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Prévia do material em texto

EDGEL JOSEPH TELES CORREA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A construção do imaginário coletivo em torno do mito “Rainha dos Baixinhos” 
com a estréia do “Xou da Xuxa” 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FORTALEZA 
2009 
EDGEL JOSEPH TELES CORREA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A construção do imaginário coletivo em torno do mito “Rainha dos Baixinhos” com a 
estréia do programa “Xou da Xuxa” 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Comunicação Social da Universidade Federal 
do Ceará como requisito para a obtenção do 
grau de Bacharel em Comunicação Social, 
habilitação em Jornalismo sob a orientação 
da Profa. Dra. Inês Vitorino. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fortaleza 
2009 
EDGEL JOSEPH TELES CORREA 
 
 
A construção do imaginário coletivo em torno do mito “Rainha dos Baixinhos” com a 
estréia do programa “Xou da Xuxa” 
 
Esta monografia foi submetida ao Curso de Comunicação Social da Universidade 
Federal do Ceará como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel. 
 
A citação de qualquer trecho desta monografia é permitida desde que feita de acordo 
com as normas da ética científica. 
 
Monografia apresentada à Banca Examinadora: 
 
_____________________________________________ 
Profa. Dra. Inês Sílvia Vitorino Sampaio (Orientadora) 
Universidade Federal do Ceará 
 
 ______________________________________________ 
Prof. Sylvia Beatriz Bezerra Furtado (Membro) 
Universidade Federal do Ceará 
 
________________________________________________ 
Profa. Ms. Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante (Membro) 
Universidade Federal do Ceará 
 
Fortaleza 
2009 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
DEDICATÓRIA 
 
 
 
Dedico este trabalho, primeiramente, a Deus por sempre estar ao meu lado na conquista dos 
meus sonhos, a minha mãe, pelo incentivo aos estudos, e, claro, a Xuxa, que foi a responsável 
pela magia da minha infância, que, até hoje, insiste em perdurar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Agradecimentos 
 
 
Concluir, aos 22 anos de idade, minha tão sonhada formação em Comunicação 
Social (Jornalismo) não teria sido possível sem a presença de pessoas fundamentais para 
o meu enriquecimento intelectual. Por isso, primeiramente, dedico as linhas aqui 
escritas a minha mãe, Maria Ivanira, que sempre acreditou em mim e me garantiu a 
oportunidade de levar adiante meu sonho de ser jornalista. Afinal, foi com muita luta 
que ela conseguiu se virar “na corda bamba” para incentivar minha formação estudantil 
em um dos melhores colégios da cidade. Também, acompanhou, desde criança, a paixão 
pela apresentadora Xuxa. Ao invés de criticar, soube entender o quanto ela foi 
importante, seja assistindo-a na TV ou mesmo ouvindo, incessantemente, suas músicas 
várias vezes por dia. 
 
Se considero Xuxa minha terceira mãe, a segunda leva o nome de Maria Stela. 
Inegável a contribuição dessa “vizinha-amiga” no meu dia-a-dia. Ainda bebê, ninava-
me ao som de “Boto Rosa”, famosa música da apresentadora na época do “Xou da 
Xuxa”. O tempo passou e continua presente em todos os meus momentos. Por que não 
estaria agora se também admira Xuxa assim como eu? 
 
Não posso esquecer os professores que, nesses quatro anos, conviveram bem 
com minhas idéias um tanto quanto fantasiosas de brilhar no mundo do entretenimento. 
Aos catedráticos Gilmar de Carvalho e Ronaldo Salgado, todo o meu respeito como 
mais novo colega de profissão. A palavra amiga e o conselho certo, quando mais 
precisei, vieram deles, sem dúvida, assim como as brincadeiras que sempre 
descontraíam o meu dia. Também, ao professor Luís Celestino, que, com sua paciência 
característica, soube ouvir minhas alegrias e tristezas, a ponto de se transformar em um 
amigo de confiança. À Júlia Miranda, que, no final do 6º semestre, apoiou, sem 
preconceitos, este trabalho. Agradeço, ainda, outros nomes notáveis da academia, como 
os professores Luis-Sérgio Santos, Glícia Pontes, Ana Cesaltina, Nonato Lima, Katiúzia 
Rios, Agostinho Gósson, Átila Bezerra e a minha espetacular orientadora, Inês Vitorino, 
que “germanicamente” corrigiu as páginas seguintes e abriu meus olhos a novos pontos 
de vistas. 
 
No percurso, impossível não fazer amigos. Levarei boas lembranças de cada um, 
mas não posso esquecer de três nomes bastante especiais: Gabriela Meneses, Darlano 
Dídimo e Heveline Ribeiro. É complicado até definir o tamanho significado que a 
“Gabi” tem para mim. Por mais de dois anos, fomos o “grude” um do outro. De vez em 
quando, uma aresta a ser aparada, mas, ao fim, muitas alegrias. Impossível não sermos o 
“xodó” de muitos da faculdade com nossa língua incansável, que já passou por cada 
“novela”... Na minha correria, se não fosse ela, certamente, estaria reprovado há 
tempos. Dias de provas, entregas de trabalhos, matrículas, enfim, tudo repassado por 
essa amiga, dona de cachinhos inesquecíveis. Já o Darlano, vulgo “Dad’s”, foi nossa a 
surpresa desses quatro anos. Conseguimos, estrategicamente, torná-lo mais sociável e, 
hoje, não consegue viver sem a gente. Inteligente como ele só, contribuiu na maioria 
dos nossos trabalhos, que sempre tinham nota máxima e eram assinados por mim, ele e 
Gabi. E a Heveline? Minha “Vev’s”. De voz tranqüila e sorriso quase sempre aberto, 
jamais me negou nada. Acho, de verdade, que ela é minha fã número um, pois sempre 
me motivou rumo ao estrelato. Trocamos confidências e, quando surge um problema, é 
só ouvi-la para me fortalecer. 
 
Externo ao universo acadêmico, agradeço à Germana Cabral, editora do caderno 
Eva do Diário do Nordeste, minha “chefa”, que soube compreender o quanto é 
complicado ter tempo no semestre da monografia. À amiga Ticiana de Castro, que, com 
alegria e graça, colocou-me mais próximo do jornalismo com sua experiência. E a 
minha revelação deste ano: Yuri Salgado, que inclusive é sobrinho do ex-coordenador 
do curso, Ronaldo Salgado. Tudo a ver! Como escrever cerca de 50 páginas sem alguém 
que te dá força e alegra aqueles dias mais estressantes? Nosso encontro aconteceu 
justamente quando estava no meio da monografia, completamente sem tempo. Driblar 
meus afazeres e ainda dedicar atenção a ele foi bem difícil. Mas consegui, entre uma 
briguinha e outra, é claro, que ele soube entender. 
 
Seria injusto não falar sobre Xuxa, que, como disse, é minha terceira mãe, e 
também Maria. Existe uma música na voz de “Sandy e Júnior” que resume bem minha 
relação com a “Rainha”. Há duas estrofes em que eles se perguntam: “Quem é que me 
alegrou durante anos nas manhãs/Quem é que deu um “tchan” na minha vida (...) Quem 
defendeu nossa mãe natureza/Quem deu a vida sem engravidar/Quem devolveu a 
criança esperança/Quem fez a gente rir e de emoção chorar/Quem é “Rainha” sem 
sangue real/A fada dos sonhos de cristal/Quem fez o nosso dia-a-dia diferente?”. Antes 
mesmo de pronunciar a palavra “mãe”, ainda bebê, falei “Tuxa”, referindo-me à 
apresentadora. A partir daí, começou essa ligação com ela que já dura 22 anos. Enxergo, 
sim, todo o marketing que existe por trás do fenômeno Xuxa, mas não há nada que me 
faça desgostar dela. A voz dela remete-me à infância, sinto-me querido e considero-a 
incomparável no referente à apresentação televisiva infantil. E ai de quem ouse falar 
mal dela. Por isso, faço questão de levar todos vocês ao encantado mundo de Xuxa, o 
qual eu deixarei, por um momento, para analisá-la objetivamente. Mas logo eu volto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“O espetáculo moderno é ao mesmo tempo a maior presença e a maior ausência. É a 
insuficiência, passividade, errância televisual e, ao mesmo tempo, participação na 
multiplicidade do real e do imaginário”. 
 
(Edgar Morin) 
 
 
 
RESUMO 
 
 
Estudo sobre a construção do fenômeno midiático “Xuxa” com a estréia do programa 
“Xou da Xuxa”, exibidona Rede Globo a partir de 1986. Analisa a trajetória da artista, 
desde seu passado como modelo, quando era considerada símbolo sexual da década de 
80, até se transformar em “Rainha dos Baixinhos” ao ingressar na emissora de maior 
destaque do País. O objetivo é mostrar como a artista, através de um marketing global 
competente, passou a integrar o imaginário coletivo como “fada madrinha” dos 
pequenos, considerando que, antes, seu trabalho era destinado unicamente ao público 
adulto, que, mais tarde, mesmo diante da empreitada no universo infantil, não a deixou. 
Através da projeção e identificação com a apresentadora, parte da sociedade da época 
acolheu Xuxa como “babá eletrônica” devido a condições sociais da época, como a 
necessidade da mulher ingressar no mercado. Os significativos índices de audiência do 
programa são resultados dos investimentos vultosos numa programação infantil inédita, 
em que o centro das atenções não eram fantoches ou desenhos animados, mas, sim, uma 
estrela de TV, com beleza e carisma inegáveis. Assim, a relação do público com Xuxa 
dá-se através de atos de projeção/identificação, uma vez que a artista despertou 
curiosidade de muitos pelo comportamento infantil, cuja autenticidade é questionada até 
hoje. Promotora de um discurso “encantado”, em que “tudo pode ser só basta acreditar”, 
a artista conquistou espaço cativo na programação televisiva infantil e tornou-se um 
lucrativo negócio para a Globo. Além das quatro horas matinais no comando do “Xou”, 
estava presente no dia-a-dia dos “baixinhos” nos diversos produtos lançados com seu 
nome, geralmente recordes de venda.Citada na mídia sempre como “Rainha”, 
impossível não criar essa “atmosfera poderosa” em torno de si, indispensável para ser 
alçada à condição de mito. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
Introdução............................................................................................. 10 
 1. É hora do “Xou”............................................................................ 13 
1.1. A menina transforma-se em “Rainha” .......................................... 13 
 1.2. O espetáculo projetado pela televisão no Brasil ........................... 18 
 1.3. Auditório como contemplador do circo ........................................ 22 
 1.4. Xuxa como agente promotora do consumo................................... 26 
 2. Querer é poder ............................................................................... 32 
 2.1. A figura olimpiana de Xuxa.......................................................... 32 
 2.2. O mito Xuxa na formação do imaginário coletivo........................ 35 
 2.3. Mito sob a ótica da semiologia...................................................... 39 
 2.4. Estrelas do século XXI..................................................................39 
 3. Sonho de Cristal ............................................................................ 44 
 3.1. “Planeta Xuxa” ..............................................................................44 
 3.2. Formato do “Xou” ......................................................................... 46 
 3.3. Imaginário de fã............................................................................. 50 
 3.4. Discurso em forma de música ....................................................... 52 
 Conclusão ............................................................................................. 58 
 Anexos.................................................................................................. 60 
 Referências ........................................................................................... 64 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Introdução 
 
