membros (Berthoz 2001: 86–7). 
O colículo superior recebe informação de múltiplas estruturas cerebrais, sobretudo 
as visuais, as proprioceptivas e as acústicas. Isso explica o quão importante é, para a 
formação sensível desejada, desenhar “de próprio punho”.
Paralelamente, a Neuropsicologia da Música informa que muitas pesquisas feitas 
com imagem por ressonância magnética vêm comprovando que “o córtex cerebral dos 
músicos contém, em certas zonas, um número de neurônios mais elevado do que em 
sujeitos que não são músicos” (Lechevalier, 2003: 286). Essas pesquisas esclarecem, por 
exemplo, a profunda interligação entre as atividades musicais e a percepção espacial, 
vinculando-as a uma acentuação das áreas que envolvem os movimentos dos dedos. 
Schlaug notou que 
A prática prolongada da música pode propiciar uma adaptação estrutural e fun-
cional do cérebro. [...] Quanto mais cedo se pratica a música, mais ela influencia 
o cérebro da criança, cujos elementos constituintes são muito adaptáveis. O cór-
tex motor, o corpo caloso (hipertrofiado nos músicos) e o cerebelo têm grandes 
possibilidades de adaptação com a prática musical (Schlaug, 2001: 285).
Nesse caso, é preciso frisar que a neurobiologia já dispõe de evidência de que a plas-
ticidade do cérebro não finda com a infância, quando ela é maior. Na realidade, embora 
não se conheça uma mensuração dessesfatos neurobiológicos, estudos científicos regis-
tram uma redução da capacidade plástica do cérebro com o correr da idade, bem como 
sua permanência na idade adulta, estando diretamente dependente da potência com 
que o corpo humano é submetido a estímulos. 
A experimentação por meio de atividades artísticas é, portanto, fundamental para 
estimular as capacidades de que necessita o arquiteto. Envolve todos os sentidos, a pon-
to de causar a modificação das ligações neuronais responsáveis pela capacidade humana 
de perceber, emocionar-se, intuir e criar. 
132 o LuGAR do PRojETo
universo difícil... mas instigante!
Trata-se de um universo de investigação de meios que permitam a formação sensível 
do arquiteto. É preciso propiciar, no sistema de ensino-aprendizagem das escolas de 
arquitetura, uma estrutura mais alargada, em que a experimentação seja fundamental e 
instrumentos estimuladores dos sentidos humanos não permaneçam apenas pragmati-
camente voltados para o ato de projetação. Tal alargamento pode garantir ao aprendiz 
um aumento de sua sensibilidade, repercutindo em potenciais ações criadoras e con-
tribuindo, inclusive, para uma revisão dos métodos de ensino-aprendizagem baseados, 
ainda hoje, em uma ótica predominantemente professoral. 
A vinculação à neurobiologia, evidente apesar de os cientistas confessarem que ainda 
se conhece pouco o funcionamento neurofisiológico humano, mostra que mesmo o que 
já se sabe não está sendo assimilado com a devida rapidez pelas ciências do aprendiza-
do. Em relação ao aprendizado de arquitetura, a estrutura curricular básica que rege o 
funcionamento das escolas de arquitetura do Brasil ao menos não tem sido refratária 
às descobertas da neurobiologia, campo de saber apenas aparentemente distante do 
domínio da arquitetura. 
Entre os aspectos que se referem ao aprendizado de arquitetura, urge enfrentar três 
mais evidentes: a) o fato de que, ao longo do tempo, o aprendizado da arquitetura se 
distanciou, geração após geração, do aprendizado artesão e da necessidade de conhecer 
e refletir sobre suas implicações e motivos, para que se tenha sobretudo uma noção mais 
aproximada das perdas e ganhos efetuados com esse atual paradigma e suas incidências 
na fisiologia humana; b) a mudança das responsabilidades do profissional arquiteto, 
cada vez menos envolvido com a confecção dos espaços e volumes edificados, e mais 
dedicado à concepção, sem perceber o que esse distanciamento acarreta para a própria 
concepção; e c) a estreita inter-relação entre a emoção e o uso dos sentidos humanos 
– visão, audição, tato, olfato, paladar, intuição e movimento – e as capacidades necessá-
rias ao domínio da arquitetura. Todos estes precisam, evidentemente, estar em constan-
te comparação com as estruturas de formação atualmente encontradas na maioria das 
escolas de arquitetura. 
133FoRmAR ou InFoRmAR?
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135
A PRÁTIcA do EnsIno dE PRojETo E A consTRuÇÃo 
dos sAbEREs do PRoFEssoR ARquITETo 
Rosilaine André Isoldi
maria Isabel da cunha
Introdução
Como professoras universitárias da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universi-
dade Federal de Pelotas (FAUrb/UFPEL) e do Centro de Ciências Humanas da Univer-
sidade do Vale do Rio dos Sinos, nós nos questionávamos a respeito do que é necessário 
saber para ensinar projeto e arquitetura e urbanismo. Aliás, essa era uma inquietação que 
acompanhava uma de nós há bastante tempo, desde a época de estudante. Ao contrário 
de algumas profissões que possuem o seu campo de conhecimento bem delimitado, a 
profissão de professor, principalmente do professor que atua no ensino superior, não apre-
senta essa delimitação de maneira clara. De acordo com Gauthier e outros, a formalização 
de saberes necessários à execução de determinada tarefa é uma das condições essenciais à 
profissionalização. A profissão de professor, apesar de estabelecida socialmente há muito 
tempo, tem particularidades que dificultam a definição dos saberes nela envolvidos. Isso 
gerou, ao longo do tempo, uma série de idéias preconcebidas, como as de que, para ser 
professor, bastaria apenas conhecer o conteúdo a ser ministrado, possuir talento ou “dom”, 
seguir a intuição e ter experiência ou cultura. Mas será mesmo que, para ser professor, isso 
basta? O fato de dominar conteúdos específicos de determinada área do conhecimento 
define, por si só, a eficácia do processo ensino-aprendizagem? Quais são as habilidades e as 
atitudes mobilizadas no exercício docente? As pessoas já “nascem” sabendo ser professores? 
