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LUCIANA PACHECO GOLINELLI UTILIZAÇÃO DE FERRAMENTAS MOLECULARES PARA AUTENTICIDADE E RASTREABILIDADE DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL Rio de Janeiro 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE QUÍMICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DE ALIMENTOS Luciana Pacheco Golinelli UTILIZAÇÃO DE FERRAMENTAS MOLECULARES PARA AUTENTICIDADE E RASTREABILIDADE DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL Orientadores: Prof.º Drº. Joab Trajano Silva (in memoriam) Prof.ª Drª. Vânia Margaret Flosi Paschoalin Prof.ª Drª Ana Carolina da Silva Carvalho Rio de Janeiro 2014 Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências. G638 Golinelli, Luciana Pacheco. Utilização de ferramentas moleculares para autenticidade e rastreabilidade de produtos de origem animal / Luciana Pacheco Golinelli. -- Rio de Janeiro: UFRJ/ IQ, 2014. 127 f.: il. Orientador: Vânia Margaret Flosi Paschoalin. Co-orientador: Ana Carolina da Silva Carvalho. Tese (Doutorado em Ciências) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos, Rio de Janeiro, 2014. 1. PCR convencional e qPCR. 2. Adulteração. 3. Queijo de cabra frescal. 4. Rações para bovinos. 5. Microscopia 6. Percepção do consumidor. I. Paschoalin, Vânia Margaret Flosi. (orient.). II. Carvalho, Ana Carolina (coorient.). III. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Química. Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos. IV. Título. CDD: 664.001 LUCIANA PACHECO GOLINELLI UTILIZAÇÃO DE FERRAMENTAS MOLECULARES PARA AUTENTICIDADE E RASTREABILIDADE DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL Tese de doutorado apresentada ao programa de pós-graduação em Ciência de Alimentos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos para obtenção do grau de Doutor em Ciências. Aprovada em: _____ agosto de 2014. Banca Examinadora ______________________________________________________ Prof. a Dr. a Vânia Margaret Flosi Paschoalin-IQ/UFRJ (Orientador) ________________________________________________ Prof. a Dr. a Ana Carolina da Silva Carvalho-Campus Macaé/UFRJ (Coorientador) ______________________________________________________ Prof a Dr a Maria Alice Zarur Coelho-EQ/UFRJ ______________________________________________________ Profº. Drº. Carlos Adam Conte Junior-Faculdade de Veterinária/UFF ______________________________________________________ Profº. Drº. Eduardo Eustáquio de Souza Figueiredo-FANUT/UFMT ______________________________________________________ Prof. a Dr a Solange Maria Gennari-FMVZ/USP ______________________________________________________ Prof. a Dr. a Analy Machado de Oliveira Leite-Campus Macaé/UFRJ (Suplente) Dedico este trabalho primeiramente a Deus, meu criador e razão da minha vida obrigada Senhor, pela fé, força, perseverança e paciência que me deu ao longo desta jornada. A meus pais e marido, os quais sempre acreditaram em mim e me deram todo o apoio necessário em todos os momentos. A minha irmã e amigos pelo incentivo a busca de novos conhecimentos e a todos os professores e professoras que muito contribuíram para a minha formação. AGRADECIMENTOS À minha mãe e meu pai por sempre estar ao meu lado, acreditando e torcendo por mim, devo esta tese a vocês meus grandes inspiradores e presentes de Deus. À minha filha querida Giovana presente maravilhoso que foi gerado durante o Doutorado e chegou para abrilhantar a minha vida. Agradeço aos pesquisadores do LANAGRO/MG Ronaldo Linhares Sanches, Danillo Vicente Reis e Juarez Fabiano de Alkmin Filho pela imensa colaboração e ajuda sempre presente no desenvolvimento deste trabalho. Agradeço a médica veterinária Cecília Ribeiro/UFF pela coleta de sangue dos animais que foram fundamentais para o desenvolvimento do estudo. Aos meus grandes amigos do laboratório 545, Rafael, Fernanda, Raquel, Josiane e Claudio, obrigado por todo o conhecimento acadêmico transmitido a mim durante o período que estive na UFRJ. À minha coorientadora e amiga Ana Carolina o meu muito obrigado pelo enorme auxílio com suas orientações a todo o momento, sempre quando precisava estava disposta a ajudar, não tenho palavras o quanto aprendi com você não só a trabalhar corretamente, mas também agir sempre com transparência e excelência. Ao amigo e técnico de laboratório Ricardo Brettas, pelas palavras sábias de incentivo, encorajamento e grande amizade em todos os momentos alegres ou difíceis que compartilhamos. À Profª Vânia Paschoalin e ao Profº Joab Silva (in memoriam) pela confiança que sempre depositaram em mim desde 2005 quando abriram as portas do laboratório, sou grata pelos ensinamentos e pelo exemplo de competência e seriedade que levarei ao longo da minha vida profissional. Ao órgão de fomento, CAPES, pelo apoio financeiro concedido a mim e ao presente projeto. RESUMO GOLINELLI, Luciana Pacheco. Utilização de ferramentas moleculares para autenticidade e rastreabilidade de produtos de origem animal. Rio de Janeiro, 2014. Tese (Doutorado em Ciência de Alimentos)- Programa de Pós-graduação em Ciência de Alimentos, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. A autenticidade de produtos alimentícios destinados à alimentação humana e animal é importante porque a adulteração destes pode enganar o consumidor, causar danos à saúde da população e perdas econômicas. O objetivo deste estudo foi avaliar a presença de material de origem animal, proibido por legislação, em rações e investigar a adulteração de queijos de cabra Minas frescal, comercializados no Rio de Janeiro. As metodologias usadas foram a microscopia (método oficial) e a PCR em tempo real quantitativa (qPCR) para detecção de material derivado de ruminantes, suíno e aves (frango) nas rações animais. Testes de PCR duplex e análise sensorial foram usados para avaliar queijos de cabra. Os testes de PCR tinham como alvo o gene 12S rRNA e a região do citocromo b ambos mitocondriais. O limite de detecção foi determinado pela adição de farinha de carne e ossos (FCO) em rações de referência ou de quantidades conhecidas de leite de vaca em queijos de cabra. O teste da qPCR foi capaz de detectar 0,0125%m/m de FCO bovina, enquanto que a microscopia detectou uma quantidade duas vezes maior, ou seja, 0,025% m/m. Vinte e nove rações foram avaliadas pela microscopia e destas, 28 foram consideradas livres de material animal. Utilizando testes de qPCR foi mostrado que 21 rações continham produto animal, sendo encontrado material bovino (n = 14), suíno (n = 02), caprino (n = 1) e a presença de material de pelo menos duas espécies na mesma ração (n = 04). Quinze de 18 rações (83%) obtidas no estado de Minas Gerais continham material animal; 11 destas, material bovino; 2, material bovino e suíno, 01, material bovino e de frango e 1, material bovino, suíno e de frango. Seis das nove rações (67%) obtidas no estado do Ceará, continham material animal, sendo 3 de bovino, 2 de suíno e 1 de caprino. As 2 rações coletadas no Rio de Janeiro estavam livres de material animal proibido. O limite de detecção do leite bovino em queijos de cabra pela PCR foi de 0,5%(v/v). A análise dos 20 queijos de cabra mostrou que todos foram adulterados pela adição de leite de vaca, embora a adição da espécie adulterante não estivesse especificada nos rótulos dos produtos. Para estimar a percepção da adição fraudulenta, foi realizada uma avaliação sensorial através de teste triangular, oferecendo para 102 consumidores queijos formulados com diferentes proporções de leite de cabra e vaca. Os consumidores perceberam o nível de adulteração com adição da menor quantidade (10% v/v) de leite de vaca. A implantação de ações efetivas para análise de produtos lácteos caprinos no Brasil é importante para regular o mercado, considerando os direitos e as escolhas dos consumidores em relação aos seus requisitos específicos para a dieta e a saúde, preferência ou custo. Por outro lado, a combinação da microscopia e qPCR poderia proporcionar segurança quanto a composição de rações animais, mantendo o Brasil em sua posição consolidada como importante produtor e exportador de carnes. Palavras-chave: PCR convencional e qPCR. Adulteração. Queijo de cabra frescal. Rações para bovinos. Microscopia. Percepção do consumidor. ABSTRACT GOLINELLI, Luciana Pacheco. Utilização de ferramentas moleculares para autenticidade e rastreabilidade de produtos de origem animal. Rio de Janeiro, 2014. Tese (Doutorado em Ciência de Alimentos)- Programa de Pós-graduação em Ciência de Alimentos, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. The authenticity of food products for human beings as well as feed for farmer animals is important because it can mislead consumers, cause serious damage to the health of populations and also cause considerable economic losses. The aim of this study was to evaluate the presence of prohibited animal-materials in commercial feeds and also investigate the adulteration of frescal (fresh) goat cheeses by cow’s milk marketed at Rio de Janeiro. The methodologies used in this study were the microscopy analysis for the presence of animal material in animal feed (official method) and the real-time quantitative PCR (qPCR) for detection of ruminants, porcine and avian (chicken) DNA in animal feeds. The duplex