Ao todo, já são mais de 20 anos de carreira na emissora de maior destaque do 
País, a Rede Globo. Nessa trajetória, a apresentadora Xuxa gravou cerca de 900 
músicas, que, em forma de Lp’s, Cd’s e K7’s, venderam mais de 55 milhões de cópias e 
renderam 400 discos de ouro, apenas no Brasil. Foram mais de sete mil roupas 
diferentes, 961 perucas, mais de 600 sapatos, 114 sandálias e muitas botas. Gravou mais 
de 15 mil horas de programas exibidos na Rede Globo. Xuxa levou aproximadamente 
30 milhões de pessoas para ver seus filmes no cinema, foi capa de aproximadamente 
3.000 revistas, e, de 2006 para cá, o site oficial (www.portalx.com.br) teve mais de 5,5 
milhões de visitas. 
E mais: a vendagem do disco “Xou da Xuxa 3” colocou a artista no “Guiness 
Book”, o livro dos recordes. Ela ganhou mais de 31 mil presentes dos seus 200 fãs 
clubes nesses 20 anos de TV Globo. Foi apontada pela revista Veja, em 2002, como a 
artista mais rica do Brasil, com um patrimônio de 250 milhões de reais, ganhando, 
anualmente, mais de 40 milhões de reais por ano, com os produtos de sua marca, além 
do salário que é de 2,5 milhões de reais mensais. Ainda segundo a mesma revista, os 
ganhos de Xuxa colocam-na no patamar de artistas de Hollywood, como Julia Roberts e 
Keanu Reeves. Está em primeiro lugar na lista dos artistas que mais faturaram nos 
últimos dez anos (1999-2009), com patrimônio atual é de um bilhão de reais. 
Portanto, não há dúvidas de que a apresentadora representou, desde sua inserção 
no dia-a-dia das crianças, em 1986, a partir do “Xou da Xuxa”, um importante e bem-
sucedido produto criado pela mídia. Por estar diretamente ligada à fantástica fábrica de 
consumo, que visa a lucros vultosos, é considerada um dos grandes fenômenos 
comunicacionais do show business brasileiro. Como sempre deixou claro em seu 
discurso, Xuxa é a “prova” de que o sonho pode ser tornar realidade. A exemplo, a 
própria vida. Nascida no interior de Santa Rosa (RS), antes mesmo dos 20 anos, já era 
conhecida, nacional e internacionalmente, pela beleza européia, confirmada pela pele 
alva e olhos azuis, numa época em que a cor morena estampava as mais famosas capas 
de revistas. Logo, é convidada para comandar o programa “Clube da Criança” na Rede 
Manchete, o que lhe dá visibilidade suficiente e atrai os olhares do alto escalão da Rede 
Globo. 
Beleza, carisma e apoio de pessoas notáveis, como o ex-namorado Pelé e a ex-
diretora, Marlene Mattos, contribuíram para que Xuxa alçasse vôos maiores e 
conquistasse o título de “Rainha dos Baixinhos”, conferido pelo público adulto e 
infantil, com clara uma contribuição mercadológica da mídia. 
Com figurino de chamar atenção, exagerado em cores e decotes, num período 
pós-ditadura, em que a censura imperou sobre os costumes, despertou a curiosidade de 
muitos com o jeito de menina-mulher e a voz infantil. Contudo, ao invés de ser vista 
como ameaça, conseguiu agradar. Afinal, nos anos 80, a mulher invadiu o mercado de 
trabalho e seria fundamental a presença de alguém que distraísse os filhos. Por que não 
uma “babá eletrônica” que canta, dança, parece lidar bem com todo tipo de criança e 
ainda incentiva, mesmo que de modo contraditório e interessado, valores de proteção da 
natureza, o respeito, amor e carinho? 
A trajetória de Xuxa, como modelo, atriz de filme erótico e, de repente, 
apresentadora infantil, está marcada na história da televisão brasileira e, por isso, 
merece ser analisada à luz dos conceitos de autores renomados da Comunicação. Alémdo contexto social da época, o marketing global por trás da artista e uma boa dose de 
sorte foram os principais responsáveis por garantir crédito e estabilidade ao “novo 
mundo” criado pela Globo destinado às crianças, o “Xou da Xuxa”. 
Para discutir o surgimento de um mito e a importância dele para a sociedade, no 
primeiro capítulo (É hora do “Xou”), a biografia de Xuxa une-se aos conceitos de 
Adorno e Horkheimer sobre a Indústria Cultural, que, de acordo com eles, dissemina 
mensagens simbólicas na mídia de forma “padronizada e manipuladora”. Em seguida, 
contrapõe-se o questionamento desses autores à visão de Arlindo Machado de que a 
televisão pode até influenciar o comportamento de quem a assiste, porém a escolha do 
que é transmitido é feita em conjunto com o público. Debord e Baudrillard também são 
utilizados para mostrar como a televisão cria espetáculos - simulacros que confundem 
real e imaginário. É quando se analisa Xuxa como promotora de consumo. A imagem 
da apresentadora na mídia passa a ser tão forte que os produtos com seu nome são 
recordes de venda. É o motivo da discussão proposta por Macneal, Linn, Steinberg e 
Kincheloe, responsáveis por defender que a infância com a qual lidamos, desde o final 
do século XX, possui características peculiares na sociedade contemporânea, tais como 
maior contato com diferentes tecnologias e influência dos efeitos da mídia. 
 No segundo capítulo (Querer é poder), apoiamo-nos em Morin, que, a partir de 
seus estudos sobre os olimpianos, esclarece a relação da celebridade com o público, em 
atos de projeção/identificação. Nessa mesma linha, Campbell diz que, “quando se torna 
modelo para a vida dos outros, a pessoa se move para uma esfera tal a ponto de se tornar 
passível de ser mitologizada”. Além desses autores, procuramos considerar as 
contribuições de Barthes no referente à semiologia, responsáveis por sugerir a 
linguagem como uma das principais atuantes na formação de um mito. 
O último capítulo (Sonho de Cristal) volta-se à construção do programa “Xou da 
Xuxa”, que estreou em meados dos anos 80, com características peculiares, desde o 
cenário às assistentes de palco, conhecidas como “Paquitas”. A partir das idéias de 
Laplantine e Trindade, discute-se o porquê da magia do universo infantil encantar tanto 
as crianças. Os autores estudam o imaginário coletivo, considerado indispensável ao 
sucesso de Xuxa, pois ela é símbolo de toda essa fantasia criada para “enfeitiçar os 
olhos” dos pequenos. 
Após expostos os conceitos descritos acima, o objetivo desta pesquisa é mostrar 
que o sucesso de uma estrela televisiva não acontece ingenuamente, como Xuxa insiste 
em transparecer ao seu público. A realidade não é nada mágica como ela faz parecer ser. 
É indispensável todo um marketing competente em torno de quem se pretende divulgar. 
Neste caso, a Rede Globo soube transformar o carisma e a beleza de Xuxa em vultosas 
cifras. Com forte apelo popular, a emissora alçou a apresentadora à condição de 
“Rainha dos Baixinhos”, desviando o olhar de setores da sociedade do passado de 
modelo sensual e atriz de filme erótico. Assim, o alto investimento dedicado ao 
programa “Xou da Xuxa” só atraiu mais atenção das famílias à apresentadora, que 
cercada de brincados e um discurso fantasioso, transformou-se em mito, apoiada por 
parte da geração de 80. 
 
 
 
1. É hora do “XOU” 
 
1.1. A menina transforma-se em “Rainha” 
 
 
 Em 27 de março de 1963, na cidade de Santa Rosa (RS), nasce Maria da Graça 
Meneghel, que ganhou este nome por ter sofrido complicações ao nascer. Assim, a mãe, 
Alda Meneghel, e o pai, Luiz Floriano, consideraram uma graça alcançada o nascimento 
da caçula, que se chamaria Morgana Sayonara, caso o parto tivesse ocorrido 
normalmente. Quanto ao apelido “Xuxa”, segundo biografia oficial (NEIVA, 2001), foi 
dado pelo irmão Bladimir Luizaldo, e, mesmo sem ter um significado especial, até hoje, 
acompanha a fama da artista. 
 
 Filha de militar, foi impelida a mudar-se para o Rio de Janeiro na década de 70, 
quando, ainda menina, já demonstrava interesse por uma carreira sob os holofotes. 
Ainda de acordo com Neiva, aos 15 anos, enquanto viajava de trem, Xuxa foi vista por 
um funcionário da Bloch Editores, que a convidou para fazer um teste de moda. Assim, 
a primeira aparição na capa de uma revista aconteceu na revista “Carinho”, popular 
publicação para adolescentes. Com 17 anos, foi eleita “Garota Pantera”, e, aos 18 anos, 
já havia sido capa de mais de 80 revistas. Então, começa a ganhar credibilidade no 
mercado fotográfico, em que as morenas estavam entre as mais bem-sucedidas do jet-set 
da moda . 
 
Ao total, no decorrer da carreira, são mais de 2.500 capas de revistas, sendo 50 
delas só no primeiro ano como modelo. Posou nua para a “Playboy” (editora Abril), 
“Status” (editora Três), “Ele e Ela” (editora Bloch), e o sucesso nas revistas aconteceu, 
principalmente, por despertar o interesse do público masculino. Em 1982, ainda fez o 
polêmico “Amor Estranho Amor”, em que interpretou uma prostituta responsável por 
seduzir um menino de 12 anos. Anos depois, quando já era conhecida 
internacionalmente, conseguiu apreender todas as cópias do vídeo disponíveis no 
mercado. Atualmente, cenas podem ser encontradas no site Youtube 
(www.youtube.com) por usuários que conseguiram adquirir, na época, o filme. Em 
1984, é contratada pela Ford Models, renomada agência de top models com sede em 
Nova York, nos Estados Unidos. 
 
