Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
i SÃO CRISTÓVÃO: DIRETRIZES PARA REINTEGRAÇÃO DOS VAZIOS URBANOS VISANDO IMPLANTAÇÃO DE ÁREAS VERDES ______________________________________________________________________ Lucas de Oliveira Lima Olivia de Castro Mercadante Orientador: Prof.ª Angela Maria Gabriella Rossi, D. Sc. Rio de Janeiro Agosto de 2014 Projeto de Graduação apresentado ao Curso de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Engenheiro. ii SÃO CRISTÓVÃO: DIRETRIZES PARA REINTEGRAÇÃO DOS VAZIOS URBANOS VISANDO IMPLANTAÇÃO DE ÁREAS VERDES Lucas de Oliveira Lima Olivia de Castro Mercadante PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE ENGENHARIA AMBIENTAL DA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE ENGENHEIRO AMBIENTAL. Examinado por: ________________________________________________ Prof.ª Angela Maria Gabriella Rossi, D. Sc. ________________________________________________ Prof.ª Alessandra Magrini, D. Sc. ________________________________________________ Prof.ª Heloisa Teixeira Firmo, D. Sc. RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL AGOSTO DE 2014 iii Lima, Lucas de Oliveira Mercadante, Olivia de Castro São Cristóvão: Diretrizes para Reintegração dos Vazios Urbanos visando implantação de áreas verdes /Lucas de Oliveira Lima e Olivia de Castro Mercadante. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Escola Politécnica, 2014. 134 p.: il.; 29,7 cm. Orientador: Prof.ª Angela Maria Gabriella Rossi, D. Sc. Projeto de Graduação – UFRJ / Escola Politécnica / Curso de Engenharia Ambiental, 2014 Referências Bibliográficas: 113-123 1. Áreas Verdes; 2. Reabilitação Urbana; 3.Reintegração; 4. Vazios Urbanos; 5. São Cristóvão Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia Ambiental. iv “Nunca duvide da capacidade de um pequeno grupo de dedicados cidadãos para mudar rumos do planeta. Na verdade, eles são a única esperança para que isso possa ocorrer.” (Margaret Mead) v Dedicamos esse trabalho às nossas famílias, pelo incentivo, pela paciência e principalmente pelo apoio eterno. vi Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica / UFRJ como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Ambiental. São Cristóvão: Diretrizes para Reintegração dos Vazios Urbanos visando implantação de áreas verdes Lucas de Oliveira Lima e Olivia de Castro Mercadante Agosto / 2014 Orientador: Prof.ª Angela Maria Gabriella Rossi, D. Sc. Este trabalho tem por objetivo discutir a reabilitação de vazios urbanos visando a implantação de áreas verdes em ambientes degradados. Para ter uma compreensão mais concreta dessa proposta, fez-se uma pesquisa de campo da VII Região Administrativa do Rio de Janeiro, pois o local sofreu com sucessivas intervenções no uso do solo, que resultou em subutilização dos edifícios e esvaziamento populacional. O desenvolvimento do estudo foi baseado em uma revisão bibliográfica sobre os principais conceitos englobados pelo tema, bem como por um levantamento de dados e da história da região. Por fim, a conclusão do estudo se direciona para a proposição de diretrizes para a implantação de áreas verdes na região. Importante salientar que sob uma visão holística de todo o planejamento, os direcionamentos traçados também contemplaram soluções para a cultura e o lazer dos residentes. Palavras-chave: Áreas Verdes, Reabilitação Urbana, Vazios Urbanos, Urbanismo. vii Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of the requirements degree of Engineer. São Cristóvão: Diretrizes para Reintegração dos Vazios Urbanos visando implantação de áreas verdes Lucas de Oliveira Lima e Olivia de Castro Mercadante Agosto / 2014 Advisor: Prof. Angela Maria Gabriella Rossi, D. Sc Course: Environmental Engineering This work aims to discuss the rehabilitation of the empty spaces in downtown area through the implementation of green areas in degraded environments. For a more accurate understanding of this proposal, a field research of the Rio de Janeiro Administrative Region VII was conducted, as the place has suffered successive interventions in land use, resulting in underutilization of buildings. The development of the study was based on a literature review of the main concepts encompassed by the topic, as well as data collection and the history of the region. Finally, the conclusion of the study is directed to propose guidelines for the implementation of green areas in the region. It is important to emphasize that under a holistic view of the entire context, tracings guidelines that also contemplated solutions for culture and leisure of residents. Key words: Green Urban Areas, Urban Rehabilitation, Empty Spaces, Sustainable Urbanism. viii ÍNDICE 1. Introdução ............................................................................................................... 3 1.1 Apresentação do Tema ................................................................................ 3 1.2 Objetivo ....................................................................................................... 4 1.3 Justificativa .................................................................................................. 4 1.4 Metodologia ................................................................................................ 5 1.5 Estrutura do Trabalho .................................................................................. 5 2. Reabilitação urbana e Vazios Urbanos: Um caminho para a Sustentabilidade ...... 7 2.1 Vazios Urbanos ........................................................................................... 7 2.2 Reabilitação Urbana .................................................................................. 11 2.3 Contribuição da Reabilitação Urbana para a Sustentabilidade Urbana ..... 14 3. Áreas Verdes e Vazios Urbanos: Uso voltado para o Lazer e a Cultura............... 18 3.1 Conceito de Áreas Verdes ......................................................................... 18 3.2 Os Diversos Índices para Quantificação de Áreas Verdes nas Cidades .... 20 3.3 Tipos e Funções das Áreas Verdes Urbanas ............................................. 23 3.3.1 Tipos de Áreas Verdes .......................................................................... 23 3.3.2 Funções das Áreas Verdes .................................................................... 25 3.4 Exemplos de Áreas Verdes ....................................................................... 29 3.5 Legislação Urbana relacionada a Áreas Verdes, Cultura e Lazer, Economia e Planejamento Urbano no Rio de Janeiro ................................................ 37 3.5.1 Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 – Estatuto da Cidade ................ 38 3.5.2 Lei Federal 9.785, de 29 de Janeiro de 1999 - Parcelamento do Solo .. 43 3.5.3 Lei Orgânica do Rio de Janeiro, de 5 de abril de 1990 ......................... 47 3.5.4 Lei Complementar nº 111, de 1º de fevereiro de 2011 ......................... 48 3.5.5 Lei Complementar nº73, de 29 de julho de 2004 .................................. 51 4. A VII Região Administrativa da Cidade do Rio de Janeiro: São Cristóvão ......... 55 4.1 Considerações sobre a Evolução Urbana da Cidade do Rio de Janeiro .... 55 4.2 Breve Histórico da evolução da Região Administrativa de São Cristóvão 674.2.1 Do final do século XIX até a década de 1940 ....................................... 67 4.2.2 Da década de 1950 até a década de 1980 .............................................. 70 ix 4.2.3 Da década de 1990 em diante ............................................................... 71 4.3 Caracterização Atual da Região Administrativa de São Cristóvão ........... 72 4.3.1 População: ............................................................................................. 73 4.3.2 Renda .................................................................................................... 79 4.3.3 Cultura .................................................................................................. 85 4.4 Avaliação dos Vazios Urbanos existentes na Região ................................ 87 4.5 Diretrizes para a Implantação de Áreas Verdes nos Vazios Urbanos da Região para o Lazer e a Cultura ................................................................ 95 4.5.1 Estrutura da análise ............................................................................... 95 4.5.2 Áreas Verdes ......................................................................................... 97 4.5.3 Cultura e Lazer .................................................................................... 101 4.5.4 Economia Local .................................................................................. 103 5. Considerações Finais ........................................................................................... 109 6. Referências Bibliográficas .................................................................................. 113 x ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 Categorias de análise dos vazios urbanos e imóveis subutilizados ...... 11 Figura 2:Funções das Áreas Verdes ................................................................... 26 Figura 3: Perímetro de Tombamento do Parque do Flamengo ........................... 30 Figura 4: Parque do Flamengo ............................................................................ 31 Figura 5: Parque Madureira Antes e Depois ....................................................... 