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o CONSUMO DOS MORADORES DA BARRA D A TlruCA UMA ETNOGRAFIA SOBRE NOVOS RICOS CARIOCAS LEIlClA BlDONE BELLlA UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro COPPEAD - Instituto de Pós-Graduação em Administração Mestrado em Administração Orientador: Prof Df. Everardo P. Guimarães Rocha Rio de Janeiro 2000 li o CONSUMO DOS MORADORES DA BARRA DA TUUCA: UMA ETNOGRAFIA SOBRE NOVOS RICOS CARIOCAS Leticia Bidone Bellia Dissertação submetida ao corpo docente do COPPEAD da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre. Aprovada por: rof. Everardo P. illuimarães Rocha, D. Se. I Presidente da Banea J Prof. Bernardo Jablonski, D. Se. C:�;?:/iC Pro{ Ana Carolina Duarte da Fonseca, D. Se. Rio de Janeiro, RJ 2000 111 Bellia, Leticia Bidone. o consumo dos moradores da Barra da Tijuca: uma etnografia sobre novos ricos cariocas. / Leticia Bidone Bellia. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. viii, 116 p. Tese - Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPEAD, 2000. I. Marketing. 2. Antropologia. 3. Tese (Mestr. - UFRJ/COPPEAD). I. Título. IV 'Sorria, você está na Barra. ' Outdoor na entrada da Barra da Tijuca. Em especial, dedico esta dissertação à minha sobrinha e afilhada Mariana, uma linda moradora da Barra de apenas 3 meses de idade. v AGRA DEClMEN TOS Ritos de passagem são manifestações culturais que representam transições no status social de um indivíduo. Alguns dos ritos de passagem mais evidentes da nossa sociedade estão as festas de debutantes com todo o simbolismo da transformação de uma menina em mulher; assim como os trotes a que os calouros são submetidos a cada início de ano letivo - rito de agregação -, fechando o ciclo que começou no vestibular - rito de separação. Dentro de uma lista quase infinita de ritos que compartilhamos, está a defesa de dissertações de mestrado. Esta é a coroação de uma fase de grandes esforços que só são bem sucedidos pela dedicação de quem assina a dissertação, devidamente amparado por várias pessoas muito queridas que, de forma mais ou menos anônima, colaboram para que o feito seja concretizado. Por isso gostaria de agradecer todo o apoio que recebi em diversos momentos, seja na vida, no dia-a-dia do mestrado ou na elaboração desta dissertação, vindo de familiares e amigos que me acompanharam. Obrigada ao meu pai, Vitor, que me ensinou desde pequena que 'primeiro vem a obrigação e depois a diversão'. A!:\Tadeço à minha mãe, Iára, que me mostrou que essa frase também diz que a diversão é necessária. Um carinho muito !:\Tande aos meus irmãos, Vitor e Luisa, que também já começam a buscar seus caminhos na área acadêmica. Muito obrigada ao Fabio, que com seu carinho me apoiou e incentivou a seguir em frente. Ao querido Everardo Rocha, meu professor em três ocasiões diferentes e que não poderia deixar de ser meu orientador, dedico todo meu respeito e admiração. Ao Carlos e à DanielIe da Biblioteca, pela ajuda e pelas incontroláveis risadas no final do expediente. À Cid a, Carlos e Eva da Secretaria Acadêmica, por toda a paciência. À Elza Aldeias, verdadeiro 'anjo da guarda' dos ex-coppeadianos no mercado de trabalho. Aos professores Úrsula Wetzel e Agrícola Bethlem, que me selecionaram para o mestrado no COPPEAD e abriram esta oportunidade na minha vida. Aos companheiros da Turma 98 do mestrado do COPPEAD pela amizade e pela troca intelectual. À todos os informantes que com paciência e generosidade tomaram possível esta dissertação, meu muito obrigado. VI Bellia, Leticia Bidone. O consumo dos moradores da Barra da Tijuca: uma etnografia sobre novos ricos cariocas. Orientador: Prof Dr. Everardo P. Guimarães Rocha. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. Dissertação. (Mestrado em Administração). O objetivo principal deste estudo é o entendimento, através do método etnográfico, do comportamento de consumo dos moradores do bairro da Barra da Tijuca e do processo de socialização do consumidor residente nesta região, seu perfil de consumo atual e suas tendências de consumo futuro. Os habitantes da Barra pertencem a um segmento muito interessante do mercado carioca devido ao seu alto poder aquisitivo e pela valorização dada ao conforto, o que os torna grandes consumidores dos mais variados produtos e serviços. Para a Antropologia, os objetos e práticas presentes em uma sociedade são símbolos através dos quais esta sociedade fala sobre si mesma e, assim, servem ao entendimento de uma realidade culturalmente constituída. Ao abordar e analisar temas relativos ao perfil de consumo de um determinado grupo social urbano como o dos moradores da Barra da Tijuca, sob a ótica antropológica de consumo, esta dissertação traz uma importante contribuição para o marketing brasileiro no sentido de desvendar a lógica intrínseca do comportamento de consumo deste nicho de mercado. Vll Bellia, Leticia Bidone. o consumo dos moradores da Barra da Tijuca: uma etnografia sobre uovos ricos cariocas. Orientador: Prof Dr. Everardo P. Guimarães Rocha. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2000. Dissertação. (Mestrado em Administração). The mam objective of this study is to understand, usmg ethnography, the consumption behaviour of the inhabitants of the borough of Barra da Tijuca, in Rio de Janeiro, and to present how the socialization of this group of customers happens, their consumption profile and their consumption trends for the future. This group under analysis is part of a very interesting market segment in Rio due to its high buying potential and its overvaluing of comfort and well being. These features make them potential buyers of a wide range of products and services. To the Anthropology, the objects present and practices within a society are the symbols through which this society describes itself Thus, they build a material culture that is the basis for the understanding of a culturally based reality. By analysing subjects related to the consumption behaviour of an specific urban social group such as the new wealth people in Barra da Tijuca, under an anthropologic scope of consumption, this study brings an important contribution for the brazilian marketing in a sense of discovering the existing logics of the consumtion behaviour of this segment of the market. VIII SUMÁRIO 1. INTRODUCÃO .................................................................................................................. 1 2. A ETNOGRAFIA COMO METODOLOGIA DE TRABALHO DE CAMPO ................. 7 3. ENTENDENDO O COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR COMO UMA MANIFESTACÃO CUL TURAL ........................................................................................... 9 3.1. TEORIAS SOBRE O CONSUMO MODERNO ............................................................ 9 3.2. A PUBLICIDADE NA PERSPECTIVA DA ANTROPOLOGIA DO CONSUMO •...•. 9 3.3. ANTROPOLOGIA E COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR ....................••........ 9 4. OS NOVOS RICOS COMO CONSUMIDORES ...•.......................................................... 9 5. OS MORADORES POR ELES MESMOS: O DISCURSO DOS INFORMANTES ....... 9 5.1. OS JOVENS MORADORES DA BARRA ..................................................................... 9 5.2. A PERSONALIZAÇÃO QUE UN1FORMIZA .............................................................. 9 5.3. LEALDADE À MARCA E FATOR DE LINHAGEM .................................................. 9 5.4. MOMENTO DO CICLO DE VIDA E PERFIL DE CONSUMO .................................. 9 6. CONCLUSÃO E TEMAS PARA PESOUISAS FUTURAS ............................................. 9 ANEXO: NOTAS HISTÓRICAS SOBRE O BAIRRO CARIOCA DA BARRA DA TIJUCA .................................................................................................................................. 9 REFERÊNCIAS BI BLIOGRÁFICAS ..................................................................................9 l. INTRODUÇÁO o objeto desta pesqUisa é entender alguns dos elementos centrais que caracterizam o comportamento de consumo de um grupo específico de pessoas da nossa sociedade: os moradores da Barra da Tijuca. Além de identificar práticas de consumo recorrentes neste grupo, será alvo de atenção a descoberta de peculiaridades que denotem a identidade própria do grupo, capazes de diferenciá-lo dos demais grupos existentes no espaço social do qual é parte integrante. A principal questão abordada é como os jovens moradores da Barra da Tijuca - membros de famílias que alcançaram a riqueza através do sucesso na vida profissional, e não por herança ou casamento - vivenciam e praticam as suas experiências de consumo. Alguns estudos já foram realizados sobre os novos ricos de diversos países, principalmente dos Estados Unidos da América; no entanto este tipo de material ainda é escasso no Brasil. Como os novos ricos formam um grupo de alto poder aquisitivo fortemente voltado para o consumo e, em alguns casos, para a ostentação, é do interesse das organizações produtoras de bens e serviços o entendimento das motivações que influenciam o comportamento de consumo de tal grupo e qual é o perfil de consumo resultante, a fim de elaborarem estratégias de marketing, promoção e propaganda que de fat.o sensibilizem o novo rico enquanto consumidor e formador de opinião. Para descrever o comportamento de consumo dos jovens moradores da Barra, é preciso desvendar o universo simbólico que os mesmos constróem a fim de delimitar suas identidades estabelecendo diferenças e conformidades em relação aos demais grupos que compartilham o mesmo espaço social. Assim, esta dissertação evidencia as semelhanças e variações dos comportamentos de consumo revelados pelos informantes da pesquisa, em busca de peculiaridades que distingam este grupo e contribuam para o melhor conhecimento geral a respeito destes consumidores que vêm particularmente se destacando em nossa sociedade devido à sua maior ascensão às camadas de alto poder aquisitivo. 