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Poços de Caldas 2022 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Graduação em Direito Cidade Ano BIANCA FRESSATO ROCHA PACOTE ANTICRIME: ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 13.964/2019 NO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL Poços de Caldas 2022 PACOTE ANTICRIME: ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 13.964/2019 NO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Pontifícia Universidade Católica, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Orientador: Prof. Dr. José Carlos Trinca Zanetti BIANCA FRESSATO ROCHA BIANCA FRESSATO ROCHA PACOTE ANTICRIME: ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI 13.964/2019 NO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Pontifícia Universidade Católica, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. BANCA EXAMINADORA Prof.Dr. José Carlos Trinca Zanetti Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Poços de Caldas, __de __de 2022. AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço à minha família, especialmente meus pais, Guilherme e Claudia que sempre foram meu suporte mesmo nas horas mais difíceis. Estendo meu agradecimento a minha parceira de vida Mariana por todo o apoio e incentivo. Imensamente grata aos meus gatos de estimação considerados por mim como membros de minha família. Minha eterna gratidão a todos meus amigos que estiveram comigo durante esta jornada, em especial Paloma e Jéssica que me deram todo apoio e suporte. Aos meus familiares Antônio, Claudia e Antônio filho por todo o auxílio, cuidado e amor. Agradeço também ao corpo docente da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais campus Poços de Caldas por legar seus conhecimentos a mim, a fim de que eu me torne não apenas uma profissional capacitada, mas também um ser humano melhor, especialmente destaco o professor José Carlos Trinca Zanetti, que se empenhou em me orientar nesta monografia. Estender meus cumprimentos a Dra. Claudia Prado Fressato Rocha que além de mãe, também sempre apoiou como advogada nos ensinamentos jurídicos, auxiliando e oferecendo todo aparato para que eu pudesse realizar minha graduação, me acudindo em todos os momentos. Um cumprimento ao meu pai Guilherme que nunca mediu esforços para que eu pudesse alcançar todos os objetivos. Igualmente, agradeço à Dr. Pedro Paulo Miglioranzi, por todo ensinamento ofertado no estágio. Por fim, agradeço aos colegas e amigos que cultivei em Poços de Caldas, com os quais compartilhei as boas novas e vicissitudes na academia e na vida, em especial Maria Luísa Oliveira Moreira e André Ferreira. RESUMO O presente trabalho tem como finalidade a análise crítica acerca de uma das mudanças trazidas pela Lei Federal 13.964, de 24 de dezembro de 2019, popularmente conhecida como “Pacote Anticrime”, principalmente na redação do artigo 75 do Código Penal. Sob essa ótica, o estudo é iniciado abordando o conceito e origem da referida Lei, bem como os fatores que influenciaram as alterações, abordando o entendimento do tema pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, bem como a inconstitucionalidade da alteração, discorrendo também sobre os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais com relação a nova redação do artigo 75 do Código Penal, que definiu 40 anos como tempo máximo de pena privativa de liberdade no Brasil, analisando eficácia dessa mudança. Seguindo os estudos, será demonstrado quais garantias foram flexibilizadas, bem como os efeitos/consequências das mudanças promovidas no limite da pena privativa de liberdade elencando as principais modificações que a nova redação trouxe para o direito penal. Com efeito, o objetivo da pesquisa é expor e analisar criticamente, inclusive verificando as causas e consequências da alteração do limite da pena como um todo. Palavras-chave: Pacote Anticrime. Lei 13.964/19. Artigo 75. Código Penal. Majoração do limite da pena privativa de liberdade. ABSTRACT The purpose of this workistocriticallyanalyzeone of thechangesbroughtaboutby Federal Law 13,964, of December 24, 2019, popularlyknown as the “Anti- CrimePackage”, mainly in thewording of article 75 of the Penal Code. From this perspective, thestudybeginsbyaddressingtheconcept and origin of thesaid Law, as well as thefactorsthatinfluencedthechanges, addressingtheunderstanding of thesubjectbytheBrazilianInstitute of Criminal Sciences, as well as theunconstitutionality of thechange, alsodiscussingtheunderstandingsdoctrinal and jurisprudentialopinionsregardingthe new wording of article 75 of the Penal Code, whichdefined 40 years as themaximumperiod of deprivation of liberty in Brazil, analyzingtheeffectiveness of this change. Followingthestudies, it willbedemonstratedwhichguaranteesweremade more flexible, as well as theeffects/consequences of thechangespromoted in thelimit of thedeprivation of liberty, listingthemainmodificationsthatthe new wordingbroughttothe criminal law. Indeed, theobjective of theresearchistoexpose and criticallyanalyze, includingcheckingthe causes and consequences of changingthepenaltylimit as a whole. Keywords:.Anti-Crime Pack. Law 13,964/19. Article 75. Penal Code. Increase of the limit of the custodial sentence. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Art. Artigo CP Código Penal CPP Código de Processo Penal IBCCRIM Instituto Brasileiro de Ciências Criminais STF Supremo Tribunal Federal STJ Supremo Tribunal de Justiça SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 1 1. O PACOTE ANTICRIME ...................................................................................... 3 1.1 CONCEITO E ORIGEM DO PACOTE ANTICRIME .......................................... 3 1.2 FATORES QUE INFLUENCIARAM NA ALTERAÇÃO PROMOVIDA NO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL ................................................................................ 5 1.3 ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PELO INTITUTO BRASILEIRO DE CIENCIAS CRIMINAIS (IBCCRIM) .................................................. 7 1.4 DA INCONSTITUCIONALIDADE DA NOVA REDAÇÃO DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL ......................................................................................................... 9 2. CORRENTES DOUTRINÁRIAS E ENTENDIMENTO JURIPRUDENCIAL ....... 14 2.1 CORRENTES DOUTRINÁRIAS .......................................................................... 14 2.2 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL .............................................................. 15 2.3 A EFICÁCIA DA ALTERAÇÃO ............................................................................. 22 3. A ALTERAÇÃO DO AUMENTO DO LIMITE DE CUMPRIMENTO DE PENA E OS RESPECTIVOS IMPACTOS NO DIREITO PENAL ............................................ 24 3.1 A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E O PACOTE ANTICRIME ............................ 24 3.2 DAS ALTERAÇÕES NA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS ................................... 27 3.3 DO HOMICÍDIO QUALIFICADO – ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO OU PROIBIDO ................................................................................................................. 27 3.4 DO LATROCÍNIO................................................................................................. 28 3.5 DA EXTORSÃO ................................................................................................... 29 3.6 DO FURTO .......................................................................................................... 30 3.7 DO GENOCÍDIO ..................................................................................................31 3.8 DA ARMA DE FOGO DE USO PROIBIDO E OUTROS ........................................ 31 3.9 DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ....................................................................... 32 3. 10 OS IMPACTOS DA ALTERAÇÃO ..................................................................... 33 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 37 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 39 1 INTRODUÇÃO O presente estudo tem como objetivo abordar a eficácia da alteração que elevou o limite de pena privativa de liberdade no direito penal de 30 para 40 anos, promovida pela Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, no artigo 75 do Código Penal, bem como seus respectivos impactos, analisando como essa alteração impactou direito penal no rol dos crimes hediondos. Como hipóteses iniciais, temos o conceito, origem e fatores que influenciaram o pacote anticrime; análise do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e estudo da inconstitucionalidade do artigo 75 do Código Penal; as correntes doutrinárias, entendimento jurisprudencial e a eficácia da alteração, levando em conta as mudanças ocorridas pelo pacote anticrime tanto no que se refere ao artigo 75 do CP quanto no Direito Penal, além de analisar os impactos desta mudança para o direito penal. Com efeito, o objetivo da pesquisa é expor e analisar criticamente, inclusive verificando as quais garantias foram flexibilizadas, bem como os efeitos/consequências das mudanças promovidas no limite da pena privativa de liberdade, e como isso influenciou o Direito Penal no rol dos crimes hediondos. Considerando este fim, a modificação a ser analisada trata-se principalmente do artigo 75 do Código Penal, que estipula a elevação de tempo do limite máximo de cumprimento de pena de 30 para 40 anos. Tal mudança, tem como pressuposto de que essa modificação nas penas privativas de liberdade deveria acompanhar o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, entrando em vigor com a edição da Lei Federal 13.964, de 24 de dezembro de 2019, popularmente conhecida como “Pacote Anticrime”. A mudança oferecida pelo Pacote Anticrime, que aumentou o tempo de permanência dos indivíduos no cárcere, não encontra amparo em quaisquer dados históricos, sociológicos, ou, ao menos, jurídicos como será demonstrado. Mas sim a uma vontade popular, que cada vez mais é levada a acreditar na extinção do criminoso como solução para a criminalidade, desconsiderando a finalidade da pena e aceitando uma medida punitivista, evitando enfrentar a realidade de que o crime pode ter raízes sociais e não nas simples escolhas individuais. 