32 Figura 6:Biblioteca Virgilio Barco, Bogotá ........................................................ 34 Figura 7: Parque de La Barceloneta .................................................................... 36 Figura 8: Organograma das áreas de loteamento que devem ser afetadas como de uso comum ...................................................................................................................... 44 Figura 9:Reforma Urbana na região central ....................................................... 56 Figura 10: Abertura da Avenida Rui Barbosa .................................................... 58 Figura 11: Plano Aguache .................................................................................. 60 Figura 12: Plano Dioxiadis, 1965 ....................................................................... 62 Figura 13:Simulação do Porto Olímpico ............................................................ 67 Figura 14: Mapa da VII Região Administrativa de São Cristóvão. .................... 72 Figura 15: Eixo viário de São Cristóvão. ............................................................ 73 Figura 16:Densidade Demográfica ..................................................................... 77 Figura 17: Zoneamento da Região Administrativa de São Cristóvão ................ 82 Figura 18: Zoneamento das Áreas de Especial Interessante Turístico e Social . 83 iv Figura 19: Jardim Zoológico do Rio de Janeiro ................................................. 84 Figura 20: Áreas Verdes Públicas ....................................................................... 85 Figura 21: Mapa de Pólos de Cultura e Lazer .................................................... 89 Figura 22: Polo Gastronômico da CADEG ........................................................ 90 Figura 23: Áreas Críticas de Drenagem .............................................................. 91 Figura 24: Diagnóstico da Arborização dos Espaços Urbanos ........................... 92 Figura 25: Mapa de áreas para Reabilitação Urbana .......................................... 94 Figura 26: Imagem áerea da Barreira do Vasco ................................................. 99 Figura 27: Imagem Aérea da Quinta da Boa Vista ............................................. 99 Figura 28: Comunidade do Tuiuti ..................................................................... 101 Figura 29:Áreas de Especial Interesse .............................................................. 105 Figura 30: Fábrica de Sabão Português ............................................................ 106 Figura 31: Avanço de Investimento da Região Portuária Para São cristóvão .. 107 Figura 32: Jardins de chuva .............................................................................. 108 v ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1: Metas Estabelecidas no Plano Estratégico 2012 ................................. 65 Tabela 2: População do Distrito de São Cristóvão, segundo as profissões e sexo em 1920 .......................................................................................................................... 69 Tabela 3: População do Distrito de São Cristóvão e divisão segundo sexo dos habitantes ........................................................................................................................ 74 Tabela 4: Distribuição da População pelos bairros da VII.RA. .......................... 74 Tabela 5:Porcentagem da população alfabetizada. ............................................. 76 Tabela 6: Índice de Desenvolvimento Humano .................................................. 78 Tabela 7: População e densidade demográfica da VIIRA-SC por bairro - Dados de habitantes e área de 2010. IDH de 2000 .................................................................... 78 Tabela 8: Região Administrativa de São Cristóvão – Nº de estabelecimentos por porte e setor 2009/2010 .................................................................................................. 79 Tabela 9: Serviços ............................................................................................... 80 Tabela 10: Comércio ........................................................................................... 80 Tabela 11:Indústria ............................................................................................. 80 Tabela 12: Agropecuária ..................................................................................... 80 Tabela 13: Classes Econômicas da Região Administrativa São Cristóvão ........ 81 Tabela 14: Total da área territorial por Classes de Uso do Solo e Cobertura Vegetal segundo Áreas de Planejamento, Regiões de Planejamento, Regiões Administrativas e Bairros. .............................................................................................. 97 Tabela 15: Índices de áreas verdes em algumas cidades Brasileiras .................. 98 2 ÍNDICE DE GRÁFICOS Gráfico 1: Pessoas Residentes por Idade População/faixa etária ....................... 75 Gráfico 2:Porcentagem da população por faixa etária ........................................ 75 Gráfico 3:Porcentagem dos Jovens alfabetizados ............................................... 76 Gráfico 4: Pessoas Residentes por espécie de domicílio .................................... 77 3 1. Introdução 1.1 Apresentação do Tema As cidades brasileiras cresceram de forma desordenada no último século. O planejamento urbano feito pelas administrações públicas, por outro lado, não acompanhou esse crescimento. Em geral, a legislação limitou-se a referendar caminhos espontâneos além de concretizar as expectativas do mercadoimobiliário. Assim sendo, regiões de menor interesse ficaram desprovidas de infraestrutura e equipamentos urbanos em seu território, afetando diretamente a qualidade de vida de seus cidadãos. Particularmente graves são as regiões definidas por processos de urbanização com características históricas específicas, onde, com o passar dos anos, interesses (e também desinteresses) políticos levaram a problemas urbanos crônicos, ligados via de regra à moradia, ao transporte e à infraestrutura. Intimamente relacionados à qualidade de vida das populações urbanas, estas questões atrelam-se também a fatores socioeconômicos e a questões ambientais. No caso que pretendemos abordar, a criação e a manutenção de áreas verdes públicas são imprescindíveis para o bem estar das populações locais, servindo de contraponto entre a existência em meio ao ambiente construído e o ambiente natural, devendo, portanto ter sua utilização estimulada como áreas de convívio, lazer e recreação. Cabe compreender que em processos urbanos espontâneos e independentes da vontade do poder público, o prévio e cuidadoso planejamento que permite a implantação e manutenção destes pulmões verdes simplesmente não existe. É precisamente neste caso que se propõe a sua criação através da reintegração de áreas potencialmente vazias (podem ser imóveis abandonados, degradados ou ociosos) para a reimplantação de áreas verdes que permitirão a reabilitação de espaços urbanos, com profundos impactos positivos na vida dos cidadãos. 4 Com base no conceito de desenvolvimento urbano sustentável, a proposta de projeto deve se basear nos pilares da sustentabilidade: Social, Ambiental e Econômico. Já a escolha do bairro de São Cristóvão como objeto deste estudo deveu-se a seu histórico, palco de diversas fases. Inicialmente residencial de alta renda, industrial, comércio e atualmente se reestruturando como residencial. Caracteriza-se também pelo desequilíbrio de áreas verdes, embora munido de vazios urbanos decorrentes de processos de desindustrialização. Portanto, o que se propõe neste trabalho é fazer uma análise retrospectiva do processo de regulação urbanística na cidade, em busca de construir um fio condutor para o entendimento das normas que foram determinantes no processo de planejamento urbano da cidade. A partir disso, iremos propor diretrizes para a implantação de áreas verdes em vazios urbanos. Ao final desse trabalho, esperamos apontar uma série de diretrizes capazes de aplicação não só, não só ao bairro em questão, mas também em outras regiões. 1.2 Objetivo O objetivo desse trabalho consiste em propor diretrizes que orientem à reintegração de espaços vazios e implantação de áreas verdes utilizando como pesquisa de campo a Região Administrativa de São Cristóvão. 1.3 Justificativa Há evidente conflito entre questões ambientais e econômicas quando analisadas no contexto urbano. Diversas razões fazem com que o aspecto econômico prevaleça, frequentemente impedindo à implantação de equipamentos urbanos voltados as necessidades da população. Os projetos de intervenção ou revitalização de vazios urbanos, ou mesmo recuperação de áreas verdes já existentes, tornam-se polêmicos, sendo usualmente classificados como supérfluos ou preteridos em detrimento de outros investimentos públicos. 5 A razão pela qual consideramos o tema justificado deve-se ao fato de que, por um lado, persiste a crescente tendência de utilizar espaços privados tais como shoppings e áreas condominiais como cenários de convívio, há nítido favorecimento de ideologias de consumo globalizante, tão comuns em sociedades urbanas. Por outro lado acreditamos que quando o convívio se processa em espaços púbicos, torna-se possível valorizar aspectos culturais, ambientais e sociais espontâneos ou menos suscetíveis de direcionamento. Outro fator importante para a criação de áreas verdes é a influência positiva para a questão das mudanças climáticas, uma vez que a arborização contribui para a absorção de gás carbônico da atmosfera. Não bastando, a região de estudo escolhida, a VII Região Administrativa do Rio de Janeiro está inserida em um contexto histórico locacional muito específico, com um grande volume de vazios urbanos e de potencial para revitalização de áreas verdes. 