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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ 
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR 
PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MARINHAS TROPICAIS 
 
 
 
 
 
 
JÚLIA NUNES RABELO 
 
 
 
 
CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO TOTAL NAS RAIAS 
Hypanus americanus e Hypanus guttatus E AVALIAÇÃO DE RISCO PELO SEU 
CONSUMO 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA 
 2017 
 
 
JÚLIA NUNES RABELO 
 
 
 
CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO TOTAL NAS RAIAS 
Hypanus americanus e Hypanus guttatus E AVALIAÇÃO DE RISCO PELO SEU 
CONSUMO 
 
 
 
 
 
 
Documento de Qualificação apresentada ao curso 
de Mestrado em Ciências Marinhas Tropicais do 
Instituto de Ciências do Mar da Universidade 
Federal do Ceará, como parte dos requisitos para 
obtenção do título de Mestre em Ciências 
Marinhas Tropicais. 
Área de concentração: Utilização e Manejo de 
Ecossistemas Marinhos e Estuarinos. 
Orientador: Prof. Dr. Luiz Drude de Lacerda 
Co-Orientador: Prof. Dr. Vicente Vieira Faria 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA 
 2017 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação 
Universidade Federal do Ceará
Biblioteca Universitária
Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
R114c Rabelo, Júlia Nunes.
 Concentração de mercúrio total nas raias Hypanus americanus e Hyanus guttatus e
avaliação de risco pelo seu consumo / Júlia Nunes Rabelo. – 2017.
 61 f. : il. color.
 Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Instituto de Ciências do Mar,
Programa de Pós-Graduação em Ciências Marinhas Tropicais, Fortaleza, 2017.
 Orientação: Prof. Dr. Luiz Drude de Lacerda.
 Coorientação: Prof. Dr. Vicente Vieira Faria .
 1. Contaminação . 2. Dasyatidae . 3. Consumo alimentar. 4. Mercúrio. I. Título.
 CDD 551.46
 
 
 
JÚLIA NUNES RABELO 
 
 
CONCENTRAÇÃO DE MERCÚRIO TOTAL NAS RAIAS Hypanus americanus e 
Hypanus guttatus E AVALIAÇÃO DE RISCO PELO SEU CONSUMO 
 
Documento de Qualificação apresentada ao curso de Mestrado em Ciências 
Marinhas Tropicais do Instituto de Ciências do Mar da Universidade Federal do 
Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências 
Marinhas Tropicais. Área de concentração: Utilização e manejo de ecossistemas 
marinhos e estuarinos. 
 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Luiz Drude de Lacerda (presidente) 
Universidade Federal do Ceará– UFC 
 
________________________________________________________________ 
Prof. Dr. Luis Ernesto Arruda Bezerra (membro interno) 
Universidade Federal do Ceará– UFC 
 
________________________________________________________________ 
 Prof. Dr. Guelson Batista da Silva (membro externo) 
Universidade Federal Rural do Semiárido - UFERSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho à minha família; 
meus pais Gilberto e Ana Cristina e minha irmã Cecilia. 
Vocês são o início, o fim e o meio. 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 Inicialmente, agradeço a todos as forças Cósmicas e Divinas que nos 
acompanham, protegem e dão forças para continuar. 
 
Aos grandes professores, responsáveis por esse trabalho: 
 Ao meu orientador Prof. Dr. Luiz Drude pela oportunidade imensurável de 
fazer parte do seu grupo de pesquisa, conhecimento, pela confiança e por ter me 
proporcionado um trabalho engrandecedor em todos os sentidos. 
 Ao meu co-orientador Prof. Dr. Vicente Faria pelo incentivo frequente, 
direcionamento durante o mestrado, conselhos e refinamento no processo da 
redação científica. 
 Ao Prof. Dr. Guelson Batista por todo auxílio durante o mestrado e por aceitar 
participar da banca examinadora deste trabalho. 
 Ao Prof.ª. Luis Ernesto Arruda Bezerra pela disponibilidade e por aceitar 
participar da banca examinadora deste trabalho. 
 A Prof.ª. Drª Rozane Marins, coordenadora do Laboratório de Biogeoquímica 
Costeira, por disponibilizar o espaço para realização da pesquisa e por todo auxílio e 
conhecimento adquirido. 
 
A minha família e amigos: 
 Aos meus pais Gilberto e Ana Cristina por serem os responsáveis pela minha 
paixão pela ciência e pelo mar, por todo incentivo, pela formação, pela presença em 
todos os momentos, pelo amor e confiança. 
 A minha irmã Cecilia e cunhado Gabriel por todos os momentos juntos, por 
todo amor e inspiração 
 Ao Diego Lehder por ser abrigo e fonte restauradora de energia, por todos os 
sonhos compartilhados, pelo amor. 
 A minha família de coração: Natalia Lemke, Camila Marques e Wanessa 
Rodrigues pela amizade pra vida toda. 
 A todos que compõe O Casulo- escola de dança, pelos momentos marcantes 
que só a arte é capaz de proporcionar. 
 
 
 
Ao corpo técnico: 
 Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), 
pela bolsa de fomento social. 
 Ao INCT/MCTI, pelo apoio financeiro às análises realizadas. 
 Ao Prof. Wanderley Rodrigues Bastos e ao Laboratório de Biogeoquímica 
Ambiental da Universidade de Rondônia – UNIR, pelas análises de metil-Hg. 
 Ao Prof. Carlos Eduardo de Rezende e ao Laboratório de Ciências Ambientais 
da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, pelas análises de 
isótopos estáveis. 
 A todos os colegas do Laboratório de Biogeoquímica Costeira, profissionais 
por quem tenho grande admiração. Em especial ao Victor Lacerda e Ana Paula 
Benigno pela parceria e amizade desde o primeiro dia de pós-graduação. 
 A todos os colegas do Laboratório de Evolução e Conservação de 
Vertebrados Marinhos (EVOLVE), por todo conhecimento compartilhado e apoio. 
 A Isabela Abreu, secretária do PPGCMT por estar sempre disponível a tirar 
todas as dúvidas, pelo carinho e por toda ajuda. 
 A todos os colegas, técnicos e professores do Instituto de Ciências do Mar 
(LABOMAR) por todos os momentos compartilhados. 
 A todos do Departamento de Engenharia de Pesca da Universidade Federal 
do Ceará pela formação, convívio e pelos meus primeiros passos na vida 
acadêmica. 
 
 
A todos vocês, todo meu amor e gratidão! 
 
Que todos os seres sencientes possam se beneficiar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O MAR 
 
"Me deste a paisagem das águas litorâneas 
e as espumas se estendendo sobre a areia 
me mostraste a nudez e o encanto das praias solitárias 
a preamar e a vazante 
e o teu perfil de mastros e gaivotas 
me deste a magia do horizonte 
uma vela solta ao vento 
e um barco de papel para os meus sonhos 
mas nunca me mostraste 
a extensão azul dos teus domínios 
e nem um indício sequer dos teus enigmas." 
 
 Manoel de Andrade 
 
 
 
RESUMO 
 
As duas espécies de raias de maior consumo humano no nordeste brasileiro são as 
raias-manteiga Hypanus americanus e Hypanus guttatus. Visto que estas duas 
espécies são predadoras generalistas de topo da cadeia alimentar, seu consumo 
(normalmente em forma de muqueca) pode causar contaminação por mercúrio (Hg). 
Diferentes hábitos alimentares podem causar variação da concentração de Hg nos 
organismos estudados, sendo necessário diferenciar, de forma consistente, estes 
hábitos. O método mais indicado para tal identificação é o uso de isótopos estáveis 
de Carbono (δC13) e Nitrogênio (δN15), uma vez que as razões isotópicas refletem 
a dieta assimilada pelo predador ao longo do seu ciclo vital. Diante disso, o presente 
estudo teve como objetivo determinar a concentração de mercúrio total (Hg-tot), 
metil mercúrio (metil-Hg) e os valores de δC13 e δN15 das espécies de raias 
estudadas. Exemplares das duas espécies foram coletadas durante desembarques 
pesqueiros entre março e julho de 2015 na praia do Icaraí, no município de Caucaia, 
Ceará. No total, foram obtidos 12 espécimes de H. americanus e 17 de H. guttatus. 
A determinação da concentração de Hg-tot foi realizada, inicialmente,através de 
digestão ácida de 0,5 g de músculo liofilizado de cada exemplar. Em seguida, 
procedeu-se a quantificação por espectrofotômetro de absorção atômica por 
geração de vapor frio (CV-AAS) no modelo NIC RA-3. Houve diferença significativa 
entre as duas espécies tanto no comprimento (U= 3,963, p= 0,0001), quanto na 
concentração de mercúrio total (U= 2,613, p= 0,0045). H. guttatus apresentou 
correlação positiva, significativa entre o tamanho dos indivíduos e a concentração de 
Hg, tornando possível estimar a concentração de Hg em indivíduos de tamanhos 
diferentes dos coletados neste estudo. H. americanus não apresentou este 
comportamento. As concentrações médias de δC13 e δN15 para as duas espécies, 
sugerem que ambas se alimentam de presas de nível trófico mais elevado a medida 
em que possuem comprimentos maiores. Para ambas as espécies, a porcentagem 
de Metil-Hg no músculo foi, em média, de 100% quando comparado ao Hg-tot. 
Apesar dos valores médios de concentração de Hg apresentarem-se baixos para 
ambas as raias, as duas espécies tiveram valores máximos de Hg acima do limite 
estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que é de 
1.000 ng g-1, em peso úmido, para espécies predadoras. Em H. americanus esse 
valor foi de 1.197 ng g-1 e de 1.089 ng g-1 para H. guttatus. O valor de exposição 
 
 
diária média para as duas espécies não é susceptível de causar efeitos adversos 
para os consumidores. Porém os resultados desse estudo sugerem que os níveis de 
mercúrio total em raias utilizadas em pratos tradicionais podem apresentar risco, 
quanto maior for a frequência do seu consumo, não sendo incentivado seu consumo 
semanal para os dois grupos de consumidores: população em geral e grupo de 
risco. 
 