2 A relevância deste estudo é ratificada pelos dados publicados no Anuário Estatístico da Cidade do Rio de Janeiro, divulgado pelo IplanRlO (Empresa Municipal de Informática e Planejamento S.A.) contemplando os anos de 1993 e 1994, segundo os quais a Barra da Tijuca já possuía 98.229 moradores, igualmente distribuídos entre homens e mulheres. A faixa etária dos moradores do bairro até aquele momento era basicamente jovem, segundo pode ser observado no gráfico abaixo: Distribuição por Faixa Etária dos Moradores da Barra da Tijucal RJ 6.995 lI! 00 -14 anos t.15 -29 anos 030 - 44 anos 045-59anos � • 60 anos ou mais -_ . . - Fonte: Empresa Municipal de Infonnática e Planejamento S.A. - lplanRIO (Anuário Estatlstico da Cidade do Rio de Janeiro, 1993/ 1994) De acordo com a mesma fonte, a Barra da Tijuca possuía, em 1991, 27. 582 chefes em domicílios particulares permanentes, dos quais 8.505 (30,8 %) com rendimento acima de 20 salários mínimos (valor máximo considerado pela fonte). Para se ter uma idéia da importância destes números, é importante considerar os números totais do Município: eram até então \.560.338 chefes em domicílios particulares permanentes, dos quais apenas 83� 735 (5,4%) recebiam mais de 20 salários mínimos de rendimento. Destes, 10,16% moravam na Barra da Tijuca. Como dados mais recentes ainda não estão disponíveis no Iplan, algumas matérias jornalísticas podem ser consideradas na formação de uma imagem mais consistente das condições sócio-econômicas dos moradores da Barra da Tijuca neste final de década. Dados do CIEE - Centro de Integração Empresa-Escola - publicados no jornal O Globol indicam a existência de mais de 130 mil habitantes na Barra, bairro I Jornal O Globo, 11/07/99, Caderno Barra, p. 15. 3 que, segundo a mesma fonte, abriga 8.058 empresas, sendo 53 indústrias, 2.180 estabelecimentos comerciais e 5.825 na área de serviços. Conforme outra reportagem, desta vez publicada na Veja Rio (PINHO, 1999), o bairro tem uma média de 850 carros para cada I. 000 habitantes, mais que a média americana, que é de 700. Em algumas ruas da Barra, como determinados trechos da Avenida Lúcio Costa (antiga Semambetiba), o número sobe para 2.000 carros por 1.000 habitantes. Na mesma matéria, o pesquisador Paulo Cezar Martins Ribeiro, doutor em Engenharia de Tráfego e chefe do programa de Engenharia de Transportes da COPPEI UFRJ, declara que o limite da utilização prática é de 500 carros por 1.000 habitantes. A mesma reportagem ainda traz a informação dada por Cláudio Neves, vice-presidente da Plarcon2, que afirma que o crescimento populacional da Barra da Tijuca é de 4,23% ao ano, e o tráfego aumenta em uma percentagem maior: 6% no mesmo período. A Barra da Tijuca é um bairro de desenvolvimento relativamente recente no Rio de Janeiro e tem atrai do como novos moradores pessoas que conquistaram uma boa situação financeira a partir do próprio trabalho e vêem na Barra a oportunidade de viver em segurança, dentro de suas dezenas de condomínios fechados, com o privilégio de ter por perto a praia e inúmeros centros comerciais e de lazer. Aliás, esta é uma grande caractenstica do bairro. É na Barra que estão os mega-empreendimentos de shoppings, hipermercados e centros de lazer que atraem não só os moradores locais como também pessoas de todo o Grande Rio. Tal gigantismo pode ser facilmente percebido através de alguns poucos exemplos: o Barrashopping possui 165.372 metros quadrados de área construída, enquanto o shopping e centro empresarial Downtown tem 24 mil metros quadrados (TORRES, 1999). Vários restaurantes temáticos têm se estabelecido no bairro, como o Rock in Rio Café, que funciona desde 1997 com um investimento inicial de R$ 8 milhões e atrai mensalmente 40 mil pessoas. Já o Outback - cujo tema é a Austrália - atende a 30 mil clientes por mês só na unidade da Avenida das Américas3 Entre os novos empreendimentos lançados na Barra está o segundo maior Hard Rock Café do mundo - o maior localiza-se em Orlando, Flórida -, com 5.200 metros 2 Empresa de Construção Civil c Incorporação pertencente a Tjong Hiong Oei, o 'Chinês da Barra', um dos maiores proprietários de terrenos no bairro. 3 Jornal O Globo, 05/08/99,Cadcmo Barra, p. 4.1. 4 quadrados de área construída e capacidade para 450 pessoas sentadas, para o qual foi destinado um investimento de R$ 8 milhões, com geração de cerca de 300 empregos diretos. A casa tem atraído mais de mil pessoas por dia4 e está localizada dentro do centro comercial Cittá América, que possui 283 mil metros quadrados. Até o final do ano 2000, a previsão é de que este novo shopping tenha 150 lojas em funcionamento$ Ainda com relação a empreendimentos recentes na Barra, está o primeiro shopping de entretenimento do Rio de Janeiro, o New York City Center (MAGALHÃES, 1999), que trouxe consigo novidades como os cinemas de última geração UCI e também a casa de jogos eletrônicos Gameworks - onde alguns de seus 250 jogos foram criados por Steven Spielberg- que sozinha recebeu 25 milhões de reais de investimento e é a primeira filial fora do território american06 Com uma área de 3.500 metros quadrados, a loja Gameworks tem capacidade para receber até duas mil pessoas. As salas de cinema têm se renovado no bairro e atraído muitos freqüentadores. São 43 salas na região que atraem até 80 mil espectadores em determinadas semanas. O conjunto de salas do Cinemark foi inaugurado em julho de 1998 e num período de dois anos e meio já recebeu cerca de 1,5 mi lhão de pessoas. Só no mês de julho de 1999, 140 mil pessoas foram às 12 salas. O recorde de freqüência em salas de cinema ocorreu em janeiro de 2000, quando em uma única semana as salas do UCI - inauguradas em novembro do ano anterior - atraiu 52 mil pagantes 7 Para enfrentar a concorrência, os cinemas do grupoSeveriano Ribeiro localizados no Barrashopping e no shopping Via Parque tiveram seus preços reduzidos; mas mesmo assim as salas do Barrashopping não resistiram e foram fechadas ao público após 19 anos de atividade. Como shopping não é tudo, há o exemplo da Casa de Cultura Estácio de Sá, que foi inaugurada em maio de 1998 e conta com uma freqüência média mensal de 12.500 pessoas (GONDlM, 1999). No entanto, apesar de tanto empenho em apostar nestes novos empreendimentos de porte e outros menores, a Associação dos Lojistas em Shopping Centers do Rio de Janeiro (Aloserj) declarou em matétia do jornal O Globo que as vendas apresentaram 4 Mil pessoas por dia no Hard Rock. Jornal O Globo, 28/09/2000, Caderno Barra, p. 23. 5 Idem. 6 Steven Spiclberg investe em complexo gigante de videogames na Barra. Iornal O Globo, 20/10/1999, Caderno Barra, p. 29. 7 Dados sobre as salas de cinema da Barra publicados no Jornal O Globo, J 6/0312000, Caderno Barra, p. 20. 5 queda de 20% no primeiro quadrimestre de 1999 em relação a igual período de 1998 (NASCIMENTO, 1999). Por isso fica claro que embora os executivos percebam um potencial de consumo voltado para a região da Barra da Tijuca, eles não têm informações qualitativas que os orientem sobre a melhor forma de conquistar os clientes, sejam moradores da Barra ou vindos de outros bairros. Como para tudo deve existir um começo, atendendo em parte a esta necessidade evidente, este estudo procura desvendar o comportamento de consumo dos jovens moradores da Barra por meio do viés antropológico. Assim, este estudo é um esforço de utilizar a metodologia chamada etnografia para conhecer o comportamento deste grupo consumidor que pode ser alvo do investimento de empresários dos mais diferentes ramos. Dentre as várias técnicas de abordagem e coleta de dados oferecidas pela metodologia científica a fim de captar representações, estilos, práticas e valores relacionados ao universo do consumo de diferentes grupos, escolheu-se para este estudo a técnica de etnografia, tradicional nos estudos de grupo da Antropologia Social, a fim de mostrar como as ferramentas desenvolvidas por esta disciplina podem contribuir para a Pesquisa de Marketing voltada para o comportamento do consumidor. A etnografia, segundo os teóricos da Antropologia, pode ser definida como a descrição densa do ethos de um determinado grupo, captando as estruturas de significação presentes em seu discurso social, que deve ser interpretado e registrado de formas pesquisáveis (GEERTZ, 1978). A Antropologia tem por princípio assumir a posição e o ponto de vista do outro, a fim de estudá-lo por todos os meios disponíveis. Respeitando estas premissas, o escopo deste trabalho é a descrição do perfil de consumo dos jovens moradores da Barra, a partir da captação da visão que eles possuem sobre este tema e do entendimento do peso relativo que a prática de consumir tem em seu cotidiano. A dissertação é composta por seIs capítulos, incluindo esta introdução. ° capítulo a se!,llJir apresenta com maior detalhamento a metodologia adotada neste estudo, assim como um resumo de etnografia� voltadas para o estudo do consumo já realizadas no Brasil e exterior. ° terceiro capítulo traz a revisão bibliográfica, iniciando pelas teorias clássicas sobre o surgimento do fenômeno do consumo moderno, com ênfase naquelas que abordam o comportamento de consumo do novo rico. No decorrer 6 desta dissertação ficará clara a diferença entre o mundo teórico e a vivência prática, pois esta última traz maior complexidade do que a teoria consegue explicar. Segue-se a apresentação de estudos que tratam do significado da publicidade no nosso dia-a-dia, procurando compreender como se processa o diálogo existente entre este mundo fantástico e a realidade. A última parte da revisão bibliográfica expõe trabalhos que abordam o enlace entre a Antropologia e o Comportamento do Consumidor, trazendo contribuições importantes para o pensamento e prática do Marketing. No capítulo quatro inícia-se a discussão sobre o consumo dos novos ricos, trazendo resultados de pesquisas estrangeiras e introduzindo informações sobre o bairro da Barra da Tijuca e seus moradores. A fala dos entrevistados toma forma no quinto capítulo, remetendo-nos muitas vezes a teorias expostas em capítulos anteriores, ora confirmando colocações dos autores e várias vezes apresentando contrapontos às teorias sobre o consumo dos novos ricos. A conclusão traz os principais pontos de toda a análise, além de indicações de estudos futuros que poderão aumentar o conhecimento disponível sobre o comportamento do consumidor brasileiro. 