1.4 Metodologia Foi empregada a metodologia da revisão bibliográfica e realização de visitas in loco e pesquisa de campo. As referências bibliográficas necessárias para o embasamento deste trabalho estão representadas por consultas concentradas na legislação brasileira no que tange o tema desta monografia, em artigos e trabalhos técnicos. Com relação às visitas ao local de estudo, foram feitas observações pelos bairros de São Cristóvão, Benfica e Vasco da Gama. Por último foram feitas consultas a relatórios com informações socioeconômicas, dados de acesso público e mapas da região. 1.5 Estrutura do Trabalho O presente trabalho se divide em cinco capítulos que apresentam as seguintes abordagens: 6 Capitulo 1: Desenvolve a introdução, na qual o tema de estudo é apresentado, bem como suas justificativas e a metodologia empregada. Apresenta-se também o objetivo deste. Capítulo 2: Aborda os aspectos conceituais e teóricos, fundamentados no trabalho de revisão bibliográfica que envolve o tema em questão, de forma a apresentar um embasamento para as questões que serão abordadas nos capítulos seguintes. Capítulo 3: Apresenta o conceito de áreas verdes, seus índices de quantificação, bem como seus tipos, funções e exemplos e, por fim, a legislação pertinente ao local. Capitulo 4: Apresenta a caracterização da região de estudo, ressaltando seu histórico de urbanização, suas características físicas, econômicas e ambientais. A abordagem adotada é orientada a sustentabilidade local, o qual se analisa os princípios escolhidos, além disso, fazendo o recorte de regiões de interesse para o estudo, assim como, expõe as diretrizes para implantação holística de áreas verdes. Capítulo 5: Trata-se do capítulo voltado para as considerações finais. Primeiramente, é traçado um panorama das diretrizes apresentadas no capítulo anterior. Posteriormente, são definidos os próximos passos para a concretização dessas orientações. Por fim, é feita uma discussão das políticas e diretrizes costumeiramente seguidas. 7 2. Reabilitação urbana e Vazios Urbanos: Um caminho para a Sustentabilidade O presente Capítulo trata dos aspectos conceituais e teóricos sobre o tema de reabilitação de áreas degradadas e ambientes urbanos mais sustentáveis, relacionando-os com exemplos bem sucedidos. No seu desenvolvimento são evidenciadas as características das requalificações, os vazios urbanos, assim como, a relação da reestruturação de tais áreas em direção à sustentabilidade urbana. 2.1 Vazios Urbanos Abreu (1994) afirma que o espaço é inerente à existência humana, isto é, o homem produz o seu ambiente por meio do seu trabalho. Portanto o entendimento dessa relação envolve o processo histórico e o desenvolvimento da sua sociedade, bem como as relações de produção e cultura. O espaço não é autônomo, está inter-relacionado à sociedade, de forma que é concebido como materialidade social, tendo no homem o sujeito da sua produção. O espaço não é simplesmente organizado pela sociedade, é produzido por ela, através do trabalho. A cidade pode ser entendida como um processo de interação espacial urbano e as suas relações socioeconômicas, que formam um macrossistema urbano desagregado, com suas atividades socioeconômicas complementares que irão definir os subsistemas urbanos. De forma que, quanto maior for a diversidade de uma cidade, mais complexo será o seu processo de transformação. Contudo, as soluções espaciais não são mais definidas em termos da melhor escolha para uma determinada região, uma vez que existe todo um ecossistemaque envolve diversos atores, como o setor privado, indústria etc. Deve-se sempre levar em consideração o contexto histórico e a realidade momentânea e local. (PALMA & KRAFTA, 2003) Com isso, temos que a dinâmica do espaço de uma cidade é um processo contínuo que adapta os espaços, as formas construídas e as atividades sociais em áreas diferentes. Esse processo de ajuste espacial envolve os atores sociais, como o poder Público e os investimentos privados que, provocando aglomeração de pessoas e 8 concentração de atividades ou dispersando as pessoas e descentralizando as atividades, estabelece-se com cada ação de transformação, um novo mapa de acessibilidade. Nessa variação de valorização formam-se os espaços vazios urbanos (PALMA & KRAFTA, 2003). Historicamente, o termo vazio urbano começa a aparecer a partir de meados do século XIX, quando cidades como Londres e Paris que já tinham atingido dimensões metropolitanas devido ao crescimento tanto físico quanto populacional, decorrente do êxodo rural, iniciam o processo de dispersão de zonas industriais dentro dos centros urbanos (BORDE, 2006). Somente no século XX, com a crise do sistema produtivo, o vazio urbano passa a despertar reflexões no campo do urbanismo. A partir dos anos 1970, multiplicam-se as ferrovias desativadas, zonas industriais e edifícios abandonados, consequências da desfuncionalização de áreas do tecido industrial. Tais espaços passam a constituir o foco dos primeiros estudos europeus sobre vazios urbanos que são elaborados a partir de inventários realizados na França, em 1979, e na Inglaterra, em 1982 (BORDE, 2006). A dinâmica urbana, no caso do Brasil, sofreu um crescimento acelerado das cidades brasileiras a partir dos anos 40 e 50, desencadeando um padrão de expansão apoiado na urbanização horizontal e na ocupação periférica (SERRA, 1991). As cidades se expandiram de maneira radial e as áreas centrais, antes residenciais, passaram por um processo de mudança de uso, evasão da população residente e de abandono de suas estruturas físicas (SILVEIRA, LAPA, & RIBEIRO, 2007). A expansão urbana e a ocupação periférica da cidade, culminaram no esvaziamento populacional dos centros, na mudança de uso do solo das áreas centrais. Todos esses processos contribuíram de maneira significativa para a degradação dos centros históricos e para o surgimento de áreas obsoletas e dos vazios urbanos nessas áreas (VAZ & SILVEIRA, 2007). Atualmente, tem-se uma ambiguidade de termos e conceitos relacionados ao tema do “vazio urbano”, que ora é associado apenas a áreas fundiárias nunca antes ocupadas, ora é relacionado à condição de abandono de estruturas que perderam seu uso. 9 Villaça (1998) utilizou a definição de vazio urbano como uma grande extensão de área urbana equipada ou semiequipada, com quantidade significativa de glebas ou lotes vagos. Uma primeira questão vem da ideia de que os vazios urbanos são espaços da cidade ausentes de construção ou preferencialmente não edificados (SOUSA, 2010). No entanto, a expressão é muito mais abrangente e designa também os “terrenos e edificações não utilizados, subutilizados, desocupados ou desestabilizados, localizados em terrenos infraestruturados e que passaram ou estão passando por processo de esvaziamento”. Os vazios urbanos seriam, portanto, espaços em mutação e que configuram uma situação de fragilidade urbana e podem vir a se constituir em vazios urbanos (BORDE, 2006). Ainda para Borde (2006), consideram-se vazios urbanos aqueles “terrenos localizados em áreas providas de infraestrutura que não realizam plenamente a sua função social e econômica, seja porque estão ocupados por uma estrutura sem uso ou atividade, seja porque estão de fato desocupados, vazios”. Esse conceito pode ser complementado por Medeiros (2007), que define vazio urbano como “um fenômeno típico da sociedade pós-industrial, podendo ser resultante de espaços residuais, zonas industriais obsoletas, de corredores e pátios ferroviários esquecidos, dos movimentos de especulação imobiliária, de catástrofes ou mesmo de edifícios centrais abandonados”. O Manual de Requalificação de Áreas Urbanas Centrais (BRASIL, 2008) fortalece essa definição de Medeiros (2007), apresentando o seguinte conceito de vazios urbanos: “[...] consistem em espaços abandonados ou subutilizados localizados dentro da malha urbana consolidada, em uma área caracterizada por grande diversidade de espaços edificados, que podem ser zonas industriais subutilizadas, armazéns e depósitos industriais desocupados, edifícios centrais abandonados ou corredores e pátios ferroviários desativados” (BRASIL,2008 p. 142). 