Há um repertório de conhecimentos próprios ao exercício docente? Que repertório é esse, 
como ele se constrói? Afinal, qual é o saber1 necessário ao exercício da docência e qual o 
significado desse saber para o ensino de arquitetura e urbanismo?
Buscou-se a resposta para esses questionamentos em uma pesquisa realizada no 
âmbito do Mestrado em Educação da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), cuja 
síntese pretendemos apresentar neste artigo. Em primeiro lugar, não podemos deixar 
de dizer que se tratou de uma investigação situada historicamente, e que tínhamos 
1 Saber, de acordo com Japiassu (1979), tem um sentido mais lato que o de conhecimento, e 
inclui aprendizagens de ordem não só teórica e intelectual, como também prática (saber-fazer, 
saber técnico).
136 o LuGAR do PRojETo
consciência de que seus resultados seriam sempremarcados pelo contexto político-
social que foi seu palco. Ao centrar a atenção no saber de professores arquitetos, 
não negamos a existência de outros fatores que participam da realidade do ensino 
superior. Além disso, não quisemos ver o professor isoladamente, e sim focalizar um 
dos aspectos dessa realidade como forma de delimitar a área de estudo e viabilizar o 
desenvolvimento da pesquisa.
metodologia: em busca de um caminho para identificar os saberes dos 
professores
Optamos por realizar uma pesquisa qualitativa em um estudo de caso na FAUrb/
UFPEL, onde atuamos como docentes. Foram os próprios objetivos da pesquisa que 
apontaram para a utilização do método qualitativo de investigação. A escolha desse 
método se deu, principalmente, pelo interesse em estudar o professor dentro de seu 
contexto, tendo como base suas memórias, idéias, significados e percepções. Como 
professoras, interessava-nos, em particular, desvendar os saberes envolvidos na prática 
dos arquitetos e urbanistas, e, em especial, na prática de ensino da disciplina de Projeto. 
Assim, ao delimitar como área de investigação a FAUrb/UFPEL, optamos por realizar 
um estudo de caso. Segundo Lüdtke e André (1986), o caso se destaca porque se cons-
titui em uma unidade dentro de um sistema mais amplo. O interesse, assim, consiste 
no que ele tem de único, próprio, singular, mesmo que, posteriormente, semelhanças se 
tornem evidentes com outros casos e situações.
Ao buscar estudar o professor em seu contexto de trabalho, partimos da investi-
gação das memórias, experiências e histórias de vida de oito professores arquitetos e 
dez alunos. Consideramos que esses sujeitos e seus olhares se constituíam em fontes 
importantíssimas e privilegiadas para o estudo, a compreensão, a análise e a reconsti-
tuição de práticas e saberes envolvidos no processo de ensino-aprendizagem da arqui-
tetura e do urbanismo. A técnica escolhida para a coleta de dados foi a de entrevistas 
semi-estruturadas. Segundo Ludke e André (1986: 11), a entrevista é um dos princi-
pais instrumentos na pesquisa de natureza qualitativa, em especial a semi-estruturada, 
na qual não há uma imposição rígida de questões, permitindo-se ao entrevistado 
discorrer sobre o tema proposto, o que possibilita a captação imediata e corrente das 
informações desejadas.
As entrevistas se constituíram em uma conversa com objetivos, que, segundo Mi-
nayo, é “uma conversa a dois, feita por iniciativa do entrevistador, destinada a fornecer 
informações pertinentes para um objeto de pesquisa, e entrada (pelo entrevistador) em 
temas igualmente pertinentes com vistas a este objetivo” (1992: 108). Essa modalidade 
de entrevista pode ser incluída no que se vem chamando, na pesquisa em ciências so-
ciais, de “história oral”. Queiroz revela a importância da utilização do relato oral como 
uma fonte de dados valiosos, principalmente em estudos de caso, em que se busca reve-
lar aspectos singulares da realidade em questão (Queiroz 1987: 273). 
Optamos, igualmente, por manter sob sigilo o nome dos entrevistados, a fim 
de não causar nenhum tipo de constrangimento e de obtermos as informações que 
desejávamos com maior tranqüilidade. Dessa forma, definimos um caminho para 
137A PRÁTIcA do EnsIno dE PRojETo E A consTRuÇÃo...
desvendar quais são os saberes do professor arquiteto e urbanista, compartilhando a 
idéia de Ferrer Cerveró de que “a reconstrução da experiência virá da reconstrução do 
relato” (1995: 185).
o saber evidenciado: a prática do professor arquiteto e urbanista na 
disciplina de Projeto
Foi possível perceber, à medida que se “desenharam” os dados da pesquisa, que a análise 
das práticas dos professores, vista sob a ótica de seus protagonistas, poderia fornecer 
importantes indícios para a solução das indagações que tínhamos no início de nossa 
pesquisa. Gimeno Sacristán afirma que “o conhecimento sobre a educação, ao explicar 
a realidade cultural, social, psicológica, as ações passadas e presentes, tem de contar e va-
lorizar as práticas dos sujeitos” (1998: 161–2). Quando pensamos em avaliar os saberes 
dos professores, isso situa a ação como o tema central a ser debatido.