Palavras-chave: Contaminação, Dasyatidae, Consumo alimentar, Mercúrio 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
Two species rays of major human consumption in northeastern Brazil are Hypanus 
americanus and Hypanus guttatus. Since these two species are top predators, their 
consumption (usually in the form of fish stew) can cause mercury (Hg) contamination. 
Different feeding habits can cause variation of the Hg concentration in the studied 
species, and it is necessary to differentiate, in a consistent manner, these habits. The 
most indicated method for such identification is the use stable carbon and nitrogen 
isotopes, since the isotopic ratios reflect the diet assimilated by the predator over the 
life cicle. The present study aimed at determining the concentration of total mercury 
(Hg-tot), methyl-Hg and the values of δC13 and δN15 in two species of rays. 
Specimens were collected during fishing landings between March and July 2015 at 
Praia do Icaraí, in the municipality of Caucaia, Ceará. In total, 12 organisms of H. 
americanus and 17 H. guttatus were obtained. The determination of the Hg-tot 
concentration was initially performed by acid digestion of 0.5 g of lyophilized muscle 
tissue of each specimen and quantification through cold vapor atomic absorption 
spectrophotometry (CV-AAS) in the Model NIC RA-3 spectrophotometer. There was 
significant differences between the two species both in length (U = 3.963, p < 0.05), 
and in the concentration of total mercury (U = 2.613, p < 0.05). H. guttatus presented 
a significant positive correlation, between the size of individuals and the Hg 
concentration, making it possible to estimate the concentration of Hg in individuals of 
different sizes of those collected in this study. H. americanus did not present this 
behavior. The average concentrations of δC13 and δN15 for the two species, 
suggests that they both feed practically on the same food items. Therefore, they are 
in the same trophic position. For both species, the percentage of methyl-Hg in the 
muscle tissue was, on average, of 100% when compared to the Hg-tot. Although 
Hg's average concentration values are low for both rays, both species had maximum 
values of Hg above the limit established by the National Sanitary Surveillance 
Agency (ANVISA), which is 1,000 ng g-1, in wet weight, for predatory species. In H. 
americanus this value was 1,197 ng g-1 and 1,089 ng g-1 for H. guttatus. The average 
daily exposure for the two species is not likely to cause adverse effects to 
consumers. However, the results of this study suggest that the levels of total mercury 
in streaks used in traditional dishes may be at risk, the greater the frequency of their 
 
 
consumption,not being encouraged their weekly consumption for both groups of 
consumers: general population and risk group. 
 
 
Keywords: Contamination, Dasyatidae, Food consumption, Mercury 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1. Ciclo global do mercúrio. ............................................................................ 16 
 
Figura 2. Indivíduos das espécies de raias Hypanus americanus e Hypanus guttatus.
 .................................................................................................................................. 23 
 
Figura 3. Local de amostragem: praia do Icaraí, município de Caucaia, Ceará. ..... 288 
 
Figura 4. Exemplares representativos das espécies de raias coletadas: Hypanus 
americanus: (a) região dorsal, (b) região ventral; Hypanus guttatus: (c) região dorsal, 
(d) região ventral. Exemplares coletadas durante desembarque pesqueiro na praia 
do Icaraí, Caucaia - CE. Fonte: Guelson Batista da Silva. ........................................ 29 
 
Figura 5. Distribuição de classes de largura de disco das raias Hypanus americanus 
e H. guttatus amostrados em Caucaia, CE, de março a julho de 2015. .................... 30 
 
Figura 6. Equações de frequência de consumo por semana e mês. ......................... 34 
 
Figura 7. Box-plot da variação de concentração de Hg total das amostras coletadas 
de Hypanus americanus e H. guttatus....................................................................... 38 
 
Figura 8. Box-plot da variação de tamanho dos indivíduos coletados de Hypanus 
americanus e H. guttatus........................................................................................... 38 
 
Figura 9. Gráficos de regressão linear entre concentração de mercúrio total e largura 
do disco (LD) de ambas as espécies coletadas. ....................................................... 40 
 
Figura 10. Relação entre os valores de δC13 e δN15 nas espécies Hypanus 
americanus e Hypanus guttatus. ............................................................................... 42 
 
Figura 11. Gráfico de regressão linear entre a concentração de Hg total e δN15 de 
ambas as espécies de raias coletadas. ..................................................................... 43 
 
 
 
Figura 12. Gráfico de regressão linear entre a concentração de Hg total e δC13 de 
ambas as espécies de raias coletadas. ..................................................................... 44 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1. Esquema global das principais fontes de exposição humana ao mercúrio e 
suas respectivas rotas de exposição. ........................................................................ 18 
 
Tabela 2. Concentrações de Hg total nos materiais certificados DORM-2 e ERM-CE 
278 K e suas respectivas recuperações. ................................................................... 32 
 
Tabela 3. Concentração de mercúrio total em peso úmido e dados biométricos para 
os indivíduos da espécie de raia Hypanus americanus.. ........................................... 36 
 
Tabela 4. Concentração de mercúrio total em peso úmido e dados biométricos para 
os indivíduos da espécie de raia Hypanus guttatus. ................................................. 37 
 
Tabela 5. Concentração de Isótopos (δC13 e δN15) em amostras aleatórias de 
Hypanus americanus e Hypanus guttatus. ................................................................ 41 
 
Tabela 6. Concentração de mercúriototal em peso úmido em indivíduos de raias 
Hypanus americanus e H. guttatus comparado com raias de outras localidades. .... 47 
 
Tabela 7. Concentração de metil mercúrio (peso úmido) em amostras de Hypanus 
americanus e Hypanus guttatus. ............................................................................... 49 
 
Tabela 8. Número de refeições das espécies amostradas para grupo geral (70kg) e 
grupo de risco, por semana e por mês. ..................................................................... 51 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
Resumo ....................................................................................................................... 8 
 
Sumário ..................................................................................................................... 15 
 
1 Introdução ......................................................................................................... 16 
 
2 Hipótese científica ............................................................................................. 26 
 
3 Objetivos ........................................................................................................... 27 
3.1 Objetivo Geral ............................................................................................... 27 
3.2 Objetivos Específicos ................................................................................... 27 
 
4 Metodologia ...................................................................................................... 28 
4.1 Amostragem ................................................................................................. 28 
4.2 Quantificação de mercúrio total .................................................................... 30 
4.3 Curva de calibração e validação de método ................................................. 31 
4.4 Quantificação mercúrio orgânico .................................................................. 32 
4.5 Isótopos Estáveis .......................................................................................... 33 
4.6 Cálculo de exposição humana ...................................................................... 33 
4.7 Análise estatística ......................................................................................... 35 
 
5 Resultados e discussões .................................................................................. 36 
5.1 Dose e limite de segurança de exposição humana ao Hg ............................ 47 
 
6 Considerações finais ......................................................................................... 54 
 
7 Referências bibliográficas. ................................................................................ 55 
16 
 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 A contaminação das zonas costeiras tem sido uma questão 
frequentemente investigada em estudos ambientais. Dentre as principais fontes 
de contaminação estão os metais traço, com especial destaque ao mercúrio 
(Hg) (LACERDA; MALM, 2008). 
 O mercúrio é o único metal em estado líquido à temperatura ambiente e 
apresenta-se em diferentes formas químicas. As mais representativas são: as 
espécies inorgânicas, tais como o mercúrio elementar (Hg0), íon mercúrico 
(Hg2+) e íon mercuroso (Hg22+); além das orgânicas, como metilmercúrio 
(CH3Hg+) e dimetilmercúrio [(CH3)2Hg]. A especiação do mercúrio em 
ambientes aquáticos é influenciada por interações com a biota e complexos 
orgânicos e inorgânicos presentes na coluna d’água e sedimentos (MIRANDA 
et al., 2007). 
 O ciclo do mercúrio engloba todos os compartimentos ambientais. A 
grande quantidade emitida pelas atividades humanas durante o último século 
ainda é, em diversas situações, sujeita à remobilização através de processos 
antrópicos e naturais e através de variações climáticas globais e mudanças no 
uso do solo (Figura 1) (LACERDA; MALM, 2008). 
 
 Figura 1. Ciclo global do mercúrio. 
 
Fonte: adaptado de Mason; Fitzgerald; Morel, (1994). 
17 
 
 
 
 
 Embora variáveis, as diferentes estimativas de emissões de Hg para a 
atmosfera global sugerem um total de aproximadamente 6.000 t ano-1; cerca de 
2.000 t ano-1 correspondentes à volatilização natural do Hg presente nos 
oceanos, aproximadamente 1.000 t ano-1 correspondentes à reemissão de 
superfícies terrestres e 3.000 t ano-1 às emissões antrópicas. Dentre as 
principais fontes antrópicas encontram-se as indústrias química e 
eletroeletrônica, além da queima de combustíveis fósseis (LACERDA; 
SANTOS; MARINS, 2007). 
 Na atmosfera, aproximadamente 95% do mercúrio total encontra-se no 
estado elementar, uma vez que o Hg0 é lentamente oxidado para o mercúrio 
inorgânico (Hg2+). O ozônio é provavelmente o principal oxidante neste 
processo, juntamente com HClO, HSO3- e OH. O carreamento do Hg da 
atmosfera para a superfície da Terra ocorre principalmente através da 
deposição seca e úmida. O tempo de residência do Hg0 na atmosfera é da 
ordem de anos, o suficiente para que possa ser distribuído sobre o planeta 
antes de retornar à terra, lagos, mar, e ao gelo. O Hg inorgânico pode ocorrer 
em águas naturais na forma oxidada (Hg+2) ou combinado com outros 
elementos como cloro (HgCl2) ou enxofre (HgS). (MOREL; KRAEPIEL; 
AMYOT, 1998). 
 Apesar da considerável redução das fontes pontuais e da 
implementação de uma legislação ambiental mais rígida, as fontes difusas 
ainda necessitam de controle e adequação ao desenvolvimento sustentável da 
região costeira brasileira (MARINS et al., 2004). Dessa forma, a estimativa do 
risco ambiental ao Hg requer uma compreensão das vias de exposição aos 
diferentes níveis tróficos do ecossistema e aos seres humanos (BAEYENS et 
al., 2003). É necessário, além de determinar quanto de Hg está presente no 
meio ambiente, também quantificar as formas reativas do Hg e suas 
biodisponibilidades (CHRISTENSEN, 1995). Assim, cada estado de oxidação e 
espécie química tem características toxicocinéticas próprias, além de seus 
respectivos efeitos na saúde (tabela 1). 
 