 Assim, o início da carreira de Xuxa foi marcado pelo papel de modelo, com todo 
o duplo sentido implicado à beleza e juventude, que a tornou um produto de consumo 
perfeito para os padrões de consumo da sociedade contemporânea. 
 
“Quando comecei a trabalhar, não estava vendendo meu corpo, mas a minha 
imagem como modelo. Depois, decidi aprender a ser apresentadora. As 
pessoas falavam que para trabalhar com criança ou tinha de vestir roupas 
fechadas ou fazer o tipo palhacinho. Quando apareci, disseram ‘epa’ é uma 
loura que já fez Playboy. Chocou um pouco no início”. 1 
 
Contudo, antes do mega-contrato com a Ford Models, conheceu o astro de 
futebol Edson Arantes, o Pelé. Durante namoro com o jogador, os contratos 
publicitários da modelo aumentaram significativamente e, claro, os lucros, também. 
Xuxa torna-se o mais novo símbolo sexual do Brasil e aproxima-se, aos poucos, de 
diferentes oportunidades de trabalho, como participações em novelas, filmes e 
apresentação de programas infanto-juvenis. 
 
 Não é de se estranhar que, logo, Xuxa começa a atrair os olhares da mídia e de 
um público acostumado com o sucesso do Rei Pelé. Afinal, beleza e dinheiro juntos 
fazem parte do imaginário coletivo de várias civilizações. Através da beleza física, 
pode-se ter acesso a um mundo onde mitos justificam o fascínio de multidões, e a 
imagem exerce um apelo irresistível, a ponto de atrair, a reboque, fama e fortuna. Essa 
porta de entrada para as passarelas marcou o mito televisivo Xuxa, que estava a surgir. 
A modelo, loura de olhos azuis, une-se ao astro do futebol Pelé em um romance que 
mobilizou todo o País. Se levarmos em consideração o racismo brasileiro, a repressão 
da ditadura militar e a repressão sexual da qual a Igreja era partícipe, Xuxa tem um 
começo de carreira bem-sucedido. 
 
Com o sucesso atrelado à beleza, a apresentadora conseguiu conquistar atenção 
de um público diverso. Pierre Bourdieu, no livro “La distinction” (1979), mostra como a 
supervalorização da aparência feminina teve impacto até no mercado de trabalho. 
 
1 Cf.Telinha encantada. Revista Contigo, 2009, p. 9. 
 
“O fato de algumas mulheres tirarem proveito profissional de seu charme 
contribuiu, sem dúvida, para determinar outro número de mudanças nas 
normas de vestuários, cosméticos, etc, e todo um conjunto de 
transformações éticas, aliadas a uma redefiniçãoda imagem legítima da 
feminilidade: as revistas femininas e todas as instâncias em matéria da 
imagem e do uso legítimos do corpo difundem a imagem de uma mulher 
encarnada por estas profissionais do charme burocrático, racionalmente 
selecionadas e formadas, segundo uma carreira rigorosamente programada, 
com o intuito de preencher as funções femininas mais tradicionais”. 
(BOURDIEU, 1979, p. 54). 
 
 A profissão de modelo, ainda hoje, facilita o contato dessas profissionais com a 
TV, meio auto-referente, que vincula as representações sociais conhecidas do grande 
público – como é o caso das modelos – à grande mídia. Assim, o sucesso garantido pelo 
universo glamouroso da moda só aumenta as possibilidades do mercado televisivo se 
destacar. 
 
 Maurício Sherman, diretor da TV Manchete nos anos 80, decide apostar na 
carreira de Xuxa. Em 1983, estréia o programa vespertino “Clube da Criança” na 
emissora, sob direção de Marlene Mattos. A ausência de intimidade com as câmeras, 
sem falar no pouco trato com o público infantil, era evidente. Em entrevista ao 
programa “Agenda”2, Xuxa reconhece a inexperiência com o novo trabalho: “Dizem 
que eu maltratava as crianças, mas não é verdade. Eu só não as tratava como os adultos. 
Caso pisassem no meu pé, eu pisava também. Um amigo das crianças faz assim; e eu 
era amiga delas”. 
 
 Mesmo assim, o “negócio” com a artista parecia valer a pena. O carisma e o jeito 
infantil de Xuxa na TV eram considerados “impressionantes” por Sherman, que, em 
entrevista a Revista Manchete3, revelou: “A moda perdeu uma modelo fenomenal, 
contudo, o resto do mundo ganhou este fenômeno responsável por encantar crianças e 
freqüentar os sonhos de adolescentes e adultos”. Xuxa, com seu figurino, chamava 
atenção diante da realidade da época, na tentativa de assimilar algum elemento que a 
alçasse à condição de personagem. Prova disso são as botas de cano alto, as minissaias, 
as ombreiras, roupas decotadas e coloridas demais, além do jeito de falar sempre com o 
“x” em evidência e até na forma de pentear os cabelos com as populares “xuxinhas”. 
Mas, segundo a família, a apresentadora é excêntrica desde criança. “Xuxa sempre foi 
 
2 Em julho de 2006, o Programa Agenda, na emissora Globo News, transmitiu um especial com Xuxa, em 
que ela foi entrevistada. 
3 Cf.Menina dos olhos de Sherman Revista Manchete, 2001, p. 24. 
moleca. Gosta da natureza, dos bichos e adora brincar. A voz e a forma como se 
comunica lembram muito uma criança”, diz a mãe, Alda. (NEIVA, 2001, p. 28). Assim, 
é notório que o discurso da mãe da artista é uma justificativa para a personalidade 
infantil da apresentadora, que gera dúvidas quanto a sua autenticidade como “criança”. 
 
 Com tanto apelo popular – independente da faixa etária -, Xuxa recebeu um 
convite de trabalho da Rede Globo, após quase três anos na Manchete. A imprensa 
publicou a oferta global: “Por Cr$ 130 milhões, Xuxa vai para a Globo”4. O diretor da 
emissora José Bonifácio Boni de Oliveira não queria um programa infantil com o nome 
da modelo. Contudo, a apresentadora e sua diretora, Marlene Mattos, foram irredutíveis: 
ela somente se transferiria para a Globo com um programa que levasse seu nome. No 
ano seguinte, a exigência foi aceita e, então, deu-se início à produção do “Xuxalândia”, 
“Xuxa Xou” ou “Xou da Xuxa”. A última sugestão foi a escolhida, como informa ainda 
a revista Contigo já citada. 
 
Os sonhos da menina de Santa Rosa (RS) viraram realidade e, com a inserção de 
sua imagem no matinal diário “Xou da Xuxa”, ela adquire o título de “Rainha dos 
Baixinhos”, passando à condição de “garota dos cem milhões de dólares” do Brasil, 
como publica a revista Veja5, a partir do faturamento da artista com o trabalho na 
emissora. Desde a estréia global em 30 de junho de 1986, a apresentadora, conquistou 
fama em outros países como apresentadora e também estabeleceu raízes na atual 
emissora, onde já comandou diversos programas para públicos distintos. 
 
Até hoje, foram cerca de 13 programas nacionais, afora os três internacionais, na 
Argentina, Espanha e Estados Unidos. De acordo com o contrato, era obrigada a morar 
15 dias no Brasil e 15 na Argentina e a gravar uma vez por mês na Espanha. Nos 
Estados Unidos, o programa “Xuxa” foi exibido em 121 canais independentes, contudo, 
a dificuldade com a língua inglesa não lhe permitiu ficar mais de um ano no ar. Já em 
solo brasileiro, comandava um formato inovador: cenários luxuosos, figurinos 
impecáveis, investimentos em discos, filmes, produtos da marca Xuxa. E a estrela do 
“show” não eram fantoches ou personagens de desenhos animados, mas a figura 
humana de uma ex-modelo, que, agora, estava no comando. 
 
4 Cf.Xuxa deixa a Manchete pela Globo. Revista Contigo, 1986, p.11. 
5 Cf.Garota que vale dólar. Revista Veja, 1991, p. 48. 
 
 Com o “Xou da Xuxa”, a apresentadora conseguiu duplicar a audiência no 
horário. Em números significa que, em sua estréia, segundo dados da Rede Globo 
publicados também na revista Veja6, o programa alcançou 16 pontos no Rio de Janeiro e 
16 em São Paulo. Nove meses depois, a audiência aumentou: 21, 8 pontos no Rio de 
Janeiro (800 mil espectadores por dia) e 18 pontos em São Paulo (950 mil espectadores 
por dia). Tal sucesso comprova que a apresentadora foi alterando sua imagem de 
símbolo sexual, capa das revistas masculinas e atriz de filmes eróticos, passando a ser 
vista, na lógica do mercado, como uma eficiente animadora de crianças. O que facilitou 
essa transposição de símbolo sexual para personagem infantil foi a estratégia de ampliar 
o público adulto e infantil, ao invés de mera substituição de um segmento por outro. 
 
 Vale ressaltar que essa redefinição de uma imagem, já instalada num esquema 
midiático, não a fez destruir sua primeira imagem. Houve uma adaptação da primeira 
(modelo) sobre a segunda (apresentadora), criando uma terceira (modelo-
apresentadora), respaldada por parte da sociedade, que não considerava o programa 
“Xou da Xuxa” uma ameaça educacional às crianças, mas uma forma de entretê-las. 
Evidentemente, que esta mudança ocorreu devido a estratégias da direção da Rede 
Globo, capitaneada por Boni e a equipe comandada por Marlene Mattos. Contudo, é 
categórica a existência de todo um segmento social que critica fortemente a influência 
de Xuxa no cotidiano das crianças. 
 
 Quanto ao passado da artista como atriz de filmes eróticos e modelo para fotos 
sensuais, a Rede Globo fez questão de escondê-lo. Neiva diz que o contrato com a 
emissora foi assinado em março de 1986, mas a estréia aconteceu apenas em junho, pois 
a direção geral preferiu “limpar a imagem” da artista. Não no sentido de ocultar, de vez, 
sua sensualidade, mas de evitar ligação da artista com trabalhos não relacionados ao 
universo infantil. Ou seja, Xuxa continuou utilizando a beleza como forma de manter o 
público adulto, mas estava rodeada de elementos (cenário, brinquedos, músicas) que a 
desvinculariam da imagem de mulher para a de menina, ainda que guardando sempre 
certa ambigüidade nesta representação. 
 