7 2. A ETNOGRAFIA COMO METODOLOGIA DE TRABALHO DE CAMPO As diferentes metodologias possíveis para o estudo do comportamento do consumidor podem ser classificadas em duas abordagens gerais: a positivista e a interpretativista. Tal distinção só é possível devido às diferenças existentes em seus processos de concepção e condução de pesquisas científicas, A corrente positivista é a mais difundida no campo da Administração, e considera a realidade vigente como uma verdade absoluta cuja existência e desenvolvimento independem de nossas percepções (HUDSON, OZANNE, 1988). O meio encontrado para o entendimento desta verdade é o de transportar alguns de seus elementos para fora do seu contexto usual, com o objetivo de analisá-los em ambientes que permitam a observação e o controle de variáveis avaliadas como relevantes para o entendimento do fenômeno, A aplicação desta metodologia em um estudo sobre o comportamento do consumidor pode ser feita, por exemplo, através da apresentação gradativa de diversas informações a um grupo de conswnidores potenciais, permitindo que os pesquisadores possam registrar e posteriormente avaliar as reações comportamentais que ocorrerem. Conhecida a relação de causa e efeito, segue-se uma generalização dos resultados da pesquisa, a fim de gerar leis que poderão ser aplicadas em um número infinito de fenômenos semelhantes, independentemente do tempo e do contexto envolvidos. Nas palavras de Hudson e Ozanne (1988:510), "( .. . ) a explanação de um fenômeno - a demonstração de uma associação sistemática de variáveis - deve também possibilitar ao pesquisador a execução de algum nível de predição ( .. )".8 Este ponto de vista não é compartilhado pelos interpretativistas, que são incrédulos quanto a possibilidade de reduzir situações altamente complexas a uma relação de causa e efeito. Por isso, em vez de tentar determinar leis gerais, estes pesquisadores procuram entender as razões, motivações e significados do fenômeno estudado (HUDSON, OZANNE, 1988). Segundo a abordagem interpretativista, a realidade é dependente da percepção dos seus estudiosos, e por isso não é única. Sendo assim, faz mais sentido estudá-la de forma holística, e não pelo seu 8 Tmdução livre da autora 8 desmembramento, ou seja, é precIso levar em consideração o contexto em que os comportamentos humanos ganham forma para corretamente interpretá-los. Isso indica uma busca pelo entendimento de determinado conjunto de atitudes a partir do ponto de vista de quem as toma (HUDSON, OZANNE, 1988). Também vale a pena ressaltar de que forma o modo de condução da pesquisa difere nas duas abordagens. No caso dos positivistas, as técnicas de coleta de dados dependem da experimentação simulada em laboratório para que se tenha pleno controle das variáveis, informações e ordem temporal dos eventos. Durante a coleta de dados, é adotada uma distância proposital na relação entre os pesquisadores e pesquisados, o que segundo os positivistas serve para garantir o rigor científico do estudo. Os interpretativistas utilizam a análise descritiva de observações participantes e a pesquisa de documentos e outros registros que permitam uma percepção holística do fenômeno, garantindo o máximo de confiabilidadequanto ao seu contexto natural. As técnicas adotadas estimulam uma interação dos estudiosos com os informantes da pesquisa, o que faz com que o indivíduo analisado participe mais ativamente do estudo, colaborando para uma construção cooperativa das questões, idéias e significados envolvidos em seu comportamento (HUDSON, OZANNE, 1988). Não cabe aqui iniciar uma discussão sobre a possível supremacia de determinada corrente sobre outra. Mesmo Hudson e Ozanne (1988:509) reconhecem que o positivismo e o interpretativismo não passam de rótulos que servem para evidenciar a existência de duas abordagens gerai s de pesquisa que diferem em suas suposições e objetivos. A intenção final que levou à citação das diferenças existentes entre as abordagens positivista e interpretativista nesta dissertação é de situar a metodologia de trabalho de campo aqui adotada - a etnogrqfia - como mais alinhada com a segunda corrente. A etnografia é uma forma de pesqUIsa de campo originada e amplamente difundida na Antropologia que assume o ponto de vista daqueles que formam o objeto de estudo, a fim de desvendar a lógica cultural que influencia as diferentes facetas de seu comportamento. A adoção do ponto de vista dos informantes não é tarefa fácil, e surgiu de grandes discussões teóricas no âmbito da Antropologia que resultaram no conceito de relativização. Rocha (1994:20) ilustra tal conceito da seguinte forma: "( . .. ) 9 quando o significado de um ato é visto não na sua dimensão absoluta mas no contexto em que acontece: estamos relativizando. Quando compreendemos o outro nos seus próprios valores - e não nos nossos - estamos relativizando (. . .)", e acrescenta: "Relativizar é não transformar a diferença em hierarquia, em superiores e inferiores, em bem e mal, mas vê-la na sua dimensão de riqueza por ser diferença ( . . .)" (ROCHA, 1994:20). O surgimento do pensamento relativizador foi motivado pela percepção da existência do que é denominado na Antropologia de etnocentrismo. Rocha (1994:7) não se omite e também oferece uma definição para este conceito: "Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossas definições do que é a existência" . É claro que esta mudança radical de pensamento não ocorreu de uma hora para outra. Entre o etnocentrismo e a relativização, a Antropologia adotou outras lógicas de percepção e interpretação das diferenças existentes entre as sociedades, a começar pelo Evolucionismo. Predominante em todo o século XIX, esta corrente tinha na noção de progresso o seu fundamento, e defendia uma posição privilegiada para a sociedade do eu na escala de desenvolvimento humano. As sociedades dos outros eram, então, classificadas de acordo com a semelhança que guardavam em relação à sociedade do eu: quanto mais diferentes, menos evoluídas eram. Rocha coloca que os estudiosos desta fase "Postulavam uma unidade entre culturas como se todas tivessem de dar conta de problemas idênticos e que, mais cedo ou mais tarde, os 'primitivos' chegariam à formas da 'civilização'." (ROCHA, 1984:30). Fica evidente por todas estas descrições o viés fortemente etnocêntrico presente nesta primeira fase do pensamento antropológico. O segundo movimento, chamado de Escola Americana ou corrente difusionista, é o primeiro a perceber o valor do discurso do outro como fonte válida de entendimento do modus vivendi de seu grupo, e assim dá um passo importante no sentido do pensamento relativizador. Rocha escreve sobre Franz Boas, o principal expoente desta linha: "Foi ele o pnmelro a perceber a importância de estudar as culturas humanas nos seus particulares. Cada grupo produzia, a partir de suas condições históricas, climáticas, lingüísticas etc., uma determinada cultura que se caracterizava, então, por ser única e específica. Este relativismo cultural, essa pluralidade de culturas diferentes, visto por Boas é, se compararmos, uma ruptura importante do centramento, da absolutização da cultura do "eu" no pensamento evolucionista". (ROCHA, 198440) 10 Segundo esta nova lógica, o outro passou a ter o direito de contar a sua história sem a necessidade de fazê-Ia desembocar na avançada sociedade do eu (ROCHA, 199443). Este rompimento do vínculo com os valores da sociedade do eu impele os antropólogos a relativizarem, entre outras coisas, a noção de tempo. Com isso, deixam de lado as narrações cronológicas e passaram a realizar estudos sincrônicos, o que simbolizou a ruptura entre Antropologia e História. O antropólogo, a partir deste momento, é obrigado viajar, precisa" ( . .. ) morar, experimentar, a existência junto ao "outro". Conhecer a diferença experimentando-se a si próprio como diferente, por estar, por períodos significativos de tempo, fazendo "trabalho de campo" no mundo do "outro" ( . . . )." (ROCHA, 1984:64). A introdução do trabalho de campo como metodologia de pesqUIsa na Antropologia foi feita por Malinowski, abrindo caminho para a comparação relativizadora. Rocha comenta: "A viagem de Malinowski e sua afirmação do trabalho de campo obriga a ida na direção do "outro". Ele mesmo, comparando com relativismo, aponta um caminho fundamental: o "outro" é, também, uma fonte possível de reflexão, de transformação até, da própria sociedade do "eu"". (ROCHA, 1984:73). A adoção do trabaJho de campo etnográfico pela Antropologia tomou tal vulto que acabou por ser disseminado para outras áreas do conhecimento. A grande vantagem que a etnografia apresenta é a possibilidade de contato direto com o grupo a ser 11 pesquisado, em uma sinergia que permite o entendimento de motivações que orientam o comportamento do grupo. Isto só é possível quando o pesquisador se envolve" ( .. . ) num processo profundamente relativizador de todo o conjunto de crenças e valores que lhe é familiar (. . . )" (DAMATTA,1987:143). Exatamente desta forma, a metodologia de trabalho de campo etnográfico objetiva coletar informações essencIaIs para o entendimento do grupo escolhido sem qualquer mediação. A etnografia é, reconhecidamente, um poderoso instrumento de pesquisa capaz de gerar uma descrição densa de um grupo que esteja sendo analisado seb'llndo a sua cultura e os comportamentos - inclusive de consumo - que lhe são peculiares. O que se entende por descrição densa nesta definição é a revelação de valores que estão por trás dos atos praticados pelos indivíduos deste grupo, para então estabelecer uma hierarquia de estruturas significantes segundo as quais as atitudes são produzidas, percebidas e interpretadas. Isso não é tão simples, como afirma Clifford Geertz. Segundo ele, o etnógrafo encontra à sua frente "( .. . ) uma multiplicidade de estruturas conceptuais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro aprender e depois apresentar." (GEERTZ, 1978:20). A etnografia vai muito além de um mero relato de dados superficiais, o que não passaria de "(. . . ) um catálogo telefônico cultural, onde a idéia de classificar e, sobretudo, de colecionar todos os costumes é um objetivo evidente (. . .)" (DAMATT A, 1987:144), e se preocupa em fazer um relralo do sistema de significados construído pelo b'IUpo buscando desvendar a lógica de comportamento dos seus componentes. Existem dois movimentos no trabalho de campo que o etnógrafo deve realizar para conseguir desenvolver a plena percepção das diferenças e dos significados dos comportamentos adotados pelos membros de um grupo. O primeiro movimento é' a transformação de um elemento exótico para o pesquisador em familiar, isto é, o etnógrafo precisa se dedicar ao entendimento de alguns enigmas existentes em contextos sociais muito diferentes do seu. O segundo movimentoé inverso, exigindo que o pesquisador adote a perspectiva do estranhamento a fim de transformar o que lhe 12 é normalmente familiar em exótico. Isso envolve uma reflexão crítica sobre as regras existentes à luz das diferenças encontradas no grupo. É este duplo movimento que permite se chegar a uma rica descrição das situações ocorridas e o conseqüente questionamento dos valores reificados pelos mecanismos de legitimação vigentes (DAMATTA, 1987). Isso posto, cabe detalhar um pouco melhor o que pode ser entendido como familiar e o que é considerado exótico. Remetendo-nos a Velho (apud DAMATTA, 1987), "(. . .) o que sempre vemos e encontramos pode ser familiar mas não é necessariamente conhecido, sendo o oposto também verdadeiro: pois o que não vemos e encontramos pode ser exótico mas, até certo ponto, conhecido (. .. )" . O que o autor aqui salienta é que não podemos cair na armadilha de considerar tudo o que parece familiar como próximo e íntimo, da mesma forma que nem tudo o que é exótico é necessariamente distante e desconhecido. Para DaMatta, questionar o real conhecimento do que é familiar é o início da prática da dúvida antropológica, base para o trabalho de campo (DAMATTA, 1987:162). O perigo dos elementos que sugerem familiaridade é a indução a análises superficiais quando o objeto de estudo são grupos sociais inseridos e organizados hierarquicamente na própria sociedade do pesquisador. Não seria razoável pressupor que os jovens moradores da Barra da Tijuca adotem necessariamente o mesmo comportamento de consumo que qualquer novo rico, seja brasileiro, americano, discreto ou espalhafatoso. É preciso considerar a provável existência de subgrupos entre os novos ricos e a diversidade de comportamento apresentada entre eles. Não faz sentido, também, apoiar qualquer tentativa de explicar os motivos da diferenciação existente com argumentos de base frágil, idéias preconcebidas ou historicamente justificadas que, por não abrirem espaço para qualquer forma de questionamento, não são capazes de enriquecer o conhecimento sobre o assunto abordado, perpetuando o lugar comum. O trabalho de campo etnográfíco percorre exatamente o caminho oposto, e as dúvidas que levanta formam seu grande diferencial, agregando valor aos métodos tradicionais de pesquIsa. O trabalho de campo etnográfíco tem, entre suas peculiaridades, a necessidade de interação entre pesquisador e informantes, afinal o ponto de partida para o estudo de 13 um determinado grupo é o ponto de vista dos seus componentes. É claro que o pesquisador também recorre à análise de materiais de estudo já produzidos sobre o assunto, no entanto a mediação com este conhecimento deve ser realizada pelo próprio informante em contato com o etnógrafo. Por isso, só existirá elnogrqfia se existir informantes e só haverá dados quando for estabelecido um processo de empatia entre estes e o investigador (DAMATTA, 1987). Geertz também está ciente desta realidade, e coloca que "os monólogos têm pouco valor aqui, pois não há conclusões a serem apresentadas; há apenas uma discussão a ser sustentada" (GEERTZ,1978:39). A etnografia busca fontes múltiplas de dados a fim de ter contato com diferentes perspectivas sobre o grupo estudado. Neste sentido, existem dois instrumentos básicos de coleta de dados: a observação de comportamento (observação participante) e o relatório verbal (escuta ativa). No primeiro caso, o pesquisador se propõe a observar as situações que naturalmente ocorrem no cotidiano do grupo, sem transportá-lo artificialmente para um ambiente de laboratório. É o etnógrafo que se desloca em busca do convívio com o grupo, tal qual a viagem proposta a partir deMalinowski. As observações podem englobar os mais diversos eventos diários, sendo que no caso deste estudo será focada especificamente a experiência de consumo. A observação participante tem a caracteristica de permitir a percepção de determinadas peculiaridades não traduzíveis no discurso do informante, por mais consciente que ele seja a respeito do seu comportamento de consumo. (ARNOULD, W ALLENDORF, 1994) o ponto-chave é que o observador participante dedica seu tempo a estar com o grupo de pessoas que estuda e a realizar atividades com ele. A tarefa deste pesquisador é descobrir o que é importante para os outros. Isto envolve tomar acessível o que normalmente é ocultado, isto é, o que está nos bastidores e as informações de senso comum, sob o ponto de vista do outro. A observação participante exige planos de ação específicos, que irão movimentar o observador no sentido do que é fácil de ser percebido até os aspectos que costumam ser encobertos. Sherry (1995: 183) cita cinco estratégias de ação que ajudam a acessar informações normalmente escondidas: parecer que sabe como consegui-Ias; usar informações de bastidores para conseguir mais informações de bastidores; usar os outros como professores; classificar os outros como 14 testemunhas, informantes e fontes de informações de bastidores; reivindicar que realmente necessita da informação. No entanto, dados provenientes de observações, por mais ricos que sejam, não permitem o acesso direto a interpretações e percepções, revelando pouco a respeito do estado interno dos indivíduos, isto é, seus pontos de vista. Assim, faz-se necessária, em um segundo momento, a realização de entrevistas em profundidade com os membros do grupo estudado. Ao abordar os informantes, o etnógrafo estará buscando as versões e interpretações dos indivíduos sobre suas próprias atitudes e comportamentos, gerando informações complementares às observações feitas em campo anteriormente (ARNOULD, W ALLENDORF, 1994). Estas entrevistas, para que sejam bem sucedidas, devem empregar a escuta ativa. Isto significa perceber o significado do que está sendo dito através do vocabulário utilizado pelo informante e suas inflexões de voz. Ao mesmo tempo, é saber ouvir as mensagens não-verbais (SHERRY, 1995). Tanto a observação quanto a entrevista foram utilizadas no desenvolvimento do estudo apresentado nesta dissertação. No caso das entrevistas, foi montado um roteiro semi-estruturado contendo algumas questões gerais sobre perfil de consumo. Com este roteiro foi possível concentrar os esforços nas informações relevantes para o entendimento do comportamento de consumo característico do grupo de jovens moradores da Barra, evitando a dispersão que poderia ocorrer em uma conversa meramente informal - que na verdade foi o tom adotado nas entrevistas, a fim de criar um clima propício para a ocorrência de declarações o mais coerentes possíveis com os sentimentos internos do informante. A fase de interpretação dos dados coletados na pesquisa de campo traz o grande desafio de combinar fatos de forma a estabelecer um todo lógico que descreva claramente o grupo analisado, sem que haja distorções de significados. Em vez de buscar padrões e convergências que sejam consistentes ao longo da aplicação de diversos testes, a etnogrcifia busca relatar em detalhe um fenômeno, incluindo nesta descrição as diferenças e divergências presentes na comparação entre as diversas perspectivas existentes sobre o grupo investigado - do pesquisador, dos informantes e dos materiais de estudo já existentes (ARNOULD, WALLENDORF, 1994). Neste estudo fica claro que o comportamento de consumo dos jovens moradores da Barra tem 15 caractelÍsticas bastante conservadoras se comparado com aquele descrito pelas teolÍas de consumo aplicadas aos novos ricos, fato que só veio à tona devido ao uso da etnografia como metodologia de pesquisa. o primeiro passo para descrever um grupo é a utilização de códigos como palavras, frases e símbolos que identifiquem um fenômeno recorrente no comportamento e discurso de diferentes informantes, mesmo que, de início, a sua importância não seja muito clara para o pesquisador. O segundo passo é abusca das diferenças existentes na percepção das fontes disponíveis a respeito do comportamento de consumo