PCR assay and sensory analysis were used for evaluation of goat cheeses. Both molecular tests were based on the amplification of the 12S rRNA and cytrocome b region from the mitochondrial gene. Detection limits were established for both techniques based on reference feeds spiked with meat and bone meal (MBM) and formulated goat cheeses containing known amount of cow’s milk. qPCR test was able to detect 0.0125% w/w of bovine MBM whereas microscopy detected the double amount (0.025% w/w). Twenty nine feeds were evaluated by microscopy analysis and 28 were considered free of banned-animal meals. The qPCR tests detected prohibited animal materials in 21 of them where, majorly from bovine (n=14), but feeds containing porcine DNA (n=02), caprine DNA (n=1), and at least two species-derived materials (n=04) were also found. Fifteen of 18 feeds for bovine (83%) obtained in the state of Minas Gerais southeast Brazil contained prohibited animal material whereas 6 of the 9 feeds (67%) obtained in the state of Ceará, northeast Brazil, contained also prohibited materials. Two feeds collected in Rio de Janeiro were free of prohibited animal materials. The detection limit of cow’s milk in goat cheeses by PCR tests was 0.5% v/v. The analysis of 20 goat cheese samples showed that all of them were adulterated with cow’s milk, although the labels did not indicate the addition of cow’s milk in the cheese composition. In order to estimate the perception of consumer of the fraudulent addition, a triangle test was performed, by offering to 102 regular consumers of dairy products, cheeses formulated with several different proportions of goat’s and cow`s milk. Detection threshold (DT) analysis indicated that nearly half of the consumers were able to perceive 10% v/v cow’s milk adulteration. The implementation of effective actions to regulate the market for goat dairy products in Brazil, is important since it should be considered the rights and choices of consumers with respect to their particular requirements for diet and health, preference, or cost. In the same way, a combination of microscopy and qPCR test could achieve the security of feeds in Brazil keeping to the country its strong position as an important meat producer and exporter. Keywords: PCR and qPCR. Adulteration. Frescal goat cheese. Feeds for bovine. Microscopy. Consumer perception. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1 14 2 REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................. 16 2.1 ADULTERAÇÃO EM ALIMENTOS ................................................................. 16 2.2 RASTREABILIDADE E ROTULAGEM DOS ALIMENTOS ........................... 17 2.3 AUTENTICIDADE NA COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS .............................. 20 2.4 O ATENDIMENTO AOS PARÂMETROS DA LEGISLAÇÃO SOBRE ALIMENTAÇÃO HUMANA ............................................................................. 22 2.5 COMPOSIÇÃO DOS ALIMENTOS PARA RUMINANTES ............................ 23 2.5.1 Ingredientes usados na elaboração de rações ................................................ 24 2.5.1.1 volumosos........................................................................................................ 24 2.5.1.2 concentrados.................................................................................................... 25 2.5.1.2.1 milho (Zea mays)........................................................................................... 25 2.5.1.2.2 sorgo (Sorghum bicolor................................................................................. 26 2.5.1.2.3 trigo (Triticum spp.) ...................................................................................... 27 2.5.1.2.4 arroz (Oryza sativa)........................................................................................ 27 2.5.1.2.5 farelo de amendoim (Arachis hypogaea L.) .................................................. 28 2.5.1.2.6 soja (Glycine max).......................................................................................... 28 2.5.1.2.7 algodão (Gossypium L.) ................................................................................. 29 2.5.1.2.8 farelo de girassol (Helianthus annuus) .......................................................... 2.5.1.2.9 sebo ............................................................................................................... 2.5.1.2.10 farinha de carne e ossos (FCO) ................................................................... 2.5.1.2.11 farinha de peixe ........................................................................................... 2.5.1.2.11 farinha de sangue .................................................................................... 2.5.1.2.12 cama de frango ............................................................................................ 2.6 AUTENTICIDADE DA COMPOSIÇÃO DE RAÇÃO PARA RUMINANTES ....................................................................................................................................... 29 29 30 30 31 31 32 2.7 PRODUÇÃO DE RAÇÕES NO BRASIL EM ATENDIMENTO AOS http://pt.wikipedia.org/wiki/Gossypium http://pt.wikipedia.org/wiki/L. REGULAMENTOS......................................................................................................32 2.8 METODOLOGIAS UTILIZADAS PARA ANÁLISE DE MATERIAL DE ORIGEM ANIMAL EM RAÇÕES ............................................................................. 36 2.8.1 Microscopia......................................................................................................... 36 2.8.2 qPCR .................................................................................................................. 2.8.3 ELISA ................................................................................................................. 2.8.4 Métodos baseados na espectroscopia no infravermelho próximo ................. 2.8.5 Cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (CG-MS) ...... 2.8.6 Focalização isoelétrica capilar .................................................................... 37 39 40 42 43 2.9 METODOLOGIAS PARA DETECÇÃO DE MISTURAS DE LEITE DE VACA, OVELHA E CABRA ..................................................................................... 2.9.1 Métodos cromatográficos ................................................................................. 2.9.2 Métodos eletroforéticos .................................................................................... 2.9.3 Métodos imunológicos ...................................................................................... 2.9.2 PCR (reação em cadeia da polimerase) .......................................................... 2.9.2 Análise sensorial de produtos alimentícios como ferramenta para detecção de adulteração ............................................................................................. 3 OBJETIVOS............................................................................................................. 3.1 OBJETIVO GERAL .............................................................................................. 44 44 46 48 50 50 52 52 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS.................................................................................. 52 4 ESTUDO ORIGINAL I : SEMI-QUANTITATIVE REAL-TIME PCR FOR SPECIES-SPECIFIC DETECTION OF MAMMALIAN AND AVIAN-DERIVED PRODUCTS IN COMMERCIAL FEEDSTUFFS IN BRAZIL …………………………………… 53 4.1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 4.2 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................... 54 57 4.3 RESULTADOS ……………………………………………………………......... 4.4 DISCUSSÃO E CONCLUSÃO ……………………………………………........ 5 ESTUDO ORIGINAL II : SENSORY ANALYSIS AND SPECIES-SPECIFIC PCR DETECT BOVINE MILK ADULTERATION OF FRESCAL GOAT CHEESE 60 65 ………………………………………………………………....................................... 5.1 INTRODUÇÃO ……………………………………………………………….... 5.2 MATERIAL E MÉTODOS …………………………………………………....... 5.3 RESULTADOS E DISCUSSÃO........................................................................... 5.4 CONCLUSÕES …….………………………………………………………........ 6 DISCUSSÃO ............................................................................................................ 7 CONCLUSÕES ....................................................................................................... 8 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 72 73 75 78 83 85 95 96 LISTA DE FIGURAS ESTUDO ORIGINAL I ESTUDO ORIGINAL II a 1 Ensaio Ensaio da qPCR para construção da curva padrão a partir das diluições seriadas de 50 ng/l a 0,5 pg de DNA obtido das amostras de sangue de ruminantes (bovino, ovino e caprino), suíno e aves (frango) e controle endógeno. (qPCR tests of 10-fold serial dilutions of DNA templates from 50ng/µl (100%) to 0,5pg obtained from blood samples of ruminant species (bovine, goat and ovine), porcine, avian(chicken) and endogenous controls) ………………................................................................................. 62 1 Limite de detecção da adulteração com leite de vaca em queijo de cabra (Detection limit of cow’s milk adulteration in goat cheese) ............................................................................................... 