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M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 1 INTRODUÇÃO Os glomérulos são estruturas corticais do rim, dentro dos néfrons (unidade funcional). Pode estar em localização justamedular: está no limite entre as regiões, mas ainda está no córtex Componentes dos glomérulos: cápsula de Bowman, capilares glomerulares (enovelados e anastomosados), membrana basal glomerular (sustenta o endotélio) e mesângio Cápsula de Bowman: folheto parietal (epitélio de revestimento externo do espaço urinário), epitélio visceral (revestimento interno da cápsula) e espaço urinário (espaço entre os folhetos) o Podócitos: constituem o folheto visceral; os pés dos podócitos entram em contato íntimo com a membrana basal glomerular (fica entre os podócitos e endotélio) o Espaço urinário = espaço de Bowman Capilares são revestidos por endotélio Mesângio: constituído por células mesangiais intraglomerular e matriz mesangial; de localização central do tufo o As células têm função de defesa, por meio de macrófago o Sustenta o tufo capilar e participa da regulação do fluxo sanguíneo, por meio da contração de suas células que respondem a agentes neuro-humorais (angiotensina II) o IMPORTANTE: célula mesangial, matriz mesangial e endotélio tem contato íntimo entre elas, não há nada as separando Barreira de filtração glomerular = endotélio + membrana basal + célula parietal Filtro glomerular é isotônico e praticamente sem proteínas Função primordial: filtração do sangue, para formar urina. Muitas coisas que são filtradas, são reabsorvidas ao longo dos túbulos, saindo pela urina, no final, só o que não deve ficar no corpo Colorações feitas na MO para análise de glomérulo: HE PAS: cora colágeno em vermelho o Colágeno está na capsula de Bowman, membranas basais das arteríolas o Avalia proteínas Tricômio de Masson: colágeno de sustentação cora em azul, normalmente é discreto o Colágeno denso caracteriza fibrose Impregnação pela prata (PAMS): cora as membranas basais (da cápsula de Bowman, do capilar) em preto Para diagnósticos: MO + imunofluorescência (IMF) + ME (se disponível) Se enviar para imunofluorescência, usar solução específica de Michel M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 2 Doença glomerular pode ser aguda, subaguda ou crônica. Podem ser primárias (lesão relacionada com alterações glomerulares, idiopática ou não) ou secundárias (agressão do glomérulo por doenças sistêmicas) Apresentação clinica aguda e/ou crônica. Saber a apresentação clínica é importante para raciocinar e definir a hipótese diagnóstica e conduta Apresentações clínicas: síndrome nefrítica (aguda), síndrome nefrótica (crônica) e síndrome nefrítico-nefrótica (subaguda, mista) Classificação das glomerulonefrites: Difusa = mais de 50% dos glomérulos acometidos (micro com 10 glomérulos). Focal = menos de 50% (micro com 20 glomérulos) Segmentar = menos de 50% do tufo capilar comprometido. Global = mais de 50% SÍNDROME NEFRÍTICA Glomerulopatias agudas: Proliferações GNDA Glomerulonefrite crescêntica Quadro clínico e laboratorial: Hematúria o Hemácia que sai no EAS, se for de glomérulo doente tem formato alterado (dismórfica, fica cilíndrica) HAS de início agudo/recente (atenção para indivíduos jovens) Diminuição da creatinina (diminuição da função renal, lesão renal aguda) Oligúria (< 400ml/dia), volume urinário diminuído o Anúria (< 50ml/dia, grave, se dirigir ao PS) Edema localizado em MMII ou facial, devido à retenção de Na+ e água Proteinúria não nefrótica (<1g/24h), discreta ou moderada Tipos de lesões glomerulares Lesões agudas = proliferação de alguma célula → SINDROME NEFRÍTICA o Proliferação epitelial (parietal e visceral) o Proliferação endotelial o Proliferação mesangial Matriz mesangial e mesangio NÃO proliferam, células mesangiais SIM. Quem prolifera é célula! o Proliferação mesangial e endotelial, devido ao contato entre elas, causa diminuição da luz dos capilares glomerulares. Com isso, sangue tem dificuldade para passar, diminui a filtração glomerular e volume urinário = oligúria o Filtrando menos, sobra mais sangue dentro do vaso, com isso, aumenta o volume circulante dentro do vaso, aumentando o debito cardíaco e causando aumento da pressão sistêmica = hipertensão arterial volume- dependente (hipertensão secundária) o Protótipo (caso clássico) de síndrome nefrítica por proliferação mesangio-endotelial (ou mesangio-capilar): glomerulonefrite difusa aguda Glomerulonefrite proliferativa difusa aguda (GNDA) Mais comum: pós estreptocócica (faringite, amigdalite, pele) → Streptococcus β-hemolítico e Staphylococcus aureus o Aparece após 7-15 dias da infecção, tempo necessário para formar anticorpos e imunocomplexo o Estimulo