18 
 
 
 
 
Tabela 1. Esquema global das principais fontes de exposição humana ao mercúrio e suas 
respectivas rotas de exposição. 
Mercúrio Fontes Rotas de exposição Eliminação Toxicidade 
 
Hg0 
Mineração artesanal de ouro; 
Amálgamas dentárias; 
Crematórios; 
Termômetros; 
Remédios populares; 
Vulcões; 
Combustão; 
Incineração de resíduos; 
Habitação em antigos rejeitos 
 
Inalação 
 
Urina e fezes 
Sistema 
Nervoso Central 
(SNC) 
Rim 
Pulmões 
Pele (acrodinia 
em crianças) 
 
Hg2+ 
Alimentos cultivados em locais 
contaminados; 
Tiomersal; 
Cosméticos; 
Medicina popular; 
Lâmpadas; 
Fotografia; 
Desinfetantes 
 
Ingestão; 
Absorção dermal 
 
Urina 
SNC 
Rim 
Trato 
Gastrointestinal 
Pele (acrodinia 
em crianças 
MeHg 
Peixes 
Conservantes 
Fungicidas 
Ingestão; 
Parental; 
Transplacentário 
Fezes 
SNC 
Cardiovascular 
Fonte: Adaptado de Bose-O’Reilly et al., (2010) 
 
 O vapor de Hg é considerado perigoso, pois é facilmente absorvido nos 
pulmões. Além disso, quando dissolvido na corrente sanguínea, difunde-se 
para todos os tecidos do corpo. Sua alta mobilidade deve-se ao fato de ser um 
gás leve monoatômico e lipossolúvel (GOYER; CLARKSON, 1996). Os níveis 
de Hg no sangue e na urina são indicadores de exposição recente. Avaliados 
de forma gradativa, esses indicadores são utilizados para monitoramento 
19 
 
 
 
biológico após exposição ocupacional ao vapor de Hg e de compostos 
inorgânicos de Hg (KAZANTZIS, 2002). 
 Assim, os seres humanos são, principalmente, expostos ao Hg0 através 
da inalação. Porém, com poucas exceções, as populações em geral têm uma 
exposição muito baixa ao mercúrio elementar, sendo estas, frequentemente, 
relacionadas a usos deliberados, como práticas ocupacionais, tratamentos 
dentários e usos folclóricos/culturais. Para a maioria das pessoas, o maior risco 
de contaminação está relacionado ao Hgorgânico, principalmente 
representado pelo metilmercúrio, cuja exposição mais significativa ocorre 
através do consumo de pescado (GOCHFELD, 2003). O metilmercúrio 
(CH3Hg+), também abreviado como metil-Hg, é a forma orgânica mais 
importante do ponto de vista da exposição humana (GOYER; CLARKSON, 
1996). 
 Dentro das células, o Hg pode se ligar a uma variedade de sistemas 
enzimáticos, incluindo os de microssomas e mitocôndrias, produzindo lesões 
celulares não específicas ou morte celular. O Hg possui uma afinidade 
particular com sítios de ligação contendo grupos sulfídricos. Nas células do 
fígado, o metilmercúrio forma complexos solúveis de glutationa, que são 
secretados na bílis e reabsorvidos do trato gastrointestinal. Também ao formar 
o complexo metilmercúrio-cisteína, o mesmo acessa as células endoteliais da 
barreira hemato-encefálica, atingindo o sistema nervoso (GOYER; 
CLARKSON, 1996). 
 Um amplo espectro de efeitos adversos tem sido observado devido à 
exposição ao Hg, geralmente variando em função da dose de exposição ao 
metil-Hg. Os desastres ocorridos em Minamata no Japão e no Iraque, por 
exemplo, causaram exposições altas nas populações locais, resultando em 
mortes e danos neurológicos devastadores. Os bebês expostos in utero ao 
metil-Hg durante esses episódios nasceram com deficiência severas, tais 
como: retardo mental, convulsões, paralisia cerebral, cegueira e surdez 
(NATIONAL RESEARCH COUNCIL, 2000). 
 Mesmo em baixas concentrações, a exposição ao Hg pode causar 
sintomas neurológicos e psicológicos. Estes incluem tremores, alterações na 
20 
 
 
 
personalidade, agitação, ansiedade, distúrbios do sono, perda de memória, 
demência, déficit de atenção, depressão e comprometimento da audição e da 
visão. Ao contrário das formas inorgânicas, o Hg orgânico pode causar efeitos 
irreversíveis e, em doses elevadas, pode levar à morte (JÄRUP, 2003; ZAHIR 
et al., 2005). 
 O consenso geral é a de que a exposição ao Hg, nas suas várias 
formas, deve ser, de maneira geral, minimizada. O principal foco de 
preocupação com a exposição ambiental de metil-Hg, ainda que em baixo 
nível, permanece no seu potencial para causar comprometimento neurológico 
do desenvolvimento das crianças ainda no útero ou em fase de amamentação 
(HOLMES; JAMES; LEVY, 2009). Acredita-se que o risco da transferência de 
metil-Hg é particularmente mais elevado durante a gestação, diminuindo 
durante a lactação (SAKAMOTO et al., 2002). 
 O Hg orgânico é convertido do inorgânico em compostos mais estáveis e 
é bioacumulativo. Assim, a transferência trófica do Hg ao longo da cadeia 
alimentar é, reconhecidamente, um importante processo de incorporação, 
bioacumulação e biomagnificação desse elemento-traço por animais aquáticos 
(KEHRIG et al., 2009). A bioacumulação de mercúrio ocorre dentro de um 
mesmo nível trófico devido à assimilação do Hg presente em alimentos e no 
ambiente circundante. Nos ecossistemas aquáticos, bactérias sulfato redutoras 
convertem Hg inorgânico em metil-Hg, que é facilmente assimilado por 
organismos. Os organismos na base da teia alimentar, tais como o fitoplâncton, 
concentram metil-Hg e Hg inorgânico diretamente da água, carreando essas 
espécies para os níveis mais altos de consumidores. Nota-se que as teias 
alimentares aquáticas tendem a ter mais níveis tróficos do que redes terrestres 
e, portanto, atingindo concentrações mais elevadas de metil-Hg (SCHNEIDER 
et al., 2013). 
 O primeiro surto bem documentado de intoxicação aguda com metil-Hg 
por consumo de peixe contaminado ocorreu em 1953 em Minamata, no Japão. 
O metil-Hg foi lançado em águas residuais, como subproduto de uma indústria 
de fertilizante local. Como a pesca nessa região do Mar de Shiranui nunca foi 
restrita, as pessoas que viviam em áreas costeiras foram expostas ao metil-Hg 
21 
 
 
 
por ingestão de peixe contaminado, por quase 20 anos. Foram observadas 
perturbações graves no desenvolvimento mental e motor em todos os casos de 
intoxicação fetal por metil-Hg. Já nos casos adultos, os casos mais graves 
apresentaram mutismo acinético (EKINO et al., 2007). 
 Uma vez que a principal via de exposição humana ao metil-Hg ocorre 
através do consumo de peixes e derivados, a Agência Nacional de Vigilância 
Sanitária (ANVISA), determinou através da portaria nª 685, de 27 de Agosto de 
1998, os níveis máximos permitidos de mercúrio total (Hg-tot) em pescado 
(BRASIL, 1998). Esta portaria estabelece que os valores para peixes não 
predadores e predadores são de 500 e 1.000 ng.g-1, em peso úmido, 
respectivamente. Internacionalmente, a Organização Mundial de Saúde - OMS 
(Word Health Organization - WHO) considera que a única faixa considerada 
segura seria apenas a de 500 ng.g-1 (WHO, 2008). 
 Espécies de peixes predadores, de grande porte e de longa vida, 
tendem a acumular mais metil-Hg do que espécies não predadoras ou de curto 
período de vida (RENZONI, ZINO; FRANCHI, 1998). Assim, o consumo de 
elasmobrânquios, como tubarões e raias, representam uma das principais vias 
de exposição humana ao Hg. Entretanto, embora existam numerosos estudos 
sobre a biologia e ecologia alimentar de elasmobrânquios na costa do Brasil, 
principalmente focando as espécies de raias, inclusive com um aumento 
significativo de trabalhos na última década, acompanhando uma tendência 
mundial (AGUIAR; VALENTIN, 2010), poucos são aqueles que quantificam a 
concentração de Hg nessas raias. Esta situação ressalta a importância de 
estudos voltados ao estudo da distribuição de Hg nesse grupo de 
elasmobrânquios. 
 Os poucos estudos envolvendo raias das ordens Myliobatiformes, 
Rhinobatidae, Rajidae e Dasyatidae, entretanto, encontraram concentrações de 
Hg consideradas altas no músculo de juvenis e adultos das espécies estudadas 
(GUTIERREZ-MEJIA; LARES; SOSA-NISHIZAKI, 2009; RUELAS-INZUNZA et 
al., 2013; HORVAT; DEGENEK; LIPEJ, 2014). 
 Gutierrez-Mejia; Lares; Sosa-Nishizaki (2009) e Ruelas-Inzunza et al. 
(2013) reportaram concentrações de Hg em raias coletadas no Golfo da 
22 
 
 
 
Califórnia, no México, enquanto que Horvat; Degenek; Lipej (2014), 
quantificaram as concentrações de Hg em raias coletadas no Golfo de Trieste, 
uma baía do Mar Adriático, no extremo norte do Mar Mediterrâneo. Em todos 
esses estudos as concentrações de Hg mensuradas foram diretamente 
proporcionais ao tamanho dos indivíduos coletados e as concentrações 
medidas em espécies de Dasyatidae apresentaram valores acima de 1.000 
ng.g-1 em peso seco, fundamentando assim, a necessidade de ênfase nessas 
espécies. 
 O conhecimento atual sobre a fauna de elasmobrânquios do Ceará 
ainda é incipiente, se considerada a extensão da costa e a importância desse 
grupo como elemento de destaque no sistema trófico dos ambientes marinhos, 
sobretudo tropicais e subtropicais. Na costa do Estado de Ceará foram 
registrados 8 ordens, 21 famílias, 27 gêneros e 42 espécies de 
elasmobrânquios. Tubarões estão representados por quatro ordens (50% das 
ordens de Elasmobranchii do Ceará), 12 famílias (57,1%), 17 gêneros (62,9%) 
e 30 espécies (71,4%). As raias compreendem quatro ordens (50%), nove 
famílias (42,9%), 10 gêneros (37,1%) e 12 espécies (28,6%) (GADIG et al., 
2000). 
 Dentre as espécies de raias encontradas, a família Dasyatidae destaca-
se como importante recurso da pesca artesanal local, principalmente as 
espécies Hypanus americanus e Hypanus guttatus (Figura 2). Ambas são 
consideradas espécie-alvo na pesca com linha de mão. Ainda, H. guttatus é 
bastante capturada como fauna acompanhante na pesca com rede de espera 
(SILVA; BASÍLIO; NASCIMENTO, 2007). 
 