2 Será demonstrado que as consequências dessas modificações estão diretamente ligadas ao poder que o Estado tem de exercer a punição de pena privativa de liberdade, e que, em realidade, a finalidade elementar da prisão, que é a ressocialização, não vem sendo garantida. Será abordada, também, uma análise desta ampliação da pena pelo IBCCRIM, que entende a mudança ocorrida como uma alteração para privilegiar somente alguns grupos da sociedade. Ademais, restará demonstrado, a inconstitucionalidade dessas modificações, considerando a entre a ADPF 347 e a ampliação do tempo máximo para o cumprimento de pena privativa de liberdade, por entender que tal medida apenas fortaleceu o Estado de Coisas Inconstitucional reconhecido pelo STF. Ante o exposto, será demonstrado a mudança ocorrida no artigo 75 do Código de Penal (CP) que previa que o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não poderia ser superior a 30 anos, e que com o advento da Lei 13.964/2019, este prazo foi ampliado para 40 anos, além de uma análise sobre e seus respectivos impactos considerando a eficácia da alteração promovida tecendo uma análise do que essa alteração causou no rol dos crimes hediondos, tecendo entendimentos de especialistas sobre o assunto e institutos sobre o assunto, abordando inclusive aspectos inconstitucionais da referida mudança. 3 1. O PACOTE ANTICRIME 1.1 CONCEITO E ORIGEM DO PACOTE ANTICRIME O chamado “Pacote Anticrime” do Governo Federal surgiu regulamentado pela Lei nº 13.964 de 24 de dezembro de 2019, atendendo a um desejo do povo, e pode ser definido como o conjunto de mudanças na legislação penal brasileira que visa aumentar a eficácia no combate ao crime organizado, aos crimes violentos e em especial à corrupção, reduzindo os atrasos no sistema judicial criminal brasileiro. Como prova disto, discorre Renato Brasileiro: O denominado projeto Anticrime foi apresentado ao Congresso Nacional no dia 31 de janeiro de 2019 (PL 882-2019), tendo como principal meta o estabelecimento de medidas que realmente se demonstrassem efetivos contra a corrupção, o crime organizado e os delitos praticados com grave violência à pessoa, sistematizando as mudanças em uma perspectiva mais rigorosa no enfrentamento à criminalidade, totalmente em consonância com o anseio popular expressado nas eleições de 2018 (BRASIL, 2020, p.18). As modificações ocorridas na legislação criminal e em no mínimo 17 leis já vigoradas, dentre estas se destacam o Código Penal Brasileiro (Decreto Lei nº 2.848/40), Lei da Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), Código de Processo Penal (Decreto Lei nº 3.689/41), Lei de Drogas (Lei nº 11.343/06), Lei de Lavagem de Capitais (Lei nº 9.613/98), Lei de Interceptações Telefônicas (Lei nº 9.296/96), Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), Estabelecimentos Penais Federais de Segurança Máxima (Lei nº 11.671/08), Identificação Criminal (Lei 12.037/09), Colegiado em Primeiro Grau (Lei nº 12.694/12), Lei do “Disque-denúncia” (Lei nº 13.608/18), dando uma nova vertente ao procedimento investigatório e às instruções judiciais nos processos criminais no Brasil. Mais especificamente, o presente trabalho intenta analisar as mudanças trazidas pela lei, no artigo 75 do código penal. Estas alterações no cumprimento de pena surgiram com o novo projeto de Lei nº 13.964/2019, conforme acima detalhado, modificando o tempo que o condenado permanece em cárcere privado, ficando estabelecido que, em decorrência do aumento da expectativa de vida da sociedade, houvesse um aumento de 30 para 40 anos o tempo máximo de pena privativa de liberdade. Bem como preceitua Renato Brasil: 4 Atento, porém, ao sensível aumento da expectativa de vida dos brasileiros – em 1940, esta era, em média, de 45,5 anos, ao passo que, em 2018, pulou para 76,3 anos, segundo dados do IBGE, o Pacote Anticrime alterou a redação do referido dispositivo para dispor que o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos (BRASIL, 2020, p. 29). O pacote anticrime foi instituído pela Lei Nº. 13.964/2019, e tinha como objetivo alterar a Legislação Penal e Processual Penal, com a finalidade de modernizá-las, combatendo a criminalidade organizada, crimes violentos e outros crimes de grande repulsa social. De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, quando alguém é condenado por um período superior, deve-se adequar a pena para que esta não ultrapasse período determinado pelo Código Penal. Desse modo, isso só ocorre com a soma de penas, vez que individualmente a legislação previa penas máximas de até 30 anos de penas para diversos crimes, fazendo com que a alteração permitisse o aumento de pena para vários crimes. A fim de ilustrar a nova regra, tem-se que os condenados não cumprem mais somente um sexto da pena, até que esses estejam aptos à progressão de regime. Com a nova mudança, os réus primários que tiverem cometido crimes sem violência, terão direito de serem transferidos após cumprirem uma porcentagem de 16% de sua pena. Para os considerados reincidentesem crimes hediondos, só poderão requerer progressão de regime depois do cumprimento de 70% da sua pena. Outras situações a serem consideradas, no que tange o cumprimento de pena para a progressão são: 20%, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência ou grave ameaça; 30%, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência ou grave ameaça e 40%, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, caso seja primário. Antes qualquer pena que o indivíduo fosse cumprir não poderia ultrapassar 30 anos, em cumprimento desta pena ou mesmo se houvesse a somatória destas penas, seja ela em regime fechado, semiaberto ou aberto, se limitando a um teto de trinta anos. A mudança que ocorreu é que este teto subiu para 40 anos, mas apesar de ter aumentado o tempo para o cumprimento de pena, não significa que os crimes previstos com pena máxima de 30 anos, como por exemplo, latrocínio, passou a ser de 40 anos, a pena para o crime de latrocínio continua a ser de trinta anos. 5 No caso prático, é possível que alguém sofra condenações de 200 anos, e isso ocorre porque o condenado poderá cumprir diretamente os 40 anos, não podendo cumprir um tempo superior a este teto, e o resto da pena a qual foi condenado servirá para a contagem de alguns benefícios que eventualmente a pessoa poderia ter, como é o caso do livramento condicional e progressão de regime. Temos, portanto houve um endurecimento da pena, que no caso do crime de latrocínio conforme acima citado, o indivíduo até pode ter uma condenação com um tempo superior a 30 anos na terceira fase de aplicação da pena, podendo ter uma causa de aumento, mas só poderá ficar preso diretamente por 40 anos, mas para efeitos de qualquer benefício a ser aplicado, utiliza-se a pena máxima, ou seja, a pena efetiva aplicada pelo juiz. Tem-se, portanto, que na prática, não é porque um condenado ficou preso por 40 anos que estará livre. Essa foi uma alteração mais motivada em dar uma satisfação à sociedade punitiva, do que ter alguma efetividade e consequentemente ser eficaz. A título de exemplificação, é como se os cidadãos em conflito com a lei tivessem efetiva oportunidade de ser ressocializados dentro do estabelecimento prisional, vez que atualmente o sistema prisional comporta o triplo de condenados do que teria capacidade de comportar, restando evidente que colocar um indivíduo mais tempo em regime fechado não o auxilia em ressocializar, vez que esse condenado vai retornar para a sociedade e essa em contrapartida precisa compreender que no Brasil não existem penas perpétuas, e que o que se faz necessário é que se saiba lidar com esse indivíduo quando o mesmo voltar para a sociedade. 1.2 FATORES QUE INFLUENCIARAM NA ALTERAÇÃO PROMOVIDA NO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL Esse novo jeito de pensar o direito penal tem influência direta um modo de aplicação de sanção penal privativa de liberdade que visa acompanhar o aumento da expectativa de vida do brasileiro. Esse aumento de 10 anos ao tempo máximo de cumprimento de pena privativa de liberdade no Brasil surgiu em decorrência do crescimento da expectativa de vida e do clamor popular para o combate a corrupção. 