10 O conceito de vazio urbano como algo degradado também é utilizado por Clichevsky (2000), que os vazios urbanos compreendem terrenos e edificações a espera de serem demolidas, caracterizados por serem estruturas com alto nível de degradação e obsolescência nos centros urbanos. Mori (2004) e Borde (2006) admitem que em suas concepções de “vazios urbanos” estão: “edifícios e outras instalações que sofreram abandono ao longo do tempo, como pátios ferroviários, zonas portuárias e complexos industriais”. De forma, que confirma-se a ambiguidade relatada sobre o estado, local e utilização. O conceito de Dittmar (2006) resume o que entendemos por “vazios urbanos” nesse trabalho, isto é, afirma que vazios urbanos são áreas construídas ou não, desocupadas ou subutilizadas, que possuem como característica em comum o fato de serem “resíduos do crescimento da cidade”, podendo ser caracterizados pelas questões físicas ou pelo esvaziamento de uso. Para a autora, os vazios urbanos podem se configurar em três tipos diferentes: áreas ociosas, remanescentes urbanos e espaços residuais. Áreas ociosas: correspondem ao vazio físico. Constituem-se em glebas não parceladas dentro do tecido urbano, lotes não edificados em um loteamento residencial, áreas que se encontram reservadas à especulação imobiliária. Remanescentes urbanos: contemplam os locais que abrigaram antigas construções e elementos de infraestrutura que, com o passar do tempo, foram deixados de lado, como instalações industriais, pátios e linhas férreas, dentre outros. As cidades europeias e estadounidenses foram as primeiras a sofrer os efeitos dos remanescentes urbanos, devido a sua industrialização anterior. Espaços residuais: correspondem à expressão francesa terrain vague, cunhada pelo urbanista espanhol Sola-Morales, para designar áreas sem limite claro e que não possuem uso atual, sobras do crescimento da cidade, áreas subutilizadas, às vezes imperceptíveis aos cidadãos, como áreas ao lado de estações do metrô, sobre linhas de alta tensão e viadutos, zonas residenciais ou comerciais abandonadas em consequência da violência. Este estudo traz à tona outra questão: a de que os vazios urbanos nem sempre estão totalmente desocupados. Ao mesmo tempo, isso cria uma dificuldade em se 11 determinar se uma determina edificação pode ser qualificada dentro dos conceitos apresentados. A figura 01 resume a ideia que tentou-se evidenciar, no qual o vazio urbano e o imóvel subutilizado ocupam o mesmo patamar. A análise dedutiva segue observando o tipo (Lote ou Edificação) , em outro patamar, sua utilização e por fim chega-se aos tipos possíveis de espaços. Figura 1 Categorias de análise dos vazios urbanos e imóveis subutilizados Fonte: (CLEMENTE, 2011) Desta maneira, pode-se concluir que localidades aparentemente sem vazios, já totalmente edificadas e sem espaços para novas construções, podem, ainda assim, possuir vazios urbanos. Desde que a edificação em questão esteja abandonada. A partir disso, vê-se que bairros que sofreram com esvaziamentos, pelos mais diversos motivos, possuem vários espaços vazios, como o bairro de São Cristóvão, em estudo no trabalho. 2.2 ReabilitaçãoUrbana O termo reabilitação urbana foi formalmente conceituado em 1995, através da chamada Carta de Lisboa. A Carta define Reabilitação Urbana como uma estratégia de gestão urbana que procura requalificar a cidade existente através de intervenções múltiplas destinadas a valorizar as potencialidades sociais, econômicas e funcionais a 12 fim de melhorar a qualidade de vida das populações residentes; isso exige o melhoramento das condições físicas do parque construído pela sua reabilitação e instalação de equipamentos, infraestruturas, espaços públicos, mantendo a identidade e as características da área da cidade a que dizem respeito (CARTA DE LISBOA, 1995). Nota-se, que o conceito de reabilitação da identidade espacial é preservado. Além disso, prioriza-se o termo reabilitação que parece valorizar usuário ou morador no processo de intervenção, as demais questões como a econômica, por exemplo, devem ser pensadas em conjunto, para que o indivíduo tenha suas necessidades satisfeitas no lugar a ser reabilitado, sem sair – ou ser expulso – do local, ou ver sua identidade perdida. A reabilitação, conforme o documento, é voltada às áreas não residenciais abandonadas. No entanto, uma vez que o significado de requalificar é voltar a atribuir qualidade a algo, então se pode afirmar que o termo requalificação pode ser empregado em qualquer área, com ou sem características particulares, residencial, ou não, abandonadas ou somente subutilizadas. Assim sendo, o termo requalificação pode ser empregado como sinônimo tanto de revitalização como de reabilitação. Para prática dessa reabilitação, é imperativo avaliar a necessidade de se fazer mudança, isto é, investigar as motivações para a alteração do ambiente urbano. Segundo Vargas e Castilho (2005), as motivações que conduzem as intervenções em centros urbanos são: Referência e identidade; História urbana; Sociabilidade e diversidade; Infraestrutura existente; Mudanças nos padrões sociodemográficos; Deslocamentos pendulares e; a Distribuição de bens e serviços. No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, as fronteiras, tanto do espaço quanto dos recursos disponíveis, já estão chegando ao seu limite, principalmente na zona sul e no Centro. Pode-se portanto observar um fenômeno recorrente de degradação do 13 ambiente urbano. Tornando imperativa a adoção que desestimulem a evolução dessa tendência. Como já foi mencionado, a reabilitação urbana é vista como um instrumento de intervenção que deve ser aplicado de modo a contribuir para solução de problemas verificados nas cidades. Pode-se considerar o processo como um eixo prioritário nas intervenções urbanas, possibilitando uma operacionalização no tecido físico e social, permitindo (re)criar uma nova estética em função do desenho já existente de uma cidade. Esse processo permite ainda a revitalização de áreas mais antigas das cidades, principalmente os centros históricos em risco de decadência. Todavia, a requalificação urbana não pode canalizar as suas intervenções só para centros históricos, mas também para áreas adjacentes. Neste sentido, o conceito tem evoluído constantemente em função dos atuais problemas verificados no espaço urbano. Segundo a Direção Geral de Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano de Portugal, a reabilitação consiste na “operação de renovação, reestruturação ou requalificação urbana, em que a valorização ambiental e a melhoria do desempenho funcional do tecido urbano constituem objetivos primordiais da intervenção […]. A valorização ambiental e a melhoria da qualidade do espaço urbano são normalmente abordadas num dupla perspectiva: de resolução de problemas ambientais e funcionais […] e a criação de fatores que favoreçam a identidade, a habitabilidade, a atratividade e a competitividade das cidades ou áreas urbanas específicas” (DGOTDU, 2007). Outra definição é a de Ferreira, Lucas e Gato (1999) “reabilitação urbana é um processo social e político de intervenção no território que visa essencialmente melhorar a qualidade de vida urbana, através de uma maior equidade nas formas de produção (urbana), de um acentuado equilíbrio no uso e ocupação dos espaços e na própria capacidade criativa e de inovação dos agentes envolvidos nesses processos”. Trata-se, portanto, de um processo dinâmico, resultante de várias linhas de orientação delimitadas, a fim de melhorar a desarticulação territorial existente e tornar coerente as funcionalidades e a qualidade de vida no espaço urbano. A reabilitação urbana passa a ser vista como um dos propósitos das políticas de intervenção urbana e, neste sentido, deve-se impor um conjunto de regras, diretrizes e 14 normas que assegurem a proteção e valorização das características de um território, como aspectos físicos, ambientais e de identidade histórico-cultural. Com isso, políticas que direcionem à regeneração, precisam ser aplicadas nas cidades já consolidadas, visando valorizar seu patrimônio, defender sistemas naturais e principalmente obter um padrão de vida melhor para seus cidadãos. Não bastando, a reabilitação urbana não pode focar só na melhoria da qualidade de ambiente e de vida nas cidades; deve envolver também a articulação e integração de diversas componentes como, por exemplo, a habitação, a cultura, a coesão social e a mobilidade (CARVALHO, 2008). Portanto, as estratégias para a reabilitação urbana, em sintonia com as principais orientações da atualidade em matéria de desenvolvimento e planejamento urbano, revelam a primazia da reutilização de infraestruturas e equipamentos existentes e a reutilização/reconversão de espaços urbanos (desocupados, abandonados ou degradados, em particular) com o objetivo de melhorar as suas condições de uso. 2.3 Contribuição da Reabilitação Urbana para a Sustentabilidade Urbana Na década de 70 surge o debate do termo sustentabilidade, com diversas preocupações relacionadas ao meio ambiente, fatores como poluição, exploração dos recursos naturais, aquecimento global e a baixa qualidade de vida da população. Baseado nesse conceito, a “Agenda 21”, documento aprovado na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, no Rio de Janeiro, estabeleceu diretrizes para mudança do padrão de desenvolvimento global para o século XXI. Trata-se de uma tentativa de promover, em todo o planeta, um padrão de desenvolvimento que venha a conciliar os instrumentos de proteção ambiental, equidade social e eficiência econômica. No Brasil, o Decreto Presidencial de 26 de fevereiro de 1997 criou a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda XXI Nacional, com a 15 finalidade de propor estratégias de desenvolvimento sustentável e coordenar, elaborar e acompanhar a implementação da Agenda 21. Entre os temas centrais desse documento encontram-se as cidades sustentáveis. No decorrer de discussões sobre a Agenda 21 brasileira, buscou-se diagnosticar os problemas urbanos ambientais e as estratégias de sustentabilidade urbana Um marco, no Brasil, na maneira de tratar as questões urbanas é o Estatuto da Cidade — Lei Federal nº 10.257/2001 —, que estabelece normas e instrumentos, objetivando regular “o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (BRASIL, 2001, p.1). De acordo com este, uma cidade sustentável propiciaria às presentes e futuras gerações o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer. Entretanto, quando se analisa a dinâmica urbana das