 
 
 
 
 
 
 
23 
 
 
 
Figura 2. Indivíduos das espécies de raias Hypanus americanus e Hypanus guttatus. 
 
Fonte: (FISHBASE, 2016) 
 
 É importante ressaltar que algumas espécies de peixes cartilaginosos 
tiveram suas nomenclaturas alteradas durante o projeto ChondrichthyanTree 
of Life, financiado pela US National Science Foundation. Seus objetivos 
principais incluíam produzir um inventário taxonomicamente robusto da fauna e 
reavaliar a classificação destes peixes usando técnicas morfológicas e 
moleculares. Assim, Dasyatis foi subdividida em seis gêneros: Bathytoshia, 
Dasyatis, Hemitrygon, Megatrygon, Telatrygon e Hypanus. Logo as espécies 
antes conhecidas como Dasyatis americana e Dasyatis guttata, passam a ser 
denominadas de Hypanus americanus e Hypanus guttatus, respectivamente 
(LAST et al., 2016). 
 A espécie Hypanus americanus encontra-se desde Nova Jersey nos 
Estados Unidos até o Brasil, ocorrendo em quase toda a costa brasileira e 
também no Arquipélago de Fernando de Noronha. Enquanto isso, Hypanus 
gutattus é encontrada desde o México e das Índias Ocidentais ao sul do Brasil 
(MENNI; STEHMANN, 2000). 
 Hypanus guttatus diferencia-se das outras espécies do gênero pela 
forma típica da ponta do focinho, a qual é projetada para fora do contorno 
anterior do disco cerca de 1,4 vezes o tamanho do espaço interorbital. H. 
americanus se diferencia das outras espécies similares pela forma rombóide da 
parte anterior do disco e também pela posição de seu espinho sobre a cauda 
(BIGELOW; SCHROEDER, 1953 apud SILVA, 2005). 
 Ambas as espécies são classificadas quanto ao desenvolvimento 
embrionário como vivíparos aplacentários com fertilização interna, o que requer 
o contato íntimo entre os sexos por meio de um órgão copulador, os cláspers. 
24 
 
 
 
O embrião é nutrido pelas reservas vitelínicas e, em seguida, por uma 
substância chamada de leite uterino proveniente do trofonemata. Porém, o 
desenvolvimento gonadal pode não ser um critério consistente o bastante para 
definir o início da maturidade sexual, pois as maturidades funcional e fisiológica 
reprodutivas nem sempre coincidem (WOURMS, 1977; SILVA et al., 2007). 
 No caso das raias, estima-se o tamanho individual médio da primeira 
maturidade sexual através da largura do disco (LD). Assim o tamanho de 
primeira maturação sexual para H. americanus é de 60-70 cm de LD para 
machos e 80-90 cm para fêmeas. Já a capacidade fisiológica de reprodução 
para H. guttatus é atingida nas classes de 60-70 cm de LD para fêmeas e 50-
60 cm LD para machos (SILVA et al., 2007). 
 Em cativeiro, observou-se que H. americanus gera de três a cinco 
neonatos, que dura em torno de 175,4 dias de cerca de 20 cm de LD por 
gestação e 500 g. O tamanho e peso médio destes neonatos foram de 23,8 ± 
0,2 cm de LD e 505,9 ± 10,7 g, respectivamente (HENNINGSEN, 2000). 
 A presença de uma variedade de itens alimentares pertencentes a 
diferentes grupos animais sugere que as raias Hipanus americanus e H. 
gutattus sejam predadores oportunistas, capturando as presas que estão mais 
disponíveis e abundantes em seu habitat (SILVA; VIANA; FURTADO-NETO, 
2001). Dessa forma, ambas podem apresentar altas concentrações de Hg. 
 Diferentes hábitos alimentares entre espécies, assim como flutuações 
sazonais dos seus estados fisiológicos são fatores responsáveis por uma parte 
estatisticamente significativa da variação da concentração de Hg nos 
organismos estudados (SVOBODOVA et al., 1999). Dessa forma, é importante 
caracterizar os itens alimentares dos organismos estudados, assim como o 
tempo de exposição do animal ao Hg (KASPER et al., 2007) 
 A análise de fezes de animais vivos e, principalmente, do conteúdo 
estomacal de indivíduos mortos são os método mais tradicionais nos estudos 
sobre a variedade alimentar de uma espécie. Outra opção relativamente 
recente é através do uso de isótopos estáveis, átomos de um determinado 
elemento que possuem o mesmo número de prótons, mas diferem quanto ao 
número de massa. Os isótopos mais utilizados nesses estudos são o carbono 
25 
 
 
 
(δ13C) e o nitrogênio (δ15N). A principal vantagem do método é que as razões 
isotópicas refletem a dieta efetivamente assimilada pelo predador ao longo do 
ciclo vital (BISI; LAILSON-BRITO; MALM, 2012). Assim, assume-se que as 
assinaturas isotópicas dos tecidos de um consumidor estão em equilíbrio com a 
assinatura isotópica de sua dieta (BOECKLEN et al., 2011). 
 Dada a importância das raias na alimentação humana no litoral do Ceará 
e de serem capazes de acumular concentrações elevadas de Hg, o presente 
estudo teve como objetivo determinar a concentração de Hg-tot, metil-Hg e 
isótopos estáveis de carbono (δ13C) e de nitrogênio (δ15N) nas raias Hypanus 
americanus e H. guttatus capturadas na costa oeste do estado do Ceará, 
inferindo se as mesmas representam algum risco de contaminação humana 
através de seu consumo. 
 
26 
 
 
 
2 HIPÓTESE CIENTÍFICA 
 
 Por serem organismos predadores e generalistas de topo de cadeia, a 
concentração de Hg total na musculatura das raias Hypanus americana e H. 
guttatus encontra-se acima do permitido pela legislação para consumo humano 
e dessa forma, apresentam risco toxicológico às populações consumidoras 
desses peixes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
27 
 
 
 
 
3 OBJETIVOS 
 
3.1 Objetivo Geral 
 
 - Avaliar o risco de contaminação por Hg nos consumidores de pratos à 
base de raias do gênero Hypanus. 
 
3.2 Objetivos Específicos 
 
 - Quantificar as concentrações de Hg-tot e metil-Hg na musculatura das 
raias Hypanus americanus e Hypanus guttatus; 
 - Quantificar as concentrações de isótopos estáveis de Carbono (δC13) 
e Nitrogênio (δN15) nas espécies estudadas. 
 - Inferir sobre o efeito da dieta das raias nas concentrações de Hg e 
metil-Hg. 
 - Quantificar a ingestão de Hg pela população consumidora através da 
ingestão das espécies de raias estudadas. 
 
 
28 
 
 
 
4 METODOLOGIA 
 
4.1 Amostragem 
 
 A amostragem de exemplares das raias Hypanus americanus e H. 
guttatus foram realizadas na praia do Icaraí, no município de Caucaia, litoral 
oeste do Ceará (Figura 3). O período de amostragens ocorreu entre os meses 
de março a julho de 2015. 
 
Figura 3. Local de amostragem: praia do Icaraí, município de Caucaia, Ceará. 
 
 
 Os exemplares de ambas as espécies foram adquiridos durante 
desembarques de pesca artesanal que operava com rede de espera e espinhel 
de fundo. As redes de espera utilizadas foram de nylon monofilamento 
apresentando 10 cm de malha e 50 m de comprimento. Já o espinhel era 
constituído de corda de polietileno de 8 mm de diâmetro na linha principal, 
nylon monofilamenar de 1,8 mm de diâmetro na linha secundária e 15 anzóis. 
O polvo foi utilizado como a isca principal. No entanto, também foram utilizados 
como isca os peixes boca mole (Larimus breviceps), solha (Solea solea) e 
29 
 
 
 
pescadinha (Macrodon ancylodon). No total, foram obtidos 12 espécimes de H. 
americanus e 17 de H. guttatus (Figura 4). 
 
Figura 4. Exemplares representativos das espécies de raias coletadas: Hypanus americanus: 
(a) região dorsal, (b) região ventral; Hypanus guttatus: (c) região dorsal, (d) região ventral. 
Exemplares coletadas durante desembarque pesqueiro na praia do Icaraí, Caucaia - CE. 
Fonte: Guelson Batista da Silva. 
 
 
 A largura do disco (LD) dos indivíduos de H. americanus teve valor 
médio de 70,7 ± 14 cm. Indivíduos dessa espécie amostrados possuíam, 
principalmente, LD variando entre 60 e 80 cm (Figura 6). Quanto a H. guttatus, 
o valor médio do LD foi de 34,3 ± 17,8 cm. Esta espécie teve sua variação no 
LD relativamente bem distribuída, com uma leve concentração de indivíduos na 
classe de 10-20 cm de comprimento (Figura 5). 
 