Mas o que é a prática docente? Apesar de não haver um vocabulário unitário entre 
os pesquisadores, há o entendimento de que a prática educativa adota formas diversas, 
especializando-se em cumprir funções particulares dentro de contextos específicos. Uti-
lizamos aqui a idéia de Gimeno Sacristán, de acordo com a qual:
prática são ações rotineiras próprias de um grupo; prática educativa é o produto 
final de um processo histórico e praticar será sempre atuar em um marco de uma 
tradição, a partir da qual os profissionais adquirem o conhecimento prático que 
poderão aperfeiçoar (1998: 88).
Assumimos, assim, a idéia de que o princípio de “toda a atividade prática tem, por 
trás de si, a orientação de algum tipo de conhecimento” (Gimeno Sacristán, 1998: 121), 
tornando-se imperativa a análise das práticas dos professores entrevistados, a fim de 
perceber nestas os saberes envolvidos.
o olhar dos professores de projeto sobre sua prática
Os professores foram solicitados a caracterizar as práticas de ensino na disciplina Projeto 
Arquitetônico e Urbanístico. Para organizar as informações e facilitar o entendimento, 
buscamos pontos comuns nos dados obtidos. Para isso, estabelecemos algumas catego-
rias, sempre levando em consideração os elementos mais significativos encontrados nos 
relatos das práticas de ensino de projeto dos professores. Essas categorias não apresenta-
ram fronteiras rígidas. Ao contrário, foi difícil estabelecer limites entre elas; a preocupa-
ção em construí-las se deveu à tentativa de sistematizar os dados coletados.
1) Papel do professor: os professores entendiam como fundamental o papel do pro-
fessor de Projeto. Para eles, a principal função do docente é orientar e coordenar as 
atividades desenvolvidas. As atividades eram tidas como “organizadas e compartilhadas 
entre alunos e professores” (professor G). O professor deve organizar, planejar e atuar 
como um potencializador das atividades, no sentido de verificar novas possibilidades, 
direcionamentos, avanços e retrocessos em um processo de constante atualização des-
138 o LuGAR do PRojETo
sas atividades. Assim, os professores se referiram a um “conjunto trabalhando, onde 
cada um exerce o seu papel” (professor G). O papel do professor é não o de um mero 
espectador do trabalho do aluno, e sim de um dos protagonistas da ação em sala de 
aula. Foi possível notar que os entrevistados buscavam atuar também como provocado-
res, instigando e questionando os alunos, ou, conforme o professor F, “descobrindo o 
lugar no aluno que abre para ele fazer a pergunta”. Para os professores, o ensino eficaz 
deve, “de alguma forma, despertar o interesse do aluno” (professor A), razão pela qual 
o aluno deve ser “fisgado” (professor F). Ainda segundo os docentes, quando o aluno é 
“fisgado”, ou quando o professor consegue despertar o seu interesse para os conteúdos 
da disciplina, estabelece-se um vínculo entre professores, alunos e conteúdos, criando-se 
um ambiente positivo na aula, com a participação de todos. 
2) Relação professor-aluno: segundo os professores, deve ser uma relação bastante pró-
xima, de companheirismo e parceria, envolvida por uma forte “dose” de afetividade. Os 
professores revelaram que nem sempre é possível obter êxito nessas relações e que “se deve 
ter a humildade de saber que não se vai agradar a todo o mundo” (professor A). Nessa 
categoria, identificamos também a valorização da participação do aluno na sala de aula. 
Os professores, ao falar da sala de aula como um espaço compartilhado, “onde há um 
conjunto trabalhando” (professor G), parecem se afastar da idéia de que são o centro do 
processo de ensino-aprendizagem, assumindo a possibilidade de “aprender com os alunos” 
(professor F). Em suma, a busca em compartilhar o espaço educativo revela a importância 
dada por esses professores à participaçãodo aluno no processo de ensino-aprendizagem. 
3) Organização do trabalho em sala de aula: um primeiro aspecto comentado pelos 
professores foi a importância de planejar as atividades. Os professores revelaram procu-
rar, ao máximo, preparar as atividades e os conteúdos trabalhados em sala de aula. Isso, 
no entanto, não quer dizer que as atividades ou conteúdos não possam ser modificados, 
em razão dos interesses dos alunos ou no transcorrer das atividades. Trata-se de algo 
possível, esperado ou, como disse o professor G, “algo que se combina”. Os professores, 
no entanto, revelaram a importância de oferecer “a proposta e esperar contrapropostas, e 
aí começar a trabalhar nesse diálogo, formulando...” (professor C). Trata-se, pois, de ter 
um planejamento flexível, ou seja, de equilibrar planejamento e imprevisibilidade. Os 
professores também indicaram a importância de respeitar as vivências e os saberes dis-
centes, utilizando essa “bagagem” para criar ambientes de aula e dar maior significação 
aos conteúdos trabalhados. Revelou-se aí outro aspecto nessa categoria: a importância 
da comunicação com os alunos e com o conteúdo. Essa comunicação deve buscar con-
teúdos e exercícios elaborados com base em situações reais, vinculadas à prática, a fim 
de que aconteçam mais naturalmente, além de valorizar a participação e a bagagem de 
experiências dos alunos. Ainda nessa categoria, pudemos perceber que os professores 
procuravam exercer a prática docente com seriedade e compromisso. 
A seriedade é, além disso, um indicador de respeito ao aluno, de sua participação, de 
valorização do ambiente e do momento único em que a sala de aula se constitui. Nota-
mos, nos professores, a tendência de aumentar os momentos de orientação e trabalho 
coletivo, bem como de diminuir os assessoramentos individuais. Suas falas revelaram 
propostas de realização de trabalhos em grupo e a preocupação de “tratar as questões 
coletivas do conteúdo da disciplina de maneira coletiva, pois o atendimento pessoal é 
para questões pessoais” (professor G). 