peculiar ao grupo em estudo. Tais diferenças, combinadas com os códigos descobertos na primeira etapa, dão origem à descrição densa do fenômeno (ARNOULD, WALLENDORF,1994). Para realizar com sucesso uma descrição etnográfica, o pesquisador precisa ter uma boa dose de criatividade e insight no momento da interpretação dos fatos, adicionando a ela um certo subjetivismo - um aspecto ainda controverso para aqueles que acreditam na idealização do rigor cientifico nas disciplinas sociais. No entanto, é subjetivismo da interpretação que dá densidade à descrição, e por isso não deve ser desprezado pelos pesquisadores, mesmo que haja algum temor de serem criticados por não estarem fazendo ciência (DAMATTA, 1987). Como toda metodologia, a etnografia tem suas limitações, que devem ser consideradas tanto pelo pesquisador que a aplica quanto por aqueles que utilizam as informações geradas por ela. A primeira restrição a ser feita diz respeito à empatia que deve ser alimentada entre o investigador e seus informantes durante a pesquisa. É preciso atentar para a possibilidade do excessivo envolvimento entre eles, o que comprometeria o senso crítico do pesquisador, afetando, por conseguinte, a neutralidade necessária para perceber as diferentes nuances de uma situação observada ou relatada. É preciso estar com eles e entender seus pontos de vista sem se tomar um deles. No caso desta dissertação, a entrevistadora pôde constatar a existência do distanciamento analítico necessário ao receber respostas diferentes daquelas que esperava para questões sobre certos aspectos do consumo do grupo, o que gerou o estranhamento daquilo que a princípio era familiar, movimento essencial para o etnógrafo. 16 Uma outra limitação diz respeito à fragilidade das tentativas de generalização dos resultados da pesquisa. Sair do específico para o genérico pode ser muito perigoso, princípalmente quando a investigação versa sobre o comportamento de consumo de um grupo com fronteiras bem delimitadas, como no estudo aqui apresentado. Nas palavras de Geertz (J 978:35), "qualquer generalidade que consegue alcançar surge da delicadeza de suas distinções, não da amplidão de suas generalizações". Ao revelar o comportamento de consumo conservador de um sub-grupo de novos ricos, em contraposição ao comportamento apresentado pelas teorias de consumo conspícuo, este estudo ressalta exatamente o perigo das generalizações teóricas. É claro que as teorias existentes se aplicam a casos mais específicos - os novos ricos das colunas sociais -, mas não a todos os membros da nova sociedade endinheirada da Barra da Tijuca. Nos últimos anos, algumas revistas cíentíficas especializadas em marketing têm publicado artigos que relatam os resultados da aplicação do método etnogràfico no estudo e descrição do comportamento social e de consumo de integrantes de determinados grupos urbanos. Estas etnogrcifias muitas vezes constataram que hábitos sociais e padrões de consumo comuns podem se tomar motivos para união de certas pessoas em um grupo, formando uma identidade própria que acaba por diferenciar seus integrantes dos demais membros da sociedade. Nesta parte da dissertação serão apresentados alguns destes artigos, selecionados entre outros da Base de Dados ABI9/ Infonn, que indexa mais de 1.200 títulos de periódicos estrangeiros nas áreas de Administração, Marketing e Negócios, incluindo a base Business Periodical on Disc, que arrola cerca de 500 títulos com texto integral dos artigos 10 Também serão citados alguns exemplos de estudos utilizando a etnografia e outras ferramentas típicas da Antropologia extraídos de uma coletânea reunida por Sherry, Ir. (1995), além de dissertações de mestrado já defendidas no COPPEADIUFRJ. Os autores dos artigos que serão apresentados a seguir utilizaram uma combinação de instrumentos de coleta e registro de dados para realizar o estudo etnográfico de consumo em grupos urbanos. Inevitavelmente, o primeiro instrumento 9 ABI significa 'Abstracts Business Index'. 17 utilizado foi a observação direta dos eventos, proporcionando uma perspectiva dos fatos na forma wmo se desenrolavam na vida prática. Estas observações foram feitas de maneiras variadas, dependendo do estudo, podendo contar com a participação total do pesquisador na situação investigada ou não. A entrevista em profundidade também aparece em todos os estudos etnográficos, caracterizando a busca dos pesquisadores por dados sobre as percepções dos integrantes dos grupos a respeito das situações sociais e hábitos de consumo compartilhados. Em alguns casos, foram tiradas fotografias de objetos, ambientes e encontros dos integrantes dos grupos, para servirem como complementos às notas de campo. A investigação documental foi utilizada em alguns estudos como fonte secundária a fim de possibilitar uma primeira aproximação exploratória com o objeto da etnografia. No relato das etnogrqfias percebe-se, também, uma organização dos resultados a partir de temas conceituais, sem qualquer privilégio da ordem cronológica da ocorrência dos fatos no dewrrer da pesquisa. A seguir estão resumidos cinco estudos etnográficos. O primeiro investiga o ritual de consumo do dia de Ação de Graças, importante data comemorativa norte americana. O segundo estudo procura explicar o comportamento de praticantes de pára quedismo. A terceira elnogrqfia se concentra nos proprietários de motos Harley Davidson. Em se!,'llida será apresentado um estudo que examina o processo de seleção de presentes em uma loja freqüentada por pessoas da alta classe média norte-americana. Por fim, teremos uma pesquisa sobre a mecânica de lealdade à marca e padrões de consumo que são passados dentro de uma família, geração pós geração, a cada indivíduo que dela faz parte. O Dia de Ação de Graças é um feriado nacional celebrado nos EUA na última quinta-feira de novembro. A motivação para este dia é o agradecimento de todas as conquistas alcançadas durante o ano. Wallendorf e Amould (J991) analisam em seu estudo detalhes do ritual seguido pelas famílias americanas neste dia, com ênfase em aspectos como o consumo abundante de alimentos compartilhado pelos participantes, o processo de seleção de convidados, o paradoxo do universalismo e particularismo existente na comemoração, os valores de trabalho na preparação da celebração e a noção la Informações retiradas do Relatório CAPES para o ano base de 1998, produzido pela COPPElUFRJ 18 de evitar desperdício, além do papel exercido pelos produtos fabricados e os produzidos em casa. Através da apresentação destes temas conceituais, o estudo etnográfico do Dia de Ação de Graças demonstrou como os norte-americanos usam rituais de consumo para construir sua cultura, além de apresentar a forma como ocorre o culto à abundância de bens materiais e o processo de reaquisição do comando do processo produtivo através da afirmação de valores e hábitos particulares frente aos esforços homogenizadores dos meios de produção de massa. Outro estudo, desta vez baseado no comportamento dos pára-quedistas, foi realizado por Celsi, Rose e Leigh (1993), e teve como objetivo entender os motivos que levam pessoas ao consumo voluntário de atividades de alto risco, para o que foi utilizado o método etnográfico. As informações levantadas servem como orientação para a crescente indústria de produção de artigos voltados para este público, que cada vez mais tem aumentado em número de participantes. Durante a investigação, os pesquisadores demonstraram especial interesse na descrição dos comportamentos e experiências típicas dos integrantes de um grupo de pára-quedistas, buscando observar, registrar e interpretar os aspectos da subcultura deste grupo. Os autores encontraram três temas conceituais para organizaros relatos sobre o grupo de pára-quedistas, sendo o primeiro deles o processo de aquisição de experiência na atividade de pára-quedismo. O segundo tema conceitual refere-se ao processo evolutivo dos motivos que levam uma pessoa a se engajar em um esporte de alto risco e, posteriormente, continuar participando e ganhando experiência em tal atividade. O último tema conceitual citado diz respeito à percepção dos participantes sobre o risco inerente á atividade de pára-quedismo. O universo simbólico que envolve o grupo de pára-quedistas abordado pelos etnógrafos pôde ser melhor entendido a partir deste estudo. Foram interligados os constructos que compõem esta subcultura, revelando a interdependência existente entre (p.8). 1 9 o processo de aquisição de experiências práticas, o conjunto de razões que levam o indivíduo a integrar-se no grupo e a percepção que os pára-quedistas compartilham a respeito do risco inerente à prática desse esporte. Já o estudo etnográfico de Schouten e Mcalexander (1995) teve como objetivo investigar a subcultura de consumo dos denominados new bikers, representados pelos proprietários das motocicletas Harley-Davidson. O interesse dos pesquisadores pelo estudo foi despertado pela possibilidade de existência de um grupo homogêneo e distinto dos demais membros da sociedade, não apenas por comungar de uma mesma atividade ou estilo de vida, mas também por compartilhar a adoração por um produto de uma marca bem definida. Para executar o estudo, os pesquisadores tiveram que eleger alguns lugares para realização de sua investigação, que no caso foram: os encontros de proprietários de Harley-Davidson, clubes de confraternização, rallies anuaIs e as residências dos informantes. Como forma de complementação das informações coletadas através do comportamento e relatos dos integrantes do grupo, os investigadores também realizaram entrevistas com diretores da empresa fabricante das motocicletas e revendedores. Os resultados do estudo etnográfico também foram organizados por temas conceituais, mais exatamente: a estrutura do grupo pesquisado, o ethos (a existência do grupo pressupõe o compartilhamento de princípios e categorias culturais que sejam um reflexo de seus próprios valores e necessidades), o patriotismo, o machismo e a transformação da identidade do indivíduo conforme aprofunda sua integração em algum dos subgrupos de proprietários de HarJey-Davidson. O último tema conceitual abordado diz respeito ao esforço dos pesquisadores em relatar como os fabricantes e revendedores de motocicletas e aceSSÓrios Harley Davidson lidam com uma legião de adoradores que a marca atrai. Desta forma, o estudo ilustrou a existência de uma subcultura na sociedade norte-americana, constituída em tomo da marca de um único produto. Isto gerou o surgimento de um conjunto inter-relacionado de comportamentos e atividades peculiares adotadas pelo grupo a fim de reforçar a demarcação das fronteiras que separariam seus integrantes dos demais membros da sociedade. 