 
6 Cf.Xou lidera audiência. Revista Veja, 1988, p.38. 
No que diz respeito ao trabalho executado pela equipe do programa, a grande 
estratégia foi jamais negar o passado de modelo, mas, sim, apresentá-lo o mais natural 
possível, quase com a inocência infantil de quem já havia crescido. 
 
“Nunca fiz pornografia. Fiz, quando tinha 18 anos, nus artísticos. Foi na 
época do Pelé. Essas fotos apareceram em três revistas. Não me arrependo 
de nada; não vendi meu corpo e, sim, minha imagem. Não apareci 
completamente nua. Isso é comum nas praias do Brasil, sem falar que ficar 
nua é um hábito que herdei dos meus pais. Sempre que podia ficava bem à 
vontade”7. 
 
 
1.2. “Xou da Xuxa”: Oespetáculo projetado pela televisão no Brasil 
 
“Afinal, desde que foi lançado, em 1986, o “Xou” transformou-se num dos 
maiores fenômenos da história da televisão, e Xuxa, ídolo maior e porta-voz 
dos pequenos. Para as mães que trabalhavam fora e saem cedinho de casa, 
ela é a babá ideal: distrai, diverte e mantém as crianças longe das 
travessuras. Para os próprios “baixinhos”, é a titia que fala a mesma 
linguagem deles, a irmã mais velha que brinca e não os esnoba, a garota 
bonita que libera neles a sexualidade, muitas vezes reprimida em suas casas 
(...) A fixação na gauchinha loura é tanta que, nos dois anos que o programa 
está no ar, verificou-se uma queda de trinta por cento nas matrículas de 
alunos de pré-escola e do primeiro grau, nas escolas das principais cidades 
brasileiras”. 8 
 
 
A Escola de Frankfurt concebia a indústria cultural como determinante para o 
consumo. No livro “Dialética do Esclarecimento” (1940), Max Horkheimer e Theodor 
Adorno defendem que o desenvolvimento da comunicação de massa teve um impacto 
fundamental sobre a natureza da cultura e da ideologia nas sociedades modernas. Na 
concepção deles, a análise da ideologia não pode mais se limitar ao estudo das doutrinas 
políticas, mas deve ser ampliada para abranger as diferentes formas simbólicas que 
circulam no mundo social, ou seja, a estruturação das relações na sociedade, a forma 
como se produz e se intensifica a massificação do indivíduo. Não obstante, a cultura é o 
instrumento que desenvolve e assegura formas de controle das concepções sociais e das 
ideologias estruturadas na sociedade capitalista. A Indústria Cultural forma um sistema 
poderoso, que inclui os meios de comunicação, responsáveis por exercer, na visão dos 
autores, manipulação e controle social ao promover a mercantilização da cultura. Os 
produtos da Indústria Cultural, em geral, privilegiam a demanda do mercado, não 
havendo uma preocupação exata com o conteúdo. 
 
7 Cf.Xuxa revela intimidade.Revista Amiga, 1991, p. 8-11. 
8 Cf.Amiga Xuxa.Revista Contigo, 1988, p.26 e 27. 
“A indústria cultural pode se ufanar de ter levado a cabo com energia e de 
ter erigido em princípio a transferência, muitas vezes desajeitada, da arte 
para a esfera do consumo, de ter despido a diversão de suas ingenuidades 
inoportunas e ter aperfeiçoado o feitio das mercadorias”. (ADORNO; 
HORKHEIMER, 1997, p. 126). 
 
Muito mais do que outros bens da indústria tradicional, o produto cultural deve 
ser atraente, criar empatia com o público, ou não vende. A exemplo um astro de 
televisão: quando ele é aceito pelo público como personagem/herói de uma novela, é 
porque demonstrou profissionalismo, além de carisma, aos telespectadores. Assim, 
torna-se um produto que aumenta a audiência e gera lucros, estando apoiado em uma 
estrutura de marketing que dá suporte à construção da sua imagem junto ao público. Por 
isso, é conveniente, ceder-lhe espaço em programas de auditório, dando entrevistas a 
jornais e revistas, por exemplo. 
 
Horkheimer e Adorno afirmam que o indivíduo deixa de decidir por si e passa a 
seguir valores impostos pela mídia em padrões repetidos, vez ou outra. “O homem se 
encontra em uma sociedade que o manipula a seu bel-prazer: o consumidor não é 
soberano, como a indústria cultural queria fazer crer, não é seu sujeito, mas seu objeto”. 
(idem, p.74). O público, aqui, seria, portanto, visto como um ser passivo, capaz de 
absorver as indicações midiáticas sem maior criticidade, idéia contradita por Arlindo 
Machado (2005). 
 
Mesmo sabendo as condições de produção a que são submetidos os programas 
televisivos, Machado considera a TV, dentre as mídias, a que melhor representa os 
anseios populares por, ao apelar para imagem, retratar o cotidiano de forma mais 
palpável, próxima ao real. A seleção do conteúdo, por exemplo, passa pelos 
responsáveis do programa e, conforme os interesses da emissora, permite-se, ou não, a 
sua exibição. Assim, o autor evita observar pelo ângulo mercadológico e quantitativo os 
efeitos provocados pela tevê na sociedade e, por isso, argumenta que o conteúdo deve 
ser real objeto especial de análise. Enquanto a abordagem com foco na Indústria 
Cultural analisa a relação entre mídia-audiência, Arlindo Machado destaca o modo 
como se dá o processo de produção dos conteúdos televisivos. “Não há nada de errado 
nessas abordagens, a não ser o fato de que elas mobilizam todo um arsenal de recursos 
analíticos, mas deixam de lado o mais importante, que é o exame efetivo do que a 
televisão produziu nesses 50 anos”. (2005, p.16). 
Vale destacar que Xuxa, nos anos 80, mais que cumprir o papel de uma estrela 
de tevê ganhou a função de “babá eletrônica” da geração que estava chegando. O 
contexto da época é de pós-ditadura, quando estouraram símbolos da música pop, como 
Madonna e Michael Jackson, e os brasileiros Blitz, Barão Vermelho, Paralamas do 
Sucesso, Legião Urbana, Ira!, Kid Abelha, Titãs, RPM, etc. O sentimento de liberdade 
permitia ousadia no pensar, agir e vestir. 
 
Como Arlindo Machado sugere, evidente que há interesses mercadológicos na 
construção de um conteúdo da mídia, como no caso do “Xou da Xuxa”. Conquistar o 
público e, ao mesmo tempo, estender a programação a diferentes idades é uma 
estratégia que depende, principalmente, da receptividade do público. Então, a influência 
das mensagens transmitidas pela apresentadora existe, como ressaltam Adorno e 
Horkheimer, através da padronização da linguagem, do conteúdo e do apelo às 
necessidades desse público. Porém, o sucesso definitivo provém da escolha por 
determinada programação, o que resulta de uma hegemonia estabelecida a partir de 
determinados padrões estéticos. 
 
Além disso, o sucesso nacional e internacional de Xuxa está atrelado à posição 
de liderança da Rede Globo na audiência televisiva do País. Segundo o site “Tudo sobre 
TV – História da Televisão no Brasil”9, de 1985/1986, há 26 milhões e 500 mil 
aparelhos, em P&B e em cores. A Rede Globo era a quarta maior rede de televisão 
comercial do mundo, superada apenas pelas norte-americanas BBS, ABC e NBC, 
cobrindo 98% do território nacional, com 70% de audiência. 
 
Ainda, em meados dos anos 80, a cobertura das outras emissoras (SBT, 
Bandeirantes e Record) era reduzida a poucos estados, ou seja, como Xuxa pertencia à 
Globo, que, dentre as estações de tevê, tinha maior alcance, é notória a facilidade em ser 
acolhida nacionalmente. “Poucas redes de televisão comercial, como a TV Globo e a 
Bandeirantes, tinham cobertura nacional e expressividade aonde chegavam”. (SANTOS 
& SILVEIRA, 2001, p. 76). 
 
 
9 Acesso, no dia 14/10/09, ao site www.tudosobretv.com.br, que contém a história da televisão no Brasil. 
Com poucos programas voltados a uma faixa etária infantil, que crescia 
progressivamente em relação aos anos anteriores, 60 e 70, uma fórmula que atraísse o 
público era essencial. E encontrar alguém para desempenhar esse papel foi o início de 
todo o processo, pois, com o cotidiano cada vez mais acelerado dos pais, uma 
companhia “virtual” para as crianças funcionaria como “substituição familiar”. Nos 
anos 80, a inserção da mulher no mercado de trabalho é apontada como uma das 
principais transformações econômicas da época, reduzindo o tempo da mãe com os 
filhos, como Maria Isabel Baltar da Rocha (2000) explica no livro “Trabalho e Gênero: 
Mudanças, Permanências e Desafio”. 
 
“A partir da década de 1970, intensificou-se a participação das mulheres na 
atividade econômica em um contexto de expansão da economia com 
acelerado processo de industrialização e urbanização. Prosseguiu na década 
de 1980, apesar da estagnação da atividade econômica e da deterioração das 
oportunidades de ocupação”. (ROCHA, 2000, p.24). 
 
Ao fim da década de 80, a programação da tevê brasileira contava com atraçõessem as características do “Xou da Xuxa”, que podem ser resumidas no alto investimento 
da emissora no programa. Exemplo: Turma do Balão Mágico (1983-1986; TV Globo; 
antecedeu o “Xou”), Oradukapeta (1987-1990; SBT), Clube da Criança (1986-1998; 
Manchete); Bambalalão (1977-1990; TV Cultura), Bozo (1979-1991; Record e SBT), e 
conteúdos da Rede Bandeirantes (Turma da Fofura, TV Tutti Fruti, Topo Gigio; Turma 
do Lambe-Lambe), entre outros. 
 
Dentre as principais diferenças entre o “Xou” e o “Clube da Criança”, estão o 
horário (manhã) e o advento de Xuxa como figura principal da atração. O horário na TV 
Globo deveu-se a uma substituição de atrações. Antes da estréia de Xuxa, Simony, 
Jairzinho e Michael comandavam o Balão Mágico. Os três contracenavam com o 
boneco Fofão, parecido com um cachorro de bochechas salientes. Entretanto, como 
Neiva revela, a Globo pretendia incrementar a audiência nas manhãs, geralmente 
destinadas às donas de casa, como é o caso da “TV Mulher” (1980-1986). 
 