139A PRÁTIcA do EnsIno dE PRojETo E A consTRuÇÃo...
Os professores afirmaram, também, que o planejamento das atividades e a progra-
mação das aulas, na disciplina de Projeto, é de suma importância, uma vez que acredi-
tam que o professor não deve ficar somente à espera do trabalho do aluno “para ‘malhar’ 
em cima daquilo que ele fez” (professor C). Assim, foi possível perceber que, ao abrir 
mão dos assessoramentos individuais e se preocuparem com o preparo de conteúdos e 
atividades específicas da disciplina de Projeto, eles procuravam igualmente “fugir” da 
modalidade de ensino chamada popularmente de “consultório sentimental” (professo-
res C e E).
4. Conteúdo da disciplina: notou-se a ênfase na organização e na sistematização dos 
conteúdos da disciplina de Projeto. A insatisfação com o modo de ver o projeto como 
uma disciplina sem conteúdo foi o principal motivo apontado pelos docentes para as 
mudanças no ensino que realizavam e cuja inovação fundamental era o trabalho com 
conteúdos teóricos. Afinal, como disse o professor C, “o aluno não precisa reinventar 
a roda e o fogo, tem conteúdos que podem ser trabalhados sem ‘cercear’ a criatividade 
do aluno”. O professor pode “se antecipar e ministrar conhecimentos específicos para 
o cara não precisar apanhar tanto” (professor B). Além disso, pode-se perceber a não 
existência, entre os docentes, da preocupação de “cercear” a criatividade do aluno, uma 
vez que se baseavam na idéia de que projetar é uma atividade que se desenvolve e que “se 
pode aprender a projetar” (professor E). Consideraram “indispensável” (professor G) a 
contribuição do professor no ensino de Projeto.
5. Avaliação: tida pelos professores como um momento difícil de suas práticas, uma 
vez que envolve aspectos subjetivos e exige a definição de critérios que situam o profes-
sor diante do “dilema” de julgar o trabalho do aluno. Como disse o professor G, “embo-
ra seja muito dolorido, o professor tem o papel de fiscal da qualidade da coisa”. Em seu 
conjunto, os professores indicaram que a avaliação deve ser um momento construtor de 
ensino e de aprendizagem, e só assim se justifica, isto é, tem “razão de ser” (professor D). 
Percebeu-se que a importância da avaliação para os professores estava na possibilidade 
de recuperar conteúdos, de realimentar e analisar o que foi realizado, além do papel tra-
dicional de aprovar ou reprovar os alunos. Os professores consideraram a avaliação um 
aspecto polêmico da disciplina de Projeto e identificaram o fator subjetivo como uma 
dificuldade na realização de avaliações. Assumiram que a avaliação em Projeto é sub-
jetiva, mas advertiram que, ainda assim, na é “misteriosa, perseguidora e não compre-
ensível” (professor G). Os professores, ao contrário, identificaram que ela é ou deveria 
ser “absolutamente compreensível” (professor G), revelando-se indispensável “trabalhar 
muito a escrita, o texto” (professor D), porque “dá para escrever a avaliação no papel” 
(Professor G). Segundo eles, é possível objetivar a subjetividade da avaliação. Nesse sen-
tido, as tentativas que vinham realizando com as avaliações apontavam, principalmente, 
para o comentário no coletivo da disciplina, em busca de compartilhar informações 
sobre dúvidas, insatisfações e aprendizagens em relação ao conteúdo trabalhado. 
Ao fazer a análise dessas categorias da prática de ensino de Projeto, percebemos que 
os professores não apontaram para uma maneira única de ensinar a disciplina, tendo se 
referido a “maneiras de ensinar Projeto” (professor D) e afirmado que existe um longo 
caminho a seguir na discussão dessas práticas. Confirmamos uma “nova” possibilida-
de de trabalhar com a disciplina, para a qual projetar é uma atividade que pode ser 
aperfeiçoada e desenvolvida, e que, para isso, necessita da aplicação de conhecimentos 
140 o LuGAR do PRojETo
arquitetônicos. Os professores salientaram que o trabalho com conteúdos teóricos na 
disciplina não é contrário à idéia de trabalhar a produção do aluno, pois isso é inerente 
às disciplinas. Advertiram, porém, que, na “perspectiva funcionalista” (Martínez, 1990: 
90), o aluno produz “algo” a partir do “nada”. Os docentes, em suma, propuseram a 
realização de uma prática de ensino que englobe a produção de um projeto pelo aluno, 
com o auxílio de conteúdos arquitetônicos, formulados e transmitidos em aulas expo-
sitivas e exercícios com objetivos definidos, em um processo conjunto e sistemático de 
construir conhecimentos. 
o olhar dos alunos sobre as práticas de ensino de projeto
A participação dos alunos na investigação foi fundamental para a análise da prática pe-
dagógica dos professores arquitetos na disciplina de Projeto. Tornou-se possível conhe-
cer essas práticas segundo o olhar do outro ator presente do processo ensino-aprendi-
zagem. As informações obtidas foram organizadas em dois grandes grupos: experiências 
positivas e experiências negativas no ensino de projeto.
a) Experiências negativas: os alunos relataram algumas características de suas expe-
riências mais negativas em projeto, e os principais pontos em comum foram: a) pouca 
sistematização e preparação dos conteúdos e das atividades a serem desenvolvidas na 
disciplina; b) orientações individualizadas, dependentes somente do trabalho do aluno 
e dotadas de uma visão muito negativa e pouco construtiva por parte do professor; 
c) pouca integração entre trabalhos (projetos) urbanos e arquitetônicos; d) ensino calca-
do na maneira como os professores tinham aprendido, conforme a sua maneira de pro-
jetar ou ainda, de acordo com o aluno I, “porque este é o jeito de ele fazer e não porque 
o aluno estava, de repente, aprendendo uma coisa a mais”; e) avaliação incompreensível 
e com ênfase nos aspectos negativos dos trabalhos; f ) pouca integração da disciplina 
com as demais disciplinas do Curso; e g) distanciamento entre aluno e professor.