20 McGrath (1989) também usou a etnogr�fia em campo a fim de analisar os fatores envolvidos na atividade de troca de presentes, a partir da perspectiva de uma loja de varejo. O processo considerado apresenta três estágios principais: a gestação - que engloba selecionar o artigo, pagá-lo, embrulhá-lo para presente -, a prestação ou entrega do presente ao destinatário, e a reformulação - quando o presente é utilizado, descartado, guardado ou trocado. O estudo se fixou no primeiro estágio e envolveu especificamente a época das festas natalinas. Como objetivos principais, essa investigação procura: descrever em detalhes a loja de presentes, dando ênfase aos fatores que transformam esse local em um espaço atrativo para a execução do estágio de gestação; entender a percepção que o proprietário e empregados têm do processo de seleção de presentes, e relatar a reformulação do conjunto de itens comercializados pela loja no decorrer do penodo do estudo. A interpretação etnográfica apresentou três temas conceituais principais: o ambiente criado no interior da loja para incentivar as vendas, a nítida distinção entre o padrão de comportamento adotado pelos vendedores na área pública da loja e aquele adotado nos espaços reservados somente para empregados, e a evolução da percepção dos processos de tomada de decisão que deram certo - o que antes era visto como uma influência do fator sorte, passou a ser considerado como um mérito da proprietária. Neste estudo etnográfico, a autora ofereceu uma descrição detalhada envolvendo as atividades diárias de uma loja de presentes, as percepções sobre o perfil de seus clientes, a relação entre proprietária, empregados e público, o ambiente e decoração da loja e a sofisticação dos processos de compra e seleção de pessoal . A etnogrqfia realizada contribuiu para um melhor entendimento do processo de transformação de uma concepção de empreendimento em um espaço privilegiado para o exercício da seleção de presentes. Num estudo voltado para entender a influência da história da família no consumo das pessoas, Barbara Olsen incorporou várias abordagens teóricas para interpretar o passado, e o passado no presente, no que se relaciona à biografia cultural das marcas e à lealdade à marca. Usando o método histórico para traçar padrões e outras tendências de comportamento, a abordagem funcionalista diacrônica oferece pistas 21 sobre como os objetos são adotados, seja por conveniência ou pelas suas várias utilidades sociais e ambientais (SHERRY, 1995 :245). A pesquisadora coloca que as marcas possuem utilidade simbólica e são adotadas pelo que comunicam ao usuário. Olsen analisou vários aspectos de lealdade à marca pelo consumidor nostálgico. O fator hereditário no consumo e na preferência por marcas foi traçado através da biografia cultural. A metodologia integra análise histórica de arquivos de dados com pesquisa etnográfica, observação participante e documentação de história de vida através de entrevistas em profundidade. O estudo de Olsen apontou que a rejeição consciente dos hábitos de compras dos pais ou marcas utilizadas durante a infância são uma forma de rebelião na qual os produtos ou hábitos rejeitados representam barreiras, comunicando simbolicamente uma fratura no relacionamento. Por outro lado, a replicação do comportamento de compra dos pais ata o laço emocional com o outro (SHERRY, 1995: 2681 269). Em poucas palavras, pode-se afirmar que as marcas refletem a percepção de quem queremos ser. Embora em fase ainda inicial de aplicação no Brasil, a etnografia tem aparecido em estudos produzidos por pesquisadores nacionais que discutem aspectos de Marketing e Comportamento do Consumidor. Carvalho (1 997) desenvolveu uma pesquisa etnogràfica sobre a simbologia dos objetos encontrados nas casas de jovens casais urbanos. Segundo o autor, os recém-casados tendem a expressar suas individualidades, ainda mais se ainda não tiverem filhos; isto é, mantém-se a existência de espaços predominantemente femininos - toda a casa - e masculinos - escritório. Os objetos também revelam sobre a identidade dos moradores, que em geral buscam a personalização da casa através da originalidade da decoração. Isso inclui recordações de momentos felizes que fazem parte da história do casal; aliás o hedonismo é um dos alicerces da lógica simbólica que envolve a aquisição de objetos decorativos neste caso. O perfil de consumo dos idosos foi o tema escolhido por Kubota (1999) para a sua etnografia. Seus entrevistados são moradores do Rio de Janeiro com mais de sessenta anos e pertencentes à classe média. Kubota notou a influência dos familiares e amigos no processo de compra, além de perfis de consumo diferentes para homens e mulheres. Neste estudo, os idosos mostraram que mantêm imutáveis vários hábitos de 22 consumo, ressaltaram as diferençasentre os símbolos de �1atus de sua juventude e os atuais, revelaram as percepções que têm sobre algumas marcas e também falaram sobre seus sonhos de consumo. Ballvé (2000) escolheu outra fase do ciclo de vida para estudar: a infância. Seu trabalho foi baseado em crianças matriculadas na 3" e 4" séries do nível elementar de uma escola da Zona Sul do Rio de Janeiro. A autora abordou a consciência que as crianças têm sobre própria idade, a construção da auto-imagem, como elas interpretam a mídia e as informações que recebem, o perfil de consumo e as estratégias econômicas destes consumidores-mirins. Este estudo mostra claramente como se dá as influências de compra e a socialização para o consumo em núcleos familiares que contam com a presença de crianças. Como ficou evidente após a apresentação destes resumos, para realizar um estudo sobre comportamento de consumo utilizando a etnogrcifia como metodologia de pesquisa de campo é preciso delimitar claramente o grupo que será estudado e determinar, de forma consistente, quais pessoas estarão aptas a atuar como informantes para a investigação. Esta dissertação foca o comportamento de consumo de um conjunto de pessoas bem definido em nossa sociedade - os moradores - e a seleção dos informantes que formam a amostra representante deste universo se deu levando em consideração os seguintes aspectos: são todos moradores de condomínios de classe média alta da Barra da Tijuca que acompanharam o percurso de suas famílias do subúrbio para a Barra, chegaram ao bairro ainda crianças ou adolescentes, estão na faixa etária entre 18 e 28 anos (muito representativa do bairro - conforme já visto no primeiro capítulo - e o que os toma grandes consumidores, desde já e numa perspectiva de longo prazo), acessibilidade (sem o que não é possível realizar as entrevistas e a observação participativa). A concentração e,te estudo em moradores anônimos da Barra da Tijuca, e não nos representantes óbvios dos emergentes que têm suas imagens veiculadas exaustivamente pelas diferentes mídias, dá-se devido á opção de apresentar uma análise do comportamento de consumo do morador comum do bairro, esta maioria que não aparece diariamente nas colunas sociais mas é geradora de grande volume de consumo; isto é, os clientes potenciais e diretos das empresas que atuam ou pretendem atuar na 23 região. Assim evita-se apresentar uma mera caricatura e agrega-se maior valor a esta análise. Por último, é preciso deixar claro que não foi utilizado qualquer tipo de procedimento estatístico, portanto a amostra possui características não probabilísticas. 