79 2 Detecção de adulteração por adição leite de vaca em queijo de cabra (Detection of goat cheese adulteration by cow’s milk) ............................................................................................................ . 80 3 Percentual de provadores que identificaram a adição de leite de vaca em queijos de cabra, através do teste de triangular (Percentage of panelists identifying the cheese with added cow’s milk in triangle tests) .......................................................................... 82 LISTA DE QUADROS E TABELAS QUADROS S 1 Produção de rações nos anos de 2011 e 2012, expressos em milhões de toneladas .......................................................................................... 33 ESTUDO ORIGINAL I TABELAS 1 Sequências de primers e sondas espécie-específicas, genes-alvo e e referências (Specie-specific primer and probe sequences, targets and references) …………………………………………………….. 59 2 Sistema TaqMan TM -qPCR para identificação espécie-específicas (Specie-specific qPCR systems) ....................................................... 61 3 Avaliação comparativa entre o desempenho da microscopia e a qPCR para detecção de FCO adicionada à rações para ruminantes livre de material de origem animal (Comparative detection of MBM in spiked feeds-free from animal material by qPCR tests and microscopy analysis) .................................................. 63 4 Análise comparativa entre a microscopia e os valores de Ct (média e desvio padrão) obtidos pelo sistema TaqMan TM -qPCR para detecção de produto derivado de bovinos, caprinos, ovinos, suínos e aves (frangos), em rações comercializadas em três estados brasileiros: Ceará (nordeste), Minas Gerais e Rio de Janeiro (sudeste) (Microscopy analysis and Ct values (mean and standard deviation) obtained in qPCR tests for the detection of bovine, caprine, ovine, porcine and avian (chicken) in 29 samples of feedsfrom three states of Brazil: Minas Gerais and Rio de Janeiro (Southeast) and Ceará (Northeast) ....................................................... 64 LISTA DE SIGLAS, ABREVIATURAS AAFCO Associação Americana Oficial de Controle da Alimentação ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária APPCC Análise de perigos e pontos críticos de controle BPF Boas práticas de fabricação BSE Bovine spongiform encephalopathy CJD Creutzfeldt-Jakob Disease CMS Carne mecanicamente separada CWD Chronic wasting disease Ct Threshold cycle DT Detection threshold EEB Encefalopatia espongiforme bovina FAO Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura FB Fibra bruta FCOFarinha de carne e ossos; termo em inglês MBM (Meat and bone meal) FPLC Fast protein liquid chromatography FMD Foot and mouth disease FSE Feline spongiform encephalopathy FUNASA Fundação Nacional de Saúde GC-MS Gas cromatography- mass spectrometry IDEC Instituto de Defesa do Consumidor INMETRO Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial IPC Controle positivo interno MAPA Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento MBM Meat and bone meal MGB Minor groove binder NDT Nutrientes digestíveis totais NM Nanômetros OMS Organização Mundial de Saúde OIE World Organization for Animal Health PCR Reação em cadeia da polimerase PB Proteína bruta pb Pares de base PAP Processed animal protein kPa QuiloPascal. RP-HPLC Reversed-phase high pressure liquid chromatography RIISPOA Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal SINDIRAÇÕES Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal SISBOV Sistema Brasileiro de identificação e certificação de origem bovina e bubalina SRM Specified risk material TME Transmissible mink encephalopathy TSE Transmissible spongiform encephalopathies vCJD Variant of Creutzfeldt - Jakob disease WHO The World Health Organization LISTA DE ANEXOS ANEXO I FICHA DEMOGRÁFICA ........................................................................ 116 II TESTE TRIANGULAR............................................................................ 119 III APRESENTAÇÃO DE TRABALHO EM EVENTO CIENTÍFICO: Detecção de Adulteração em Queijo de Cabra Utilizando como Ferramenta a PCR MULTIPLEX. Anais da XXXII Jornada Iniciação Científica UFRJ. 2010 ................................................................................. 120 IV APRESENTAÇÃO DE TRABALHO EM EVENTO CIENTÍFICO: Detecção de Adulteração em Produtos Lácteos Utilizando a PCR duplex. In: Simpósio Latino Americano de Ciência de Alimentos, 2011, Campinas - São Paulo. Ciência de Alimentos e qualidade de vida: saúde meio ambiente e sustentabilidade, 2011................................................................ 121 V APRESENTAÇÃO DE TRABALHO EM EVENTO CIENTÍFICO: Identification of adultered goat cheese marketed in Rio Janeiro city. In: 16 th (Iuofost) World Congressof Food Science and Technology:“Addressing Global Food Security and Wellness through Food Science and Technology”, 2012, Foz do Iguaçu - Paraná, 2012 ……. 122 VI APRESENTAÇÃO DE TRABALHO EM EVENTO CIENTÍFICO: Detection of meat and bone meal in ruminant feeds by species-specific PCR assay. In: 16 th (Iuofost) World Congress of Food Science and Technology : “Addressing Global Food Security and Wellness through Food Science and Technology”, 2012, Foz do Iguaçu - Paraná, 2012……. 123 VII APRESENTAÇÃO DE TRABALHO EM EVENTO CIENTÍFICO: Identificação de Fraudes em Queijos de Cabra Comercializados na Cidade do Rio de Janeiro. Anais da XXXV Jornada Iniciação Científica UFRJ. 2013 ……………………………………………………………………..... 124 VIII CARTA DE ACEITE DO ESTUDO ORIGINAL IV: Sensory analysis and species-specific PCR detect bovine milk adulteration of frescal goat cheese, Journal of Dairy Science, 2014 …………………………………... 125 IX CARTA DE SUBMISSÃO DO ESTUDO ORIGINAL V: Semi- quantitative real-time PCR for species-specific detection of mammalian and avian-derived products in commercial feedstuffs in Brazil, Food Control, 2014 …………………………………………………………….... 126 14 1 INTRODUÇÃO A alimentação e a nutrição são condições básicas para a promoção e a proteção da saúde, possibilitando a expressão plena do potencial de crescimento e desenvolvimento humano, com qualidade de vida e cidadania (BADARÓ et al., 2007). O Decreto-Lei nº 986, de 12 de outubro de 1969, que instituiu normas básicas sobre os alimentos, define alimento como toda substância ou mistura de substâncias, no estado sólido, líquido, pastoso ou qualquer outra forma adequada, destinadas a fornecer ao organismo humano os elementos normais à sua formação, manutenção e desenvolvimento (BRASIL, 1969). A preocupação com a qualidade dos alimentos já fazia parte das civilizações mais antigas. A primeira lei referente a qualidade de um alimento foi proclamada na Inglaterra em 1202 que proibiu a adulteração dos ingredientes usados na fabricação do pão. Outra importante lei, aprovada no congresso brasileiro em 1938, foi a Lei Federal para Alimentos, Drogas e Cosméticos, que estabeleceu padrões para identificação, qualidade, e embalagens, assim como autorização para inspeções nas fábricas de produtos alimentícios (FILOMENO, 2003). Pesquisas brasileiras, realizadas por Universidades, pelo Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) e pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) mostraram que havia irregularidades em, praticamente, todos os grupos de alimentos (PROENÇA, 2002). A não conformidade dos produtos alimentícios comercializados no varejo, bem como o fluxo crescente de alimentos importados e exportados pelo Brasil, requer maior ação e fiscalização por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Esta fiscalização deve ocorrer em todas as etapas da produção, desde a obtenção da matéria-prima, passando pelo transporte, armazenamento e processamento, até a distribuição final ao consumidor (VALENTE e PASSOS, 2004). A Portaria n° 2.715/2011 do Ministério da Saúde estabeleceu a Política Nacional de Alimentação e Nutrição e elegeu entre seus objetivos principais a preocupação com a segurança e com a qualidade dos alimentos disponibilizados para consumo no país, assim como a garantia da qualidade da prestação dos serviços, além do desenvolvimento de mecanismos de investigação no segmento alimentício. 15 A autenticidade de produtos alimentícios destinados a humanos e ruminantes é importante uma vez que a adulteração de ambos caracteriza ação fraudulenta podendo trazer sérios danos para a saúde do consumidor e prejuízos econômicos, impedindo até mesmo as exportações e prejudicando a credibilidade do Brasil como país produtor de alguns gêneros alimentícios como é o caso da carne. 