 
 
30 
 
 
 
Figura 5. Distribuição de classes de largura de disco das raias Hypanus americanus e H. 
guttatus amostrados em Caucaia, CE, de março a julho de 2015. 
 
 Os exemplares obtidos foram acondicionados em gelo e transportados 
em caixas térmicas resfriadas ao laboratório. Após realizada a biometria, uma 
amostra de tecido muscular de cada exemplar foi retirada e congelada. 
Posteriormente,as amostras foram seccionadas em subamostras de 
aproximadamente 20 g e novamente congeladas. As amostras foram então 
submetidas a liofilização durante cinco dias. Isto foi feito com o intuito de 
desidratar as amostras. Concluído o período de liofilização, cada amostra teve 
o seu peso (g) registrado. Com isto, pôde-se obter o teor de umidade. O teor de 
umidade é necessário para o cálculo das concentrações finais de Hg em peso 
úmido. 
O material seco (liofilizado) foi, então, macerado. Para isto, utilizou-se 
cadinho e pistilo de porcelana. O material já na forma de pó e homogeneizado 
foi então acondicionado em frascos de vidro. Este tipo de frasco foi escolhido 
por evitar umidade. 
 
4.2 Quantificação de mercúrio total 
 
 A determinação da concentração de Hg total nos tecidos seguiu a 
metodologia proposta por Adair e Cobb (1999). A pré-digestão ácida foi 
realizada utilizando-se 0,5 g de músculo liofilizado de amostras duplicadas em 
tubos de teflon e adicionando-se 10 mL de ácido nítrico (HNO3 65%). Após 1 
hora, a digestão foi realizada a 200 ºC e por 30 minutos, utilizando-se um forno 
31 
 
 
 
de microondas MARS XPRESS, com potência de 800 Watts. 
Em seguida, para impedir a recomplexação do Hg com a matéria 
orgânica, 1 mL de peróxido de hidrogênio (H2O2) foi adicionado a cada tubo. 
Posteriormente, o extrato correspondente foi transferido para balão volumétrico 
de 100 mL, aferido com água destilada. 
Os teores de Hg-tot foram obtidos através da técnica de espectrometria 
de absorção atômica com geração de vapor a frio (CV-AAS), em um 
espectrofotômetro modelo NIC RA-3 da NIPON. O volume de 5 mL do extrato 
foi transferido ao tubo de ensaio conectado ao borbulhador do equipamento, 
com leitura realizada a 253,7 nm. 
O limite de detecção médio foi de 0,068 ng.g-1, obtido pela média dos 
resultados do triplo do desvio padrão de sete leituras dos brancos, multiplicado 
pelo fator específico determinado pela distribuição t de Student (3,14, gl 6) 
(EPA, 2000). 
 Os resultados, obtidos em peso seco, foram convertidos em peso úmido. 
Para esta conversão foi utilizada a seguinte fórmula: 
 
[Hg] em peso úmido = [Hg] em peso seco * (100 - % umidade) / 100 
 
Os valores em peso úmido foram então comparados ao valor máximo 
permitido estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANVISA). 
 
4.3 Curva de calibração e validação de método 
 
Uma curva de calibração foi utilizada para determinar a concentração 
das amostras a partir da solução padrão 1.000 mg L-1 de mercúrio da Merck®. 
Após sucessivas diluições em balões volumétricos de 100 mL, obteve-se a 
solução final de 5 ng mL-1. Uma nova curva de calibração foi feita para cada dia 
de análise, com pontos entre 0 e 25 ng de mercúrio e coeficiente de 
determinação (r²) médio de 0,9996. 
Os materiais certificados de referência utilizados foram de tecido 
muscular de tubarão Squalus sp. (dogfish) (DORM-2) e tecido de mexilhão 
32 
 
 
 
(ERM-CE 278 K), ambos liofilizados. Os padrões apresentaram valores de 
recuperação média acima de 70% (Tabela 2). 
 
Tabela 2. Concentrações de Hg total nos materiais certificados DORM-2 e ERM-CE 278 K e 
suas respectivas recuperações. 
Material certificado 
de referência 
Valor certificado 
(ng.g-1) 
Valor médio 
obtido 
(ng.g-1) 
Recuperação média 
(%) 
DORM-2 4460 3380 ± 225 
 
74,22 ± 3,42 
 
ERM-CE 278 K 71 64 ± 5 
 
89,75 ± 7,12 
 
 
4.4 Quantificação mercúrio orgânico 
 
 A quantificação do metil-Hg foi realizada em onze amostras de ambas as 
espécies aleatoriamente selecionadas. A digestão destas amostras ocorreu em 
solução alcalina de 25% KOH/metanol com grau de HPLC, com adição de água 
Milli-Q. Após este procedimento, 30 µl da amostra foram transferidos para 
frasco âmbar, aos quais foram acrescidos 200 mL de solução tampão 
(NaC2H3O2 2M) para ajustar o pH a 4,9 e, em seguida, aferida novamente com 
água Milli-Q para o volume de 40 mL. Posteriormente, foi etilada com 50 µl de 
NaBEt4. O Metil-Hg foi quantificado utilizando-se cromatografia gasosa com 
detecção por espectrometria de fluorescência atômica ou GC-AFS (MERX™ 
Automated Metil Mercúrio Sistema Analítico, Brooks Rand) (BLOOM; 
FITZGERALD, 1988; LIANG; HORVAT, BLOOM, 1994). Os resultados foram 
expressos em peso úmido. 
 
 
 
 
33 
 
 
 
4.5 Isótopos Estáveis 
 
 Considerando que a alimentação é a principal via de acumulação de Hg, 
foram também realizadas análises de isótopos estáveis para ambas as 
espécies. Mais precisamente, foram realizadas duas análises. Uma delas foi a 
de Carbono 13 (δ13C), para identificação da variedade alimentar. A outra foi a 
de Nitrogênio 15 (δ15N), para identificação da posição trófica. As mesmas 
amostras escolhidas anteriormente para análise de metil-Hg foram também 
utilizadas nas análises de isótopos estáveis. 
 As análises isotópicas das amostras de tecido seco (0,5 mg) foram 
completadas num espectrômetro de massa ThermoQuest Finnigan Delta Plus 
(Finnigan MAT) acoplado a um analisador elementar. Os valores de referência 
para δ15N foi nitrogênio atmosférico. Já para o δ13C, o valor de referência foi o 
Pee Dee Belemnite (PDB). Os resultados foram expressos em partes por mil 
(‰). A precisão analítica foi de ± 0,3 ‰ para δ15N. Já para δ13C, a precisão 
foi de ± 0,2 ‰. A precisão analítica foi determinada por triplicatas para cada 
cinco amostras. A precisão para a composição elementar e isotópica foi 
determinada por um padrão certificado (Proteína OAS / Isotopo Cert 114859). 
 
4.6 Cálculo de exposição humana 
 
 Para avaliar o risco para a saúde associado à ingestão das raias 
utilizamos a equação (1) (NEWMAN, UNGER, 2002; LACERDA et al., 2016). 
 
I. HQ = E / RfD 
 
 Onde HQ é o coeficiente de risco, E é o nível de exposição ou ingestão 
de Hg e RfD é a dose de referência para Hg (Hg = 0,47 μg / kg de peso 
corporal / dia). O nível de exposição (E) é calculado usando a equação (2) 
 
II. E = C * I / W 
 
34 
 
 
 
 Onde C é a concentração de Hg (μg.g-1 de peso úmido); I é a taxa de 
ingestão per capita (35,6 g dia 1, utilizada em Sartori; Amancio (2012) e W é o 
peso médio de um adulto (70 kg). Na HQ menor que 1, o nível de exposição é 
menor do que a dose de referência; O que significa que a exposição diária a 
este nível não é susceptível de causar efeitos adversos para os consumidores. 
 Foi estimada também a dose a qual a população estaria eventualmente 
exposta pelo consumo dessas espécies. Para isto, foram considerados os 
seguintes valores: (1) concentrações de Hg orgânico das amostras; e (2) 
consumo médio de pescado pela população em uma refeição. Tal porção será 
padronizada em 250 g, valor utilizado no trabalho de Vieira et al., (2015), assim 
como a fórmula adaptada apresentada na figura 6. 
 
Figura 6. Equações de frequência de consumo por semana e mês. 
 
 Os consumidores foram subdivididos em dois grupos. O primeiro 
representando a população em geral. Já o segundo representou os grupos de 
risco (grávidas, lactantes e crianças). A ingestão diária máxima aceitável (RfD) 
de MeHg nesses grupos é de 100 e 50 ng diários para cada kg de peso 
corpóreo, respectivamente (EPA, 1997). 
 
 
 
 
 
 
 
35 
 
 
 
4.7 Análise estatística 
 
O teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para averiguar se os dados de 
concentração de Hg obtidos possuíam distribuição normal. Como em ambas as 
espécies as concentrações de Hg não apresentaram distribuição normal, foi 
empregado o teste não paramétrico do coeficiente de correlação de Spearman 
para correlação entre a largura do disco e a concentração de Hg. Isto foi feito 
para se testar se houve bioacumulação de Hg nos tecidos musculares. Em 
seguida, para testar se as duas espécies diferiam quanto as concentrações de 
me Hg aplicou-se o teste de Man Whitney. Os testes estatísticos foram 
realizados utilizando-se o programa PAST. Já para a elaboração dos gráficos 
de frequência, regressãoe box plot, foi utilizado o software Excel. 
 
36 
 
 
 
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES 
 
 Para obtenção das concentrações de Hg em peso úmido, necessária 
para comparar aos limites exigidos pela ANVISA, foi necessário converter as 
concentrações de Hg-tot de peso seco para peso úmido. Os teores médios de 
umidade de tecido muscular para Hypanus americanus e H. guttatus foram de 
76,57 e 76,46 %, respectivamente. 
 Todas as amostras de ambas as raias Hypanus americanus e H. 
guttatus apresentaram concentração de Hg acima do limite de detecção do 
método. Para H. americanus a concentração de mercúrio total variou de 185 ± 
8 à 1.198 ± 141 ng.g-1 em peso úmido (Tabela 3). Por sua vez, H. guttatus 
variou de 0,4 ± 0,3 à 1.089 ± 52 ng.g-1 em peso úmido (Tabela 4). 
 