24 3. ENTENDENDO O COMPORTAMENTO DO CONSUM1DOR COMO UMA MANIFESTAÇÃO CULTURAL A diferença fundamental entre o ser humano e as demais formas de vida está na sua capacidade de adotar comportamentos além da determinação imposta pela sua carga genética. Como coloca Sahlins (1979: 120), "o homem sente que a qualidade ideal de sua existência consiste em ocupar o mundo de símbolos e idéias - ou, como às vezes ele o chama, o mundo da mente ou do espírito". Cultura pode ser definida, então, como a relação dinâmica existente entre o homem, seus símbolos e o mundo. De forma semelhante, McCracken (1988) coloca que a cultura é formada pelas idéias e atividades através das quais interpretamos e construímos nossa visão de mundo. Assim, fica claro que a cultura se coloca entre os homens e as ações, os objetos e a natureza, atuando como uma lente da qual não podemos fugir e que influencia nossa forma de ver o ambiente que nos envolve. Rocha (1984) aborda o conceito de cultura associando-o à idéia de código, passando a atuar essencialmente como um sistema de comunicação. O autor coloca que a cultura atua como uma espécie de linguagem compartilhada entre os membros de uma mesma sociedade, que utilizam símbolos de diferentes tipos para trocar mensagens. Ao entender a cultura como um sistema de comunicação, Rocha assume que: "(. .. ) as culturas humanas constituem-se de conjuntos de verdades relativas aos atores sociais que nela aprenderam por que e como existir. As culturas são 'versões' da vida; teias, imposições, escolhas de uma 'política' dos significados que orientam e constróem nossas alternativas de ser e de estar no mundo. ( . . . )". (ROCHA, 1984:88-89) Entre os vários símbolos dessa linguagem compartilhada estão as práticas de consumo, focadas nesta dissertação. A forte relação entre cultura e consumo se baseia no fato de que o processo de consumir bens e serviços é moldado e dirigido por um forte viés cultural. Por sua vez, a cultura depende dos objetos e práticas de consumo para perpetuar os seus valores. McCracken (1988:77) evidencia esta afirmativa quando 25 diz que os produtos são criações e criadores do mundo culturalmente constituído. Isso significa que os produtos, além de sua funcionalidade, servem para que as pessoas expressem os valores culturais de sua sociedade, cultivem ideais, sustentem estilos de vida, construam noções sobre elas mesmas, criem e mantenham relações sociais. O entendimento do processo de consumir vai além da definição estreita de utilizar um bem ou dispor de um serviço, e inclui a interação - antes, durante e após o momento da compra - entre produto, indivíduo e sociedade. Essa abordagem permite uma discussão mais abrangente sobre o processo de consumir, onde sua definição está menos atida à satisfação de necessidades individuais e mais relacionada a uma visão de consumo enquanto fenômeno cultural (McCRACKEN, 1988). Seguindo o raciocínio destes autores, chega-se à conclusão de que os homens não consomem apenas por um desejo de suprir necessidades exclusivamente fisicas; senão a relação do homem com o produto estaria limitada às coisas como elas são, e a avaliação do valor e da utilidade deste mesmo produto consideraria apenas as suas propriedades objetivas. É exatamente a subjetividade que permite ao homem dar uma dimensão simbólica ao objeto. Quando um indivíduo seleciona e usa determinado produto, revela a intenção de distinplÍr-se socialmente dos demais. Através do objeto, o indivíduo está se engaj ando em uma determinada categoria cultural, tomando a sua opção visível e demonstrável para a sociedade da qual faz parte. Um bom exemplo é a forma de se vestir, que funciona como a materialização de import.antes coordenadas a respeito de uma pessoa no contexto da ocasião em que se encontra, transmitindo mensagens entre aqueles que não se conheciam previamente. (SAHLINS: 1979). A Antropologia do Consumo se dedica a entender essa relação de interdependência entre cultura e produtos de consumo. O uso dos conhecimentos produzidos por este campo do saber se justifica na medida em que percebemos o processo de consumir enquanto fenômeno cultural de uma sociedade. Para evidenciar esta importância, segue uma revisão dos estudos antropológicos que versam sobre o consumo moderno - suas origens e seus enigmas - e de sua relação com temas característicos da Antropologia, como totemismo, mito e ritual, aliando-os aos estudos encontrados sobre o grupo de novos ricos, no qual se enquadrariam os moradores da Barra, tema desta dissertação. 26 3 . 1 . TEORIAS SOBRE O CONSUMO MODERNO O economista americano Thorstein Veblen desenvolveu a teoria da classe ociosa no ano de 1 899, e com ela influenciou numerosos cientistas sociais em busca de explicações para o consumo moderno. Sua teoria será a primeira a ser apresentada não s6 porque é citada pelos demais autores como também porque traz os principais pensamentos que revelam as motivações de consumo do grupo aqui estudado. Veblen (1965) inicia sua exposição caracterizando o que ele chama de classe ociosa. Presente na história desde os estágios avançados da cultura bárbara, esta classe envolve os nobres, sacerdotes e a maioria de seus agregados. Uma de suas características básicas é a ocupaçãode seus participantes, predominantemente não industrial e, em geral, nas áreas de governo, hJUerra, religião e esportes. Como esclarece Veblen, isto é uma conseqüência da própria origem da classe ociosa, sedimentada em uma discriminação entre diversas funções, onde algumas passaram a ser consideradas dignas - compreendendo elementos de proeza ou façanha - e as outras, indignas - atividades diárias e rotineiras, sem qualquer componente extraordinário. Assim, o trabalho adquire um caráter desagradável devido à indignidade a ele relacionada. A diferença inicial, que deu origem à divisão entre classe ociosa e classe trabalhadora, foi a distinção entre trabalho feminino e trabalho masculino. Da mesma forma, o tipo mais primitivo de propriedade foi a posse das mulheres pelos homens 'capazes'. Com o tempo, o conceito de propriedade se estendeu e passou a incluir a propriedade dos produtos fabricados pelas mulheres, resultando daí a propriedade das coisas além da propriedade das pessoas. Aos poucos a atividade industrial foi substituindo a atividade predatória, e, conforme isto foi acontecendo, a acumulação de bens passou a atuar como o índice convencional de prepotência e de sucesso. Assim, com o crescimento da indústria, a posse de riquezas tomou-se a base mais eficaz e rotineira de conferir estima e reputação, segundo afirma o autor. 27 Logo que a propriedade se torna a base de estima popular, passa também a ser um requisito para o respeito próprio. Em comunidades onde o sistema vigente é o de posse privada de bens, cada indivíduo passa a pertencer a uma determinada classe de acordo com as suas posses. No entanto, Veblen defende que tais indivíduos preferem possuir mais que os outros membros da mesma classe, o que gera o seguinte ciclo: a pessoa acumula uma quantidade maior de riqueza e logo se acostuma a ela, de forma que a nova condição deixa de satisfazê-lo. Assim, cada padrão pecuniário atingido serve como ponto de partida para um novo critério de suficiência, para o qual o indivíduo se mobiliza acumulando ainda mais riquezas. No entanto, ser rico ou deter o poder não é suficiente para conquistar e manter a consideração alheia: é preciso patentear tal condição aos olhos de todos. Veblen afirma que a prova de riqueza não só acentua a importância de seu possuidor frente aos demais, mas também é útil na criaç.ão e preservação da própria satisfação. Sem tal prova, Veblen acredita que este indivíduo se sentiria diminuído em sua dignidade humana, mesmo sem qualquer consideração consciente da aprovação ou desaprovação de seus semelhantes. A repugnância dos membros das classes altas a trabalhos considerados servis traz em si a crença de que seria inevitável que este tipo de atividade contaminasse espiritualmente seus praticantes. A part.ir desta visão, as pessoas mais refinadas condenam lugares vulgares, casas baratas e ocupações produtivas corriqueiras, que seriam incompatíveis com uma vida "mental elevada" (VEBLEN, 1 965). O valor direto e subjetivo do ócio e outros sinais de riqueza é um reflexo de seu uso como um meio para a obtenção de respeito alheio. Uma vida ociosa é o mais simples e mais patente modo de demonstrar força pecuniária, e a condição fundamental é que o indivíduo ocioso possa viver, sem dificuldade, no conforto. Não precisar trabalhar, além de assumir características de honra e mérito, também se torna um requisito de decência. É a prova convencional de riqueza, marcando perante todos a posição social da pessoa. É importante deixar bem claro que a definição de ócio, como usada por Veblen, designa o tempo gasto em atividade não-produtiva devido ao sentimento da indignidade do trabalho produtivo, com a finalidade de demonstrar a capacidade pecuniária de viver de forma inativa. 28 Muitas vezes, o indivíduo quer mostrar que a sua ociosidade vem de longo periodo, e para isso recon-e a provas imateriais deste ócio, que se traduzem por talentos quase-eruditos ou quase-artísticos e de um conhecimento de processos e incidentes que não trazem vantagem direta à vida humana. Neste conjunto se incluem o conhecimento de línguas mortas, ciências ocultas, o uso correto da ortof,'Tafia, refinamentos no vestuário e mobília, participação em jogos e esportes que usam animais de raça como cães e cavalos de corrida. Além destes talentos, outros fatores mais ligados ao caráter do hábito fisico e da destreza também contam para a comprovação do ócio: ter boas maneiras e educação, conhecer normas de polidez e decoro, ou até mesmo de cerimonial. São formas interessantes de mostrar o ócio, já que necessitam de emprego não-produtivo de tempo, esforço e dinheiro para serem adquiridas, e são notadas de forma imediata e ostensiva por todos. Assim sendo, como o ócio é o meio convencional de se conseguir respeitabilidade pecuniária, adquirir uma certa dose de decoro é essencial a todos que aspiram a qualquer posição pecuniária. Veblen acentua que, gradualmente, o ócio conspícuo se transforma não só em um esforço contínuo para um requinte cada vez maior no comportamento, mas também em uma educação para o bom gosto e para desenvolver a sensibilidade quanto aos artigos que devem ser consumidos. Além de saber o que consumir, o membro da classe alta também deve conhecer a forma adequada de consumir os mais variados bens para que sua vida de ócio seja bem conduzida. Daí o surgimento das boas maneiras, que, ao lado dos modos de vida refinados, são sinais de conformidade com a norma de ócio e de consumo conspícuos. Em seguida, o autor introduz os conceitos de o ócio e o consumo vicáriosl l Para ISSO, ele parte de uma segunda divisão de trabalhol2 Alguns escravos passaram a assumir o serviço pessoal do senhor, enquanto os demais eram mantidos na produção industrial, afastados de qualquer relação imediata com o dono. Este processo gradual de isenção de tarefas industriais rotineiras normalmente se iniciava pela isenção da esposa, em geral de sangue nobre. Ter sangue nobre, neste momento, significa ter se distinguido por longo contato com a riqueza ou com contínuo privilégio. 