metrópoles brasileira, questiona-se a sustentabilidade do modelo de desenvolvimento brasileiro. Observa-se que o governo, mesmo com a intenção de aplicar uma política de sustentabilidade urbana, trataa gestão e o planejamento de forma fragmentada, sem incorporar estratégias que contemplem as múltiplas dimensões para o desenvolvimento sustentável (SACHS, 1993). Farr (2008) emprega o termo urbanismo sustentável, que traduziria uma política de sustentabilidade, para o projeto de cidades que se relaciona intimamente com natureza, buscando a síntese entre a corrente do Novo Urbanismo, dos edifícios sustentáveis e do crescimento inteligente. Para o autor, o urbanismo sustentável baseia- se em: Mobilidade; Caminhabilidade; Uso do solo misto, compacto e denso; Edificações de alto desempenho energético e de recursos naturais; Infraestrutura de alto desempenho energético e de recursos naturais; Biofilia: conexão dos homens à natureza; Projeto integrado. Braga (2008) discorda de Farr ao afirmar que, no que diz respeito as cidades, não há um consenso sobre o que venha a ser realmente uma cidade ou um planejamento 16 urbano sustentável, menos ainda de como avaliar o grau de sustentabilidade do crescimento de uma cidade ou sua contribuição para a promoção do desenvolvimento sustentável. Contudo, o conceito de sustentabilidade expressa a busca por uma melhor qualidade de vida e bem-estar para toda a população e por uma redução dos impactos ambientais antrópicos, ressaltando que as questões sociais e ambientais estão relacionadas (ROGERS, 2001). O reaproveitamento da infraestrutura instalada em uma área subutilizada per se pode levar a uma diminuição dos gastos públicos, a reabilitação de edifícios ou a ocupação de edifícios vazios apresentam vantagens em relação à urbanização de novas áreas e à prática de loteamentos, porque estas últimas demandam mais recursos financeiros para a realização de obras de infraestrutura. De maneira que o conceito de sustentabilidade também deve ser aplicado a projetos de recuperação de áreas degradadas. Alem disso, ocorre uma melhora da qualidade de vida através do restabelecimento ou estabilização do valor urbanístico, da infraestrutura e de empregos em regiões reabilitadas, que podem ser entendidas como um benefício social, uma consequência disso é a revitalização da imagem da cidade. Como já foi mencionado, muitas cidades do mundo já sofreram com processo de diminuição/descentralização da indústria, deixando as grandes áreas abandonadas, geralmente localizadas ao longo das principais vias de transporte, de rios, canais e junto ao mar. Este processo reflete a lacuna existe no planejamento urbano. Tais áreas a serem recuperadas representam uma importante oportunidade para melhorar o grau de sustentabilidade das cidades (ROGERS, 2001). A proposta de que o processo de recuperação de uma área vazia pode contribuir para a sustentabilidade, à qual Rogers (2001) se referiu, estimula o questionamento sobre diversos tópicos envolvidos nesse processo. Reabilitar uma região é um processo que exige o planejamento estratégico bem estruturado e são necessárias metas para atingir os objetivos planejados. Sendo assim, ao se planejar a utilização de espaços abandonados como potenciais locais para a construção de áreas verdes, então se chega mais perto de se 17 atingir a sustentabilidade de um espaço urbano. Essa medida de reabilitar locais degradados, em conformidade com o local a ser estudado pelo presente trabalho, pode estimular o desenvolvimento da região. No que se refere à implantação de áreas verdes e parques em áreas urbanas sem uso, tem-se a dificuldade de estabelecer a localização, uma vez que o tecido urbano já esta traçado. Segundo Farr (2008), ainda que esta área represente uma significativa contribuíção para a cidade, o desenvolvimento de parques urbanos acaba prejudicado pelos elevados preços dos terrenos e pela inadequação dos locais disponíveis pertencentes ao poder público, onde não há o apelo de instalação de parques. De maneira que, a utilização de um vazio urbano pode compensar, uma vez que seu estado de depredação reduziria seu valor. Edwards (2008) afirma que a relação entre preenchimento de vazios urbanos e criação de espaços verdes ao destacar tais ações como princípios orientadores de um projeto urbano na escala do lugar que contribua para o desenvolvimento sustentável: considerar a natureza e a biodiversidade, utilizar prioritariamente terrenos ou edificações abandonados e reforçar cinturões ou circuitos verdes. Garvin (2011), ao discorrer sobre parques públicos em sua obra, define alguns tópicos que tornam um parque sustentável nos aspectos social, funcional, ambiental, financeiro, político e estético. Para o autor, um espaço público pode ser considerado socialmente sustentável se atrai a frequência de pessoas variadas; para que isso ocorra, a composição de paisagem em si deve ser o destino almejado pelos seus usuários. A contribuição para a sustentabilidade da reintegração de vazios urbanos em espaços verdes torna-se de grande importância na medida em que a não existe grande disponibilidade de vazios nos centros urbanos. Harnik (2010) retrata essa afirmação ao alegar que o espaço urbano é altamente disputado, isto é, cada área possível de implantação compete com outro uso. Com isso, tem-se que muitas vezes a decisão é impulsionada por análise de custo-benefício e lucro. “Parques agregam valor aos bairros, mas os bairros também agregam valor aos parques, o que faz com que os desenvolvimentos dos dois devam caminhar juntos” (HARNIK, 2010 apud JARDIN 2012, p. 43). 18 3. Áreas Verdes e Vazios Urbanos: Uso voltado para o Lazer e a Cultura 3.1 Conceito de Áreas Verdes As áreas verdes são consideradas importantes na avaliação da qualidade ambiental urbana. Quando não existem ou não são efetivadas no ambiente urbano interferem em sua qualidade e sua ausência reduz substancialmente a qualidade de vida de sua população. Os problemas relacionados ao meio ambiente tornaram-se mais críticos nas cidades nas últimas décadas, portanto, os estudos relacionados com a qualidade do ambiente urbano podem contribuir para melhorar o planejamento a partir da geração de políticas capazes de tornar o uso e a ocupação do solo nas cidades menos impactantes ao meio ambiente, assim como, melhorar a qualidade de vida da população. Embora a existência de áreas verdes implique em inúmeras vantagens para a população, sua criação precisa de planejamento e ordenamento, uma vez que, nas cidades brasileiras, os processos de urbanização são desordenados, sua implantação demanda profundas remodelações (HOEHNE, 1944). De maneira a definir melhor o termo “área verde”, foram consultados diversos trabalhos sobre o assunto. Dentre estes, podemos citar Gonçalves (1994) que considera área verde como: “[...] qualquer área, no âmbito urbano ou rural, de propriedade pública ou privada, que apresente algum tipo de vegetação com dimensões verticais e horizontais significativas e que sejam utilizadas com objetivos sociais, científicos ou culturais.” 19 Fica implícita a predominância arbórea, pois assim teriam dimensão vertical significativa. Isso se torna mais claro no trabalho de Lima (1994), que apresenta a seguinte definição: “Área Verde: onde há o predomínio de vegetação arbórea; engloba as praças, os jardins públicos e os parques urbanos. Os canteiros centrais e trevos de vias públicas, que têm apenas funções estética e ecológica, devem, também, conceituar- se como Área Verde. Entretanto, as árvores que acompanham o leito das vias públicas, não devem ser consideradas como tal. Como todo Espaço Livre, as Áreas Verdes também devem ser hierarquizadas, segundo sua tipologia (privadas, potencialmente coletivas e públicas).” (LIMA et. al., 1994, p.549). Importante ressaltar que o autor não inclui como área verde a arborização viária e esta opinião é compartilhada por diversos autores. A razão disso, segundo (ÁLVAREZ, 2004), se deve aofato de que essas árvores se encontram em áreas impermeabilizadas. Em concordância com esse pensamento, Nucci (2008) afirma que para uma área ser identificada como área verde deve haver a predominância de áreas plantadas e que deve cumprir três funções: Estética, Ecológica, e Lazer. Além de apresentar uma cobertura vegetal e solo permeável, devem ocupar uma grande porcentagem da área. Oliveira (1996) relatou em seu trabalho a sua própria definição de áreas verdes: “[...] são áreas permeáveis (sinônimo de áreas livres) públicas ou não, com cobertura vegetal predominantemente arbórea ou arbustiva (excluindo-se as árvores no leito das vias 20 públicas) que apresentem funções potenciais capazes de proporcionar um microclima distinto no meio urbano em relação à luminosidade, temperatura e outros parâmetros associados ao bem estar humano (funções de lazer e cultura); com significado ecológico em termos de estabilidade geomorfológica e amenização da poluição e que suporte uma fauna urbana, principalmente aves, insetos e fauna do solo (funções ecológicas); representando também elementos esteticamente marcantes na paisagem (função estética), independentemente da acessibilidade a grupos humanos ou da existência de estruturas culturais como edificações, trilhas, iluminação elétrica, arruamento ou equipamentos afins; as funções ecológicas, sociais e estéticas poderão redundar entre si ou em benefícios financeiros (funções econômicas).” (OLIVEIRA, 1996, p. 17). Essa conclusão é bastante abrangente, já que engloba além da concepção de áreas verdes como receptáculo de árvores, mas também caracteriza outras funções potenciais que podem ser atreladas a esses locais. Com isso, é possível pensar nesses locais de forma mais holística. 