A análise desses relatos confirmou a afirmação feita pelos professoresde que existem 
práticas de ensino de projeto nos moldes do “ensino funcionalista” (Martínez, 1990: 
90). Os próprios alunos perceberam que um ensino baseado nessa lógica, em que “ser 
arquiteto é ser um gênio” (aluno A), prejudica bastante o processo ensino-aprendiza-
gem. Em relação à disciplina Teoria e História da Arquitetura, as experiências negativas 
foram caracterizadas, de maneira geral, por: a) pouca discussão e análise dos conteúdos; 
b) aulas maçantes e pouco dinâmicas; c) ênfase nos conteúdos de história em detrimen-
to dos de teoria; d) pouca empolgação dos professores; e) disciplinas estruturadas em 
seminários; f ) muito “xerox”; g) trabalhos desinteressantes; e h) pesquisas realizadas sem 
muita contribuição do professor e feitas de “forma mecânica” (aluno F), com pouca 
análise no coletivo da disciplina.
b) Experiências positivas: apesar de as falas dos alunos enfatizarem as experiências 
negativas, pôde-se perceber a existência de outras significativas na trajetória dos alunos 
entrevistados. As experiências positivas de projeto, segundo os alunos, foram aquelas 
em que os professores realmente “ensinaram projeto” (aluno C) e identificaram as suas 
características: a) trabalho com conteúdos arquitetônico básicos; b) planejamento das 
atividades a serem desenvolvidas em aula; c) desenvolvimento gradual dos projetos; 
141A PRÁTIcA do EnsIno dE PRojETo E A consTRuÇÃo...
d) discussão dos trabalhos no coletivo da disciplina; e) trabalhos em grupo e individuais; 
f ) orientação dos trabalhos feita tanto individualmente quanto no coletivo; g) avalia-
ção contendo aspectos positivos e negativos do trabalho; h) objetivos claros a serem 
atingidos; i) professor com postura mais flexível, sem impor apenas as suas idéias; e 
j) professor que “era empolgante” e “participava na disciplina com o aluno, que tinha 
‘humildade’, flexibilidade, era dedicado e tinha percepção das necessidades do aluno e 
percebia o momento de intervir” (aluno A).
A análise dos relatos confirmou que as experiências de ensino de projeto que estavam 
sendo realizadas pelos professores, em uma perspectiva diferente do modelo tradicional de 
ensino, foram, segundo a opinião dos alunos, as experiências mais positivas em suas trajetó-
rias. Consideramos isso um bom indício para os professores que vêm inovando e apostando 
na possibilidade de concretizar um “novo ateliê de Projeto” (Martínez, 1990: 92).
os saberes do professor arquiteto e urbanista
A análise dos dados obtidos sugere que os saberes utilizados pelos professores em sua 
prática são, na verdade, um saber plural (Tardif e outros 1991: 218). Esses saberes, 
segundo os professores, correspondem a “um patamar mais ou menos estável2, compos-
to pelas habilidades do professor, sua visão de mundo, sua vida fora da universidade” 
(professor F) e “sua postura político-ideológica” (professor C). Apresentam certo grau 
de flexibilidade e transformação relacionado com o conteúdo específico das discipli-
nas trabalhadas, e exigem do professor a utilização de um “instrumental diferenciado” 
(professor D) na realização de sua práticas de ensino. Foi possível perceber, portanto, 
que os professores arquitetos entrevistados se utilizavam de “didáticas específicas” (Lu-
carelli, 1995: 64) tanto para o trabalho na disciplina Teoria e História da Arquitetura 
quanto da disciplina de Projeto, mas estruturavam suas práticas segundo a orientação 
de saberes, sem influenciar “demasiadamente” os conteúdos específicos das disciplinas 
que, como sugeriu o professor G, “eram mais ou menos estáveis por um determinado 
período de tempo”.
Na pluralidade de saberes revelada pelos sujeitos da pesquisa, observaram-se quatro 
grandes grupos, dos quais os três primeiros conferem com aqueles citados por Tardif 
e outros: saberes de formação profissional docente3, saberes das disciplinas, saberes da 
experiência e saberes de outras origens. Nesse último grupo, identificaram-se outros 
dois tipos de saber não abordados pelos autores pesquisados, que chamamos de “saberes 
próprios da profissão de arquiteto e saberes decorrentes da aproximação com o campo 
de conhecimento da educação” (1991: 219).
2 Esse patamar, indicado pelos professores, parece constituir o que Shulman (1987: 21) entende 
como a base de conhecimento do professor, ou o que Gauthier e outros (1998: 28) indicam 
como reservatório de conhecimentos de que o professor se utiliza em situações concretas de 
ensino.
3 Esses saberes são denominados por Tardif e outros (1991: 218) como saberes de formação 
profissional. Utilizamos o termo docente para não confundir com formação profissional de 
arquiteto.
