Buscar

Texto de referência 1 2 seminario

Prévia do material em texto

Seminário de Práticas Educativas II 
Texto de Referência I 
A Experiência Criativa 
Viola Spolin 
 (Retirado do livro “ Improvisação para o Teatro “ / Perspectiva/ 1998) 
 
Todas as pessoas são capazes de atuar no palco. Todas as pessoas são capazes de improvisar. As 
pessoas que desejarem são capazes de jogar e aprender a ter valor no palco. 
Aprendemos através da experiência, e ninguém ensina nada a ninguém. Isto é válido tanto para a criança que 
se movimenta inicialmente chutando o ar, engatinhando e depois andando, como para o cientista com suas 
equações. 
Se o ambiente permitir, pode-se aprender qualquer coisa, e se o indivíduo permitir, o ambiente lhe 
ensinará tudo o que ele tem para ensinar. “Talento” ou “falta de talento” tem muito pouco a ver com isso. 
Devemos reconsiderar o que significa “talento”. É muito possível que o que é chamado comportamento 
talentoso seja simplesmente uma maior capacidade individual para experienciar. Deste ponto de vista, é no 
aumento da capacidade individual para experienciar que a infinita potencialidade de uma personalidade pode 
ser evocada. 
 Experienciar é penetrar no ambiente, é envolver-se total e organicamente com ele. Isto significa 
envolvimento em todos os níveis: intelectual, físico e intuitivo. Dos três, o intuitivo, que é o mais vital para a 
situação de aprendizagem, é negligenciado. 
A intuição é sempre tida como sendo uma dotação ou uma força mística possuída pelos privilegiados 
somente. No entanto, todos nós tivemos momentos em que a resposta certa “simplesmente surgiu do nada” 
ou “fizemos a coisa certa sem pensar”. Às vezes em momentos como este, precipitados por uma crise, perigo 
ou choque, a pessoa “normal” transcende os limites daquilo que é familiar, corajosamente entra na área do 
desconhecido e libera por alguns minutos o gênio que tem dentro de si. Quando a resposta a uma experiência 
se realiza no nível do intuitivo, quando a pessoa trabalha além de um plano intelectual constrito, ela está 
realmente aberta para aprender. 
O intuitivo só pode responder no imediato — no aqui e agora. Ele gera suas dádivas no momento de 
espontaneidade, no momento quando estamos livres para atuar e interrelacionar, envolvendo-nos com o 
mundo à nossa volta que está em constante transformação. 
Através da espontaneidade somos re-formamos em nós mesmos. A espontaneidade cria uma 
explosão que por um momento nos liberta de quadros de referência estáticos, da memória sufocada por 
velhos fatos e informações, de teorias não digeridas e técnicas que são na realidade descobertas de outros. A 
espontaneidade é um momento de liberdade pessoal quando estamos frente a frente com a realidade e a 
vemos, a exploramos e agimos em conformidade com ela. Nessa realidade, as nossas mínimas partes 
funcionam como um todo orgânico. É o momento de descoberta, de experiência, de expressão criativa. 
Tanto a “pessoa média” quanto a “talentosa” podem ser ensinadas a atuar no palco quando o 
processo de ensino é orientado no sentido de tornar as técnicas teatrais tão intuitivas que sejam apropriadas 
pelo aluno. É necessário um caminho para adquirir o conhecimento intuitivo. Ele requer um ambiente no 
qual a experiência se realize, uma pessoa livre para experienciar e uma atividade que faça a espontaneidade 
acontecer. (...) 
 
SETE ASPECTOS DA ESPONTANEIDADE JOGOS 
O jogo é uma forma natural de grupo que propicia o envolvimento e a liberdade pessoal necessários 
para a experiência. Os jogos desenvolvem as técnicas e habilidades pessoais necessárias para o jogo em si, 
através do próprio ato de jogar. As habilidades são desenvolvidas no próprio momento em que a pessoa está 
jogando, divertindo-se ao máximo e recebendo toda a estimulação que o jogo tem para oferecer — é este o 
exato momento em que ela está verdadeiramente aberta para recebê-las. 
A ingenuidade e a inventividade aparecem para solucionar quaisquer crises que o jogo apresente, 
pois está subentendido que durante o jogo o jogador é livre para alcançar seu objetivo da maneira que 
escolher. Desde que obedeça às regras do jogo, ele pode balançar, ficar de ponta-cabeça, ou até voar. De 
fato, toda maneira nova ou extraordinária de jogar é aceita e aplaudida por seus companheiros de jogo. 