antigênico > resposta humoral > fixação de complemento > recrutamento de macrófagos > exsudato de neutrófilos > inflamação aguda Incidência maior em crianças e adultos jovens, causando hipertensão Proliferação de células mesangiais e endotélio Presença de neutrófilos entre as alças. Não tem lesão da membrana basal do capilar (MICRO) Imunofluorescência positiva: depósito granular difuso e global sobre alças capilares e mesângio de C3 (do sistema complemento, complexos proteicos que ajudam o sistema imune a combater os agressores) o Hipocomplementemia o Classificada por IC circulante Normalmente tem resolução benigna e espontânea - controlar a pressão e função renal M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 3 Glomerulonefrite crescêntica (GNC) → se enquadra dentro de glomerulonefrite rapidamente progressiva (síndrome de etiologia variada caracterizada por sd. nefrítica + insuficiência renal grave) Crescentes = proliferação extra-capilar do epitélio parietal da cápsula de Bowman, fibrina e células inflamatórias (macrófagos e linfócitos T) Formação de crescentes > lesão e ruptura de alças capilares glomerulares > passagem de fibrina e monócitos para o espaço de Bowman > proliferação de células parietais, acumulo de macrófagos, colágeno, fibroblastos e linfócitos T no espaço urinário > formação dos crescentes o Crescente pode evoluir para fibrose caso não tratado adequadamente o Fibrocelular = subagudo o Fibrose = crônico Lesão glomerular caracterizada pela presença de crescentes difusas, com rápida queda da função renal e instalação de insuficiência renal grave → Espaço urinário é fechado! o Oligúria/anúria o Hipertensão arterial o Crescentes comprimem os capilares, resultando em isquemia glomerular e interferem na filtração (causa IR) Proteinúria variável (pode ocorrer a níveis nefróticos) Processo idiopático em 50% dos casos, mas pode ser evolução de lesões agudas, crônicas ou doenças sistêmicas Imunofluorescência: o Tipo I: tem anticorpos anti-membrana basal do capilar, imunoglobulina contra componente da membrana (autoimune, AcAnti-MBG. Depósito linear difuso de IgG e C3 em alças glomerulares → IMF positiva Síndrome de Goodpasture: glomerulonefrite por AcAnti-MBG e acometimento pulmonar (hemorragia, masculino, entre 20-30 anos) o Tipo II: doenças sistêmicas, deposita no rim e forma crescente. Depósito granular de imunocomplexo → IMF positiva o Tipo III: negativa ou pauci-imune, aparece nas vasculites que acometem os glomérulos. Sem depósito → IMF negativa Em geral, há necessidade de terapia substitutiva definitiva (diálise ou transplante) M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 4 Sinal de mau prognóstico: crescentes ≥ 80%, sinais de cronificação, rupturas frequentes da cápsula de Bowman e membrana e necrose ou trombose nas alças capilares IMF de Síndrome de Goodpasture SÍNDROME NEFRÓTICAGlomerulopatias crônicas: Doença de lesão mínima Glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) Glomerulonefrite membranosa Glomerulonefrite membrano-proliferativa (subaguda) Quadro clínico e laboratorial: Proteinúria maciça/nefrótica: ≥ 3-3,5g/24h (adulto) o Proteinúria maciça ≥ 50 mg/kg/dia (criança) o Proteinúria normal = 150 mg Anasarca: devido à proteinúria nefrótica o ↓ pressão oncótica do plasma e hipofluxo sanguíneo > vasoconstrição da arteríola aferente > ativação do SRAA > aldosterona liberada > retenção, mas por estar com pouca proteína não consegue reter e líquido fica acumulado no terceiro espaço/interstício, mesmo com ativação do SRAA Dislipidemia (hipercolesterolemia): fígado tenta compensar perda da albumina, produzindo mais proteína, inclusive as lipoproteínas (aumenta colesterol e triglicerídeos) o Lipidúria Hipoalbuminemia: < 3,0 g/dL Hipercoagulação: tendência à trombose da veia renal por perda de antitrombina III na proteinúria Aumento do risco de infecção: devido à perda de imunoglobulinas Hematúria não é obrigatório Doença de lesão mínima Lesões são identificadas APENAS na ME, lesões nos podócitos o MO: glomérulos normais o Imunofluorescência negativa o ME: retração e fusão dos pedicelos dos podócitos, degeneração podocitária - podocitopenia Mais comum na criança (2-6 anos) o Criança com edema generalizado (“QP: ganhando peso”) Causa mais comum de síndrome nefrótica em adultos (nos idosos) – pensar em síndrome paraneoplásica Remissão completa em mais de 90% dos casos, as vezes espontaneamente o Benigna o Função renal preservada, sem hipertensão arterial e hematúria o Mas é recorrente, com remissão completa também nas recorrências Corticossensível Sem perda da função renal Biopsia renal não é necessária para fechar diagnóstico M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 5 Glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) Acomete qualquer faixa etária, mais comum nos adultos jovens Mais frequente na raça negra Corticorresistente Tem lesão de podócito (podocitopenia, mesma da lesão mínima) + esclerose glomerular Hipertrofia glomerular o Hipertrofia glomerular > lesa podócitos e endotélio > hiperfiltração glomerular > acúmulo de macromoléculas (proteínas) no mesângio > depósito de matriz extracelular > esclerose glomerular Com perda de função renal o Tende a progredir para insuficiência renal terminal, necessitando de terapia renal substitutiva Pode ser primária (sem causa, predisposição), hereditária, secundária (a HAS, DM, doenças virais, drogas licitas ou ilícitas, rim com alteração de sobrecarga hemodinâmica - obesidade, rim único, hidronefrose com pielonefrite crônica) o Envolvimento genético, fator circulante, teoria hemodinâmica x sobrecarga Achados: o MO: expansão da matriz mesangial, presença de depósitos hialinos, formação de sinequias (aderência do tufo capilar a cápsula de Bowman), obstrução dos capilares glomerulares o ME: mesmas alterações da MO, retração dos pedicelos dos podócitos o Imunofluorescência positiva: depósitos de IgM e fator C3 do complemento com distribuição segmentar e focal Na GESF primária, os primeiros glomérulos acometidos são os justamedulares o Individuo jovem com síndrome nefrótica e biopsia renal cortical normal não afasta GESF Proteínas (podocina e nefrina) têm formação genética anormal: não consegue fazer a ligação entre as membranas podocitárias, deixando a ancoragem frágil e permeabilidade glomerular alterada → fendas e poros, passa proteína Subtipo mais frequente: peri-hilar o Esclerose começa no hilo o Comum nas formas adaptativas: obesidade, perda de néfrons, anemia falciforme, hipertensão arterial, refluxo vesicoureteral → condições que ↑ pressão de filtração Proteinúria subnefrótica e níveis normais de albumina sérica Outros subtipos: o TIP: envolve túbulo proximal, podocitopatia primária, mediada por estresse paratubular devido filtrado rico em proteína no TCP o Sem outra especificação (NOS): primária ou secundária o Celular: primária ou secundária, rara, hipercelularidade endocapilar o Glomerulopatia colapsante: mais grave, apresentação agressiva com progressão rápida, proliferação podocitária (hipertrofia e hiperplasia) e colapso das alças capilares. Primária ou secundária a doenças autoimune, HIV, drogas e outros Glomerulonefrite membranosa 80% dos casos idiopáticos o Autoimune – antígeno podocitário maior o PLA2R: receptor 1 da fosfolipase A2 tipo M o Ainda, pode ser secundária (menor frequência) à LES, tireoidite, infecções, fármacos, drogas ou tumores Teste com anti-PLA2R: distingue primárias das secundárias, monitora resposta ao tratamento, prevê recorrência Pico de incidência entre 40-60 anos Predomínio no sexo masculino e branco Curso clínico geralmente insidioso o Função renal normal Pode ocorrer trombose da veia renal M a r i a L u i z a C a n a l l i P á g i n a | 6 Achados: o Imunofluorescência positiva: depósito granular de IgG e C3 sobre as alças capilares glomerulares (entre a membrana e o podócito) difuso e global o MO: espessamento regular, difuso e global da parede dos capilares, sem aumento das células dos tufos Membrana reage formando espículas (spike), a fim de tentar englobar o imunocomplexo o ME: apagamento dos pés dos podócitos, depósito eletrodensos no subepitélio Glomerulonefrite membrano-proliferativa (GNMP) Espessamento das alças capilares (membrano) + aumento das células do tufo glomerular (proliferativa) Predomínio em crianças (mais de 8 anos) e adultos jovens (80% dos casos antes dos 40 anos) – forma primária Na forma secundária, se associa a neoplasias e doenças infecciosas, reumatológicas e genéticas o GNMP associada à hepatite C Apresentação clínica variável: depende da proeminência da lesão Tipo I: depósito de imunocomplexo circulante ou formados in situ nas regiões subendoteliais e mesangiais o Primária ou secundária o Forma mais comum o Tipo III: GNMP de variação rara do tipo I, quando se encontram depósitos elétron-densos subepiteliais, separados entre si por espículas na ME Tipo II: predomínio de depósito de C3 nas regiões subendoteliais, mesangiais e/ou intramembranoso o Geralmente idiopático (primária) o Depósitos densos o Hipocomplementemia: redução de C3 sérico Achados: o MO: proliferação celular mesangio-capilar, espessamento da membrana basal glomerular e aumento da matriz mesangial, resultando em lobulação do tufo capilar glomerular Duplicação da membrana basal glomerular, dando o aspecto de “trilho de trem” o ME: interposição mesangial e depósitos elétron-densos subendoteliais e mesangiais o Imunofluorescência positiva B - “Trilho de trem”