142 o LuGAR do PRojETo
a) Saberes de formação profissional docente: são aqueles transmitidos por institui-
ções específicas de formação de professores que não só informam sobre questões rela-
tivas ao ensino, como também propiciam contato com referenciais do campo de co-
nhecimento da educação. Apesar de não terem contato com tais saberes, os professores 
fizeram referência à sua importância para a prática docente. 
b) Saberes decorrentes da aproximação com o campo de conhecimento da educação: 
próprios da área, obtidos por meio de experiências de assessoria pedagógica, treinamen-
to de professores ou cursos na área de pós-ingresso na docência, permitindo o contato 
com referenciais específicos da educação e auxiliando na reflexão sobre o ensino e na 
objetivação dos saberes dos professores.
c) Saberes das disciplinas: são sociais, difundidos pela instituição universitária e cor-
respondem a diversos campos de conhecimento, sob a forma de disciplinas que indicam 
a qualificação do professor para o exercício da sua atividade, fornecem aos alunos infor-
mações sobre determinado tema e auxiliam no cumprimento da profissionalização, que 
é um dos papéis do ensino universitário.
d) Saberes da experiência: desenvolvidos na prática cotidiana dos professores, possi-
bilitam a interpretação, a compreensão e a orientação da sua prática. Entre esses saberes, 
estão: a) a postura do professor: realizar sua prática de ensino com seriedade e compro-
misso; assumir o papel de professor; participar do processo de ensino-aprendizagem; 
ser já; r estar consciente de suas incertezas, de seu inacabamento; b) a relação com os 
alunos: respeitar o educando e seus saberes; dialogar com os alunos; querer bem aos es-
tudantes; c) o trabalho em sala de aula: valorizar a participação e a produção do aluno; 
equilibrar o planejamento das atividades e a improvisação; propor exercícios a partir de 
situações vinculadas à prática; realizar um ensino questionador, desafiador, dialógico; d) 
a profissão de professor: ensinar é formar, aprender, ter esperança, gostar do que se faz; 
e e) os saberes próprios à profissão de arquiteto: decorrentes do exercício da profissão 
de arquiteto, auxiliam no ensino de aspectos práticos da profissão e na atualização de 
assuntos específicos da área.
conclusão
No relato dos professores, pôde-se perceber que a construção de seus saberes depende 
muito da prática, mas não de qualquer uma delas. Para objetivar os conhecimentos 
adquiridos em sua prática pedagógica cotidiana, informaram a necessidade de passar 
por momentos de reflexão: “na ação e sobre a ação” (Shön, 1992: 63). A primeira é uma 
análise que o indivíduo realiza após a ação, ao passo que a segunda ocorre nas interações 
com a experiência e resultam em formas repentinas e não antecipadas, pelas quais se vê 
a experiência de maneira diferente.
Conclui-se que os docentes, em uma relação de enfrentamento com “limites” im-
postos pelo contexto, buscam realizar suas práticas de ensino e constroem vários sabe-
res que se constituem nos fundamentos de sua competência profissional. Os saberes 
envolvidos na docência englobam, portanto, saberes de várias origens, que consti-
tuem a base para o seu exercício profissional. Tais saberes foram classificados em cinco 
grupos: de formação profissional docente; decorrentes da aproximação com o campo 
143A PRÁTIcAdo EnsIno dE PRojETo E A consTRuÇÃo...
de conhecimento da educação; das disciplinas; da experiência; e próprios à profissão de 
arquiteto.
O saber do professor, ou melhor, os saberes do professor arquiteto e urbanista e sua 
construção nos foram revelados, bem como o significado que eles têm. Esse significado 
parece incluir a possibilidade de formação e o aprimoramento contínuo dos professores, 
a possibilidade de imprimir melhoras à qualidade do ensino de arquitetura e urbanismo 
e do ensino superior; e a possibilidade de encontrar o caminho “mais curto” para profis-
sionalização docente. Em suma, os professores tornam o seu saber pedagógico um saber 
plural, permeado pela emoção e em constante formação. Como disse Virgínia Ferrer 
Cerveró, “A formação é chegar a um ponto que não se conhece”.
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145
cRÍTIcA E AVALIAÇÃo no EnsIno do PRojETo ARquITETônIco: 
subsÍdIos PARA umA dIscussÃo nEcEssÁRIA
Elvan silva
Introdução
Usualmente, quando se fala em ensino, seja de projeto arquitetônico, seja de qual-
quer outra disciplina, pensa-se apenas na etapa de transmissão de conhecimentos ou na 
oferta de elementos de um determinado repertório; a avaliação é encarada como outra 
etapa, desvencilhada do processo pedagógico. Em algumas situações, vê-se a avaliação 
como certo gênero de cobrança, como se o processo didático fosse uma espécie de em-
préstimo a ser amortizado. Quando se fala em verificação da aprendizagem, aborda-se 
algo já separado do aprendizado propriamente dito. Nas disciplinas convencionais, em 
que há correspondência invariável entre questões e respostas, sabemos que o educando 
deve, na avaliação, demonstrar que assimilou o conteúdo ministrado, cabendo-lhe o 
papel de protagonista no processo, enquanto ao examinador compete apenas atribuir 
um grau ou conceito que corresponda ao aproveitamento observado.
Há dois aspectos dignos de atenção nesse fenômeno. O primeiro diz respeito à aca-
lentada possibilidade de quantificar, de maneira precisa, o aproveitamento, por meio de 
um procedimento estatístico em que da proporção de acertos deriva o grau atribuído, cuja 
variação se dá dentro de uma escala em que o acerto de todas as questões é representado 
pelo grau máximo. O segundo aspecto concerne ao fato de que o processo de avaliação 
não implica, necessariamente, a correção das eventuais respostas erradas que tenham sido 
consignadas. Isso vale para tanto para a matemática quanto para a botânica, a história ou 
a fisiologia dos batráquios. A condição para a validade desse processo é a existência de um 
campo disciplinar caracterizado pela relação necessária entre pergunta e resposta.
Esse, no entanto, não é o caso da avaliação no ensino do projeto arquitetônico. 