6 Desse modo, pode-se entender que as mudanças foram influenciadas por três fatores, quais sejam: históricos, estruturais e sociais. Os fatores históricos nos mostram registros de corrupção no Brasil desde os tempos remotos. Na atual conjuntura brasileira, é possível verificar a existência de uma crise político-social, causada pela falta de representatividade na política e pela desigualdade social. Tem-se uma busca pelos interesses pessoais dos representantes eleitos, em vez de buscarem atender às demandas da sociedade que sofre cada vez mais com a corrupção. Ademais, justiça criminal brasileira reflete a desigualdade social existente no país e também atende aos desejos de uma sociedade clama por mudanças na legislação penal e processual penal, vez que o atual estado das coisas não se mostra eficaz, gerando o sentimento de impunidade. Em relação ao fator estrutural temos que o nítido emparelhamento do Estado em prol da corrupção, vez que conforme acima narrado, tem-se que a corrupção é um fenômeno atemporal, recorrente e generalizado nas instituições, que se juntam com o objetivo de viabilizar a corrupção. Diante disso, surgiu o pacote anticrime, que visava repelir crimes desta natureza, como por exemplo, os crimes de colarinho branco, praticados por membros que ocupam cargo de poder, para que pudessem ser aplicadas as devidas penas, independente do cargo que ocupa. O pacote anticrime foi o marco inicial para erradicar a distância existente entre a impunidade e a justiça, a correta aplicação da lei e a devida sanção aplicada a quem venha transgredi-la. Os fatores sociais estão diretamente ligados a corrupção que assola o Brasil, vez quanto maiores as desigualdades sociais, menor são os investimentos em saúde, educação, segurança, habitação, infraestrutura. O fator social é o maior causador da corrupção no Brasil, ele é trazido por fatores externos, tais como a desigualdade social e a inversão de valores. Ademais, conforme disposto alhures, tal mudança ocorreu sobre o pretexto da elevação da expectativa de vida do brasileiro. Nesse sentido, Renato Brasil: Atento, porém, ao sensível aumento da expectativa de vida dos brasileiros – em 1940, esta era, em média, de 45,5 anos, ao passo que, em 2018, pulou para 76,3 anos, segundo dados do IBGE, o Pacote Anticrime alterou a redação do referido dispositivo para dispor que o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos (BRASIL, 2020, p. 29). 7 Este aumento de teto refletiu também, na unificação de penas, para fins de composição do quantum de 40anos, quando há condenações sucessivas, bem como em relação à superveniência de condenação por crime havido após o início da execução penal, excluindo do cômputo o período de pena já cumprido. A nova redação do art. 75, CP restou estabelecido da seguinte forma com as modificações no caput e no parágrafo primeiro, in verbis: Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos. 1º Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. 2º Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido. 1.3 ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PELO INTITUTO BRASILEIRO DE CIENCIAS CRIMINAIS (IBCCRIM) Fundando em 1992, o Instituto Brasileiro de ciências criminais (IBCCRIM)1, é uma organização não governamental brasileira, ligada à Justiça e aos direitos humanos. Acerca do tema abordado, realizou algumas considerações, explicando que Lei 13.964/2019, erroneamente conhecida como pacote anticrime, alterou o Código Penal, e que uma das principais mudanças ocorridas dói a redação do art. 75, que aumentou o tempo máximo de cumprimento das penas privativas de liberdade de 30 para 40 anos. Essa mudança reflete uma luta irrompida no Congresso Nacional (1) e teve como consequência um modo de “contenção de danos” (2) do excesso de criminalidade. Em uma tentativa de atender a uma medida populista, o governo coordenou os projetos de aumento do poder punitivo do Estado e propôs a mudança 1Reconhecido nacional e internacionalmente por sua atuação na área de produção científica -- incluindo o acervo de sua Biblioteca, a mais completa em Ciências ininais da América Latina -- o IBCCRIM realiza cursos, eventos, debates e iniciativas de extensão universitária e iniciação científica. Aspublicações produzidas pelo Instituto, além das notas técnicas e pareceres sobre projetos de lei e ações judiciais de grande repercussão, são referências para pesquisadores, profissionais, jornalistas e estudantes. 8 sem qualquer promover o diálogo com as vozes dissonantes e divergentes as mudanças. É válido ressaltar que ao propor essa alteração, nem mesmo os defensores dos direitos humanos, os movimentos sociais e os juristas garantistas, que são contra a “banalização do mal”, foram convidados a discutir e juntos encontrarem as dificuldades para, nos locais oficiais, demonstrar os pontos negativos do projeto. O Instituto ainda relatou que afirma: o projeto demonstrou traços autoritários, pois, desconsiderando a práxis republicana e o compromisso com a transparência, não expôs suas justificativas, inclusive tornando cinzenta as intenções do governo e as razões fundantes para a aprovação do projeto pelo Legislativo” Em que pese o importante trabalho cumprido pelos parlamentares progressistas, refletindo as contribuições da sociedade civil, da academia e da advocacia criminal, a lei aprovada (mesmo que nutrida de alguns - raros - pontos positivos, como a indicação do juiz de garantias, requisito fundamental ao sistema acusatório), não conseguiu barrar o animus punitivista do projeto(BCCRIM, 2019). Nesse mesmo diapasão, relata que esse aumento no tempo de cumprimento de pena privativa de liberdade afronta a CF, e que uma de suas consequências seria a ampliação do poder punitivo às periferias, visto que o Direito Penal, desde os tempos remotos, vem se estabelecendo de modo a punir os mais fracos e oprimidos, conhecido como as minorias, como caso dos pretos e favelados. Esse mesmo Instituto analisa as mudanças ocorridas no Direito Penal e suas consequências. Na ótica das teorias críticas, entende que não há construção de pensamento imparcial e neutro, vez que o ser humano é um indivíduo situado e, por conta disso, deve se colocar dos grupos mais vulneráveis e comprometidos com a emancipação daqueles que até hoje não tiveram voz, onde de acordo com Nilo Batista: para a grande maioria dos brasileiros - do escravismo colonial ao capitalismo selvagem contemporâneo - a punição é um fato cotidiano. Essa punição se apresenta implacavelmente sempre que pobres, negros ou quaisquer outros marginalizados vivem a conjuntura de serem acusados da prática de crimes interindividuais. (BATISTA, 1990, p. 38). Continuando a análise, afirmando que Penal, o Direito tem servido para proteger apenas uma parte da população e combater outra. No Estado Democrático de Direito Brasileiro, todas as normas são feitas para beneficiar apenas uma parcela da sociedade, conforme afirma Thula Pires: 9 partindo da premissa de que a construção normativa (tanto teórico quanto jurisprudencialmente) se produz a partir da experiência da zona do ser, busca-se uma narrativa que reposicione o papel dos direitos humanos sobre os processos de violência sobre a zona do não ser. Tomar a realidade da zona do ser como o parâmetro para pensar processos de proteção e promoção de direitos humanos produziu um aparato normativo incapaz de perceber e responder às violências que se manifestam na zona do não ser e fez da afirmação do não-ser a condição de possibilidade que sustenta a humanidade como atributo exclusivo da zona do ser.” (PIRES, 2019, p. 66). Finalizando sua abordagem sobre o tema, esclarece que não há erros de interpretação quando a real intenção da alteração, estabelecendo que as mesmas pessoas que estão tendo seus direitos sociais serão as que mais sofrerão com as alterações explicando que, em suas palavras: “a mesma mão que impede a aposentadoria, a educação e a saúde pública é aquela que aumenta a pena privativa de liberdade de 30 para 40 anos”. A atual conjuntura política do Brasil indica mostra que ficará a encargo das agências judiciais a diminuição do exercício do poder punitivo irracional e a contenção da seletividade na criminalização secundária para diminuir os efeitos adversos da alteração do art. 75 do CP. 1.4 DA INCONSTITUCIONALIDADE DA NOVA REDAÇÃO DO ARTIGO 75 DO CÓDIGO PENAL O aumento do tempo da pena privativa de liberdade, fará com que sistema prisional fique mais sobrecarregado do que já está, e que como consequência disso, faltarão vagas para atender o aumento da população carcerária, ocorrendo uma superlotação nos presídios, e como resultado, trará sérios impactos aos direitos fundamentais, bem como infringirá aos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988, que estabelece que todo o sistema prisional brasileiro terá sua função inconstitucional, de acordo com o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, vejamos no julgado a seguir: CUSTODIADO – INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL – SISTEMA PENITENCI-ÁRIO – ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMEN-TAL – ADEQUAÇÃO. Cabível é a arguição de descumprimento de preceito fundamental considerada a situação degradante das penitenciárias no Brasil. SISTEMA PENITENCIÁRIO 10 NACIONAL – SUPERLOTAÇÃO CARCERÁ-RIA – CONDIÇÕES DESUMANAS DE CUSTÓDIA – VIOLAÇÃO MASSIVA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – FALHAS ESTRUTURAIS – ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL – CONFIGURAÇÃO. Presente quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional ser caraterizado como “estado de coisas inconstitucional”. FUNDO PENITENCIÁRIO NACIONAL – VERBAS – CONTINGENCIAMENTO. Ante a situação precária das penitenciárias, o interesse público direciona à liberação das verbas do Fundo Penitenciário Nacional. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA – OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. Estão obrigados juízes e tribunais, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, a realizarem, em até noventa dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão. (ADPF,2016) Nesse contexto, resta evidente que a alteração do art. 75 do Código Penal, vários princípios fundamentais constitucionais, tais como o Estado de Coisas Inconstitucional, visto que tendo em vista que aumentar o limite máximo da pena de privativa de liberdade terá como consequência a superlotação do sistema prisional, vai de encontro com a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto São José da Costa Rica), na qual o Brasil é signatário. Segundo o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM): no retrospecto das avaliações feitas sobre os problemas estruturais e desumanizantes que cercam o nosso sistema prisional, sucedâneo do pelourinho de outrora, é importante relembrarmos o diagnóstico realizado pelo STF na ADPF 347 que reconheceu no Brasil, por inspiração da atuação da Corte Constitucional da Colômbia, o Estado de Coisas Inconstitucional do sistema prisional pátrio(BCCRIM, 2019). É evidente que existe a inconstitucionalidade da alteração promovida diante da falta de um amplo estudo sobre o impacto financeiro e orçamentário que será causado aos estados em decorrência do aumento da população carcerária que necessita de assistência material e que sofrerá com a falta de vagas para comportar o crescimento populacional, fazendo com que o estado tivesse que investir no aumento dos estabelecimentos prisionais. A nova redação do art. 75 do CP utilizou-se do clamor popular para empregar uma tentativa de reparo para os problemas sociais, fazendo com que a legislação penal se tornasse simbólica e emergencial, porém sem nenhuma eficácia, além de violar direitos e garantias fundamentais. Segundo o Ministro Ricardo Lewandowski:11 um quadro insuportável e permanente de violação massiva de direitos fundamentais, que não poderia subsistir e que exigia, sem dúvida nenhuma, uma intervenção do Poder Judiciário de caráter estrutural e que demandava, inclusive, medidas de natureza orçamentária. [...] Neste mesmo sentido, o Ministro Luís Roberto Barroso assentou que: “mandar uma pessoa para o sistema é submetê-la a uma pena mais grave do que a que lhe foi efetivamente imposta, em razão da violência física, sexual e do alto grau de insalubridade das carceragens, notadamente devido ao grave problema da superlotação (BRASIL, 2020). O então Ministro Teori Zavascki consignou que “em nossas prisões as condições de vida são intoleráveis” e, na prática, “os presos não têm direitos”(BRASIL, 2020), demonstrando que o sistema prisional não se coaduna com sistema de direitos e garantias previstos na Constituição de 1988(BCCRIM, 2019). Analisando os casos práticos, onde a aplicabilidade da referida Lei 13.964/2019, fica claro que no sistema prisional brasileiro, existe uma grande violação generalizada de direitos fundamentais dos presos no tocante à dignidade, higidez física e integridade psíquica, infringindo a Constituição Federal. O sistema carcerário brasileiro sofre com uma superlotação carcerária e a uma enorme precariedade das instalações das delegacias e presídios. Além disso é nítido que existe uma inobservância, por parte do Estado, da ordem jurídica correspondente, que geram um degradante, ultrajante e indigno a pessoas que encontram sob custódia, e que la deveriam estar cumprindo suas penas para serem ressocializadas. As penas privativas de liberdade aplicada, cumpridas nos presídios, por terem, essa característica de descaso com a referida instituição e estar em condições precárias, acabam se tornando cruéis e desumanas. Os condenados acabam sendo destratados e humilhados, exposto a situações degradantes que de nada o auxiliam a encarar seus erros e vislumbrar uma nova oportunidade de reintegrar a sociedade. Ademais, o próprio SFT entende o Estado de Coisas Inconstitucional, conforme já tratado, sendo, portanto, uma controvérsia aumentar o tempo máximo das penas privativas de liberdade, sem antes se preocupar em modificar o cenário e a realidade desumana e insalubre do sistema carcerário brasileiro. Se este cenário já existe é reconhecido, é insustentável que se alega a constitucionalidade de uma alteração, ou no caso, de uma Lei que aumente o tempo que os condenados fiquem presos. Ainda há de se ressaltar que, mesmo diante de 12 várias violações aos constitucionais, esse cenário deplorável é uma realidade em todas as unidades da Federação, restando concluído que deve ser reconhecida a inequívoca falência do sistema prisional. Restado demonstrado a inconstitucionalidade, podendo ser fundamentada na ADPF 347 em conjunto com o art. 5º, inc. XLVII, “b”, da CF/88, que proíbe penas perpétuas A proteção constitucional existente é para impedir que as medidas legislativas não afastem ao direito de liberdade, e afaste das penas perpétuas, e que reforce a importância da dignidade humana e da ressocialização do indivíduo. Desse modo, é evidente que não existe ligação entre função ressocializadora da pena e o seu cumprimento, e que cada vez mais e diante das mudanças ocorridas, afasta um cenário ideal para o desenvolvimento de um relacionamento entre o criminoso e a criminalidade. O descaso da sociedade para com o condenado é outra questão que dificulta a ressocialização, vez que esses devem demonstrar que é possível voltar a confiar, e que isso deve ser constantemente demonstrado. Portando, é notório que o Estado, ao unir suas forças na criação de leis mais repressivas retratando um endurecimento penal, está se utilizando da matéria punitiva para mascarar os verdadeiros problemas sociais que afligem a sociedade brasileira. Assim, nunca irá se superar este ciclo vicioso, em que a sociedade, apavorada pelo alto índice de criminalidade, obriga o Poder Público a tomar providências, se baseando no Direito Penal, para reafirmar a atuação do Estado, bem como, ganhar prestígio político. Mesmo que essa mudança tenha se estruturado na necessidade de readaptação da Lei a uma realidade de expectativa de vida maior dos brasileiros, conforme já tratado, um aumento de 10 anos de pena para aqueles que possuem uma expectativa de vida muito menor em vista dos indivíduos que estão em liberdade, é o mesmo que introduzir um sistema de pena perpétuo. O Brasil é um país que possui muitas desigualdades sociais, não podendo ser utilizado o mesmo peso e a mesma medida para todos para realizar uma alteração, sem considerar o fator principal de que a expectativa de vida do sistema carcerário, é afrontar a Constituição Federal. Além disso, o aumento de 10 anos é desproporcional, vez que somente foi considerada a expectativa de vida dos indivíduos em liberdade e não do sistema carcerário, e as desigualdades sociais. 13 Desse modo, é cada vez mais claro que não é aumentando o limite do cumprimento da pena privativa de liberdade que a sociedade se encontrará livre do crime. Ao contrário, esse tende somente a aumentar, vez que enquanto não for superado a ideia de realizar mudanças que não afrontem a constituição, levando em consideração e que as penas têm sua função, e que o Direito Penal só deve ser utilizado em último caso, não estará a comunidade afastada da criminalidade. É necessário que medidas sejam tomadas no sentido de humanização das penas e da ressocialização do infrator. A segurança pública não será revitalizada com o endurecimento das penas, ao contrário, usar da cultura do medo e do uso de medidas penais mais rígidas, faz com que haja a expansão penal em casos que o direito penal deverias estar mais afastado, vez que o aumento não corrigi o fato da finalidade da pena não ser cumprida. Todos os esforços deveriam ser direcionados para alteração de medidas alternativas à prisão, uma vez que o sistema carcerário brasileiro está falido e sofrendo com superlotação. Ainda há a incoerência da ADPF 347 e o aumento do tempo máximo para o cumprimento de pena privativa de liberdade, medida que deixa mais forte o Estado de Coisas Inconstitucional reconhecido pelo STF. Ante o exposto, é necessário que para que haja uma mudança de realidade, seria a redução da pena, e políticas públicas de ressocialização, com a real fiscalização para o cumprimento da verdadeira finalidade da pena, necessitando também da diminuição do poder punitivo irracional, seguindo sempre uma vertente constitucional e jus humanista, visando arbitrar o direito penal. 14 2. CORRENTES DOUTRINÁRIAS E ENTENDIMENTO JURIPRUDENCIAL Este capítulo trará uma breve análise sobre as principais correntes doutrinárias de do direito penal, chamado Guilherme de Souza Nucci e Cezar Roberto Bitencourt, acerca das interpretações destes juristas sobre a alteração nos limites das penas privativas de liberdade. 