3.2 Os Diversos Índices para Quantificação de Áreas Verdes nas Cidades A quantificação da arborização urbana tem sido realizada através de indicadores dependentes e independentes da demografia, expressos, respectivamente, em termos de superfície de área verde/habitante (IAV = Índices de Áreas Verdes) ou porcentual do solo ocupado pela arborização (PAV = Porcentual de Áreas Verdes) (Oliveira, 1996). Cavalheiro e Del Picchia (1992) discutiram a existência do índice de 12 m² de área verde/habitante considerado ideal, arraigado e difundido no Brasil e atribuído à Organização das Nações Unidas (ONU), Organização Mundial de Saúde (OMS) ou Food and Agriculture Organization (FAO). Os autores afirmaram que esse índice não é conhecido por aquelas instituições e supõem que deve se referir somente às categorias de parques de bairro e distritais/setoriais, ou seja, áreas públicas com possibilidades de 21 lazer ao ar livre. Já a Sociedade Brasileira de Arborização Urbana (SBAU) propôs como índice mínimo para áreas verdes públicas destinadas à recreação o valor de 15 m 2 /habitante. Segundo Nucci (2008) outros índices devem ser calculados, como: índice de cobertura vegetal, em que se consideram todas as manchas de vegetação, por exemplo as copas das árvores; e índice de áreas verdes utilizáveis, quando a área verde não apresenta condições de uso e, após a qualificação das áreas verdes, dever-se-ia recalcular o índice de áreas verdes, indicando a quantidade daquelas utilizáveis pela comunidade de acordo com suas qualificações. O índice de áreas verdes é aquele que expressa a quantidade de espaços livres de uso público, em Km² ou m², pela quantidade de habitantes que vive em uma determinada cidade. Participam deste cálculo as praças, os parques e os cemitérios, ou seja, espaços cujo acesso pela população é livre. Cabe ressaltar que se deve trabalhar com um primeiro valor que é em função da quantidade total das áreas existentes e um segundo, recalculado, que expresse quantas dessas áreas estão sendo realmente utilizadas, após uma avaliação do seu estado de uso e conservação. ∑ Outro índice que pode ser gerado é o índice de cobertura vegetal em área urbana (IAVC). Para obtenção desse índice é necessário o mapeamento de toda cobertura vegetal de um bairro ou cidade, que será posteriormente quantificado em m 2 ou Km 2 . Conhecendo-se a área total estudada, também em m² ou Km², chega-se posteriormente à porcentagem de cobertura vegetal que existe naquele bairro ou cidade. Se mapearmos somente as árvores, então esse índice expressará somente a cobertura vegetal de porte arbóreo. ∑ Segundo Nucci (2008), pode-se calcular o índice de verde por habitante (IVH), isto é, levantar a área verde total, também conhecido como mancha verde, que considera todo o verde existente no bairro, independente de ser área pública ou particular e não se 22 preocupando, neste caso, com o acesso da população a essas áreas, e dividir pela população residente. ∑ Oliveira (1996) obteve dois índices diferentes. O primeiro, denominado percentual de áreas verdes (PVA), foi estimado para grandes áreas da cidade que o autor chamou de unidade de gerenciamento. Neste índice entraram todas as áreas verdes públicas da cidade, independentemente da sua acessibilidade à população. Diferentes valores foram obtidos para as diferentes unidades de gerenciamento. Em seguida, o autor calculou o índice de áreas verdes (IAV), considerando somente aquelas áreas verdes públicas de acesso livre para a população. Neste caso os índices foram obtidos para setores da cidade. Na sequência do estudo setorial, o autor também chegou ao índice de áreas verdes para a cidade como um todo. Outros índices que também são valiosos para estimativa das áreas verdes, são: Pelo índice de áreas verdes para parques de Bairros (IAVPB), estima-se apenas as áreas verdes relativas a parques, acessíveis a população (em m²) e divide-se pelo número de habitantes da região. É possível refinar esse indicador se considerarmos apenas áreas públicas em bom estado. ∑ A partir desse refinamento, obtêm-se o índice de áreas verdes utilizáveis (IAVU). ∑ A falta de uma definição amplamente aceita sobre o termo "áreas verdes" e as diferentes metodologias utilizadas para obtenção dos índices dificulta a comparação dos dados obtidos para diferentes cidades brasileiras e destas com cidades estrangeiras. 23 Estes índices carregam consigo apenas uma informação quantitativa geral, não expressando como essas áreas verdes se encontram, como estão sendo utilizadas e nem a distribuição das mesmas dentro da cidade. Pode-se ter um alto índice de áreas verdes em uma determinada cidade, no entanto, pode-se constatar que a grande maioria delas se localizam nos bairros de classe de alta renda. Soma-se a isto, o fato de que as pessoas mais pobres, onde há uma carência maior dessas áreas, não possuem acesso a clubes de lazer particulares e os quintais de suas casas são pequenos ou mesmo inexistentes, tendo muitas vezes que praticar esporte ou desenvolver algum tipo de recreação nas ruas do seu bairro. 3.3 Tipos e Funções das Áreas Verdes Urbanas 3.3.1 Tipos de Áreas Verdes A conceituação desenvolvida por Richter (1981 apud GERALDO, 1997, pg.40) propõe a seguinte classificação para os espaços livres e o verde urbano: Jardins de representação e decoração: Ligados à ornamentação, de reduzida importância com relação à interação com o meio e sem função recreacional. São jardins à volta de prédios públicos, igrejas etc; Parques de vizinhança: Praças, playground, espaços que apresentam função recreacional, podendo abrigar alguns tipos de equipamentos; Parques de bairro: São áreas ligadas à recreação, com equipamentos recreacionais,esportivos dentre outros, que requerem maiores espaços do que os parques de vizinhança; Parques setoriais ou distritais: Áreas com equipamentos ligados à recreação que permitem o desenvolvimento de atividades; Áreas para proteção da natureza: Destinadas à conservação, podendo possuir algum equipamento recreacional para uso pouco intensivo; 24 Áreas de função ornamental: Áreas que não possuem caráter conservacionista nem recreacionista, são canteiros de avenidas e rotatórias; Áreas de uso especial: Jardins zoológicos e botânicos; Áreas para esportes; Ruas de pedestres: Calçadões. Continuando com as definições, Llardent (1982) ainda conceitua os seguintes termos sobre o entendimento de espaços livres e áreas verdes. Sistemas de espaços livres: Conjunto de espaços urbanos ao ar livre, destinados ao pedestres para descanso, passeio, prática esportiva e, em geral, entretenimento nas horas ociosas. Espaço livre: Quaisquer das distintas áreas verdes que formam o sistema de espaços livres. Zonas verdes, espaços verdes, áreas verdes, equipamento verde: Qualquer espaço livre no qual predominam as áreas plantadas de vegetação, correspondendo, em geral, o que se conhece como parques, jardins ou praças. Milano (1984) destaca que a cobertura arbórea das áreas abertas ou coletivas é um importante setor da administração pública, tendo em vista a facilidade de supressão da cobertura arbórea das áreas privadas urbanas. Para esse autor, tais áreas dividem-se em dois grupos: Áreas verdes; e Arborização urbana. Di Fidio (1990) estabelece uma classificação dos espaços urbanos: Espaços verdes urbanos privados e semi-públicos: Jardins residenciais; Hortos Urbanos; Verde semi-público. 25 Espaços verdes urbanos públicos: Praças; Parques Urbanos; Verde balneário e esportivo; Jardim botânico; Jardim zoológico; Mostra (ou feira de jardins; cemitério; Faixa de ligação entre áreas verdes; Arborização urbana). Espaços verdes suburbanos: Cinturões verdes. Para este trabalho adotam-se os termos desenvolvidos por Lima (1994): Espaço livre: Trata-se do conceito mais abrangente, integrando os demais e contrapondo-se ao espaço construído em áreas urbanas. Área verde: Onde há o predomínio de vegetação arbórea, englobando os jardins públicos e os parques urbanos. Os canteiros centrais de avenidas e os trevos e rotatórias de vias públicas que exercem apenas funções estéticas e ecológicas, devem, também, conceituar-se como área verde. 3.3.2 Funções das Áreas Verdes A constante modificação do espaço urbano pela sociedade tem conferido diversas feições às áreas verdes urbanas ao longo da história das cidades. Como dito anteriormente, as principais funções de tais áreas são: a ecológica, a estética, a social e a urbana, como mostra a figura 3. 26 Figura 2:Funções das Áreas Verdes Fonte: Elaboração própria baseado em (LIMA,1994). No quesito ecológico, a contribuição ocorre na medida em que os elementos que compõem essas áreas reduzem os impactos negativos, não só da industrialização, mas da urbanização descontrolada. A função estética está relacionada, principalmente com a integração dos espaços construídos, isto é, elas proporcionam maior permeabilidade da circulação. O papel social está diretamente relacionado a oferta de espaços para o lazer da população. Por fim, a função urbana de tais áreas está relacionada com o equilíbrio entre as áreas construídas e os espaços abertos. Lamas (1993) ressalta que “do canteiro à árvore, ao jardim de bairro ou grande parque urbano, as estruturas verdes constituem também elementos identificáveis na estrutura urbana; caracterizam a imagem da cidade; têm a individualidade própria; desempenham funções precisas; são elementos de composição e do desenho urbano; servem para organizar, definir e conter espaços, de forma a ressaltar sua função no tecido urbano”. Sitte (1992) destaca também a importância dos espaços livres inseridos nas proximidades da grande massa de edifícios, pois são essenciais para a saúde e para melhoria da qualidade de vida da população. As áreas verdes desempenham um papel importante no mosaico urbano, porque constituem um espaço cujas condições ecológicas mais se aproximam das condições naturais. 