Isto torna a forma útil não só para o teatro formal, como especialmente para os atores interessados 
em aprender improvisação, e é igualmente útil para expor o iniciante à experiência teatral, seja ele adulto ou 
criança. Todas as técnicas, convenções etc., que os alunos-atores vieram descobrir lhes são dadas através de 
sua participação nos jogos teatrais (exercícios de atuação): 
O jogo é psicologicamente diferente em grau, mas não em categoria, da atuação dramática. A capacidade 
de criar uma situação imaginativamente e de fazer um papel é uma experiência maravilhosa, é como uma 
espécie de descanso do cotidiano que damos ao nosso eu, ou as férias da rotina de todo o dia. Observamos 
que essa liberdade psicológica cria uma condição na qual tensão e conflito são dissolvidos, e as 
potencialidades são liberadas no esforço espontâneo de satisfazer as demandas da situação1. (Neva. 
L.Boyd, Play,A Unique discipline) 
 Qualquer jogo digno de ser jogado é altamente social e propõe intrinsecamente um problema a ser 
solucionado — um ponto objetivo com o qual cada indivíduo deve se envolver, seja para atingir o gol ou 
para acertar uma moeda num copo. Deve haver acordo de grupo sobre as regras do jogo e interação que se 
dirige em direção ao objetivo para que o jogo possa acontecer. 
Os jogadores tornam-se ágeis, alerta, prontos e desejosos de novos lances ao responderem aos 
diversos acontecimentos acidentais simultaneamente. A capacidade pessoal para se envolver com os 
problemas do jogo e o esforço despendido para lidar com os múltiplos estímulos que ele o provoca, 
determinam a extensão desse crescimento. 
 O crescimento ocorrerá sem dificuldade no aluno-autor porque o próprio jogo o ajudará. O objetivo 
no qual o jogador deve constantemente concentrar e para o qual toda ação deve ser dirigida provoca 
espontaneidade. Nessa espontaneidade, a liberdade pessoal é liberada, e a pessoa como um todo é física, 
intelectual e intuitivamente despertada. Isto causa estimulação suficiente para que o aluno transcenda a si 
mesmo — ele é libertado para penetrar no ambiente, explorar, aventurar e enfrentar sem medo todos os 
perigos. 
A energia liberada para resolver o problema, sendo restringida pelas regras do jogo e estabelecida 
pela decisão grupal, cria uma explosão — ou espontaneidade — e, como é comum nas explosões, tudo é 
destruído, rearranjado, desbloqueado. O ouvido alerta os pés, e o olho atira a bola. 
Todas as partes do indivíduo funcionam juntas como uma unidade de trabalho, como um pequeno 
todo orgânico dentro de um todo orgânico maior que é a estrutura do jogo. Dessa experiência integrada, 
surge o indivíduo total dentro do ambiente total, e aparece o apoio e a confiança que permite ao indivíduo 
abrir-se e desenvolver qualquer habilidade necessária para a comunicação dentro do jogo. Além disso, a 
aceitação de todas as limitações impostas possibilita o aparecimento do jogo ou da cena, no caso do teatro. 
Sem uma autoridade de fora se impondo aos jogadores, dizendo-lhes o que fazer, quando e como, 
cada um livremente escolhe a autodisciplina ao aceitar as regras do jogo (“desse jeito é mais gostoso”) e 
acata as decisões de grupo com entusiasmo e confiança. Sem alguém para agradar ou dar concessões, o 
jogador pode, então, concentrar toda sua energia no problema e aprender aquilo que veio aprender. 
 
APROVAÇÃO/DESAPROVAÇÃO 
 O primeiro passo para jogar é sentir liberdade pessoal. Antes de jogar, devemos estar livres. É 
necessário ser parte do mundo que nos circunda e torná-lo real tocando, vendo, sentindo o seu sabor, e o seu 
aroma — o que procuramos é o contato direto com o ambiente. Ele deve ser investigado, questionado,aceito 
ou rejeitado. A liberdade pessoal para fazer isso leva-nos a experimentar e adquirir autoconsciência 
(autoidentidade) e auto-expressão. A sede de auto-identidade e auto-expressão, enquanto básica para todos 
nós, é também necessária para a expressão teatral. 
Muito poucos de nós são capazes de estabelecer esse contato direto com a realidade. Nosso mais 
simples movimento em relação ao ambiente é interrompido pela necessidade de comentário ou interpretação 
favorável por uma autoridade estabelecida. Tememos não ser aprovados, ou então aceitamos comentário e 
interpretação de fora inquestionavelmente. Numa cultura onde a aprovação/desaprovação tornou-se o 
regulador predominante dos esforços e da posição, e freqüentemente o substituto do amor, nossas liberdades 
pessoais são dissipadas. 