Mesmo que se queira caracterizar a tarefa projetual como a resolução de um problema, 
não se pode pretender que nesse campo ocorra a relação necessária e excludente entre 
pergunta e resposta. À diferença das disciplinas do gênero exemplificado acima, um 
exame ou prova de projeto arquitetônico não admite, em princípio, a confecção de um 
gabarito, isto é, de uma tabela com as respostas corretas e excludentes para as questões 
formuladas, passível de ser conferida por qualquer pessoa. Dito de outro modo, não há 
a possibilidade de atribuir um grau ou conceito de aproveitamento de modo preciso e 
146 o LuGAR do PRojETo
impessoal; a aferição, nesse caso, não será a aplicação de uma fórmula estatística. Conse-
qüentemente, é possível que examinador e examinando venham a divergir sobre o grau 
ou conceito outorgado. A avaliação da obra arquitetônica ou, no caso aqui examinado, 
do projeto arquitetônico se consubstancia na emissão de um juízo de valor. Mesmo que 
este seja representado por uma posição numérica, em uma escala finita, a avaliação con-
tinua sendo um juízo de valor: excelente, bom, regular, insuficiente ou insatisfatório. 
Em essência, portanto, a avaliação do projeto arquitetônico, no contexto de ensino, é 
uma questão de opinião, já que esta é a natureza de um juízo de valor.
O ensino do projeto arquitetônico não é a única modalidade que se enquadra em tais 
circunstâncias. Sempre que as respostas cabíveis a uma determinada pergunta não guar-
dam a necessária relação a que se alude acima; sempre que a solução de um problema 
comporta a variedade que se espera da capacidade de criar; sempre que o componente 
surpresa ou inovação é cabível; e sempre que o equacionamento de um problema passa 
pela opinião ou pela emissão de um juízo de valor, estamos diante da impossibilidade 
de aplicar um gabarito e atribuir graus ou conceitos precisos e objetivos. No ensino de 
filosofia ou de composição musical, o que conta é a filiação doutrinária, a opinião ou 
o gosto dos interessados. Via de regra, não é possível, nesses âmbitos, falar em certo ou 
errado, exato ou inexato, pois estas não são categorias do gosto ou da opinião.
No aspecto pedagógico, tal situação é indesejável. Em uma disciplina que admite 
sem restrições o gabarito, é possível sustentar a atribuição de grau ou conceito de modo 
impessoal, sendo suficiente correlacionar o número de acertos com o número de ques-
tões, sem que caiba ao examinando protestar contra um resultado que decorre necessa-
riamente dessa correlação. Sendo assim, diz-se que o aluno obteve grau “n” na prova. Já 
na disciplina Projeto Arquitetônico, é usual a noção de que o professor Fulano reprovou 
o aluno Beltrano ou atribuiu o conceito “x” ao aluno Sicrano.
A problemática da avaliação no ensino do projeto arquitetônico
Naturalmente, tal situação só pode ser evitada quando não ocorre a reprovação na disci-
plina considerada, ou quando a eventual reprovação advém da não entrega do trabalho, 
do excesso de faltas etc. Como não existe um seguro contra a reprovação, é compreen-
sível que tanto discentes quanto docentes persigam modos de diminuir a incidência de 
desacordo na emissão dos juízos de valor a que se fez referência acima. Tal preocupação 
se manifesta na solicitação, por parte dos alunos, da divulgação de “critérios claros e 
objetivos” e na tentativa, por parte dos professores, de estabelecertais critérios, na con-
vicção de que, desse modo, a avaliação seja efetivamente impessoal.
Na realidade, o estabelecimento desses critérios exige, com freqüência, a definição 
prévia do que se entende como avaliação, pois se trata de uma prática pedagógica que 
envolve certa complexidade. Se o assunto fosse, por exemplo, a avaliação em uma disci-
plina como Resistência dos Materiais, essa complexidade, se existisse, estaria no conteúdo 
propriamente dito e não no escopo do processo de avaliação, que seria sempre a aferição 
do conhecimento assimilado pelo aluno. Como vimos, no caso do projeto arquitetôni-
co, a dúvida pode começar na incerteza sobre avaliar o aluno ou o trabalho. Embora a 
maioria dos observadores diga que se trata de avaliar o trabalho, ou de avaliar o aluno por 
147cRÍTIcA E AVALIAÇÃo no EnsIno do PRojETo ARquITETônIco
intermédio do trabalho, existem aqueles que dirão que trata-se de avaliar o aluno, sendo a 
avaliação do trabalho deste apenas um meio de acesso ao objetivo em jogo. Tal concepção, 
todavia, é visivelmente ambígua e não conduz a nenhum itinerário conclusivo; por isso, 
o entendimento da maioria de que se trata de avaliar o aluno por meio de seu trabalho é 
aquele que oferece as perspectivas de desenvolvimento e implementação mais fecundas.
Se o processo de avaliação pretende aferir o aprendizado do estudante, deve-se ca-
racterizar qual é o conteúdo ou repertório envolvido. O que é ensinado na disciplina 
Projeto Arquitetônico? Existe, efetivamente, um conteúdo chamado Projeto Arquitetô-
nico? Não. Se existisse, haveria a possibilidade de aplicar provas discursivas, inclusive 
com gabaritos. Sabemos que isso é totalmente impraticável. O que se pretende avaliar 
no exercício do projeto arquitetônico é uma competência e não um mero repertório. 
A aferição dessa competência só pode ser feita a partir da materialização de seu resulta-
do, ou seja, da produção do projeto, ou melhor, da simulação da produção do projeto.