16 2 REVISÃO DA LITERATURA 2.1 ADULTERAÇÃO EM ALIMENTOS Em 2013 a população mundial alcançou 7,2 bilhões de pessoas e segundo previsões demográficas, da Organização das Nações Unidas (ONU) poderá ultrapassar os 9 bilhões, ainda na metade deste século (ONU, 2013). A explosão demográfica se dará notadamente na Ásia e na África, responsáveis por 2,25 bilhões de novos habitantes, enquanto as Américas, Europa e Oceania contribuirão com apenas 250 milhões (ZANI, 2011). O crescimento populacional gerou o desafio de proporcionar alimentos em quantidade e qualidade adequadasa toda a população mundial. Um grande esforço de adaptação e adequação tem sido exigido das cadeias produtivas, visando eficiência na produção e distribuição de alimentos e matérias primas, em condições de competitividade nos principais mercados nacionais e internacionais. Esse aumento da demanda por alimentos poderá facilitar a ocorrência de fraudes de vários gêneros (GALEAZZI et al., 2002). A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que pelo menos 200 casos de fraude e contaminação de grandes proporções são identificados a cada ano no mundo. Para esta organização, a incapacidade dos países em garantir a qualidade e segurança dos alimentos está se agravando, e seus especialistas sugerem que todas as tecnologias disponíveis sejam usadas para garantir a qualidade dos alimentos (ESTADO DE S. PAULO, 2007). Segundo a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) a adulteração dos alimentos é definida como: contaminação, deterioração ou alteração de suas propriedades alimentícias. O alimento é considerado adulterado caso contenha substância tóxica ou perigosa à saúde além dos limites de tolerância; apresente qualquer substância estranha às suas características; contenha elemento deteriorado; quando foi retirada dele substância alimentícia além do limite de tolerância; quando foi produzido em condições sanitárias inadequadas ou foram acrescentados a ele corantes, conservantes ou quaisquer substâncias não permitidas pela legislação sanitária vigente (BRASIL, 2004 a ). O Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária dos Produtos de Origem Animal (RIISPOA) considera adulterados os produtos que tenham sido elaborados em condições que contrariem as especificações e determinações fixadas; quando no preparo dos produtos tenha sido empregada matéria-prima alterada ou 17 impura; quando tenham sido empregadas substâncias de qualquer qualidade, tipo e espécies diferentes daquelas da composição normal do produto sem prévia autorização do departamento de inspeção de produtos de origem animal; quando os produtos tenham sido coloridos ou aromatizados sem prévia autorização e não conste declaração nos rótulos; ou quando há intenção dolosa em mascarar a data de fabricação (BRASIL, 1952). Algumas vezes, a adulteração consiste na substituição de constituintes de elevado custo por outros menos dispendiosos, ou ainda na omissão de algum componente e ou na adição de ingredientes que não sejam inerentes ao produto (SILVA, 1999). Adulterações que ocorrem em produtos alimentares contendo leite e/ou proteínas lácteas são relativamente frequentes e diversificadas, incluindo: adição de leite de vaca ao leite de ovelha e/ou cabra para a preparação de queijo; a incorporação de proteínas do soro na produção de queijos; a adição de caseínas, ou proteínas do soro a produtos alimentares, particularmente nos derivados de carne (VELOSO et al., 2002 a ). Muitas são as doenças que podem ser transmitidas aos seres humanos através de alimentos contaminados, quando práticas de higiene são negligenciadas ou esquecidas. O perigo das contaminações por micro-organismos é relevante assim como o uso indiscriminado de conservantes e outras substâncias que são adicionadas aos alimentos durante o processamento industrial (os chamados aditivos químicos). Uma alimentação higiênica é um dos parâmetros essenciais para a promoção e a manutenção da saúde e deve ser assegurada pelo controle eficiente da qualidade sanitária do alimento em todas as etapas da cadeia alimentar, entendendo-se por cadeia alimentar todas as etapas que envolvem a obtenção do alimento. A deficiência nesse controle é um dos fatores responsáveis pela ocorrência de surtos de doenças transmitidas por alimentos. Em 1998 a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) definiu higiene dos alimentos como o conjunto de medidas necessárias para garantir a segurança, a salubridade e a sanidade do alimento. É nesse contexto que os serviços da ANVISA e MAPA norteiam suas atividades, visando minimizar os riscos das doenças transmitidas por alimentos na população (SCHREINER, 2003). 2.2 RASTREABILIDADE E ROTULAGEM DOS ALIMENTOS O Brasil representa hoje uma das maiores potências do agronegócio mundial, destacando-se como um grande produtor e exportador de diversos gêneros agrícolas (IBA et al., 2003). Na primeira década do século XXI, o Brasil, tornou-se o maior exportador, o 18 segundo maior produtor e o terceiro consumidor de carne bovina do mundo (Ribeiro, 2012). O país tem o segundo maior rebanho do mundo, com mais de 212 milhões de cabeças de gado, sendo que um quinto da carne vendida para mais de 180 países nos mercados internacionais é proveniente do Brasil (MAPA, 2003; ABIEC, 2013). O sucesso alcançado pelo Brasil se deve em grande parte ao reconhecimento da qualidade do sistema produtivo nacional e a confiança crescente no conceito de segurança alimentar e sanidade animal, com grande ênfase na produção de carne de qualidade que é praticado no país (GOULART, 2011). Neste sentido, o alimento deve satisfazer as exigências de qualidade quanto ao aspecto nutricional, bem como quanto à pureza, higiene, sanidade e integridade (NASCIMENTO, 2009). O fornecimento de alimentação ao cidadão, com características nutricionais adequadas, em quantidade suficiente e livre de contaminação microbiológica é um cuidado primário e deve fazer parte das políticas públicas de promoção da saúde (ZANLORENZI, 2008). Episódios como o aparecimento da encefalopatia espongiforme bovina (BSE), surtos de febre aftosa em vários países (inclusive no Brasil), contaminação com dioxina em frangos e suínos na Bélgica (maio de 1999) e, mais recentemente, a gripe aviária que inicialmente acometeu os países orientais, mas que depois atingiu diversos países levou a um aumento da preocupação com produtos de origem animal, especialmente por parte da União Européia. Tais fatos fizeram com que leis sanitárias rigorosas fossem estabelecidas em relação aos produtos cárneos, exigindo dos países exportadores, que seus estabelecimentos produtores fossem por ela habilitados, devendo estes possuir um certificado de saúde pública emitido pela mesma, para então a comercialização ser aceita pelos países-membro. Esta mesma qualidade vem sendo cada vez exigida também pelo mercado interno brasileiro. Assim como o consumidor europeu, o consumidor brasileiro também passou a exigir mais qualidade, está atento e observando as informações disponíveis, seja no rótulo ou através de outras fontes de disponíveis, procurando qualidade na sua alimentação (SILVA e SATO, 2008). Com a necessidade de se adequar às exigências sanitárias e de segurança alimentar, em especial impostas pela União Européia, o Brasil criou, através da Instrução Normativa nº1 de 9 de janeiro de 2002, o Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina (SISBOV) definido como o conjunto de ações, medidas e procedimentos adotados para caracterizar a origem, o estado sanitário, a produção, a produtividade da pecuária nacional e a segurança dos alimentos provenientes dessa exploração econômica, objetivando identificar, registrar e monitorar, individualmente, todos os bovinos e bubalinos nascidos no Brasil ou importados (BRASIL, 19 2002). A Instrução normativa nº 17, de 13 de julho de 2006 veio substituir a de 2002 trazendo uma nova estrutura operacional para o Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos. O novo sistema é de adesão voluntária, permanecendo a obrigatoriedade de adesão para a comercialização em relação a mercados que exijam a rastreabilidade (BRASIL, 2006 a ). A esse processo de controle de identificação e certificação de origem, deu-se o nome de rastreabilidade. O conceito de rastreabilidade envolve a recomposição da história do produto alimentício, com identificaçãoe registro de cada etapa do processo. Assim, as etapas de produção, industrialização e consumo, devem ser registradas e disponibilizadas as informações que permitam, por exemplo, identificar como o animal foi criado, o tipo de ração utilizado, a época e o método de abate, a maneira como o alimento (produto do abate) foi industrializado e conservado até o consumo. A identificação de animais pode ser feita através da utilização de um brinco auricular ou um brinco botão padrão SISBOV em uma das orelhas do animal, um dispositivo eletrônico colocado na orelha ou uma tatuagem com o número de manejo SISBOV (BRASL, 2006 a ). A rastreabilidade complementa o gerenciamento da qualidade de um produto, mas quando aplicada isoladamente não representa garantia de segurança ao produto ou ao processo. Deve, portanto, estar agregada a outros sistemas de controle e garantia da qualidade dos produtos como o programa de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) e de Boas Práticas de Fabricação (BPF) (IBA et al., 2003). Na comunidade internacional, a rastreabilidade é conhecida como ISO 22005:2007 (ISO, 2007). Segundo Spers (2003), a confiança no local de compra da carne, a utilização de selos que indiquem a qualidade e certificações são fundamentais para a rastreabilidade. A certificação representa um conjunto de procedimentos pelo quais uma entidade certificadora credenciada (imparcial e independente) atesta que um produto ou processo atende a requisitos pré- estabelecidos. Uma produção certificada não garante que um produto seja passível de ser rastreado, porém um produto rastreado deve passar por um processo de certificação do sistema. A rotulagem, num sistema de rastreabilidade, tem importância na demonstração dos registros feitos da cadeia produtiva e em assegurar a qualidade ao consumidor, fornecendo-lhe as informações requeridas. Deve existir uma correlação entre os elos da cadeia que permita a transferência das informações de um segmento a outro. Os rótulos devem identificar os produtos de forma única, inequívoca e permanente e a identificação deve estar interligada a 20 um sistema central de armazenamento de dados, que permita o acesso a todos os elos da cadeia produtiva, inclusive para o consumidor. Os cuidados com a rotulagem dos alimentos constitui uma tendência que é o resultado da nova postura exigente do consumidor, no sentido da valorização das diversas opções de certificação dos alimentos, buscando assegurar questões relativas, por exemplo, ao processo, à conformidade, à qualidade, à origem e à composição nutricional (PROENÇA, 2002). 