2.1 CORRENTES DOUTRINÁRIAS Existem várias correntes doutrinárias sobre o tema, mas as mais reconhecidas são a do jurista Guilherme de Souza Nucci, que justifica a majoração dos limites da pena se baseando nos argumentos de que a mudança não é inconstitucional, por considerar que a alteração promoveu justiça uma vez que a elevação acompanhou o aumento da expectativa de vida, não entendendo como cruel o aumento da pena de 30 para 40 anos. O jurista Guilherme de Souza Nucci (2020) argumenta positivamente sobre a majoração do limite de tempo de cárcere tecendo seus comentários baseado em quatro argumentos. O primeiro deles é de que essa majoração corrigiu uma injustiça existente há décadas, pelo fato de o limite de cumprimento de pena não ter acompanhado o aumento da expectativa de vida do brasileiro. O segundo por entender que essa modificaçãonão pode ser considerada inconstitucional por entender que não fere a vedação da pena perpétua. Outro argumento é que não entende como dura e cruel um encarceramento de 40 anos, vez que aqueles indivíduos condenados ao teto máximo de tempo cometeram inúmeras barbaridades, necessitando ficar recluso, e por fim, demonstra que na prática como no caso do Bandido da Luz Vermelha, que cometeu vários homicídios, latrocínios e estupros, tendo cumprido menos de 10% de uma condenação de 326 anos. Do outro lado, o doutrinador Cezar Roberto Bitencourt, que aduz que as prisões causam muitos efeitos negativos e na prática não cumprem sua real função ressocializadora, não sendo eficaz a alteração promovida no artigo 75 do Código Penal. Ademais, além destes efeitos negativos, o endurecimento da pena não contribui para que o indivíduo seja ressocializado, na verdade só contribui para sua permanência na criminalidade, vez que o réu posto em liberdade, se depara com um 15 mundo que não está apto a sua readaptação não o oferecendo o suporte necessário para conduzi-lo a uma vida digna. Neste sentido Cezar Roberto Bitencourt: As graves deficiências das prisões não se limitam a narrações de alguns países; ao contrário, existem centros penitenciários em que a ofensa à dignidade humana é rotineira, tanto em nações desenvolvidas como em subdesenvolvidas. As mazelas da prisão não são privilégios apenas de países do terceiro mundo. De um modo geral, as deficiências prisionais compendiadas na literatura especializada apresentam muitas características semelhantes: maus tratos verbais ( insultos, grosserias etc.) ou de fato ( castigos sádicos, crueldades injustificadas e vários métodos sutis de fazer o recluso sofrer sem incorrer em evidente violação do ordenamento etc.); superlotação carcerária, o que também leva a uma drástica redução do aproveitamento de outras atividades que o centro penal deve proporcionar [...] ( BITENCOURT, 2011, p. 163, 164). Dessa forma, as duas correntes estabelecem uma discrepância quanto a eficácia da alteração promovida, sendo que a corrente do jurista Guilherme de Souza Nucci não se sustenta diante de uma análise pontual feita pelo jurista Cezar Roberto Bitencourt, vez que todos os argumentos tratados para justificar a majoração além de serem eivados de incongruências devidamente satisfeitas pela corrente de Bitencourt, não servem para justificar uma majoração que não tem eficácia e que possui mais um caráter de atendimento a um anseio popular do que uma tentativa de reparar erros do sistema penal brasileiro. 2.2 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL Inicialmente cumpre discorrer sobre os entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre os limites do cumprimento das penas privativas de liberdade. Ambos os tribunais superiores brasileiros já se posicionaram sobre o assunto, porém seus entendimentos não são o mesmo. Para melhor ilustrar o entendimento, o STF entende que o limite da medida de segurança é o mesmo da pena, portanto, 40 anos, de acordo com a súmula 715 do STF. A Súmula 715 do STF consagra este entendimento: A pena unificada paraatender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução” (BRASIL, 2003). 16 Desse modo, este limite de 40 anos é tão-somente para o cumprimento de pena, não sendo aplicável para outros benefícios, conforme já discorrido. Já o Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a Súmula 527 que diz que “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”. (BRASIL, 2015) Isso significa que o prazo máximo de duração da medida de segurança não pode ultrapassar o máximo fixado para a pena abstratamente cominada ao delito.É válido ressaltar que a pena unificada a fim de atender ao limite de quarenta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios como, por exemplo, a progressão de regime. Com feito, com a edição da Lei 13.964/2019, houve uma alteração significativa na aplicação penal no Brasil, salientando que se deu em plena pandemia mundial do Covid -19, vejamos em então, o cenário nacional e a repercussão das decisões do STJ, principalmente no primeiro ano que passou a vigorar, vejamos. O STJ ressalta qual o cenário se encontrava o país em 2019: Em meio à pandemia da Covid-19, o número de assassinatos voltou a crescer no Brasil, depois de dois anos seguidos de queda. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o primeiro semestre de 2020 teve alta de 7,1% no volume de mortes violentas intencionais, em comparação com o mesmo período do ano anterior. Nos seis primeiros meses de 2020, foram registradas 25.712 ocorrências de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e óbitos decorrentes de intervenção policial, o que equivale a uma pessoa morta a cada dez minutos. De acordo com o 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública do FBSP, houve crescimento também no quantitativo de casos de violência contra a mulher, com uma agressão física de dois em dois minutos e um estupro a cada oito minutos. Conforme o levantamento, o número de denúncias de violência de gênero levadas às polícias militares aumentou em 3,8% no comparativo entre o primeiro semestre de 2019 e os seis primeiros meses do ano passado, com um total de 147.379 chamados em todo o país. [...]As estatísticas da violência urbana no Brasil são traduzidas em uma sensação generalizada de insegurança, que resulta em uma cobrança da sociedade por medidas de endurecimento do combate à criminalidade. Pesquisas do Instituto Datafolha realizadas em 2018 e 2019 revelam, por exemplo, o apoio majoritário da população brasileira à aprovação da pena de morte e da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos (STF, 2020). Havendo, portanto, a necessidade de endurecimento penal, das leis, como “resposta da justiça”, aos apelos da sociedade como medida de coibir o aumento da 17 violência e o povo necessitava com veemência isso na prática. O STJ, deixa bem claro nesse sentido, que ele mesmo salienta: Foi no embalo do clamor popular por maior repressão aos criminosos que o Congresso aprovou a Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote ou Lei Anticrime. Em vigor desde janeiro do ano passado, o pacote alterou dispositivos de 17 leis penais, a exemplo do Código Penal (CP), do Código de Processo Penal (CPP) e da Lei de Execução Penal (LEP). Entre as novidades, a Lei Anticrime elevou de 30 para 40 anos o tempo máximo da pena de reclusão, ampliou o rol de crimes considerados hediondos – foram incluídos delitos como genocídio, roubo com restrição de liberdade da vítima e furto com uso de explosivo – e limitou as hipóteses de progressão de regime e de livramento condicional.” “Somente duas regras ainda não entraram em vigor. Uma delas é a criação do juiz das garantias, com o acréscimo dos artigos 3ª-A a 3º-F no CPP. A outra é a exigência de realização de audiências de custódia no prazo máximo de 24 horas após a prisão em flagrante, conforme nova redação dada ao artigo 310 do CPP. Ambas as normas estão suspensas por liminar do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, relator das ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305. Durante o primeiro ano de vigência da Lei 13.964/2019, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem uniformizando a interpretação de seus dispositivos. Acórdãos sobre o Pacote Anticrime foram divulgados em seis edições do Informativo de Jurisprudência, publicação periódica produzida pela Secretaria de Jurisprudência do tribunal (STF, 2020). Ainda sob a ótica da aplicabilidade da Lei 13.964/2019, em relaçãoa sua contemporaneidade, junto ao STJ, menciona: As novas regras da prisão preventiva são o tema mais frequente na jurisprudência do STJ em torno da Lei Anticrime. Em uma série de julgados, as turmas penais vêm consolidando o entendimento de que a Lei 13.964/2019 – nos termos da redação conferida ao artigo 315 do CPP – exige expressamente que a imposição de preventiva ou de qualquer outra cautelar deve estar fundamentada em motivação concreta relacionada a fatos novos ou contemporâneos e na demonstração da imprescindibilidade da medida restritiva. O princípio da contemporaneidade foi aplicado pela Sexta Turma para conceder, por unanimidade, habeas corpus (HC 553.310) relatado pela ministra Laurita Vaz a uma então vereadora de Bertioga (SP), denunciada pela suposta prática do crime de concussão no seu gabinete parlamentar. Segundo o Ministério Público de São Paulo, entre 2013 e 2014, ela teria exigido de dois assessores parte de sua remuneração mensal, totalizando cerca de R$ 42 mil. Em razão da denúncia, a ex- vereadora foi afastada do cargo pelo juízo de primeiro grau (STF, 2020). Nesse diapasão, continuamos a analisar alguns casos práticos da aplicação da nova lei junto ao STJ: a Sexta Turma revogou a suspensão do exercício da função pública. De acordo com a ministra Laurita Vaz, não houve fatos recentes que justificassem a implementação da cautelar. Como destacou a ministra, o afastamento do cargo foi determinado mais de cinco anos depois dos episódios narrados na denúncia, Em que pese, de fato, a gravidade e a reprovabilidade das condutas imputadas à paciente, verifica-se que não foi 18 demonstrada, na espécie, a indispensabilidade atual da restrição, nos termos do parágrafo 1º do artigo 315 do Código de Processo Penal, incluído pela Lei 13.964/2019 (STF, 2019) Outro tema que não é consensual entre os membros do STJ sobre a aplicabilidade da norma “Ex ofício”; assim posiciona: Ao contrário do reconhecimento do princípio da contemporaneidade, um tema não consensual