27 Espaços integrantes do sistema de áreas verdes de uma cidade, exercem, em função do seu volume, distribuição, densidade e tamanho, inúmeros benefícios ao seu entorno. Com ênfase ao meio urbano, estas áreas proporcionam a melhoria da qualidade de vida pelo fato de garantirem áreas destinadas ao lazer, paisagismo e preservação ambiental. São inúmeros os benefícios proporcionados pela arborização no meio urbano. Segundo Llardent (1981), Cavalheiro (1990), Di Fidio (1990), Milano e Sirkis (2000), destacam-se os seguintes, de acordos com as suas funções. As principais funções ecológicas são: a) Composição atmosférica urbana: Redução da poluição por meio de processos de introdução do excesso de oxigênio na atmosfera; Purificação do ar por depuração bacteriana e de outros micro-organismos; Ação purificadora por reciclagem de gases em processos fotossintéticos; Ação purificadora por fixação de gases tóxicos; Ação purificadora por fixação de poeiras e materiais residuais. b) Equilíbrio solo-clima-vegetação: Luminosidade e temperatura: a vegetação, ao filtrar a radiação solar, suaviza as temperaturas extremas; Enriquecimento da umidade por meio da transpiração da fitomassa (300 a 450 ml de água/metro quadrado de área); Umidade e temperatura: a vegetação contribui para conservar a umidade dos solos, atenuando sua temperatura; Redução na velocidade dos ventos; Mantém a permeabilidade e a fertilidade do solo; Embora somente parte da pluviosidade precipitada possa ser interceptada e retida pela vegetação em ambientes urbanos, esta diminui o escoamento superficial de áreas impermeabilizadas; Abrigo à fauna existente; Influencia no balanço hídrico. 28 c) Redução dos níveis de ruído: Amortecimento dos ruídos de fundo sonoro contínuo e descontínuo de caráter estridente, ocorrente nas grandes cidades. Quanto às funções estéticas: Transmite bem estar psicológico, em calçadas e passeios; Quebra da monotonia da paisagem das cidades, causada pelos grandes complexos de edificações; Valorização visual e ornamental do espaço urbano; Caracterização e sinalização de espaços, constituindo-se em um elemento de interação entre as atividades humanas e o meio ambiente. Gomes (2005) complementa sua importância social, apontando que as áreas verdes, do ponto de vista psicológico e social, influenciam o estado de ânimo dos indivíduos causado pelo transtorno das grandes cidades. Apesar das inúmeras e inegáveis funções das áreas verdes, sua oferta ainda é muito pequena. Isso ocorre pela dificuldade do poder público agir de forma rápida. Santos (1997) preconiza que as cidades são criadas para a economia e não para os cidadãos. A afirmação é evidente nas limitações entre a rua e a casa, a redução do espaço público, o anonimato entre as pessoas, tornando a cidade cada vez mais. Mesmo sabendo todos os benefícios de tais áreas, são escassas no Rio de Janeiro, contudo sabe-se que a falta dessas áreas está ligada às descontinuidades políticas. Sabe-se que um plano de áreas verdes, implantação de uma praça, arborização de um bairro, são ações que precisam ser pensadas e executadas a longo prazo. Todo esse processo é prejudicado com a alternância de grupos políticos na administração, pelo fato de que as políticas, os planos e metas traçados não vão além do período de gestão, isso ainda quando chegam a ser efetivados. No âmbito geral, a falta de planejamento é uma constante no desenvolvimento de nossas cidades, principalmente tratando-se das áreas verdes geralmente delegadas ao29 segundo plano, quando não ao abandono. Os resultados são os déficits permanentes e crescentes dessas áreas de forma contígua ao espaço urbano 3.4 Exemplos de Áreas Verdes Apresentam-se, agora, exemplos bem sucedidos da reabilitação de áreas subutilizadas em ambientes sustentáveis. As áreas propostas sintetizam o tema deste trabalho. Apesar de existirem muitos projetos de reabilitação urbana no Rio de Janeiro, focaremos especificamente no Aterro do Flamengo e no Parque Madureira, por serem intervenções com propostas de implantação de áreas verdes voltadas para a cultura e o lazer. Para não se restringir somente ao Brasil, apresentaremos dois exemplos internacionais bem-sucedidos de requalificação urbana, o projeto de Bogotá e o de Barcelona. i. Aterro do Flamengo Os projetos do Aterro do Flamengo começaram em 1948, juntamente com a proposta da Esplanada de Santo Antônio, esse sofreria o desmonte, seguido de urbanização e com ele seria aterrado a Praia do Flamengo (OLIVEIRA, 2006). Apenas em 1968, formou-se uma comissão, independente da Prefeitura, para desenvolver o projeto. Presidida por Maria Carlota Macedo Soares, esta comissão a princípio foi composta por Reidy, Jorge Machado Moreira, Hélio Mamede e Roberto Burle Marx. Posteriormente, foram a ela agregados os arquitetos Hélio Modesto, Carlos Werneck de Carvalho, Cláudio Marinho de A. Cavalcanti, Ulysses P. Burlamaqui, C. P. Motta e J. D. Ortega; a engenheira, Bertha C. Leitchic e o botânico, Luiz Emyglio de Mello Filho. O grupo de trabalho do Aterro também contou com a assessoria técnica de E. B. Medeiros, M. C. Ribeiro, F. B. Pereira e A. Wollner (OLIVEIRA, 2006). Com o desmonte do morro, o aterro ocupou uma área de 1.200.000 m² que ligava ao Aeroporto Santos Dummont à Praia de Botafogo. Com mais de cinco quilômetros de extensão, o projeto visava ser o mais longo projeto arborizado da 30 América do Sul. Sobre o Aterro, foram previstos locais para diversos esportes como futebol, vôlei e basquete; esportes náuticos; aeromodelismo naval em tanques especiais; locais para dança, música e espetáculos populares; bosques para passeio; viveiros de pássaros, aquários, viveiros de plantas; áreas para piqueniques; restaurantes e parques de recreação voltados para todas as idades. Inicialmente, só circularia pela região veículo sobre trilhos, de forma que os automóveis não teriam acesso à região. Contudo, o projeto foi alterado para incluir uma autopista elevada que vem do centro da cidade no sentido norte-sul e se conecta a uma pista de alta velocidade localizada na parte mediana da zona aterrada e uma pista de baixa velocidade voltada para a parte interior do aterro, próximo aos bairros da região. A figura 4 a seguir retrata o projeto do Aterro do Flamengo. Figura 3: Perímetro de Tombamento do Parque do Flamengo Fonte:IPHAN O Aterro foi uma grande experiência em termos de utilização de um parque como instrumento de planejamento urbano. Atualmente, o parque (Figura 05) é símbolo de lazer aos domingos e feriados, quando a autopista fecha e o local torna-se palco de atividades esportivas e culturais, como as corridas e as festas. 31 e Figura 4: Parque do Flamengo Fonte: Foto de Nelson Kon, 2012. ii. Parque Madureira O parque Madureira foi o projeto mais recente de intervenção urbana de grande porte da cidade do Rio de Janeiro. O objetivo foi estabelecer um projeto urbanístico que além de melhorar a qualidade de vida da região, possibilitasse aos usuários vivenciar experiências ambientais em espaços públicos, estabelecendo um questionamento do significado do que se experimentava. O projeto foi desenvolvido com o propósito de recuperar áreas degradadas e subutilizadas no trajeto das linhas de transmissão. Além disso, uma diretriz do projeto era adotar práticas sustentáveis na execução da obra. Com base nisso e com o apoio técnico de profissionais em arquitetura, urbanismo, paisagismo e engenharia, comprometidas com os conceitos ambientais e de sustentabilidade, foi possível moldar o projeto de acordo com os interesses da população local e dos gestores públicos. A figura 6 mostra as fases de construção, na qual foi feita a terraplanagem e o projeto final, com a obra já concluída. 