Há, de fato, um repertório envolvido. De forma sucinta, pode-se dizer que o propósito 
essencial do ensino institucional da arquitetura, e não apenas do projeto arquitetônico, 
é a transmissão de duas teorias: a teoria da produção arquitetônica e a teoria da excelência 
arquitetônica. Esses dois corpos de conhecimento viabilizam e dão conteúdo à práxis da 
disciplina, sem a qual uma arquitetura erudita não se caracteriza. A teoria da produção 
arquitetônica diz respeito aos procedimentos envolvidos tanto no processo de concepção 
quanto no processo de materialização do objeto arquitetônico; a teoria da excelência arqui-
tetônica, por sua vez, trata da qualidade do objeto arquitetônico. As duas teorias consti-
tuem o invólucro e o recheio da competência acima mencionada; buscar-se-ão, no trabalho 
apresentado pelo aluno, evidências de que as duas teorias foram assimiladas não por sua 
memorização discursiva, e sim por sua incorporação imagética na proposta.
A questão seria banal se não se apresentasse um primeiro problema: as duas teorias se 
expressam discursivamente, enquanto sua aplicação tem natureza imagética. Por exem-
plo, enquanto no âmbito de projeto estrutural o problema e a solução são veiculados 
por meio de linguagem matemática, na arquitetura o programa é expresso em conceitos 
textuais e a proposta de solução, em termos de alternativas formais ou, mais precisa-
mente, na representação gráfica de tais alternativas. Cotejando número com número 
ou aplicando um algoritmo, posso verificar o acerto de uma solução proposta para um 
problema estrutural; na projetação arquitetônica, como se certificar que a determinado 
conceito abstrato, como “aprazibilidade”, corresponde uma determinada configuração 
formal que existe apenas como proposta representada? Nesse caso, a avaliação de teor 
do potencial resolutivo da proposta depende da capacidade do examinador de enxergar 
nesta a aptidão para configurar os atributos desejáveis, já que esses atributos só se mani-
festarão em sua forma propriamente dita, e não em sua representação. Tal capacidade é 
inculcada pela experiência ou familiaridade com o tema, vale dizer, por conhecimento 
de causa. Também aqui não se aplica o conceito de gabarito.
A irrelevância dos esforços para a matematização do processo de avaliação
Um esforço no sentido de atenuar o problema acima descrito é representado pela tenta-
tiva de matematizar a atribuição de graus e conceitos. Pretende-se isso por intermédio 
148 o LuGAR do PRojETo
da elaboração, por exemplo, de um inventário de requisitos que devem ser satisfeitos 
pelo projeto, de modo que se possa aplicar o critério de correlação: se foram enuncia-
dos, por exemplo, n requisitos, a proporção de requisitos satisfeitos determinará o grau 
outorgado. Tal procedimento parece ser preciso e impessoal, mas não o é.
A primeira dificuldade desse procedimento advém da precariedade dos critérios 
para a ponderação dos requisitos. Pode-se, por exemplo, convencionar que todos os 
requisitos de um determinado programa têm a mesma importância e igual valor para a 
ponderação. Se, hipoteticamente, arrolam-se em um programa de uma clínica geriátrica 
cem requisitos, entre os quais um é a existência de elevador, pode-se chegar ao absurdo 
de considerar que um projeto que satisfaça 99 desses requisitos, exceto a previsão do ele-
vador, merece a nota 99 em uma escala de zero a cem. Naturalmente, nenhum docente 
ou arquiteto discordará da afirmação de que esse critério é absurdo e indefensável. Por 
sua vez, a ponderação diferenciada, em que se atribuem pesos diferentes aos requisitos, 
também resultará em malogro, pois esse empreendimento não pode ser levado a cabo 
sem arbitrariedade. No hipotético projeto de uma residência unifamiliar, será possível 
afirmar, de maneira categórica, que a insolação aconselhada vale dez pontos, a vista da 
paisagem, três pontos e a concentração das instalações hidráulicas, um ponto?
Na realidade, tal critério até poderia ser circunstancialmente defendido, desde que 
fosse relativizado de maneira ostensiva e deixada patente sua arbitrariedade intrínseca, 
ou seja, a tarefa projetual acadêmica estaria sendo caracterizada com um exercício ou 
jogo, para o qual se estabeleceriam, previamente, certas regras. Deve ficar muito claro 
o fato de que, em uma situação real, semelhante ponderação dificilmente se expressará 
em uma equação ou soma exata, pois será ordenada por fatores afetivos, não suscetíveis 
a uma matematização. Designamos como fatores afetivos aqueles que determinam es-
colhas não demarcadas por fundamentos racionais ou pragmáticos, baseadas na relação 
custo-benefício, etc. Aliás, é justamente o teor afetivo do fenômeno da identificação 
do indivíduo com os atributos do objeto arquitetônico que determina a complexidade 
do conceito de excelência na arquitetura. A própria verificação da satisfação ou não de 
um determinado requisito depende na natureza afetiva da avaliação dos atributos. Em 
uma teorização superficial, pode-se conceber uma notação binária para tal verificação: o 
requisito é satisfeito ou não; o edifício tem elevador ou não. Em muitos casos, todavia, 
faz-se necessária a aferição da intensidade com que um determinado requisito é satis-
feito, em uma escala nem sempre discreta, ou seja, com intervalos representáveis por 
números inteiros. Por essa razão, torna-se difícil atribuir a um trabalho o grau 7,38 e a 
outro 7,39; esse procedimento responde apenas à necessidade da escrituração ou regis-
tro do desempenho acadêmico, não significando que o segundo trabalho seja superior 
ou mais meritório de o primeiro.
Algumas instituições, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 
aboliram a escala númerica de zero a dez ou de zero a cem, e estabeleceram o quadro de 
conceitos de desempenho, representados, para efeitos de registro, por letras: “A”, “B”, 
“C” etc. Tais conceitos traduzem uma hierarquia, em que se agrupam os desempenhos 
em classes: “excelente”, “bom” ou “regular”. Mesmo assim, persiste em inúmeras

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