na corte superior é a conversão, de ofício, da prisão em flagrante em preventiva, à luz da redação dada ao artigo 311 do CPP pelo Pacote Anticrime. Ao longo de 2020, a Quinta Turma alterou o próprio entendimento a respeito da matéria.O colegiado compreendia que a nova legislação mantém no ordenamento jurídico a autorização para o juiz converter o flagrante em segregação provisória sem prévio requerimento. Como registrado pela edição 679 do Informativo de Jurisprudência, a turma penal referendou, por unanimidade, a decisão que indeferiu habeas corpus (AgRg no HC 611.940) impetrado por um suspeito de praticar, em Santa Catarina, os delitos de organização criminosa, receptação e adulteração de sinal identificador de veículo.Ao votar pela manutenção da custódia cautelar do acusado, o relator do HC, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que a Lei Anticrime excluiu apenas a possibilidade da imposição, de ofício, de prisão preventiva."Embora a Lei 13.964/2019 tenha retirado a possibilidade de decretação da prisão preventiva, de ofício, do artigo 311 do Código de Processo Penal, no caso, trata-se da conversão da prisão em flagrante, hipótese distinta e amparada pela regra específica do artigo 310, II, do CPP (STF, 2020). Posteriormente, a Quinta Turma fixou tese em sentido contrário. No HC 590.039, impetrado pela Defensoria Pública de Goiás, o colegiado, por unanimidade, concedeu a ordem para anular duas prisões cautelares impostas sem prévia manifestação das partes, do Ministério Público ou da autoridade policial, em razão de flagrante da prática do crime de receptação. Segundo o relator do processo, ministro Ribeiro Dantas, o Pacote Anticrime modificou a redação do parágrafo 2º do artigo 282 do CPP, de modo a definir que qualquer medida cautelar somente será decretada pelo magistrado mediante provocação. Parece evidente a intenção legislativa de buscar a efetivação do sistema penal acusatório, vontade explicitada, inclusive, quando da inclusão do artigo 3º-A no Código de Processo Penal, que dispõe que o processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação", complementou. A fim de pacificar a interpretação do tema, a Quinta Turma afetou para a Terceira Seção o julgamento do recurso em habeas corpus (RHC 131.263) no qual um acusado pelo crime de tráfico de drogas foi detido preventivamente, de ofício, após o flagrante em Goiás. O ministro Sebastião Reis Júnior é o relator do caso, que teve a análise interrompida por um pedido de vista do ministro Joel Ilan Paciornik (STF, 2020). 19 O STJ salientou que a norma trouxe inovações, como a necessidade de revisão da segregação cautelar pelo juiz ou Tribunal que for responsável pela prisão, sem dúvida uma novidade a mais que atinge diretamente a vida do segregado, do réu preso. Vejamos o posicionamento do STJ: Ainda em matéria de prisão preventiva, o STJ firmou entendimento sobre a norma inscrita no parágrafo único do artigo 316 do CPP, nos termos da Lei Anticrime. O dispositivo inovou ao estabelecer a necessidade de revisão da segregação cautelar a cada 90 dias. De acordo com a edição 680 do Informativo de Jurisprudência, uma das teses delimitadas é a de que a obrigação de rever a preventiva de três em três meses vale apenas para o juiz ou o tribunal que impuser a custódia provisória. [...]“No caso concreto, a Sexta Turma, por unanimidade, negou habeas corpus (HC 589.544) em que um homem condenado em primeira e segunda instâncias pelo cometimento do crime de extorsão questionava o fato de o Tribunal de Justiça de Santa Catarina não ter revisado a prisão preventiva decretada pelo juízo de primeiro grau.A relatora do habeas corpus, ministra Laurita Vaz, enfatizou que o Pacote Anticrime é literal ao atribuir exclusivamente ao órgão emissor da decisão o dever de reavaliar a prisão cautelar. "A inovação legislativa se apresenta como uma forma de evitar o prolongamento da medida cautelar extrema, por prazo indeterminado, sem formação da culpa (STF, 2020). Também no tocante à regra da revisão da preventiva a cada 90 dias – inserida no artigo 316 do CPP –, o STJ vem compreendendo que a inovação processual da Lei 13.964/2019 não resulta em soltura automática em caso de eventual atraso na reavaliação da conveniência da segregação provisória. Esse posicionamento das turmas de direito penal foi reforçado por precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Suspensão de Liminar 1.395. Em outubro passado, por maioria, a corte manteve a suspensão da eficácia de liminar que havia colocado em liberdade André Oliveira Macedo, apontado como um dos líderes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). André do Rap, como é conhecido, está foragido.Antes do julgado do STF, a Quinta Turma do STJ, por unanimidade, adotou a mesma interpretação ao manter a custódia cautelar contra um homem condenado na Justiça Federal da 1ª Região por tráfico internacional de entorpecentes e organização criminosa, depois de ter sido apreendido na posse de 257 quilos de cocaína. Ele permanecia preso provisoriamente desde dezembro de 2017, sem que a medida fosse revista, como prevê o Pacote Anticrime. Relator do HC 605.590, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca afirmou – ao julgar agravo contra sua decisão monocrática que negou o relaxamento da prisão ao paciente – que o descumprimento do prazo nonagesimal para a rediscussão da preventiva "não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade (STF, 2020). Ainda sob as decisões do STJ, agora com foco na progressão prisional, dos presos já em cumprimento de pena (Lei de Execução Penal), também trouxe alterações vejamos algumas decisões nesse sentido: 20 Em relaçãoaos condenados, a Lei Anticrime promoveu nova disciplina no artigo 112 da Lei de Execução Penal, por meio de uma escala com percentuais de observância da pena para a progressão de regime, a depender da natureza da sanção e do perfil do apenado. Contudo, conforme a jurisprudência das turmas penais, resta uma lacuna legal no caso de quem cumpre pena por crime hediondo e possui condenação anterior pela prática de delito comum. [...] A matéria foi examinada pela Sexta Turma, por exemplo, em habeas corpus (HC 607.190) no qual a Defensoria Pública de São Paulo pleiteava que um condenado em regime fechado por tráfico de drogas e furto qualificado, reincidente simples, tivesse direito à progressão com base em prazo mais vantajoso previsto na Lei 13.964/2019. Na origem, o Tribunal de Justiça paulista manteve o patamar inicial de 60% da pena, destinado aos que cometem crime hediondo e são reincidentes em igual modalidade delitiva, nos termos do Pacote Anticrime. A Sexta Turma, por unanimidade, deferiu o pedido de habeas corpus, determinando que a progressão ocorra quando for atingido o percentual de 40% da sanção, reservado aos apenados primários na prática de crime hediondo.Segundo o relator do processo, ministro Nefi Cordeiro, diante da ausência de previsão legal, o magistrado deve buscar a solução mais favorável ao réu por meio da analogia in bonam partem. "Desse modo, forçoso reconhecer que, diante de duas situações, em obediência ao princípio do favor rei, ao paciente se deve aplicar a norma penal mais benéfica (STF, 2020). Outra novação trazida foi sobre o livramento condicional, na seara da execução penal, é os aumentos dos requisitos para a sua obtenção, de acordo com artigo 83 do Código Penal, nesse sentido: Nas turmas de direito penal, houve reorientação jurisprudencial a partir da nova exigência legal de não cometimento de falta disciplinar grave nos 12 meses anteriores para a concessão do benefício (a Súmula 441 do STJ reconhece que a falta grave não interrompe o prazo para a obtenção de livramento condicional). Os julgados do tribunal vêm asseverando ainda que, além do período de um ano sem falta grave, a Lei 13.964/2019 demanda a existência de circunstâncias pessoais favoráveis para se autorizar o benefício. Exemplo de tal posição foi o julgamento em que, por unanimidade, a Quinta Turma não conheceu de habeas corpus (HC 616.951) no qual a Defensoria Pública de São Paulo contestava a exigência de exame criminológico para a concessão de livramento condicional a um homem apenado por cinco roubos qualificados e que cometeu nove faltas graves durante o cumprimento da pena. [...] A última falta grave havia sido cometida há mais de dois anos. Mas, de acordo com o relator, ministro Felix Fischer, além das faltas, o réu apresentou indicativos desfavoráveis no exame criminológico anterior, o que levou à determinação da nova prova técnica. Fischer citou trecho do Pacote Anticrime segundo o qual as condições subjetivas necessárias a quem requer o benefício são "comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. A Quinta Turma recomendou celeridade na realização do exame (STF, 2020). A norma também trouxe alteração sobre o tráfico privilegiado, vejamos: A Lei Anticrime também tratou do regime de cumprimento da pena para condenados por tráfico privilegiado, modalidade elencada no parágrafo 4º 21 do artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). Esse dispositivo permite a redução da pena em até dois terços – chegando ao mínimo legal de um ano e oito meses – quando a quantidade de material apreendido não é elevada, o agente é primário, de bons antecedentes e não se dedica a delitos nem integra organização criminosa. Normatizando jurisprudência consolidada no STF e no STJ, a Lei 13.964/2019 alterou a redação do parágrafo 5º do artigo 112 da LEP para retirar o caráter hediondo do tráfico privilegiado. Como