Abandonados aos julgamentos arbitrários dos outros, oscilamos diariamente entre o desejo de ser 
amado e o medo da rejeição para produzir. Qualificados como “bons” ou “maus” desde o nascimento (um 
bebê “bom” não chora) nos tornamos tão dependentes da tênue base de julgamento de 
aprovação/desaprovação que ficamos criativamente paralisados. Vemos com os olhos dos outros e sentimos 
o cheiro com o nariz dos outros. 
 Assim, o fato de depender de outros que digam onde estamos, quem somos e o que está acontecendo 
resulta numa séria (quase total) perda de experiência pessoal. Perdemos a capacidade de estar organicamente 
envolvidos num problema, e de uma maneira desconectada funcionamos somente com partes do nosso todo. 
Não conhecemos nossa própria substância, e na tentativa de viver (ou de evitar viver) pelos olhos de outros, 
a auto-identidade é obscurecida, nosso corpo e a graça natural desaparece, e a aprendizagem é afetada. Tanto 
o indivíduo como a forma de arte são distorcidos e depravados, e a compreensão se perde para nós. 
Ao tentarmos nos salvaguardar de ataques, construímos uma fortaleza poderosa e nos tornamos 
tímidos, ou então lutamos cada vez que nos aventuramos sair de nós mesmos. Alguns, nesta luta com a 
aprovação/desaprovação, desenvolvem egocentrismo e exibicionismo; outros desistem e simplesmente 
seguem vivendo. Outros ainda, como Elsa no conto de fada, estão eternamente batendo nas janelas, tocando 
campainhas e lamentando “Quem sou eu?” O contato com o ambiente é distorcido. Autodescoberta e outros 
traços exploratórios tendem a ser atrofiados. Ser “bom” ou ser “mau” torna-se um modo de vida para 
aqueles que precisam da aprovação/desaprovação de uma autoridade — a investigação, assim como a 
solução dos problemas, tornam-se de importância secundária. 
Aprovação/desaprovação cresce do autoritarismo que, com o decorrer dos anos, passou dos pais para 
o professor e, finalmente, para o de toda a estrutura social (o companheiro, o patrão, a família, os vizinhos 
etc.). 
A linguagem e as atitudes do autoritarismo devem ser constantemente combatidas quando desejamos 
que a personalidade total emerja como unidade de trabalho. Todas palavras que fecham portas, que têm 
implicações ou conteúdo emocional, atacam a personalidade do aluno-ator ou mantêm o aluno totalmente 
dependente do julgamento do professor, devem ser evitadas. Uma vez que muitos de nós fomos educados 
pelo método da aprovação/desaprovação, é necessário uma constante auto-observação por parte do 
professor-diretor para erradicar de si mesmo qualquer manifestação desse tipo, de maneira que não entre na 
relação professor-aluno. 
A expectativa de julgamento impede um relacionamento livre nos trabalhos de atuação. Além disso, 
o professor não pode julgar o bom ou o mau pois que não existe uma maneira absolutamente certa ou errada 
para solucionar um problema: o professor, com um passado rico em experiências, pode conhecer uma 
centena de maneiras diferentes para solucionar um determinado problema, e o aluno pode aparecer com a 
forma cento e um, que o professor até então não tinha pensado . Isto é particularmente válido nas artes. 
O julgamento por parte do professor-diretor limita tanto a sua própria experiência como a dos alunos, 
pois ao julgar, ele se mantém distante do momento da experiência e raramente vai além do que já sabe. Isto 
o limita aos ensinamentos de rotina, às fórmulas e outros conceitos padronizados, que prescrevem o 
comportamento do aluno. 
E mais difícil reconhecer o autoritarismo na aprovação do que na desaprovação — particularmente 
quando um aluno solicita aprovação. Isto lhe dá autoconhecimento, pois uma aprovação do professor indica 
que foi feito algum progresso, mas um progresso em termos do professor, não em termos do aluno. Portanto, 
ao desejar evitar a aprovação, devemos nos precaver para não nos distanciarmos a tal ponto que o aluno se 
sinta perdido, ou que ele julgue que não está aprendendo nada. 