2.3 AUTENTICIDADE DA COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS O preço de um produto, frequentemente, depende de sua composição, que deve estar especificada em seu rótulo. Estas informações são utilizadas, na maioria das vezes, pelas indústrias como forma de marketing para atrair os consumidores e, ao mesmo tempo, agregar valor ao produto. Entretanto, na maioria das vezes, a composição do produto não pode ser determinada com facilidade, principalmente no caso de produtos extensivamente processados, e que, por esta razão poderiam ser fraudados com maior frequência. Incluem-se neste tipo de fraudes a adição de produtos que não estejam especificados, ou seja, em desacordo com a rotulagem, como a substituição de uma matéria prima mais nobre por outra de qualidade inferior ou de menor valor de mercado (EGITO, 2006). A adição de leite de vaca ao leite de cabra na preparação de queijos, sem prévia declaração no rótulo, representa fraude, enganando o consumidor, mas também pode trazer riscos a saúde do indivíduo que, em alguns casos, escolhe este alimento com orientação médica devido a uma restrição alimentar como, por exemplo, a alergia ao leite de vaca (VELOSO, 2002 a ). A caprinocultura leiteira veio se consolidando no Brasil como uma atividade rentável a partir de 2000, com a Instrução Normativa 37 que fixou as condições de produção, identidade e requisitos mínimos para a obtenção de um leite de qualidade e critérios para produtos pasteurizados e esterilizados (BRASIL, 2000). A produção anual de leite de cabra é de cerca de 148,149 toneladas (FAOSTAT, 2011), sendo que deste total, 90% é produzido na região nordeste do Brasil. O leite de cabra é um alimento completo, rico em proteínas, gorduras, vitaminas e sais minerais, possui moléculas de gordura de tamanho reduzido e apresenta alta digestibilidade, quando comparado aos demais tipos de leites (MONTIGELLI, 2005). Estas características nutricionais têm contribuído para o crescimento do mercado de produtos 21 lácteos de cabra e, consequentemente, têm atraído o interesse dos produtores em diferentes regiões geográficas do país (LUIZ et al., 1999). É indicado para crianças que sofrem com processos alérgicos de origem alimentar, particularmente aqueles relacionados às proteínas do leite de vaca, e para idosos por sua concentração de cálcio e biodisponibilidade deste cátion, se comparado a outros alimentos (FISBERG et al., 1999). O fator principal que faz do leite de cabra e seus derivados uma opção valiosa, principalmente nos casos de crianças nos primeiros anos de vida, é a diferença de composição proteica entre as espécies caprina e bovina. As principais proteínas presentes no leite podem ser divididas em três grupos segundo LE JAQUEN (1981) e SWAISGOOD (1996): caseína, que é a parte coagulável das proteínas, e é representada em ordem decrescente pela αs-caseína (αs1 e αs2), β -caseína, k-caseína e γ- caseína. Proteínas solúveis não coaguláveis, representadas pela β-lactoglobulina e a α- lactoalbumina. E em baixas concentrações, as proteoses, peptonas, albumina sérica e imunoglobulinas. Segundo LE JAQUEN (1981), a αs1-caseína representa 21,2% das proteínas do leite de cabra, enquanto no leite de vaca, este valor corresponde a 40%. Por outro lado, a β-caseína representa 67,4% da proteína do leite de cabra e 43,3% da proteína do leite de vaca. CLARK e SHERBON (2000) citam que os leites de cabra e vaca tem proporções similares de k- caseína e αs2-caseína, porém o leite de cabra apresenta níveis mais altos de β-caseína (53% vs 37,5%) e níveis mais baixos de αs1-caseína (15% vs 38%) (RIBEIRO, 1997). A principal proteína do leite de vaca responsável pela alergia é a αs1-caseína. Isto explica a boa tolerância ao leite de cabra pelas pessoas que são sensíveis ao leite de vaca (FISBERG et al., 1999). As alergias mediadas por IgE são responsáveis por 60% da reações relacionadas ao leite e os 40% restantes ficam por conta das reações alérgicas não mediadas por IgE. A maioria das reações alérgicas mediadas por IgE envolve a pele (urticária e dermatite atópica) e a maioria das reações não mediadas por IgE envolve distúrbios do trato gastrointestinal (SHEK et al., 2005). A alergia ao leite de vaca afeta 5,7% das crianças no Brasil (Binsfeld et al., 2009) durante os três primeiros anos de vida, ocorrendo em 12-30% nas crianças com menos de 3 meses de idade, com frequências bem elevadas as quais chegam a 20% em algumas regiões geográficas. A utilização de leite de cabra em substituição ao leite de vaca poderia resolver entre 30- 40% dos casos de alergia (HAENLEIN, 2004). Apesar das vantagens nutricionais, o mercado brasileiro de leite de cabra e seus derivados ainda não estão totalmente desenvolvidos. Os desafios para as indústrias de laticínios de cabra 22 podem ser atribuídos a vários fatores que vão desde o processo de obtenção do próprio leite, a problemas relacionados com a aceitação de seus produtos. Um destes problemas é o odor desagradável que constitui um fator externo responsável por defeitos de sabor no leite caprino e seus derivados. Isto pode ser corrigido, nas fazendas, isolando o bode das cabras, durante o processo de ordenha (CARUNCHIA-WHETSTINE et al., 2003). Outros fatoresque podem influenciar também no sabor característico é a maior concentração de alguns ácidos graxos livres, especialmente os de cadeia curta (C6 - C10), a presença de compostos voláteis como o ácido 4-etiloctanóico, a concentração de cloreto de potássio, e a presença de alguns cresóis (orto, meta e para-cresóis) (SKJEVDAL, 1979). MORGAN e GABORIT (2001) relataram que o armazenamento refrigerado do leite acentua o sabor desagradável, enquanto que o tratamento térmico resulta em uma pequena redução do mesmo. No Brasil, até o momento, nenhum método oficial foi validado para avaliação da autenticidade dos produtos de origem caprina. Essa carência favorece práticas fraudulentas, como a mistura de diferentes concentrações de leite de vaca ao leite de cabra para reduzir custos e, ao mesmo tempo minimizar o forte aroma de leite de cabra promovendo provavelmente, uma maior aceitação do ponto de vista sensorial pelos consumidores (SANTOS et al., 2011). 2.4 O ATENDIMENTO AOS PARÂMETROS DA LEGISLAÇÃO SOBRE ALIMENTAÇÃO HUMANA Como já explicado anteriormente, o rótulo deve identificar o produto de forma única, inequívoca e permanente, atendendo aos parâmetros de identidade e qualidade descritos na legislação. O alimento destinado ao consumo humano precisa se adequar à legislação nacional. Entretanto, se este produto se destinar a exportação é necessário, também, que ele atenda aos requisitos regulamentares do país de destino. No âmbito nacional, a Instrução normativa nº 22, de 24 de novembro de 2005, que especifica o regulamento técnico para Rotulagem de Produtos de Origem Animal Embalado dispõe que a lista de ingredientes é uma informação obrigatória a constar no rótulo. Esta instrução menciona que, “exceto para os produtos de origem animal com um único ingrediente, (por exemplo: carne resfriada, leite pasteurizado, peixe cru resfriado e outros), é obrigatório constar no rótulo do produto a lista de ingredientes usados em sua formulação”. Esta mesma Instrução Normativa determina que, se for utilizado um ingrediente composto (aquele elaborado com dois ou mais ingredientes) 23 deve ser estabelecido um nome em um Regulamento Técnico específico, e, caso represente menos que 25% do produto de origem animal, não será necessário declarar seus ingredientes, com exceção para os aditivos alimentares que desempenhem uma função tecnológica no produto acabado. No âmbito internacional, o regulamento CE/89/2003 da Comunidade Europeia, de 17 de janeiro de 2003, estipulou que o rótulo deve incluir a lista de todos os ingredientes que representem mais de 2% do peso total do produto alimentar. A legislação pátria, através da lei nº 8.137/90, capítulo II que trata dos crimes contra economia e a relação de consumo, estabeleceu, através do art. 7º, II, que “vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou, que não corresponda a respectiva classificação oficial” é considerado crime. O Código de Defesa do Consumidor (lei nº 8.078/90) dispôs no artigo 18, parágrafo 6º, inciso II, que são considerados impróprios o uso e o consumo de produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos, ou ainda, aqueles que estejam em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação. A infração contra medidas sanitárias possui um caráter de ordem pública, pois pode gerar riscos à saúde humana e são considerados crime, sendo previstos na legislação brasileira. O código penal brasileiro, decreto lei nº 2.848/40 através do título VIII capítulo III em seu tópico “dos crimes contra a saúde pública”, art. 268 trata como crime “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”. 