Tabela 3. Concentração de mercúrio total em peso úmido e dados biométricos para os 
indivíduos da espécie de raia Hypanus americanus.. 
 
Hypanus americanus 
Amostras 
Conc. Hg total 
DesvPad Sexo LD (cm) Peso (kg) (ng.g-1) peso 
úmido 
RDA01 910 47 m 75 10 
RDA02 200 13 m 69 10 
RDA03 836 36 m 75 12 
RDA04 397 35 m 72 10 
RDA05 295 14 m 74 10 
RDA06 1.198 141 m 70 10 
RDA07 203 21 f 91 22,5 
RDA08 249 14 m 70 12 
RDA09 305 14 m 75 8,8 
RDA10 270 20 m 74 10 
RDA11 233 5 m 73 10 
RDA12 185 8 m 30 0,7 
 
 
 
 
37 
 
 
 
 
Tabela 4. Concentração de mercúrio total em peso úmido e dados biométricos para os 
indivíduos da espécie de raia Hypanus guttatus. 
 
Hypanus guttatus 
Amostras 
Conc. Hg total 
(ng.g-1) peso 
úmido 
DesvPad Sexo LD (cm) Peso (kg) 
RDG01 1.089 52 f 72 11, 
RDG02 237 141 m 54 6 
RDG03 37 2 NR 19 0,15 
RDG04 951 67 m 54 6 
RDG05 90 5 f 37 1,5 
RDG06 0,4 0,3 f 18 0,14 
RDG07 11 1 NR 18 0,15 
RDG08 12 1 f 10 0,11 
RDG09 1 0,2 f 17 0,15 
RDG10 17 3 NR 46 0,19 
RDG11 56 2 f 33 1 
RDG12 15 2 NR 25 0,38 
RDG13 39 1 NR 20 0,21 
RDG14 56 2 m 17 0,13 
RDG15 766 16 m 46 2,6 
RDG16 103 4 m 42 2,3 
RDG17 644 31 m 52 4,5 
*NR = Não registrado. 
 
 Utilizando o teste de Shapiro-Wilk (W) foi observado que as espécies H. 
americanus e H. guttatus não apresentam distribuição normal (p < 0,05) do 
comprimento e das concentrações de Hg. Em seguida, com o teste não 
paramétrico de Mann Whitney (U), observou-se que houve diferença 
significativa na concentração de Hg total entre as espécies (U= 2,546, p= 
0,011), onde H. americanus teve maior variação média no teor de mercúrio 
total em peso úmido, em comparação com Hypanus gutattus, representado na 
figura 7. 
 
38 
 
 
 
Figura 7. Box-plot da variação de concentração de Hg total das amostras coletadas de 
Hypanus americanus e H. guttatus.. 
 
 
 As amostras obtidas de Hypanus americanus apresentaram apenas uma 
fêmea, enquanto H. guttatus não obteve definição de sexo em variadas 
amostras. Dessa forma, a largura do disco tornou-se a variável mais 
significativa para ser relacionada a variação de concentração de Hg-tot (Figura 
8). 
 
Figura 8. Box-plot da variação de tamanho dos indivíduos coletados de Hypanus americanus e 
H. guttatus. 
 
 
39 
 
 
 
 O box-plot da variação de comprimento das raias corrobora para 
demonstrar que o número amostral de H. americanus compreendeu uma faixa 
de comprimento mais limitada do que H. guttatus, apresentando diferença 
significativa (U= 3,963, p= 0,0001). A maior amplitude amostral de Hypanus 
guttatus torna essa espécie melhor representada quando comparada à H. 
americanus, pois apresenta indivíduos jovens e adultos. 
 Assim, como a amostragem, para as duas espécies de Hypanus, 
apresentou frequência de tamanho variado, a mediana das concentrações de 
Hg torna-se mais representativa do que a média. Sendo assim, a mediana 
obtida para H. americanus é até 4 vezes maior que a mediana calculada para 
H. guttatus, em peso úmido, e foram respectivamente de 283 ± 17 e 56 ± 2 
ng.g-1. Este resultado pode refletir o tamanho maior (aproximadamente duas 
vezes maior) de H. americanus em relação a H. guttatus. 
 Após tais verificações, a quantificação de Hg-tot para cada espécie foi 
relacionada com a largura do disco dos indivíduos. Através do gráfico da figura 
9, observa-se que ambas as espécies apresentaram bioacumulação, com os 
indivíduos maiores apresentando concentrações mais elevadas de Hg, porém a 
regressão linear para H. americanus não foi significativa (p= 0.6756), enquanto 
H. guttatus apresentou resultado de p < 0,05 (p = 0.0003). Assim, o aumento 
da concentração de Hg no tecido muscular de H. guttatus aumentará, em taxas 
constantes, com o aumento do tamanho do indivíduo 
 
40 
 
 
 
Figura 9. Gráficos de regressão linear entre concentração de mercúrio total e largura do disco 
(LD) de ambas as espécies coletadas. 
 
 
 O valor de r próximo a zero para Hypanus americanus sugere a não 
existência de correlação linear entre as variáveis, provavelmente devido ao 
grande número de indivíduos na mesma classe de tamanho, entre 70 e 80 cm 
de LD. Outro fator poderia ser uma possível mudança na dieta alimentar entre 
os juvenis e adultos. Bezerra et al., (2012), discutem essas hipóteses de 
alterações na concentração de Hg em tecidos da espécie de tartaruga marinha 
Chelonia mydas coletados no litoral do Estado do Ceará. A figura 9 sugere, 
alternativamente, a existência de dois grupos de concentrações de Hg nos dois 
diferentes grupos de tamanhos de H. guttatus, indivíduos menores, com LD < 
50 cm, apresentam concentrações bem mais baixas de Hg total (< 100 ng.g-1); 
enquanto que para Hypanus americanus, as concentrações distribuem-se em 
apenas um grupo nos indivíduos de LD sempre maiores que 70 cm. Da mesma 
forma que o padrão encontrado na tartaruga C. mydas, este padrão sugere 
fortemente alteração na dieta alimentar entre indivíduos jovens e adultos em H. 
guttatus, . 
41 
 
 
 
 Dessa forma, as concentrações de Hg nos peixes podem variar de 
acordo com fatores bióticos e abióticos. Portanto, o hábito alimentar, o estágio 
de vida, o tamanho e sexo são importantes para o entendimento dos níveis do 
metal nesses organismos. Além disso, parâmetros como o pH, temperatura, 
condutividade e oxigênio dissolvido podem influenciar não somente a absorção 
do Hg pelo peixe quanto sua biodisponibilidade (KASPER et al., 2007). 
 Considerando que a diferença na concentração de Hg nas espécies 
podem ocorrer devido à sua alimentação e nível trófico, foram analisados 
isótopos estáveis de δC13 e δN15 em amostras aleatórias para as duas 
espécies de raias (tabela 5). 
Tabela 5. Concentração de Isótopos (δC13 e δN15) em amostras aleatórias de Hypanus 
americanus e Hypanus guttatus. 
Amostra C (%) δC13 N (%) δN15 
H
ypanus 
am
ericanus 
RDA02 39,75 -14,29 14,38 8,71 
RDA03 46,60 -14,42 16,27 12,68 
RDA06 42,28 -13,87 15,33 13,64 
RDA07 41,11 -15,21 15,39 11,88 
RDA10 41,61 -15,45 15,31 10,04 
Média 42,27 -14,65 15,34 11,39 
RDG01 44,04 -13,88 16,34 13,00 
H
ypanus 
gutattus 
RDG03 40,71 -14,98 14,51 10,33 
RDG04 40,79 -15,32 14,13 11,08 
RDG07 39,21 -14,31 13,85 8,71 
RDG14 40,76 -14,83 14,27 10,83 
RDG15 43,42 -13,70 14,58 13,87 
Média 41,88 -14,58 14,97 11,35 
 
 As concentrações médias de δC13 e δN15 nas duas espécies, sugerem 
que ambas, coletadas na mesma região, alimentam-se praticamente de itens 
alimentares de mesmo nível trófico. Portanto, encontram-se na mesma posição 
trófica (figura 10). Assim, os itens alimentares e a posição trófica não 
justificariam a diferença nas concentrações de Hg apresentada entre as 
espécies. 
 
 
 
42 
 
 
 
Figura 10. Relação entre os valores de δC13 e δN15 nas espécies Hypanus americanus e 
Hypanus guttatus. 
 
 A composição isotópica de um consumidor é enriquecida por um fator de 
3‰ a 4‰ para nitrogênio e de menos de 1 ‰ a 1‰ para carbono em relação à 
sua dieta (PETERSON, 1987; DI BENEDITTO et al., 2011). 
 O cálculo de nível trófico pode ser determinado em relação ao δN15 do 
fitoplâncton, considerado como linha de base da cadeia. Logo, o nível trófico é 
igual ao δN15do consumidor subtraído do δN15 do fitoplâncton, divididos pelo 
fator de enriquecimento trófico médio 3,4‰, utilizado para homogeneizados 
musculares de componentes da rede alimentar para ecossistemas marinhos 
(FISK et al., 2001; DI BENEDITTO et al., 2011). 
 Assim, as raias do presente trabalho, encontram-se entre consumidores 
secundários e terciários. Seus níveis tróficos, baseados nos cálculos de suas 
dietas, são de 3,5 ± 0 e 2,6 ± 0.3 para H. americanus e H. gutattus, 
respectivamente (FISHBASE, 2016). 
 
43 
 
 
 
Figura 11. Gráfico de regressão linear entre a concentração de Hg total e δN15 de ambas as 
espécies de raias coletadas. 
 
 As espécies H. americanus e H. gutattus não apresentam resultados 
estatisticamente significativos quando associados a concentração de mercúrio 
total e δN15 (Figura 11). Porém, observa-se que ambas apresentam a 
tendência de indivíduos com maiores concentrações de Hg também possuírem 
maiores valores de δN15, estando em níveis tróficos mais elevados. Estes 
resultados confirmam que indivíduos maiores das duas espécies se alimentam 
de presas de níveis tróficos mais elevados, dando suporte a hipótese da 
diferença de alimentação para explicar as diferenças observadas nas 
concentrações de Hg, particularmente em H. guttatus. 
 