A verdadeira liberdade pessoal e a auto-expressão só podem florescer numa atmosfera onde as 
atitudes permitam igualdade entre o aluno e o professor, e as dependências do aluno pelo professor e do 
professor pelo aluno sejam eliminadas. Os problemas propostos no livro ensinarão ambas as coisas. 
Aceitar simultaneamente o direito do aluno à igualdade na abordagem de um problema e sua falta de 
experiência coloca uma carga sobre o professor. Esta maneira de ensinar parece a princípio mais difícil, pois 
o professor deve sempre se colocar fora das descobertas dos alunos sem interpretar ou forçar conclusões. 
Contudo, isto pode ser mais recompensador para o professor, porque uma vez que os alunos-atores tenham 
realmente aprendido através da atuação, a qualidade da performance será de fato muito alta. 
(...)Com o despertar do sentido do eu, o autoritarismo é eliminado. Não há necessidade do status 
dado pela aprovação/desaprovação na medida em que todos (professor e aluno) lutam pelo insight pessoal 
— com a consciência intuitiva vem um sentimento de certeza. 
A mudança do professor como autoridade absoluta não ocorre imediatamente. Levamse anos para 
construir atitudes, e todos temos medo de abandoná-las, uma vez incorporadas. O professor encontrará seu 
caminho se nunca perder de vista o fato de que as necessidades do teatro são o verdadeiro mestre, pois o 
professor também deve aceitar as regras do jogo. Então ele facilmente encontrará sua função de guia, pois 
afinal o professor-diretor conhece o teatro técnico e artisticamente, e suas experiências são necessárias para 
liderar o grupo. 
 
EXPRESSÃO DE GRUPO 
Um relacionamento de grupo saudável exige um número de indivíduos trabalhando 
interdependentemente para completar um projeto, com total participação individual e contribuição pessoal. 
Se uma pessoa domina, os outros membros têm pouco crescimento ou prazer na atividade, não existe um 
verdadeiro relacionamento de grupo. 
O teatro é uma atividade artística que exige o talento e a energia de muitas pessoas — desde a 
primeira idéia de uma peça ou cena até o último eco de aplauso. Sem esta interação não há lugar para o ator 
individualmente, pois sem o funcionamento do grupo, para quem iria ele representar, que materiais usaria e 
que efeitos poderia produzir? O aluno-ator deve aprender que “como atuar”, assim como no jogo, está 
intrinsecamente ligado a todas as outras pessoas na complexidade da forma de arte. O teatro improvisacional 
requer relacionamento de grupo muito intenso, pois é a partir do acordo e da atuação em grupo que emerge o 
material para as cenas e peças. 
Para o aluno que está iniciando a experiência teatral, trabalhar com um grupo dá segurança, por um 
lado e, por outro lado, representa uma ameaça. Uma vez que a participação numa atividade teatral é 
confundida por muitos com exibicionismo (e portanto com o medo de se expor), o indivíduo se julga isolado 
contra muitos. Ele luta contra um grande número de “pessoas de olhos malevolentes”, sentadas, julgando seu 
trabalho. O aluno se sente constantemente observado, julgando a si mesmo e não progride. 
No entanto, quando atua com o grupo,experienciando coisas junto, o aluno-ator se integra e se 
descobre dentro da atividade. Tanto as diferenças como as similaridades dentro do grupo são aceitas. Um 
grupo nunca deveria ser usado para induzir conformidade, mas, como num jogo, deveria ser o elemento 
propulsor da ação. 
O procedimento para o professor-diretor é basicamente simples: ele deve certificar-se de que todo 
aluno está participando livremente a todo o momento. O desafio para o professor ou líder é ativar cada aluno 
no grupo respeitando a capacidade imediata de participação de cada um. Embora o aluno bem dotado pareça 
ter sempre mais para dar, mesmo se um aluno estiver participando do limite de sua força e usando o máximo 
de suas habilidades, ele deve ser respeitado, ainda que sua contribuição seja mínima. Nem sempre o aluno 
pode fazer o que o professor acha que ele deveria fazer, mas na medida em que ele progride, suas 
capacidades aumentarão. Trabalhe com o aluno onde ele está, não onde você pensa que ele deveria estar. 