registra a edição 683 do Informativo de Jurisprudência, a novidade fundamentou a decisão unânime da Sexta Turma de conceder habeas corpus coletivo (HC 596.603), pedido pela Defensoria Pública de São Paulo, para fixar o regime aberto a todas as pessoas condenadas no estado por tráfico privilegiado, com pena de um ano e oito meses. Segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo listados no processo, 1.018 homens e 82 mulheres cumpriam, em março passado, a pena mínima por tráfico em regime fechado. De maneira preventiva, eventuais novos apenados nas mesmas condições deverão ser igualmente contemplados pela decisão do STJ, impedindo-se a decretação de regime fechado pela Justiça paulista.No voto, o relator do habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz, criticou a insistente desconsideração das diretrizes derivadas das cortes superiores relativas ao tema, por parte das demais instâncias: "Produz um desgaste permanente da função jurisdicional, com anulação e/ou repetição de atos, e implica inevitável lesão financeira ao erário, bem como gera insegurança jurídica e clara ausência de isonomia na aplicação da lei aos jurisdicionados" (STF, 2020). Ainda continuando sobre as inovações trazidas pela Lei 13.964/2019, sobre o estelionato: Outra mudança promovida pelo Pacote Anticrime é a obrigatoriedade da representação da vítima no crime de estelionato, salvo se praticado contra a administração pública, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência mental, maiores de 70 anos ou incapazes. Há divergência entre as turmas penais quanto ao alcance da retroatividade da nova regra, ponto em torno do qual permanece omissão legal. Para a Quinta Turma – edição 674 do Informativo de Jurisprudência –, o parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.964/2019, não pode ser aplicado aos processos em que o Ministério Público já ofereceu denúncia. Esse foi o posicionamento unânime do colegiado no julgamento de habeas corpus (HC 573.093) em que a Defensoria Pública de Santa Catarina pleiteava a anulação do processo de um homem condenado por estelionato, sem que a vítima houvesse se pronunciado a respeito da persecução penal. De acordo com o relator do caso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, as denúncias de estelionato já ofertadas estão protegidas pelo princípio do ato jurídico perfeito. "As condições de procedibilidade, que alguns autores chamam de condições de admissibilidade do processo penal ou, ainda, de pressupostos processuais, não se confundem com as condições de prosseguibilida-de", afirmou o ministro ao explicar que a representação é requisito para o início, e não para a continuidade de uma ação penal. Já no HC 583.837 – edição 677 do Informativo de Jurisprudência –, a Sexta Turma decidiu, por unanimidade, pela retroatividade da exigência de representação da vítima em todos os processos por estelionato ainda não transitados em julgado, mas sem a extinção automática da punibilidade naqueles em que o ofendido não tenha se manifestado favoravelmente à persecução penal. 22 A decisão do colegiado se deu no julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que manteve o réu condenado à pena de reclusão por estelionato, apesar da ausência de representação da vítima. No voto, o ministro relator, Sebastião Reis Júnior, disse que as normas regulamentadoras da ação penal são regidas pelos princípios da retroatividade e da ultratividade benéficas, pois disciplinam o exercício da pretensão punitiva. "Parece notório que o parágrafo 5º do artigo 171 do Código Penal, inserido pela Lei 13.694/2019, é norma mais benéfica em relação ao regime anterior. E, pelo caráter misto, alcança casos anteriores à sua vigência”, declarou (STF, 2020). Continuando a análise das inovações, vejamos o entendimento do STJ sobre a não persecução penal: O STJ também buscauniformizar a interpretação em relação à retroatividade do instituto do acordo de não persecução penal. Ao criar o artigo 28-A do CPP, a Lei 13.964/2019 abriu a possibilidade de que o Ministério Público proponha ao acusado acordo para a não abertura de ação penal, desde que preenchidos os requisitos legais de confissão de crime sem violência ou grave ameaça, de pena mínima inferior a quatro anos, e mediante o cumprimento de obrigações como a prestação de serviços comunitários. A Sexta Turma afetou a matéria para julgamento na Terceira Seção. O habeas corpus (HC 596.340) em análise foi impetrado pela defesa de um homem denunciado pelo crime de furto qualificado, que confessou o delito, mas teve negado o pedido para negociar um acordo de não persecução penal após parecer contrário do Ministério Público do Tocantins. Em liminar, o relator do processo, ministro Rogerio Schietti Cruz, suspendeu a ação penal até o exame de mérito do caso. A Quinta Turma, por sua vez, vem firmando a tese de que a retroatividade do acordo de não persecução penal só é válida se a denúncia não tiver sido recebida. Esse entendimento embasou a decisão do colegiado que, por unanimidade, manteve o desprovimento de recurso especial (AgRg no REsp 1.886.717) interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região contrário à retroatividade do acordo. O caso concreto envolvia um condenado por contrabando de medicamentos importados. Segundo o relator do recurso, ministro Felix Fischer, o artigo 2º do Código de Processo Penal dispõe que as normas processuais penais não possuem efeito retroativo."Da simples leitura do artigo 28-A do CPP se verifica a ausência dos requisitos para a sua aplicação, porquanto o recorrente, em momento algum, confessou formal e circunstancialmente a prática de infração penal, pressuposto básico para a possibilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal", complementou” (STF, 2020). 2.3 A EFICÁCIA DA ALTERAÇÃO Para o doutrinador Cezar Roberto Bitencourt, as prisões causam muitos efeitos negativos e na prática não cumprem sua real função ressocializadora, não sendo eficaz a alteração promovida no artigo 75 do Código Penal. Nesse mesmo 23 diapasão, tem se que tal mudança não foi eficaz, vez que as penas não estão cumprindo sua função, além de que o tempo de duração da medida de segurança não deve ser superior ao limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado. As garantias que foram flexibilizadas foram no sentido de limitar direitos e liberdades individuais em nome de uma suposta maior eficácia e proteção social. O princípio da humanidade das penas atua como elemento para coibir a irracionalidade da violência criminal, manifestada na proibição da tortura e dos tratamentos cruéis e degradantes (art. 5º, III, CF/88), o legislador ignorou a mesma individualização que pena (art. 5º, XLVI) e a proibição da pena de morte, prisão perpétua ou prisão perpétua (art. 5º, XLVIII). Posto isso, ao invés de cercear direitos, a falta de recursos públicos deveria ser mais um motivo para o Estado reservar a prisão para casos excepcionais, deixando de banalizá-la e utilizá-la como instrumento de segregação e neutralização. O aumento injustificado em uma década do limite da pena privativa de liberdade encobre, na verdade, sob um argumento higienista e securitário, um projeto de institucionalização, estigmatizando a diferenciação e o desprezo pela humanidade. Em realidade, trata-se de um atentado à integridade física, psíquica e moral dos indivíduos que foram presos, infringindo tanto o texto constitucional quanto as normas internacionais de direitos humanos. Desse modo, a lógica legal razoável é reduzir a pena e não a prolongar. Consequentemente, a lei que eleve o limite da pena para 40 anos no Brasil é um instrumento inconstitucional mascarado de convencionalidade. 24 3. A ALTERAÇÃO DO AUMENTO DO LIMITE DE CUMPRIMENTO DE PENA E OS RESPECTIVOS IMPACTOS NO DIREITO PENAL Este capítulo trará uma breve análise da nova redação do artigo 75 do Código Penal, que conforme já mencionado alhures, em decorrência da Lei 13.964/2019, trouxe uma série de modificações no Direito Penal, mais especificamente da alteração que aumentou o tempo máximo de cumprimento das penas privativas de liberdade de 30 para 40 anos, e como isso influenciou o direito Penal. Conforme já tratado, as alterações promovidas pela Lei n° 13.964/2019, modificou a redação do artigo 75 do Código Penal Brasileiro, qual seja, que alterou a pena 30 anos: Art. 75 – O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos. Desse modo, com a recente mudança na legislação em decorrência da nova lei, o limite fixado de reclusão e detenção passou a ser 40 anos, ocorrendo, portanto, um aumento de 10 anos no cumprimento de pena no Brasil: Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 40 (quarenta) anos. Tal modificação na redação do artigo, tem o intuito fazer com que a sanção penal privativa de liberdade possa acompanhar o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, tendo entrado em vigor com a edição da Lei Federal 13.964, de 24 de dezembro de 2019, que ficou popularmente conhecida como “Pacote Anticrime”, conforme dito alhures. Tal elevação no tempo de encarceramento tem um cunho de punibilidade do agente condenado, sob a argumentação de reduzir a incidência criminal e o combate às organizações criminosas. Desse modo, entende-se que o que se baseia para justificar a alteração da legislação penal de torná-la mais punitiva, possui, na prática, eficácia. 