O marketing competente do ponto de vista mercadológico, as condições 
sociológicas da época – pós-ditadura; inserção da mulher no mercado de trabalho - e o 
profissionalismo de quem o comandava, mostram como o “Xou da Xuxa” possibilitou o 
surgimento de Xuxa como um fenômeno midiático. Um ambiente repleto de brinquedos 
e envolto pela fantasia não tinha como deixar de atrair públicos de todas as idades. 
Dessa forma, o conteúdo do programa, além da audiência, buscava colocar quem o 
assistia em um plano diferente: o “planeta Xuxa”, onde praticamente tudo seria possível, 
e a fantasia faz parte do dia-a-dia. 
 
1.3. Auditório como contemplador do circo 
 
 
 Depois que aterrissa, a porta da nave rosa repentinamente abre. De lá, sai uma 
apresentadora loura, de pele branca, olhos azuis e um sorriso sempre aberto. É assim a 
mulher de 23 anos escolhida para figurar a grade da Rede Globo por quatro horas matinais 
de segunda-feira a sábado de 1986 a 1992. Com nome fácil de ser pronunciado até mesmo 
pelos bebês, Xuxa entregou-se ao formato do programa e seguia à risca as orientações da 
diretora, Marlene Mattos. 
 
 Dirige-se ao público com uma voz infantilizada. Aprendeu a se portar frente às 
câmeras, a conduzir a seqüência da atração, a maneira cúmplice de se dirigir aos olhos 
atentos a cada palavra que profere, mantendo o domínio da situação. Foi preparada meses 
antes de ir ao ar no dia 30 de junho de 1986, quando se iniciam as férias colegiais, como 
afirma Neiva. Xuxa estava a par de todos os detalhes do seu “Xou” e, juntamente com 
uma equipe profissional e numerosa, alavancou o próprio sucesso e o da emissora. De 
fato, uma brincadeira séria que movimentou bilhões de dólares. 
 
Na estréia do “Xou da Xuxa”, a apresentadora disse: “para aqueles que não 
acreditavam que um dia estaria aqui, bom dia!”. Talvez, um certo ressentimento quanto 
às críticas recebidas enquanto esteve na Manchete, e uma valorização de sua imagem, 
que obteve um salto incrível na troca de emissoras. 
 
 No programa, a margem de erro teria de ser mínima. Por outro lado, a 
identificação da apresentadora com o público deveria ser máxima. Xuxa passou a 
representar o novo modelo de se relacionar com as crianças na televisão brasileira. Além 
das brincadeiras e desenhos animados, o programa tinha no comando uma ex-modelo 
alçada à estrela de TV, representada nas mais diversas formas de consumo, como 
cadernos, sandálias, bonecas, entre outros. 
 Machado aponta o diálogo como fundamental para o sucesso de um programa na 
televisão. Segundo ele, a interatividade gera uma possibilidade maior de discursos que 
podem ser trabalhados, contribuindo para um melhor desempenho da programação e da 
relação produção-público. 
 
“Essa disponibilidade para o discurso oral, de um lado, desviou a televisão 
para a facilidade, a comodidade e a banalidade dos ‘talk shows’, em geral 
voltados para a celebração das próprias estrelas (...). Mas, de outro lado, 
favoreceu o ressurgimento na televisão de formas discursivas muito antigas 
e vitais, formas que estão na raiz mais profunda de toda a nossa cultura: 
aquelas que se fundam no diálogo”. (MACHADO, 2005, p.73). 
 
 A trajetória de Xuxa é um perfeito exemplo de como a televisão tem o poder de 
transformar a realidade de quem passa por ela. Fama, publicidade, mercado, 
comportamento, imagem, sexualização precoce, infantilização e exposição de 
privacidade são elementos que costuram a anatomia de um dos fenômenos 
comunicacionais mais significativos das últimas décadas. E graças à imponência cedida 
pelos filtros da tevê a quem nela aparece, Xuxa conseguiu conquistar o título de 
“Rainha dos Baixinhos”, com o cuidado de, ao mesmo tempo, ser considerada mito por 
quem a assistia. De acordo com Guy Debord (1967), as transmissões feitas pela TV são 
vistas pelo telespectador como um espetáculo à parte, “uma dimensão 
reconhecidamente irreal e ilusória de que a vida é menos o que se leva nas esferas 
cotidianas”. Ele denomina a atual sociedade como “sociedade do espetáculo”, suscetível 
aos resultados da mídia. 
 
“No espetáculo, uma parte do mundo se representa diante do mundo e lhe é 
superior. O espetáculo nada mais é que a linguagem comum dessa 
separação. O que liga os espectadores é uma ligação irreversível com o 
próprio centro que os mantém isolados. O espetáculo reúne o separado, mas 
o reúne como separado”. (DEBORD, 1967, p.23). 
 
 Assistir ao “Xou” significava estar próximo à artista. Era a prova de que a fuga 
do cotidiano é possível, que crescer não depende mais da lei natural do homem. Foi esse 
o motivo da apresentadora cunhar os termos “baixinho” e “altinho”, que, agora, não 
estavam mais relacionados à maturidade biológica e, sim, à disponibilidade e interesse 
em travar um contato mais íntimo com Xuxa. Com batom vermelho, saia e botas, a 
infância não era mais a mesma. Assim, em muitas famílias, ser “sexy” e “baixinha” 
estava longe de ser vista como uma ameaça aos costumes. O mesmo acontecia com os 
“altinhos”: a maturidade biológica já os alcançou, contudo, mantiveram os laços com a 
apresentadora. Se Xuxa era a “Rainha” e tinha um comportamento de “baixinha” – 
apesar de não ser – e, como tal, ainda pegava emprestada a sensualidade do mundo dos 
adultos, não há motivos para as outras crianças ficarem de fora da “brincadeira”, afinal 
os tempos mudam. Novamente, é importante lembrar que a imagem mercadológica de 
Xuxa, vendida como sensual na mídia, foi bastante criticada no meio acadêmico. Dessa 
forma, era clara a divisão dos segmentos prós e contras à presença da apresentadora 
numa programação destinada às crianças. 
 
 Dentre os papéis representados pela televisão, está o de (in)formar quem a 
assume como parte do cotidiano. É inegável que, mesmo com valores sociais a serem 
respeitados, a tevê garante acesso livre onde há resquícios de repressão velada. Ao se 
utilizar do entretenimento, a televisão torna o ar “mais respirável” e gera esquemas mais 
sutis de padrões de comportamento social. É como se a fantasia realmente pudesse vir a 
se tornar realidade. 
 
 Segundo Baudrillard (1981), o hiper-real explicitado pela TV é um simulacro, 
em que as representações assumem formas nítidas de referência, mas, ao mesmo tempo, 
pobres em anteparos conscientes. Os simulacros e suas simulações de uma realidade 
construída, alternativa - e, portanto apreendida segundo certos padrões adotados pela 
sociedade – e os meios de comunicação de massa agem como holofotes hiper-reais, 
criadores de um universo paralelo. Baudrillard afirma que vivemos em constante estado 
de aceitação às regras sociais impostas por uma minoria detentora dos meios de 
produção, difusão midiática, economia, legislação, formas de ensino, etc e, por isso, a 
televisão tem o potencial de deturpar o cotidiano, transformando o real em simples 
imagens, motivações eficientes de um “comportamento hipnótico”.Através do carisma e capacidade de expressão na tevê, Xuxa gera esse 
comportamento hipnótico no show business. Para tanto, uma sandália, o clip de uma 
música até uma declaração em uma entrevista, despertam o interesse de quem se 
permite a essa experiência de “parecer-se com” ela. 
 
 Muniz Sodré também entende que a tevê opera a partir de simulacros, que 
segundo ele, é uma realidade idealizada, algo que se afirma como existente. Aqui, o 
parecer com o real motiva o interesse do público por uma programação e, 
conseqüentemente, torna-se referência maior em relação ao que deve ser vivido. O autor 
prossegue com a idéia de que a tevê, ao fundir imaginário e realidade, cria um espaço 
“próprio, simulado e surreal”. É como se o indivíduo tivesse a sensação de estar se 
aproximando dos mitos que povoam o dia-a-dia e, simultaneamente, indo ao encontro 
de si, no que deseja para sua realidade. “Sem a necessidade de uma realidade externa 
para validar a si mesmo enquanto imagem, o simulacro é, ao mesmo tempo, imaginário 
e real, ou melhor, é o apagamento da diferença entre real e imaginário – entre o 
verdadeiro e o falso”. (1984, p.29). 
 
 Xuxa é apenas mais um personagem no qual são depositados os anseios e as 
esperanças de quem a “seguiu” nos anos 80. O jeito de falar, agir e vestir gerou 
identificação com o público infantil. “Altinhos” e “baixinhos” confiavam à Xuxa o 
resgate da felicidade, demonstrada no delicado jeito de acreditar na concretização dos 
sonhos. No “Planeta Xuxa”, tudo é possível, principalmente quando se tem como “fada 
madrinha” uma loura de olhos azuis que “espalha bondade” por onde passa. As frases 
ligadas à artista, como “Tudo pode ser, só basta acreditar” e “Querer, poder e 
conseguir”, reforçam essa imagem positiva de Xuxa. Assim, fica difícil não se deixar 
encantar. A televisão funciona como uma saída à carência, afinal atua como 
companheira nos momentos de solidão. 
 
“O espelho estendido pela teleorganização – e no qual o indivíduo é 
instalado a se reconhecer – difrata continuamente simulacros, prontos a 
exibir tecnoestrutura como único modelo com o qual cada um pode 
identificar-se para bem existir socialmente, mas prontos também a esvaziar o 
indivíduo de seus próprios modelos e imagens autônomas. Para tal sistema, é 
preciso ficcionalizar o real” (idem, p.67). 
 
 
1.4. Xuxa como agente promotora do consumo 
 
 
 Logo de manhã cedo, ao ligar a televisão, crianças de todo o Brasil assistiam ao 
“Xou” e comiam guloseimas da Xuxa enquanto recebiam a enxurrada de anúncios da 
sua marca. Na hora do almoço, mais alimentos da marca Xuxa e, na ida ao colégio, uma 
verdadeira miscelânea de acessórios, como relógios e bijuterias, material escolar, 
cadernos, pastas, lancheiras... Na volta da escola, os mesmos pequenos escutam um 
disco com as músicas do “Xou”, divertem-se com brinquedos da apresentadora, tomam 
banho com produtos Xuxa e se preparam para ver, em vídeo, um dos filmes da “loura” 
ou mesmo ler a revistinha em quadrinhos lançada por ela. Para tudo começar novamente 
no dia seguinte e, ao fim de semana, irem a um show num grande estádio ou casa de 
espetáculo. 
 