2.5 COMPOSIÇÃO DOS ALIMENTOS PARA RUMINANTES No Brasil, as pastagens são consideradas a fonte de alimento mais econômica para a alimentação de bovinos de corte e de leite e cerca de 88% da carne bovina produzida no país tem origem em rebanhos criados a pasto (ESTANISLAU e CANÇADO Jr., 2000). Durante a época chuvosa, observa-se um crescimento destes animais ou aumento na produção de leite, no entanto, na época da seca ocorre uma queda na produção dos animais e consequente redução das pastagens e do valor nutritivo das mesmas, o que acarreta perda de peso dos animais ou baixa produção de leite. Nestas condições, as dietas forrageiras muitas vezes não podem atender as necessidades nutricionais dos animais produtores de carne e leite. Para amenizar os efeitos das restrições quantitativas e qualitativas das pastagens durante o período 24 estiagem, o confinamento pode ser uma opção para fornecer uma alimentação mais equilibrada, utilizando as rações para alimentação destes animais. As rações comerciais são utilizadas para aumentar a produção de leite e taxa de ganho de peso em um animal de corte na época da seca. Sendo que o uso de ração comercial é aconselhável se o aumento da produção aumentar a rentabilidade, ou seja, quando o aumento dos custos com rações comerciais são compensados pelo aumento dos lucros (TAMMINGA, 1996; SCHOENIAN, 2014). 2.5.1 Ingredientes usados na elaboração de rações A cadeia produtiva da carne envolve a agricultura, a pecuária, a indústria e o comércio. A agricultura assume um importante papel no plantio, colheita e armazenamento de culturas diversificadas, sendo estas utilizadas na fabricação das misturas chamadas de ração (ECKHARDT et al., 2013). A ração é definida pela AAFCO (Associação Americana Oficial de Controle da Alimentação) (2000) como a quantia total de alimento fornecida ao animal por um período de 24 horas. E pode ser conceituada também como uma mistura composta por ingredientes e aditivos, destinada à alimentação de animais de produção, que constitua um produto de pronto fornecimento e capaz de atender às exigências nutricionais dos animais ao qual se destine (BRASIL, 2009 a ), A ração pode conter em sua composição alimentos de alta concentração de nutrientes, chamados de concentrados, e os que possuem baixa concentração, chamados de volumosos. Geralmente, os ingredientes que podem estar presentes nas rações destinadas a ruminantes são classificados de acordo com o estabelecido pela AAFCO (2000) como volumosos e concentrados. 2.5.1.1 volumosos São aqueles alimentos de baixo teor energético e, em geral, usados para animais com aparelho digestivo com grande capacidade, como é o caso de ruminantes e herbívoros, já que o animal terá de ingerir uma grande quantidade de alimento para satisfazer suas necessidades nutricionais. Possuem mais de 18% de fibra bruta (FB) e menos de 60% de nutrientes digestíveis totais (NDT), sendo estes usados como forma de expressar o valor calórico dos 25 alimentos, em razão dos nutrientes contidos e dos aproveitados pelo animal. São divididos em volumosos aquosos ou secos, sendo os aquosos aqueles que contêm mais de 25% de água. Exemplos são as forragens verdes, silagens, raízes, tubérculos, frutos, etc. E alimentos volumosos secos são aqueles que possuem menos de 25% de água, como fenos, palhadas ou restos de culturas (soja, arroz, milho, trigo, etc) (AAFCO, 2000). 2.5.1.2 concentrados Os alimentos concentrados são aqueles com alto teor de energia, mais de 60% de NDT, menos de 18% de FB, sendo divididos em energéticos e proteicos. Os concentrados energéticos são aqueles que possuem menos do que 20% de proteína bruta tais como os alimentos de origem vegetal: (milho, sorgo, trigo, arroz), e de origem animal, como o sebo. Já os concentrados proteicos são aqueles que possuem mais de 20% de proteína bruta (PB). Os exemplos mais relevantes de concentrados origem vegetal sãoo farelo de soja, farelo de algodão, farelo de girassol, soja grão, farelo de amendoim, caroço de algodão. Quanto aos alimentos concentrados de origem animal os principais são a farinha de sangue, de peixe e de carne e ossos e a cama de frango (AAFCO, 2000). 2.5.1.2.1 milho (Zea mays) Segundo Teixeira (1998) o milho, dentre os grãos de cereais, é o mais largamente empregado, rico em energia e pobre em proteína e aminoácidos como a lisina e o triptofano. É rico em pró-vitamina A (betacaroteno) e pigmentos (xantofila). A parte principal da planta é a espiga composta de 70% de grãos, 20% de sabugo e 10% de palhas. O milho pode ser usado como fonte volumosa ou concentrado energético. Segue abaixo os subprodutos que podem ser obtidos a partir do milho segundo LANA (2000). -Milho grão- É o concentrado energético mais empregado na alimentação animal sendo praticamente impossível encontrar um alimento balanceado que não o contenha ou um de seus subprodutos na sua formulação. É também um dos cereais mais cultivados no mundo com cerca de 600 milhões de toneladas produzidas por ano. O milho possui alto valor nutritivo, alta produtividade e excelente desempenho animal obtido com seu uso, sendo, portanto o cereal que serve de parâmetro para a comparação nutritiva de outros cereais. O alto valor energético do milho deve-se ao seu elevado teor de amido (70-80%) de alta digestibilidade, 26 associado ao teor de 4% de óleo e ao baixo teor de fibra bruta (2%) e matéria mineral (1,2%). O milho é relativamente pobre em PB (8 a 9%) e de baixo valor biológico em função da deficiência de lisina e triptofano, como já especificado. -Rolão do milho- é constituído da palha do milho depois de feita a colheita das espigas. Contudo pode ser feito de toda a planta, incluindo a espiga, tornando-o mais rico em nutrientes, e é usado como fonte volumosa na dieta de ruminantes; -Silagem de milho- o milho é uma excelente cultura para confecção de silagem, por apresentar boa quantidade de açucares para produção de ácido lático, fundamental para o processo. A silagem é um método de conservação da forragem para alimentação animal baseado na fermentação láctica da matéria vegetal durante a qual são produzidos ácido láctico e outros ácidos orgânicos, o que causa a diminuição do pH até valores inferiores a 5 e a criação de condições de anaerobiose. A acidificação e a anaerobiose interrompem o processo de degradação da matéria orgânica, conservando a qualidade nutritiva do material original; -Palhadas e sabugos - é um resíduo da colheita do grão que pode ser utilizado como fonte de fibra na dieta de ruminantes, é de baixo valor nutritivo; -Milho desintegrado com palha e sabugo - é obtido pela moagem das espigas inteiras, é fonte energética na dieta de ruminantes, apresenta menor valor nutritivo do que o milho grão é rico em fibra; -Farelo de glúten de milho 60 - é o resíduo seco de milho obtido após a remoção da maior parte do amido e do gérmen, e da separação do farelo pelo processo empregado nas fabricações do amido de milho ou do xarope, por via úmida, ou ainda, pelo tratamento enzimático do endosperma. É uma excelente fonte de proteína (e proteína não degradada no rúmen) e energia, mas não é muito palatável. Este produto é conhecido comercialmente por protenose ou glutenose; -Farelo de glúten de milho 22 - é a parte da membrana externa do grão de milho que fica após a extração da maior parte do amido, do glúten e do gérmen pelo processo empregado na produção do amido, ou do xarope, por via úmida. Pode conter extrativos fermentados do milho e/ou farelo de gérmen de milho. 2.5.1.2.2 sorgo (Sorghum bicolor) http://pt.wikipedia.org/wiki/Conserva%C3%A7%C3%A3o_ambiental http://pt.wikipedia.org/wiki/Forragem_animal http://pt.wikipedia.org/wiki/Alimenta%C3%A7%C3%A3o http://pt.wikipedia.org/wiki/Fermenta%C3%A7%C3%A3o_l%C3%A1ctica http://pt.wikipedia.org/wiki/Mat%C3%A9ria_vegetal http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81cido_l%C3%A1ctico http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81cido_l%C3%A1ctico http://pt.wikipedia.org/wiki/PH http://pt.wikipedia.org/wiki/Anaerobiose 27 É um cereal muito usado como alternativa ao milho na alimentação animal por apresentar uma composição nutricional próxima a do milho. É uma planta resistente a falta de água durante o seu cultivo, o que faz do sorgo a cultura de cereais preferencial para as regiões de clima semi-árido, sendo muito cultivado no norte da África, sudoeste dos EUA e norte do México. No Brasil é uma boa opção de cultivo para o nordeste e também vem sendo muito utilizado como segunda cultura de verão na região sul e centro oeste. O sorgo tem entre 9 e 12% de PB, 3% de gordura, 2,5% de FB, 2% de cinzas e cerca de 70 a 75% de amido. A proteína do sorgo é de pior qualidade que a do milho contendo cerca de 15% menos de metionina, e deficiente em lisina e treonina. Tem baixo teor de caroteno, pigmentos xantofílicos, isoleucina e leucina. Deve ser fornecido triturado ou moído devido à baixa digestibilidade do grão inteiro (LANA, 2000). 