32 Figura 5: Parque Madureira Antes e Depois Fonte: Prefeitura do Rio - Cidade Olimpica, 2014. O bairro de Madureira sofria pela baixa qualidade ambiental, com poucas áreas arborizadas e escassa oferta de espaços públicos, pela estagnação imobiliária, pelo intenso tráfego de veículos e pessoas e poluição ambiental. A criação de um parque na região tinha como objetivo suprir essas carências, além de proporcionar lazer, incentivar a prática de esportes, promover atividades culturais para o bairro de Madureira e outros bairros vizinhos. Este parque, que é o terceiro maior em área do Rio de Janeiro, tinha como proposta criar uma nova centralidade para os bairros da região, modificando o cotidiano da população, que dispõe de uma grande área verde e equipamentos para a realização de atividades diversas. O Parque Madureira conta com uma área de intervenção de 108.870,32 m², sendo que o projeto se subdivide em: área de parque, propriamente dita, com 93.553,79 m² e vias, estacionamentos e calçadas com 15.316,53 m² (BONELI, 2013). Por se tratar de um parque, e ter a maioria de suas atividades realizadas em espaços externos, o paisagismo possui um papel importante no aspecto ambiental e influencia a percepção de conforto dos usuários, de forma que este foi projetado com ambientes externos diversificados. A implantação de vegetação foi pensada para ter uma densidade adequada a cada tipo de ambiente. O parque apresenta pouca área construída e edifícios de baixo gabarito, sem acarretar impactos negativos relacionados com o adensamento de construções (BONELI, 2013). Foi o primeiro projeto nacional de um parque público que contempla, além dos aspectos urbanísticos e arquitetônicos, um programa socioambiental. Como 33 consequência disso, buscou-se consumir os recursos naturais conscientemente durante o projeto e implantação, principalmente em relação ao consumo de água e de energia. Ainda que sua construção tenha sido alvo da crítica, como projeto populista – somente para conquista de eleitorado na região e sem real demonstração de cultura local, seu sucesso reforça a carência de regiões semelhantes dispersas no Estado do Rio de Janeiro, uma vez que, a área serve de lazer não só para Madureira, mas também Nilópolis, Taquara, Irajá, entre outros. Ou seja, o sucesso do Parque de Madureira reforça a necessidade de áreas verdes para práticas esportivas e lazer em diversos bairros do Rio de Janeiro. Além de endossar a importância dada pelos moradores a essas áreas. Por meio do Parque Madureira, a Prefeitura do Rio de Janeiro pretende promover a sustentabilidade em obras públicas, com reabilitação de áreas urbanas degradadas, buscando sua preservação e integração com a natureza, em prol da economia e da valorização das culturas locais, conforme o plano estratégico para grandes eventos. iii. Bogotá Saindo do ambiente brasileiro, vamos apresentar um caso de uma cidade que guarda algumas semelhanças com o Rio de Janeiro, o caso de Bogotá, na Colômbia. Durante o período de 1948 a 1958, a Colômbia viveu um período de Guerra Civil devido ao tráfico de drogas. Com isso, a população procurou refúgio nos grandes centros urbanos, o que resultou em um grande crescimento populacional (VERISSIMO, 2012; SANTORO 2011). O cenário que se apresentava era de carência de infraestrutura, zonas segregadas e muita violência. Com essa estrutura social, o governo promoveu a criação de planos estratégicos objetivando atender a toda malha urbana, promovendo a inclusão social e melhorias de acessibilidade. 34 É necessário ressaltar que a legislaçãocolombiana difere da brasileira, pois considera diferentes níveis de planos a serem estabelecidos – municipal, intermunicipal e macroprojetos –, que oferecem maior autonomia para intervenção. Com o pilar central de reestruturar a mobilidade urbana por meio de transportes de massa, esse plano ainda contemplava a construção e manutenção das vias públicas, bancos de terras, sistemas distritais de parques e sistemas distritais de bibliotecas. Com essa estrutura, juntamente com o arcabouço legal favorável, a capital colombiana desenvolveu um plano de reabilitação urbana de forma a reintegrar os espaços e promover a inclusão social, tanto pela mobilidade, quanto pela educação. O plano de mobilidade – TransMilenio , que contou com engenheiros brasileiros, implantou ônibus expressos e ciclovias. O projeto também criou uma biblioteca chamada Virgílio Barco, onde a concepção foi pensada se orientando nos três princípios norteadores, social, econômico e ambiental. Cercada de vias e ciclovias, o local em questão fica escondido em uma grande área verde criada (Figura 7) . Figura 6:Biblioteca Virgilio Barco, Bogotá Fonte:Google Earth, 2014 35 iv. Barcelona A reabilitação da zona portuária, localizado muito próximo do centro histórico da cidade teve como fator motivador a realização dos Jogos Olímpicos de 1992, assim como o projeto do Porto Maravilha. O modelo de planejamento estratégico adotado em Barcelona baseou-se em experiências que já haviam sido realizadas em outras cidades, tais como a de São Francisco e a de Roterdã, entre 1986 e 1987. As propostas resultantes do processo de negociação entre diferentes Comitês: os grupos considerados os mais representativos da cidade, formavam o Comitê Executivo, os representantes de instituições, formavam o Conselho Geral e os diretores de empresas privadas, de instituições públicas diversas, constituíam as Comissões Técnicas. Estes grupos foram ordenados em seis grandes linhas estratégicas, com o objetivo maior de “consolidar Barcelona como metrópole empreendedora europeia, com uma forte incidência na região em que está situada, com qualidade de vida moderna, socialmente equilibrada e fortemente arraigada na cultura mediterrânea” (Plano Estratégico Econômico e Social de Barcelona, 2000 apud FORN, 1993). A região do Port Vell encontrava-se decadente, com antigos armazéns abandonados. O projeto teve como objetivo abrir Barcelona para o mar. No antigo Porto de Barcelona, nos Cais de Fusta e Espanya foram construídos marcos arquitetônicos que convivem harmoniosamente com as construções históricas, além de abrigar uma marina, aquário, centro de convenções, shopping, restaurantes integrados a edifícios comerciais e um bairro residencial. O projeto da Villa Olympica fazia parte de uma grande operação de iniciativa municipal conhecida como Remodelación del Frente Marítimo del Poble Nou de Barcelona. A região de Poble Nou – que fora durante o século XIX uma das principais zonas de implantação da primeira industrialização catalã – encontrava-se praticamente abandonada. As fábricas, armazéns e linhas férreas separavam a cidade do mar (KRUSE, 2011). Para a integração da região ao restante da cidade foi preciso remodelar toda a rede ferroviária existente, rebaixar o cinturão rodoviário que circunscrevia a zona e remanejar as redes coletoras subterrâneas. A aquisição dos terrenos, nos anos de 1986 e 36 1987, significou uma operação de compra ou expropriação de 304 unidades imobiliárias. O projeto previa conceber dois parques, sendo o mais importante o Parque da Barceloneta, construído em uma antiga fábrica de gás, 2 mil unidades residenciais, destinadas ao alojamento dos atletas durante a realização dos Jogos Olímpicos, sendo depois comercializadas para particulares, oito edifícios de escritórios, um hotel, um centro de convenções e um centro comercial e de negócios (HELD, 1994). A figura 8 mostra o Parque de Barceloneta, na região do Port Vell, o local anteriormente era uma fábrica de gás catalã, pode-se considerar essa reabilitação como recuperação de brownsfield, por ser a regeneração de uma antiga área industrial. O edificação da antiga fábrica foi mantida, atual tem-se no local a Fábrica do Sol, sede do Centro de Recursos Sustentável de Barcelona, dedicado à educação ambiental. Figura 7: Parque de La Barceloneta Fonte: (Green Spaces) Após o fim das Olimpíadas, fundaram o Bairro Barceloneta, que valorizou a região e a transformou no ícone do urbanismo contemporâneo. A Cidade se abre para o mar, diante da Vila Olímpica com um novo e elegante passeio marítimo e a criação de praias artificiais. Atualmente a região o novo bairro, Barceloneta, além de ter sido valorizado, também atrai muito turismo. 37 3.5 Legislação Urbana relacionada a Áreas Verdes, Cultura e Lazer, Economia e Planejamento Urbano no Rio de Janeiro Para iniciar a estrutura legal relacionada a área urbana, citaremos a Resolução CONAMA n° 369/2006, cujo conteúdo trata sobre a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente (BRASIL, 2006), que apresenta uma definição muito pertinente sobre áreas verdes. Em seu parágrafo primeiro, do artigo 8º, inova ao conceituar área verde como “espaço de domínio público que desempenhe função ecológica, paisagística e recreativa, propiciando a melhoria da qualidade estética, funcional e ambiental da cidade, sendo dotado de vegetação e espaços livres de impermeabilização”. Diante deste disposto legal, estes espaços naturais (áreas de preservação permanente) podem ser urbanizados para a implantação de parques lineares. Essa resolução admite que as áreas verdes urbanas sejam consideradas como o conjunto de áreas intraurbanas que apresentem cobertura vegetal, arbórea arbustiva ou rasteira e que contribuam de modo significativo para a qualidade de vida e o equilíbrio ambiental nas cidades. Essas áreas verdes estão presentes numa enorme variedade de situações: em áreas públicas; em áreas de preservação permanente (APP); nos canteiros centrais; nas praças, parques, florestas e unidades de conservação (UC) urbanas; nos jardins institucionais; e nos terrenos públicos não edificados. De forma que a resolução considera o termo englobando todo o universo de manchas verdes, até mesmo as que não englobam lazer e cultura, como é o caso das Áreas de Preservação Permanente, os canteiros centrais e as praças. Para se estruturar um estudo sobre a área alvo do presente trabalho é de suma importância averiguar as legislações pertinentes, que definam regras para a modificação do espaço urbano. Após uma extensa análise sobre os diversos planos, leis e intervenções que atravancaram o desenvolvimento da região administrativa de São Cristóvão, nos períodos mais recentes, surgiram algumas leis que deram esperança para que o processo de reabilitação da região seja possível com resultados concretos para os residentes. 38 Antes de proceder com detalhes em legislações federais e municipais que tratarão mais detalhadamente das questões urbanísticas é importante destacar que o tema, primeiramente, é abordado nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, com destaque ao artigo 182, que estabelece a existência do Plano Diretor: Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei. Tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. § 3º As desapropriações
Compartilhar