1 1 Vicário: adj (lat vicariu) 1. Que fuz as vezes de outrem. ( ... ) - (Michaelis: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa! São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998, p. 2 198. Editor: Waller Weiszflog). 29 Aqueles senhores com posição excepcional na comunidade e uma situação pecuniária privilegiada tinham à sua disposição servos especializados, que não se ocupavam de outra coisa senão sua tarefa principal. Para Veblen, estes escravos também serviam como ostentação, e por serem uma evidência de riqueza, as tarefas que assumiam tomaram-se cada vez menores, até o ponto em que suas funções passaram a ser meramente nominais. Veblen enfatiza a diferença fundamental existente entre a classe ociosa vicária e a classe ociosa propriamente dita. O ócio da classe de senhores, pelo menos ostensivamente, se caracteriza pelo seu êxito em evitar todo e qualquer trabalho; presumivelmente aumentando o bem-estar do senhor e a opulência de sua vida. Já o ócio da classe de criados domésticos isenta de trabalho produtivo, não visa primariamente o seu próprio conforto. É um ócio necessário e obrigatório, que passa normalmente por ser serviço especializado que tem por fim aumentar a opulência da vida de seu senhor. Veblen ainda ressalta que tanto o criado quanto a esposa, para que satisfaçam os requisitos do esquema de vida da classe ociosa, precisam ter uma atitude de subserviência. No caso dos criados, também devem demonstrar que foram devidamente treinados para tal subserviência e têm no seu exercício a prática necessária. Do contrário, demonstraria a incapacidade do patrão de pagar pelo tempo, esforço e treino de seus criados segundo as rigorosas normas de etiquetas. Veblen arremata: "( . . .) Quando o comportamento do criado indica falta de recursos do patrão, desaparece arazão principal de manter o criado, uma vez que a sua existência se destina a demonstrar a riqueza do patrão." (VEBLEN, 1965 :69) Veblen passa então a um detalhamento de sua visão sobre o consumo conspícuo, a partir da análise dos produtos disponíveis para este fim. Para o autor, alguns produtos - seja por sua natureza ou por sua raridade - tomaram-se tabus na sociedade industrial, sendo consumidos quase que exclusivamente pela classe superior. São destacadamente os produtos relacionados a luxo e conforto, incluindo alimentos e bebidas. A diferenciação cerimonial na alimentação se observa principalmente quanto ao uso de 12 A pri meira forma de di visão do trabalho, como já citado, foi a divisão entre homens e mulheres, onde os primeiros se responsabilizavam por tudo qne incluía atos de façanha e as íJltimas assumiam as tarefas rotineiras. 30 bebidas intoxicantes e de narcóticos; artigos que, por serem dispendiosos, são considerados nobres e honoríficos. Assim, o que se observa é que à classe servil cabe consumir apenas o que é necessário à sua subsistência, enquanto os membros da classe alta consomem mais do que o mínimo necessário para a sua sobrevivência e também especializam seu consumo quanto à qualidade dos bens. Os artigos consumidos pela classe alta sofrem um processo gradual de melhoria em busca de maior eficiência, elaboração e perfeição na promoção de seu conforto e bem-estar pessoal. No entanto, este não é o fim principal de seu consumo. O movimento de inovação sofre também a influência do critério de respeitabilidade na determinação dos produtos que têm melhor possibilidade de sobrevivência. Como o consumo dos bens de maior excelência é considerado uma prova de riqueza, ele se toma honorífico; da mesma forma, a incapacidade de consumir na devida quantidade e qualidade se toma urna marca de inferioridade e de demérito (VEBLEN, 1965). A discriminação rigorosa quanto à excelência nos alimentos, na bebida e outros artigos passa logo a determinar a maneira de viver e também a educação e a atividade intelectual do indivíduo. Ele deixa de ser simplesmente o homem bem sucedido e passa a cultivar o gosto, já que se tomou imprescindível discriminar cuidadosamente entre o que é nobre e o que não possui valor nos bens de seu consumo. Assim ele se toma um connojsseur dos alimentos nobres de vários graus de mérito, das bebidas, dos adornos e vestuário adequados, dos jogos, da arquitetura e tantas outras categorias de produtos. Este cultivo do senso estético requer tempo e esforço; portanto, o indivíduo tende a transformar a sua vida de ócio num aprendizado mais ou menos árduo para uma vida correta de ócio ostensivo, como bem observa Veblen. Para o indivíduo ocioso, o consumo conspícuo de bens valiosos é um instrumento de respeitabilidade. Com o acúmulo de mais riqueza, ele se toma incapaz de, sozinho, demonstrar a própria opulência pelo consumo conspícuo. Por isso ele recorre aos amigos e concorrentes, aos quais oferece presentes valiosos e convida para festas e divertimentos dispendiosos. Veblen então enfatiza que o concorrente, com o qual o dono da festa quer instituir uma comparação de opulência, consome vicariamente 3 1 por seu anfitrião, atua como testemunha do consumo dos bens valiosos que o anfitrião tem em excesso e presencia o seu refinamento de etiqueta. À medida em que acumula riqueza, a classe ociosa desenvolve suas funções e sua estrutura, surgindo dentro dela novas divisões baseadas em um sistema mais ou menos elaborado de status e posições. Esta diferenciação se acentua ainda mais pela herança de riqueza e a conseqüente herança de fidalguia. A herança de .fidalguia traz forçosamente a herança de um ócio obrigatório, e pode ser de tal monta que se herda a vida de ócio sem o complemento de riqueza necessário para mantê-Ia dignamente, ou seja, pode-se herdar sangue nobre sem bens suficientes para possibilitar um consumo livre e fácil numa vida de respeitabilidade. Assim Veblen explica o aparecimento de uma classe de gentis-homens sem dinheiro. Estes gentis-homens de meia casta se classificam segundo um sistema de posições hierárquicas, onde aqueles que, pelo nascimento, pela riqueza ou por ambos, estão mais perto das camadas mais altas da classe ociosa são superiores aos que, pelo nascimento, estão mais afastados delas ou são pecuniariamente mais fracos. Como se trata obviamente de uma relação de troca, estes gentis-homens constituem-se em índices da posição de seus patronos, consumindo vicariamente a sua riqueza supérflua. A este respeito, Veblen deixa claro: "Em toda esta hierarquia de ócio vicário e consumo vicário, a regra é que todos os cargos devem ser exercidos de tal modo, ou em circunstâncias tais, ou ainda sob sinais de tal modo evidentes, que se saiba inequivocadamente de quem é o ócio ou o consumo a que se I igam os dependentes, a quem de direito pertence o resultante incremento de respeitabilidade". (VEBLEN, 1 965: 82) A utilidade do ócio e do consumo conspícuos, para fins de boa reputação, repousa no dispêndio: num caso, o dispêndio é de tempo e esforço; no outro, de bens. Ambos são métodos de demonstrar a posse da riqueza, e os dois são convencionalmente aceitos como equivalentes. Na base da conveniência, pode-se preferir uma forma ou outra em diferentes fases de desenvolvimento econômico; basta saber qual destes dois métodos provocará com maior eficiência uma reação nas pessoas cujas convicções se deseja afetar. Na opinião do autor, em um grupo pequeno, qualquer uma das estratégias surte efeito; no entanto, quando é preciso atingir um ambiente humano mais vasto, o 32 consumo passa a superar o ócio como meIo ordinário de decência. Veblen ainda acrescenta: "( . . . ) A fi m de impressionar esses observadores eremeros e a fim de manter a satisfação própria em face da observação deles, a marca da força pecuniária da pessoa deve ser gravada em caracteres que mesmo correndo se possa ler.(. .. )" . (VEBLEN, 1965:90). Veblen defende que é muito mais dificil diminuir a escala de gastos já adotada do que estendê-Ia em resposta a um aumento de riqueza. Seu argumento é de que muitos dos itens consumidos habitualmente, quando analisados, revelam-se quase que inteiramente como desperdício, sendo, portanto, apenas honorários. No entanto, ao serem incorporados à escala de consumo decente, passam a integrar a vida do indivíduo de tal forma que se tornam tão dificeis de serem abandonados como quaisquer outros itens que conduzem diretamente ao conforto fisico pessoal, ou mesmo como os necessários à vida e à saúde. É notoriamente tão difícil abandonar um padrão de vida elevado como baixar um padrão que já é relativamente baixo, apesar de, no primeiro caso, a dificuldade ser de ordem moral, enquanto no último poderá significar redução material dos confortos físicos Mas, enquanto a regressão é dificil, um novo avanço nos gastos conspícuos é relativamente fácil, se processando quase que normalmente. Isto sugere que o padrão de vida, que em geral governa os nossos esforços, não é formado pelos gastos ordinários comuns já alcançados, mas sim pelo consumo ideal pouco além do nosso alcance, ou cujo alcance requer um certo esforço. O motivo que Veblen alega para isso é a competição, ou seja, o estímulo de uma comparação individual que nos instiga a sobrepujar àqueles que estamos habituados a considerar como pertencentes à nossa classe. O nosso padrão de decência nos gastos, assim como em outros meios de competição, é determinado pelo padrão de respeitabilidade que vigora na classe logo acima à nossa na escala social. As exigências da decência pecuniária tiveram um efeito de grande alcance no critério popular da beleza ou da utilidade dos bens de consumo. O autor coloca que a satisfação que deriva do uso e da contemplação de produtos caros e considerados belos é, em geral, uma satisfação
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