2.5.1.2.3 trigo (Triticum spp.) O grão de trigo é o único cereal que compete com o milho, tanto em toneladas produzidas anualmente no mundo como em valor nutritivo. Ele é um pouco mais rico que o milho em PB com 11% (deficiente em lisina) e contém menos gordura cerca de 2% e não contém pigmentos. O grão de trigo pode ser utilizado na alimentação animal em substituição ao milho para praticamente todas as espécies animal sem perda de desempenho. Por ser uma cultura de clima temperado é bastante utilizado na alimentação animal nos países do hemisfério norte e na Austrália. No Brasil é importado em grandes quantidades para o consumo humano e o preço do grão inviabiliza o seu uso na alimentação animal. Esporadicamente alguns lotes de grãos impróprios para consumo humano são destinados à alimentação animal no Brasil. São frequentemente usados na alimentação animal no Brasil alguns subprodutos do trigo como triguilho (grãos quebrados ou mal formados oriundos do processo de seleção e classificação dos grãos de trigo após a colheita) e farelo de trigo (constituídos das camadas mais externas do grão tegumento, aleurona, algum gérmen e resíduos de amido) retiradas do processamento do grão para a produção da farinha de trigo para consumo humano (TEIXEIRA, 1997). 2.5.1.2.4 arroz (Oryza sativa) 28 O grão de arroz é o terceiro cereal mais produzido no mundo com uma safra anual de cerca de 400 milhões de toneladas. Assim como o grão de trigo, o de arroz tem um grande potencial de uso na alimentação animal. Todavia a tradição de uso do arroz na alimentação humana o torna muito caro para uso na alimentação animal. O grão de arroz com casca tem cerca de 7% de PB (deficiente em lisina) e 10% de FB. Após a remoção da casca, o teor proteico é de para cerca de 8% e o teor de FB cai para menos de 2%. O grão de arroz sem casca torna-se, portanto um excelente alimento, pois o amido do arroz é um dos carboidratos de mais fácil digestão pelos animais (TEIXEIRA, 1997). 2.5.1.2.5 farelo de amendoim (Arachis hypogaea L.) É o subproduto da extração do óleo da semente de amendoim. É muito rico em proteína com 50 a 55% de PB de alta palatabilidade, digestibilidade, porém deficiente nos aminoácidos lisina e treonina. O farelo de amendoim é muito palatável principalmente para suínos e ruminantes. Na alimentação de mongástricos se usado em níveis acima de 10 a 15% apresenta efeito laxativo, podendo causar até diarréia dependendo do nível empregado. Junto com o farelo de algodão já foi uma importante fonte de proteína na alimentação animal. Todavia, a descoberta do grande tropismo do fungo Aspergillus flavus (produtor da micotoxina aflatoxina) pelo amendoim tornou o farelo muito pouco usado nas fábricas de alimentos balanceados em função do risco de contaminaçãodos equipamentos com o fungo e a produção de aflatoxina, já que as condições climáticas no Brasil são favoráveis para produção da toxina (TEIXEIRA, 1998). 2.5.1.2.6 soja (Glycine max) A soja é uma das mais importantes culturas para produção de grãos destinados à indústria de óleo e produção de farelo. Pode ser usada na alimentação animal na forma de semente, casca ou farelo. A semente é rica em proteína (38 a 39%). Quando da utilização da semente crua, deve-se evitar a utilização conjunta da uréia, em virtude da urease contida nas sementes transformar a uréia em amônia. A soja crua possui ainda outros fatores antinutricionais divididos em termolábeis e os termoestáveis. Entre os termolábeis estão presentes os inibidores de proteases que provocam redução de crescimento e hipertrofia de pâncreas; lectinas, que se ligam à carboidratos e glicoproteínas, são hemaglutinantes e reduzem a 29 ingestão de alimentos e o crescimento; fatores bociogênicos, que provocam aumento da tireóide; fatores antivitamínicos que aumentam os requisitos de vitaminas D3, B12 e E. Entre os fatores termoestáveis estão as isoflavonas, substâncias estrogênicas; fatores de flatulência, sacarose, rafinose e amilose, que provocam náuseas, gases, diarréia e cólica; fatores alergênicos, glicinina e conglicinina que provocam distúrbios gastrintestinais e alergias; lisinoalanina, resultante da extração alcalina da soja que provoca lesões renais em ratos. A tostagem da soja é vantajosa uma vez que destrói a urease (GONÇALVES e BORGES, 1997). O farelo de soja é o subproduto obtido após a extração do óleo do grão da soja para consumo humano. Dependendo do processo de extração, o farelo pode ter entre 44-48% de PB, possuindo as mesmas limitações e qualidades da proteína do grão de soja. O teor de gordura do farelo é bem baixo, menor que 1% e o teor de FB é cerca de 6% (LANA, 2000). 2.5.1.2.7 algodão (Gossypium L.) Segundo TEIXEIRA (1998), da cultura do algodão se obtém fibras e sementes que são aproveitadas para extração do óleo alimentício, de cujo processo resulta o farelo de algodão, que representa a segunda mais importante fonte de proteína disponível para alimentação animal. Possui de 30 a 38% de PB, boa palatabilidade, é rico em fósforo e pobre em lisina, triptofano, vitamina D e pró-vitamina A (LANA, 2000). O caroço de algodão é um alimento com moderada concentração de proteína e alta concentração gordura, fibra e energia. Devido à sazonalidade de sua produção deve ser armazenado em lugar limpo, seco. A sua utilização inteira é melhor do que na forma moída ou triturada (TEIXEIRA, 1997). 2.5.1.2.8 farelo de girassol (Helianthus annuus) Segundo TEIXEIRA (1998), o farelo de girassol é resultante da moagem das sementes de girassol feita no processo industrial para extração de óleo, para consumo humano. É permitido a utilização de cascas de girassol, desde que não ultrapasse o nível máximo estipulado para fibra bruta (15%). É um suplemento protéico que apresenta boa palatabilidade pelos ruminantes. O teor de proteína bruta varia de 28 a 45%, mas é deficiente em lisina. 2.5.1.2.9 sebo http://pt.wikipedia.org/wiki/Gossypium http://pt.wikipedia.org/wiki/L. 30 Segundo TEIXEIRA (1997) o sebo é 100% gordura e não supri outro nutriente para a ração, sendo importante para a produção de energia (densidade energética de 177% NDT). Segundo Lana (2000) a inclusão de sebo não pode ultrapassar o nível de 5% de extrato etéreo na dieta de bovinos de corte, pois este pode causar diminuição da digestibilidade da fibra. De acordo com a instrução normativa nº 8, de 25 de março de 2004 do MAPA está proibido o uso de gordura de origem animal em rações para ruminantes (BRASIL, 2004 b ). 2.5.1.2.10 farinha de carne e ossos (FCO) A denominação farinha de carne e ossos deve vir acompanhada do nome da espécie animal que lhe deu origem tal como bovina, suína, equina, etc. É produzida em frigoríficos a partir de ossos e com resíduos de tecidos de animais após desossa completa da carcaça de bovinos, suínos e/ou outras espécies. Não deve conter cascos, chifres, pêlos, conteúdo estomacal, sangue e outros materiais. Seu processamento consiste em submeter todos os resíduos a cozimento em autoclaves, muitas vezes denominados digestores, a alta temperatura e pressão por um período de tempo determinado. Após o cozimento a maior parte da gordura é retirada por sifonação e o material que sobra é seco e moído (TEIXEIRA, 1998). A maior participação de restos de carnes e vísceras em relação ao conteúdo de ossos determinará o teor proteico, de cálcio e de fósforo do produto. A farinha de carne e ossos possui entre 38 a 44% de PB. As fontes proteicas de origem animal em geral tem um maior valor biológico que as de origem vegetal, pois tem um melhor balanço de aminoácidos e são mais digestíveis. O teor de Cálcio varia de 10 a 15% e o de fósforo de 3 a 5 %. Assim, a farinha de carne e ossos além de ser uma excelente fonte de PB é também uma importante fonte de Cálcio e fósforo de alta disponibilidade. Entretanto, níveis elevados de ambos minerais chegam a ser fator que limita a inclusão da farinha nos alimentos balanceados, pois pode prejudicar o desempenho animal (TEIXEIRA, 1997). A Instrução normativa nº 8, de 25 de 2004 do MAPA proibiu o uso de farinha de carne e ossos não calcinados (BRASIL, 2004 b ). 2.5.1.2.11 farinha de peixe 31 Segundo TEIXEIRA (1997), é o subproduto do processamento do pescado. O processo de produção da farinha de peixe é semelhante ao da farinha de carne e ossos, sendo a temperatura, pressão e tempo de processamento variável. No Brasil o mais comum são dois tipos distintos de farinha: a integral (feita com peixe inteiro) e a residual (produzida com as sobras da indústria de pescado). O teor de proteína varia de 55 a 65%. É uma fonte proteica, se bem processada, de excelente qualidade, muito rica em lisina e aminoácidos sulfurados, e de alta digestibilidade. O teor de cinzas varia de 12 a 20%, sendo uma boa fonte de Ca (3 a 7%) e P (2 a 4%). O teor de gordura pode variar entre 7 a 15%, sendo muito insaturado e, portanto de difícil conservação (TEIXEIRA, 1998). 