 Com tamanho sucesso, não tinha como Xuxa, aos 23 anos, reclamar da carreira. 
Tudo o que levava seu nome passou a ser consumido freneticamente pelos fãs: 
sandálias, bonecas, camisetas, bicicletas, iogurtes, chicletes... Segundo Neiva, um ano 
depois da estréia global, Xuxa e sua diretora, Marlene Mattos, criaram a empresa 
“Beijinho, Beijinho” para cuidar do licenciamento da marca da apresentadora. A 
empresa gaúcha “Grendene” teve cerca de 50 produtos licenciados, e a marca Xuxa 
vendeu mais de 15 milhões de pares. Também, já foram vendidas mais de um milhão de 
bonecas na América do Sul e 35 milhões de revistinhas. Tudo isto em seis anos de “Xou 
da Xuxa”. A Xuxa Produções, criada em 1982 num esquema bem familiar, foi a 
empresa responsável por tudo o que se relacionava ao nome dela. Dentre as empresas 
que formavam o conglomerado Xuxa, a grife de roupas “Bicho Comeu”, a de 
adolescentes “PQT”, a Fazenda MG Meneghel de agropecuária, uma escola de modelos, 
uma vídeo-locadora, uma produtora e uma agência de turismo, a Xuxatur. 
 
 Ainda segundo biografia oficial, a apresentadora recebia em média 10 mil cartas 
por dia. Por isso, quando a “Som Livre”, gravadora da Globo, lançou o disco “Xou da 
Xuxa” (1986) já era esperado um recorde de vendas. Foram mais de dois milhões de 
cópias, o que a fez desbancar o cantor Roberto Carlos. O “Xou da Xuxa 2” (1987) 
vendeu mais de 2,6 milhões de cópias, o Karaokê da Xuxa (1987) e o disco “Xou da 
Xuxa 3” (1988), alavancado pelo sucesso da música Ilariê, chegou a 3,3 milhões de 
cópias, sendo repercutido no “Guiness Book”, o livro dos recordes, devido ao triplo de 
diamante. Logo depois, veio “O Carnaval dos Baixinhos” (1989), a trilha sonora de 
“Super Xuxa contra o Baixo Astral” (1989), “4º Xou da Xuxa” (1989), “Xuxa” (1989 – 
disco em espanhol que vendeu um milhão de cópias nos Estados Unidos e Porto Rico), 
“Paradão dos Baixinhos” (1990), “Xuxa 5” (1990 – um milhão de cópias vendidas), 
“Xou da Xuxa 7” (1992), “Xuxa em Espanhol 2” (1991 – 600 mil cópias), “Xou da 
Xuxa 7” (1992) e “Xuxa em Espanhol” (1992). Os números surpreenderam, posto que 
muitas críticas relativas à voz de Xuxa são até hoje feitas e, inclusive, bem aceitas pela 
própria apresentadora, que já declarou em entrevistas considerar sua voz “chatinha” e 
“infantil”. 
 
 Mesmo sem formação de atriz, protagonizou, na época do “Xou”, quatro filmes 
voltados para o público infanto-juvenil. “Super Xuxa contra o Baixo Astral” (BRA, 
1988, aventura, dirigido por Anna Penido e David Sonneschein), “A Princesa Xuxa e os 
Trapalhões” (BRA, 1989, aventura, dirigido Por José Alvarenga Jr.), “Lua de Cristal” 
(BRA, 1990, comédia, dirigido por Tizuka Yamaki – 5,5 milhões de espectadores) e o 
 “Mistério de Hobin Hood” (BRA, 1990, aventura, dirigido por José Alvarenga Jr.). 
Essa presença contínua na mídia mostra como a produção de Xuxa assume a 
característica sistêmica da Indústria Cultural. 
 
 O sucesso categórico nas vendagens desses produtos foi estrategicamente 
calculado. Gradativamente, Xuxa passou a interferir no cotidiano das crianças, que, 
quando saíam de frente da TV, após o término do programa, recorriam à imagem da 
artista em outras formas de representação. E não precisava ser o melhor filme ou o 
álbum de músicas mais vendido. A figura de Xuxa no mercado publicitário era tão forte 
que conseguiu superar conceitos como os de “bom e ruim”. Quem a “comprava” queria 
tê-la ao lado como companhia. 
 
 Baudrillard, em sua obra “A sociedade de consumo” (1995), afirma que o 
consumo constitui um universo de significação capaz de modelar as práticas cotidianas. 
 
“O consumo é um sistema que assegura a ordenação dos signos e a interação 
do grupo. Ele é, ao mesmo tempo, uma moral (um sistema de valores 
ideológicos) e um sistema de comunicação, uma estrutura de troca. Segundo 
esta hipótese, o consumo se define como exclusivo do gozo. Como lógica 
social, o sistema de consumo se institui sobre a negação do gozo. Ora, o 
consumo nunca é isto. Nós gozamos para nós, mas quando consumimos 
nunca o fazemos sozinhos, entramos num sistema generalizado de trocas e 
de produção de valores codificados, onde, a despeito deles mesmos, todos os 
consumidores estão implicados reciprocamente. Neste sentido, o consumo é 
uma ordem de significados”. (BAUDRILLARD, 1995, p.109 e 110). 
 
 
 Neste sentido, o mercado é fonte de autoridade, possuindo poder para 
reconhecer a validade das ações individuais. Maria da Graça Meneghel atuou como uma 
agente promotora do consumo, tanto do produto cultural Xuxa, como de todos os 
produtos e serviços com seu nome, pelo fato de estar na TV durante seis dias na 
semana, por quatro horas, tempo suficiente para despertar o desejo de quem a assistia. 
Vale ressaltar que,além do consumo material, Xuxa foi responsável pela disseminação 
de um discurso carregado de valores incrustados, como acreditar no sonho, proteger a 
natureza, fazer o que se gosta, entre outros. 
 
 Na mesma linha de Baudrillard, o sociólogo Gilberto Felisberto Vasconcellos 
ressalta que Xuxa não deve ser encarada isoladamente. Segundo ele, a artista é um 
produto organicamente conectado com o desenvolvimento da televisão, uma espécie de 
termômetro da cultura midiática das últimas décadas do século XX. Ele compara os 
programas de auditório da apresentadora a um “cabaré”, entendido não apenas como 
“metáfora da ausência de pudor Xuxa”, mas como um espaço de diversão que supera a 
casa, a família e o sistema educacional. E, neste espaço, Xuxa teria um papel no processo 
de dissolução da infância. “É curioso observar como essa infantilização do adulto se faz 
acompanhar de uma adultização compulsiva da garotada, sobretudo por eliminar qualquer 
vaga de ‘latência’ do desenvolvimento infantil”. (VASCONCELLOS, 1998, p.145-146). 
 
 Xuxa era a pessoa certa na hora certa: o sucesso da apresentadora em seu 
programa de televisão ocorreu num momento em que as empresas brasileiras iniciavam a 
copiar o modelo americano de fabricação de produtos para crianças com o uso de 
personagens da ficção e estrelas do mundo artístico-esportivo. 
 
 Para McNeal, no livro “Kids as customers” (1992), o “mercado primário” é 
formado pelas crianças que já possuem seu dinheiro e, mais importante, seus próprios 
desejos e necessidades, recebendo dos pais a permissão de gastar. Com base em pesquisas 
gerais, este mercado comporta produtos voltados especificamente para o universo dos 
pequenos consumidores, como brinquedos e utensílios infantis. Já o “mercado 
influenciador” é maior que o primário, pois diz respeito aos pedidos e sugestões das 
crianças nos hábitos de consumo de terceiros – especificamente pais e responsáveis – na 
escolha de viagens de férias, restaurantes, hotéis e sabores de alimentos. O último 
mercado é o “futuro”, o de maior potencial dos três, uma vez que abarca o consumo em 
potencial de todos os produtos do mercado a longo prazo. 
 
 Outra teoria de McNeal, presente no mesmo livro, comenta os diferentes 
estágios pelos quais as crianças passam quando desenvolvem suas aptidões com 
consumidores. Numa primeira etapa, são levadas pelos pais, desde a mais tenra idade, 
para fazer compras, quando começam a incorporar, por observação, os padrões 
transmitidos. Numa segunda fase, a partir dos dois anos de idade, a criança passa a fazer 
conexões entre o que viu em anúncios e o que está disponível nas lojas e nos 
supermercados, quando surgem os primeiros pedidos por parte dos pequenos. O terceiro 
estágio acontece a partir dos três ou quatro anos, quando a criança não se manifesta 
apenas através de pedidos, como na fase anterior, mas apontando ativamente o que deseja 
nas prateleiras das lojas e dos supermercados. Na etapa seguinte, a criança enfrenta uma 
atividade mais difícil que consiste em conciliar seu entendimento do valor da moeda com 
a necessidade de adquirir um produto independentemente, através de um pedido dos 
responsáveis que a acompanham. Por fim, entre os cinco e sete anos, a criança está em sua 
última fase, referente a compras individuais para satisfazer o desejo próprio ou dos pais. 
 
 Por isto, fala-se em mercado primário, no caso dos bebês como consumidores. 
Claro que é preciso argumentar que são os pais os responsáveis pelas compras, pois os 
bebês ainda não pedem por elas. Mas pesquisas indicam, como garante Linn (2006), que, 
ao aprenderem a falar, os bebês já sabem pedir marcas que querem. Isso sugere, por 
exemplo, que a criança, ainda bem pequena, desenvolva pensamentos positivos sobre 
logotipos e personagens licenciados mesmo antes de aprender corretamente as palavras 
necessárias para pedir os produtos associados a eles. 
 
“Como qualquer pai pode atestar, mesmo antes de uma criança possuir uma 
linguagem, um pequeno dedo apontando para determinado lugar, 
acompanhado por ruídos excitados é suficiente para indicar: ‘eu quero isso’. 
Através da venda de lençóis de berço, móbiles e brinquedos, os marketeiros 
estão fazendo o que podem para que os bebês reconheçam e requisitem 
produtos” (LINN, 2006, p. 42-43). 
 