44 
 
 
 
Figura 12. Gráfico de regressão linear entre a concentração de Hg total e δC13 de ambas as 
espécies de raias coletadas. 
 
 Enquanto isso, através do gráfico da figura 12, apesar de ambas as 
espécies também não apresentarem resultados estatisticamente significativos, 
observa-se que os indivíduos com maiores concentrações do Hg-tot estão 
associados a maiores valores de carbono 13. Os mesmos são indivíduos de 
maiores comprimentos para espécie de H. americanus, o que pode estar 
associado a um período maior de alimentação. Já para H. guttatus o mesmo 
não pode ser observado, pois os resultados apresentam-se dispersos. 
 Apesar da importante aplicabilidade no uso de isótopos estáveis, ainda 
são incipientes os estudos focalizando a taxa de reposição dos tecidos 
biológicos, conhecida como taxa de turnover. No caso de espécies migratórias, 
a ausência desta informação, impede indicações mais claras dos locais de 
alimentação e até mesmo melhores esclarecimentos acerca da sua ecologia 
alimentar e rota migratória. Fatores intrínsecos, como tipo de tecido e o estágio 
de desenvolvimento; e extrínsecos como temperatura, podem influenciar essa 
taxa (MANETTA; BENEDITO-CECILIO, MARTINELLI, 2003). 
 Os autores Logan; Lutcavage, (2010), compararam as taxas de turnover 
de isótopos de duas espécies de elasmobrânquios, a raia Potamotrygon motoro 
e o tubarão Carcharhinus plumbeus. Ambas espécies possuem diferentes 
45 
 
 
 
estratégias de vida, com taxas de crescimento igualmente baixas, porém 
apresentaram semelhantes taxas de renovação celular. Dessa forma, as duas 
espécies de Hypanus devem apresentar resultado semelhante, pois 
encontram-se na mesma familia Dasyatidae. 
 Com relação aos itens alimentares, crustáceos e peixes ósseos são 
considerados os principais itens da dieta das raias marinhas que habitam 
regiões costeiras. Adicionalmente, moluscos, poliquetos, priapulidas, 
sipunculas e equinodermos também são identificados como fontes alimentares 
importantes, porém em menor frequência (AGUIAR; VALENTIN, 2010). 
 Após analisar o conteúdo estomacal de H. guttatus capturadas na 
enseada do Mucuripe, Ceará, Silva et al. (2001) confirmaram que os 
crustáceos foram o grupo predominante na dieta desta espécie. Moluscos, 
anelídeos e peixes também foram encontrados, em menor proporção. Assim, a 
presença de uma variedade de itens alimentares pertencentes a diferentes 
grupos animais sugere que a raia H. guttatus seja um predador oportunista, 
capturando as presas que estão mais disponíveis e abundantes em seu habitat. 
Também observou-se que a sutil diferença entre as dietas de juvenis e adultos 
dessa espécie, pode ser consequência principalmente da capacidade dos 
animais adultos de capturarem presas de maior tamanho ou, ainda, da 
profundidade das águas, uma vez que os jovens foram capturados próximos à 
costa e os indivíduos adultos em maiores profundidades 
 Os autores Neta; Almeida (2002), também observaram que os 
braquiúros (Callinectes sp.) são os principais itens alimentares das Hypanus 
guttatus capturadas no Maranhão. Seguidos de poliquetas, peixes e larvas de 
decápodos para jovens e adultos. Apesar de priapulida ter sido observado 
somente em adultos, os autores não constataram variações ontogenética ou 
sexual nos exemplares analisados, com a maioria dos itens alimentares sendo 
encontrados em ambos os sexos. 
 Enquanto isso, para Hypanus americanus existe um uso diferenciado do 
habitat durante a ontogenia de indivíduos no arquipélago de Fernando de 
Noronha, Pernambuco. As praias são possivelmente utilizadas como áreas de 
berçário e as regiões recifais mais profundas, como áreas de alimentação para 
46 
 
 
 
adultos e subadultos da espécie. Esta distribuição reflete uma tendência das 
raias mais jovens para ocupar as áreas de praia rasas, enquanto indivíduos 
maiores se deslocam para águas mais profundas com características de recifes 
durante a ontogenia (AGUIAR; VALENTIM; ROSA, 2009). 
 Sobre os itens alimentares, as raias Hypanus americanus das Bahamas 
possuem uma dieta ampla e são capazes de se alimentar de uma variedade 
abundante de peixes epibentônicos e invertebrados (GILLIAM; SULLIVAN; 
GILLIAM, 1993). 
 Em Sergipe, na Praia do Mosqueiro, essas mesmas espécies de raias 
são capturadas em profundidades diferentes. Hypanus americanus é capturada 
em profundidades entre 35 e 40 metros, enquanto que H. guttatus é pescada 
em águas mais rasas, com cerca de 7 a 10 metros, inclusive no estuário do Rio 
Vaza Barris (MENESES; SANTOS; PEREIRA, 2005). 
 Dessa forma, nota-se que ambas as espécies são predadores 
oportunistas, não escolhendo sua presa, alimentando-se assim do item mais 
disponível. A diferença entre as dietas de juvenis e adultos ocorre apenas no 
tamanho da presa capturada, maior à medida em que o indivíduo cresce. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
47 
 
 
 
5.1 Dose e limite de segurança de exposição humana ao Hg 
 
 No presente trabalho, ambas as espécies apresentaram valores acima 
do permitido pela ANVISA. Os valores máximos obtidos foram de 1.198 ng g-1 
para H. americanus e 1.089 ng g-1 para H. guttatus, ambas em peso úmido. 
Para os seguintes cálculos de exposição, foram utilizadas as médias das 
concentrações de Hg-tot, que foram de 440 e 242 ng.g-1 em peso úmido para 
Hypanus americanus e H. guttatus, respectivamente. 
 Existem poucos trabalhos de concentração de mercúrio em raias, 
portanto a tabela 6, a seguir, compila resultados de Hg-tot, em peso úmido, em 
diferentes espécies de raias 
 
Tabela 6. Concentração média de mercúrio total em peso úmido em indivíduos de raias 
Hypanus americanus e H. guttatus comparado com raias de outras localidades. 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2009 Gutierrez-Mejia et al México músculo 1 úmido 
Espécie N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
Rhinoptera 
steindachneri 34 66,5 
Baja 
California 60 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2013 Ruelas-Inzunza 
Noroeste do 
México músculo 10 úmido 
Familia Dasyatidae N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
D. dipterura 24 46,3 ± 8,4 El Choyudo 280 
D. dipterura 6 33,9 ± 5,1 
Playa del 
Rey 850 
D. longa 1 52,7 
Playa del 
Rey 1340 
Urolophus halleri 10 36,9 ± 7,1 
El 
Português 410 
Urolophus halleri 1 22 
Playa del 
Rey 700 
Urolophus spp. 1 22,8 
Playa del 
Rey 1110 
Familia 
Urotrygonidae N LD Local músculo (ng.g-1) 
Urotrygon chilensis 5 26,8 ± 1,4 
Puerto 
Chale 160 
Familia 
Rhinobatidae N LD Local músculo (ng.g-1) 
Rhinobatus 
productus 2 65 ± 15,5 
El 
Português 270 
Zapteryx exasperata 1 34,5 
Puerto 
Chale 270 
Familia Narcinidae N LD Local músculo(ng.g-1) 
48 
 
 
 
Narcine entemedor 1 28 
El 
Português 30 
Narcine entemedor 1 29 
Puerto 
Chale 320 
Familia Rajidae N LD Local músculo (ng.g-1) 
Raja velezi 1 83 
El 
Portugues 340 
Familia 
Gymnuridae N LD Local músculo (ng.g-1) 
Gymnura 
marmorota 1 50 Dautillos 210 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2013 Cisneros 
Alto Golfo da 
California México músculo 3 úmido 
Espécies N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
Rhinobatus 
productus 45 de 43,5 a 70,5 Alto Golfo 60 
Raja velezi 40 de 60 a 80 Punta Lobos 190 
Gymnura 
marmorota 24 de 60 a 131 Punta Lobos 170 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2014 Horvart et al. Mar Adriático músculo 4 úmido 
Espécie N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
Myliobatis aquila 5 310 ± 50 
Golfo de 
Trieste 86 
Pteromylaeus 
bovinus 17 727 ± 422 
Golfo de 
Trieste 1.028 
Dasyatis violacea 8 531 ± 61 
Golfo de 
Trieste 871 
Dasyatis pastinaca 1 455 
Golfo de 
Trieste 400 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2016 Lacerda et al. Ceará - Brasil músculo 3 úmido 
 Espécie N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
Hypanus guttatus 1 84 Mucuripe 83,4 
Ano Autor Local Tecidos Espécies Peso 
2017 Este trabalho Ceará - Brasil músculo 3 úmido 
 Espécie N LD cm Local músculo (ng.g-1) 
 
Hypanus 
americanus 12 70,7 Icaraí - CE 440 
 
Hypanus guttatus 17 34,3 Icaraí - CE 242 
 
 A maioria das espécies listadas na tabela, apresentam valores médios 
abaixo do limite estabelecido pela ANVISA. As exceções, foram 3 espécies que 
possuíam apenas o valor de um único individuo, semelhante ao que ocorreu no 
presente trabalho para ambas as espécies estudadas. 
 
49 
 
 
 
 Considerando que para calcular o risco na exposição humana são 
necessários os dados de Hg orgânico, as mesmas amostras selecionadas para 
isótopos também foram submetidas a análise de mercúrio orgânico, que em 
seguida foi comparado com a concentração de mercúrio total nas 12 amostras 
analisadas (tabela 7). Para ambas as espécies, a porcentagem de mercúrio 
orgânico no músculo foi, em média, de 100% quando comparado ao mercúrio 
total. 
 