2.5.1.2.11 farinha de sangue Segundo TEIXEIRA (1997), é um produto constituído de sangue coagulado, seco e moído, na forma de farinha. É rica em proteína bruta (80%) com alto nível de proteína não degradável no rúmen (acima de 80%), embora seja fonte de aminoácidos de excelente qualidade. Entretanto o método de processamento pode afetar a qualidade do produto, diminuindo a disponibilidade de aminoácidos, fato que pode ocorrer também com outros produtos que sofrem tratamento térmico. Segundo LANA (2000), é pobre em vitaminas e possui baixa palatabilidade. Deve ter no máximo 11% de umidade, pois pode ocorrer contaminação microbiana. De acordo com a Instrução normativa nº 8, de 25 de 2004 do MAPA está proibido o uso deste ingrediente em rações para ruminantes (BRASIL, 2004 b ). 2.5.1.2.12 cama de frango Segundo TEIXEIRA (1998), a cama de frango é uma mistura de substrato, comumente chamado de cama de fezes, pena de aves e restos de ração. Sua composição química varia de acordo com a densidade das aves no galinheiro que a produziram, tipo de alimentação, manejo da cama, tempo de armazenagem e altura da cama. Contudo, apresenta de 19 a 25% de proteína bruta e 60% de NDT. Apresenta boa aceitabilidade pelos animais e normalmente é fornecida como substituto aos farelos proteicos obtidos de algodão e de soja, na proporção de 40 a 60% da ração concentrada para bovinos de corte. Entretanto seu uso está proibido de acordo com a instrução normativa nº 8, de 25 de 2004 do MAPA (BRASIL, 2004 b ). 32 2.6 AUTENTICIDADE DA COMPOSIÇÃO DE RAÇÕES PARA RUMINANTES Ao longo dos últimos anos, vem sendoexigido atenção à qualidade dos alimentos para animais, e muitas indústrias de alimentos têm procurado formas de assegurar que o nível de rastreabilidade dos seus produtos seja semelhante ao dos destinados ao consumo humano. Como já dito anteriormente, autenticidade significa que um produto foi produzido, transportado e vendido de uma forma tal que corresponda às expectativas associadas a ele (ELZAKKER et al., 2013). Como já mencionado, o farelo de soja é normalmente utilizado como matéria-prima na composição de rações destinados aos ruminantes, porém seu custo é mais elevado do que o da farinha de carne e ossos (custo médio é de R$ 1,00/kg de farelo de soja contra apenas R$ 0,65/kg de FCO). A indústria de rações depara-se com a necessidade de grandes volumes de matérias-primas, havendo, com freqüência, escassez de ingredientes alternativos ao milho e farelo de soja. Mesmo que haja disponibilidade de farelo de soja, seu preço é regulado no mercado internacional e, se alto, favorece o uso de ingredientes alternativos, uma vez que a competição entre as empresas comprime a margem de lucro, sendo necessário reduzir os custos de produção das rações. As fontes protéicas com melhor composição, digestibilidade e palatabilidade tem, em geral, alto custo, facilitando o uso de ingredientes alternativos inferiores e menos custosos, como, por exemplo, a farinha de carne e ossos (BELLAVER, 2013). A identificação de matéria-prima de origem animal em rações para ruminantes é importante, pois corresponde a um problema de política pública envolvendo saúde das populações, perdas econômicas e de credibilidade, sendo por isso, regulamentada por lei na Europa e por instrução normativa no Brasil. A garantia de que produtos destinados a ruminantes sejam livres de matéria-prima animal significa ganhos com as exportações e a manutenção da confiabilidade, tanto no mercado externo quanto no mercado interno. 2.7 PRODUÇÃO DE RAÇÕES NO BRASIL EM ATENDIMENTO AOS REGULAMENTOS Na última década houve um significativo aumento na produção de rações destinadas a ruminantes e outras espécies, partindo-se de 15 milhões de toneladas em 1990 para cerca de 37 milhões de toneladas em 2001. O Sindicato Nacional das Indústrias de Alimentação 33 Animal (SINDIRAÇÕES) verificou que houve crescimento de 2,8% em 2012, quando comparado ao ano anterior com produção de 66,2 milhões de toneladas de ração, e de 2,58 milhões de toneladas de suplementos minerais. Em 2011 o setor cresceu 5,2% e movimentou R$ 40,0 bilhões em insumos produzindo 64,5 milhões de toneladas de ração e 2,35 milhões de suplementos minerais (Quadro 1) (SINDIRAÇÕES, 2012). Quadro 1: Produção de rações nos anos de 2011 e 2012, expressos em milhões de toneladas. No que diz respeito às barreiras sanitárias dois pontos merecem ser mencionados como relevantes para as exportações brasileiras de carne bovina: a febre aftosa e a BSE. A febre aftosa é uma doença vesicular viral altamente contagiosa dos animais de casco fendido. A doença provoca graves perdas na produção de animais e é um dos principais entraves ao comércio internacional de produtos de origem animal. Programas de erradicação da febre aftosa no Brasil foram implementados e vem reduzindo ano a ano o número de casos notificados (SUMPTION et al., 2007). Encefalopatias espongiformes transmissíveis (TSE) são responsáveis por doenças neurodegenerativas fatais em seres humanos e animais. TSE humanas incluem a doença de Creutzfeldt – Jakob (CJD), insônia familiar fatal (FFI), a síndrome de Gerstmann-Sträussles- Fonte: SINDIRAÇÕES, 2012 2012 34 Scheinker (GSS) e Kuru, uma doença transmitida por meio de rituais de canibalismo. Em animais, TSE englobam a encefalopatia espongiforme de ovinos e caprinos ou scrapie, encefalopatia espongiforme bovina (BSE) ou “doença da vaca louca”, encefalopatia espongiforme felina (FSE), encefalopatia espongiforme de marta (TME) e encefalopatia espongiforme de cervídeos ou chronic wasting desease (CWD) (DORMONT, 2002; CONCEPTION e PADLAN, 2003). O período médio de incubação destas doenças pode variar de quatro a seis anos para BSE em bovinos (KIMBERLIN, 1993) e a pelo menos, nove anos para CJD em humanos (GHANI et al., 1998), com o agravante de que não há indícios visíveis das doenças durante o período de incubação. A hipótese mais aceita do agente infeccioso das TSE são os príons, partículas de proteínas desprovidas de material genético (DNA ou RNA) e presentes em diversos tipos de células. Embora a natureza destes agentes infecciosos e seus mecanismos de ação não estejam completamente elucidados, há evidências de que as TSEs sejam provocadas por transformações na conformação de príons normais (estrutura proteica predominante alfa- hélice) a príons de conformação atípica (estrutura proteica predominante em beta-hélice). Estas estruturas de conformação atípicas são resistentes à ação de proteases e a tratamentos térmicos, formando agregados em organelas celulares e provocando danos ao tecido nervoso (HUR, et al., 2002 ). Os primeiros casos de BSE foram diagnosticados no Reino Unido em 1986. Na época, acreditava-se que a BSE era uma forma de scrapie adquirida por bovinos após a ingestão de subprodutos de ovinos contaminados, os quais eram adicionados às rações (KIMBERLIN, 1993). Uma nova variante de CJD (vCJD) foi descrita há cerca de dez anos (março de 1996) após a identificação de BSE, pela primeira vez também no Reino Unido. Em contraste com a forma tradicional da CJD, esta nova variante afetava pacientes jovens (FISHBEIN, 1998). Foi sugerido que a vCJD pudesse ser causada pela transmissão da BSE a humanos por carne contaminada (CONCEPCION e PADLAN, 2003). A ocorrência de BSE em bovinos e sua transmissibilidade a humanos, tornaram-se uma preocupação internacional principalmente por não existirem terapias aplicáveis para taratamento de TSE em humanos. Este problema exigiu uma mobilização mundial, no sentido de minimizar a exposição humana frente ao agente infeccioso por práticas de controle de qualidade de alimentos e do uso seguro de produtos biológicos de origem bovina (DORMONT, 2002). 35 As recomendações de medidas para proteção da saúde pública acordadas entre a OMS, a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) e a FAO incluem: i) nenhuma parte ou produto de animal, o qual tenha apresentado sinais de TSE, ou tecidos que provavelmente contenham BSE devem ser introduzidas nas cadeias alimentares (humana e animal); ii) todos os países devem estabelecer vigilância e notificação compulsória de ocorrências de BSE; iii) todos os países devem banir o uso de tecidos de ruminantes em rações para ruminantes; iv) leite e derivados são considerados seguros; v) gelatina e sebo somente são considerados seguros se processos de produção efetivos forem adotados e vi) produtos medicinais e acessórios médicos devem ser obtidos em países sem casos esporádicos de BSE e com medidas implantadas e recomendadas para minimizar os riscos (WHO, 1996). O status da BSE para os países-membros ou países em vias de desenvolvimento é determinado pela classificação em três categorias: risco insignificante, risco controlado ou indeterminado. De acordo com a OIE, o Brasil integra grupo de risco "insignificante" para a BSE, que é a categoria mais segura (MATHEWS, VANDEVEER e GUSTAFSON, 2006). Sob o ponto de vista regulamentar, muitos países formalizaram a proibição do uso de proteínas derivadas de subprodutos de origem animal em ração para alimentação de ruminantes. No Brasil o MAPA tomou várias medidas, entre as quais a rastreabilidade de animais importados para impedir a entrada de animais contaminados no país. Foi também criado a Instrução Normativa nº 8, de 25 de março de 2004, que proíbe, em todo o território nacional, a produção, a comercialização e a
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