 Crianças em idade pré-escolar, até a faixa dos oito anos, têm dificuldade em 
diferenciar entre os comerciais e a programação regular dos canais de televisão. Um 
pouco mais velhas, tendem a fazer essa distinção, mas acreditam na veracidade do que 
assistem nos anúncios. Foi o que aconteceu com a apresentadora Xuxa e lhe rendeu 
dores de cabeça devido à interferência do Conselho Nacional de Autoregulamentação 
Publicitária (Conar). A apresentadora “esqueceu” que as crianças costumam levar, “ao 
pé da letra”, o que é dito a elas. Na propaganda, crianças de todo o País destruíam seus 
tênis para ganhar dos pais o novo “Tênis da Xuxa”. Depois de reclamações dos pais ao 
Conar, o anúncio saiu do ar. 
 
 
“Xuxa anda mesmo sem sorte no Brasil. Agora, anda pisando em ovos por 
causa do anúncio do tênis que leva o seu nome. Os órgãos de proteção do 
consumidor estão dando ‘um chega pra lá’ na Rainha dos Baixinhos por 
causa de um anúncio em que as crianças estragavam de propósito os seus 
calçados para os pais comprarem um novo ‘Tênis da Xuxa”10. 
 
 Steinberg e Kincheloe (2004) afirmam que a infância com a qual lidamos desde 
o final do século XX possui características peculiares na sociedade contemporânea. 
Aqui, escola e família unem-se a diferentes mídias na socialização das crianças. Com o 
advento dos meios de comunicação em massa, os pequenos garantiram acesso ao mundo 
secreto dos adultos, onde os segredos vão sendo revelados com o tempo. O mundo 
assiste à valorização da individualidade e à saciedade momentânea a partir da absorção 
de imagens e conceitos em um ambiento particular e restrito. As tecnologias ajudaram 
nessa ênfase ao mundo individual e, conseqüentemente, na despolitização da sociedade. 
Portanto, o mundo globalizado afasta a idéia de heterogeneidade social, aproximando as 
distâncias e uniformizando as identidades dos grupos sociais. 
 
“A cultura popular provê as crianças com intensas experiências emocionais 
muitas vezes inigualáveis em qualquer outra fase de suas vidas. Não é de 
surpreender que semelhante energia e intensidade exerçam poderosa 
influência na autodefinição, nas formas que as crianças escolhem para 
organizar suas vidas”. (STEINBERG; KINCHELOE, 2004, p. 20 e 21). 
 
 
 Com a existência do “Xou”, necessidades inéditas foram criadas, possibilitando 
o surgimento de uma estrela que influenciaria a cultura e a economia do País. No 
exterior, Madonna, Michael Jackson, o cinema americano, cristalizaram da cultura 
estrangeira, molde a ser reproduzido em todo o planeta. Assim, a indústria do 
entretenimento transformou necessidades práticas e cotidianas das pessoas em pequenas 
fatias do irreal e do imaginário. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 Cf.Xuxa se mete em confusão.Revista Amiga, 1992, p.7. 
2. Querer é poder 
 
2.1. A figura olimpiana de Xuxa 
 
 
 Segundo a Enciclopédia Ilustrada do Conhecimento Essencial Reader’s Digest 
(1998), o Monte Olimpo é uma montanha com 2.917 metros de altura, localizada ao 
norte da Grécia, entre as regiões da Tessália e da Macedônia. De acordo com a 
mitologia grega, o Olimpo era a residência oficial dos deuses, conhecidos como 
olímpicos. A entrada do monte era feita por um portão de nuvens, protegidos por 
deusas. Lá dentro, dezenas de deuses deliciavam-se com néctar e ambrosia, enquanto as 
musas tocavam, dançavam e recitavam para eles. 
 
 Inspirado nos deuses olímpicos da Grécia Antiga, Edgar Morin propôs o 
conceito “olimpiano” para definir as celebridades do século XX, ídolos içados à 
condição de “deuses” por servirem de modeloàs pessoas comuns. Mais uma vez, 
observa-se o conceito de mito como referência a ser seguida: 
 
“Os olimpianos, por meio de sua dupla natureza, divina e humana, efetuam a 
circulação permanente entre o mundo da projeção e o mundo da 
identificação (...). Eles realizam os fantasmas que os mortais não podem 
realizar, mas chamam os mortais para realizar o imaginário (...) Conjugando 
a vida quotidiana e a vida olimpiana, os olimpianos se tornam (...) modelos 
de vida. São heróis modelos. Encarnam mitos de auto-realização da vida 
privada (...) são os grandes modelos que trazem a cultura de massa”. 
(MORIN, 1997, p. 107). 
 
Apesar de a maioria dos exemplos de olimpianos, na obra de Morin, estarem 
ligados às estrelas do cinema, o próprio autor ressalta que o conceito também vale para 
campeões, príncipes, reis, artistas célebres, etc. Vale ressaltar que o estudo analisa o 
panorama da cultura de massa no início da década de 60, época na qual o livro foi 
escrito. É fácil observar que, hoje, neste início de século XXI, esse processo está bem 
mais intenso. 
 
Segundo Morin, a imprensa, o rádio e a televisão informam “sem cessar” sobre a 
vida dos olimpianos, seja essa vida “privada, verídica ou fictícia”: 
 
“Eles vivem de amores, de festivais, de viagens. Sua existência está livre da 
necessidade. Ela se efetiva no prazer e no jogo (...). Até mesmo seu trabalho 
é uma espécie de divertimento, voltado à glorificação da sua própria imagem 
(...) Esses olimpianos propõem o modelo ideal da vida de lazer (...) Vivem 
segundo a ética da felicidade e do prazer, do jogo e do espetáculo. Essa 
exaltação simultânea da vida privada, do espetáculo, do jogo é aquela 
mesma do lazer, e aquela mesma da cultura de massa”. (idem, p.75). 
 
 
Morin esclarece que, a partir do surgimento da cultura de massas, as estrelas de 
cinema já haviam sido promovidas a divindades, mas, com o passar do tempo, ficaram 
mais próximas do público. De acordo com o autor, os olimpianos, vez ou outra, 
assumem uma postura mais humana, o que os impede de se tornarem verdadeiros 
deuses. Contudo, ficam fortalecidos como modelos de identificação. 
 
“Não há verdadeiros deuses: heróis e semi-deuses participam da existência 
empírica, enferma e mortal (...) não há grande arrebatamento mitológico, 
como nas religiões ou nas epopéias, mas um desdobramento ao nível da 
terra. O Olimpo moderno se situa, além da estética, mas não ainda na 
religião (...) A eficácia dos modelos propostos vem precisamente do fato de 
eles não corresponderem às aspirações e necessidades que se desenvolveram 
realmente”. (idem, p. 109). 
 
 
A mídia, particularmente a televisão, opera sobre os olimpianos com um 
movimento pendular. Ora os mitifica, ora os humaniza. Os semi-deuses ficam 
alternando o Olimpo com sua vida privada. Esse movimento pendular incide sobre a 
relação das estrelas com os mortais, que oscila entre a projeção e a identificação. Essa 
identificação/projeção de que fala o autor, entre olimpiano e público, é muito comum de 
acontecer. É só observar: quantas crianças não sonham em ser uma apresentadora de 
TV, uma atriz ou mesmo modelo? O caráter mítico de grande parte dos artistas de 
televisão é inquestionável. Em alguns momentos, admiradores de uma celebridade 
sonham, por exemplo, com sua vida de luxo, e, em outros, sentem-se próximos, a ponto 
de ser a própria estrela. Mas os olimpianos sempre mantêm uma distância considerável 
entre eles e o público, mesmo quando parecem “humanizados”. Exemplo: quando Xuxa 
vai buscar a filha, Sasha, no colégio, tarefa comum, em geral, das mães, sempre está 
acompanhada de um segurança, no mínimo. Se a apresentadora leva a filha ao trabalho, 
não é para um escritório qualquer, mas ao “mundo encantado” de um estúdio de 
televisão. Enfim, mesmo em momentos simples da vida privada, os olimpianos não 
conseguem se livrar, inteiramente, desse referencial mítico. 
 
Para complementar a análise referente ao poder exercido pelo olimpiano na 
sociedade, Morin ainda aborda o conceito de vedete. Segundo ele, as estrelas são, sem 
dúvida, fadadas ao “vedetismo”. Contudo, as vedetes só se tornarão estrelas 
excepcionalmente. O que lhes falta é uma dose extra de poder que transforma “o caráter 
delas em sobrecaráter”. Já as estrelas conseguem combinar sucesso profissional e 
midiático. 
 
Nesse caso, podemos considerar a importância da presença de Xuxa nos 
diferentes meios em que surge. Se a artista aparece em um programa, como 
entrevistada, a possibilidade de os índices de audiência subirem é alta. O mesmo ocorre 
em uma revista ou site de entretenimento. O nome de Xuxa desperta atenção e 
curiosidade. O motivo para tamanho sucesso, segundo Morin, está no apelo popular 
conquistado pela estrela no decorrer de sua carreira. “Dentre as estratégias de 
preparação de um produto na mídia, está o interesse que existe, nos bastidores, em 
promovê-lo. Conseqüência disso será o excesso da imagem da celebridade em jornais e 
revistas”. (idem, p. 81). 
 
Como se fosse “uma tábua de mandamentos”, o comportamento, modo de vestir, 
de andar e falar costumam ser imitados pela legião de admiradores de um artista. 
Completando a analogia com a passagem bíblica, Moisés teria sido o canal usado por 
Deus para transmitir aos fiéis sua lei, o que pode ser comparado à televisão, por 
exemplo. A terra prometida seria, neste caso, o jogo e espetáculo promovido pelas 
celebridades da TV e do cinema, que faz com que as estrelas alcem vôos mais altos. 
 
No encontro do ímpeto imaginário para o real e do real para o imaginário, 
situam-se as vedetes da grande imprensa, os olimpianos modernos” (MORIN, 1997, p. 
105). Dessa forma, Xuxa é considerada uma olimpiana, pois a mídia a transformou em 
celebridade, e os acontecimentos que a envolvem ganham uma “dimensão 
estratosférica”, atingindo, através dos diversos produtos da mídia, fãs espalhados pelo 
mundo. Morin ainda diz que a mídia eleva a dignidade de acontecimentos banais 
destituídos de qualquer importância para o crescimento intelectual. 
 