Tabela 7. Concentração de metil mercúrio (peso úmido) em amostras de Hypanus americanus 
e Hypanus guttatus. 
Cód. Amostra Hg-T (ng.g-1) MeHg (ng.g-1) MeHg (%) Espécie 
RDA02 200 203 101 Hypanus am
ericanus 
RDA03 836 941 112 
RDA06 1197 1405 117 
RDA07 203 196 96 
RDA09 305 316 103 
RDA10 270 253 93 
Média 502 552 104 
RDG01 1089 1311 120 H
ypanus guttatus 
RDG03 37 54 148 
RDG04 951 1132 119 
RDG07 11 16 141 
RDG14 56 49 87 
RDG15 766 1055 137 
Média 485 577 114 
 
 Suportando o resultado encontrado no presente trabalho, estudos com 
diferentes espécies de raias apontam que quase 100% do mercúrio encontrado 
no músculo desses indivíduos encontra-se na forma metilada (HORVAT et al., 
2014). 
 Visando um possível risco de contaminação da população humana por 
meio do consumo de pescado, a ANVISA estabeleceu os níveis máximos de 
mercúrio total permitidos nesses alimentos. Assim, para peixes predadores o 
valor máximo legislado é de 1.000 ng.g-1 em peso úmido, enquanto para os 
peixes não predadores.esse valor é reduzido a 500 ng.g-1 em peso úmido. 
50 
 
 
 
 Sabe-se que o consumo de peixes contaminados com compostos de 
mercúrio é a principal fonte potencial de exposição da população humana ao 
metil-Hg, principalmente quando os mesmos fazem parte dos postos mais altos 
da teia alimentar. Os elasmobrânquios, composto essencialmente por tubarões 
e raias, encontram-se normalmente no topo dessa teia e são apreciados em 
diversos pratos culinários. Dessa forma, esse grupo merece destaque nos 
estudos de contaminação por mercúrio, principalmente para as raias pela maior 
facilidade de obtenção através da pesca. 
 A caracterização do risco para as populações humanas concentra-se 
cada vez mais na exposição ao metil-Hg ao longo da vida em vez da exposição 
aguda. Para este fim, pode ser definida uma dose de referência (RfD) como 
uma estimativa da exposição diária, sem um risco significativo de efeitos 
deletérios durante um tempo de vida. O RfD para metil-Hg foi determinada pela 
Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) como sendo 100 ng 
por kg de peso corporal por dia (BAEYENS et al., 2003). 
 Assim, com relação aos cálculos de exposição humana ao mercúrio 
através do consumo das espécies estudadas, obteve-se no presente trabalho a 
dose de metil-Hg diária, semanal e mensal, além do limite de segurança dessa 
ingestão, através do número de refeições semanais e mensais. 
 O cálculo de risco à saúde (HQ), foi de 0,48 e 0,26 para H. americanus e 
H. guttatus, respectivamente. Valores de HQ abaixo de 1 refletem que o nível 
de exposição ao mercúrio é menor do que a dose de referência. Isso significa 
que a exposição diária média a este nível não é susceptível de causar efeitos 
adversos para os consumidores. 
 Considerando a média de peso corporal de um adulto de 70 kg, o valor 
total de mercúrio que pode ser consumido é de aproximadamente 7.000 
ng.dia/adulto, 49.000 ng por semana e 210.000 ng por mês para grupo controle 
e para os grupos de risco são 3.500 ng.dia/adulto, 24.500 ng por semana e 
105.000 ng por mês. 
 Dessa forma, com relação aos cálculos de exposição humana ao Hg 
através do consumo das espécies estudadas, a tabela 8 apresenta o número 
de refeições à base dessas raias em dois grupos distintos. O primeiro 
51 
 
 
 
representando a população em geral e o segundo os grupos de risco, 
abrangendo grávidas, lactantes e crianças. 
 
Tabela 8. Número de refeições das espécies amostradas para grupo geral (70kg) e grupo de 
risco, por semana e por mês. 
Espécie consumida 
Grupo Geral Grupo de risco 
Semana Mês Semana Mês 
Hypanus americanos 
(Hg médio = 440 ng.g-1) 
0 1 0 0 
Hypanus guttatus 
(Hg médio = 242 ng.g-1) 
0 3 0 1 
 
 Ambas as espécies apresentaram frequência de consumo semelhantes, 
não sendo incentivado seu consumo semanal para os dois grupos. Além disso, 
recomenda-se também que o grupo de risco evite o consumo mensal. 
 No trabalho de Ruelas-Inzunza et al., (2013), realizado no México, 
nenhuma das sete espécies de raias estudadas possuía concentração de 
mercúrio capaz de causar efeitos adversos nos consumidores. Ainda assim, o 
mesmo enfatiza a necessidade de calcular as taxas reais de consumo de 
elasmobrânquios, principalmente relacionada aos pescadores e seus 
familiares, considerados grupos de risco 
 No Brasil, trabalhos vem sendo realizados com foco no consumo de 
pescado e seu risco para a população. Os maiores valores são encontrados 
nos tecidos musculares de peixes carnívoros, mas apenas uma pequena 
percentagem ultrapassa o limite máximo recomendado pela legislação 
nacional. Ainda assim, considera-se que há risco associado a frequência do 
seu consumo (BOISCHIO; HENSHEL, 2000; FERREIRA et al., 2012; 
STORELLI; BARONE, 2013; AMARO et al., 2014; COSTA; LACERDA, 2014) 
(LACERDA et al., 2017). 
 Concentrações de Hg observadas em peixes comercializados no 
mercado de Mucuripe, Fortaleza, CE, são relativamente baixas em comparação 
com outros mercados no Brasil e no exterior, variando de 14 a 509 ng.g-1 em 
peso úmido. Os níveis de exposição dos consumidores, considerando todas as 
52 
 
 
 
espécies analisadas foram muito mais baixos do que aqueles considerados de 
risco para os seres humanos. Porém, ressalta-se que indivíduos de grande 
porte de espécies carnívoras, como a Cavala (Scomberomorus cavala), 
apresentaram concentrações de Hg mais altas que os limites aceitáveis para o 
consumo humano (LACERDA et al., 2016). 
 Pesquisas com outros organismos de elevada posição trófica também 
sugerem risco no consumo humano. A ingestão de carne e gordura de baleia 
piloto na vida adulta dos habitantes das Ilhas Faroé - Dinamarca foram 
significativamente associadas à Doença de Parkinson, sugerindo uma 
associação positiva entre a exposição do animal ao metil-Hg e poluentes 
orgânicos persistentes(POP) e o desenvolvimento dessa doença em seus 
consumidores (PETERSEN et al., 2008). 
 Atuns da espécie Thunnus obesus também apresentaram resultado 
semelhantes. Pois, embora a concentração média para esta espécie tenha sido 
de 545 ng.g-1, os indivíduos de 30 kg ou mais de T. obesus apresentaram 
concentrações de Hg acima de 1.000 ng.g-1, superando, assim, os limites 
legais para o consumo humano (LACERDA et al., 2017). 
 Considerando a contaminação por mercúrio em vários cenários relativos 
ao consumo de peixe, publicados na literatura, foram combinados o número de 
refeições e a quantidade de peixe ingerido, relacionados aos valores de Hg 
aceitos pela legislação internacional atual. Abrangendo todos os dados, 
conclui-se que mesmo uma única refeição (por semana) de 50 g de peixe com 
840 ng g-1 de metil-Hg atingiria os níveis máximos de dose de referência (RfD) 
da EPA (VIEIRA et al., 2015) 
 Avalia-se que no futuro, as emissões antropogênicas de mercúrio 
deverão aumentar, principalmente devido à expansão industrial e da 
combustão de carvão projetada na Ásia. Portanto, os níveis de Hg de peixe e a 
consequente exposição das populações humanas ao metil-Hg tendem a 
aumentar, uma vez que a produção de metil-Hg nos ecossistemas oceânicos é 
impulsionada pelo suprimento de mercúrio inorgânico disponível (VIEIRA et al., 
2015) 
53 
 
 
 
 Assim, esforços para reduzir emissões de mercúrio ao ambiente devem 
ser priorizados, pois com o constante aumento da população mundial, tal 
recurso alimentar nutritivo como pescado não deveria ser cogitados a ser 
retirado do consumo humano devido à poluição antropogênica (HYLANDER; 
GOODSITE, 2006). Dessa forma, os resultados desse estudo sugerem que os 
níveis de mercúrio total em raias utilizadas em pratos tradicionais podem 
apresentar risco, quanto maior for a frequência do seu consumo. Assim, as 
consequências diretas à saúde humana, em função do consumo de 
elasmobrânquios, precisam ser estudadas com maior veemência. 
54 
 
 
 
 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
 Houve diferença significativa para as concentrações de mercúrio entre 
as espécies estudadas, quando consideradas as medianas. Os indivíduos 
amostrados da espécie Hypanus guttatus apresentaram uma distribuição de 
tamanho mais ampla, ocorrendo indivíduos de diferentes estágios de 
maturidade e apresentando uma regressão significativa, positiva entre o 
tamanho e a concentração de Hg, sugerindo que embora tenham hábitos 
alimentares similares, provavelmente consomem presas de diferentes níveis 
tróficos, como mostrado na diferença da razão 13C/15N entre indivíduos 
menores (juvenis) e maiores (adultos). Dessa forma, acredita-se que o 
aumento da concentração de mercúrio no tecido muscular de H. guttatus 
aumentará, em taxas constantes, ao longo do aumento do tamanho da mesma. 
 Apesar dos valores médios de concentração de Hg apresentarem-se 
baixos para ambas as raias, as duas espécies tiveram valores máximos de Hg 
acima do limite estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
(ANVISA). 
 O valor de exposição diária média para as duas espécies não é 
susceptível de causar efeitos adversos para os consumidores. Porém os 
resultados desse estudo sugerem que os níveis de mercúrio total em raias 
utilizadas em pratos tradicionais podem apresentar risco, quanto maior for a 
frequência do seu consumo, não sendo incentivado seu consumo semanal para 
os dois grupos de consumidores. 
 
55 
 
 
 
 
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 
 
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