A participação e o acordo de grupo eliminam todas as tensões e exaustões da competição e abrem 
caminho para a harmonia. Uma atmosfera altamente competitiva cria tensão artificial, e quando a 
competição substitui a participação, o resultado é a ação compulsiva. Mesmo para os mais jovens, a 
competição acirrada conota a idéia de que ele deve ser melhor do que qualquer outro. Quando um jogador 
sente isso, sua energia é despendida somente para isto, ele se torna ansioso e impelido, e seus companheiros 
de jogo tornam-se uma ameaça para ele. Se a competição for tomada erroneamente como um instrumento de 
ensino, todo o significado do jogo será distorcido. A atuação permite que uma pessoa responda com seu 
“organismo total dentro de um ambiente total”. A competição imposta torna essa harmonia impossível, pois 
ela destrói a natureza básica da atuação no palco ocultando a auto-identidade e separando um jogador do 
outro. 
Quando a competição e as comparações aparecem dentro de uma atividade, há um efeito imediato 
sobre o aluno que é patente em seu comportamento. Ele luta por um status agredindo outra pessoa, 
desenvolve atitudes defensivas (dando “explicações” detalhadas para as ações mais simples, vangloriando-se 
ou culpando outros pelas coisas que ele faz) assumindo o controle agressivamente ou demonstrando sinais 
de inquietude. Aqueles que acham impossível levar a cabo com uma tensão imposta, se tornarão apáticos e 
mostrarão sinais de fastio para se aliviarem. Quase todos mostrarão sinais de fadiga. 
A competição natural, por outro lado, é parte orgânica de toda atividade de grupo e propicia tensão e 
relaxamento de forma a manter o indivíduo intacto enquanto joga. É a estimulação crescente que aparece na 
medida em que os problemas são resolvidos e que outros mais desafiantes lhe são colocados. Os 
companheiros de jogo são necessários e bem recebidos. Essa competição natural pode se tornar um processo 
para maior penetração no ambiente. 
Com a dominação de cada problema caminhamos para uma compreensão mais ampla, pois uma vez 
solucionado o problema, ele se dissolve como algodão doce. Quando já dominamos o engatinhar, nos pomos 
em pé, e quando nos levantamos começamos a andar. Esse aparecimento e dissolvição infinitos de 
fenômenos desenvolve uma visão (percepção) cada vez maior com cada novo conjunto de circunstâncias(...) 
Se quisermos continuar o jogo, a competição natural deve existir onde cada indivíduo tiver que empregar 
maior energia para solucionar consecutivamente problemas cada vez mais complicados. Estes podem ser 
solucionados, então, não às custas de uma outra pessoa, com a terrível perda emocional pessoal que o 
comportamento compulsivo ocasiona, mas trabalhando harmoniosamente com outros para aumentar o 
esforço ou trabalho de grupo. É só quando a escala de valores toma a competição como grito de guerra que 
decorre o perigo: o resultado final — sucesso — torna-se mais importante do que o processo. 
A utilização de energia em excesso para solucionar um problema é muito evidente hoje. Embora seja 
verdadeiro que algumas pessoas que trabalham com energias compulsivas façam sucesso, na maioria dos 
casos já perderam de vista o prazer na atividade e se tornam insatisfeitas com suas realizações. Assim 
acontece porque se dirigirmos todos os nossos esforços para a obtenção de um objetivo, corremos um grave 
perigo de perder tudo aquilo no qual baseamos nossas atividades cotidianas. Pois quando um objetivo é 
superimposto numa atividade ao invés de emergir a partir dela, sempre nos sentimos enganados quando o 
alcançamos. 
Quando um objetivo aparece fácil e naturalmente e vem de um crescimento e não de uma força 
compulsiva, o resultado final, seja ele um espetáculo ou o que quer que seja, não será diferente do processo 
que levou a esse resultado. Se somos treinados somente para o sucesso, devemos usar tudo e todas as 
pessoas para esse fim, podemos então trapacear, mentir, trair e abandonar toda vida social para alcançar 
sucesso. O conhecimento teria uma exatidão maior se viesse da estimulação do próprio aprendizado. Se 
procurarmos somente o sucesso, quantos valores humanos não serão perdidos? E quanto não estaremos 
privando a nossa forma de arte? 
Portanto, ao desviar a competição para o esforço de grupo, lembrando que o processo vem antes do 
resultado final, libertamos o aluno-ator para confiar no esquema e o ajudamos a solucionar os problemas da 
atividade. Tanto o aluno bem dotado, que teria sucesso mesmo sob altas tensões, como o aluno que tem 
poucas chances de ser bem sucedido sob pressão, mostram uma grande liberação criativa e os padrões 
artísticos nas sessões de trabalho, se elevam quando a energia livre e saudável entra sem restrições na 
atividade teatral. Uma vez que os problemas de atuação são cumulativos, todos são aprofundados e 
enriquecidos por cada experiência sucessiva. (...)

Continue navegando