A idolatria dos admiradores de Xuxa é, nessa perspectiva, resultado do processo 
de identificação/projeção já citado. Interessada no sucesso das informações divulgadas 
com o nome da artista entre o público, a mídia constrói, aos poucos, essa relação entre 
os que se encontram no Olimpo e os mortais, como qualifica Morin. Assim, ao exibir a 
vida íntima de Xuxa, a mídia torna-a também mais acessível. 
 
Uma vez que é inegável a identificação/projeção dos fãs, o que pode ser 
observado no mercado bem-sucedido de LP’s, sandálias, botas, “xuxinhas”, minissaias, 
além da audiência do “Xou da Xuxa”, a apresentadora cumpre o papel de “babá 
eletrônica”. Entretanto, além de promover vendas, Xuxa, através de músicas sobre o 
ABC, a natureza, a alimentação, a amizade, entre outras, transmitia mensagens de 
conteúdo questionável aos pequenos. Afinal, como será mostrado no terceiro capítulo 
deste trabalho, ora a apresentadora difunde uma lição positiva ora contradiz o próprio 
discurso.No momento em que as mães e os estavam pais envolvidos com suas ocupação 
diárias, a audiência do programa nas manhãs da Globo era garantida, afinal eram na 
companhia de Xuxa que as crianças se divertiam e aprendiam a se tornar vorazes 
consumidores. 
 
2.2. O mito Xuxa na formação do imaginário coletivo 
 
 
A identificação de artistas como mitos pela mídia não é fato novo na história dos 
meios de comunicação de massa e, nos dias atuais, ocorre em larga escala, sejam as 
estrelas merecedoras ou não da honraria que lhes é concedida. Cabe iniciar este tópico 
por uma definição dada pelo mitólogo norte-americano Joseph Campbell em “O poder 
do mito” (1997): 
 
“O que é mito? Definição do dicionário: História sobre deuses (...) Um deus 
é a personificação de um poder motivador ou de um sistema de valores que 
funciona para a vida humana e para o universo – os poderes do seu própriocorpo e do universo. Os mitos são metáforas de potencialidade espiritual do 
ser humano”. (CAMPBELL, 1997, p. 23). 
 
O conceito de mito exposto exige um esclarecimento do conceito de metáfora, 
também revelado na mesma obra: “Metáfora é uma imagem que sugere alguma outra 
coisa (...) Nas tradições religiosas, metáfora remete a algo transcendente” (idem, p. 59). 
Essa “alguma outra coisa” significa que as metáforas não podem ser interpretadas 
literalmente, de forma denotativa. Um dos exemplos dados por ele na obra é sobre a 
narrativa da ascensão de Jesus Cristo ao Céu, que seria, na verdade, uma metáfora para 
explicar a ida de Jesus para o “espaço interior”, “o lugar de onde provêm todas as 
coisas”. Após essa explicação, é possível voltar ao primeiro conceito de mito exposto e 
aferir que, interpretados de maneira simbólica, os mitos mostram o poder interior do 
homem, até onde ele pode ir se apoiando na força interna de que dispõe. 
 
Para a inglesa Karen Armstrong, autora do livro “Breve história do mito” 
(2005), nas primeiras civilizações, a vivência dos mitos desempenhava uma melhora da 
relação do homem consigo mesmo. 
 
“A mitologia foi criada para nos auxiliar a lidar com as dificuldades 
humanas mais problemáticas. Ela ajudou as pessoas a encontrarem seu lugar 
no mundo e sua verdadeira orientação. Todos queremos saber de onde 
viemos, mas, como os primórdios se perderam nas brumas da pré-história, 
criamos mitos sobre nossos antepassados, que não são históricos, porém 
ajudam a explicar atitudes atuais em relação a nosso ambiente, nossos 
semelhantes e nossos costumes. Também queremos saber para onde vamos, 
por isso elaboramos histórias que falam de uma existência póstuma (...) E 
queremos explicar os momentos sublimes, quando parece que somos 
transportados para além de nossas preocupações ordinárias. Os deuses nos 
ajudavam a explicar a experiência da transcendência”. (ARMSTRONG, 
2005, p. 11 e 12). 
 
Na última fala, Armstrong explora a experiência transcendente do mito, em que 
se esquece do mundo dito real e se adentra um novo espaço, com tempo próprio, que 
leva a emoções, angústias, satisfações e decepções. O “Xou da Xuxa” explica bem essa 
sensação de “novo mundo” sugerida pela autora. Lá, as crianças integram-se à fantasia 
cor de rosa disseminada na figura de Xuxa – a “Rainha” que, ao chegar de um outro 
planeta através de sua nave – espalha alegria e esperança aos “terráqueos”. Com 
músicas, desenhos animados e brincadeiras, transfere os espectadores para uma outra 
realidade, onde o “abracadabra” é possível. A autora complementa que, dentre as 
funções da mitologia, está a “realidade invisível” em que os indivíduos são destinados a 
acreditar no “universo paralelo”. Campbell, em sua obra, usa esse mesmo termo: “O 
tema de toda mitologia: o de que existe um plano invisível sustentando o visível” (1997, 
p. 76). 
 
 Cabe antecipar, porém, que o mito é acima de tudo uma história tida como 
verdadeira para o homem. “Todos [os mitos] são verdadeiros em diferentes sentidos. 
Toda mitologia tem a ver com a sabedoria da vida, relacionada a uma cultura específica 
numa época específica. Integra o indivíduo na sociedade e a sociedade no campo da 
natureza. Une o campo da natureza à minha natureza” (idem, p. 58). 
 
 Uma outra importante característica do mito, exposta por Armstrong, está 
intimamente ligada à dinâmica das estrelas de TV. São os altos e baixos que elas 
enfrentam durante a carreira, a necessidade de saber perder para depois conseguir a 
vitória. Na biografia oficial de Xuxa (NEIVA, 2001), é possível identificar que, durante 
a trajetória da apresentadora, obstáculos surgiram. Apesar de os programas da 
apresentadora, em países de língua latina terem conquistado êxito, como já foi 
mencionado, nos Estados Unidos a dificuldade com a língua inglesa tirou Xuxa desse 
mercado. 
 
Outro exemplo foram os problemas enfrentados por Xuxa para retirar o filme 
“Amor estranho amor”, em que interpreta uma prostituta, das locadoras de todo o País. 
Em entrevista ao apresentador Amaury Júnior, no programa “Flash”11, em 1990, a 
“loura” confessa os transtornos referentes ao marketing pessoal pelos quais passou com 
a existência do filme: “Não nego que tenha feito esse trabalho. Mas não era a atriz 
principal, então não poderiam ter me colocado na capa do vídeo. Por isso, tive de 
recorrer. Minha imagem de apresentadora infantil não poderia estar mais atrelada ao 
‘Amor estranho amor’”. 
 
Neiva ainda destaca dificuldades de relacionamento da artista com a diretora-
geral do “Xou”, Marlene Mattos, e algumas quedas de audiência, durante os seis anos 
de programa, devido à rotina diária de quatro horas, o que também foi considerado uma 
ameaça à continuidade do sucesso da “Rainha dos Baixinhos”. Mas, logo em seguida, 
buscavam-se as soluções, e Xuxa recuperava a “boa imagem”. 
 
De acordo com Campbell, o mito precisa passar por uma série de provações para 
chegar a uma vida nova: “As provações são concedidas para ver se o pretendente a herói 
pode realmente ser um herói”. (1997, p. 133 e 134). Armstrong concorda: “Alguém não 
pode ser heróis e não estiver preparado para desistir de tudo; não há ascensão às alturas 
 
11 Programa Flash apresentado por Amaury Júnior, nos anos 90, cobria eventos sociais. O acesso da 
matéria em que Xuxa foi entrevistada por ele aconteceu em 20/11/2009. 
sem uma descida prévia às profundezas, não há vida nova sem alguma forma de morte”. 
(2005, p. 36 e 37). 
 
Para Campbell, “quando se torna modelo para a vida dos outros, a pessoa se 
move para uma esfera tal que se torna passível de ser mitologizada” (1997, p. 16). Ao 
complementar a idéia de mito como “ato heróico”, destaca dois tipos de proezas 
realizadas pelos heróis para defender sua idéia. A primeira é a proeza física: “O herói 
pratica um ato de coragem, durante a batalha, ou salva uma vida” (idem, p. 131). A 
segunda proeza é espiritual: “O herói aprende a lidar com o nível superior da vida 
humana e retorna com uma mensagem” (idem). 
 
A coragem de Xuxa, ao enfrentar um rigoroso cronograma com carga horária de 
mais de 10 horas (gravações de programa, LP’s, especiais de fim de ano, filmes, 
propagandas; participações eventos beneficentes e projetos sociais, etc), torna-se uma 
espécie de “batalha”. Já o nível superior da vida humana pode ser comparado à criação 
da Fundação Xuxa Meneghel, em Pedra de Guaratiba, no Rio de Janeiro, uma 
propriedade de 10 mil metros quadrados. A instituição atende a 250 crianças e 
adolescentes, entre 3 e 12 anos, e dá assistência em áreas distintas: alimentação, 
atendimento médico odontológico, acompanhamento do desenvolvimento físico e 
mental e participação em cursos de Informática, Inglês, Artes Plásticas, Natação, 
Educação Física, Escolinha de Futebol, Biblioteca, Reforço Escolar, dentre outros. É 
mantida pela apresentadora sem a ajuda de terceiros e cuida de aproximadamente 350 
crianças. A mensagem, aqui, amplamente difundida pelo marketing da apresentadora, é 
de que ela está realmente comprometida com as crianças do País, fazendo sua parte 
como cidadã. 
 
2.3. Mito sob a ótica da semiologia 
 
 
A ligação entre o mito e a TV ganhou espaço também nos estudos estruturalistas 
e semiológicos do francês Roland Barthes. No livro “Mitologias” (1997), o autor 
explica que o papel da linguagem na cobertura dos eventos relacionados às estrelas é 
imenso. “É ela [a linguagem] que dá ao acontecimento (...) o suplemento épico que 
permite solidificá-lo”. (1997, p. 26). Ou seja, a linguagem é quem torna um fato épico e, 
portanto, mítico. 
 
Antes, porém, de consideradas as idéias de Barthes a respeito do mito, é 
importante explicar o mecanismo usado pelo autor para defender os seus estudos: a 
Semiologia. “Enquanto estudo de uma fala, a mitologia não é, com efeito, mais do que 
um fragmento dessa

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