3.1 A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS E O PACOTE ANTICRIME Segundo Capriolli (2020), a análise das alterações feitas à “Lei dos Crimes de Hediondos” pelo Pacote Anticrime, que realizou alterações importantes no que diz respeito a punibilidade, se baseando na interpretação da “Lei dos Crimes 25 Hediondos”, publicada no Diário das Nações Unidas em 26 de julho de 1990. Além de lidar com vários outros crimes horríveis na época, a sociedade também estava sofrendo com os crimes de sequestro. O caso em questão foi o assassinato do empresário Ablio Diniz em 11 de novembro de 1989, seis (seis) dias antes do segundo turno da eleição presidencial, que elegeu Fernando Collor de Melo. Diante disso, o estado procurou combater a violência, se baseando na Lei dos crimes Hediondos, como forma de satisfação popular, endurecendo a punição para piores e mais graves crimes. (CAPRIOLLI, 2020). A Lei em comento regulamenta o artigo 5º, inciso XLIII da Constituição da República Federativa do Brasil. De acordo com o disposto no art. 2º, I, da Lei n. 8.070/90, os crimes hediondos e os equiparados são insuscetíveis de anistia, graça e indulto (STF, 2006). Os crimes considerados hediondos são o de extorsão qualificada pela morte, latrocínio, estupro, extorsão mediante sequestro e na forma qualificada, epidemia com resultado morte, atentado violento ao pudor, envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou medicinal, qualificado pela morte, todos do Código Penal, e os crimes de genocídio, tentados ou consumados. O parágrafo 1º do artigo 2º da referida lei, discorre sobre os autores destes crimes não terem direito a progressão de regime e devendo cumprir sua pena em regime integralmente fechado, fato este que deu origem a declaração de inconstitucionalidade por parte do STF, partindo da premissa de que esta previsão feria os princípios da individualização e humanização da pena, além dos princípios da igualdade e do devido processo legal. Tal entendimento foi o precursor da Súmula Vinculante 26, que estabeleceu a progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, observando que o juízo da execução declarará a inconstitucionalidade do art. 2º daLei 8.072, de 25 de julho de 1990, sem considerar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo estabelecer de maneira fundamentada, para essa finalidade, a realização de exame criminológico. A critério de demonstração disso surgiu o precedente representativo emitido por aquele Órgão Supremo: PENA — REGIME DE CUMPRIMENTO — PRO-GRESSÃO — RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semiaberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso, que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA — 26 CRIMES HEDIONDOS — REGIME DE CUMPRIMENTO — PROGRESSÃO — ÓBICE — ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/1990 — INCONSTITUCIONALIDADE — EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena — art. 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal — a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990. [HC 82.959, rel. min. Marco Aurélio, P, j. 23-2-2006, DJ de 1º-9-2006.]” (STF, 2006). Com o advento da Lei 11.464/2007, parágrafo 1º do artigo 2º da Lei dos crimes Hediondos, ficou estabelecido que a pena dos crimes hediondos seria cumprida em regime fechado, inicialmente. Em todo caso, o atual entendimento jurisprudencial é de que cabe ao juiz sentenciante a definição de qual será o regime de cumprimento de pena a ser aplicado ao condenado, levando em consideração o princípio da individualização da pena, como se observa em Teses de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal: “É inconstitucional a fixação ex lege, com base no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, do regime inicial fechado, devendo o julgador, quando da condenação, ater-se aos parâmetros previstos no artigo 33 do Código Penal”. Vale ressaltar que esta lei passou por muitas reformas legislativas, tais como: Lei 8.930/1994; 9.695/1998; 11.464/2007; 12.015/2009; 12.978/2004; 13.104/2015; 13.142/2015; 13.497/2017; 13.769/2018. Na maioria das vezes, lei tem sido utilizada de maneira eleitoreira por aqueles que inundam o público com o argumento de que a segurança pública se torna mais eficaz com o endurecimento das leis, e em outras circunstâncias, a mesma lei tem sido utilizada apenas para acalmar o anseio popular, tendo uma vertente muito mais emergencial e simbólica do que efetivo e eficaz em sua finalidade. Superado isso, no momento em que o Brasil adota um critério legal, taxativo ou enumerativo, para definir os crimes hediondos, é o momento em que o juiz deixa de possuir discricionariedade para afastar a hediondez, ou até mesmo aplicá-la em casos que não os previstos na lei. No que se refere a esta taxatividade, o legislador tem feito inúmeras alterações na tipificação dos crimes, o que em certo ponto atinge também aqueles previstos na Lei dos Crimes Hediondos. A título de exemplificação disto, são as recentes modificações realizadas pelo Pacote Anticrime, que em seu artigo 5º traz a possibilidade de alterar da redação do artigo 1º da Lei 8.072/1990, principalmente 27 em seus incisos I (homicídio), II (roubo), III (extorsão qualificada) e IX (furto qualificado pelo emprego de explosivo). 3.2 DAS ALTERAÇÕES NA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS No que se refere as mudanças ocorridas na Lei dos Crimes Hediondos, alterada pelo Pacote Anticrime, Lei n. 13.964/2019, foram realizadas mudanças muito importantes quanto a punibilidade dos crimes hediondos. Vale ressaltar que o Pacote Anticrime, na Lei dos Crimes Hediondos, alterou apenas o rol de crimes hediondos, vez que as alterações ligadas à progressão de regime, liberdade condicional e outras características de cumprimento de pena foram incluídas na Lei de Execuções Penais. 3.3 DO HOMICÍDIO QUALIFICADO – ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO OU PROIBIDO Dentre a alteração ocorrida, a mais criticada é o fato de o Pacote Anticrime tentar incluir no Código Penal o inciso VIII do parágrafo 2º, no artigo 121, a qualificadora do homicídio quando cometido com uso de arma de fogo de uso restrito ou proibido, e ainda considerou este ato qualificado de homicídio como crime hediondo. Ocorre que a inclusão deste inciso VIII, § 2º, 121 do CP, foi vetada pela Presidência da República, sob o pretexto de que sua aprovação poderia causar danos aos agentes de segurança pública, como se percebe na Mensagem 726, de 24 de dezembro de 2019, da Presidência da República (BRASIL, 2019). Inciso VIII do § 2º do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de1940, alterado pelo art. 2º do projeto de lei.: “VIII – com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido: ”Sendo que as razões do veto são: A propositura legislativa, ao prever como qualificadora do crime de homicídio o emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, sem qualquer ressalva, viola o princípio da proporcionalidade entre o tipo penal descrito e a pena cominada, além de gerar insegurança jurídica, notadamente aos agentes de segurança pública, tendo em vista que esses 28 servidores poderão ser severamente processados ou condenados criminalmente por utilizarem suas armas, que são de uso restrito, no exercício de suas funções para defesa pessoal ou de terceiros ou, ainda, em situações extremas para a garantia da ordem pública, a exemplo de conflito armado contra facções criminosas. No entanto, mesmo a alteração legislativa constando como vetada no Código Penal, ainda é citada no rol de crimes hediondos da Lei 8.072/1990, ou seja, restando demonstrada a falta de empenho do legislativo na publicação de nossas leis, conforme a integra do texto legal já com a redação dada pelo Pacote Anticrime, na Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. “Art. 1º.I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII) (BRASIL, 1990). 3.4 DO LATROCÍNIO A Lei dos Crimes Hediondos apresentava em seu texto, tanto na redação original, quanto na alteração promovida pela Lei 8.930/1994, a expressão “latrocínio” como sinônimo de roubo acompanhado de morte da vítima. Trata-se de crime contra o patrimônio, e de acordo com a Súmula 603 do Supremo Tribunal Federal, “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do Juiz singular e não do Tribunal do Júri” (BRASIL, 1988). As hipóteses que isso era possível são na de roubo consumado e homicídio tentado que seria a tentativa de latrocínio, a de roubo consumado e homicídio consumado, que seria latrocínio consumado, a de roubo tentado e homicídio tentado que seria a tentativa de latrocínio, e por fim o roubo tentado e homicídio consumado que seria o latrocínio consumado. Dentre as mudanças trazidas pelo Pacote Anticrime, é notória a alteração que retirou a palavra “latrocínio” da Lei dos Crimes Hediondos, sendo substituída pela expressão “roubo”, de acordo com o método de nomenclatura utilizada no artigo 157 do Código Penal. A Lei dos Crimes Hediondos prevê as hipóteses em que o “roubo” será considerado hediondo. O inciso II do artigo 1º desta Lei passa a prever três alíneas que narram as situações em que o roubo será considerado crime hediondo. Nas alíneas “a” e “b” verifica-se as ocorrências descritas como roubo 29 circunstanciado, como no caso da restrição de liberdade da vítima, ou até mesmo, no emprego de arma de fogo “de uso permitido”, arma de fogo de uso proibido e arma de fogo de uso restrito. Já na alínea “c” existem duas hipóteses descritas como roubo qualificado, tais como: quando ocorre lesão corporal de natureza grave (ou gravíssima), e ainda, quando ocorre o resultado morte. Em síntese, o roubo com resultado
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